Artigo
Proteção contra o fogo
por Antonio Carlos Vendrame
INCÊNDIOS ENVOLVENDO
INFLAMÁVEIS LÍQUIDOS
A ocorrência desses eventos depende de múltiplos fatores, mas uma vez
iniciados, podem provocar verdadeiras tragédias
R
ecentemente um incêndio envolvendo inflamáveis na
cidade de Santos (SP), levou oito dias para ser controlado. Felizmente, não houve vítimas, mas é inegável que as
perdas materiais para a empresa foram substanciais, além
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dos impactos ao meio ambiente. As empresas que mantêm
inflamáveis em suas instalações devem promover ações de
prevenção continuamente para evitar que pequenas ocorrências se transformem em grandes acidentes.
Os líquidos inflamáveis fazem parte de vários processos
industriais nos quais nem sempre é possível sua substituição por produtos não inflamáveis. Assim, a indústria moderna teve de se adaptar ao trabalho sob condições de risco, ou até mesmo perigo, controlando-os no seu dia a dia.
Várias medidas de proteção devem ser implementadas
para se evitar o princípio de incêndio. O controle das fontes
potenciais de ignição é muito importante, mas a ênfase primária deve ser dada à prevenção de liberação de concentração de vapores ignitáveis.
Os líquidos inflamáveis são comumente utilizados na indústria para várias finalidades; no entanto, apesar de sua versatilidade quanto ao uso, representam acentuado risco de
incêndio quando não adequadamente manuseados.
Quando entram em ignição, os inflamáveis líquidos geram fogo intenso, o qual se alastra com rapidez, podendo
se tornar incontrolável. Porém, se os inflamáveis fossem utilizados de forma racional, muitos incêndios envolvendo esses líquidos poderiam ser evitados.
Se os inflamáveis forem manuseados e estocados em ambiente seguro, consequentemente evitando os incêndios, é
possível reduzir perdas ao patrimônio, preservar vidas, não
interromper a continuidade dos negócios, não impactar o
meio ambiente etc.
Infelizmente, a maioria dos líquidos inflamáveis, os quais
geram vapores de inflamáveis, são facilmente inflamados
por fontes de ignição com baixa energia, a exemplo da eletricidade estática.
Os líquidos inflamáveis queimam rápido, liberando muito calor. Os vapores dos inflamáveis também possuem as
mesmas propriedades dos fluidos; normalmente, são mais
pesados do que o ar e se instalam próximo ao nível do solo.
O incêndio em inflamáveis deve fazer parte da gestão de
riscos de uma empresa. O ponto de partida são as condições básicas de armazenamento de um inflamável, tais como manutenção e controle de temperatura, bacias de contenção, aterramento, ventilação etc.
Sistemas de drenagem de emergência devem ser instalados para direcionar o vazamento de líquidos e a água de
proteção contra incêndio para uma localização segura. Podem ser utilizadas guias para limitar o líquido, bacias de segurança (contenção) ou outros sistemas de drenagem para
controlar o espalhamento do fogo.
Outras medidas de segurança desejáveis são: instalação
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dos detectores de fumaça, sprinklers, hidrantes, alarmes etc.
Mas não somente o armazenamento deve receber cuidados especiais. O processamento é também ponto crítico, especialmente quando não for realizado em circuito fechado.
Os eventuais vapores produzidos dos inflamáveis devem ser
confinados em equipamentos fechados, evitando-se o contato com o ar atmosférico.
A transferência de líquidos entre vasos, contêineres, tanques e sistemas de tubulação deve ser pressurizada, evitando-se a entrada de ar no sistema.
Teoricamente, as operações que envolvem o processamento de líquidos inflamáveis devem ser realizadas em área
onde não haja significativo risco de fogo ou explosão com
ameaça à vida, propriedade e outros; ou prédios importantes ou utilidades localizadas na mesma planta. Os prédios
ou estruturas de processos devem ser construídos com materiais resistentes ao fogo ou incombustíveis.
Nas condições de trabalho em temperatura no ponto de
fulgor da substância, ou acima, deve ser implementado sis-
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tema de ventilação com trocas de ar suficientes no ambiente, para manter a concentração de vapor na área abaixo de
25% do limite inferior de explosividade. Nas condições de
trabalho acima do ponto de fulgor dos líquidos, estes devem ser armazenados em tanques, contêineres ou vasilhames fechados.
O ponto de fulgor é uma medida direta do volatilidade
de um líquido, de sua tendência a vaporizar. Ponto de fulgor baixo indica grande volatilidade e, em consequência, alto risco de fogo. Um líquido com ponto de fulgor abaixo da
temperatura ambiente facilmente se inflamará e queimará
rapidamente. Na ignição, a propagação da chama ao longo
da superfície de tal líquido será rápida, uma vez que não é
necessário que o fogo gaste energia para aquecer o líquido
para gerar mais vapor.
Quando armazenados em tanques ao ar livre, é importante o correto dimensionamento da bacia de contenção (ou de
segurança), inclusive com sistema de drenagem apropriado.
Tais tanques devem ser instalados em local isolado, distan-
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te de vias e logradouros, bem como de residências da comunidade próxima. Indispensável advertir que não devem
ser instalados quaisquer equipamentos que possam originar faíscas ou se transformem em fonte de ignição nas imediações dos tanques.
Quando os inflamáveis são armazenados em recipientes,
devem ser acondicionados em local isolado constituído por
prédio em alvenaria, com ventilação eficiente (seja natural
ou mecânica), dotado de instalação elétrica à prova de explosão. O prédio deve possuir também sistema de drenagem para conter eventual vazamento.
Todos os trabalhadores que manipulam inflamáveis devem passar por rigoroso treinamento. Basicamente, os incêndios por derramamento ou vazamento de inflamáveis são
resultantes de erro humano na manipulação de recipientes
(tambores ou bombonas) de estocagem e/ou na transferência dos inflamáveis para pequenos recipientes com controles inadequados (utilização de mangueiras, inclinação dos
tambores, adaptação de torneiras, falta de aterramento etc).
Os vapores produzidos por inflamáveis não devem se acu-
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mular, vez que poderá se irromper um incêndio. A ventilação deve ser suficiente para dispersar os vapores.
Não é qualquer equipamento que pode ser utilizado em
locais com armazenamento de inflamáveis, mas sim equipamentos adequados, tais como garfos de empilhadeiras de
aço inoxidável ou ferramentas de cobre e berílio, os quais
são antifaisca.
Os incêndios envolvendo combustíveis e inflamáveis em
ambientes industriais estão se tornando cada vez mais comuns em razão da falta de conhecimento das propriedades
e natureza do incêndio, bem como dos procedimentos de
prevenção para reduzir o risco de incêndio.
Poucos sabem que um líquido não pega fogo, mas o que
entra em combustão são os vapores emanados por um líquido. Num incêndio, o aumento da temperatura faz o líquido se transformar progressivamente em vapor, o que favorece o processo de combustão.
Além do que, não é qualquer concentração do vapor que
entra em ignição, mas uma proporção ideal com o ar. Se
houver muito ar, a mistura é chamada de pobre e não en-
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tra em ignição. Se houver muito vapor, a mistura é chamada de rica e também não entra em ignição. Só entrará em
ignição a mistura com proporções exatas entre o vapor e o
ar, que esteja entre o limite inferior e superior de explosividade do inflamável.
Outro elemento importante é a fonte de ignição. É preciso uma energia mínima para que uma fonte possa ignitar
uma mistura perfeita entre vapor de inflamável e ar. É por
isso que um palito de fósforo acesso ao ser lançado num
recipiente com gasolina se apaga.
As principais fontes de ignição encontradas são: (1) chamas abertas; (2) iluminação; (3) superfícies quentes; (4) calor
radiante; (5) cigarro; (6) corte e solda; (7) ignição espontânea; (8) calor de fricção ou faíscas; (9) eletricidade estática;
(10) faíscas elétricas; (11) fugas de corrente e (12) fornos,
fornalhas e equipamentos de calor.
Com todos os requisitos mostrados acima, podemos concluir que não é fácil um incêndio com inflamável líquido. São
necessárias várias condições simultâneas para que se inicie
um incêndio. Portanto, podemos concluir que a prevenção
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falhou em vários fatores simultaneamente.
No entanto, temos também de admitir que uma vez iniciado um incêndio em inflamável líquido, especialmente em
grandes volumes, não é tarefa fácil combater o fogo. Em determinadas situações, a única solução é deixar queimar o inflamável até o seu total esgotamento. Porém, a solução do
“deixar queimar” traz outro problema: com o fogo contínuo e duradouro é possível o aquecimento de reservatórios
que se encontram próximos àquele que incendeia, havendo o risco de vários inícios de incêndio pelo atingimento da
temperatura de ignição espontânea do inflamáveis que estão ao lado, que é aquela na qual o inflamável produz fogo
sem a presença de fonte de ignição.
Assim, um incêndio que estaria restrito a um tanque, por
exemplo, depois de algum tempo pode se alastrar para todos os outros tanques que se encontram próximos, transformando-se em verdadeira catástrofe.
Várias são as formas de prevenção do incêndio. Uma bastante importante é o controle da eletricidade estática mediante o aterramento perfeito dos equipamentos. Pequenos
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acúmulos de carga são potencialmente perigosos quando estamos lidando com inflamáveis. Até mesmo o corpo humano pode produzir correntes que podem iniciar um incêndio.
Seria desnecessário se falar das fontes de ignição como
cigarros acessos, pois estas já são preocupação constante
nos ambientes industriais.
Basicamente a eliminação do perigo por inflamáveis é realizado pelas medidas a seguir descritas:
◗ Substituição dos produtos inflamáveis por produtos
que não sejam inflamáveis;
◗ Utilização de contêiner de segurança em vez de
vasilhames comuns;
◗ Delimitação das áreas de risco;
◗ Sinalização de proibição de ingresso às áreas de risco;
◗ Emissão de ordem de serviço proibindo o ingresso em
áreas de risco;
◗ Treinamento dos trabalhadores com respeito ao
ingresso em áreas de risco;
◗ Substituir tanques aéreos por tanques enterrados,
ainda que tal medida conflite com a legislação
ambiental;
◗ Alterar política de compras no sentido de dar
preferência aos produtos com ponto de fulgor superior
a 60ºC;
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◗ Não permitir a manutenção de estoques de
inflamáveis, de forma disseminada, especialmente em
recinto fechado, mantendo pequenos volumes somente
para a utilização diária;
◗ Não permitir que trabalhadores, de forma
indiscriminada, realizem enchimento ou transvase de
inflamáveis, delegando tal atividades somente àqueles
recebedores do adicional de periculosidade;
◗ Implementar técnica racional de rotulagem de
produtos químicos;
◗ Os vasilhames de pequeno porte devem ser dispostos
em armários corta-fogo.
Em 2012 o Ministério do Trabalho alterou profundamente
a NR 20 – Norma Regulamentadora nº 20, que trata dos líquidos combustíveis e inflamáveis. Grande parte das empresas ainda não se adaptaram a esta norma, que prevê, dentre
outras ações, a realização de análise de risco nos ambientes com vistas a simular o cenário num caso de incêndio ou
explosão, além de vários outras ações com vistas a se prevenir incêndios com inflamáveis. n
Antônio Carlos F. Vendrame, mestre em química ambiental
e ecotoxicologia; engenheiro químico e engenheiro de segurança
do trabalho; consultor técnico em segurança e higiene do trabalho; perito da justiça do trabalho, justiça cível e justiça federal
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