5 Arquivos secretos do Estado podem ser entregues a privados Proposta. Bases de dados, mesmo com informação Um estudo do Governo defende que as bases de dados de toda administração pública sejam centralizadas e guardadas por uma entidade privada, numa nuvem tecnológica (cloud), incluindo os arquivos das informações classificadas e os segredos de Estado. Com o objetivo de reduzir despesas, o plano está a ser desenvolvido pelo Grupo de Projeto para as Tecnologias de Informação e Comunicação, na tutela do minis- classificada, guardadas por entidade externa tro Miguel Relvas. Se o plano for aceite, dados da defesa, da segurança interna e do serviço de informações, acordos internacionais e registos de saúde ou da justiça passam a ficar guardados num único local, em cloud compwízngína lnternet) e geridos por uma empresa privada. A segurança deste modelo é contestada por instâncias internacionais e já gera alarme entre autoridades nacionais. PAÍS PÁGS. 14 E l Estudo do Governo entrega segredos de Estado a privados Nuvem. Para cortar despesas, todas as bases de dados do Estado podem ir parar a uma 'cloud computing' de uma empresa privada VALENTINA MARCELINO nova, a Um estudo do Governo defende solução tecnologicamente que as bases de dados com informações classificadas, como as que estão em segredo de Estado, sejam centralizadas e guardadas por cloud computing (computação em nuvem), gerida por uma empresa privada. Estas estruturas são seriamente desaconselhadas pela Agência Europeia para a Segurança da Informação (EuropeanNetworkand Information Security Agency ENISA) para guardar qualquer tipo de dados governamentais uma entidade privada. O docu- - mento designado "Estratégia para a Racionalização dos Centos de Dados da Administração Pública" chegou, há cerca de duas semados responnas, ao conhecimento - sáveis dos serviços de informações e da senacional, gurança que não tinham sequer sido ouvidos. O alarme disparou enDirigentes Gabinete quanto estes eram pressionados para Segurança tentarem o plano. SIRP estão O relatório, a que o DN teve acesso, foi desenvolvido no âmbito do Grupo de Projeto para as Tecnologias de e Comunicação Informação (GPTIC), nomeado pelo primeiro-ministro e que está na tutela do ministro dos Assuntos Parlamentares, Miguel Relvas. O rosto mais conhecido deste grupo, coordenado pela assessora de Pedro Passos Coelho, Marta Sousa, é um dos gurus nacionais das tecnologias de informação, o catedrático JoséTri- bolet (ver perfis, em baixo). O estudo apresenta três potenciais cenários para reduzir as despesas com os centros de dados da Administração Pública (AP) e conclui que o mais "vantajoso" é uma sensíveis (ver riscos, ao lado). Contactado pelo DN, o gabinete de Relvas confirma que, "no âmbito do plano global estratégico de racio- do de e do decorrer um inas bases de daassegura um des- e está a dos existentes", ses responsáveis. De facto, no relatório é dito que do Conselho de Ministros (PCM) está a fazer esse levantamento em toda a AP e que, "numa primeira fase, já se encontra realizado ao nível da PCM e dos ministérios da Administração Interna (MAI), da Educação e da a Presidência Saúde". nalização e redução Na PCM estão as bases de dados do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP) e do Gabinete Nacional de Segurança, de custos nas Tecnologias de Informação por onde passam, por exemplo, todos os documentos classifica- Comunicação (TIC) , está prevista a dos racionalização centros de dados e o cloud computingna AP". Porém, acrescenta que o estudo em causa é ainda uma "versão de trabalho" e que "posteriormente o modelo terá de ser ainda aprovado em Con- alerta ordenado ventário de todas e selho de Ministros". No entanto, fontes ao mais alto nível ouvidas pelo DN não têm essa perceção. "O documento foi apresentado como definitivo e o modelo está decidido, bem como a escolha do local. Apenas o facto de ter começado a haver pressão por causa dos documentos classificados está a fazer que tentem dissimular os objetivos. Mas a opção está tomada. Tanto quejáfoi dos da NATO e da União Europeia, cujas regras de segurança das in- formações não admitem que outra entidade que não o Estado proteja aqueles documentos. No MAI estão as bases de dados das forças e serviços de segurança, grande parte classificada e sensível. Neste estudo nem sequer estão excluídas as bases de dados de outros sectores que lidam com matérias sensíveis relacionadas com a soberania nacional. No Ministério da Defesa Nacional estão docu- mentos classificados da NATO e nas Forças Armadas os centros de dados têm informação logística e operacional dos militares. No Ministério dos Negócios Estrangeiros estão guardados documentos classificados da UE. Na Justiça, onde a base de dados Citius alberga todos os inquéritos judiciais e processos Os oito riscos em segredo de justiça, correm também o risco de ser transferidos para a "nuvem" privada. de segurança da computação PROTAGONISTAS MARTA SOUSA > É a coordenadora em nuvem do Grupo de Projeto para as TecnoLogias de Informação e Comunicação perigos. A Agência Europeia para a Segurança das Informações desaconselha os Governos a guardar dados sensíveis nas nuvens (clouds). (GPTIC), na dependência do ministro adjunto e dos Assuntos Parlamentares, MigueL ReLvas. Com apenas 34 anos, Marta tem deixado os mais altos dirigentes relacionados com a segurança nacional à beira de um ataque de nervos com as suas exigências. Pertence ao gabinete do que conheceu durante a campanha eleitoral, quando era especialista de marketing e comunicação na agência que trabaLhou para o PSD. Antes de Passos Coelho a levar para o Governo, era assessora do grupo parlamentar social-deomocrata. primeiro-ministro, JOSÉTRIBOLET Este catedrático > do O Bloqueio. Dependência do fornecedor da é um dos problemas principais em matéria de documentos classificados. Dificilmente o Estado vai conseguir mudar de fornecedor e vai ficar sujeito aos preços que ele ditar. Á. cloud. Este O Partilha. Como alguns sistemas são partilhavários clientes ou várias aplicações, os mecanismos de separação dos componentes da infraestrutura dos diversos clientes podem falhar e ficar-se sujeito a ataques. No entanto, mesmo assim, estes ataques são mais difíceis de efetuar do que os ataques tradicionais. Odos por Preside a ConseLho de Diretores e à Comissão Executiva do Instituto de Engenharia de Sistemas de Computadores (INESC), uma das mais prestigiadas entidades de investigação científica e consultoria tecnológica. TriboLet, o mais ativo membro e conhecido rosto do ConseLho Consultivo do adoção do cLoud computing. serviço muitas vezes são omissos no que respeita a segurança e não responsabilizam a empresa que fornece a "nuvem" Deixa de existir mobilidade. Instituto Superior Técnico é considerado um guru nas tecnoLogias de informação. GPTIC, foi autor do prefácio da estratégia nacional, para a racionalização das tecnologias de informação comunicação desta comissão, relatório que prevê a "I Perda de governabilidade. Implica cedência _L de controlo da segurança para os fornecedores de serviço de cloud. Os acordos de nível de e / Certificação. Existem riscos de falta conforEste é um dos e de certificação. grandes problemas. Não existem produtos certificados para usar na cloud, sendo difícil aos a conformidade com os cloudprovidersmostiav standards ou mesmo mostrá-los aos clientes, especialmente quando se usa uma cloudpública. Outro problema é a falta de entidade certificadora para a cloud. Estas tecnologias são muito recentes. H~midade [T Interface de acesso. Quando o acesso se faz <J através de um browserna Internet, muitos dos riscos são os inerentes aos da própria inter- net. O Proteção de dados. O cliente não tem capaLJ cidade de saber se os seus dados estão protegidos a todo o momento ou se o seu cloud provider está a manuseá-los corretamente, a infringir a lei, ou mesmo se eles não circulam através de federações de clouds, algures em qualquer parte do mundo. Na prática, existe falta de controlos dos cliente relativamente ao cloud provider. ~7 Destruição de dados insegura. Este risco ve- I rifica-se em todo o lado, mesmo no disco rígido do computador que temos em casa. Quando apagamos dados do disco, estes não são apagados na totalidade. Normalmente ficam lá guardados. O que é apagado são os endereços onde estão localizados, o que significa que os dados na cloud, no local onde ficarem armazenados, mesmo após apagados, continuam lá e podem ser utilizados. A agravar este risco está o facto de a infraestrutura poder ser partilhada por desconhecidos. Q Administrador 'malicioso'. Um elemento O pertencente ao cloud provider com acesso privilegiado é um dos maiores riscos á segurança. Num sistema de concentração de dados, como Aqui o risco é maior porque a concentração de dados num único local é elevadíssima. PT, Google Apple e Microsoft têm 'cloud' executivo da PortuZeinal Bava, anunTelecom, gal ciou há uma semana a disponibilização de uma "oferta cloud" gratuita de 16 gigabytes a todos os portugueses. A operadora é atualmente a que oferece mais espaço gratuito a nível mundial, mesmo entre empresas como a Google, a Microsoft e a Apple. Computação em nuvem consiste no armazenamento de dados na Net, independentemente do local e equipamento a partir do qual é feito o acesso. Funciona como um disco rígido virtual portátil. O desenvolvimento deste tipo de estrutura é a grande aposta comercial da PT, a partir do mega centro de processamento de dados que está a construir na Covilhã. Numa entrevista à CNBC, Zeinal Bava, sublinhou que o investimento na "virtualização" dos dados e uma forma de ajustar os custos das empresas. Bava salientou que a transferências de muitos aspetos da vida de uma companhia para a "nuvem informatizada" conduz a poupanças entre os 30% e os 40% dos custos. o presidente 2 PERGUNTAS A... PAULO QUERIDO Consultor em tecnologias Um estudo do Governo defende a centralização das bases de dados do Estado numa cloud privada. É seguro este sistema? A computação em nuvem é provavelmente mais segura que os sistemas redundantes, mas depende da profundidade destes. No entanto, subscrevo as reservas da Agência Europeia em relação às bases de dados do Estado serem transferidas para clouds. Que opinião tem sobre esta possibilidade? Discordo frontalmente da transferência de informação do Estado para sistemas privados, independentemente da arquitetura. Professo a existência de um sistema tipo cloudpara o Estado. Não me chocará se esse sistema for elaborado por contrato com empresas privadas, mas penso que a infraestrutura deve ficar sempre e só debaixo da alçada do Estado. Mesmo que a grande maioria da informação a guardar seja pública. Aliás, essa é uma razão de peso para que a sua guarda não seja entregue a privados.