A COMPREENSÃO DO GÊNERO CHARGE NUMA ABORDAGEM COGNITIVA: PROCESSOS DE MESCLAGEM Arethusa Andréa Fernandes de Oliveira Barros1 (UFRN) [email protected] Resumo Este artigo tem como objetivo principal a análise dos processos de construção de sentidos no gênero textual charge a partir da Teoria da Mesclagem Conceptual. A nossa discussão, ancorada na Linguística Cognitiva, adota uma proposta de linguagem baseada na idéia de mente ‘corporificada’, pressupondo-se, portanto, a inseparabilidade entre os processos cognitivos e as atividades sensório-motoras, entre a emoção e a razão. Nesse sentido, a compreensão do texto não pode ser vista como resultante exclusivamente do código linguístico, de seus aspectos formais, mas também vinculada às nossas práticas sociais, sendo, portanto, uma atividade cognitiva que emerge de nossas experiências corpóreas em interação com o mundo. Com o intuito de oferecer subsídios que possam auxiliar na prática educativa do professor que está na sala de aula, escolhemos o gênero textual charge por ser um gênero que se adapta a qualquer público, a qualquer idade. Nossa pesquisa, ainda em andamento, coleta dados (charges) de Jornais (online) e terá como referência teórica autores representativos da Linguística Cognitiva, tais como Gilles Fauconnier, Mark Turner, George Lakoff, Mark Johnson, dentre outros. PALAVRAS-CHAVE: Compreensão, Mesclagem, Charge. 1 Arethusa Andréa Fernandes de Oliveira Barros – Graduada em Letras Língua Portuguesa e Literatura pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte – Especialista em Língua Portuguesa: leitura, produção de textos e gramática pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte- Aluna do curso da Especialização em Linguística e Língua Portuguesa (CELE) - Mestranda do curso de Pós-Graduação em Estudos da linguagem (PPGEL)/UFRN. Abstract This article has as main objective the analysis of processes of meaning construction in the cartoon genre from the Theory of Conceptual Blending. Our discussion, anchored in Cognitive Linguistics, adopts a proposal for a language based on the idea of mind 'embodied', assuming, therefore, the inseparability between cognitive and sensory-motor activity, between emotion and reason. In this sense, the understanding of the text can not be seen solely as a result of the linguistic code in its formal aspects, but also linked to our social practices and therefore, a cognitive activity that emerges from our bodily experiences in interaction with the world. In order to provide subsidies that would assist in educational practice is the teacher in the classroom, we chose the cartoon genre to be a genre that fits any audience at any age. Our research, still in progress, collecting data (cartoons) Newspaper(online) and will have the theoretical framework of Cognitive Linguistics representative authors such as Gilles Fauconnier, Mark Turner, George Lakoff, Mark Johnson, among others. Key-words: Comprehension, Blending, Cartoons. . 2 1 INTRODUÇÃO Afinal, por que sentimos tantas dificuldades em compreender certos tipos de textos? Por que tornamos a atividade de compreensão textual algo que está vinculado apenas à forma, ao código linguístico, e a desvinculamos de nossas práticas discursivas, de nossas experiências sensório-motoras? Talvez porque ainda estejamos arraigados a uma concepção formalista, em que o texto é associado a um amontoado de frases desconexas, prontas e acabados para serem decodificadas pelo leitor. Ao adotarmos essa visão, estamos desconsiderando todo o processamento cognitivo, todos os sentidos que subjazem à estrutura superficial do texto. A atividade de compreensão textual pode ser algo bastante prazeroso do ponto de vista cognitivo. Se entendemos o texto como uma atividade cognitiva cuja compreensão emerge de nossas relações intersubjetivas, de nossas experiências corpóreas em interação com o mundo, passaremos a conceber uma visão “corporificada”2 dos processos cognitivos que subjazem a atividade de produção de sentido. Nesses termos, entendemos que a compreensão de um texto está relacionada a conhecimentos prévios adquiridos em um contexto situacional. Conseguimos acionar frames e esquemas em um texto graças a nossa capacidade de categorizar as coisas e experiênciá-las no mundo. Assim, todas as atividades que realizamos estão relacionadas à maneira como categorizamos o mundo. De acordo com Lakoff &Johnson (1999, p. 18), os processos de categorização evidenciam o caráter corporificado de nossas mentes. Acompanhando o que afirmam DUQUE e COSTA (no prelo), entendemos que categorizar, enquanto atividade mental é a ação que nos permite oferecer uma ordem à imensa variedade de entidades que constituem o ambiente externo, dando-lhes significações particulares, com o propósito de resolvermos certas disponibilidades e atingirmos objetivos considerados importantes. Categorizamos porque temos cérebros e corpos, e porque estamos sempre interagindo com o mundo. O fato de estamos sempre tentando criar categorias pode estar relacionado à nossa tentativa de dar sentido às coisas. Segundo Duque & Costa (no prelo) O ato de categorizar atesta os links entre nossas ações e nossos processos cognitivos. Corpo, cognição e interação fornecem a base do nosso sentido do que seja a realidade. Se não há interação entre os organismos e entre os organismos e o ambiente à sua volta, não há o que categorizar. A investigação do modo como pensamos e produzimos conhecimento, a compreensão de como categorizamos é, 2 Mente Corporificada, isto é, estruturada através de nossas experiências corporais, e não uma entidade de natureza puramente metafísica e independente do corpo. Da mesma forma, a razão não seria algo que pudesse transcender o nosso corpo: ela é também "corporificada", pois se origina tanto da natureza de nosso cérebro, como das peculiaridades de nossos corpos e de suas experiências no mundo em que vivemos. 3 nas palavras de Lakoff (1987, p.15), “um ponto central para a compreensão daquilo que nos faz humano”. De acordo com Lakoff (1987), muitas vezes não nos damos conta de que categorizamos de forma inconscientemente e automaticamente. Nós automaticamente passamos a categorizar pessoas, animais e objetos físicos naturais e artificiais. E isso às vezes nos leva à impressão de que nós apenas categorizamos as coisas como elas são, que as coisas vêm de tipos naturais, e que nossas categorias de mente naturalmente se encaixam nos tipos de coisas que existem no mundo. Mas uma grande proporção das nossas categorias não são categorias de coisas, são categorias de entidades abstratas como eventos, ações, emoções, relações espaciais e relações sociais. Sem a capacidade para categorizarmos, não poderíamos conviver em um mundo fisico, ter uma vida social e intelectual. Isso comprova o fato de entendermos o processo de categorização como algo fundamental para nossa vida. Faz-nos entender também como pensamos, como funcionamos e, principalmente, torna-se central para compreendemos o que de fato, nos torna humanos. A atividade de categorização também está relacionada à evocação de domínios cognitivos culturais. Esses domínios cognitivos nos permitem fazer uma série de inferências que vão além do processamento discursivo do texto. Somos capazes de categorizar as coisas, significá-las, a partir de nossa interação com o mundo. Evocamos os domínios cognitivos motivados pelas nossas experiências em uma determinada cultura, e esses mesmos domínios passam a influenciar em nossa maneira de pensar, construir sentidos e categorizar o mundo. De acordo com Duque e Costa (no prelo), Esses domínios – que funcionam como padrões recorrentes, estrategicamente regulando as atividades de ordenação das experiências – organizam-se como estruturas significativas principalmente a partir de nossos movimentos corporais no espaço, nossas manipulações de objetos e nossas interações psicológicas, físicas e sociais. São esses domínios que configuram expectativas acerca dos objetos, dos eventos, das ações, enfim, de nosso entorno em geral, guiando-nos no processo de compreensão e construção do conhecimento. Nossa pesquisa, ancorada na Linguística Cognitiva, busca propor subsídios que facilitem a compreensão do gênero textual charge. Com base na Teoria da Mesclagem Conceptual (FAUCONNIER e TURNER, 2002), tentaremos compreender como ocorrem os processos de construção de sentidos no gênero textual charge. 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 Refletindo sobre os estudos linguísticos voltados para a articulação entre linguagem e cognição. Ao longo do século XVII, René Descartes, um dos grandes pensadores da Filosofia Moderna, introduz o pensamento cartesiano Cogito ergo sum. Para ele, a evidência da própria existência – o "penso, logo existo" – traz uma certeza: a razão seria a única coisa verdadeira da qual se deve partir para alcançar o conhecimento. De acordo com o filósofo, o ser é uma coisa que pensa, e só a partir do seu pensamento ele pode ter 4 certeza ou intuição imediata. Esse tipo de ceticismo influencia até hoje o pensamento ocidental. O postulado cartesiano propõe a separação entre mente e corpo. Em outras palavras, o nosso corpo e o meio em que vivemos dizem respeito ao que Descartes chama de res extensa, separados da matéria pensante, ou res cogitans, e, portanto, não haveria qualquer influência de fatores externos à atividade da mente. Conforme Koch e Cunha Lima (2005, p.259), A mente foi pensada, a partir dessa época, como um lugar especial, separado do corpo, e que está dentro dele. Temos uma fronteira bem nítida: os processos internos mentais, individuais e particulares, aos quais, como seres racionais, temos acesso direto, pela introspecção, e os processos externos, extra-individuais, sociais, interacionais, que tem uma natureza diferente e independente dos primeiros. Influenciadas pelas idéias cartesianas, surgem em meados do século XX as ciências cognitivas clássicas, defendendo o princípio da modularidade da mente. Segundo esse principio, nossa mente é formada por vários sistemas cognitivos, ou módulos, que funcionam de forma autônoma, sendo cada um desses módulos responsável pela compreensão e desenvolvimento de uma forma específica de conhecimento. Nessa concepção, a linguagem caracteriza um modulo especifico, autônomo, sendo independente de toda atividade sensório-motora e da experiência sociocultural vivenciada pelos sujeitos. Assim, permanecemos na mesma dicotomia cartesiana entre mente e corpo. Entendemos, portanto, que a linguagem não pode ser vista como uma entidade armazenada em um compartimento isolado no cérebro. De acordo com Damásio (1996), O nosso próprio organismo, e não uma realidade externa e absoluta é utilizada como referencia de base para as interpretações que fazemos do mundo que nos rodeia e para a construção do permanente sentido de subjetividade é parte essencial de nossas experiências. Nessa perspectiva, os nossos mais refinados pensamentos e as nossas melhores ações, as nossas maiores alegrias e as nossas profundas mágoas usam o corpo como um instrumento de aferição. Assim, partindo do pressuposto de que o cérebro humano e o resto do corpo constituem um organismo indissociável, assumimos nossa visão cognitivista Johnsonlakoffiana que afirma o fato de nossa mente ser corporificada, como vimos anteriormente. Em resumo, esses são alguns dos princípios que defendemos: • A mente é corporificada (embodied mind), e não autônoma (disembodied); • A mente não é dividida em módulos, mas trabalha com conexões neurais que seriam motivadas pelas interações socioculturais com o meio; • A razão não é separada do corpo. Esse princípio refere-se à formação de conceitos no/pelo corpo nas trocas entre os seres humanos e o ambiente, coevolutivamente, sendo caracterizado pelo uso da percepção, da imaginação e do 5 sistema sensório-motor na vida diária. Esse nível de compreensão possibilita a maximização do contato com a realidade e permite o desenvolvimento da capacidade de projeção imagética, reconhecida como uma faculdade cognitiva vital. É partindo desses pressupostos, adotados pela Linguística Cognitiva, que reformulamos nossos conceitos acerca da linguagem, não mais como entidade autônoma, mas compreendida a partir da relação da experiência com o mundo, considerando os princípios de categorização que auxiliam na construção de sentidos; os mecanismos de processamento, e a nossa experiência social, cultural e individual, enquanto comprendedores. Partimos da visão de que não há significados prontos, mas mecanismos de reconstrução de sentidos a partir de dados contextuais que são evocados a partir das inferências pragmáticas. 2.2 Compreendendo os processos de construção de sentidos nas charges a partir da Teoria de Integração Conceptual ou Mesclagem. Temos consciência de que todas as atividades que realizamos requerem um esforço imaginativo. Desde um trabalho manual, como a de criar uma peça de artesanato para ser exposta numa feira, em que se exige uma certa habilidade para empreendê-la, como o ato de realizar atividades mais complexas, como por exemplo, escrever um texto para ser publicado em um livro.Seja qual for a atividade, sabemos do esforço mental que empreendemos para realizá-la. No universo textual não é diferente. Sabemos das dificuldades enfrentadas pelos alunos em interpretar textos argumentativos como as charges. Por isso, partimos de uma visão não mais centrada no texto, já que acreditamos que o sentido não está na forma, mas no nosso poder imaginativo de construir significados. Segundo Fauconnier e Turner, apud Betânia Medrado, 2008 p.63, ‘’a linguagem não produz sentido automaticamente; ela age como um guia para a produção de sentido que se faz social e contextualmente’’. Baseados em Women, fire and dangerous things (LAKOFF, 1987), Fauconnier e Turner desenvolveram a Teoria da Mesclagem. A mesclagem3 conceptual é uma teoria geral da cognição que descreve a capacidade humana de imaginar identidades entre conceitos e integrá-los para criar e formar novos modelos de pensamento e ação. Fauconnier & Turner (1994, 1997) afirmam que, embora a mesclagem se relacione a outros processos cognitivos (tais como a metáfora, metonímia, recursividade, modelagem cognitiva, categorização e frame), deve-se enfatizar que se trata de um processo muito mais dinâmico. A combinação de domínios pode acontecer de diferentes maneiras. Desse modo, de acordo com a teoria, a mesclagem é um processo cognitivo que opera sobre dois espaços mentais para obter um terceiro espaço. A integração é realizada por meio de uma rede (a rede de integração conceptual) e dispõe de, pelo menos, quatro espaços fundamentais: o espaço genérico, dois espaços 3 De acordo com Miranda (2000), o termo “mesclagem” foi proposto pela professora Margarida Salomão como tradução para blending (usado originalmente por Fauconnier e Turner). 6 de input e o espaço-mescla. O espaço-genérico consiste nos traços comuns aos dois espaços de input em qualquer momento da integração. Nele há o compartilhamento de elementos que podemos atribuir tanto ao espaço (input 1) quanto ao espaço (input 2). Esses elementos advêm de modelos cognitivos idealizados que foram incorporados à nossa memória através das nossas experiências corpóreas e socioculturais. No entanto, a projeção dos elementos é seletiva, de modo que nem todos os elementos que pertencem ao espaço são projetados no espaço-mescla. O espaço-mescla é temporário e é criado a partir das projeções de determinados elementos. A constituição dessa estrutura se dá, segundo Fauconnier e Turner (2002), a partir de três elementos: a) Composição: a composição dos elementos dos inputs constrói relações que não existiam, anteriormente, nos inputs de entrada; b) Complementação: acrescenta um conjunto ou estrutura adicional de conhecimento prévio, modelos cognitivos e culturais, que não estava nos inputs,sendo a mesma integrada no espaço-mescla; c) Elaboração: fase na qual a mescla é posta em funcionamento de forma criativa. Os autores formalizam o processo de mesclagem através de diagramas nos quais os espaços mentais (inputs) são representados por círculos. 7 3 CARACTERIZANDO A CHARGE Diário de Natal/Junho 2011 O termo charge é um galicismo, isto é, um empréstimo linguístico da língua francesa. Vem de charger, carregar, exagerar e até mesmo atacar violentamente (uma carga de cavalaria). O seu significado (carga) representa um ataque onde a realidade é reapresentada com o auxílio de imagens e palavras. Este tipo de texto tem caráter temporal, pois trata do fato do dia. O sentido é construído na oscilação entre o dito e o não-dito. Numa perspectiva bakhtiniana cada gênero possui composição, conteúdo e estilo. Do ponto de vista composicional, as charges apresentam enunciados curtos e são estruturados em torno de um ponto de vista e da argumentação em sua defesa. Há um imbricamento entre o verbal e não-verbal distribuídos na cor, no padrão gráfico e nas ilustrações. O conteúdo temático esperado é a crítica de forma bem humorada à política atual. Em se tratando de estilo, na charge, devido a uma escassez de espaço, a produção escrita é breve e a linguagem é metafórica e marcada pela informalidade, segundo Koch (2007, p.106). A charge encontra-se na página de opinião, de editoriais, ou mesmo na primeira página dos jornais porque transmite informações que envolvem fatos, mas é, ao mesmo tempo, um texto crítico e humorístico. É a representação gráfica de um assunto conhecido dos leitores segundo a visão crítica do desenhista ou do jornal. Quanto à forma, as charges representam figuras com possibilidades existentes no mundo real. Assim, na maioria delas, são utilizadas caricaturas e símbolos e não desenhos lúdicos, fantasiosos. Em sua construção, é necessário ter detalhes que forneçam dados suficientes para a compreensão do leitor, tais como a caracterização do ambiente e as marcas simbolizando o tema tratado. 8 4 ANALISANDO A MESCLAGEM NAS CHARGES A compreensão da charge acima envolve dois espaços: o primeiro espaço aciona elementos relativos às festas juninas (bandeiras, fogos, quadrilha, músicas, fogueira), já no segundo, trata-se do Palácio da Alvorada, lugar onde existem homens bem vestidos, porém portando máscaras, o que nos permite inferir tratar-se de ladrões. Outros elementos são evocados na composição desses espaços (presidente, ministros, deputados, políticos, Palácio da Alvorada, quadrilha). No espaço genérico, podemos atribuir o que há de comum entre os dois espaços: uma quadrilha, que se relaciona às comemorações das festas juninas ou uma quadrilha como coletivo de ladrões, representada, aqui, pelos políticos. No espaço mescla, temos a junção dos dois espaços: input 1 (espaço das festas juninas) e input 2(espaço da política). No mapeamento, temos: 9 Espaço emergente Quadrilha Fogos Política os Palácio da Alvorada FogosFestas juninas Bandeiras Ministros Fogueira Quadrilha Quadrilha Presidente Fogos Input 1 Quadrilha de ladrões políticos Quadrilha Input 2 Espaço-mescla Q Figura 1: Rede de Integração Conceptual: quadrilha Vejamos um outro exemplo: A compreensão dessa segunda charge envolve dois espaços: o primeiro espaço (Input 1) aciona elementos relacionados ao fenômeno Ronaldo (bola, futebol, jogador, Corinthians, Brasil, saída). No segundo espaço (Input 2) acionamos a figura do ex10 ministro da Casa Civil, Antônio Palocci, também vestido com a camisa do Brasil, porém com uma camisa de número 20. Então, podemos acionar elementos (ministro, casa civil, economista, empresário, político, despedida). No espaço genérico, temos elementos em comum entre os dois espaços como, por exemplo, o fato dos dois estarem se despedindo do Brasil, no mesmo dia, embora com saudações diferentes. No espaçomescla, temos a junção dos inputs: o espaço 1 (futebol) e o espaço 2 ( política). Ronaldo (camisa 9) deixa de ser jogador do Brasil e Palocci (camisa 20), representada pelo número de aumento de seu patrimônio, se despede do Brasil, apenas por enquanto (até 2005). No mapeamento, temos: Espaço genérico Despedida de dois brasileiros (Ronaldo, Palocci) Jogador Ministro Bola Casa civil Futebol Economista Corinthians Empresário Brasil Político Saída Despedida Input 1 Ronaldo deixa o futebol e Palocci apenas se despede Input 2 Espaço-mescla Figura 2: Rede de Integração Conceptual: Ronaldo 11 5 PROPOSTA DIDÁTICA 5.1 Inserindo o gênero textual charge na sala de aula Na situação escolar, o gênero deixa de ser apenas uma ferramenta de comunicação e passa a ser objeto de ensino-aprendizagem entre o professor e o aluno. A escola, portanto, funciona como o lugar autêntico da comunicação, onde acontecem as situações de produção de textos: narração, dissertação e descrição. É por esta razão que os gêneros não podem ser estudados totalmente isolados dos parâmetros da situação de comunicação. Daí a preocupação que o professor deve ter de diversificar a escrita, de criar situações autênticas de comunicação, de levar o aluno ao domínio do gênero exatamente da forma como funciona nas praticas de linguagem, afirma SCHNEUWLY&DOLZ (apud Koch, 2006, p. 56-57). Os gêneros são “tipos relativamente estáveis de enunciados”, marcados sócio-historicamente, visto que estão diretamente relacionados às diferentes situações sociais. E cada uma dessas situações determina um gênero com características temáticas, composicionais e estilísticas próprias. Sendo as esferas de utilização da língua extremamente heterogêneas, também os gêneros apresentam grande heterogeneidade, incluindo desde o diálogo cotidiano até a tese cientifica. Os gêneros estão sujeitos às mudanças, decorrentes não só das transformações sociais, como oriundas de novos procedimentos de organização acabamento da arquitetura verbal, como também de modificações do lugar atribuído ao ouvinte. Resta a nós, educadores, desenvolvermos atividades fora de contexto escolar, isto é, tornar mais coerente e produtiva a nossa prática educativa, valer-se de textos que são de conhecimento e interesse do aluno, afastar-se do modo pedagógico tradicional de somente usar textos do livro didático, e corroborar, de acordo com Schneuwly e Dolz (2004), com a proposta de modelos didáticos mais concretos. É importante ressaltar que a escola deve considerar que é necessário deixar de trabalhar com os textos apenas como pretextos para ensinar a gramática e ortografia. Sabendo que a sala de aula é onde se estabelece a interação entre sujeitos, isto é, espaço de pesquisa-ação-produção, a qual possibilita aumentar a qualidade de suas produções escolares, isto sob um enfoque em teorias linguísticas e discursivas. Por outro lado, os Parâmetros Curriculares Nacionais de Língua Portuguesa do Ensino Fundamental (1998, p. 70) revelam que o uso de gêneros textuais tem um papel decisivo na formação de leitores. Para tanto, o professor deve assumir a tarefa de formar aluno-leitor, aluno-produtor fazendo com que a escola tenha responsabilidade na elaboração de projetos educativos que busquem a intermediação da passagem do leitor de tipologias textuais para o leitor de diversos gêneros discursivos, do mesmo modo que são vinculados em diferentes campos de comunicação verbal. Se nós como educadores propusermos a adoção dos Parâmetros Curriculares Nacionais, criaremos possibilidades para que nossos alunos produzam textos coerentes, coesos e que façam sentidos, estaremos contribuindo para o crescimento de cidadãos conscientes, competentes em termos de produção, leitura e compreensão de textos. 12 Numa abordagem corporalizada, o aluno-leitor, ao interagir no discurso do outro, não assimila mais passivamente as informações provenientes do mundo externo independente de suas operações cognitivas – decodificando apenas a opinião do chargista como única possibilidade de resposta – mas passa a refletir dentro de um contexto sócio-histórico e cultural, incorporando determinada personalidade, assumindo determinados valores, ideologias que circulam como conteúdo temático em um tempo e espaço específico. A partir deste contexto sócio-histórico, o leitor vive experiências cognitivas que resultará em processos mentais inéditos desencadeando dessa forma, em habilidades mentais diferentes, e porque não dizer também, em possibilidades de construção de sentidos, uma vez que a cada novo contato com o texto, num dado momento histórico, este leitor não estará percebendo um mundo sem constituir historicamente , experiências cognitivas, segundo Vitor Paredes (2003). Daí a possibilidade de não sermos mais os mesmos depois de nossas experiências cognitivas, depois de nos percebermos como fruto de uma sociedade que está em constante atuação intersubjetiva sobre o mundo; depois de nos constituirmos como produto de uma cultura que está em constante evolução; depois de nos percebermos como parte integrante na busca incessante pela questão do sentido. Isto nos prova que, para construir com o outro, necessitamos passar pelas transformações, viver as mudanças, perceber que o conhecimento está em constante instabilização, e nós somos resultado deste processo em construção, uma vez que ao interagirmos com o texto, somos logo afetados, e por isso, queremos evidenciar nosso discurso também, impregnado de crenças, de ideologias, de pensamentos, de experiências nossas com o mundo, assumindo assim, uma nova postura critica, manifestada em ações, atitudes que são resultantes de nossa condição de seres semióticos sócio-cognitivos 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Com este estudo, pretendeu-se abrir novas possibilidades de se trabalhar o padrão discursivo charge em sala de aula, numa perspectiva cognitivista. Nessa nova concepção de linguagem, levamos em consideração todo o processamento cognitivo, ou seja, todo o conhecimento prévio do compreendedor adquirido nas experiências corpóreas no entorno sócio cultural. Numa abordagem cognitivista “corporificada”, o compreendedor irá captar tanto o conteúdo inserido na charge quanto o significado proposto pelo contexto situacional. A imagem e o texto nos fornecerão ‘pistas’ que ao serem acionadas, nos permitirão construir sentidos. Isto nos prova que, não há como integrar espaços, sem identificar elementos que são cruciais para a compreensão do texto; não há como construir sentidos, sem antes fazer um esforço imaginativo para recuperar informações que não estão no texto, mas que são inferidas a partir de nossas experiências no mundo. Essas questões nos fazem incorporar novos conceitos sobre a linguagem e a cognição como processos que estão imbricados um no outro. Nesse sentido, assim como não podemos separar a razão da emoção, a mente do corpo, não há também como acionar sentidos no texto, sem levar em consideração todas as nossas experiências enquanto professores, alunos, linguistas, educadores. Daí a importância de refletirmos sobre a importância de trabalharmos com o gênero charge na sala de aula, pois a leitura da charge pode ser bastante prazerosa, no sentido de ampliar discussões, debates, propostas, sugestões que transcendam à abordagem textual. Por isso, nossa proposta 13 aqui, pretende contemplar diferentes públicos, já que o universo da intertextualidade da charge nos permite trabalhar qualquer temática. 6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental – 5ª a 8ª séries: língua portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1998. CUNHA-LIMA, M. L. e KOCH, I. G. V. Do cognitivismo ao sociocognitivismo. In: BENTES, A. C. e MUSSALIM, F. (orgs). Introdução à linguística: fundamentos epistemológicos. São Paulo: Cortez, 3.ed., 2007. DUQUE, P. H. e COSTA, M. A.. 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