H.3.1 - Literatura Forma metafórica em Terra do Pecado, de José Saramago. Rosemary Conceição dos Santos1 1. Pós-Doutoranda, Depto. de Letras Clássicas e Vernáculas, FFLCH/USP/São Paulo; *[email protected]. Palavras Chave: Forma; Função; Saramago. Introdução Termo de amplo uso na literatura, forma vincula-se a uma canônica história crítica. De estrutura inteligível e distinta da matéria (Pitágoras) a “eidos”, noção abstrata de matéria eterna (Platão), o conceito alcançou sentido escolástico (domínio sobre todo o conhecimento disponível), oposto ao admitido pela cultura geral (superficialidade). Desse período ao século XX, entretanto, perdurou sua associação de construto lingüístico a classificações de gênero, distinguindo padrões de composição textual (texto em verso é poesia; texto linear é prosa). Com o modernismo, este princípio foi renovado (inserção de prosa no texto poético), mas, ao tentar desacreditar a tradição escolástica de inseparabilidade de forma e conteúdo, tendo em vista a criação de uma ciência formal do texto literário, o que se criou foi uma utopia no contexto da Teoria Literária, ainda que a forma textual condicione, para muitos, o processo de leitura. O contexto formal de arte pela arte do século XIX (conteúdo negligenciado e concentração em formas fixas e suas regras de configuração) opondo-se às diferentes teorizações do século XX, ainda que este último, em seu início, tenha sido berço de teorias formais (Formalismo russo; New Criticism inglês e norte-americano; Estruturalismo francês). Em Terra do pecado (1997), seu primeiro romance, José Saramago exercita variações, as mais diversas, nas comparações entre elementos por meio de seus significados imagísticos, causando o efeito de atribuição "inesperada", ou improvável, de significados de um termo a outro, próprios da metáfora, antes de se aperfeiçoar na prática alegórica. Este trabalho busca analisar a presença, e relevância, da forma metafórica na configuração literária romanesca do referido autor. Busca, também, nesse intercurso, verificar a incorrência metafórica na construção alegórica. Resultados e Discussão Em Terra do pecado (1997), romance de estréia de José Saramago, o autor configura seu texto com pontuação normal, discurso direto separado do discurso indireto, narrador imediatamente distinto de personagens, indicações claras de quem fala a cada momento, estilo, este, diametralmente oposto ao que se conhece a partir de sua 13ª obra, Levantado do chão (1991), na qual, segundo o próprio autor, “Sem saber como, sem ter pensado nisso, começo a escrever como se estivesse a contar aquela história, e contando aquela história, conto-a sem pontuação, da mesma maneira como falamos, com sons e pausas. Como a música...” (Mendes, 1997, p.2). A forma literária em Terra do pecado é, por excelência, metafórica, de metáforas independentes umas da outras, motivadas pelo contexto imediato em que elas se inserem, sem padrão de organização que as unifique. Entretanto, na obra, ainda que em seu interior, na qualidade de partes constituintes da mesma estrutura narrativa, cada uma encarregue-se de efetuar a descrição de dado estado narrativo, atuando, de acordo com a estabelecida por Ullmann (1964, p. 213), ora como metáforas objetivas, em que as relações de semelhança se dão por fatores perceptíveis por qualquer observador, independentemente de julgamento, interesse, gosto, desejo, visão de mundo, sentimentos e opiniões, ora como metáforas subjetivas, submetidas à percepção emotiva de quem as enuncia, tais metáforas não estabelecem pontos em comum com sistemas alegóricos. Forma literária final de Saramago, e, segundo Lopes (1987, p.49), construída pelo procedimento da metaforização continuada, ou seja, de uma metáfora expandida que surge, quase sempre, na forma de metáforas que se ligam umas às outras, sintática e semanticamente, a alegoria em Saramago sustenta o pressuposto de ter sua origem vinculada à maneira inicial de o autor sentir, perceber e agir de acordo com elas. Figura 1. Capa da obra Terra do pecado, de José Saramago. Figura 2. Comentário do autor acerca de sua obra Terra do pecado. Conclusões Sendo o plano de expressão da alegoria constituído por um discurso (C) que não os metafóricos (A e B), a alegoria assume-se um discurso triplanar, o qual, em seu sentido final, é condicionado e influenciado tanto pelos contextos sintagmáticos apresentados no texto no qual ela se insere, quanto nos contextos paradigmáticos culturalmente pressupostos. Em Terra do pecado (1997), o exercício saramaguiano de configuração literária possibilita a identificação de estruturas metafóricas hierárquicas no texto, bem como, de relações funcionais que essas estabelecem entre si, o que, em conjunto, revela-se prérequisito para a articulação semântica do terceiro plano de significados (C). ____________________ BOLLE, Willi. “Gêneros literários urbanos: Berlim, Paris, São Paulo”. TB, Rio de Janeiro, 132: 75-97, jan.-mar., 1998. HEGEL,Georg Wilhelm Friedrich. Cursos de Estética, Volume II. SP: Edusp, 2000. LOPES, Edward. Metáfora. São Paulo: Atual, 1987. MENDES, A.(1997). José Saramago: a arte de escrever. Diário de Natal. 23 nov.1997. Lazer e Cultura, p.2. SARAMAGO, José. Terra do pecado. Lisboa: Editorial Caminho, 1997. ULLMANN, Stephen. Semantics: an introduction to the science of meaning. Oxford: Basil Blackwell 1964. WHITMAN, Jon. Allegory: the dynamics of an Ancient and Medieval Technique. Cambridge: Harvard University Press, 1987. 67ª Reunião Anual da SBPC