A força da lei e o assistencialismo entre os ferroviários
Moacyr Manfrim Junior (Centro Universitário de São Carlos/SP, Centro Universitário Nossa Senhora
do Patrocínio/Itu-SP, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ouro Fino, Brasil)
“A disciplina tem sido implantada sem maiores dificuldades e os nossos operários em
ocasiões bem difíceis tem se mostrado dedicados e cumpridores de ordens.”1
“Os operários da Viação Férrea têm quem os guie e não precisam portanto de
protetores improvisados, que visando interesses puramente políticos, não pugnam,
como querem fazer crer, pelo interesse da classe.
(...) Os ferroviários sabem que a Caixa de Aposentadorias [sic] e Pensões, foi criada
em conseqüência de um lei federal (...)”2
Alfredo J. Ruprecht ressalta em seus estudos sobre a natureza da previdência social que a
seguridade social torna-se mais importante em períodos históricos instáveis. A conclusão a que Ruprecht chega
situa bem a abrangência da seguinte constatação no mundo contemporâneo: “o disparo no dia 29 de junho de
1914, em Saravejo, desfez em mil pedaços, em apenas um segundo, o mundo da segurança da razão criadora.”3
Gramsci, baseado na derrota sofrida pela classe trabalhadora - com a ascensão do fascismo na
Itália nos anos 20 - deduziu que o poder político não é seguramente o poder em si. Quis asseverar, em outras
palavras, que a cultura define a dominação de uma classe sobre outras. A originalidade de Gramsci,
fundamentou-se em parte no seu conceito da natureza do domínio burguês (e, de fato, qualquer ordem
estabelecida anteriormente); em seu argumento de que a força verdadeira do sistema não residia na violência da
classe dominante ou no poder coercitivo do seu aparelho de Estado, mas na aceitação por parte dos dominados
de uma concepção de mundo que pertence aos seus dominadores (Fiori, 1970: 238).
O quadro em que se passam os fatos analisados aqui remontam à Grande Crise
econômica, ou seja, período que denominaremos de Entre-Guerras. Trata-se do resultado de uma
enorme emergência de movimentos sociais, e que atingiu inclusive países com tradição liberal forte –
na qual a situação, por vezes parecia ser muito dramática. Este é o caso dos Estados Unidos, e
outros países onde a previdência pública na forma de seguro social, inclusive auxílio-desemprego, ou
não existia, ou, pelos padrões jurídicos da época, tinha pouca expressão.
Buscando explicar o processo de manutenção da “ordem social” no Brasil dos anos 20,
encontramos um exemplo no estudo de relações constituídas em torno do processo de montagem
das Caixas de Aposentadoria e Pensões (CAPs). Podemos supor que este ato de reconhecimento de
certos direitos sociais representou um momento crucial do processo de incorporação da classe
operária ao jogo político nacional. Num contexto mais amplo, o reconhecimento dos direitos sociais
objetivava diminuir o impacto da Crise econômica, que ameaçava a queda de governantes e/ou
partidos governantes. “É difícil lembrar que mesmo nos anos de ‘boon’ da década de 1920 (1924-9) o
1
Relatório da VFRGS, dados do ano de 1920, Porto Alegre, 30/4/1921: 121.
Cf. “O assisismo e o Operariado”, A Federação. Porto Alegre, 27/6/1923: 1 (Petersen e Lucas, 1992:
258).
3
Cf. ZWEIG, Stefan. El Mundo de ayer. Autobiografia, Buenos Aires, 1911 (RUPRECHT, 1996:
151).
2
desemprego ficou em média entre 10% e 12% na Grã-Bretanha, Alemanha e Suécia, e nada menos
de 17% a 18% na Dinamarca e na Noruega” (Hobsbawm, 1997: 97).
Após analisar o contexto político da Primeira República (1889-1930) no Rio Grande do Sul,
Sílvia Petersen e Elisabeth Lucas afirmam que a orientação positivista fundamentava a manutenção da
privatização nas relações de produção e o protecionismo operário (Petersen e Lucas, 1992: 243).
Para Tarso Fernando Genro o positivismo restringiu-se ao ideário do Partido Republicano do Rio
Grande do Sul: “fato registrado por todos os historiadores” (Dacanal e Gonzaga, 1980: 96). Compartilharemos
aqui da idéia de que o positivismo não foi a única base da teoria política do poder republicano, apesar da notável
influência sobre o governo gaúcho – gerando alianças deste com algumas das “camadas médias ilustradas que
surgiam como defensoras da república e a alguns setores burgueses em fase de consolidação” (Dacanal e
Gonzaga, 1980: 98). Todavia, a presença dessa teoria não terminava aí. Importa lembrar o uso de termos como
“progresso da nação” que, por exemplo, eram repetidos nos discursos de Lindolfo Collor, primeiro Ministro do
Trabalho no Brasil. Ao entender o Rio Grande do Sul como referência de "civilização" a ser alcançada em
outras regiões do país, o Ministro concebia esse estado como a “parte mais civilizada do território nacional”
(referindo-se especialmente à situação organizativa alcançada pelos empregados da Viação Férrea do Rio
Grande do Sul [VFRGS] ).
Mas ele não parava por aí. Argumentando ainda sobre a importância da observância à lei
previdenciária - que se expandia no início dos anos 30 -, aquele representante da oligarquia gaúcha ressaltou “o
espírito de cooperação dos ferroviários”. O referido “espírito”, explicaria o Ministro, deveria “suprir as
necessidades em geral muito maiores do que é possível atender dentro do quadro momentâneo das Caixas de
Aposentadorias.”4 Neste caso, Collor orientava-se mais especificamente à análise do atendimento médicohospitalar – “exemplar” em suas palavras” – que há tempos vinha sendo oferecido aos empregados da VFRGS.
O atendimento médico-hospitalar desta CAP formada na ferrovia concentrava-se em diversas sedes instaladas
nas seguintes localidades: Porto Alegre, São Leopoldo, Taquara, Montenegro (com 3 postos de atendimento),
Garibaldi (com 2), Rio Pardo, Santa Maria (com 4), Cacequy, Alegrete, Uruguayana, Sant’ Anna, São Gabriel,
Bagé (com 4), Pelotas (com 4), Rio Grande (com 2), Cruz Alta (com 2), Ijuhy, Carasinho, Passo Fundo (com 2),
B. V. do Erechim (com 2). A quantidade de postos variava de acordo com a capacidade de atendimento de cada
um, assim como da dispersão geográfica na respectiva localidade e, enfim, de acordo com a quantidade de
ferroviários ali trabalhando. Nesse complexo era mantido um quadro variado de profissionais, ligados a diversas
áreas da medicina: 4 cirurgiões, 3 oculistas, 30 clínicos efetivos, 9 clínicos adjuntos, 2 clínicos auxiliares, 3
otorrinolaringologista. 5
Além de ferroviários, portuários e marítimos (estes últimos pelo Decreto 5109: 20/12/1926),
outras categorias ligadas à economia agro-exportadora foram abrangidas pela legislação das CAPs. O Artigo 1º
do Decreto 2046 (1/10/1931) definia quais seriam os segmentos operários abrangidos pela lei previdenciária:
“de água, de força e luz, de esgotos, de transportes terrestres e aéreos, de portos, de telégrafos - radiotelegrafia e
telefones.” Deveria ser formada uma CAP em cada um desses setores, isto é, desde que estivessem diretamente
explorados pela União, Estado ou Município (Eboli, 1937: 11).
4
5
Diário do Povo, Campinas, l9/2/l931.
Cf. Relatório da VFRGS, dados do ano de 1929, Porto Alegre, 30/4/1930.
Lindolfo Collor, como outros expoentes da intelectualidade gaúcha, exercia um papel de suma
importância na formulação de uma “política adequada” para as oligarquias em luta. Entre estes, na maior parte
formados por advogados, médicos e estancieiros, estavam os denominados “grandes líderes” do período: Júlio
de Castilhos, Gaspar Martins, Borges de Medeiros, Assis Brasil, Pinheiro Machado, Getúlio Vargas, Oswaldo
Aranha, Carlos Barbosa Gonçalves, Fernando Abott, Ramiro Barcelos e Flores da Cunha.
De fato, todos representantes das classes dominantes, entendiam as concessões de direitos como
uma válvula de escape em face das pressões populares. Considerando-se um conjunto amplo de especificidades
devidas, para algumas parcelas de trabalhadores tanto as CAPs como os sindicatos estavam fortemente
enraizados na sua formação cultural e ideológica.
Esse tema, crucial nesta nossa discussão, inspira duas formas de encaminhamento das questões
levantadas no estudo do campo da natureza da lei: 1) resgatar a densidade de algumas relações, situadas no
campo do assistencialismo operário; 2) entender como um aspecto histórico o papel desempenhado pela lei e
pelo direito no exercício de formas peculiares de dominação.
Sem nenhuma pretensão de esgotar as referências sobre a questão da relação entre a lei e os
direitos sociais, acredito que esta breve discussão contribuirá para a análise do desenvolvimento da legislação
previdenciária no Brasil dos anos 20, que aqui aparecerá encadeada a outras temáticas, igualmente recorrentes
no campo de reflexões sobre os modos de resistência social gerados ante o processo de formação de uma
determinada cultura política.
A EMPRESA E AS INICIATIVAS OPERÁRIAS
O primeiro nome dado ao complexo férreo instalado no território gaúcho foi Rede Ferroviária Sul
Rio-Grandense. Sua unificação resultou do Decreto 5.548, de 6 de junho de 1905, permitindo também a
encampação da ferrovia por parte do Governo Federal. Eram ligadas então as estradas de ferro de Rio Grande a
Bagé, Santa Catarina a Passo Fundo e Porto Alegre a Uruguaiana – desde o Decreto 2.884, de 25 de abril de
1898, que essa última estrada já era administrada pela Companhia Auxiliaire de Chemins de Fer au Brésil, que
passa a controlar todo esse complexo sete anos depois.
Conforme o Decreto 9101, de 8 de novembro de 1911, havia um forte interesse em adquirir
materiais e executar melhoramentos. Em conseqüência houve a unificação e a redução das tarifas e do prazo de
arrendamento. Naquele ano iniciou-se a administração norte-americana sob a orientação da Brazil Railway. À
medida em que a Companhia desrespeitou as cláusulas do contrato, deixando as estradas na iminência de
paralisação - o que foi agravado em face da situação criada com a Primeira Guerra Mundial - houve a passagem
da Rede para o Governo Federal e seu conseqüente arrendamento ao Governo do Estado do Rio Grande do Sul,
em 29 de julho de 1920.
“O Governo Federal diante a situação em que se encontravam as classes produtoras, e
pela falta de transportes e a situação altamente aflitiva da Companhia Auxiliaire, deu
recursos financeiros que permitissem enfrentar e resolver esse dificílimo problema,
em boa hora aceitou a sugestão do Governo do Estado, a quem coube a iniciativa de
encaminhar a solução, ansiosamente desejada por todos, de fazer-se a encampação e
transferência conseqüente dos contratos de arrendamento ao Governo do Rio Grande
do Sul” (Fortes, 1962:2).
Convém lembrar da ruidosa mobilização grevista que paralisou, em 1917, quase que totalmente as
vias férreas do Rio Grande do Sul, e que ainda vinha sendo encarada como uma ameaça aos interesse de
diversos setores econômicos no início da década seguinte. Cabe lembrar que o movimento citado foi marcado
por um sentimento nacionalista que marcou o discurso das lideranças da Rede gaúcha.
Talvez mediante desse aspecto, os empregados no complexo gaúcho não passaram pela mesma
dureza de tratamento reservado pela polícia de outros estados aos segmentos grevistas de 1917. No caso dos
ferroviários essa diferença fica nítida em diversos estudos, notadamente no confronto das obras de Cristina
Hebling Campos (1988) e Joan Bak (1995).
Alguns anos após o término daquela paralisação, um administrador da VFRGS,
Octacílio Pereira, classificou a existência de dois tipos de associações entre seus subordinados: as
que estavam bem conduzidas e as que ainda sofriam com a influência recebida em outras épocas.
Encaixada no segundo caso, a Caixa de Socorro era tida como uma “boa instituição, mas sempre
sem direção alguma, arrastando-se porque tem alguns recursos, mas sem ordem, sem programa e
6.
sem regulamento que se execute” Uma outra, a Associação dos Empregados da Via Férrea (criada
o
em 1 de maio de 1915), fora muito mais que uma simples organização assistencial no movimento de
1917 (Bak, 1995: 12).
O receio da repetição de efeitos como os vistos no movimento grevista de 1917 deu
consistência às advertências de Octacílio Pereira, como a manifestada na página 121 do Relatório da
VFRGS de 1920 - sobretudo no tocante à sua constatação de que o “perigo das más influências não
estava afastado”, tendo-se em vista “quão difíceis são as condições de vida atualmente e com os
pequenos vencimentos pagos a esse pessoal não há regime de economia doméstica que possa
equilibrar as despesas imprescindíveis.”
Desde o início do século que formas semelhantes de preocupação eram trazidas a
público pela ação de alguns intelectuais e representantes das classes dominantes no cenário
nacional. Ainda que com respostas distintas, concessões são feitas por algumas parcelas das
classes dominantes nesse contexto, especialmente as dos grandes centros urbanos no país, que
mais ressentiam-se da efervescência do movimento operário. Intelectuais como Alberto Torres e
seus seguidores eram ouvidos nos bastidores do Congresso Nacional.
Para estes, prevalecia um mundo caótico no Brasil republicano. Segundo o pensamento
de alguns, a situação ameaçava a própria integridade da nação. Oliveira Vianna, por exemplo, previa
um agravamento dos problemas enfrentados pelo país, especialmente pelo fato de terem surgido no
cenário político novas forças sociais que escapavam ao controle do mundo rural, como os industriais,
os operários, os imigrantes. Em Pequenos Estudos, publicados em 1921, esse pensador dizia ainda
acreditar numa volta ao mundo rural, ao “velho culto nacional da terra opima e nutridora”, ainda
depositava suas esperanças em orientar a juventude a amar a terra, o campo, o arado, “símbolos
toscos e obscuros desse patriotismo civil, que é quase tudo” (Moraes e Bastos, 1993: 30).
É difícil avaliar se - ou como - essas premissas estenderam-se à consciência operária, ou afirmar
que os projetos legais criados neutralizam aquilo que os trabalhadores urbanos guardavam: suas heranças e lutas
de resistência ao Estado e ao empresariado. As dificuldades encontradas para driblar a organização fragmentada
6
Relatório da VFRGS, dados do ano de 1920, Porto Alegre, 30/4/1921: 119.
do assistencialismo dos empregados da VFRGS parecia ser contraditória às diretrizes dadas ao Estado brasileiro
a partir dos anos 30 pelos próprios políticos gaúchos. Esse tema, longe de ser esgotado no presente artigo,
merece grande atenção por parte dos estudiosos que tratam do processo de intervenção estatal no país.
É nos anos 20, portanto, que através da definição de um sistema que os mecanismos de cooptação
operária vão direcionar para a centralização da previdência social. Me parece que a pouca expressão ou a
inexistência de um montepio na VFRGS implicou na formação, logo em 1923, de uma CAP – diferentemente de
outras ferrovias estatais no país, onde isso somente ocorreu a partir de1926. Convém lembrar que o sistema de
montepio, restrito a poucas parcelas do funcionalismo público, surgiu no final do século XVIII oferecendo
benefícios diversos a soldados, escrivães e a outros segmentos de trabalhadores empregados em determinadas
repartições públicas.
O SISTEMA PREVIDENCIÁRIO
Uma matéria do jornal socialista A Democracia, do dia 1o de maio de 1905, surgiria a emergência
de garantias sociais: “por meios legais ou ilegais, o promotor e defensor dos interesses de todas as classes”
(Petersen e Lucas, 1992: 131-132). Para Petersen e Lucas, a arregimentação associativa transformou-se num
espaço de destaque da luta política da militância operária gaúcha na última década do século XIX. No tocante ao
processo de redefinições da vanguarda operária, ambas as autoras detectaram a importância da defesa da
legislação social como razão para explicar o fortalecimento da social-democracia na organização operária
gaúcha, principalmente no início do século XX.
Contudo, como uma historiadora demonstrou, além das rivalidades a solidariedade na organização
operária era evidente. Em seu estudo, sobre o movimento dos trabalhadores no Rio Grande do Sul das primeiras
décadas deste século, Isabel Bilhão enfatiza que a solidariedade mesclava-se às relações da militância sindical:
dificultando assim a identificação do começo e do término de uma determinada ideologia política (Bilhão: 1999:
109).
No que tange ao tratamento de nosso objeto de estudo, convém notar que – entre os anos 20 e 30
deste século - as lideranças dos empregados da VFRGS aparentemente apoiaram uma tendência de restrição aos
serviços que vinham sendo oferecidos por meio da sua própria CAP. Esta postura, aliás, passou a ser assumida a
partir de maio de 1931 por um número cada vez maior de representantes do sindicalismo dos trabalhadores de
algumas estradas de ferro paulistas.
Dava-se assim consistência, à falsa idéia de que havia setores operários segurados que não viam
como um ponto positivo a manutenção do tratamento médico através do sistema das CAPs. A preocupação “no
sentido de limitar à indispensável a despesa” dessas lideranças operárias, objetivando garantir o oferecimento de
outros benefícios por meio da sua CAP, vinha em boa parte justificar a referida postura. Por outro lado,
principalmente sindicalistas ligados aos ferroviários valorizavam a atribuição de aposentadorias e pensões
através do modelo previdenciário regulamentado.
Em 1926 a CAP da VFRGS concedeu 143 aposentadorias. 74 haviam sido concedidas em 1924 e
74 em 1925: atingindo 291 no total. Na soma, foram concedidas 83 pensões no mesmo período. Não obstante,
era acusada a falta de dados sobre os gastos com o atendimento médico-hospitalar – o que ocorria, conforme
Octacílio Pereira (que vinha dirigindo aquela CAP) – “principalmente por falta de uma regulamentação
adequada”.7
Entretanto, a importância do assistencialismo operário ganhava sua própria versão no Regulamento da Caixa de
Socorros da Liga Operária Internacional; mais especificamente de seu 2o artigo:
“O fim desta Caixa é socorrer os associados da Liga nos seguintes casos:
a) de enfermidade;
b) de forçada desocupação, exceto nos casos de greve em que só poderão ser
auxiliados por autorização de uma assembléia geral;
c) de transportar-se, devido a causa de força maior, desta para outra localidade,
prestando-lhes para esse fim.”8
CARACTERÍSTICAS DO ASSISTENCIALISMO NA VFRGS
Seguindo os preceitos do Decreto 4682, aprovado no dia 24 de janeiro de 1923, seria criada a
CAP da VFRGS. Reconhecida pelo CNT, em 21 de setembro de 1923, essa instituição, diferentemente do que
ocorreu em outras ferrovias (convém recordar que os ferroviários, até 1926, foram atendidos exclusivamente
pela legislação das CAPs), não restringiu a existência do assistencialismo não oficial.
No início dos anos 30 persistia o amplo complexo de entidades criado naquele reduto:
“Com sede em diversas localidades servidas pela VFRGS, funcionaram regularmente
durante o ano de 1931, prestando os membros serviços à coletividade, as seguintes
associações do pessoal ferroviário e às quais o Diretor da Viação Férrea tem prestado
todo apoio:
1. Caixa de Aposentadorias e Pensões
2. Cooperativa dos Empregados
3. Amparo Mútuo
4. Empregados da Viação Férrea – Santa Maria e Rio Grande
5. Beneficente dos Operários – Santa Maria
6. Biblioteca Profissional dos Operários das Oficinas de Santa Maria
7. Grêmio Apolo Cacequíense – Cacequí
8. Mutualidade de Ferroviários
9. Rio Grande F. B. Clube – Santa Maria
10. Sociedade de Cultura e Beneficência – Bagé
11. União Recreativa dos Empregados – Garibaldi
12. Sociedade Ferroviária de Auxilio Mutuo
13. Associação dos Ferroviários sul-rio-grandenses (fundada em 6 de
julho de 1931)” 9
Octacílio Pereira mostrou-se aparentemente compreensível com o descontentamento de seus
subordinados no início da década de 20. Ele formalizou isso num relatório entregue à direção da VFRGS, no
qual lamentava a estreiteza das condições de sobrevivência social e, sobretudo, dos efeitos disso sobre o ânimo
do operariado:
7
Cf. Relatório da VFRGS, dados do ano de 1926, Porto Alegre, 30/3/1927: 7.
O Regulamento fazia parte dos Estatutos da Liga Operária Internacional, “aprovados em sessão de
assembléia geral realizada em 11 de outubro de 1896”: Porto Alegre, Tip. de Gazetinha, 1896
(Petersen e Lucas, 1992: 62).
9
Além das associações assistenciais, acima relacionadas, existiam diversos clubes desportivos, nas
localidades de maior núcleo de ferroviários, como em Cacequí, Couto, Bagé, Piratiní, Cruz Alta,
Taquara, Gravataí, Passo Fundo e outras. Cf Relatório da VFRGS, dados do ano de 1931, Porto
Alegre, 1932: 305.
8
“Os sócios da Cooperativa, que somente podem ser os empregados da Estrada, por
falecimento, deixam às suas famílias pecúlios regulares e que representam uma
fortuna para o pobre. Seguidamente, em acidentes ou por qualquer motivo falecem
empregados da Estrada, operários, sócios da Cooperativa, cujas famílias chegam a
receber dois, três e até quatro contos de réis como pecúlio. É este um lado simpático
desse estabelecimento e que deve ser citado.”10
Respondendo à acusação levantada pela imprensa revolucionária da época – de que a referida
Cooperativa dos Empregados estava sendo lesada em seu patrimônio pela direção da VFRGS -, a redação do
jornal O Ferroviário (dirigido pela VFRGS) dedica-se a defender a empresa em duas matérias – publicadas,
respectivamente, nos dias 1711 e 24 de junho de 1923. Eesse jornal apresentava como finalidade afastar os
empregados da influência daqueles que praticavam “atos de terrorismo”. Nesse sentido advertia não ser possível
confundir a ação operária com a dos “agitadores”: o que seria denegrir e alterar o caráter pacífico dos
trabalhadores. Seriam, nessa versão, os “agentes estrangeiros”, “os desordeiros” os responsáveis pelas
sabotagens que danificavam o complexo físico da VFRGS. Assim, a paralização das estradas era relacionada à
falta de condições básicas de segurança dos trabalhadores. Certamente esse não representava o único motivo
para a paralisação “forçada” dos ferroviários.
Mas os documentos revelam que o descontentamento desses trabalhadores era visível anos antes.
Octacílio Pereira vinha acompanhando as críticas dos ferroviários, e demonstra ao enfatizar a persistência de
algumas condições “nocivas” à vida operária. Além disso, diagnosticava o administrador da VFRGS, a situação
tendia a piorar: principalmente se os ferroviários continuassem “lutando” – como vinha ocorrendo em 1921 –
“dentro das oficinas”. Esses “males” consistiam em situações de trabalho, e para serem evitados – apontava
Octacílio Pereira – era emergente oferecer aos ferroviários ambientes de trabalho “amplamente ventilados”,
onde tivessem “luz, ar e relativo conforto e abrigo”12. Ele ressaltava que não nutria dúvidas quanto à
necessidade de se tomar providências imediatas – além do aumento salarial de 52% concedido pelo governo
federal no mesmo ano, mais precisamente quando a Auxiliaire deixa de administrar a ferrovia.
Octacílio buscava novas bases do contrato social? Para buscar uma resposta a essa indagação
proponho, primeiramente, emprestar dois pressupostos para nossa discussão: de que a lei consiste numa
referência material e política e que objetivava firmar a internalização da ideologia dominante. Nessa lógica a
aceitação social da lei resulta, em outras palavras, de um determinado tipo de “falsa consciência”, e representa
uma “condição natural”: “endêmica em nossa experiência imediata”, mas que encontra-se ancorada nas
operações cotidianas do sistema capitalista (Eagleton, 1997: 145).
A INTERNALIZAÇÃO DA IDEOLOGIA BURGUESA E A AÇÃO SINDICAL
10
Relatório da VFRGS, dados do ano de 1920, Porto Alegre, 30/4/1921: 127.
Nesta data, a grande preocupação com o sistema previdenciário centrava-se no envio de um
representante ao Rio de Janeiro, para um encontro de representantes de CAPs com o Ministro da
Agricultura – convém lembrar que a partir de 1923 as CAPs passaram a ser responsabilidade do
Ministério do Trabalho. Cf. O Ferroviário (Órgão dos funcionários da U.F.R.G.S), Porto Alegre,
17/5/1925:1.
12
Relatório da VFRGS, dados do 2o Semestre do ano de 1920, Porto Alegre, 30/4/1921: 119.
11
Desde o final do século XIX, o envolvimento de algumas ferrovias na organização de
13
seus empregados gerou muitas revoltas, como a greve da Companhia Paulista em 1906 . O sucesso
do movimento consistiu na obtenção de liberdade de vínculo dos empregados da empresa junto à
respectiva Associação dos Empregados. Mas o fim da coerção com relação ao vínculo daqueles
trabalhadores não implicaria decisivamente no seu afastamento daquele espaço, mantido sob o
controle patronal desde o surgimento da Associação (1891). Isso se deve, apesar da greve, à
estratégia da direção da Paulista, mais especificamente à “concessão” de uma parte dos lucros do
negócio (1% aproximadamente) aos fundos assistenciais voltados aos seus empregados. As
pesquisas realizadas revelam que o mesmo processo deu-se no caso de outras duas ferrovias
paulistas: a Mogiana e a São Paulo Railway.
Isso teria ocorrido com os empregados da Rede Férrea gaúcha? Me parece que não, ao
menos nas mesmas circunstâncias. O papel exercido pelas associações beneficentes parece ter sido
cumprido, ainda que em parte, por uma instituição que recebeu outra denominação e, ao menos
formalmente, atribuições mais específicas: a Cooperativa dos Empregados da VFRGS, que ao
contrário das referidas associações manteve-se independente da CAP formada naquele reduto
(1923) até o início da década de 30.
Se empreendermos um breve balanço, como a das diferenças entre a Cooperativa dos
Empregados da VFRGS e as associações beneficentes formadas em algumas ferrovias paulistas,
encontraremos interessantes semelhanças e diferenças; as quais já repercutiam em diversos campos
de manifestações culturais e políticas dos ferroviários no Brasil dos anos 20.
Todavia, essas manifestações procediam do final do século XIX. Em 1893, por exemplo,
alguns empregados da Cia. Mogiana encontraram-se na residência de Eduardo Meirelles: ajudante
do chefe do Tráfego em Campinas. O objetivo era, segundo a imprensa local, propiciar meios para os
ferroviários e suas famílias disporem “regularmente socorridos de auxílios médicos e farmacêuticos
de que precisam”. O apelo para a participação de outros empregados da Mogiana nesse
empreendimento foi repetidamente publicado nos jornais Correio de Campinas e Diário de Campinas
nos dias 9, 10 e 11 de novembro de
1893.
Surgiu daquela reunião a Associação de Auxílios Médicos e
Farmacêuticos dos Empregados da Companhia Mogiana de Estradas de Ferro – nome mudado em
fevereiro de 1889 para Associação Beneficente Dr. Francisco Salles de Oliveira; em homenagem a
um dirigente da empresa falecido recentemente.
Entre os que decidiram essa troca de nome estava Francisco Gonçalves Gomide, que
o
ocupava a função de 2 Secretário daquela associação. Menos de três décadas depois encontrava-se
como o primeiro presidente do Centro Ferroviário Brasileiro (CFB): entidade fundada em janeiro de
1927 na cidade de Campinas. Sua posse aconteceu em de janeiro de 1927 – o mandato era de um
14
ano .
Os primeiros dirigentes daquele sindicato obtiveram resultados em pouco tempo desde a
fundação do CFB - na cidade de Campinas. No tocante à ampliação do raio de ação desta
13
Cf. “A Associação Beneficente dos Empregados da Companhia Paulista”, Commércio de
São Paulo, São Paulo, 21/5/1906: 3.
associação tive a oportunidade de constatar, entre o dia 21 de abril e 22 de maio de 1927 (ano em
que surge), que seu quadro social aumentou consideravelmente: de 950
15
para 1.185
16
filiados. Em
17
1928 o CFB já filiava ferroviários de diversas empresas e em localidades afastadas de Campinas .
18
Os 2.724 sócios registrados dois anos depois - em 31 de dezembro de 1930
- confirmariam a
viabilidade da propaganda e da valorização da lei no meio operário. Em 1928 o sindicato ainda
contava apenas com representantes espalhados por apenas algumas das regiões do interior paulista,
como Casa Branca e Ribeirão Preto. Logo em seguida ampliou significativamente essa influência
incluindo-se, além do interior paulista, alguns localidades do sul de Minas Gerais.
Os representantes do CFB, na maior parte das vezes, constituíam-se nos chefes de
estação - o que importava para a filiação de novos filiados e o respectivo recebimento das
mensalidades destes. Em 1928 as cidades abrangidas por essa expansão eram: Pedreira, São
Simão, Itaicy, Guataporá, Jundiaí, Uberaba, Araguari, Cosmópolis, Itú, Franca, Casa Branca,
Guaxupé, Poços de Caldas, Mogi Mirim, Pontal, Rincão, Piracicaba, Igarapava, Rio Claro. Já em
1931 os associados estavam distribuídos no interior de três estados (incluindo-se o sul de Goiás).
Conforme revela a leitura de uma carta - escrita em nome do CFB e enviada ao Diretor do
Departamento do Trabalho Industrial, Comercial e Doméstico do Estado, da Secretaria da Agricultura
de São Paulo-, o quadro social do sindicato campineiro era formado por 2.308 sócios paulistas, 319
mineiros e 97 goianos.
Mas não se trata unicamente de buscar compreender como se formaram e se dividiram as regiões
sob a influência deste ou daquele sindicato, ou quais os grupos detinham o poder formal sobre esse campo
organizativo. Objetivamos sobretudo entender como as parcelas operárias seguradas reagiram num mesmo
campo de confrontos, envolvendo interesses mútuos e levando adiante um projeto de montagem da previdência
oficial brasileira que mesclava a ação sindical à assistencial.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Saber sobre o grande poder de manipulação (dos dirigentes das ferrovias sobre as
associações beneficentes) não nos oferece apenas um conhecimento isolado do que realmente se
passou no processo de montagem das CAPs. Por outro lado, não podemos conceber que Francisco
14 Ele continuava, como no fim do século XIX, defendendo ideais como a “harmonia social” e o “progresso da nação”: Cf. Primeiro Livro de Atas da
Associação Beneficente Dr. Salles de Oliveira. Campinas, 1893-1915: 5.
15
A anotação, citada na página 74 do Primeiro Livro de Atas das Sessões dos Membros da
Diretoria do CFB, demonstra o período e os presidentes que se alternaram nas primeiras
gestões administrativas da referida entidade. Até janeiro de 1931, 4 presidentes - eleitos
anualmente - sucederam-se: Francisco Gonçalves Gomide (de 9/1/1927 até 4/12/1927),
Aldo Leite de Oliveira (até 4/4/1928), Norberto Camargo (até 3/8/1928), Antonio de França
Júnior (até 24/1/1931). Francisco Gonçalves Gomide substituiu França Júnior, passando, no
início de 1932, a presidência a Polytano Barbosa: “em Assembléia Geral realizada nesta
cidade [Campinas], no dia 27 de janeiro passado, foi eleita e empossada (...)”: Carta Ofício
do CFB, 1/2/1932.
16
Ata da 3a Reunião da Diretoria do CFB, 22/5/1927.
17
Cf. Carta Ofício do CFB, 3/10/1931. Em 1932, logo após o reconhecimento oficial,
chegava a 2.336 sócios (somente da Mogiana), 2.358 em 1933 e, com um pequeno
decréscimo, atingia 2.194 em 1934 (ARAÚJO, 1994: 312).
18
Ata da 58a Reunião da Diretoria do CFB, Campinas, 10/8/1931.
Gomide e outras lideranças operárias, enquanto atreladas ao empresariado, restringiram-se ao papel
de “espiões”, “marionetes” e/ou simples “instrumentos” nas mãos dessa parcela social. Nem
tampouco podemos ser conclusivos no julgamento do peso dos laços clientelistas que levaram à
unificação do sistema previdenciário voltado aos empregados nas ferrovias paulistas citadas
anteriormente – diferentemente do que ocorreu com a organização dos ferroviários da VFRGS até o
início dos anos 30.
As afirmações sobre o comportamento dessa parcela da mão-de-obra contratada
devem, portanto, ser inscritas num plano mais amplo de relações para alcançar o significado cultural
que, muitas vezes vem acompanhado de referências aos vínculos dos trabalhadores com esta ou
aquela corrente sindical, com este ou aquele partido político em particular. Steven Topik, por
exemplo, salientou que no final dos anos 20, sob o estímulo de suas lideranças, os empregados
nesta última empresa serviram aos interesses do governo estadual, como eleitores, dos ferroviários e
de seus familiares (Topik, 1987: 130). Em que sentido o sistema previdenciário teve haver com essa
disposição operária?
Me parece que indagações desse porte devem ser reavaliadas à luz do aprofundamento
da análise dos primeiros anos de funcionamento das CAPs no meio dos ferroviários. De qualquer
modo algumas constatações são relevantes para a nossa reflexão no presente.
Nesse caminho, devemos ter em mente o papel das ferrovias e dos ferroviários para a
economia como um todo, assim como tinham para a questão econômica e cultural. Veremos que em
1930 as estradas de ferro estatais contavam com 70.000 funcionários. Em alguns estados como São
Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul o número de ferroviários duplicou desde 1889. Os cargos
oferecidos nesse ramo resultavam, de acordo com alguns políticos da época, da barganha que se
refletia nas urnas em favor de poucos.
É em face deste cenário que encontraremos nas lutas dos trabalhadores a razão para se sujeitar a
lei, e aos interesses também dessa classe. Como podemos observar na leitura da imprensa do início dos anos 30,
que publicava os apelos e as críticas dos operários (mesmo quando pela voz de seus representantes sindicais), os
membros do CNT e do Ministério do Trabalho encontravam-se coagidos ante o processo de reforma de reforma
legal que, na formalidade, cabia a eles promover.
“Um encontro com o Sr. Flávio de Brito Bastos, antigo ferroviário da Leopoldina, e
diretor da ‘Revista dos Ferroviários, deu-nos o ensejo de ouvir suas opiniões sobre o
palpitante assunto da reforma das Caixas de Aposentadoria e Pensões. Perguntandolhe qual era a sua impressão sobre a precariedade de algumas dessas instituições, o Sr.
Flávio Bastos assim nos falou:
- Quero mostrar-lhe, de início, um caso concreto. Na Caixa de Aposentadoria
e Pensões da ‘Leopoldina Railway’, até l929, tinham sido concedidas 972
aposentadorias. Desde o início da caixa extinguiram-se l78 dessas
aposentadorias, cujo total ficou reduzido a 794, número com que se iniciou o
exercício de l930. Isto indica que o volume das aposentadorias, que é
geralmente grande nos primeiros anos, tende sempre a decrescer
posteriormente, com o falecimento de aposentados e pensionistas. Nestas
condições, desde que suportem os encargos dos primeiros anos de
funcionamento, as caixas só poderão ser ameaçadas de falência por causas
estranhas a essas despesas, que são as essenciais. Convém relembrar que,
não existindo limitação para a importância das aposentadorias, na primitiva
lei 4.682, houve algumas que subiram a 5 e 6 contos de réis mensais, como
acentuou em artigo recente a ‘Revista dos Ferroviários’.
- E a opinião dos ferroviários sobre o anteprojeto que esta sendo elaborado
no Ministério do Trabalho?
- Quanto a esse ponto, posso mostrar-lhe a correspondência que tenho
recebido de colegas da Great Western, da Viação Férrea do Rio Grande do
Sul, da E. F. S. Paulo-Rio Grande (Paraná), etc. Fazem eles sentir que, tendo
prestado relevantes serviços à revolução, esperam poder colaborar, a seu
tempo, nesse trabalho. Veja este tópico do artigo de um ferroviário da Great
Western, publicado no ‘Diário da Manhã’, de Recife:
‘- E tão inestimável foi o concurso dos ferroviários riograndenses do sul, no
transporte dos exércitos gaúchos, em demanda da metrópole, que tiveram menção
honrosa, pela sua coesão e nítida compreensão de deveres patrióticos.’”19
Na busca da manutenção de alguns direitos ameaçados e na formulação de novos direitos, os
ferroviários brasileiros adaptaram a sua tradição de lutas a questão jurídica desde os anos 20. Obter amparo legal
era algo inconcebível para muitos sem o auxílio que passou a ser oferecido por muitas de suas entidades
classistas. A novidade introduzida nos anos 20 transformara-se num ponto de inflexão para a idéia de direito
previdenciário à “classe dos ferroviários” (como a categoria era representada em muitos artigos da segunda
metade daquela década). Contudo, a reforma do sistema previdenciário ocorrida nos anos 30 viria negar direitos
vigentes nos anos 20, quando além da maior importância estratégica para a economia (pois as rodovias mal
haviam se iniciado no país), os ferroviários inspiravam maiores cuidados do que se verifica no início da década
seguinte.
Ao mesmo tempo em que alguns sindicalistas ligados à categoria passaram a olhar para trás, e
passaram a revalorizar alguns costumes vivenciados no período em que as relações previdenciárias eram de
caráter privado (sabendo-se, no entanto, que isso era algo difícil de se obter na prática), de outro lado, os
ferroviários acreditavam poder reviver os antigos direitos a fim de abrir novos precedentes. Esse aspecto estaria
associado à cultura da categoria, pelo menos, até o final dos anos 50, quando o mesmo Flávio de Brito Bastos –
ao participar no V Congresso Nacional dos Trabalhadores Ferroviários, realizado na cidade do Rio de Janeiro –
continuava ressaltando que só via vantagens, na defesa dos direitos sociais dos trabalhadores a partir da
exploração dos meandros do aparelho estatal20.
Bibliografia
1 - Livros
BAK, Joan. Workers, Foreign Enterprise and the Making of Cross-Class Alliance In Brazil:
The First 1917 Railroad Strike In Rio Grande do Sul. University of Richmond, Washington,
1995.
BILHÃO, Isabel. Rivalidades e Solidariedades no Movimento Operário (Porto Alegre 19061911). Porto Alegre: EDIPUCRS, 1999.
19
“Os Problemas em Foco: Analisando o anteprojeto das CAPs – Um ferroviário fala ao ‘Globo’”,
Globo, Rio de Janeiro, Marco/l931.
20
Cf. Noticiário do Discurso de abertura do V Congresso Nacional dos Trabalhadores Ferroviários,
Rio de Janeiro, 18/9/1958.
CAMPOS, Cristina Hebling. O Sonhar Libertário. Campinas, Ed. da UNICAMP/Pontes,
1988.
CARVALHO, José Murilo de. “A Utopia de Oliveira Vianna”. In João Quartim de Moraes/ Édile Rugai
Bastos (org.). O Pensamento de Oliveira Vianna. Ed. da UNICAMP, Campinas, 1993.
EAGLETON, Terry. Ideologia: Uma Introdução. São Paulo: Boitempo Editorial e Editora
UNESP, 1997.
EBOLI, Enrique. Jurisprudência sobre as Caixas de Aposentadoria e Pensões. Rio de Janeiro,
MAOS, 1937.
FIORI, Giuseppe. Antonio Gramsci, Life a Revolutionary. London: New Left Books, 1970.
FORTES, Ariosto Borges. Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima VFRGS: Suas
estações e paradas. Porto Alegre, 1962.
GENRO, Tarso Fernando “RS, Tradição Jurídica e Relações Políticas: Um Estudo
Introdutório”. In DACANAL, José Hildebrando/ GONZAGA, Sergius (org.). RS: Cultura &
Ideologia. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1980.
HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo:
Companhia das Letras, 1997.
PETERSEN, Sílvia Regina Ferraz; LUCAS, Elisabeth Lucas. Antologia do Movimento
Operário Gaúcho: 1870-1937. Porto Alegre: Editora da Universidade/ Tchê, 1992.
RUPRECHT, Alfredo J. Direito da Seguridade Social. São Paulo: LTr, 1996.
TOPIK, Steven. A presença do Estado na Economia Política do Brasil - de 1889 a 1930. Rio de
Janeiro, Record, 1987.
2 – Dissertações e Teses
ARAÚJO, Angela Maria Carneiro, Construindo o Consentimento: Corporativismo e Trabalhadores no
Brasil dos anos 30. Tese de Doutoramento apresentada ao Departamento de Ciência Política do
IFCH da UNICAMP, Campinas, 1994.
3 – Documentos oficiais e semi-oficiais
a
Ata da 3 Reunião da Diretoria do CFB, 22/5/1927.
a
Ata da 5 Reunião da Diretoria do CFB, 10/8/1931.
Carta Ofício do CFB, 1/2/1932.
Carta Ofício do CFB, 3/10/1931.
Commércio de São Paulo, São Paulo, 1906.
Correio de Campinas, 1893.
Decreto 2046, 1/10/1931.
Decreto 4682, 24/1/1923
Decreto 5109, 20/12/1926.
Diário de Campinas, Campinas, 1893.
Diário do Povo, Campinas, 1931.
Globo, Rio de Janeiro, Marco/1931.
Noticiário do Discurso de abertura do V Congresso Nacional dos Trabalhadores
Ferroviários, Rio de Janeiro, 18/9/1958.
O Ferroviário (Órgão dos funcionários da U.F.R.G.S), Porto Alegre, 17/5/1925.
Primeiro Livro de Atas da Associação Beneficente Dr. Salles de Oliveira. Campinas, 1893-1915.
Primeiro Livro de Atas das Sessões dos Membros da Diretoria do CFB, Campinas, 19271931.
Relatório da VFRGS de 1929 (Apresentado ao Engenheiro João Fernandes Moreira,
Secretário de Estado dos Negócios, ao Chefe do Trafego, Interino, Fernando Olyntho de
Abreu Pereira, ao Diretor da Viação Férrea, Dr. Augusto Pestana), Porto Alegre: Oficinas
gráficas da A Federação, 1930.
Relatório da VFRGS de 1931 (Apresentado em 1931 ao Dr. Francisco Rodolpho Simch,
Secretário de Estado dos Negócios e Obras Públicas, pelo Engenheiro Fernando Olyntho de
Abreu Pereira, Director-Geral da Viação Férrea), Porto Alegre: Livraria Globo – Barcellos,
Bertaso & Cia., 1932.
Relatório da VFRGS do 2o Semestre do ano de 1920 (Apresentado ao Sr. Diretor da Viação
Férrea, Eng. Augusto Pestana, pelo Chefe Interino do Departamento da Locomoção, pelo
Secretário de Estado dos Negócios e Obras Públicas, Engenheiro Fernando Olyntho de
Abreu Pereira – Nota: Este Relatório contém também dados referentes ao 1o semestre do ano
de 1920, quando a Viação Férrea estava sob a direção da Compagnie Auxiliaire de Chemins
de Fer au Brésil), Porto Alegre, 30/4/1921.
Relatório de 1926: Caixa de Aposentadoria e Pensões dos Empregados da Viação Rio
Grande do Sul. no 4, Porto Alegre: Livraria Selbach de J. R. Fonseca & Cia., 30/3/1927.
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A força da lei e o assistencialismo entre os ferroviários