PSICOLOGIA
A DEFICIÊNC
NA VISÃO DO ESPIRITISMO
SOMENTE ATRAVÉS DA PERSPECTIVA REENCARNACIONISTA, SOB A LUZ DO
EVANGELHO, É QUE PODEREMOS ANALISAR COM PROFUNDIDADE
AS CAUSAS DA DEFICIÊNCIA MENTAL
Washington Luiz Nogueira Fernandes
[email protected]
V
ale a pena refletir na questão da deficiência mental,
já que no Brasil muitas instituições espíritas se dedicam a
cuidar de pessoas nestas condições, num abençoado trabalho
verdadeiramente cristão. Procurase seguir as lições de Jesus, que determinou que amássemos o próximo como a nós mesmos.
Em 1997, fizemos um estudo
desse assunto, juntamente com o
amigo Luciano Grisolia, por ocasião
da data aniversária do Centro Espírita Nosso Lar Casas André Luiz, que
atende 700 crianças especiais. Fizemos então um resumo de parte do
trabalho para compor este artigo.
UM BREVE HISTÓRICO
Na antigüidade, constatamos o
desprezo e mesmo a eliminação
das crianças que nasciam com algum tipo de defeito, seja ele físico
ou mental. Segundo o grande historiador americano Will Durant
(1885-1981), a maioria dos povos
primitivos permitiam a morte dos
recém-nascidos que eram deformados, doentes, bastardos ou
cujas mães tinham morrido ao dar
a luz (Our Oriental Heritage, Will
Durant).
Os conceitos morais ensinados
por Jesus reforçaram a idéia de que
também o deficiente mental tives-
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se uma alma e que todo e qualquer
ato discriminatório e anticaridoso
seria considerado contrário às leis de
Deus. Na Idade Média, surgiram as
dúvidas: e se o deficiente fosse um
aplacador da cólera divina, a receber uma vingança celeste? Ou teria
uma alma, mas não teria virtudes?
Como poderia ser salvo do inferno?
No começo do século XIX, o
médico francês Jean Marc Gaspard
Itard (1774-1838) foi um dos pioneiros no atendimento educacional aos
deficientes mentais, provando que
eles deveriam ser atendidos com
amor, cada um de acordo com as
suas possibilidades. Este trabalho
inspirou seu discípulo Edouard
Seguin (1812-1880) a prosseguir
nestes estudos. Seguin, que também
era médico, tornou-se o primeiro
especialista em deficiência mental e
seu ensino. Nos Estados Unidos, em
1848, Samuel Gridley (1801-1876)
fundou a Escola Howe para deficientes mentais, para dez crianças.
Johann Traugott Weise (17931859), educador alemão, embora tenha escrito em 1820 um panfleto
intitulado Pensamentos, a respeito
de crianças oligofrênicas, abordando suas variedades e causas, somente em 1859 é que foi estabelecida a
primeira classe especial ou escola
auxiliar. Hoje, a obra de Weise tem
o crédito de ter sido a primeira pu-
blicação educacional voltada para
os estudantes retardados mentais.
Johann Jakob Guggenbuhl (18161863), médico suíço, dedicou sua
vida a estudar a causa e o tratamento destes problemas. John Langdon
Haydon Down (1826-1896), químico e médico inglês, teve uma importante contribuição nesta área, ao elaborar uma classificação étnica do
retardo mental em 1866, a qual foi
incluída em seu texto Mental
Affections of Childhood and Youth
(Afecções Mentais da Infância e Juventude), publicado em 1887. Não
se poderia aqui omitir a educadora
Maria Montessori (1870-1956), a
primeira médica italiana. Ela aprimorou os processos de Itard e
Seguin, desenvolvendo um programa de treinamento para crianças
retardadas mentais nos internatos de
Roma. Ainda na Europa, destaca-se
Alice Descoeuders (1928-...), médica belga que elaborou uma proposta curricular para os retardados mentais leves.
O BRASIL NO SÉCULO PASSADO E ALGUMAS INSTITUIÇÕES
Encontramos somente duas instituições para deficientes mentais,
surgidas até o fim do Império: uma
junto ao Hospital Juliano Moreira, de
1874, em Salvador (BA), e outra, a
Escola México, de 1887, no Rio de
A MÁQUINA – DE VICTOR REBELO
IA MENTAL
Janeiro. A
primeira especializada e a
segunda de ensino
regular, atendendo
também deficientes físicos e visuais.
Em 1900, surge a primeira monografia nacional sobre o Tratamento dos
Idiotas, apresentada por Carlos Eira no
4º Congresso de Medicina e Cirurgia,
no Rio de Janeiro. Em 1913, Basílio de
Magalhães escreveu Tratamento e
Educação das Crianças Anormais de
Inteligência. Em 1958, aparece a Introdução ao Estudo da Deficiência Mental, de Clóvis Faria Alvim.
Segundo levantamento do Reintegra/Amankay, Rede de Informações Integradas sobre Deficiências,
existem muitas instituições no Brasil
que se dedicam à assistência de crianças especiais. Para referir algumas
das mais antigas, citamos: Instituto
Pestalozzi de Canoas, criado em
1926, em Porto Alegre, RS; Sociedade Pestalozzi de Minas Gerais, fundada em 1932; Sociedade Pestalozzi
do Estado do Rio de Janeiro, fundada em 1948; Sociedade Pestalozzi
de São Paulo, fundada em 1952; Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) do Rio de Janeiro,
fundada em 1954; Associação de
Pais e Amigos dos Excepcionais
(APAE) de São Paulo, fundada em
1961. Até 1996, havia 230 APAEs no
Estado de São
Paulo e 1058 no
país, filiadas à
Federação Nacional das APAEs, em
Brasília.
ENTIDADES
ESPÍRITAS DE
ASSISTÊNCIA
AO DEFICIENTE MENTAL
No Espiritismo, destacam-se as
Casas André Luiz, em Guarulhos,
que atende 700 crianças especiais; a
Casa da Criança do Betinho – Lar
Espírita para Excepcionais, Rua
Vacanga, 300, bairro de Vila Carrão;
Caminhando – Núcleo Espírita para
Educação e Integração do Excepcional, Rua Rosária Mussara, 90, bairro de Vila Califórnia; Instituto Beneficente Nosso Lar, Praça Florence
Nightingale, 56, Cambuci, que adota o método DIPCI (Desenvolvimento Integral das Potencialidades da
Criança Excepcional); AIA – Núcleo
Assistencial Irmão Alfredo Entidade
Mantenedora Obra Beneficente,
Rua Ribeiro do Vale, 120, Brooklin.
CAUSALIDADE
MÉDICA E ESPÍRITA
Do ponto de vista médico, identificam-se disposições gerais como
agentes causadores da deficiência
mental e também fatores biológicos,
psicológicos e sociais. Entre estes
agentes responsáveis, identificamos:
infecção e intoxicação; anormalidade cromossômica; distúrbios de gestação; retardo decorrente de distúrbio psiquiátrico; rubéola ou sarampo alemão, que pode causar defici-
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PSICOLOGIA
A MEDICINA PROCURA DESCREVER SEUS
EFEITOS E, POR VEZES, ALCANÇA CAUSAS
IMEDIATAS, MAS AINDA PERMANECE A
GRANDE INCÓGNITA DA CAUSALIDADE
PRIMEIRA DO PROBLEMA
carnação, porque
um espírito retorna
à vida física num
corpo com alterações somáticas ou
psíquicas.
A doutrina espírita nos ensina que
O deficiente é uma delicada flor que requer carinho especial
Deus é a Inteligênência mental durante os três primei- cia Suprema do Universo, causa priros meses de gravidez; agentes tóxi- mária de todas as coisas, sendo Ele
cos ingeridos pela mãe durante a eterno, único, imutável, imaterial,
gravidez ou pela criança podem soberanamente justo e bom, perfeiperturbar o equilíbrio bioquímico to em todas as coisas. Mas como um
interno; vírus ou germes em forma Deus soberanamente justo e bom
de doenças infecciosas podem inva- pode permitir que um bebê totaldir o corpo e causar danos duradou- mente inocente possa nascer com
ros ao sistema nervoso central; con- tantos defeitos, não podendo, desta
sumo de álcool, que pode atravessar forma, ter uma vida normal?
a barreira placentária, permanecenO Espiritismo explica que todo
do na corrente sangüínea do feto e este sofrimento da criança deve ter
deprimindo o funcionamento do sis- uma causa e, como Deus é justo,
tema nervoso central. Em qualquer esta causa só pode ser justa. Se não
caso, ocorre o funcionamento inte- encontramos a causa deste sofrimenlectual abaixo da média durante o pe- to na vida atual, devemos nos reporríodo de desenvolvimento, associado tar às vidas pretéritas. Admitir a
a distúrbios de maturação, aprendiza- unicidade da existência, ou seja, a
do ou adaptação social. Face a esta criação da alma juntamente com o
realidade, existem várias alternativas corpo, seria o mesmo que duvidar da
terapêuticas e formas de reabilitação, Justiça de Deus, que permitiria que
conforme o grau de comprometimen- seus filhos sofressem sem culpa.
Em virtude do axioma (lei cientíto orgânico.
fica sem demonstração) que estabelece que todo efeito deve ter uma
EM BUSCA DAS CAUSAS
A verdade é que muitas pessoas causa, a explicação para isto se entêm dificuldade em entender o fator contra na Lei de Causa e Efeito, na
causal do nascimento de uma crian- Lei de Ação e Reação. Aplicada esta
ça deficiente. A medicina procura lei em nossa vida, nossas atitudes,
descrever seus efeitos e, por vezes, sendo a causa ou a ação, sempre
alcança causas imediatas, mas ain- terão os seus respectivos efeitos.
da permanece a grande incógnita da Assim, praticando o bem, conforme
causalidade primeira do problema. as Leis de Deus, conheceremos a seu
O Espiritismo, no século XIX, pôde tempo os bons efeitos, mas também
explicar e descrever, através da reen- se praticarmos o mal, conheceremos
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as suas amargas conseqüências, respondendo por nossa indisciplina e
por nossa transgressão à Lei de Deus,
que é a Lei do Amor. Não se trata
aqui de um mecanismo punitivo,
mas sim educativo, como ocorre
com um estudante que é levado a
repetir o ano letivo para o qual não
se aplicou devidamente e, para ele,
isto será recebido como uma penalidade. Assim, por punição devemos
entender o estado mental daquele
que a sofre. Tudo isto podemos extrair do conjunto dos esclarecedores
ensinamentos espíritas.
Allan Kardec apresenta as seguintes considerações a respeito dos
problemáticos mentais:
“Os que nascem nessas condições, nada fizeram, seguramente,
nesta vida, para merecer uma sorte
tão triste, sem possibilidade de compensação, e que eles não puderam
evitar, sendo impotentes para modificá-las e ficando à mercê da comiseração pública. Por que, pois, esses
seres tão desgraçados, enquanto ao
seu lado, sob o mesmo teto e na
mesma família, outros se apresentam
favorecidos em todos os sentidos?
Ora, a causa sendo sempre anterior
ao efeito e desde que não se encontre na vida atual, é que pertence a
uma existência precedente. Por outro lado, Deus, não podendo punir
pelo bem que se fez, nem pelo mal
que se não fez, se somos punidos, é
que fizemos o mal. E se não fizemos
o mal nesta vida, é que o fizemos em
outra. Esta é uma alternativa a que
não podemos escapar, e na qual a
lógica nos diz de que lado está a
justiça de Deus” (O Evangelho Segundo o Espiritismo, Cap. V).
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REFERÊNCIAS
A CAUSA, SENDO SEMPRE ANTERIOR AO EFEITO
E DESDE QUE NÃO SE ENCONTRE NA VIDA ATUAL,
É QUE PERTENCE A UMA EXISTÊNCIA PRECEDENTE
XAVIER, Francisco Cândido/
André Luiz.
Os Mensageitos
FEB
Espíritos diversos
Deficiente Mental, por que fui um?
Petit
Yvonne A. Pereira
Memórias de um Suicida
FEB
O LIVRO DOS ESPÍRITOS
“Questão 371: A opinião de que
os cretinos e os idiotas* teriam uma
alma de natureza inferior tem fundamento? (*Importante esclarecer que,
antigamente, na terminologia médica, o indivíduo portador de qualquer
anormalidade mental era chamado
idiota, cretino ou louco).
– Não. Ele têm uma alma humana, freqüentemente mais inteligente
do que pensais, e que sofre com a
insuficiência dos meios de que dispõe para se comunicar, como o
mudo sofre por não poder falar.
Questão 372: Qual é o objetivo
da Providência ao criar seres desgraçados como os cretinos e os idiotas?
– São espíritos em punição que
vivem em corpos de idiotas. Esses
espíritos sofrem o constrangimento a que estão sujeitos e pela impossibilidade de manifestar-se através de órgãos não desenvolvidos
ou defeituosos.
Questão 373: Qual o mérito da
existência para seres que, como idiotas
e cretinos, não podendo fazer o bem
nem o mal, não podem progredir?
– É uma expiação, imposta ao
abuso que tenham feito de certas faculdades; é um tempo de suspensão.
Questão 373-a: Um corpo de idiota pode então encerrar um espírito
que tivesse animado um homem de
gênio numa existência precedente?
– Sim, o gênio torna-se às vezes
uma desgraça, quando dele se abusa.
NOTA: A superioridade moral
não está sempre na razão da superioridade intelectual e os maiores gênios podem ter muito a expiar; daí
resulta freqüentemente para eles
uma existência inferior às que já te-
UM CASO DE DEFICIÊNCIA MENTAL
Do livro O Céu e o Inferno, Cap. 8, 2ª Parte:
Este era um rapaz de 13 anos, ainda encarnado, cujas faculdades intelectuais eram nulas a ponto de não reconhecer os próprios pais, mal podendo
tomar por si mesmo o alimento. Dava-se a completa suspensão do desenvolvimento em todo o sistema orgânico.
1. (A São Luís) Podemos evocar o espírito deste menino?
R. Sim, é como se o fizésseis ao de um
desencarnado.
2. Essa resposta faz-nos supor que a evocação se pode fazer a qualquer hora...
R. Sim, visto como presa ao corpo por
laços materiais, que não espirituais, a sua
alma pode desligar-se a qualquer hora.
3. (Evocação de Carlos)
R. Sou um pobre Espírito preso à Terra por
um pé como se passarinho fosse.
4. Presentemente, isto é, como um Espírito, tendes consciência de vossa nulidade neste mundo?
R. Decerto que sinto o cativeiro.
5. Quando o corpo adormece e o vosso
Espírito se desprende, tendes as idéias tão
lúcidas como se estivésseis em estado
normal?
R. Quando o corpo infeliz repousa, fico
um pouco mais livre para alçar-me ao céu
a que aspiro.
6. Experimentais no estado espiritual
qualquer sensação dolorosa oriunda do
vosso estado corpóreo?
R. Sim, por isso que é uma punição.
7. Lembrai-vos da precedente encarnação?
R. Oh! Sim, e ela é causa de meu exílio
nham vivido, que é uma causa de
sofrimentos. Os entraves que o espírito prova em suas manifestações são
para ele como as cadeias que constrangem os movimentos de um homem vigoroso. Pode-se dizer que os
cretinos e os idiotas são estropiados
do cérebro, como o coxo o é das
de hoje.
8. Que existência era essa?
R. A de um jovem libertino no reinado de
Henrique III.
9. Dizeis ser uma punição a vossa condição atual... acaso não a escolhestes?
R. Não.
10. Como pode vossa existência atual
servir ao vosso adiantamento no estado
de nulidade em que vos achais?
R. Para mim não há nulidade, pois foi
Deus quem me impôs esta contingência.
11. Podes prever o tempo de duração da
existência atual?
R. Não, porém, mais ano menos ano,
reentrarei na minha pátria.
12. Que fizestes durante o tempo que
mediou entre a vossa última desencarnação e a encarnação atual?
R .Deus encarcerou-me; logo, eu era um
Espírito leviano.
13. Tendes, quando acordado, a consciência do que se passa, apesar da imperfeição dos vossos órgãos ?
R. Vejo e ouço, mas meu corpo nada vê
nem percebe.
14. Poderemos fazer alguma coisa de
proveito por vós?
R. Nada.
pernas e o cego dos olhos“ (O Livro
dos Espíritos, Allan Kardec).
Ficam registradas estas sábias reflexões sobre a deficiência mental à
luz do Espiritismo, trazendo valiosos
esclarecimentos e conselhos para os
que se encontram inseridos de alguma forma nesta realidade.
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A deficiência mental na visão do Espiritismo