Conferência
trabalho na
investigação
criminal
Há limites que
existem para NÃO
serem quebrados.
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Comunicações,
debates e conclusões
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Associação Sindical dos
Funcionários
de
Investigação Criminal da
Polícia Judiciária - ASFIC/PJ
2
Título:
O regime de trabalho na Investigação Criminal /
/ Comunicações, debates e conclusões
Edição e propriedade:
Associação Sindical dos Funcionários de Investigação
Criminal da Polícia Judiciária, ASFIC/PJ
Organização da conferência:
Concepção:
Sobral Barbosa
Mário Coimbra
Coordenação:
Sobral Barbosa
João Rouxinol
Mário Coimbra
Equipa técnica:
António Trogano
Helena Santos
Jorge Marques
Jorge Mourão
José Peixoto
Vítor Hugo
Logotipo da conferência (cartaz e capa do livro):
Carlos Magno
Grafismo:
Bruno Reis
Execução gráfica e impressão:
Castel-Publicações e Ediçoes, SA.
Tiragem: 1 700 Exemplares
Ano: Dezembro de 2003
Depósito legal:
3
Índice
Nota Prévia ........................................................................................................................................
5
Paradigmas do quotidiano do investigador criminal ...........................................................................
7
Programa da Conferência ..................................................................................................................
12
Entidades convidadas presentes na conferência .................................................................................
14
Imagens da conferência .....................................................................................................................
17
Recepção e Abertura Solene
• Dr. Artur Oliveira ........................................................................................................................
Juiz de Direito
Director Nacional Adjunto da Directoria do Porto,
(em representação do Director Nacional da Polícia Judiciária)
20
• Dr.ª Marlene Lemos .....................................................................................................................
Representante do Conselho Regional do Norte da Ordem dos Médicos
21
• Manuel Carneiro Rodrigues .......................................................................................................
Inspector-Chefe na DCCB
Presidente Nacional da ASFIC/PJ
22
• Dr. Teodósio Jacinto ...................................................................................................................
Procurador-Geral Adjunto
Director do Instituto Superior de Policia Judiciária e Ciências Criminais (ISPJCC)
Moderador convidado
25
Comunicações:
• Dr. Ferreira Leite .........................................................................................................................
Director Nacional Adjunto na DCCB
As especificidades e as exigências da prestação de trabalho na Investigação Criminal
28
• Dr. Carlos Sobral ..........................................................................................................................
Médico do Trabalho, indicado pela Ordem dos Médicos
A Medicina do trabalho na Investigação Criminal
39
• Prof. Dr. A. Martins da Silva .......................................................................................................
Professor no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar do Porto
Director do Departamento de Doenças do Sistema Nervoso e Órgãos dos Sentidos
do Hospital St. António, no Porto
Alterações do sono e alterações dos ritmos biológicos
41
• Debate ..........................................................................................................................................
53
4
• Prof. Dr. Jorge Leite ....................................................................................................................
Professor na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra
Princípios Direito Internacional do Trabalho sobre Regime, Duração e Remuneração do trabalho
61
• Prof. Dr. Liberal Fernandes .........................................................................................................
Professor na Faculdade Direito da Universidade do Porto
O Regime de trabalho na função pública portuguesa
- Limites às normas especiais que o excepcionem: o art. 79.º da LOPJ
69
• Debate ..........................................................................................................................................
73
• Dr.ª Cristina Soeiro ......................................................................................................................
Psicóloga no Instituto Superior de Polícia Judiciária e Ciências Criminais
Os Factores stressantes na Investigação Criminal
83
• Gerard Greneron .........................................................................................................................
Comandante de Polícia da Polícia Nacional Francesa
Secretário-geral do Conselho Europeu de Sindicatos de Polícia (CESP)
A realidade laboral nas polícias europeias
94
• Dr. A. Jorge Braga .......................................................................................................................
Jurista especializado em Direito do Trabalho, na área da Administração Pública
Adaptação do Trabalho na Investigação Criminal à Lei e às suas especificidades - Soluções possíveis
98
• Debate .......................................................................................................................................... 106
• Conclusões .................................................................................................................................... 122
Anexos - Legislação
• Despacho 248 / MJ / 96 ................................................................................................................. 138
(regulamento dos Serviços de Piquete e de Unidades de Prevenção)
• Despacho n.º 07-SEC/DG ............................................................................................................... 144
(Regime de Folgas decorrente da prestação de serviço efectivo por parte dos funcionários em
regime de prevenção)
• Portaria n.º 98/97 de 13 de Fevereiro (Actualização do suplemento de piquete) ............................. 145
• Decreto-Lei n.º 275-A/2000 (art. n.º 79 da Lei Orgânica da Polícia Judiciária) .................................. 147
• Despacho n.º 06/2002-SEC/DN ...................................................................................................... 148
(Serviço de Prevenção/Trabalho Extraordinário/Pagamento)
• Despacho Normativo n.º 18/2002 .................................................................................................. 151
(Regulamento de Horário de Trabalho do Pessoal da polícia Judiciária)
• Despacho 11/2002-SEC/DN (Aclaramento ao Despacho n.º 06/20002-SEC/DN) .............................. 156
• Despacho 24/2002-SEC/DN ........................................................................................................... 159
(Serviços de Prevenção, Ajudas de Custo, Trabalho Extraordinário)
• Constituição da República Portuguesa (Artigos 13.º, 18.º, 21.º, 22.º e 59.º) ................................... 161
• Lei n.º 23/98 de 26 de Maio ........................................................................................................... 163
(Regime de Negociação Colectiva dos trabalhadores da Administração Pública)
• Decreto-Lei n.º 259/98 de 18 de Agosto ........................................................................................ 170
(Regime Geral da Administração Pública)
Nota prévia
Nota Prévia
A Associação Sindical dos Funcionários de Investigação Criminal da Polícia
Judiciária realizou no dia 21 de Março de 2003, no Salão Nobre do Centro
de Cultura e de Congressos, da Ordem dos Médicos do Porto, uma
Conferência subordinada ao tema «O Regime de Trabalho na Investigação
Criminal».
Esta conferência contou com o apoio científico da Faculdade de Direito da
Universidade do Porto, do Instituto Superior de Polícia Judiciária e Ciências
Criminais e da Ordem dos Médico - Secção Regional do Norte, através de
conceituados Professores Universitários e Técnicos, que abordaram a profissão
do investigador criminal da PJ, nas suas diferentes dimensões, à luz dos
respectivos conhecimentos de direito, de medicina, de psicologia e de
sociologia do trabalho.
Os investigadores criminais têm a perfeita noção que correm diariamente
riscos físicos e de vida, mas não têm uma percepção muito clara sobre a
mais que provável exposição a outros tipos de riscos também eles graves,
de natureza psicossocial e patológica, resultantes do desempenho da sua
profissão. O primeiro grande objectivo desta conferência foi precisamente
tornar perceptíveis esses riscos aos próprios investigadores e depois
sensibilizar as instâncias de decisão, para a necessidade premente (e até
para a obrigatoriedade legal) de um comportamento preventivo de riscos,
em matéria de gestão de recursos humanos.
Tendo como pano de fundo o regime de trabalho na Função Pública (definido
pelo DL 259/98), onde se prevê a possibilidade de excepções (ou restrições
de direitos) através de leis especiais (v.g. por regulamentos de trabalho),
para os chamados «Corpos Especiais» (polícias, médicos, enfermeiros,
bombeiros, etc.), o outro grande objectivo desta conferência foi saber até
onde é que essas excepções (ou restrições de direitos) podem ir...
Efectivamente, a questão dos limites máximos que tal regulamentação
especial possa introduzir, afectando a normal atribuição dos direitos gerais
a estes grupos de funcionários e as formas da sua compensação nunca
tiveram uma solução legal razoável e lógica.
No caso especial da PJ, o corpo de funcionários afectos à investigação
criminal vem sendo sujeito a cargas diárias de trabalho intensas, sem limites
horários, sem pausas para descanso e /ou refeições.
São já rotina jornadas de trabalho contínuo superiores a 24 horas (e mais),
por exigência das especificidades próprias da actividade policial, fortemente
sentidas num corpo que faz a investigação criminal dos delitos de maior
gravidade e que faz um esforço enorme para acompanhar a dinâmica diária
da actividade criminal.
É bem verdade, que a dinâmica criminal (o criminoso não marca hora nem
local para actuar, podendo o crime ocorrer a todo o momento) não se
compadece com horários rígidos e pré-definidos...
5
6
Nota prévia
A prestação de trabalho nestas condições levanta problemas de vária
natureza, até hoje sem uma solução razoável, como seja:
• o controlo e registo das horas de trabalho extraordinário prestadas;
• a sua compensação remuneratória;
• a compensação dos tempos de descanso devidos;
• as pausas para refeições;
• o limite máximo da jornada de trabalho diária / semanal / mensal.
Todos os governos até ao momento, baseando-se nos conceitos de
"disponibilidade funcional" e de "caracter permanente e obrigatório"
do serviço da PJ, previstos na LOPJ ( art.º 79.º DL 275-A/2000) têm vindo a
impor soluções (regulamentares) que visam, por um lado, afastar o
pagamento de horas extraordinárias, e, por outro lado, forçar jornadas de
trabalho contínuo, sem limites, com formulas de compensação
aparentemente contrárias à lógica prevista na lei geral:
• O serviço de Piquete, quer de Prevenções instituídos, impõem um limite
remuneratório máximo (igual ao subsídio de piquete: cerca de 30 Euros),
independentemente do número de horas de trabalho prestado para além
do horário normal (e independentemente de se tratar de dia de semana
ou de descanso/ fins de semana), em que o valor da hora pago é cerca
de um quinto do que é pago por hora normal de trabalho,
subvertendo-se o sistema retributivo do trabalho para além do horário
normal;
• E, mesmo assim, atingido o valor do subsídio de piquete, continua-se a
exigir a prestação do trabalho, passando este a ser gratuito.
• Não se prevê uma correcta compensação do descanso, e a jornada de
trabalho é ilimitada no tempo, dependendo apenas da conclusão das
diligências urgentes ...
Com esta Conferência pretendeu-se realizar uma reflexão serena, séria
e necessariamente multidisciplinar, sobre o regime de trabalho na
investigação criminal e as condições da sua prestação, por forma a se
encontrar, num futuro próximo, uma solução que compatibilize o
interesse público e os direitos dos funcionários.
A Organização
Paradigmas do quotidiano do investigador criminal
Paradigmas
do quotidiano
do investigador
criminal
Este texto pretendeu apenas tornar mais perceptível, a cada uma das
individualidades exteriores à polícia, presentes nesta conferência, o trabalho
concreto diário desenvolvido pelo investigador criminal da Polícia judiciária.
É sabido que o tipo de criminoso combatido pela PJ não desenvolve as suas
actividades dentro do horário normalmente designado por «horário normal
de trabalho», a que todo e qualquer vulgar cidadão tem direito, nem obedece
a um horário rígido.
Os criminosos combatidos pela PJ, são muitas vezes indivíduos marginais
que se movimentam essencialmente durante a noite, preparando, planeando,
efectuando contactos e que conhecem ou dominam o submundo nocturno,
com todas as implicações que daí resultam para a actividade da polícia.
Mesmo o criminoso dito de «colarinho branco», aparentemente respeitável,
aparece muito frequentemente ligado a indivíduos com antecedentes
criminais, servindo-se normalmente destes para um sem número de tarefas
menores, mas essenciais ao projecto criminoso (desde as simples tarefas de
segurança, às de contra vigilância, passando pela sua utilização como
instrumento de chantagem, de violência física ou para a criação de empresas
de fachada, vulgarmente conhecidos como «testas de ferro», etc.).
É pois, na noite, que na maioria dos casos se torna possível controlar, sentir
o pulsar e obter dados sobre a movimentação destes indivíduos, o que obriga
a rotinas policiais que não se coadunam com o normal horário de trabalho.
No seu dia a dia, os investigadores elaboram o trabalho «burocrático» de
cariz técnico-jurídico, que tanto pode ter lugar na polícia como no terreno,
designadamente
§ Estudo dos inquéritos e planeamento das investigações
§ Inquirições
§ Interrogatórios
§ Outros autos formais
§ Relatos de diligências
§ Compilação e tratamento de observações efectuadas ou de informações
recolhidas
§ Análise de informações
§ Relatórios de inquéritos
§ Preparação e planificação de buscas e detenções
§ Apresentação de detidos em tribunal
§ Testemunho em audiências de julgamento
§ Audição e transcrição de intercepções telefónicas
§ Etc.
7
8
Paradigmas do quotidiano do investigador criminal
Essa parte do trabalho é depois complementada ou culmina com uma
actuação de cariz técnico-operacional traduzida no terreno em
§ Inspecção aos locais do crime
§ Buscas
§ Vigilâncias e seguimentos
§ Contactos com colaboradores
§ Detenções
§ Etc.
Quer o trabalho de cariz técnico-jurídico, quer o trabalho de cariz técnico-operacional desenvolve-se, muito frequentemente, sem pausas, começando
bem cedo, continuando noite dentro, por vezes atravessando sucessivamente
dias e noites seguidas, sempre com a perspectiva em mente, de criar ou
esperar pelas melhores condições para o flagrante delito e/ou para a detenção
de suspeitos...
Trata-se reconhecidamente de uma actividade profissional multifacetada,
tecnicamente exigente, que faz apelo a conhecimentos de várias áreas
científicas, que requer um cuidado meticuloso, específico e na maioria das
situações ininterrupto, não sendo possível ao investigador ou a quem a
chefia, propor a interrupção do trabalho, seja por razões de protecção dos
direitos dos próprios funcionários ou até de cariz económico, sob pena de
se comprometer irremediavelmente os resultados da investigação...
Em síntese, os problemas que afectam a organização do trabalho na
investigação criminal são, a nosso ver, essencialmente três:
•
o excesso de trabalho com todo o seu cortejo de consequências (que
resulta, também, saliente-se, de uma crónica falta de pessoal, com um
quadro que continua preenchido a 50%, há mais de 15 anos).
•
uma crescente dessensibilização, quer da administração, quer das chefias
superiores, para o respeito por direitos constitucionalmente protegidos.
•
um modelo de gestão do trabalho e de recursos humanos, desligado da
realidade, sem visão estratégica, assente numa filosofia de resultado
imediato, que não só ignora as capacidades reais do investigador (reage
com indiferença aos seus limites físicos e psicológicos e desvaloriza, por
exemplo, a importância da maturidade profissional), como gere todas
as situações, quase sempre, em detrimento das suas expectativas (e
direitos) profissionais e pessoais.
As situações que a seguir se descrevem, recolhidas junto de investigadores,
são, no essencial, verídicas, excepto a identidade dos protagonistas.
Escolhemos quatro pequenas histórias, atravessadas transversalmente por
Paradigmas do quotidiano do investigador criminal
alguns dos problemas referidos anteriormente, com o intuito não só de
ilustrar, mas sobretudo de facilitar uma análise multidisplinar do quotidiano
da investigação criminal, à lupa do direito, da psicologia, da sociologia e da
medicina do trabalho:
Caso 1
Paulo é Inspector e trabalha numa secção de Banditismo. Recentemente
trabalhou em serviço de prevenção 72 horas (ininterruptamente de Quarta
a Sábado), realizando diligências urgentes relacionadas com um rapto. Findas
estas, quase de imediato foi convocado para nova prevenção activa (às 0H00
de Sábado). Alegou não poder trabalhar mais por exaustão e não
compareceu. Esta recusa foi participada pelo seu superior, sendo-lhe
instaurado procedimento disciplinar.
Caso 2
João é Inspector e trabalha numa secção que investiga tráfico de
estupefacientes. As exigências e as necessidades de trabalho em número de
horas e disponibilidade total são de tal ordem, que além de andar
permanentemente com uma sensação física e psicológica de cansaço, o
seu casamento está a atravessar uma fase critica. A sua mulher é funcionária
superior numa autarquia e tem também uma actividade absorvente,
queixando-se constantemente de prejuízo profissional devido às ausências
sistemáticas de João. A guarda dos dois filhos e as deslocações à escola e ao
infantário para os levar e recolher são duas das situações que originam
frequentemente problemas e conflitos entre o casal, isto porque o trabalho
do João é imprevisível e a sua mulher também trabalha, com muita
frequência, para além do horário normal de trabalho. João tem plena
consciência de que a profissão da sua mulher também é importante e que
ela tem o mesmo direito à realização profissional. O problema é que não
sabe como explicar isso aos seus colegas e aos seus superiores, que, aliás,
devem ter os mesmos problemas... João foi confrontado recentemente com
uma situação que o deixou ainda mais angustiado e cismático: foi convocado
pela professora do seu filho Jorge, de 7 anos, por aquela notar que este
andava a manifestar algumas dificuldades que só podiam ser supridas com
muita ajuda dos pais, nomeadamente na realização dos «trabalhos de casa»
(devido às constantes ausências de João, esta tarefa era desempenhada,
quase em exclusivo, pela sua mulher, que o fazia, aliás, com muita
dificuldade, pois ainda tinha que dividir atenção com a bebé de dois anos e
tratar das outras tarefas domésticas). Mas o que mais tinha surpreendido e
preocupado a professora, verdadeira razão da convocatória, tinha sido o
facto de o Jorge ter choramingado numa aula em que falaram dos pais e
das respectivas profissões! Era como se não tivesse pai porque raramente o
via, nem sequer aos fins de semana... a professora compreendera que ele se
tinha sentido constrangido perante as histórias apresentadas pelos colegas,
em que a figura do pai estava sempre presente...
9
10
Paradigmas do quotidiano do investigador criminal
Caso 3
Idalécio é Inspector, tendo acabado o estágio hà 11 meses. Encontra-se
actualmente colocado numa Brigada do Banditismo. Ele é o terceiro elemento
mais novo da Brigada, composta por 6 investigadores, cuja experiência de
Polícia tem uma média inferior a 4 anos. Nas duas últimas semanas e
meia, tem vindo a trabalhar até às 5 da manhã, na recolha de informação e
em vigilâncias realizadas no terreno. Tem trabalhado praticamente 18 horas
diárias (só tendo tempo a espaços para ir a casa mudar de roupa e tomar
banho - o único descanso é passado a dormitar, ora no gabinete ora no
carro, isto à vez com o seu colega de equipa). Toda a Brigada tem vindo a
desenvolver um esforço (pode-se dizer) desumano no sentido de deter um
«gang» cujos elementos, por diversas vezes, dispararam armas de fogo na
realização dos assaltos, num dos quais feriram um funcionário de uma bomba
de gasolina. Nos últimos dias a violência dos assaltos aumentou e teme-se
que possa vir a acontecer uma fatalidade... Idalécio está, desde segundafeira, a fazer vigilância a um posto de abastecimento de combustível que o
referido «gang» havia projectado assaltar. Este «gang» tinha realizado um
assalto na terça-feira e, pela rotina entretanto estabelecida, era muito
provável que nessa noite voltassem a assaltar...
São 22H30, Idalécio faz parte de uma equipa composta por 3 grupos de
dois investigadores, que faz vigilância ao referido posto de abastecimento.
Faz equipa com um colega que está em Estágio há 6 meses, motivo pelo
qual, não duvidando da aptidão do colega, assumiu a responsabilidade de
ficar com a pistola metralhadora que lhes fora distribuída. Idalécio preferia
fazer equipa com um colega mais velho, mais experimentado, que lhe
transmitisse a calma que é preciso ter nestas ocasiões, mas a realidade é
que agora lhe cabe a si fazer esse papel, não podendo deixar transparecer,
para o colega mais novo, nem a emoção nem o que lhe vai no pensamento...
Na disposição das viaturas no terreno, é o carro do Idalécio que mais próximo
se encontra do posto de abastecimento de combustível, tendo visão sobre o
mesmo... Foram já várias as viaturas iguais à utilizada pelo «gang»
investigado, que entraram e saíram no posto de abastecimento combustível
vigiado. Este facto leva a que a adrenalina esteja num constante sobe e
desce e que a transpiração cole a roupa ao corpo , por força do colete à
prova de bala envergado...
São 23H50 e entra no posto de abastecimento outra viatura com aquelas
características. Idalécio verifica que do seu interior saem indivíduos
encarapuçados que de imediato iniciam o assalto... O momento esperado
chegara e, entre o preparar das armas e dar conhecimento do que estava a
ocorrer, vê-se confrontado com as suas dúvidas e as do colega sobre aquilo
que deveriam fazer. Recebem, entretanto, a ordem, vinda do Inspector
mais antigo da Brigada que ficara responsável por chefiar aquele grupo, de
fazer o seguimento aos assaltantes e, na primeira oportunidade, fazerem a
abordagem. Sempre com a adrenalina no máximo e passados alguns
quilómetros, resolvem abordar a viatura dos assaltantes...
Paradigmas do quotidiano do investigador criminal
Ao se aperceberem que era a Polícia, dois dos assaltantes tentam a fuga a
pé e o terceiro, ao volante do carro, dispara e fere dois colegas de Idalécio,
um dos quais gravemente. Um conjunto de pensamentos, como que
«flash’s», passam naquele instante pela sua cabeça... Idalécio depara-se,
pela primeira vez, com uma situação só vista em filmes: fogo real e colegas
feridos e ensanguentados. Enquanto tenta acudir aos colegas o terceiro
assaltante tenta a fuga abalroando as viaturas Policiais...
Caso 3
Pedro é Inspector e trabalha num serviço de vigilância. Quando foi
seleccionado para integrar esse serviço disseram-lhe que tinha de ter
disponibilidade total, 24 sobre 24 horas, tendo de estar sempre contactável.
Hoje sabe o que isso significa: recentemente até lhe recusaram uma acção
de formação no Instituto da própria Polícia... Pedro gosta do que faz e sabe
que se falhar no que concerne a essa disponibilidade sai da brigada... Mas
também gostava de ter alguma vida privada, de prosseguir os seus estudos
académicos, de dar mais apoio à família... e não consegue.
A Organização
11
12
Programa da Conferência
Programa da
Conferência
10h00
Recepção e Abertura Solene
Mesa de Honra
Dr. Artur Oliveira, Director Nacional Adjunto da
Directoria do Porto, da Polícia Judiciária, em
representação do Director Nacional da Polícia
Judiciária
Dr. Teodósio Jacinto, Director do Instituto Superior
de Policia Judiciária e Ciências Criminais
Dr.ª Hortênsia Calçada, Procuradora Geral Adjunta,
em representação do Sindicato dos Magistrados
do Ministério Publico
Dr.ª Marlene Lemos, em representação do
Conselho Regional do Norte da Ordem dos
Médicos
Manuel Carneiro Rodrigues, Inspector-Chefe e
Presidente Nacional da Associação Sindical dos
Funcionários De Investigação Criminal da Policia
Judiciária
10h30
As especificidades e as exigências da
prestação de trabalho na Investigação
Criminal
Dr. Ferreira Leite, Director Nacional Adjunto da
Polícia Judiciária (Director da DCCB)
11h00
Pausa / café
11h30
A Medicina do trabalho na Investigação
Criminal
Dr. Carlos Sobral, Médico de Medicina do Trabalho
indicado pela Ordem dos Médicos
Alterações do sono e alterações dos
ritmos biológicos
Prof. Dr. ª Martins da Silva, Instituto de Ciências
Biomédicas Abel Salazar, do Porto
Programa da Conferência
12h00
Princípios Direito Internacional do
Trabalho sobre Regime, Duração e Remuneração do trabalho
Prof. Dr. Jorge Leite, da Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra
12h30
Regime de trabalho na função pública
portuguesa - limites às normas especiais
que o excepcionem: o ART.º 79.º da LOPJ
Prof. Dr. Liberal Fernandes, da Faculdade Direito
da Universidade do Porto
13h00
Debate
13h30
Almoço
15h30
Factores stressantes na Investigação
Criminal
Dr.ª Cristina Soeiro, Psicóloga, do Instituto Superior
de Polícia Judiciária e Ciências Criminais
16h00
A realidade laboral nas polícias europeias
Gerard Greneron, Comandante de Polícia e
Secretário Geral do Conselho Europeu de
Sindicatos de Polícia (CESP)
16h30
Pausa / café
17h00
Adaptação do Trabalho na Investigação
Criminal à Lei e às suas especificidades - Soluções possíveis
Dr. A. Jorge Braga, Jurista especializado em Direito
do Trabalho, na área da Administração Pública
17h30
Debate
19h00
Encerramento
13
14
Entidades Convidadas Presentes na Conferência
Entidades
Convidadas
Presentes na
Conferência
Da Polícia Judiciária:
Dr. Artur Oliveira, Director Nacional Adjunto da
Directoria do Porto da Polícia Judiciária (Presidente
da Mesa de Honra da Conferência), em
representação do Director Nacional da Polícia
Judiciária, Dr. Adelino Salvado
Dr. Teodósio Jacinto, Director Nacional Adjunto
do Instituto Superior de Polícia Judiciária e Ciências
Criminais (Presidente da Mesa de Trabalhos - moderador da Conferência)
Dr. Ferreira Leite, Director Nacional Adjunto da
Direcção Central de Combate ao Banditismo da
Polícia Judiciária (Orador convidado)
Dr. José Alberto Abrantes, Director Nacional
Adjunto da Directoria de Faro da Polícia Judiciária
Dr. Reis Martins, Director Nacional Adjunto da
Polícia Judiciária
Dr. Paulo Rebelo, Subdirector Nacional Adjunto
da Directoria de Lisboa da Polícia Judiciária
Dr. Teófilo Santiago, Subdirector Nacional
Adjunto da Directoria do Porto da Polícia Judiciária
Dr. Massano de Carvalho, Subdirector Nacional
Adjunto da Directoria do Porto da Polícia Judiciária
Dr. Almeida Rodrigues, Subdirector Nacional
Adjunto da Directoria de Coimbra da Polícia
Judiciária
Dr.ª Cristina Soeiro, Psicóloga, do Instituto
Superior de Polícia Judiciária e Ciências Criminais
(Oradora convidado)
Dr. José André Vaz, Director do Departamento
Disciplinar e de Inspecção da Polícia Judiciária
Dr. Barbosa, Chefe de Área em representação
do Director do Departamento de Recursos
Humanos da Polícia Judiciária
Dr. Pedro Machado, Coordenador do DIC de
Braga
Dr.ª Maria do Céu Fernandes, Coordenadora do
DIC de Aveiro
Jorge Pelicano Paulus, Presidente da Direcção
Regional Norte da ASFTAO
Rente Martins, em representação da APS/PJ
Entidades Convidadas Presentes na Conferência
Da Secção Regional
do Norte da Ordem
dos Médicos:
Dr.ª Marlene Lemos, membro do Conselho
Regional Norte da Ordem dos Médicos (Mesa de
Honra da Conferência)
Dr. Carlos Sobral, Médico de Medicina do
trabalho (Orador convidado)
Do Instituto de
Ciências Biomédicas
Abel Salazar,
do Porto:
Professor Doutor A Martins da Silva (Orador
convidado)
Da Faculdade
de Direito da
Universidade
de Coimbra:
Professor Dr. Jorge Leite (Orador convidado)
Da Faculdade
de Direito da
Universidade
do Porto:
Professor Dr. Liberal Fernandes (Orador
convidado)
Juristas / Advogados: Dr. A Jorge Braga (Orador convidado)
Dr. José Vieira, Advogado
Dr. Pedro Martins, Advogado
Do Conselho Europeu Gerard Greneron, Comandante de Polícia e
Secretário-geral do CESP (Orador convidado)
de Sindicatos de
Polícia:
Da Inspecção-Geral
dos Serviços de
Justiça:
Dr. Jorge Lapa
Dr. Miguel Sá Pais
15
16
Entidades Convidadas Presentes na Conferência
Da Associação Sócio
Profissional da
Polícia / Polícia
Segurança Pública:
Alberto Torres, Presidente Nacional
Da Associação
Profissional da
Guarda Nacional
Republicana:
José Manageiro, Presidente Nacional
Do Sindicato dos
Magistrados do
Ministério Público:
Dr. ª Hortênsia Calçada, Procuradora Geral
Adjunta
Psicólogo:
Dr. Carlos Ribeiro
Da Associação de
Estudantes da
Universidade
Moderna do Porto:
Rogério Luís Preto Antão
Registos da Conferência
Registos da Conferência
1 1.º Painel: Dr. Carlos Sobral, Prof. Martins da Silva, Dr. Ferreira
Leite, Dr. Teodósio Jacinto e Dr. Calado de Oliveira
2 2.º Painel: Prof. Jorge Leite, Dr. Teodósio Jacinto, Prof. Liberal
Fernandes e Dr. Calado de Oliveira
3 3.º Painel: Dr.ª Cristina Soeiro, Dr. Jorge Braga, Dr. Teodósio
Jacinto, e Gerard Greneron, Secretário-geral do CESP
4 Aspecto geral da assistência e intervenções dos participantes
1
2
3
4
17
18
Registos da Conferência
Registos da Conferência
Ambiente dos trabalhos
Centro de Cultura e Congressos da Ordem dos
Médicos - Secção Regional do Norte
19
20
Abertura da
Conferência
Dr. Artur Oliveira
Director Nacional Adjunto da Directoria do Porto,
da Polícia Judiciária, em representação do Director
Nacional da Polícia Judiciária
A minha presença nesta conferência assume uma dupla condição, por um
lado, apresento-me em representação do Exmo. Senhor Director Nacional
da Polícia Judiciaria, Dr. Adelino Salvado e, pelo outro, naturalmente, na
qualidade de Director Nacional Adjunto na Directoria do Porto.
A incumbência que me foi transmitida pelo Exmo. Senhor Director Nacional
constitui para mim, a subida honra de trazer a esta conferência a saudação
do primeiro dirigente da Polícia Judiciária e de através dela deixar expresso
o alto apreço e relevância que este evento lhe merece.
Na verdade, impõe-se uma palavra de incentivo à Associação Sindical dos
Funcionários de Investigação Criminal pela iniciativa que agora concretiza e
que bem traduz a força e vitalidade que impulsiona a Policia Judiciária.
Permitam-me pois, que em nome do Exmo. Senhor Director Nacional formule
sinceros votos de felicitações pela realização em curso e expresse a inabalável
certeza de que o debate será profícuo, sereno e elevado para que também
por esta via, se engrandeça e se prestigie a Polícia Judiciária, enquanto
instituição incontornável no quadro dos valores do Estado de Direito.
Também em meu nome e em nome da Directoria do Porto saúdo todos os
presentes e felicito os organizadores desta iniciativa. Creio que temos pela
frente uma jornada de diálogo, de reflexão e por isso acredito que as suas
conclusões reflectirão também alguma ponderação.
A todos desejo, por isso, os melhores sucessos.
21
Dr.ª Marlene Lemos
Membro do Conselho Regional Norte,
da Ordem dos Médicos
Em nome do Conselho Regional Norte da Ordem dos Médicos agradeço o
convite formulado pela ASFIC/PJ para estar presente na mesa constituída
por tão ilustres individualidades.
Os temas propostos para desenvolvimento são oportunos, considerando
que foi, justamente nesta altura, aprovada na generalidade, a "lei geral do
trabalho".
Como médica, o tema que mais me chamou a atenção - "factores stressantes
na investigação criminal - tem uma enorme relevância, constatada no dia à
dia do nosso exercício profissional, com também com reflexos na vida familiar.
Cada vez mais teremos de nos preocupar com as condições laborais e com
o facto de elas se transformarem num factor de risco para a saúde mental
do trabalhador. O que significa que devemos tentar gerar condições cada
vez mais propícias a um bom desempenho profissional, mais saudável e
consequentemente com maior satisfação por parte de todos os profissionais.
Espero em nome do Conselho Regional do Norte, da Ordem dos Médicos,
que em conjunto consigam encontrar soluções e alertar os responsáveis
deste governo para as situações de desigualdade e de prejuízo de direitos
no regime de trabalho dos profissionais de investigação criminal da Polícia
Judiciária.
Quero mais uma vez cumprimentar a organização por esta iniciativa e desejarlhes os maiores sucessos.
Obrigado.
22
Manuel Carneiro Rodrigues
Presidente Nacional da Associação Sindical
dos Funcionários de Investigação Criminal
da Polícia Judiciária
Começo por agradecer à Ordem dos Médicos, a cedência das magníficas
instalações em que nos encontramos, para a realização desta conferência.
As minhas primeiras palavras são obviamente dirigidas a todos os associados
da ASFIC/PJ que, com a sua presença nesta conferência, demonstram uma
vontade inequívoca em contribuir para a resolução dos problemas que vão
surgindo no âmbito da vida profissional, o que significa, em termos mais
abrangentes, no âmbito da vida da Instituição Polícia Judiciária.
Seguidamente, quero dirigir um profundo agradecimento a todos os
elementos da hierarquia da Polícia Judiciária (e congratulo-me por constatar
que são em número elevado), que não quiseram deixar de estar presentes
nesta conferência, o que só poderá significar a vontade de unir esforços,
com vista à busca de caminhos coincidentes para a resolução de problemas
que afectam toda a investigação criminal.
A ASFIC/PJ, e concretamente a actual direcção da associação, sempre
defendeu como caminho fundamental conducente à resolução dos
problemas e até dos conflitos, porque julgo que ser desnecessário disfarçar
que estes surgem episodicamente no decurso da vida institucional, como
único caminho, dizia, a via do diálogo entre as partes.
O diálogo sério, o diálogo franco, a crítica construtiva, a postura directa
mesmo que por vezes incisiva, correndo até o risco de eventualmente poder
por vezes ferir ou melindrar, mas que tenha a virtude de nos fazer parar
para pensar, emendar posições mesmo que já tenham sido assumidas, se os
valores em causa justificarem a alteração de uma decisão menos correcta.
A ASFIC/PJ já o tem feito, já tem reconhecido erros de percurso e orgulha-se
dessa atitude. A ASFIC/PJ espera das outras partes, seja a nível de Direcção,
seja mesmo a nível Ministerial, a mesma postura e fará a respectiva vénia
sempre que tal suceda.
Ao longo da história, o prestígio, respeito e admiração, somente foram
granjeados por aqueles que a comunidade anónima decidiu eleger como
referências, e não pelos que, através da imposição da sua personalidade ou
atitudes se julgam a si próprios como figuras de distinção.
Abertura da Conferência
Em seguida, impõe-se uma especial referência aos ilustres oradores, figuras
sobejamente conhecidas das ciências médicas, do mundo universitário,
judiciário, policial e sindical e que passo a salientar, e aos quais, desde já,
deixo publicamente explícito o nosso profundo reconhecimento:
Prof. Doutor Jorge Leite, da Faculdade de Direito da Universidade de
Coimbra;
Prof. Doutor Liberal Fernandes, da Faculdade de Direito da Universidade
do Porto;
Prof. Doutor Martins da Silva, do Instituto de Ciências Biomédicas Abel
Salazar;
Dr. Carlos Sobral, da Ordem dos Médicos;
Dr.ª Cristina Soeiro, Psicóloga do ISPJCC;
Dr. Jorge Braga, Jurista e especialista em Direito do Trabalho na área da
Administração Pública;
Dr. Ferreira Leite, Director Nacional Adjunto da Polícia Judiciária;
Gérard Greneron - Secretário-geral do Conselho Europeu de Sindicatos de
Polícia.
Permitam-me um especial agradecimento ao Dr. Teodósio Jacinto,
Procurador-geral Adjunto e Director do ISPJCC, que acedeu prontamente
ao nosso convite para presidir à mesa da Conferência, sabendo à partida
que a mesma trata um tema complexo, que ao longo do tempo foi sofrendo
sucessivas tentativas de aperfeiçoamento, mas que no momento actual carece
de uma profunda reflexão no sentido de se encontrarem vias de simplificação,
de desburocratização e adequação, tendo sempre como pano de fundo três
vertentes essenciais:
• Que a investigação criminal encerra em si mesma procedimentos
funcionais que entroncam com valores essenciais quer da vida humana,
quer das responsabilidades inerentes a um verdadeiro Estado Democrático;
• Que o País passa por um momento complexo a nível geral e particularmente no panorama económico e laboral;
• Que os profissionais de polícia também são simultaneamente, pais,
maridos ou mulheres, companheiros, filhos, em suma... também são
pessoas que carecem de uma componente de vida social e familiar,
estabilizada.
E que melhor via poderia a ASFIC/PJ encontrar, na busca da compreensão
desta problemática, do que a realização desta Conferência, na qual foi
possível reunir um painel constituído por personalidades de tão elevado
nível, os quais mostraram prontamente um interesse inexcedível em partilhar
connosco os seus profundos conhecimentos?
Julgo que todos nos devemos congratular pela sua presença e contributo,
pois, desde logo, podemos concluir que tal se deve, por um lado ao
reconhecimento do papel fundamental que a Polícia Judiciária desempenha
na sociedade, e por outro, ao respeito que os mais diversos sectores nutrem
23
24
Abertura da Conferência
pelos profissionais que realizam a investigação criminal e que dia após dia,
noite após noite, contribuem para o prestígio da Instituição e para a
manutenção de um pilar fundamental da vida democrática, ou seja, uma
sociedade livre e justa.
O tema da presente Conferência, "O Regime de Trabalho na Investigação
Criminal", parece deixar transparecer a ideia redutora de que a ASFIC/PJ
pretendeu discutir uma questão visando um objectivo meramente
remuneratório. Quem assim pensa incorre num erro crasso. Debater as
questões inerentes à Investigação Criminal, na nossa perspectiva, abrange
um campo extremamente mais alargado, que passa pelas especificidades e
exigências desta actividade profissional, pelas diferenças relativas ao normal
funcionamento da função pública, pelas questões inerentes aos factores de
Stress que a mesma origina, pela análise dos aspectos correlacionados no
campo da medicina do trabalho, pela análise e comparação com a realidade
laboral das polícias europeias congéneres, pelas condições que o Governo
oferece aos profissionais de Polícia para o cabal desenvolvimento das suas
funções, sendo estes apenas alguns dos aspectos essenciais merecedores
de reflexão profunda.
Convirá aqui relembrar que o papel fundamental desempenhado pela Polícia
Judiciária no combate à criminalidade considerada mais gravosa e complexa
só tem sido possível fruto do constante esforço desenvolvido pelos
profissionais de polícia, não só expresso claramente e traduzido pela sua
inteira dedicação à actividade profissional, mas também pela atitude
constante de alerta e persistência manifestada junto da tutela, para que
seja feito um esforço contínuo de modernização, de aperfeiçoamento, de
investimento, de adaptação, quer de meios humanos, como técnicos e
científicos, não esquecendo nunca o vector essencial que compreende a
selecção e formação dos quadros, de forma a permitir que a Polícia se
mantenha em condições de superar os desafios a que se encontra
continuamente sujeita.
Não me compete antecipar conclusões. Compete-me sim deixar aqui expressa
com toda a clareza, em nome da ASFIC/PJ, a esperança de que esta
Conferência decorra com o elevado nível a que nos fomos habituando,
decorrente das várias realizações que levámos a efeito no passado e, apelar
a todos sem excepção aqui presentes, para que contribuam participando
activamente, seguro que, no final dos trabalhos, não haverá um só
participante que considere este dia como um mau investimento.
O Sindicalismo, nos dias de hoje, não se esgota nos recursos usuais de
reivindicação.
O sindicalismo consciente obriga a espaços de estudo, de reflexão, de debate
de ideias, de aprendizagem contínua.
É esse caminho que a ASFIC/PJ vos propõe hoje.
É essa a forma que consideramos adulta e, com que nos identificamos para
fazer sindicalismo.
Sinto-me honrado em ceder neste momento a palavra a quem sabe....
25
Dr. Teodósio Jacinto
Procurador-Geral Adjunto e Director do Instituto
Superior de Policia Judiciária e Ciências Criminais
Os temas complexos são para serem agarrados de frente. Congratulo-me
muito com esta iniciativa da ASFIC. Sempre pensei que as associações sindicais
têm um papel fundamental e que podem e devem dar um contributo
importante em temas como este. Isso significa que toda a organização está
envolvida e sem o contributo de todos os seus quadros, não será encontrada
uma solução ajustada.
O tema não me assustou nada e o Senhor Presidente da ASFIC,
apresentou-me um argumento que me convenceu de imediato: o Senhor
é Director do Instituto de formação da PJ há pouco tempo, ou seja, não
conhece os quadros da polícia e eles também não o conhecem. É uma
grande oportunidade de contactar com eles.
É obvio que eu não serei capaz de desempenhar o papel de responsável
pela formação inicial e permanente na Polícia Judiciária, se não conhecer
bem as necessidades da casa e, sobretudo, se não conhecer bem o pulsar
dos seus quadros, que são a maior riqueza da instituição.
Como tal, não podia de forma alguma deixar fugir esta oportunidade, que
já ultrapassou todas as minhas expectativas, pois vejo uma casa cheia para
um tema destes.
Congratulo-me vivamente que haja uma adesão tão grande à discussão
deste tema.
Por outro lado, quando olhei para o painel das pessoas convidadas para
intervir, algumas das quais eu já conhecia, vi que era um painel de luxo e
não quis perder mais uma oportunidade de as ouvir falar.
Também acho óptimo que se alargue a discussão à participação de colegas
europeus, o que, aliás, muito me pode ajudar no âmbito das reuniões da
Academia Europeia de Polícia, em que tenho vindo a participar.
Como aprendi nos meus tempos de Coimbra, com o professor Teixeira
Ribeiro: «está tudo mais ou menos inventado». O que significa que se há de
encontrar uma solução para estes problemas complexos que afectam a PJ,
para que esta continue a desempenhar o papel fundamental que tem neste
Estado de Direito, com o nível que todos lhe reconhecemos, ao longo destes
anos.
26
Abertura da Conferência
Felicito assim vivamente a ASFIC pelo tema, pela qualidade dos oradores e
também pelas condições de trabalho.
Estas são, no fundo, as condições de trabalho que todos nós precisamos no
dia ao dia. O local escolhido é um local fabuloso. O facto de se situar na
cidade do Porto, num dia em que a cidade está em festa,1 ou melhor, num
dia em que todos nós estamos em festa, significa que a ASFIC conseguiu
atingir o pleno. Estes aspectos também são importantes e certamente não
aconteceram por acaso. De facto, tudo isto parece ter sido pensado ao
milímetro para reunir as melhores condições para todos termos um óptimo
dia de trabalho.
Para terminar diria que sem a vossa participação, sem os vossos pontos de
vista não conseguiremos encontrar os caminhos acertados para a solução
dos problemas que se levantam.
Sem mais, daria a palavra ao Dr. Ferreira Leite.
1
O F. C. Porto e o Boavista passaram às meias-finais da Taça UEFA na noite anterior.
27
28
1.º Painel
As especificidades e as Exigências
da Prestação de Trabalho na
Investigação Criminal
Dr. Ferreira Leite
Director Nacional Adjunto da Direcção Central
de Combate ao Banditismo da Polícia Judiciária
Muito obrigado Sr. Director do Instituto Superior de Polícia Judiciária e
Ciências Criminais.
Há mais de vinte anos tive a oportunidade de fazer parte da Comissão
Pró-Sindical dos Funcionários de Investigação Criminal da Polícia Judiciária,
o que me valeu posteriormente a atribuição do n.º 34 de associado.
Mesmo tirando este facto é para mim, enquanto funcionário de investigação
criminal, uma honra e um prazer ser convidado a participar nas iniciativas
da ASFIC, muito especialmente quando se caracterizam, como esta, pela
sua oportunidade e o seu interesse.
Muito obrigado pelo convite e pela iniciativa, Sr. Presidente da Associação
Sindical dos Funcionários de Investigação Criminal da Polícia Judiciária.
Os organizadores desta Conferência tiveram a atenção para com os oradores
de lhes fornecerem atempadamente alguns tópicos em relação aos vários
temas atribuídos.
No que respeita a este, Especificidades e exigências da prestação de trabalho
na Investigação Criminal, adiantaram os seguintes:
• Impossibilidade de prever, situar e limitar no tempo as acções e diligências
policiais, quanto ao seu início, duração e término;
• A disponibilidade funcional e o carácter permanente e obrigatório (artigo
79.º da Lei Orgânica da Polícia Judiciária);
• Da necessidade de jornadas de trabalho contínuo superiores a 24 horas.
Face aos objectivos desta Conferência são claramente tópicos fundamentais
dentro do tema que me cabe tratar. Mas antes de chegar a eles, afigura-seme pertinente aflorar dois ou três pontos, o que, com a vossa permissão e
paciência, passo a fazer.
1.º Painel - Dr. Ferreira Leite
Na sua obra "Introdução à gestão - uma abordagem sistémica" (Editorial
Verbo, Lisboa, 1990) António de Sousa aponta como objectivo da gestão
de recursos humanos, e passo a citar:
A grande questão que se coloca ao gestor é a de tentar compatibilizar,
e mesmo optimizar, a interacção entre objectivos organizacionais e
pessoais. Trata-se de estruturar a organização, as relações inter-pessoais
nela e a relação de cada indivíduo com o seu cargo e as tarefas que o
compõem, de tal forma que o indivíduo ao procurar satisfazer os seus
objectivos pessoais, contribua eficiente e eficazmente para os objectivos
prosseguidos pela organização.
Fixemos desde já a necessidade, por um lado, de compatibilizar interesses,
satisfazendo os individuais sem detrimento dos colectivos e vice-versa e, por
outro, a importância de determinar os objectivos da organização para poder
gerir capazmente os seus recursos humanos.
Já agora, uma outra referência a raiar os conceitos de gestão a propósito do
que um colega espanhol chamava "A Polícia dos objectivos" (Felipe Sanz
Jimenez, in "Policia", n.º 16, Junho, 1986). Dizia-nos ele que os três
elementos básicos do processo de gestão são:
• As ideias, a que chama também o pensamento conceptual, isto é, o
formular de noções;
• As coisas, ou seja, dirigir os pormenores de execução, a gestão;
• As pessoas: conseguir, através da liderança, que as pessoas realizem os
objectivos da organização.
Ou seja, e reforçando o que o autor atrás citado já dizia a propósito das
empresas em geral, gerir recursos humanos implica que previamente se
planifique e se organize, para depois, então, designar pessoal, dirigi-lo e
controlá-lo.
Parece-me, assim, que não posso chegar aos tópicos propostos sem antes
abordar os objectivos da organização.
Ao fim e ao cabo, e penso que concordarão comigo, um qualquer horário
de trabalho deve visar a realização das finalidades da respectiva organização.
E não é que queira complicar, mas discutir o pagamento de uma qualquer
hora de trabalho é discutir a organização da Polícia Judiciária.
Tenham, então, a paciência de me acompanharem num regresso ao passado,
às origens desta Instituição, relendo os textos na perspectiva das suas
finalidades e das responsabilidades e direitos dos seus trabalhadores.
Logo a começar, o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 35.042, de 20 de Outubro
de 1945, explica a razão de ser da reestruturação a que procedeu, dizendo-nos:
29
30
1.º Painel - Dr. Ferreira Leite
A necessidade de reorganizar os serviços de polícia judiciária não carece
de justificação. Os defeitos da sua organização relativos aos quadros,
vencimentos do pessoal, funcionamento dos serviços e determinação
da sua competência são por demais conhecidos e têm-se feito sentir
nos resultados da actuação da polícia por forma a que se torna inútil
encarecer a necessidade de se lhes procurar remédio.
A finalidade desta reestruturação era a de dispor de um órgão preparado
tecnicamente e dotado de pessoal e meios adequados para realizar a
instrução, definida esta como uma função auxiliar ou pressuposto da
acusação e que tinha por fim, citando, recolher as provas indiciárias que
permitem ao acusador público atribuir ao arguido a prática de uma infracção.
Assim, a Polícia Judiciária tinha, essencialmente funções de investigação
criminal ou post-delituais.
No que respeita à prevenção, começava o legislador por remeter tal tarefa
para a polícia de segurança, por acção de presença, salvaguardando, no
entanto, a prevenção do perigo crónico da criminalidade.
Neste campo adiantava o Professor Cavaleiro de Ferreira:
Pode dizer-se que, em relação às formas de delinquência habitual, a
investigação deve ser realizada "a priori", isto é, a polícia deve ter feito
de tal forma o estudo prévio dos meios criminais e dos agentes habituais
do crime, dos seus processos, especialidades, locais de actuação e formas
peculiares de execução que, ainda quando não consiga obstar á
consumação do delito, tenha reunidos, antecipadamente, todos os
elementos necessários para a pronta determinação e captura do seu
autor.
Actividade mais aliciante, estamos de acordo, mas não esqueçamos o núcleo
primordial das tarefas da Polícia Judiciária, realizar a instrução.
O campo da gestão dos recursos humanos, a tal compatibilização dos
interesses que citei inicialmente, estava já consagrado em sede do articulado
do Decreto-Lei n.º 35.042.
O artigo 12.º estabelecia que o serviço da polícia judiciária é, para os
respectivos funcionários, de carácter permanente e obrigatório.
O artigo 26.º, por sua vez, esclarecia que o director e os subdirectores
assegurarão a permanência do serviço da polícia judiciária, fora das
horas regulamentares, por meio de turnos de funcionários de secretaria
e de investigação, de modo que a toda a hora do dia e da noite possa
executar-se qualquer serviço urgente.
1.º Painel - Dr. Ferreira Leite
Para terminar esta evocação e só a título de curiosidade, deixem-me dar um
exemplo da forma prática como então se resolviam os problemas.
Em Despacho datado de 21 de Janeiro de 1947, S. Ex.ª o ministro da
Justiça dava conta de que, citando, os resultados obtidos pela Polícia
Judiciária no último ano não atingiram o que seria razoável esperar do
número do pessoal, da especialização de funções e dos meios atribuídos
à Polícia, ainda que se considerem as naturais dificuldades do período
de transição a que ficou sujeita por virtude da sua reestruturação.
E de entre um conjunto de medidas que eram estabelecidas nesse Despacho
visando ultrapassar tal situação, uma delas estabelecia de forma nítida e
simples:
Que o horário normal de trabalho da Polícia Judiciária, até ser
normalizado o serviço, comece às 10 horas e termine às 20, com intervalo
para almoço, de maneira, porém, a que em nenhum tempo esteja
ausente mais de metade do pessoal superior ou subalterno.
Mas muito mudou nos quase sessenta anos que desde então decorreram, e
também a Polícia Judiciária.
Aliás, é nesses termos que começa o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 275-A/
/2000, de 9 de Novembro, dizendo:
As profundas alterações sociais e económicas verificadas nas últimas
décadas determinaram mudanças significativas das características da
criminalidade. A supressão das barreiras fronteiriças no quadro europeu,
a evolução tecnológica bem como a intensificação dos fenómenos
mediáticos têm vindo a contribuir para a aceleração da globalização
dos comportamentos individuais a todos os níveis, donde resulta o
aparecimento e a generalização de novas formas de criminalidade, cada
vez mais sofisticadas, opacas e imunes aos métodos tradicionais de
investigação.
É, assim, continua o legislador, crescente a convicção de que, perante
os desafios que a evolução apontada coloca, a sociedade portuguesa
não pode prescindir de uma polícia criminal especialmente preparada,
científica e tecnicamente apetrechada e dotada de uma estrutura
orgânica que lhe permita, com elevado grau de eficácia, prosseguir a
sua função decisiva no âmbito da prevenção da criminalidade, da
investigação criminal e da coadjuvação das autoridades judiciárias.
E quanto às finalidades a atingir pela Polícia Judiciária, quanto ao que em
linguagem castrense designaríamos pela sua missão, estabelecem-se, e volto
31
32
1.º Painel - Dr. Ferreira Leite
a citar, regras de aperfeiçoamento e clarificação do modelo mais apto a
combater, em especial, a criminalidade organizada e a que lhe está associada,
bem como a altamente complexa e violenta.
Digamos que os quase 60 anos decorridos desde a reestruturação de 1945
fizeram como que inverter os objectivos atribuídos à Polícia Judiciária,
passando o combate ao tal perigo crónico da criminalidade a constituir a
sua principal atribuição.
Nesta evolução, como se faz hoje a compatibilização de interesses inerente
à gestão de recursos humanos, no que a horários respeita?
Temos então o artigo 79.º:
O serviço na Polícia Judiciária é de carácter permanente e obrigatório,
diz-nos o seu n.º 1.
E o n.º 3:
O serviço permanente é assegurado fora do horário normal, por piquetes
de atendimento e unidades de prevenção, ou turnos de funcionários, tendo
os funcionários direito a suplementos de piquete, de prevenção e de turno.
Ou seja, se retirarmos a consagração dos suplementos, consequência da
sucessiva satisfação das necessidades que Maslow hierarquizava na sua
pirâmide, a solução é aqui idêntica à de 60 anos atrás!
Mas o legislador sentiu essa, chamemos-lhe assim, incongruência, e remeteu
para despachos subsequentes a definição do horário normal de trabalho, a
regulamentação do serviço de piquete e do serviço de unidades de prevenção
ou turnos de funcionários e até a possibilidade de serem estabelecidos
serviços, em regime de turno, destinados a acções de prevenção e de
investigação de crimes, sempre que tal se revele necessário.
E aqui começam as questões que tanta tinta têm feito correr.
Deixando a análise jurídica para os reputados especialistas que irão intervir
ao longo desta Conferência, interessa-me apenas apanhar o que me parecem
ser os pontos fulcrais deste tema.
O enquadramento global é feito pelo Decreto-Lei n.º 259/98, de 18 de
Agosto, que estabelece as regras e os princípios gerais em matéria de duração
e horário de trabalho na Administração Pública, como diz o ponto 1 do seu
artigo 1.º.
Nos artigos subsequentes constatamos, designadamente, que:
• O período normal de funcionamento não pode iniciar-se antes das 8
horas, nem terminar depois das 20 horas;
• O período de atendimento deve, tendencialmente, ter a duração máxima
de sete horas diárias e abranger o período da manhã e da tarde.
1.º Painel - Dr. Ferreira Leite
Desculpem-me que vos diga mas logo aqui começam as minhas dúvidas
quanto a saber se um regime destes é adequado a um corpo superior de
polícia que visa combater a criminalidade organizada, bem como a altamente
complexa e violenta.
E mais dúvidas tenho se com ele é possível dar a resposta que o legislador
de 1945 apontava. Dizia ele:
Há, na verdade, certas formas de actividade criminal para cuja prevenção
não basta a simples acção estática de presença, antes exigem aturado
trabalho de investigação e activa vigilância por agentes especializados
no conhecimento do meio e dos processos criminais. São as formas da
criminalidade habitual exercidas como verdadeiro profissionalismo por
delinquentes inveterados, muitas vezes integrados numa organização
criminosa e quase sempre esclarecidos sobre os meios de iludirem a
vigilância.
E também não será de esquecer que os cemitérios e os serviços de leitura
das bibliotecas, entre outros denominados serviços de regime de
funcionamento especial, têm uma semana de trabalho de cinco dias e meio,
enquanto a Polícia Judiciária, encarregue de combater a tal criminalidade
organizada, complexa e violenta tem uma semana de trabalho de cinco
dias.
Não pensem que estou aqui a assumir posições de patrão, que não sou a
tentar retirar direitos aos funcionários que, isso sim, sou.
Estou apenas a tentar salientar, na esteira do colega espanhol que
inicialmente citei, que os recursos humanos devem ser organizados em função
dos objectivos da organização.
Estou apenas a tentar salientar, na esteira do autor que também inicialmente
citei, que devemos sempre tentar compatibilizar os objectivos pessoais com
os da organização.
Mas continuando.
A escassez de resposta do artigo 79.º obriga, como vimos, a mais e específica
regulamentação.
Daí o Despacho Normativo n.º 18/2002, de 5 de Abril, que aprovou o
Regulamento do Horário de Trabalho do Pessoal da Polícia Judiciária.
Regulamento este marcado decisivamente pela famosa compensação
temporal e de que, se calhar e por isso mesmo, não avaliámos ainda as
qualidades e os defeitos.
Mas também não veio trazer a resposta esclarecida que faltava ao artigo
79º, como bem o demonstra a quantidade de despachos e ofícios-circulares
de esclarecimento que já motivou, e nalguns dos quais parece, por vezes,
33
34
1.º Painel - Dr. Ferreira Leite
perpassar a ideia de um não cumprimento quase generalizado dos horários
de trabalho enquanto razão justificativa daquele regime.
E nem sequer o momento o favoreceu, pois escassos meses antes despacho
interno nos havia feito descobrir que tínhamos direito ao pagamento de
qualquer meia-hora de trabalho a mais.
Caros colegas, minhas senhoras e meus senhores.
Não estou aqui a discutir a validade ou a interpretação das leis e dos
regulamentos que, como já disse, os outros intervenientes desenvolverão,
nem a tal me atrevo.
Por outro lado, também não disponho, infelizmente, de nenhuma solução
mágica que possa resolver rapidamente todo este, permitam-me a expressão,
imbróglio.
Mas os meus vinte e três anos e meio de serviço na Polícia Judiciária obrigam-me,
tal como a vocês, a contribuir com ideias que possibilitem alcançar a tal
compatibilização entre os interesses pessoais e os organizacionais, que
possibilitem, ao fim e ao cabo, alcançar um ponto de equilíbrio.
E como de equilíbrio se trata, isso exige que cada parte assuma compromissos
e ceda posições.
No que à organização respeita julgo adequado o seguinte:
1.º Preencher o mais rapidamente possível os quadros previstos na
Lei Orgânica.
Sabemos todos que os tempos não são os mais adequados para as despesas
públicas. Mas os custos resultantes do continuado não preenchimento do
quadro também são elevados, conduzindo à crónica falta de recursos
humanos, à insatisfação e à redução da eficácia.
2.º Pagar de forma efectiva o trabalho extraordinário.
Afastemos liminarmente teses que se baseiam num alegado incumprimento
reiterado e generalizado do período normal de trabalho e em que a
compensação temporal mais assume foros de punição do que retribuição.
Da mesma forma, afastemos visões de controlo burocrático e formal dos
funcionários de investigação criminal.
Somos, até prova em contrário, pessoas de bem, que procuram dar o melhor
de si próprios na realização das tarefas que à Polícia Judiciária incumbe
realizar.
3.º Estabelecer limites obrigatórios e vinculativos para trabalho
contínuo
Nas notas que nos distribuiu a ASFIC levanta situações de prolongamento
do trabalho em contínuo que não parecem, melhor dizendo, que não são
claramente adequadas aos tempos em que vivemos.
1.º Painel - Dr. Ferreira Leite
Não sou técnico para poder dizer quais são os limites, mas eles existem,
limites a partir dos quais se está a exercer uma autêntica violência sobre o
funcionário.
É obrigação de dirigentes e chefias impedir essas situações, através de um
esforço acrescido de planeamento de gestão de recursos.
Tanto mais, e penso que todos concordarão, que é muito questionável o
rendimento que se obtém quando se ultrapassam esses limites.
Mas, como eu disse, estamos a falar de equilíbrio. Vamos então ver a parte
que entendo caber-nos.
1.º Tornar efectivo o período de funcionamento e esquecer o período
de atendimento.
Somos uma Polícia e uma Polícia que combate o crime organizado. E se este
funciona vinte e quatro horas por dia, bom seria que nós também assim
funcionássemos.
Sei, sabemos todos, que não temos meios para isso.
Procure-se, então, abarcar o maior período de tempo possível.
Fujamos de conceitos próprios dos serviços burocráticos e que se prendem
com o atendimento do público ao "guichet" da repartição.
O nosso público é o cidadão, é a sociedade no seu normal funcionamento.
Façamos o seu atendimento através da preservação da sua segurança e do
seu sentimento de segurança.
Mostremos-lhes que trabalhamos tanto quanto é possível.
Ultrapassem-se, porque é necessários, os mitos que figuras como o Sherlock
Holmes e o Comissário Maigret criaram, do investigador que, sozinho, com
o seu intelecto, descobre os mais intrincados crimes.
Para responder aos grupos criminosos temos que trabalhar em grupo, não
podendo ser o clássico titular do processo, por mais brilhante que seja, o
único conhecedor dos meandros da investigação e dos detalhes dos indícios
e provas.
2.º Adoptar modelos de controlo adequados às funções desenvolvidas.
Tal como a famosa mulher do não menos famoso César, não basta sê-lo, é
preciso também parecê-lo.
Longe vão os tempos, como vimos, em que a principal actividade da Polícia
Judiciária era realizar a instrução. E quão fácil era o controlo.
Muitos se lembram, tal como eu, dos mapas estatísticos mensais, em que
um resultado negativo acarretava imediata averiguação do foro disciplinar,
tal decorrendo também do citado sistema do titular do processo.
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36
1.º Painel - Dr. Ferreira Leite
Vigilâncias, intercepções, trabalho em equipa, etc., são as realidades da
actividade de um funcionário de investigação criminal. Que controlo
exercemos? Será que todos os dirigentes e chefias conseguem, ao fim do
mês, dizer exactamente o que fez cada um dos seus funcionários?
E não tenhamos ilusões. A Polícia Judiciária já não é um, permitam-me a
expressão, um "grupo de amigos" que nem sequer enchia o edifício da
Gomes Freire.
É, e ainda bem que o é, uma organização de dimensões apreciáveis, cujo
funcionamento depende dos tais mecanismos de controlo.
Dirigentes e chefias, aqueles que o queiram ser, terão que actuar cada vez
mais como planificadores e supervisores do que como investigadores.
Aceito que não concordem. Mas a realidade está à nossa volta e não vale a
pena ignorá-la.
3.º Definir um conceito adequado de trabalho extraordinário.
Nem oito nem oitenta. Não me dêem compensação temporal por trabalhar
até às 20 horas., mas também não têm que me pagar por sair às 18 horas.
A lei consagrou-mos um regime especial, com algumas regalias, superiores
à generalidade dos que trabalham para o Estado.
Estamos aqui voluntariamente e gostamos do estatuto que nos é atribuído.
Aceitemos alguns ónus enquanto houver contrapartida.
Bom, se calhar acabei por não chegar aos tópicos que eram propostos. Mas
muito rapidamente:
Sei que é impossível prever, situar e limitar no tempo algumas acções e
diligência policiais, quanto ao seu início, duração e término. Mas também
sei que é possível, quanto a outras.
A disponibilidade funcional é isso mesmo: tenho que estar disponível sempre
que o interesse social a isso obriga e desde que não ultrapasse os limites do
que pode ser exigível, enquanto pessoa e cidadão.
O carácter permanente e obrigatório é algo que é inerente a um serviço de
polícia e que o legislador de 45 tão simplesmente caracterizou: de modo
que a toda a hora do dia e da noite possa executar-se qualquer serviço
urgente.
Se existem jornadas de trabalho contínuo superiores a 24 horas, tal deve-se
as mais das vezes e lacunas de planeamento e a um espírito paroquial que
se continua a manifestar.
Caros colegas, minhas senhoras e meus senhores.
Não vos peço a concordância. Digam-me só que teve alguma utilidade.
1.º Painel - Dr. Ferreira Leite
Dr. Teodósio Jacinto
Muito telegraficamente deixem-me dizer que a conciliação dos interesses
pessoais com os interesses da instituição é de facto absolutamente
fundamental, exactamente como o Sr. Dr. Ferreira Leite acabou de sublinhar.
Numa profissão onde a opção tem um significado muito forte deixem-me
salientar, aliás com muito agrado, que os 98 elementos (do 37.º Curso de
Inspector Estagiário) que estão em formação no ISPJCC, me parecem de
muito boa qualidade. Estiveram muito tempo à espera e vê-se, claramente,
que vieram para a polícia, por gosto, o que é fundamental para o
desempenho.
Esses aspectos que o Dr. Ferreira Leite sublinhou, do trabalho em equipa,
do controlo do desempenho, da boa gestão, tudo isso são excelentes temas
de reflexão, que teremos oportunidade de aprofundar no período de debate.
Dava agora a palavra ao Sr. Dr. Carlos Sobral, congratulando-me também
com esta maneira de reflectir estes temas em conjunto com os detentores
de outros saberes. Esta reflexão conjunta é essencial.
Como dizia recentemente um médico, também escritor - o António Lobo
Antunes - numa conferência no CEJ: o investigador tem algo parecido com
o médico, há momentos em que ele tem que decidir num milímetro, ou
num segundo... De maneira que há aqui um amplo campo comum de
experiências e saberes que tornam muito importante este trabalho conjunto.
37
38
1.º Painel - Dr. Carlos Sobral
39
A Medicina do Trabalho
na Investigação Criminal
Dr. Carlos Sobral
Médico do Trabalho, indicado pela Ordem dos Médicos
Quero começar por agradecer a amabilidade do convite que me foi dirigido
e reconhecer nesse agradecimento o Conselho Regional do Norte, da Ordem
dos Médicos, que foi quem se me dirigiu. Penso que a ASFIC solicitou ao
Conselho Regional do Norte, da Ordem dos Médicos, para indicar alguém
para fazer esta palestra, o que eu agradeço.
Agradeço também, dada a complexidade do tema, a colaboração do
Sr. Prof. Dr. Martins da Silva, que está aqui na mesa e que vai falar a seguir
a mim integrado neste painel.
O Sr. Prof. Dr. Martins da Silva é professor no Instituto de Ciências Biomédicas
Abel Salazar e também Director do Serviço de Neurofisiologia do Hospital
St.º António, além de reconhecido especialista na área do sono.
Quero confessar que fiquei bastante preocupado com o tema que me foi
proposto, uma vez que o conhecimento que eu tinha sobre a actividade dos
investigadores criminais não ia além do que é possível reter a partir da
literatura ou do cinema policial.
Contudo, foi-me chegando alguma tranquilidade a partir do momento em
que fui tomando conhecimento da documentação que a ASFIC amavelmente
me enviou.
Procura-se nesta conferência estudar a existência de riscos psicossociais e as
suas consequências para a saúde na actividade da investigação criminal.
São indicadores fortes e orientadores deste trabalho as seguintes questões:
• A impossibilidade de prever, situar e limitar no tempo as acções e eventos
policiais, quanto ao seu inicio, duração e termo,
• A necessidade de jornada de trabalho continuo superior a 24 horas,
• As consequências para a saúde física e mental e quais os limites da duração
de trabalho, a necessidade de repouso, os factores stressantes e as suas
repercussões na saúde e vida privada e familiar e social.
Penso que vamos estar rodeados nesta conferência de eminentes especialistas
em direito laboral e psicologia do trabalho que certamente se ocuparão
dessas áreas de conhecimento.
40
1.º Painel - Dr. Carlos Sobral
Pela nossa parte, abordaremos as questões
relacionadas com o ritmo "circadiano", a que
nenhum de nós pode fugir: o sono, a sua
necessidade, as consequências da sua privação, a
fadiga e a consequente necessidade de repouso.
Sabe-se que trabalhar mais de 12 horas sem
interrupção ultrapassa o aceitável para sectores
importantes como os transportes, sendo a fadiga
um dos factores que tem um contributo
importante em acidentes de viação.
Num estudo realizado em pilotos de aviação ficou
comprovado que aqueles que dormiam uma sesta,
nos seus lugares, durante 40 minutos, apresentavam melhores níveis de alerta e melhor
desempenho que os que o não faziam. Isto em
viagens de longa duração.
O efeito da privação do sono em tarefas que
envolvam a coordenação motora demonstrou ser
equivalente ao efeito da intoxicação pelo álcool:
por exemplo, 24 horas sem dormir equivalem a
uma taxa de alcoolémia de 1 grama por litro.
O humor é prejudicado pela fadiga, contribuindo
para a depressão, ansiedade, confusão,
irritabilidade, afectando assim o desempenho psico
motor. A privação do sono afecta, por exemplo, a
coordenação da mão de um cirurgião a efectuar
uma laparoscopia.
Está perfeitamente demonstrada a existência de
um relógio biológico intrínseco a todos os humanos que gere a sequência externa dos eventos
fisiológicos e do metabolismo. Sabemos assim, que
o ritmo corporal tem altos e baixos durante as
24 horas do dia, porque existem sistemas corporais
activos a certas horas e inactivos a outras.
Este relógio biológico marca assim o chamado
ritmo "circadiano».
O Sr. Prof. Martins da Silva vai explicar o que é o
ritmo "circadiano» e o que acontece quando ele
é violado. Penso que assim ficaremos a perceber
melhor a importância do sono na nossa vida do
dia a dia, as consequências da sua privação ou a
irregularidade de horários.
41
Alterações de Sono e Alterações
de Ritmos Biológicos
Prof. Dr. Martins da Silva
Professor no Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar
e Director do Departamento de Doenças do Sistema Nervoso
e Órgãos dos Sentidos do Hospital St. António, no Porto.
Sinto-me muito honrado pelo convite que me foi endereçado pela vossa
associação. Fiquei um bocado perplexo porque não é comum este tipo de
aproximação das associações profissionais e sindicatos, que não seja no
campo estrito da actividade médica ou da actividade universitária.
Agradeço sinceramente e reconhecidamente esta oportunidade, ainda por
cima porque é um assunto transversal que interessa a qualquer indivíduo e
interessa especialmente a vocês que têm um trabalho que é realmente
bastante duro e bastante exigente, como ficou demonstrado na intervenção
anterior.
É um pouco como nós quando trabalhamos na actividade médica fora do
contexto de uma certa estabilização que se tem ao fim de uns anos. No
início somos obrigados a fazer urgências e tudo isso altera de algum modo
o nosso equilíbrio ou pode alterar o nosso equilíbrio.
Para continuar a introdução do Dr. Sobral, eu vou recordar que o chamado
equilíbrio biológico relacionado com ritmos de actividade e de repouso
começou a ser descrito de modo mais sistemático nos anos 50 do século
passado e foi objecto de diversas investigações que eram centradas sobre
um tema fundamental:
Os animais têm normalmente uma actividade física que é condicionada pela
luz solar.
Vocês conhecem o que acontece aos animais domésticos, nomeadamente
às galinhas em galinheiros. Elas regressam ao repouso quando o sol se põe
e os galos cantam de manhã ao levantar do sol.
O que significa que há um equilíbrio biológico que não podemos esticar
demasiado, como diz o vosso cartaz. Nós não podemos esticar demasiado a
corda do ponto de vista biológico, porque a corda pode romper.
E pode romper por várias razões. Vejamos o que foi feito. Nesses anos 50,
um conjunto de experiências foram muito dirigidas aos efeitos o equilíbrio
biológico, da luz solar e da escuridão, o que levou a que vários grupos,
nomeadamente grupos alemães, estudassem esses efeitos no comportamento biológico em voluntários - normalmente voluntários da área médica,
como os estudantes de medicina.
42
1.º Painel - Prof. Dr. A. Martins da Silva
A «actividade 12-12» é uma actividade em que a luz é controlada durante
12 horas, a escuridão é controlada durante as outras 12 horas, estando
esses voluntários confinados em meios fechados, sem contacto com o
exterior. Neste regime12-12, a própria luz, que se assemelhava à luz solar,
era manipulada: ou seja o regime mantém-se 12-12 mas o início do "dia"
pode ser a horas diversas. Imaginemos que estávamos agora na primavera,
em que a luz solar começa a fazer-se notar às seis da manhã. A manipulação
consistia em fazer modificações de 2 a 3 horas em relação a isso, para escalas
de 12-12.
O que foi possível demonstrar na altura foi que havia ritmos biológicos
humanos intrínsecos que eram muito estáveis.
Acho que todos nós tivemos contacto uma vez ou outra com doentes que
estiveram no hospital. Se repararam bem, esses doentes têm aos pés da
cama uma tabela para registo das temperaturas. Não é por acaso que a
temperatura deve ser registada em dois momentos do dia, ou seja, de manhã
e de tarde.
Como o Dr. Sobral já referiu, há momentos do dia que a actividade física do
nosso organismo, do ponto de vista metabólico e organizacional é
completamente diferente.
Em consequência disso, a temperatura corporal é necessariamente maior à
tarde e é mínima durante a madrugada. Quando determinamos a
temperatura de manhã, ela deve ser fisiologicamente mais baixa do que à
tarde. Isto, por vezes, é um indicador fundamental.
Neste exemplo, mostrado aqui neste slide, do lado esquerdo, nós temos um
conjunto de indicações, de barras horizontais e temos pequenos triângulos.
Os pequenos triângulos em branco localizam o momento da temperatura
corporal de manhã e à tarde e o que é visto é que aquelas barras que estão
ali oblíquas, com tracejado, indicam que foram introduzidos modificações
no dormir de voluntários e que essa introdução de modificações no dormir
levou obviamente a modificações do momento do dia em que ocorrem os
valores da máxima e da mínima temperatura corporal.
Há portanto um desfasamento que se estabelece. Vocês puderam constatar,
desta maneira, que biologia é um bocadinho perturbada com algumas
actividades.
Cada um de nós, cada um de vocês e eu, temos um ritmo, que é o nosso
ritmo biológico, que é razoavelmente equilibrado, aquilo a que se chama o
ritmo normal que está ali indicado. Vejam outra vez a temperatura corporal
que é indicada por aquela linha descendente e ascendente. Aquela curva
que ali está, em que se vê que há máximos e mínimos, não interessa agora
dizer qual é o momento, mas se vocês repararem nas verticais vão ver as
horas a que isso acontece. È que há indivíduos que têm uma coisa que se
chama "um avanço de fase", em que a fase biológica é diferente com
momentos de máximos antecipados e outras pessoas em que a fase biológica
é diferente porque é atrasada (atraso de fase).
1.º Painel - Prof. Dr. A. Martins da Silva
Agora vou-vos contar o caso que se passou comigo na Consulta de Sono do
Hospital, de alguém que veio à consulta por ter exactamente um problema
de avanço de fase. Era uma senhora que acordava impreterivelmente às
duas da manhã. A essa hora já ela estava preparada para realizar uma
actividade física diária normal, realizando as lides domésticas, mas procurando
não perturbar os restantes. Mas o emprego que ela tinha só começava às
09h00 da manhã. Este desfasamento, durante anos, traduziu-se numa fadiga
excessiva, além de que, a senhora durante a tarde não conseguia trabalhar.
Estes casos são raros mas existem. Isto significa que todos temos que respeitar
um bocadinho a biologia. No caso desta senhora pode dizer-se que ela teve
um comportamento agressivo para o seu equilíbrio biológico, durante muitos
anos, que só resolveu agora quando se reformou.
Há indubitavelmente uma biologia própria que todos nós temos que respeitar.
Vamos agora falar sobretudo dos «normais», da maior parte da multidão
que somos nós. Reparem que naquelas barras horizontais brancas estão
indicados os períodos de sono, ou seja, sono nocturno entre as 22/23 horas
e as 07 da manhã. Se repararem há naquelas curvas um pico de secreção
hormonal que é completamente diferente. É o pico da hormona de
crescimento, que não é só para as pessoas crescerem, mas é também para
o seu metabolismo geral. O máximo da Hormona tem uma particularidade:
ocorre em certo momento do dia, estando relacionado com o sono (sono
inicial, Estádio II mais concretamente).
Na experiência em voluntários, mais uma vez os estudantes de medicina,
estes aceitaram fazer uma privação do sono. Reparem na barra horizontal
branca em vez de estar a cheio está vazio, o fundo é azul, ali entre as 22 e
as 6 horas, não houve sono e o sono foi empurrado para o dia seguinte
entre as 11 da manhã e as 6 da tarde.
Reparem que na noite anterior houve menos secreção da hormona, mas
quando a pessoa dorme de dia há um pico que não é tão grande, e há
diversas flutuações havendo repercussão negativa sobre o metabolismo.
Baseado nesta ideia, que de facto existem alterações provocadas no ritmo
biológico, eu queria reflectir convosco um pouco sobre a influência que a
manipulação do nosso regime de trabalho pode ter naquilo que nós somos.
Vou falar-lhes agora sobre as alterações do sono e alterações de ritmo
biológico.
Para não lhes falar de coisas que são muito fora do comum e para vocês
perceberem que isto existe, repesquei alguns dados, que são dados da
classificação internacional das doenças de sono. É uma classificação da
associação americana «American Sleep Disorderds Association» («Associação
das Sociedades Americanas de Doenças de Sono»). A segunda edição desta
classificação internacional, elaborada em 1997, é uma espécie de guia da
nossa actividade profissional.
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1.º Painel - Prof. Dr. A. Martins da Silva
Vou concentrar a atenção em duas modificações
que ocorrem, que são conhecidas por «Síndromo
das Mudanças de Meridiano» ou da chamada
«zona de tempo» (ou ainda "Jet Lag") e as
alterações do sono relacionadas com as mudanças
de turno de trabalho.
A investigadora Irene Tobler, que trabalha em
Zurique, estudou animais a quem aplicou uma
«escala de tempo» diferente. Quer isto dizer, que
ela introduziu nas 24 horas da actividade dos
animais, uma escala de 16 horas de completa
privação de sono, para depois estudá-los nas 8
horas seguintes.
O que é que encontrou? Encontrou alterações da
função da parte anterior e posterior do córtex
cerebral. A parte anterior do córtex cerebral é
aquela que nos dá maior capacidade de
organização das nossas ideias, do raciocínio, da
compreensão e também daquilo que se chama o
planeamento das nossas actividades.
Este dado experimental foi extremamente
importante (vocês são investigadores, nós também
temos o lado da investigação) pois foi, ao fim e ao
cabo, a confirmação de um outro trabalho que já
tinha sido efectuado em estudantes de medicina,
pelo grupo de Cauter.
Aquilo que Cauter fez foi uma coisa relativamente
simples:
• Foi fazer uma linha de base, entre o dia 1 e o
dia 3, em que as pessoas (os estudantes de
medicina, voluntários adultos), dormiam
8 horas, entre as 23H00 e as 07H00 do dia
seguinte;
• Depois, entre o dia 4 e o dia 9, fez uma noite
de privação parcial de sono, ou seja, àquelas
oito horas retirou quatro horas de sono e as
pessoas só dormiam entre a 01H00 e as 05H00;
• Posteriormente retomou o descanso, entre o
10º dia até 16º dia, dando a possibilidade de
as pessoas recompensarem aquelas quatro
horas que tinham perdido, com 12 horas, entre
as 21H00 e as 09H00.
1.º Painel - Prof. Dr. A. Martins da Silva
Este modelo experimental conseguiu pôr em
evidência algumas coisas que são razoavelmente
desagradáveis:
• Em primeiro lugar, que as pessoas neste
período, sobretudo à volta do nono dia, tinham
alterações metabólicas tão importantes, que
tinham comportamentos do género que tem
por exemplo um diabético,
• E que tinham dificuldades na concentração,
memorização e em outras actividades.
Quando olhamos para algumas doenças de sono,
relacionadas com os chamados «Ritmos
Circadianos» (para vos explicar melhor este termo,
isto quer dizer que há ritmos biológicos que têm
cerca de um dia de duração, circadiano é isso
mesmo que quer dizer, cerca de 24 horas, ou seja,
o nosso ritmo de máximo e mínimo da temperatura corporal, o nosso próprio ritmo de nos
deitarmos, dormir, acordar e depois retomar a
nossa actividade), basicamente o que nós dizemos
é que são perturbações de sono, dissónias quer
dizer isso, que têm em comum perturbações desse
ritmo circadiano, da alternância de sono e de
actividade, numa base de cronofisiologia, ou seja
a fisiologia que tem a ver estes ritmos biológicos.
Concentrada a nossa atenção sobre estas duas
doenças relacionadas com as doenças do trabalho
chamado pelos norte americanos «Shift Work
Sleep Disorders» ou «Síndroma das mudanças de
zona de tempo» (Jet Lag) ou das «mudanças de
meridianos», o que é que nós podemos encontrar:
Na população que trabalha por turnos (5-8 % da
população das sociedades industrializadas)
prevalece, em 2-5 % dessa mesma população,
aquilo que se chama as alterações do sono
relacionadas com as mudanças de turno de
trabalho. Esta percentagem é razoavelmente
pequena, mas a partir do momento em que isto
existe tem que ser considerado.
Retirei também alguns dados do trabalho do
Kirger, de um livro que se chama «Princípios e
práticas da Medicina do Sono», onde se demonstra
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1.º Painel - Prof. Dr. A. Martins da Silva
também que os factores biológicos diários
intervêm no próprio sono. Conclui Kirger que a
dificuldade em iniciar o sono e em manter um sono
adequado e repousado origina dificuldades no
desempenho de trabalho e cria problemas do
ponto de vista doméstico, familiar e social.
Como se pode ver as coisas complicam-se e devem
dar-nos que pensar.
Existe outra experiência interessante com base
num trabalho de voluntários jovens em 21 noites
consecutivas. Se repararem bem, cerca do 21.º
dia, entre a 3.ª e a 4.ª semana, as pessoas
habituaram-se já a um novo ritmo, ou seja, há
uma biologia que tende, outra vez, a ser
resincronizada por um novo horário. Há aqui,
claramente, uma mudança de comportamento
biológico que tem a ver com a mudança de
actividade.
Outra das alterações sobre que vos queria falar
tem a ver com as viagens rápidas através de
diversos fusos horários. Coisa que me preocupa
muito hoje em dia, sobretudo em relação a alguns
políticos, que andam sistematicamente a viajar por
vários fusos de sono, que são claros fusos
geográficos, o que pode ter consequências
gravosas sobre os mesmos. Não se fala muito nisso,
não sei porquê? Os pilotos de aviação, por
exemplo, falam muito nisso.
Nestes casos existem dificuldades comprovadas em
iniciar e manter o sono, excessiva sonolência, uma
baixa de perfomance e do alerta e sintomas
associados, predominantemente intestinais.
A severidade depende do números de meridianos
atravessados, da direcção (Este ou Oeste) e dá
origem sintomas diversos (cefaleias, irritação,
caimbras, distensão abdominal, etc) e que são mais
frequentemente encontrados em pessoas que
viajam para Leste.
De seguida vou-vos mostrar um gráfico do mesmo
livro que mostra porque é pior quando se viaja
para Este do que quando se viaja para Oeste.
Viajar, por exemplo, para a América tem menos
consequências do que quando regressamos da
América à Europa.
1.º Painel - Prof. Dr. A. Martins da Silva
Estas viagens provocam diversos sintomas de que já falei, dores de cabeça,
irritação, caibras, distensão abdominal. O que se sabe hoje em dia é que
esses sintomas não resultam apenas da privação do sono, são modificações
biológicas que aparecem sobretudo a partir do 2.º dia.
Nesse quadro temos uns indivíduos que estão em casa e que depois viajam
ou para ocidente ou para oriente. Estes são os momentos do sono. Quando
a pessoa viaja para oeste ainda vai ter sono, como vai ter ainda sono, se na
mesma noite chega, por exemplo, à Costa Americana onde vai ter que
cumprir ainda o dia que eles têm para cumprir, pois quando aí chega tem
que sincronizar pelo acto social local.
Quando regressa o que acontece é que está numa fase completamente
diferente daquela em que estava. Isso aí tem consequências, porque se não
faz a mesma coisa que é adaptar-se à nova escala de tempo, no mesmo dia,
vai ter consequências nos dias seguintes enormes, sobretudo a partir da
2.ª noite, em que vai ter dificuldades para começar a dormir.
Agora quero apresentar-vos em resumo um trabalho que recebi ainda ontem
que é o trabalho de um grupo americano, trata-se de um holandês que
trabalha num grupo americano.
Neste trabalho, agora publicado na Revista Sleep (que é a revista Oficial da
Associação Americana) foram testados 48 voluntários saudáveis repartidos
por dois grupos:
• Um grupo em que há uma noite de base, duas noites de adaptação de
sono de 8 horas e depois períodos de sono de 8, 6 e 4 horas alternados
até ao 14.º dia e depois a recuperação.
• No outro grupo fizeram uma noite de base, duas noites de adaptação
depois obrigaram as pessoas ficaram despertas 88 horas, isto é três noites
de privação, mais de três dias e depois três dias de recuperação.
O que se encontrou neste estudo, em voluntários, são alterações neuro
comportamentais, com redução da capacidade de algumas funções. O défice
de sono traduziu-se aqui, outra vez, numa vigília adicional que tem um
custo neurobiológico adicional e que é comulativo no tempo.
Mais uma vez repito, que esta minha intervenção apenas serve para reforçar
a ideia de que estes problemas existem e que devem ser encarados com o
máximo de seriedade. E, já que cada caso é um caso, quando os mesmos
existam devem ser adequadamente estudados para que mais rapidamente
se consiga o equilíbrio.
Agora, passo a palavra ao Dr. Carlos Sobral.
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1.º Painel - Prof. Dr. A. Martins da Silva
Dr. Carlos Sobral
Agradeço ao Professor Martins da Silva esta breve exposição que nos fez,
que nos tornou mais conhecedores da importância capital do sono a horas
e do repouso reparador necessário.
Na qualidade de médico do trabalho que lida com situações de trabalho
nocturno, trabalho por turnos, trabalho extraordinário em que é prolongada
a jornada de trabalho, gostaria de tecer algumas considerações à laia de
reflexões e conclusões sobre as consequências para a saúde e para o
desempenho.
Como vimos, numerosas variáveis fisiológicas e psicológicas vêm sendo
demonstradas ter um ritmo circadiano nas 24 horas do dia.
São exemplos a temperatura corporal, a alternância sono / vigília, parâmetros
cárdio-vasculares, a performance cognitiva, factores endócrinos e
imunológicos, a resposta terapêutica a certas medicações, variáveis
psicológicas de melancolia e ansiedade.
Se estes ritmos biológicos fossem meras respostas a estímulos externos, não
haveria grandes consequências, quando alterássemos os nossos horários.
A questão é que o ritmo circadiano tem uma componente endógena: a
existência de um relógio biológico nos humanos, tem sido repetidamente
demonstrada em estudos de isolamento temporal, em que os indivíduos
são completamente separados de todas as suas referências ambientais e
temporais.
Em circunstâncias normais (actividade diurna e sono nocturno), o nosso
sistema circadiano está sincronizado com o dia solar de 24 horas: as relações
normais de fase, da multiplicidade dos ritmos biológicos, são efectuadas
através de uma resposta orquestrada ao pace-maker interno.
Os estímulos externos apenas permitem ajustar o relógio biológico, que
roda um pouco mais lentamente (ciclo de 25horas), que as 24 horas de
um dia.
Estes factores externos incluem a luz, factores sociais e comportamentais,
tais como horários de refeição, horários de deitar e despertar, sendo no
entanto uns mais eficazes que outros. É o caso da luz solar natural ou luz
artificial de muito grande intensidade (7000 a 13000 Lux).
Está inclusivamente demonstrado que o efeito desfasador da luz, é
consequência de um efeito supressor da produção de melatonina pela
hipófise. A melatonina induz o sono e diminui a temperatura corporal.
A maior função do sistema circadiano é a sequênciação interna dos eventos
fisiológicos e do metabolismo.
As funções restauradoras do sono são maximizadas pela harmonia de fase
dos ritmos biológicos durante as horas nocturnas.
O trabalho nocturno está portanto desfasado em relação aos ritmos
biológicos do nosso organismo.
1.º Painel - Prof. Dr. A. Martins da Silva
Estes factores biológicos têm no entanto e como atrás vimos a capacidade
de se ajustar progressivamente a outros horários, embora a ritmos diferentes
uns dos outros. Assim sendo, após curtos períodos de actividade nocturna o
sistema circadiano estará desfasado e dessincronizado: por exemplo a
alternância sono/vigília adapta-se mais rapidamente que o ritmo da
temperatura corporal, havendo mesmo estudos que demonstram que a sua
adaptação nunca é completa.
O desvio mais óbvio da vida normal para os trabalhadores nocturnos é o
facto de permanecerem acordados durante a noite e terem de dormir durante
o dia. Nestas circunstâncias, tipicamente dorme-se menos, estabelecendo-se uma síndroma de privação crónica de sono. Na realidade a duração do
sono acaba por ser 15 a 20% inferior ao normal (4 a 6 H, comparado com
7 a 9 H).
Adicionalmente o sono durante o dia, é de pior qualidade, devido a rupturas
por despertar frequentemente, bem como desvios ao padrão normal do
sono (sono REM / Não REM).
Embora as responsabilidades domésticas, condições ambientais, os problemas
laborais, possam contribuir para as anomalias do sono, está bem
demonstrado que o factor mais determinante na duração e qualidade do
sono é o sistema circadiano endógeno.
A privação crónica parcial de sono pode ter efeitos significativos na
performance profissional e no funcionamento social. Está associada a um
aumento da irritabilidade, fadiga generalizada, sonolência diurna e redução
significativa do estado de alerta. Está provado que na condução automóvel,
uma noite sem dormir equivale a conduzir com uma alcoolémia de cerca de
1 g/litro.
Estudos incidindo sobre o bem-estar geral em trabalhadores nocturnos,
demonstram queixas e sintomas em tudo iguais aos sentidos por quem realiza
uma viagem transoceânica ou transcontinental, onde se estabelece uma
dessincronização entre o relógio biológico interno e as condições ambientais
externas à chegada (jet lag). Estes sinais e sintomas incluem a sonolência
diurna, fadiga, dificuldade em adormecer, baixa concentração, reflexos
diminuidos, irritabilidade, queixas digestivas e mesmo sentimentos
depressivos.
Intolerância ao Trabalho Nocturno
Felizmente para muitas pessoas que trabalham de noite, os sintomas daí
resultantes não são debilitantes, mas para uma percentagem significativa
vão-se intensificando, tornando-se mesmo incapacitantes em definitivo. Esta
percentagem chega a atingir em certos estudos 20% do total da população
estudada.
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1.º Painel - Prof. Dr. A. Martins da Silva
Os factores que favorecem uma intolerância ao
trabalho nocturno foram estabelecidos em estudos
de susceptibilidade individual e incluem factores
comunitários, familiares e sociais, condições de
trabalho desmotivantes e horários de trabalho
irregulares.
Síndrome de Inadaptação ao Trabalho
Nocturno
Esta designação tem sido usada para descrever a
típica constelação de sinais e sintomas observáveis
em trabalhadores com intolerância ao trabalho
nocturno.
Casos há em que os sintomas se vão agravando
com a continuação dos horários desregulados,
caminhando-se para um círculo vicioso, devido à
falta de reconhecimento e compreensão do
problema pelo próprio trabalhador, ou por outros
não familiarizados com a doença.
A incapacidade para ajustar a vida social e familiar
ao horário de trabalho, bem como horários
irregulares, contribui significativamente para o
grau de intolerância.
Se os sinais e sintomas persistem, o tratamento
recomendado passa exclusivamente pelo
afastamento do horário nocturno. A utilização de
medicamentos (hipnóticos, sedativos, ansiolíticos,
antidepressivos), é fortemente prejudicial.
Patologia Induzida / Associada ao Trabalho
Nocturno
Patologia Gastro-Intestinal
As disfunções gastro-intestinais são muito
habituais, sendo a gastrite e outras patologias
digestivas a principal causa do absentismo nestes
trabalhadores. Inclusivamente, uma vez instaladas
estas disfunções, podem não se resolver completamente após o retorno ao horário normal diurno.
A incidência de úlcera péptica (estômago e
duodeno), em trabalhadores nestas circunstâncias,
é notoriamente mais elevada que em trabalhadores com horário diurno estável, na maioria dos
estudos realizados.
1.º Painel - Prof. Dr. A. Martins da Silva
Pensa-se que as causas desta patologia são multifactoriais, envolvendo
factores dietéticos, de estilo de vida e ruptura do sistema circadiano: refeições
em horários anómalos, comida não habitual por redução da oferta de
restauração, e o ritmo circadiano da acidez gástrica e do seu esvaziamento,
que se encontram nitidamente reduzidos durante a noite.
Morbilidade Cárdio-Vascular
Tem sido relatado um efeito pernicioso do trabalho nocturno em factores
de risco cardio-vascular.
Vários estudos sugerem um aumento dos triglicerídios e do colesterol de
baixa densidade (LDL).
Tem sido notada uma associação com a incidência de hipertensão.
Resultados do estudo de Helsínquia apontam para taxas de risco de doença
cardio-vascular, onde se inclui o enfarte de miocárdio, entre 1,5 e 1,9
relativamente ao trabalho diurno estável.
Este estudo aponta mesmo para o facto de existir uma potenciação do efeito
pernicioso de outros factores relacionados com o estilo de vida, no caso de
trabalho nocturno, o que não é demonstrado para o trabalho diurno.
Patologia da Reprodução
Prematuros, Baixo Peso à Nascença e Aborto Espontãneo
Os estudos efectuados, revelam taxas de prematuridade nestas trabalhadoras
que atingem 1,6 em relação ao resto da população, o mesmo acontecendo
com o peso à nascença.
Acredita-se que este tipo de horários retarda o normal desenvolvimento
fetal.
Nos estudos referidos também ficou comprovada uma maior incidência de
abortamento espontâneo relacionada com o desfasamento de horários.
Fertilidade
Os poucos estudos realizados apontam a possibilidade de estes horários
reduzirem a fertilidade, particularmente em mulheres.
Agravamento de Doenças
Horários por turnos podem agravar certas doenças, como resultado da
ruptura do sistema circadiano, stress psicológico e/ou privação de sono.
Entre as doenças que podem ser agravadas, contam-se:
Diabetes - A produção de insulina e consequentemente a tolerância à glicose,
seguem um ritmo circadiano, razão pela qual, o horário das refeições e da
medicação, têm um papel fundamental na manutenção dos diabéticos. Toda
51
52
1.º Painel - Prof. Dr. A. Martins da Silva
a alteração a esta harmonia, acaba por ser catastrófica no seguimento e
tratamento destes doentes, tornando-se muito mais difícil o ajustamento
das doses de medicação e de nutrientes.
Epilepsia - São conhecidas há muito, técnicas de privação de sono para
desencadear descargas tipicamente epilépticas no electroencefalograma. Na
realidade está bem documentado o efeito da privação do sono no
desencadeamento de crises convulsivas em doentes com epilepsia, o que
pode ser explicado por alterações dos níveis de corticoides, que passam a
estar dessincronizados com a inversão das fases do ciclo sono / vigília.
Asma - Todos sabe muitos por experiência própria ou dos nossos filhos,
que existe uma propensão natural para o aparecimento de crises respiratórias
durante a noite. Isto tem a ver com a redução nocturna dos níveis de
corticoides e catecolaminas circulantes, redução da elasticidade pulmonar e
do diâmetro dos brônquios. É por isto que se torna obrigatória uma
adaptação da medicação nos trabalhadores nocturnos com asma.
Saúde Mental / Ruptura Psico-social - Horários irregulares tornam difícil
o cumprimento de responsabilidades sociais, paternais etc., ocasionando
graves rupturas familiares e/ou sociais.
Depressão - O potencial dos horários nocturnos ou irregulares, para
aumentar o risco de depressão está bem estabelecido e comprovado por
diversos estudos.
Conclusão
Tudo o que fica dito, demonstra a existência de factores lesivos para a saúde
resultantes da desregulação do ritmo circadiano normal, em resultado do
trabalho por turnos, trabalho nocturno, horários irregulares.
É com base nestes conhecimentos, que os médicos do trabalho procuram
nos exames de admissão ou pré-colocação, identificar características
individuais associadas à redução da tolerância ao trabalho nocturno, de forma
a estabelecer estratégias de impedimento, vigilância particular ou
aconselhamento de factores de higiene psico-fisiológica.
1.º Painel - Debate
Debate
Avelino Lima (Inspector na Polícia Judiciária do Porto)
Depois de ouvirmos o Dr. Carlos Sobral dizer que trabalhar 24 horas sem
descanso corresponde a 1 grama de álcool por litro no sangue, podemos
então concluir, por exemplo, como no caso de um dos paradigmas
apresentados, que uma situação de 72 horas contínuas, corresponde, no
mínimo, a 3 gramas de álcool por litro no sangue.
A questão que eu pretendo colocar é a seguinte: havendo uma ordem
superior para um funcionário trabalhar tantas horas, para mais, tendo de
enfrentar situações de risco, se nesse trabalho acontecer algum incidente,
se ocorrer até a prática de ilícitos, poderá ou não, quem ordena, ser
criminalmente responsabilizado por esses mesmos ilícitos?
Dr. Carlos Ribeiro (Psicólogo)
É importante saber que 24 horas sem dormir correspondem a 1 grama de
álcool no sangue. Fico a saber que graças ao trabalho que tenho vindo a
desenvolver com a ASFIC que tenho ido trabalhar muitas vezes de manhã
completamente embriagado. Não sei se também poderei responsabilizá-los
criminalmente...
Antes da questão eu faria um comentário prévio dirigido ao Dr. Ferreira
Leite, porque não queria deixar passar esta oportunidade. Falou-nos aqui
em objectivos individuais e organizacionais. Parece-me que aquilo que tem
sido feito em termos de legislação enquadradora da actividade da PJ está
tudo muito bem, mas falha-se na operacionalização. Ou seja, a utilidade
prática cai por terra. Do ponto de vista do processo está tudo muito bem,
do ponto de vista do pragmatismo isso não acontece.
Eu sugeria que quando se fazem os sistemas de avaliação ou regulamentos
de classificação (como é chamado na PJ), se ouvisse quem trabalha nas
áreas da avaliação de desempenho e se consultassem autores actuais. Falounos do «Maslow» e muito bem. Mas eu sugeria que se revisitassem outros
autores que falaram depois do «Maslow», quanto a mim bastante melhor
do que ele, como por exemplo o «Herzberg» ou o «Lawler III». É uma pista
que eu aqui deixo.
Relativamente à noção de competência da PJ eu também sugeria que se
deixasse de pegar na noção do direito de competência, que é a noção de
uma «atribuição» ou «responsabilidade» e que se revisitasse um outro autor,
que é o Sr. «Guy Le Bolterf», que nos diz que «competência é um saber agir
socialmente validado».
Assim sendo, eu só vejo um caminho para a PJ: é fazer-se aquilo que a
gestão de recursos humanos diz há muitos anos para se fazer, que é uma
«descrição de funções», uma «análise de funções», um «perfil de exigências»
e um «perfil de competências». Isto permite-nos o quê? Permite-nos, em
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54
1.º Painel - Debate
primeiro lugar, seleccionar profissionais; em segundo lugar, avaliar o
desempenho e consequentemente remunerar diferenciadamente quem mais
merece; em terceiro lugar, diagnosticar necessidades de formação e promover
os mais aptos.
Este foi o trabalho que me foi pedido pela ASFIC, que tem pautado o seu
modus operandi, como dizia o Carneiro Rodrigues, por um sindicalismo
consciente, É o único sindicato que eu conheço no país a ser mais papista
que o papa e, como à primeira vista pode parecer, a dar um tiro no pé, a
querer ser mais exigente com os seu associados do que a própria "entidade
patronal", a querer que sejam premiados os melhores e desenvolvidos os
menos aptos.
Em suma, a minha questão é: tendo a ASFIC patrocinado a construção de
um sistema de avaliação e gestão do desempenho baseado em critérios
técnico-científicos reconhecidos, que cumpre todos os requisitos
metodológicos daquilo que deve ser um sistema do género, e tendo-o
enviado ao anterior ministro da justiça, tendo colocado (com as devidas
explicações) a par do processo a actual titular da pasta, porque razão ainda
não obteve qualquer resposta?
Dr. Carlos Sobral
Eu queria sublinhar que nós não temos dúvidas de que a privação do sono
tem influências que a certa altura podem tornar-se catastróficas para o
desempenho: na coordenação motora e em todas as áreas que aí são
implicadas. Fui buscar a frase de que 24 horas sem dormir corresponde a 1
grama de alcoolémia a um artigo que li (After 24 consecutive hours without
sleep, cognitive psychomotor function declines to a level equivalent to that
associated with a 0.1 percent blood alcohol level - Dawson D, Reid K. Fatigue,
alcohol and performance impairment. Nature 1997;388:235-235) e penso
que ela deve estar minimamente certa e comprovada. Eu pediria ao Professor
Martins da Silva para complementar esta minha resposta mais
cientificamente.
Professor Dr. Martins da Silva
Eu apresentei anteriormente e de forma resumida três aspectos de uma
investigação feita num modelo animal onde se mostra claramente que
existem alterações das funções, mas não só das funções.
Na altura fiquei-me apenas pelo funcionamento do cortex frontal, da
actividade de organização, programação e da nossa resposta em relação às
modificações no exterior, que ficam notoriamente diminuídas quando há
uma privação de sono. Mas há um estudo mais completo de outro grupo,
1.º Painel - Debate
em humanos, que mostra que há modificações do fluxo sanguíneo cerebral
a algumas regiões quando acontece uma situação de stress, neste caso
quando se realiza uma actividade profissional ou de vida depois de ter feito
uma privação de sono.
Queria pegar num comentário feito pela assistência para dizer uma coisa: é
necessário que haja na selecção das pessoas o entendimento de que existe
uma biologia própria e que essa biologia própria tem de ser considerada.
A minha função aqui é só alertar de que estes problemas existem.
O que eu disse anteriormente não é uma figura de retórica, foi mesmo
ontem que chegou o último artigo que fala claramente disso: que alerta no
sentido de se ter que ter cuidado; que diz que felizmente isso não afecta
toda a gente; que nas pessoas afectadas isso tem que ser tratado, com
muito cuidado, com muita delicadeza, falando do ponto de vista médico.
Como dizia o Dr. Carlos Sobral, que tem a sua experiência, como médico de
trabalho, na selecção das pessoas estas têm que ser forçosamente avaliadas
em função disso. As estruturas, quaisquer que elas sejam, deixemo-nos de
histórias... na minha visão da vida, as estruturas foram feitas para os seres
humanos e não são os seres humanos que se têm que adaptar às estruturas.
A humanidade é feita para os seres humanos, para os seres humanos viverem
em harmonia e, se possível, em harmonia biológica.
As estruturas nas quais vivemos, trabalhamos, e que fazem parte do nosso
quotidiano social e cultural, têm que ser organizadas no sentido de não
"hostilizarem" o ser biológico que (também) é o ser humano, respeitando a
própria biologia.
E, embora seja inquestionável que devem haver regras gerais e esforço de
adaptação às mesmas (e estas regras funcionam desde há muito como
sincronizadores sociais que condicionam os nossos ritmos biológicos) não
podemos esquecer que há pessoas diferentes e para essas pessoas diferentes
têm que ser encontrados os meios de realizarem, ao serviço das instituições,
o máximo que puderem, mas obrigatoriamente de um modo diferente. Nesse
sentido, acho que a melhor selecção dos profissionais é aquela que respeita
as suas características biológicas. Esta noção é fundamental.
No caso que mostrei aqui, com voluntários, ao quarto dia de uma privação
de sono (e uma privação de sono só de quatro horas) fomos encontrar
modificações metabólicas de uma diabetes tipo II. Não entrei em pormenores,
porque sabia que o Dr. Sobral ia falar nisso. Nas modificações de diabetes
tipo II há uma resposta diferente à insulina.
Há ainda alterações cardio vasculares que podem acontecer e isso é preciso
ter-se em conta. Eu não quero de modo algum influenciar, a minha função
aqui é só dizer que estas coisas existem. E se existem tem que se manejar a
situação. No fundo é isso que vocês fazem no dia a dia, na vossa hora a
hora de trabalho, os problemas aparecem e vocês têm que os resolver.
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56
1.º Painel - Debate
Dr. Ferreira Leite
Eu não vou discutir os autores de gestão porque nesta matéria sou um
mero amador. Desconheço a proposta da ASFIC, sou sincero. Nem sempre
os Directores Adjuntos sabem tudo o que se passa na polícia, talvez felizmente
para nós. Mas o Sr. Dr. (Carlos Ribeiro) falou aí em duas ou três coisas que
eu penso que também são opinião generalizada na polícia. Aliás, o actual
regulamento de classificações está a funcionar em função de um que está
suspenso. Foi-se buscar o anterior porque se chegou à conclusão que dar as
classificações com o novo era mais trabalhoso e o resultado que se tirava
não era muito melhor.
É verdade, que o regulamento de classificações é um aspecto fundamental.
Mas antes das classificações, julgo que neste momento padecemos de outro
problema mais grave, em termos de gestão de recursos humanos, que são
o nosso historial, os nossos processos individuais. Ou seja, hoje em dia se
quiser fazer uma selecção de funcionários, para determinados serviços, de
acordo com os seus antecedentes profissionais e a sua formação, duvido
que se consiga.
A última vez que consultei o meu processo individual para o concurso de
Coordenador Superior (inspectores Coordenadores à época) verifiquei que
estavam lá as férias todas, os castigos que tinha recebido e mais nada...
Nem sequer as colocações. Se me é permitida a opinião, antes das
classificações, ainda temos este problema para resolver.
E sobre as classificações, também não vou discutir, que não sou técnico,
mas deixem-me dizer o seguinte: até que ponto é que 80 a 90% de nós não
somos cidadãos comuns e não satisfazemos nas funções? Talvez 1 ou 2%
estejam acima disso e se justifique salientar e 1 ou 2% estejam abaixo disso
e se justifique explicar porquê.
Não sei se o trabalho da ASFIC está assim bom, não faço ideia, mas também
julgo que não está tudo em falha. Mal ou bem, no sistema clássico da
legislação portuguesa, o conteúdo funcional está na lei orgânica: o que
cabe a cada um de nós fazer está lá.
Talvez haja aqui uma interpretação à luz daquilo em que se continua a
basear, na minha opinião, a organização da Polícia Judiciária, que é à luz
dos tribunais. Na minha opinião, um dos problemas é que a organização da
Polícia Judiciária continua a ser a mesma de quando o objectivo era fazer
instrução. Aliás, basta ver como é que estão em regra os departamentos
organizados, como estão os funcionários e como depois é o Director, que é
aquela «cabeça brilhante», que decide tudo. Nunca foi previsto, por exemplo,
qualquer estrutura de apoio ao Director, nem sequer, desculpem-me a
linguagem militarista, uma espécie de «Estado-maior» que possa contribuir
para o funcionamento dos departamentos. É à moda dos tribunais. Esta
talvez também seja outra questão que justificasse resolver.
1.º Painel - Debate
Eu também não sei se não está na altura, como já outros colegas meus
tiveram a oportunidade de dizer, de parar um bocadinho para pensar. Será
que o actual modelo de tudo isto que nós temos vale a pena e consegue-se
de uma maneira fácil e útil transformá-lo ou não valerá mais a pena e então
temos que começar quase do princípio, partindo do que é a realidade, do
que se pretende hoje em dia da Polícia Judiciária e não continuando a adaptar
o que vem de 1945.
Porque é um exercício que vale a pena e que eu gosto de fazer que é ir ler o
35042, ler as sucessivas leis orgânicas e verificar que a estrutura básica
continua a ser a mesma. Tudo mudou menos o legislador.
Já agora deixem-me meter a foice em seara alheia, aí a propósito do dormir
ou não dormir e porque me tocou directamente a responsabilidade criminal,
até de dar ordens nesse sentido. Nem 8 nem 80, até porque se a ordem é
ilegal a sua obrigação é não cumprir. Portanto por aí, tínhamos a questão
resolvida, em termos formais.
Em última instância e do que eu estou a perceber do que os Senhores
Doutores têm referido, então se calhar um dia destes, na selecção do pessoal
temos que incluir isto, a capacidade do funcionário para resistir a estas
mudanças de horário, porque volto à minha, somos uma polícia, podemos
ter que trabalhar 24 horas por dia e pessoas que não aguentam trabalhar
fora de horas ou passar a noite a trabalhar terão que escolher outra profissão.
É pura e simplesmente isso. Porque de outra maneira não é possível.
Isso varia pelos vistos de cidadão para cidadão, a sua capacidade de
resistência, aquilo que um consegue satisfazer para o outro é uma violência.
Mas como é que algum de nós vai adivinhar isso, quando vai dizer a um
funcionário, vamos embora trabalhar a noite toda ou coisa parecida. Eu não
sei. A não ser que cada um de nós ande com uma chapinha a dizer qual seu
limite obrigatório de horas. Acho que terá que passar por aí então.
Os que cá estamos já estamos, paciência vamos de acordo com as
características de cada um, mas para o futuro se calhar teremos de incluir
algo parecido com isso, a capacidade de resistência. E nas provas de selecção
passar a haver um teste, porque aí dou razão ao Sr. Dr., se chega de manhã
com três gramas de álcool no sangue, como disse, por causa da noite, ao
menos que fosse a sério... Sempre sabia melhor.
Manuel Carneiro Rodrigues (Presidente Nacional da ASFIC)
Queria tecer aqui uma pequena consideração relativamente a algo que o
Dr. Ferreira Leite disse na sua intervenção e que me parece de extrema
importância. Em primeiro lugar, não me admira que o Sr. Dr. desconheça a
nossa proposta de «Regulamento de Classificações», que o nosso Psicólogo
referiu, porque obviamente ela foi mandada para o Director Nacional e para
o Ministério da Justiça e, sobre ela, não obtivemos qualquer resposta até ao
momento.
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1.º Painel - Debate
Mas a questão que eu queria colocar sai um pouco ao âmbito desta discussão.
Referiu, e eu próprio muitas vezes também o defendi, que seria bom parar
para pensar. Repensar o modelo organizativo.
O Sr. Dr. Ferreira Leite referiu que provavelmente incorremos num erro
organizativo, porque nos organizamos à imagem dos tribunais. Não me
parece que estejamos organizados à semelhança dos tribunais, desde logo,
porque, a partir das 4 ou das 5 da tarde, não podemos apresentar um detido
em certos tribunais. Está aqui uma representante do Sindicato dos
Magistrados do Ministério Público, que eu muito prezo, e que certamente
me irá desculpar se isto não for correcto.
Nós, polícias, temos a obrigação de defender os valores essenciais do Estado
de Direito Democrático, mas será só a polícia que é obrigada a fazê-lo e será
só a polícia que deve ser penalizada por o fazer?
Espero ter a oportunidade de discutir isto proximamente com os colegas do
Sindicato do Ministério Público e tentarmos juntos, mais uma vez, organizar
uma conferência, se possível ainda antes do fim deste ano, para debater
este tema, o que provavelmente nos arrastará também para o modelo
organizativo da PJ, que não é assim tão parecido com o dos tribunais, como
à primeira vista pode parecer, o que não significa, obviamente, que não
tenha de ser repensado.
Dr. Teodósio Jacinto
Não resisto a dizer isto: eu não falaria só em organização da polícia e dos
tribunais. Tudo isto é o sistema de justiça penal e este tem que ser
reformulado e organizado articuladamente. O problema que temos é,
porventura, esse e já agora desafio a ASFIC a organizar uma conferência
com este tema.
Depois também quero dizer que a selecção na PJ deve ser e é para mulheres
e homens normais, que obviamente têm de produzir trabalho de grande
qualidade para o grande patrão de todos nós, que é o cidadão. É para ele
que todos nós trabalhamos.
É evidente que no Instituto também damos muita atenção às condições
físicas, à preparação física dos Inspectores Estagiários e a outros aspectos,
mas a ideia essencial que eu quero que retenham é que estamos a preparar
pessoas normais para o dia a dia da investigação criminal.
Eu fiquei deliciado a ouvir estes ilustres médicos que aqui trouxeram, porque
durante três anos andei num sistema destes, com muitas gramas de álcool
e tomar coisas para conseguir dormir. E, de facto, a grande ajuda que recebi
na altura foi a de um médico que me acompanhou. A imagem que melhor
1.º Painel - Debate
caracterizava a minha situação naquela altura era a de um elástico: a gente
vai, vai, vai esticando e depois o problema é saber se a gente volta ao mesmo
sítio ou não volta e quebra.
Mas julgo que tudo isto é conciliável. Eu sou um eterno optimista, a Polícia
Judiciária é uma polícia de alta qualidade, este problema não surgiu só agora
e, seguramente, vamos todos em conjunto encontrar o caminho para conciliar
um trabalho de grande qualidade em prol da sociedade e os interesses e os
direitos dos profissionais, como o direito ao lazer, à vida familiar, etc.
O painel seguinte já trará, seguramente, contributos para resolver estes
problemas. Aproveito para agradecer, sobretudo ao Dr. Carlos Sobral e ao
Professor Martins da Silva, porque os da casa, como o Dr. Ferreira Leite e eu
próprio, estamos aqui naturalmente por gosto, mas também por obrigação.
Julgo que da parte da Polícia Judiciária e em particular do Instituto existe
uma abertura muito grande para resolver estes problemas. É evidente que
estou aqui mais legitimado para falar em nome próprio e do Instituto, no
sentido de trabalharmos em conjunto para encontrarmos as melhores
soluções.
De seguida vamos ter o Senhor Professor Jorge Leite, com o seu profundo
saber e a sua notável capacidade de comunicação e também o Senhor
Professor Liberal Fernandes, de quem conheço os trabalhos, mas não tinha
tido ainda o privilégio de conhecer. Aplicar-se-ão a si, seguramente, as
mesmas palavras.
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2.º Painel
O regime de Trabalho na Investigação
Criminal - Princípios de Direito
Internacional
Professor Dr. Jorge Leite
Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra
1. Notas introdutórias
Antes de mais as minhas saudações a todos os presentes e os meus
agradecimentos à ASFIC pelo convite para participar nesta iniciativa, embora
pense que fui bastante temerário em aceitar falar de um tema que é complexo
quanto baste (sobretudo, mas não exclusivamente, em razão das
características da realidade extrajurídica para que remete) e que não domino
convenientemente.
Como todos reconheceremos, o pessoal de investigação da Polícia Judiciária
está sujeito, por exigências próprias das suas funções, a formas de trabalho
e a formas de organização e de gestão pouco comuns ou, talvez mais
rigorosamente, verdadeiramente excepcionais. Ora, estando eu do lado de
fora da instituição, a primeira advertência a fazer diz respeito ao risco de
«ver o filme» de que vou falar ligeiramente desfocado.
Com estas minhas palavras de abertura, pretendo conseguir duas coisas: o
reconhecimento do referido carácter temerário desta minha comunicação e
a vossa compreensão tanto para o que vai ser dito (com passos seguramente
controversos), como para o que vai ficar por dizer (as omissões serão, por
certo, várias). Posso, entretanto, acrescentar, em jeitos de compensação,
que o convite poderá funcionar como um desafio ou uma espécie de apelo
para que, no âmbito da minha profissão, não deixe de ter em conta certas
situações rebeldes a generalizações, como me parece ser o caso de que
agora nos vamos ocupar.
2. Uma tipologia de casos preocupante?
Quando acabei de ler a síntese dos quatro tipos de casos que a organização
deste encontro preparou e enviou aos convidados, a minha reacção foi esta:
não pode ser...; alguma coisa terá de ser corrigida para se eliminarem ou se
reduzirem os excessos, portadores de riscos de vária ordem que podem
62
2.º Painel - Professor Dr. Jorge Leite
originar danos irreparáveis. Mas, logo acrescentei para mim mesmo, se o
que aí está não pode ser, qual a alternativa? Eis aí uma questão central e,
por certo, uma preocupação cimeira dos organizadores deste encontro.
É certo, importa salientar, que me não é pedido que indique, ou sequer
sugira, qualquer alternativa. Verdadeiramente, o que me é pedido é que
teça algumas considerações sobre a compatibilidade ou a compatibilização
da actividade dos inspectores da Polícia Judiciária com os princípios de direito
internacional, princípios gerais, entenda-se, já que não há, ou não conheço,
princípios especificamente aplicáveis ao tipo de actividade aqui tratada.
Mas haverá, então, uma principiologia de direito internacional que nos
convide a um adequado exercício dialógico com a prática de uma dada
actividade?
3. Direito internacional
São três os sentidos com que aqui será tomada a expressão direito
internacional, desta forma nos aproximando do disposto no art. 8.º da
Constituição da República Portuguesa:
- no sentido de direito (internacional) geral ou comum, nele se incluindo,
consequentemente, todas as regras e princípios jurídicos vinculativos da
generalidade dos países. Tais regras e princípios consideram-se
automaticamente recebidos na nossa ordem jurídica ou, para usar a
expressão do n.º 1 do citado artigo da Constituição, «fazem parte
integrante do direito português». O direito internacional geral ou comum
é constituído pelas normas consuetudinárias de âmbito geral («costume
internacional») e «pelos princípios fundamentais geralmente reconhecidos
no direito interno dos Estados e que, em virtude da sua radicação
generalizada na consciência jurídica das colectividades, acabam por
adquirir sentido normativo no plano do direito internacional (por ex:
princípio da boa fé, cláusula rebus sic stantibus, proibição do abuso do
direito, princípio da legítima defesa)» (Gomes Canotilho/Vital Moreira,
Constituição da República Portuguesa, Anotada, C.ª Editora, 1993,
p. 83);
- no sentido de direito constante das convenções internacionais, que, como
referem os citados autores, inclui instrumentos identificados por diversas
expressões (tratados, acordos, cartas, pactos, convenções, etc.). Os que
aqui importa ter em conta são os instrumentos aprovados no âmbito de
organizações internacionais como a ONU, a OIT, ou, sendo de carácter
regional, o Conselho da Europa. Como dispõe o n.º 2 do art. 8.º da
Constituição, essas normas - as normas constantes de convenções
internacionais - vigoram na ordem interna se vincularem, e enquanto
vincularem, o Estado português depois de regularmente ratificadas ou
aprovadas e de publicadas no Diário da República;
2.º Painel - Professor Dr. Jorge Leite
- no sentido de direito elaborado no âmbito de organizações internacionais
de integração dotadas de poderes normativos próprios. O n.º 3 do já
citado art. 8.º da Constituição, aditado pela lei de revisão de 1982, teve
como finalidade principal a adequação do ordenamento nacional à
integração de Portugal em organizações com alguma característica de
supranacionalidade ou, dito de outro modo, em qualquer organização
dotada de poderes normativos próprios. As normas emanadas dos órgãos
competentes de instituições internacionais de que Portugal seja membro
vigoram directamente na ordem interna, como nele se dispõe, desde
que tal se encontre estabelecido nos tratados constitutivos. Este
aditamento, parecia, obviamente, destinado a preparar o caminho da
adesão de Portugal à então Comunidade Económica Europeia.
4. Princípios gerais
Tendo em conta o sentido atrás enunciado, poderá falar-se de princípios
gerais de direito internacional eventualmente incompatíveis ou dificilmente
compatíveis com as descritas práticas profissionais da actividade dos
inspectores da Polícia Judiciária?
Compreendo que não estejam aqui para me ouvir falar sobre o sentido do
termo princípios na expressão princípios de direito internacional, um
problema de teoria do direito suficientemente complexo cujo tratamento
seria, no mínimo, deslocado. Digamos que os princípios gerais são uma
espécie de normas mais abstractas, vagas, fundamentais, estruturantes do
que a generalidade das demais normas por vários autores designadas por
regras jurídicas, são, dito por outras palavras, linhas de orientação de todos
os operadores jurídicos (legislador, tribunais, administração pública) com
vocação para modelar o próprio ordenamento de que fazem parte integrante.
Penso que poderei limitar as minhas considerações aos princípios seguintes:
o da preservação da integridade pessoal (da vida, da integridade física, da
integridade moral), o da limitação da indisponibilidade, o da conciliação da
vida profissional com a vida familiar e o da adaptação do trabalho ao homem.
Como facilmente se poderá concluir são princípios que reciprocamente se
implicam e se influenciam.
5. Princípio da prevenção
Também aqui se poderia dizer que «no princípio era a prevenção», no sentido
de que, no princípio, está a previsão e a eliminação dos riscos porque, antes
de tudo, está a integridade física, a saúde, a vida de todos e de cada um e,
portanto, também de quem trabalha enquanto trabalha, aqui se fundando
o direito do trabalhador a boas condições de saúde e de segurança e a
correspondente obrigação do empregador - de todo e qualquer empregador,
privado ou público - de adoptar todas as medidas adequadas à preservação
dos referidos bens fundamentais.
63
64
2.º Painel - Professor Dr. Jorge Leite
O empregador não está, pois, apenas obrigado a abster-se de qualquer
conduta que agrida a vida ou a integridade física ou moral dos trabalhadores
ao seu serviço. Sem deixar de continuar a ser um devedor passivo universal,
encontrando-se, consequentemente, obrigado, como todos as demais
pessoas, a abster-se de qualquer conduta que agrida os bens essenciais de
natureza pessoal daqueles que estão ao seu serviço, o empregador é também,
por força do vínculo que o liga aos respectivos trabalhadores, um autêntico
devedor de segurança, encontrando-se, nessa qualidade, adstrito a
adoptar, como diz a lei, as medidas adequadas a eliminar os riscos, a substituir
os materiais e processos com riscos por outros sem riscos ou com menores
riscos, a recorrer a equipamentos de protecção colectiva e de protecção
individual, dando prevalência aos primeiros, a realizar os exames médicos
recomendados, a formar e a informar os trabalhadores como via indispensável
à preservação dos referidos bens pessoais.
Ora, pode dizer-se com segurança, a comunidade internacional, através de
organizações de carácter universal ou regional, e as comunidades nacionais,
nestas incluída, naturalmente, a portuguesa, mobilizaram uma série de textos,
mais ou menos solenes, dirigidos à preservação da integridade pessoal dos
trabalhadores, textos de que resulta, como é pacificamente aceite, o princípio
aqui enunciado. «Qualquer membro, dispõe, por exemplo, o n.º 1 do art.
4.º da Convenção (C) n.º 155 da Organização Internacional do Trabalho
(OIT), deverá (...) definir, pôr em prática e reexaminar periodicamente uma
política nacional coerente em matéria de segurança e saúde dos trabalhadores
e ambiente de trabalho» (a C 155 foi aprovada para ratificação pelo Decreto
1/85, de 16 de Janeiro).
Os Estados Partes no presente Pacto, dispõe, por sua vez, o art. 7.º e sua
alínea c) do PIDESC, reconhecem o direito o direito de todas as pessoas de
gozar de condições de trabalho justas e favoráveis, que assegurem (...)
condições de trabalho seguras e higiénicas», devendo as medidas destinadas
a assegurar o pleno direito de todos a gozar do melhor estado de saúde
física e mental compreender, como acrescenta a alínea b) do n.º 2 do art.
12.º, necessárias para assegurar «o melhoramento de todos os aspectos (...)
da higiene industrial» (o Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos,
Sociais e Culturais foi aprovado para ratificação pela Lei n.º 45/78, de 11 de
Julho).
No âmbito da União Europeia, referem-se à mesma questão o ponto 19 da
Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais do Trabalhadores - «todos os trabalhadores devem beneficiar de condições satisfatórias de
protecção da saúde e de segurança no meio onde trabalham» - e sobretudo
a designada directiva-quadro sobre promoção da melhoria da segurança e
da saúde dos trabalhadores cujo art. 5.º dispõe que «a entidade patronal é
obrigada a assegurar a segurança e a saúde dos trabalhadores em todos os
aspectos relacionados com o trabalho», devendo tomar as medidas para o
2.º Painel - Professor Dr. Jorge Leite
efeito necessárias (art. 6.º/1), constituindo a melhoria da segurança, higiene
e saúde dos trabalhadores, como se declara no 13.º considerando, um
objectivo que não pode subordinar-se a considerações de ordem puramente
económica» (itálico meu).
Em sentido idêntico se pode referir a Carta Social Europeia, do Conselho da
Europa, revista em 1996, e aprovada para ratificação pela Resolução da
Assembleia da República n.º 64-A/2001, de 17 de Outubro, cujo art. 3.º,
Parte II, se refere às obrigações a que as Partes se comprometem em matéria
de segurança, saúde dos trabalhadores e do meio de trabalho.
6. O princípio da limitação da heterodisponibilidade
A duração do trabalho e a sua organização - a sucessão tempo de trabalho/
/tempo de repouso - têm, como já se referiu, fortes implicações na saúde e
segurança no trabalho, interferindo, consequentemente, com o princípio
referido no ponto anterior e com os bens pessoais correspondentes - a vida,
a integridade física... Aqueles dois factores têm, porém, estreitas implicações
no âmbito de outros direitos fundamentais.
Naturalmente, todos temos o dever (social) de trabalhar. Trata-se de um
dever básico de solidariedade, como o recordava o poeta popular António
Aleixo numa das suas conhecidas quadras: «Quem trabalha e mata a fome/
Não come o pão de ninguém/Mas quem come e não trabalha/Come sempre
o pão de alguém».
Uma coisa, porém, é o contributo de cada um para a preservação e o
progresso da humanidade, outra, bem diferente, é a redução da vida ao
trabalho ou a pouco mais do que o trabalho, como se de uma questão
meramente residual se tratasse. A compreensão e a adesão ao dever (social)
de trabalho não justificam, porém, que outros, desde logo o Estado, nos
possam transformar em «wokólicos». Como tenho sublinhado com alguma
frequência, e agora aqui repito, eu não sou um «religioso do trabalho». Se
ter trabalho é, nas nossas sociedades, uma questão básica para cada um de
nós, se é importante o que cada um de nós faz no âmbito da sua actividade
profissional - importante para quem o realiza e para os demais que com ele
partilham a mesma experiência comunitária - não é, por certo, menos
importante o que cada um de nós faz ou deve ou pode fazer para além
dele. Todos temos necessidade de espaços da nossa vida para preenchermos
com as nossas necessidades e preferências.
Ora, a ideia de disponibilidade permanente - se por esta se entender o que
a expressão sugere - entra, manifestamente, em rota de colisão com o
princípio aqui enunciado. A limitação da heterodisponibilidade, que é como
quem diz, a protecção do direito a ter vida extraprofissional, não é
incompatível com situações de disponibilidade temporária, mas dificilmente
será compatível com situações de disponibilidade permanente ou com
situações que ultrapassem as fronteiras da razoabilidade. A obrigação de
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66
2.º Painel - Professor Dr. Jorge Leite
disponibilidade permanente, no sentido de obrigação de resposta, a todo o
momento, às solicitações da entidade para a qual presta serviço não pode
ser imposta como uma regra de vida.
Insisto nesta ideia: o princípio aqui enunciado, com as mais diversas
projecções normativas, tais como a da limitação do dia de trabalho, a do
prévio conhecimento das horas de início e de termo da jornada de trabalho,
a das restrições ao trabalho suplementar... - não se confunde, embora com
ele interfira, com o princípio da preservação da integridade pessoal do
trabalhador. O princípio agora tratado da limitação da heterodisponibilidade
é antes, apenas, uma outra forma de afirmação do princípio ou do direito
de cada um de nós a um espaço de tempo próprio, a uma vida pessoal, no
sentido amplo de vida extraprofissional, de que possa dispor.
Com este preciso sentido de direito a espaços significativos da sua vida
durante os quais seja senhor de si - o que não sucede durante o tempo de
trabalho nem, ainda que com diferente intensidade, durante o tempo de
disponibilidade (tempo de ausência de, pelo menos total, autodisponibilidade) - o princípio aqui enunciado não se encontra expressamente
consagrado em qualquer texto internacional, mas, como se me afigura
inequívoco, induz-se de uma vasta gama de normas de múltiplos textos da
OIT, da ONU, do Conselho da Europa, da União Europeia e também,
naturalmente, de várias normas da maior parte dos ordenamentos jurídicos.
7. O princípio da conciliação da vida profissional com a vida familiar
Estreitamente ligado com o princípio acabado de descrever está o princípio
da conciliação da vida profissional com a vida familiar, precisamente por se
entender que a primeira, a vida profissional, não pode anular a vida
extraprofissional de que a vida familiar é uma das suas mais importantes
dimensões.
A família vem merecendo, porém, um tratamento expresso «autónomo»
pelo lugar que ocupa na vida de cada um. «A família, pode ler-se no n.º 16
da Parte I da Carta Social Europeia, como célula fundamental da sociedade,
tem direito a uma protecção social, jurídica e económica apropriada para
assegurar o seu pleno desenvolvimento», uma protecção que o art. 16.º da
Parte II desenvolve. Mais expressivo do princípio aqui referido é, porém, o
n.º 27 da Parte I que se refere ao direito das pessoas com responsabilidades
familiares de ocupar um emprego «sem ser submetidas a discriminações e,
tanto quanto possível, sem que haja conflito entre o seu emprego e as suas
responsabilidades familiares» e que o art. 27.º da Parte II concretiza.
Este é um princípio constitucionalizado desde a lei de revisão de 1997 que
alterou a alínea b) do n.º 1 do art. 59.º Como deste passou a constar, «todos
os trabalhadores (...) têm direito (...) à organização do trabalho (...) de forma
a permitir a conciliação da actividade profissional com a vida familiar».
2.º Painel - Professor Dr. Jorge Leite
8. O princípio da adaptação do trabalho ao homem
Um dos princípios gerais de orientação do empregador na aplicação das
medidas necessárias à defesa da segurança e da saúde dos trabalhadores é
o da adaptação do trabalho ao homem em todos os aspectos relevantes e,
em especial, no que respeita à escolha dos equipamentos de trabalho e dos
métodos de trabalho e de produção. É assim que se lhe refere, na alínea d)
do n.º 2 do art. 6.º, a Directiva 89/391/CEE, do Conselho de 12 de Junho de
1989, a designada directiva-quadro, relativa à aplicação de medidas
destinadas a promover a melhoria da segurança e da saúde dos trabalhadores
no trabalho. Evitar os riscos, avaliar os riscos que não possam ser evitados,
combater os riscos na origem, ter em conta o estádio de evolução da técnica,
substituir o que é perigoso pelo que é isento de perigo ou o que é menos
perigoso, planificar a prevenção como um sistema coerente (...), dar
prioridade às medidas de protecção colectiva em relação às medidas de
protecção individual e dar instruções adequadas aos trabalhadores são os
restantes oito princípios enumerados na citada directiva.
Três notas a propósito do princípio em análise consagrado na referida norma
comunitária:
- a primeira para salientar que a adaptação do trabalho ao homem tem a
natureza de um princípio geral de prevenção;
- depois para sublinhar que o âmbito do referido princípio se não reduz à
concepção dos postos de trabalho, à escolha dos equipamentos, dos
métodos de trabalho e de produção, antes se refere a todos os aspectos
atinentes à protecção da saúde e da segurança, ou seja, a repercussão
deste princípio na obrigação de saúde e de segurança tem um alcance
mais amplo do que pode parecer à primeira vista;
- finalmente para chamar a atenção para o facto de a atenuação do trabalho
monótono e cadenciado e dos seus efeitos sobre a saúde ser apenas
uma parte das finalidades prosseguidas com o referido princípio.
A meu ver, a lei portuguesa não transpõe correctamente este princípio do
direito comunitário. Como dispõe a alínea g) do n.º 2 do art. 8.º do Decreto-Lei n.º 441/91, de 14 de Novembro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 133/99,
de 21 de Abril, e pela Lei n.º 118/99, der 11 de Agosto, o empregador deve
adoptar as medidas necessárias no âmbito da sua obrigação de segurança,
tendo em conta, entre outros, o princípio segundo o qual deverá «organizar
o trabalho, procurando, designadamente, eliminar os efeitos nocivos do
trabalho monótono e do trabalho cadenciado sobre a saúde dos
trabalhadores».
Ao mesmo princípio se refere a C 155 da OIT quando inclui entre as várias
esferas de acção a ter em conta na política de saúde e de segurança a esfera
das «relações existentes entre os componentes materiais do trabalho e as
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2.º Painel - Professor Dr. Jorge Leite
pessoas que o executam ou supervisionam, assim como a adaptação das
máquinas, dos materiais, do tempo de trabalho, da organização do trabalho
e dos processos de trabalho às capacidades físicas e mentais dos
trabalhadores».
A afirmação deste princípio representa uma espécie de reacção contra a
concepção taylorista, de alguma forma prolongada no modelo fordista, em
que o homem parecia uma espécie de prolongamento da máquina a que,
consequentemente, deveria adaptar-se. Este princípio aparece, contudo, com
frequência, reduzido a uma questão quase física, como se pouco mais fosse
do que um capítulo da ergonomia. Ora, a adaptação do trabalho ao homem
não tem a ver apenas com a adequação do posto de trabalho ao trabalhador
que o ocupa, antes apelando também a vários outros factores, designadamente de ordem psicológica e social.
Aqui chegados, creio que não será necessário qualquer esforço para concluir
que os casos descritos do Paulo, do João, do Idalécio e do Pedro estão em
(perigosa) rota de colisão com os descritos princípios de direito internacional,
poucas dúvidas me restando quanto à desadequação de algumas práticas
em relação ao quadro normativo aplicável e, consequentemente, quanto à
conveniência ou necessidade da modificação de tais práticas.
Resta-me reconhecer que há problemas de resposta difícil. Sei, no entanto,
que uma sociedade democrática e livre não pode dispensar um serviço como
o da polícia judiciária. Diria mesmo que a sociedade será tanto mais livre e
civilizada quanto melhor funcionarem os serviços correspondentes - mais
civilizada por se encontrar mais protegida contra a lei do mais forte; mais
livre por dispor de condições de segurança que melhor permitam desenvolver
a personalidade dos seus membros.
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Regime de Trabalho na Função Pública
Portuguesa - Limites às normas especiais
que o excepcionem: art. 79.º da LOPJ
Professor Dr. Liberal Fernandes
Faculdade de Direito da Universidade do Porto
Antes de mais queria agradecer o convite que me foi dirigido para estar
aqui presente e cumprimentar os meus colegas de mesa.
Cabe-me falar - e vou ser breve, dado o adiantado da hora - sobre o artigo
79.º, da Lei Orgânica da PJ, que versa sobre o serviço permanente na PJ.
Como facilmente se deixa antever, trata-se de uma norma que exerce um
papel determinante na caracterização das relações laborais na PJ, em
particular no que respeita à organização do tempo de trabalho. Relativamente
a esta matéria, irei abordar, tal como me foi proposto, alguns aspectos que
têm directamente a ver com o alcance daquela norma.
Com vista a aferir o significado jurídico dos princípios da permanência e da
obrigatoriedade do trabalho na PJ - significado que o legislador não cuidou
de precisar pelo menos de forma expressa ou explícita -, importa, em primeiro
lugar, estabelecer um confronto entre o artigo 79.º e o artigo 172.º da
mesma lei para apurar até que ponto aquelas características afastam da
disciplina aplicável à organização do tempo de trabalho na PJ o disposto na
lei geral da função publica, tendo presente que a segunda daquelas normas
considera este último regime aplicável supletivamente. Ou seja, por força
do artigo 172.º da Lei Orgânica, o regime vigente para a função pública em
geral é aplicável aos agentes da PJ em tudo que não contrarie o disposto
naquele diploma.
Ora, não definindo o artigo 79.º o que deve entender-se por permanência e
obrigatoriedade do serviço, podemos perfeitamente questionarmo-nos sobre
o significado destes conceitos: será que, não obstante o disposto no artigo
172.º, os agentes da PJ estão sujeitos a um regime de excepção que lhes
impede de beneficiar directamente do regime da função pública no que
respeita especificamente à duração do tempo de trabalho, de tal modo que
os princípios vigentes para a função pública em geral só lhes são aplicáveis
em caso de remissão expressa? Ou, diferentemente, será que os agentes da
PJ gozam em termos imediatos do estatuto geral da função pública, com
ressalva das disposições específicas contidas na respectiva lei orgânica?
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2.º Painel - Professor Dr. Liberal Fernandes
A primeira posição significaria que, relativamente aos restantes trabalhadores
da Administração, os agentes da PJ estariam sujeitos a um estatuto autónomo
ou de excepção em matéria de duração do trabalho. Com um tal alcance,
poderíamos concluir que os princípios da permanência e da obrigatoriedade
do serviço colocariam os agentes da PJ numa situação em que não
beneficiariam de alguns dos princípios jurídicos sobre os quais o Prof. Jorge
Leite acabou de falar.
Contudo, parece-me que a melhor interpretação será aquela que entende
que, no domínio em que nos situamos, os agentes da PJ beneficiam de
forma imediata do estatuto geral da função publica, embora sujeitos às
especificidades previstas na respectiva lei orgânica.
Esta posição parece ser confirmada pelo próprio artigo 79.º, n.º 5, preceito
que manda aplicar directamente (sem prejuízo do regime geral da função
publica) aos agentes da PJ os princípios do direito da função pública,
relativamente ao serviço prestado em regime de turno; além disso, a norma
do artigo 172.º consagra igualmente a regra segundo a qual os agentes da
PJ beneficiam do regime vigente para a função pública.
Ou seja, em face destas remissões, é possível concluir que, apesar de
permitirem constituir um regime especial de duração de trabalho, as
características da permanência e da obrigatoriedade não prejudicam a
aplicação dos princípios fundamentais do direito da função pública,
designadamente as regras relativas à duração semanal do trabalho, ao limite
máximo do período normal de trabalho, ao descanso semanal, ao horário
de trabalho (Decreto-Lei n.º 259/98, de 18/8).
Em face disto, o problema que se coloca é saber que especificidades ou
desvios (e respectivo âmbito) as cláusulas gerais da permanência e
obrigatoriedade permitem caucionar em matéria da duração do trabalho
relativamente ao direito geral da função publica. Ora, na ausência de regras
específicas, haverá que recorrer aos princípios gerais da necessidade e da
proporcionalidade para delimitar esse estatuto. (Como se verá, essa
especificidade laboral tem exclusivamente a ver com a prestação de serviço
em regime de piquete e de prevenção).
Antes de prosseguir, convirá colocar a seguinte questão prévia: que razões
justificam que o trabalho na PJ tenha carácter de permanência e de
obrigatoriedade? Com efeito, uma coisa é o serviço de prevenção ou
investigação criminal funcionar permanentemente, outra é os trabalhadores
adstritos a esse serviço estarem sujeitos a um regime de trabalho com aquelas
características. Trata-se de realidades jurídicas distintas, entre as quais não
há qualquer relação de necessidade ou continuidade jurídica: é que se o
serviço em causa estivesse organizado na sua globalidade em regime de
trabalho por turnos, não haveria fundamento para que o trabalho prestado
na PJ apresentasse natureza específica.
2.º Painel - Professor Dr. Liberal Fernandes
Contudo, duas ordens de razões poderão justificar as referidas características:
uma, de natureza económico-financeira, tem a ver com o facto de o recurso
ao regime de piquete e prevenção constituem formas de organização do
serviço que obstam à "duplicação de efectivos sem sujeitar os funcionários
a regime de trabalho excessivamente penoso" (Despacho do Ministro da
Justiça n.º 248/96); a outra razão, de natureza jurídico-policial, prende-se
com o interesse em criar corpos de intervenção aptos a responderem de
forma imediata e permanente às necessidades relacionadas com o
cumprimento das funções da PJ.
Dito isto, o que deverá entender-se por serviço permanente, serviço
obrigatório ou disponibilidade funcional, tal como prevê o art. 79.º da Lei
Orgânica?
Em primeiro lugar, os dois primeiros termos não podem ser entendidos de
acordo com o seu sentido comum. Com efeito, constitui um princípio do
Estado de direito democrático a tutela da liberdade de trabalho, a qual
engloba igualmente a liberdade de não trabalhar e a proibição do trabalho
forçado ou obrigatório; também o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis
e Políticos (art. 8.º) e a Convenção Europeia dos Direitos do Homem
(art. 4.º) proíbem o trabalho forçado. Do mesmo modo, o art. 59.º, n.º 1,
alínea d) da Constituição proíbe o trabalho permanente, na medida em que
garante o direito ao repouso e a um limite máximo de jornada de trabalho.
Por isso, somos da opinião que o verdadeiro significado jurídico daquelas
expressões consiste no facto de o agente da PJ estar sujeito a um dever de
maior disponibilidade funcional que não é idêntico ao que recai sobre os
trabalhadores da Administração abrangidos ao regime geral. A consequência
mais evidente desse dever consiste no facto de poderem ser exigidos, com
carácter de regularidade, ao agente da PJ períodos contínuos de trabalho
superiores aos períodos normais, estabelecidos na lei geral. Ou seja, o artigo
79º da Lei Orgânica sujeita o agente da PJ a um dever específico ou legal de
maior disponibilidade para o serviço, cujo fundamento jurídico reside na
própria natureza do serviço prestado pela PJ. Tal disponibilidade
consubstancia-se, ainda nos termos daquela norma, na obrigação de o
agente, para além do período normal diário (ou semanal) de trabalho, prestar
serviço em regime de piquete, em unidades de prevenção e em regime de
turnos, sempre que lhe for exigido pela entidade a quem compete definir a
organização do tempo de trabalho.
Subsiste, porém, um problema que a lei não resolve - mas cuja solução
passa naturalmente pela aplicação de critérios pautados pela razoabilidade
jurídica - e que é o de saber a partir de que momento é que cessa esse dever
de maior disponibilidade, ou seja, ao fim de quantas horas de serviço
consecutivo, seja contabilizado ao dia ou em termos de semana de trabalho,
pode o agente recusar-se a continuar a integrar um serviço de piquete ou
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2.º Painel - Professor Dr. Liberal Fernandes
de prevenção ou de turno?. Pode o agente que, por exemplo, esteve numa
acção de vigilância 72 horas consecutivas recusar a prestação do serviço
normal nos restantes dois dias de trabalho da semana? É claro que existem
alguns limites a partir dos quais se reconhece, de acordo com critérios de
razoabilidade jurídica, ao agente o direito de recusar continuar a prestar o
serviço permanente; contudo, todos nós sabemos as implicações a nível
disciplinar que, por vezes, semelhantes actos podem desencadear.
Como ficou implícito no que atrás disse, as características da permanência e
a obrigatoriedade do serviço não prejudicam a aplicação ao agente da PJ
das regras relativas à duração normal de trabalho, semana de trabalho,
descanso semanal e descanso complementar (Decreto-Lei n.º 259/98, por
força do art. 172.º da Lei Orgânica da PJ). Isto significa que o trabalho
prestado para além das 7 horas por dia (ou das 35 horas por semana), isto
é, o trabalho prestado em regime permanente, nos termos do art. 79.º da
Lei Orgânica, deve ser classificado como trabalho suplementar, pelo que a
respectiva prestação está sujeita, na ausência de qualquer previsão desta
última lei, ao regime estabelecido nos artigos 25.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 259/98, isto não obstante o legislador poder fixar regras próprias
neste domínio da duração do tempo de trabalho na PJ.
O facto de tratar-se de uma actividade destinada a satisfazer uma necessidade
regular ou normal da PJ não lhe retira o carácter de trabalho suplementar,
porquanto se trata de uma situação que "resulta de uma imposição legal"
(art. 26.º, n.º 1, in fine, do Decreto-Lei n.º 259/98).
Quanto à respectiva compensação, apenas direi, para terminar dado o
adiantado da hora, que, não havendo normas específicas na Lei Orgânica,
só resta aplicar as regras definidas nos artigos 28.º e seguintes, pelo que o
serviço permanente tanto pode ser compensado com acréscimo retributivo,
como através de dedução no período normal de trabalho.
Muito obrigado pela Vossa atenção.
2.º Painel - Debate
Debate
Joaquim Conceição (Inspector na DCCB)
Atendendo à matéria trazida para esta mesa, gostaria de apresentar ao
senhor Presidente da Mesa, na qualidade de jurista e simultaneamente de
policia e com a devida vénia ao Professor Jorge Leite, cientista juslaboralista
de conceituado nome, a análise de um documento que aqui trago, solicitando
também que o mesmo possa ser distribuído por cópias a todos os presentes.
Muito obrigado.
Arnaldo Silva (Inspector Chefe na Polícia Judiciária do Porto)
Só queria colocar uma questão. Será legal pagarem-me a hora que trabalho
a mais, depois do meu trabalho normal de 7 horas diárias, a 500$00, quando
o meu valor hora para efeitos de vencimento é de 3 contos? Se trabalhar
essas horas a mais pagam-me 500$00 por cada hora, mas se faltar
descontam-me 3 contos por cada hora, será legalmente correcto?
Rui Abreu (Inspector na Polícia Judiciária do Porto)
Será admissível, à luz do direito laboral actual a existência de um serviço
previsto, programável e logo efectuado com escala, com a duração de 24
horas?
Já agora queria suscitar outro comentário, ainda a propósito: caso esse serviço
se possa prolongar, previsivelmente, para além das 24 horas, qual é a situação
jurídica do funcionário que se recuse a prestar essas horas a mais?
Moreira Mendes (Inspector na Polícia Judiciária do Porto)
Tenho uma questão a colocar aqui pelo senhor Gerard Greneron, Secretário-Geral do Conselho Europeu de Sindicatos de Policia, dirigida ao Prof. Jorge
Leite, que é a seguinte: partindo das constatações cientificas aqui já
apresentadas, acredita que as condições de trabalho na PJ, estão em
conformidade com o art. 3, da Carta Social Europeia, que estipula no seu
artigo n.º 1, as obrigações de por em prática e reexaminar periodicamente
uma política social coerente, que tem que ter como objectivo primordial a
prevenção de acidentes e problemas de saúde, relacionados com a prestação
de trabalho? Na sua opinião, o seu não cumprimento poderá legitimar uma
reclamação colectiva, ao abrigo do direito internacional?
Miguel Rodrigues (Inspector na Polícia Judiciária do Porto)
Queria colocar uma questão dirigida ao Prof. Liberal Fernandes, que já a
esclareceu parcialmente, que é a questão da remuneração do trabalho que
vai além das 7 horas diárias, que, se bem compreendi, podemos remeter
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74
2.º Painel - Debate
para a lei geral. Mas a lei geral fala também de compensação temporal. Em
termos concretos, gostaria de saber como é que o trabalho extraordinário
na Polícia Judiciária pode ser compensado através dessa compensação
temporal.
Dr. Reis Martins (Director Nacional Adjunto da Polícia Judiciária)
O Dr. Reis Martins não autorizou a publicação das suas intervenções em
debate, decisão que obviamente respeitamos, embora não compreendamos.
Prof. Jorge Leite
Há aqui várias e interessantes questões. Algumas não são do jurista, não
são da minha competência. De qualquer modo vou insistir em duas ideias
que me parecem importantes. Em primeiro lugar, a importância deste serviço
e, em segundo lugar, uma outra dimensão que é a necessidade que todos
temos, a momentos de auto disponibilidade.
É um facto que existem exigências específicas para determinadas funções.
Eu diria mesmo, que é impossível pensar no regime comum para a vossa
actividade profissional. De qualquer modo, existem sempre limites que a
meu ver são infranqueáveis.
É inexigível, mesmo que não houvesse leis, que se peça a alguém que corra
desnecessariamente riscos de vida. Se me obrigam a conduzir ao fim de
24 horas, terei o direito de resistir a uma ordem dessas? Bom, se ao fim de
24 horas, eu estou com o tal 1 grama, 2 gramas de álcool no sangue e
ainda tenho que enfrentar situações perigosas, já sem um domínio tão
perfeito como devia ser dos meus actos - o cansaço a isso leva - e ainda por
cima sujeito a um stress por circunstâncias que não controlo, a resposta
parece-me óbvia.
Eu imagino-me a vigiar o tipo que vai assaltar as bombas... Ao fim de não
sei quanto tempo é evidente que o controlo que eu tenho de mim mesmo já
se reduziu. Com a minha capacidade de auto-domínio reduzida e debaixo
da pressão desse legítimo e naturalíssimo receio - ter medo é bom, porque
de contrário tornamo-nos inconscientes - que resulta do facto de eu não
saber como é que o outro vai reagir, é evidente que nos coloca problemas
de solução muito difícil.
Pode haver aqui alguma conflitualidade que obriga a fazer um balanceamento - como nós os juristas costumamos dizer - entre os bens que
estão em causa, sendo certo, repito, que há limites infranqueáveis.
Quando é a própria vida que está em causa é inexigível obrigar quem quer
que seja a correr riscos desnecessários. A não ser, porventura, em situações
de guerra, mas mesmo nestas. É inexigível a uma pessoa que caminhe
alegremente para um risco de morte grande, sobretudo se ele é desnecessário
ou evitável. Eu insisto nesta ideia - há limites.
2.º Painel - Debate
É evidente que se calhar é impossível discutir o problema do trabalho
suplementar ou extraordinário, etc., sem o associar à discussão da
organização do trabalho, o que é óbvio. A resposta adequada pode não
estar em: - bom, paguem-me 1000 ou 1500, em vez de pagarem 500. Não,
essa até me parece uma resposta totalmente desadequada. A melhor resposta
pode ser: vamos ver se é possível organizar o serviço em termos de não ser
necessário recorrer a tanto trabalho suplementar.
Eu não sei o que faria se estivesse nessas funções enfim, só penso que teria
sempre em conta os limites humanos e os valores da vida, da segurança, do
tal direito à auto-disponibilidade, etc.
Mas se me disserem assim: está bem, mas então concretiza lá os tais limites?
É difícil, eu não conheço a vossa realidade. Agora, o que eu sei é que existem
princípios que devem enformar a organização do trabalho, nos vários serviços,
mas em particular num tipo de serviços como este...
Eu admito, por aquilo que li, que alguma coisa possa e deva fazer-se para
adequar melhor a vossa prática quotidiana a um conjunto de exigências
que não são apenas do direito, embora eu entenda que são também do
direito, mas que são sobretudo exigências humanas, sociais, familiares e
éticas.
Uma última questão que eu julgo que me foi posta directamente, que é
assim: bom, as condições, o horário que se pratica, etc. - isto compatibiliza-se
com o art. 3.º da Carta Social Europeia?
A Carta Social Europeia vem de 1961, mas foi revista muito recentemente e
foi ratificada por Portugal, suponho que em Outubro do ano transacto.
Quer o art. 2.º, quer o art. 3.º se referem a uma questão muito importante,
que no fundo são as condições de higiene e segurança.
E julgo saber que o Comité de Peritos do Conselho da Europa tem sido
confrontado, várias vezes, com problemas desta natureza. Sei que eles têm
discutido isso. A Carta nesse artigo fala em fixar o limite máximo razoável
de trabalho diário. Mas também se diz assim: mas como é que se fixa?
Quem fixa? Tendo em conta o quê? E como é que se sabe qual é o limite
razoável?
Eles têm, de facto, respondido a estas questões e até têm dito uma coisa
que pode ser útil, como orientação para nós, para o futuro, que é esta: a
questão da determinação do que é razoável nunca pode deixar de ter alguns
referentes que têm a ver também com o nosso ritmo de vida, com o ritmo
biológico. Isto é, não basta dizer que, por exemplo, uma pessoa, por ano,
não pode trabalhar mais do que, vamos supor 1670 horas - não sei se o
número é muito disparatado ou não, até julgo que não é, mas podia ser.
Não. É preciso, depois, que por cada unidade de referência, que do ponto
de vista médico tem um significado especial, se respeitem certos limites.
E as unidades de referência que têm sido estabelecidas - e foram sempre - são o dia e a semana.
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2.º Painel - Debate
Isto é muito importante! As leis, de facto, neste aspecto, dão uma grande
importância àquilo que se chama, não apenas os limites de trabalho diário
ou semanal, mas também ao ritmo, isto é à sucessão tempo de trabalho/
/tempo de repouso e a tendência é para considerar que 6 horas são o limite
máximo. Ao fim de 6 horas a gente tem que descansar, tem que interromper
o trabalho.
Isso também está numa directiva de 1993, da União Europeia - só que esta
é uma directiva esquizofrénica!... Porquê? Porque afina esses princípios,
mas depois permite alguns desvios. Eu entendo que nalguns casos, como
no meu, por exemplo, que às vezes também trabalho mais de 6 horas
consecutivas, que isso é uma violência. Mas eu estou numa posição muito
mais privilegiada do que vocês, porque eu posso fazer isso em épocas
especiais de exames ou coisas do género e se me sinto cansado sei que
posso resolver o problema, por minha iniciativa.
O limite máximo é 6 horas, mas admito que para alguns trabalhos ele deva
ser inferior. Compreendo que isto não passa ser aplicado, sem desvio, a
todas as actividades, será impossível. Agora, volto a sublinhar, mesmo assim
tem que haver limites. Como concretizar esses limites? Quem me dera saber?
Se eu soubesse já tinha posto essa sabedoria ao serviço de todos.
Portanto, eu diria assim em termos muito telegráficos: aquilo que eu li nos
4 casos paradigmáticos coaduna-se? Respeita? Observa? Ou não observa?
O tal art. 3.º e eu até juntaria o artigo 2.º, da Carta Social Europeia? Eu diria
que é evidente que não.
Agora, reparem bem, uma coisa é pensar um padrão normativo para aquilo
que é uma actividade mais ou menos comum e outra coisa é adequar esses
padrões (onde ate poderá haver alguns desvios), a actividades que fogem
por completo à generalidade das actividades.
É um bocado difícil, não é fácil dar respostas muito concretas e acima de
tudo eu não as sei dar. Porquê? Porque eu precisava de estudar o vosso
caso e ver de facto quais são os limites. Com a ajuda dos médicos do trabalho
seria possível saber quais são os limites da capacidade humana e a partir de
quando é que se entra numa fase de autêntica agressão inexigível a qualquer
pessoa. E esses limites, teriam que ser respeitados.
A não ser em situações excepcionais, excepção à excepção, se poderia exigir
um sacrifício mais, porque podem estar bens sociais, públicos, fundamentais
em jogo. Imaginem que estávamos a perseguir alguém que ia envenenar as
águas, ou...
Em situações de estado de necessidade quais são os limites? Quais são? Se
formos nós como cidadãos a responder, como é que responderíamos? Mas
isso também não é, felizmente, uma situação normal.
No fundo, é um pouco este balanceamento entre bens jurídicos e bens
sociais fundamentais em jogo, que nos tem que orientar na resposta a estes
2.º Painel - Debate
problemas. Mas insisto, considero que os paradigmas que me foram
fornecidos devem ser corrigidos, porque são excessivos e é criar um risco
que, no tal balanceamento de valores, pode não se justificar. Bem gostaria
de ser mais concreto, mas não posso.
É claro que eu atirei aqui a questão da remuneração só para agitar, porque
eu disse que não me queria meter nessa coisas. É claro, que a lei geral prevê
formas de compensação do trabalho suplementar através do descanso
compensatório, no art. 29, que também pode ser aplicado à Polícia Judiciária,
mas não me vou alongar mais.
Bom, mas os tribunais servem para alguma coisa, e servem, principalmente,
para firmar jurisprudência em áreas em que a aplicação dos regimes convivem
com uma grande indefinição. Então, porque não recorrer aos tribunais para
saber quando é que é legítima a recusa, a partir de 24? 32? Às vezes até, ao
fim de 16 horas? Pode ser legítima a recusa em continuar a trabalhar. Eu
acho que os tribunais têm aí um papel importante para clarificar o regime.
A Lei Orgânica da Polícia Judiciária peca por alguma omissão. De facto,
estabelece um regime especial, mas depois, em termos de duração e em
termos de outras áreas, manda aplicar a Lei Geral, o que parece ser um
contra-senso. Quer dizer, considera que o regime é especial e, depois, em
quase tudo, manda aplicar o regime geral, quando devia, para evitar e para
obviar alguns problemas, criar ou estabelecer um regime de duração de
trabalho específico que já contemplava alguns destes problemas relacionados
com o excesso de tempo de trabalho...
João Rouxinol
Inspector na Polícia Judiciária do Porto
Presidente da Direcção Regional Norte da ASFIC/PJ
Antes de mais, queria agradecer a presença de todos os nossos convidados,
que vieram enriquecer este debate. Eu não duvido que é com o contributo
cruzado de todos estes saberes científicos que uma associação sindical pode
melhor defender os direitos dos seus associados.
Gostaria até, se isso fosse possível, de convidar o senhor Doutor Jorge Leite
a acompanhar o trabalho diário da brigada onde tenho trabalhado, pois
estou certo que assim compreenderia melhor a razão desta conferência e a
necessidade de se encontrar soluções de organização do trabalho para a
Polícia Judiciária.
Queria então fazer 2 perguntas:
Todos sabemos que a Polícia Judiciária não tem funcionários que cheguem
para suprir todo o trabalho que é necessário fazer. Certo?
O serviço é de carácter permanente. Certo?
77
78
2.º Painel - Debate
A sociedade tem que contar com a polícia 24 horas sobre 24 horas. Certo?
Mas o funcionário não é nenhuma máquina que possa trabalhar 24 sobre
24 horas. Certo?
A polícia não tem como evitar o trabalho para além das horas normais de
serviço. Certo?
A investigação criminal não tem horas e todos os casos investigados têm
imponderáveis. Certo?
Mas a Polícia não quer aplicar a lei geral. Aqui desconfio que esta decisão já
não será assim tão certa. Se calhar não é mesmo.
Agora de uma coisa tenho eu a certeza não é com soluções inventadas à
medida das conveniências do serviço e sempre contrárias aos direitos dos
funcionários que se resolvem os problemas.
A Polícia quer actual emente compensar o trabalho extraordinário com
descanso, isto é com tempo, o que é extraordinário, porque o nosso problema
é precisamente o tempo, ou melhor, a falta dele. Não temos tempo para
fazer todo o serviço que é necessário, nem sequer para descansar.
Será que esta solução não passa de mais uma manobra enganosa para não
pagar o trabalho extraordinário?
Na prática, o que têm dito é o seguinte: «têm direito à compensação
temporal só que para já não se paga» ou «foi pedido extemporaneamente», quando o funcionário, até por razões de serviço, se atrasou uma
semana a pedir a compensação temporal!
Eu pergunto, que resposta é que podemos dar a uma administração que
mostra não ter o mínimo respeito nem pelo funcionário, nem pela própria
lei?!
Professor Jorge Leite
Muito rapidamente. Obrigado pelo convite, que naturalmente não pode ser
aceite, nem o pode fazer oficialmente; além disso, eu também já não tenho
idade para essas coisas e também não sei se teria vocação.
Agora, há uma coisa que eu tenho como certa: a lei diz que o serviço é
permanente, mas isto não quer dizer que a disponibilidade de cada
funcionário seja permanente, são coisas distintas.
Se não há meios humanos que permitam aos serviços responder a esta
exigência legal de serviço permanente, bom, a culpa não é de certeza dos
funcionários. De quem é? Ora bem, isso já é outra questão.
O Doutor Liberal Fernandes fez bem essa distinção. Uma coisa é o serviço
que é permanente - e bem me parece que ele tem que ser permanente,
aliás há muitos serviços que têm que ser permanentes, por exemplo, o
2.º Painel - Debate
fornecimento de água tem que ser permanente, senão era um problema
terrível - outra coisa é que todos os funcionários estejam em sistema de
auto-disponibilidade permanente e aí eu entendo, como já disse, que não
pode ser.
O problema dos imponderáveis é que é um dos grandes problemas, isso
pude-me eu aperceber, embora, enfim, não tenha um grande conhecimento
do quotidiano da Polícia Judiciária e em especial dos investigadores.
No vosso serviço, os imponderáveis, as exigências, as reclamações sociais
podem aparecer de um momento para o outro e elas podem ter
consequências graves. Mas, vamos lá ver, se são assim muito excepcionais,
como, por exemplo, no caso de um acidente, com proporções muito graves,
que pode ter que mobilizar muitos médicos, para estar em serviço
permanente, durante muito tempo. Estas situações são, na verdade, situações
de verdadeira excepção, de quase estado de emergência. Ora, não me parece
que seja esta a vossa situação. Isto é, os tais imponderáveis de que vocês
falam podem não ter uma gravidade que justifique aquela permanência
excepcional.
Mas admitindo que são imponderáveis importantes, excepcionais e que se
verificam com alguma frequência. Bom, mas a exigências especiais como
essas só é possível responder com equipas suficientes.
Mas também sei que nada é ilimitado e que os recursos também não são
ilimitados. Lembrei-me agora da saudosa Ivone Silva: a Ivone que paga
impostos diz: «Oh, diabo! Isso é demais», mas a Ivone que quer beneficiar
do sistema de segurança, diz: «Oh, diabo! Isso é de menos». Portanto, o
equilíbrio é importante em todas as situações. O equilíbrio é que dá a ideia
de uma sociedade adulta e estável. Mas há áreas em que as reclamações de
equilíbrio são muito maiores.
Este é um problema de que se tem ocupado o Comité do Conselho da
Europa, como eu já referi. Não basta que se limite o tempo de trabalho
numa unidade de referência muito ampla, entendem? Não me podem
obrigar, por exemplo, a trabalhar durante três meses, enfim, já estou a
exagerar, como é evidente, 15 horas por dia, com o pretexto de que eu
depois, nos três meses seguintes, quase não trabalho nada. Não, porque
isso afecta, agride na mesma, põe na mesma em risco direitos e, portanto,
as tais unidades de tempo, os tais limites por unidades de referência mais
curtas, são absolutamente necessários. Neste aspecto, o Doutor Carlos Sobral
melhor do que eu o diria, não é?
Como é que se pode compensar com tempo se não há tempo para
compensar? Bom, esse, digamos, é um paradoxo, tudo bem ou tudo mal.
Mas, mesmo que fosse possível, não é uma boa solução. Porquê? Porque
não se podem ultrapassar, sem riscos desnecessários, determinados limites
em unidades de referência mais baixas. Trabalhar vinte ou trabalhar, por
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80
2.º Painel - Debate
exemplo, 72 horas consecutivas, não é a mesma coisa que trabalhar
72 horas ao longo duma semana. Tem que haver aqui uma distribuição
equilibrada, equitativa, que tenha em conta o tal ritmo biológico, até porque
o limite é 35 horas. Se eu concentrar ainda mais esse tempo de trabalho
semanal ou o tempo de trabalho dum mês ou o tempo de trabalho dum
ano, num período mais curto, é evidente que estou a criar riscos
desnecessários e obviamente que não estou a organizar devidamente o
trabalho, a harmonizar a organização do trabalho com todos os textos
nacionais e internacionais que eu referi. E aqui não tenho dúvida nenhuma,
todos eles apontam na mesma direcção.
Mas deixem-me também dizer o seguinte: muitos dos textos internacionais
permitem aos estados que se desvinculem, isto é, que ratifiquem uma
convenção, mas que se desvinculem da sua aplicação em relação a
determinados serviços. Eu confesso que não vi essa desvinculação, por
exemplo, em relação aos serviços da Polícia Judiciária. Não, não vi. Mesmo
a resolução e o decreto do presidente que ratificam a Carta Social Europeia
não contêm ressalvas, no sentido de não ser aplicada a carta aos vossos
serviços.
Para responder directamente e terminar é assim: trabalho suplementar com
compensação sim, mas obrigatoriamente com limites, sob pena de violação
de direitos fundamentais, como o direito à vida, à saúde, ao tal espaço de
auto-disponibilidade, etc.
Dr. Teodósio Jacinto
O senhor Doutor Liberal Fernandes quer acrescentar algo mais? Não?... Então,
o adiantado da hora, o bom senso elementar, o tal equilíbrio com que as
coisas devem ser tratadas obriga-me a dar por terminada esta parte dos
trabalhos.
Mas primeiro não quero deixar de me congratular com esta notável manhã
de trabalho, com a profundidade e a serenidade com que os temas foram
abordados, desígnio que constava aliás do panfleto de divulgação da ASFIC
e que julgo que foi plenamente conseguido.
É verdade que a falta de quadros existe, mas não é má vontade de ninguém.
No que me diz respeito posso dizer que o instituto não dá mais formação
porque não pode, porque não existem meios financeiros, quer para alargar
a formação, quer para abrir mais concursos. O curso que lá temos neste
momento está demasiado comprimido, está no limite e não vou aqui narrar,
porque não o devo fazer publicamente, a pressão que foi necessário fazer
para este curso se iniciar.
Recordo que esperamos cerca de 3 anos para este curso se iniciar. Porquê?
Apenas por falta de meios financeiros.
2.º Painel - Debate
A intervenção do professor Jorge Leite aponta como caminho o bom senso,
o equilíbrio, o balanceamento que tem que se fazer entre os interesses em
jogo, entre o interesse público e os interesses pessoais, mas na certeza que
há limites que não podem ser ultrapassados. Isto parece-me óbvio e
elementar, porque se queremos ter profissionais de qualidade, uma Polícia
Judiciária eficiente, como é absolutamente fundamental, então temos que
ter quadros bem preparados e em boa forma, que repousem adequadamente
e que vivam a vida em toda a sua plenitude, pois a vida não pode ser só
trabalho.
Bom almoço, continuamos às 15H30, muito obrigado.
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3.º Painel - Dr.ª Cristina Soeiro
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3.º Painel
Dr.ª Cristina Soeiro
Gabinete de Psicologia e Selecção do ISPJCC
Quero agradecer este convite, em especial porque me dá a oportunidade
de mostrar o que é que eu faço com os questionários que vos peço para
preencher. E, já agora, aproveito para lhes pedir que tomem consciência
que estes estudos só são possíveis com o vosso contributo.
Este estudo sobre o stresse profissional na polícia de investigação criminal
foi iniciado pelo gabinete de psicologia do Instituto (ISPJCC), há 3 anos e
baseia-se nas respostas de uma amostra de inspectores de investigação
criminal, com experiências representativas de algumas das vossas realidades
de trabalho.
Hoje já se abordaram aqui algumas questões relacionadas com a selecção,
que me interessam particularmente, no sentido em que são questões que
se situam na minha área de trabalho e que me preocupam todos os dias;
falou-se também no stresse, no nível óptimo de stresse, no stresse negativo
e nas especificidades individuais.
Muitas destas questões estão interligadas e é preciso estudá-las muito bem
se quisermos realizar uma selecção adequada. No fundo, o tipo de trabalho
que desenvolvemos no Gabinete de Psicologia do Instituto tem a ver com a
necessidade de se saber exactamente o que é que é que se deve fazer para
seleccionar pessoas para o desempenho desta função específica, que é a
investigação criminal.
Não é fácil. Eu diria mesmo que é uma matéria complexa porque não basta
ter testes que são aferidos para as populações em geral, não basta garantir
que esses testes também são usados por outras polícias, porque cada polícia
tem a sua realidade específica. Em primeiro lugar é necessário identificar as
competências necessárias ao desempenho da função. Em segundo lugar é
preciso apurar exactamente quais são os incidentes críticos que esta vida
profissional provoca, para se poder concluir sobre os factores de resistência
necessários ao desempenho profissional e assim escolher um certo tipo de
pessoas.
84
3.º Painel - Dr.ª Cristina Soeiro
Como é evidente, os nossos problemas não
terminam com a selecção. Depois é necessário
ajudar as pessoas que trabalham na organização
a resolverem da melhor maneira os incidentes
críticos do dia a dia. Uma das formas que temos
de ajudar as pessoas, sendo elas novas ou indo
elas à formação permanente é, por exemplo,
trabalhar esta questão do stresse de forma
preventiva, identificando com precisão os factores
do stresse e falando sobre eles.
Porque é que este tema do stresse é pertinente
para o trabalho de polícia?
Em primeiro lugar, o stresse é um conceito que
abarca muitas realidades. O stresse é algo que faz
parte da nossa vida e é algo que nos faz funcionar
bem. Só a partir de determinado limite é que ele
deixa de nos ajudar a trabalhar ou a funcionar bem.
O que significa que todos nós precisamos de um
nível mínimo de stresse para conseguirmos
funcionar.
A reacção ao stresse negativo varia de indivíduo
para indivíduo mas existem contextos
organizacionais que potenciam reacções de stresse
que acabam por ser partilhadas por um grande
grupo de pessoas.
O trabalho de polícia surge no ranking das
profissões mais stressantes. As pessoas que
trabalham com o nível mais elevado de stresse são
as pessoas que trabalham na emergência médica,
seguindo-se os polícias e os professores.
Os factores de stresse associados a cada uma
destas profissões serão obviamente diferentes. De
qualquer modo, todas elas desenvolvem indicadores de stresse negativo, com problemas de vários
níveis, nomeadamente físicos, psicológicos, sociais
e comportamentais.
Este estudo centra-se na noção de stresse
ocupacional, que é uma área de trabalho que foi
desenvolvida precisamente para dar resposta aos
problemas dos funcionários, nos respectivos
contextos de trabalho.
Neste estudo articulamos dois tipos de questões
que são importantes, uma que é a reacção que os
3.º Painel - Dr.ª Cristina Soeiro
indivíduos têm aos problemas, a sua capacidade
de resistência a factores adversos e a outra que é
identificar as práticas profissionais que podem
potenciar, só por si mesmas, determinado tipo de
reacções negativas.
No fundo, temos aqui dois problemas: o problema
das capacidades que os indivíduos têm de reagir e
depois, por outro lado, as próprias dinâmicas
organizacionais que podem, também, provocar,
só por si, determinado tipo de reacções nos
indivíduos.
Basicamente, o que é que provoca stresse nas
pessoas?
Nós trabalhamos com a noção de acontecimento
de vida. O que é que é um acontecimento de vida?
É algo que nós fazemos ou um conjunto de
actividades, de experiências e de relacionamentos
que nós desenvolvemos, que podem promover nas
pessoas reacções de difícil adaptação ao meio.
Existem experiências de vida em contexto
profissional e não só, que pressionam negativamente o indivíduo, funcionando como factores
indutores de stresse.
Basicamente o que fizemos neste estudo foi tentar
identificar quais são os acontecimentos de vida
do polícia que dificultam a sua prática profissional.
Mas antes fiquem a saber que relativamente ao
trabalho do polícia existem muitos estudos feitos
sobre o stresse nas polícias uniformizadas e poucos
sobre o stresse nas polícias de investigação
criminal.
Associadas à prática profissional existem quatro
grandes áreas de acontecimentos de vida do
trabalho do polícia que promovem stresse:
• Um primeiro grupo de factores de stresse tem
a ver com as práticas rotineiras do dia a dia,
com o circuito de papéis, com a complexidade
burocrática associada à profissão que é desencadeadora de determinados indicadores de
stresse.
• Um segundo grupo de factores de stresse está
associado à gestão de situações imprevisíveis
que terão, portanto, mais a ver com o contexto
dito operacional.
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3.º Painel - Dr.ª Cristina Soeiro
• As práticas e as políticas de gestão associadas
ao contexto organizacional também são uma
fonte forte de stresse.
• E por último, a gestão de aspectos extra
profissionais que têm a ver com as relação
familiares e com os outros contextos sociais de
vida dos polícias.
Percebeu-se muito rapidamente que com os
instrumentos desenvolvidos para as outras polícias,
que são bastantes, não iria conseguir esclarecer
ou obter a informação pretendida para estudar a
realidade da Polícia Judiciária Portuguesa.
Numa primeira fase foi necessário elaborar um
questionário à realidade da PJ, que permitissem
listar e identificar os acontecimentos de vida da
prática profissional da investigação criminal
considerados mais relevantes pelo grupo de
funcionários que responderam a este instrumento
(questionário).
Numa primeira fase foi pedido aos profissionais
para indicarem o que achavam ser positivo e
negativo no seu trabalho e para descreverem
incidentes críticos que tivessem experienciado.
A segunda fase consistiu num trabalho de análise
de conteúdo e tratamento estatístico. Foi
construída uma escala que depois foi reenviada
não para os mesmos funcionários, mas para
outros, para se testar e confirmar a avaliação da
importância que era dada a cada um desses
acontecimentos de vida apresentados como
stressantes.
(Aproveito esta oportunidade para mais uma vez
agradecer à ASFIC, que se encarregou de distribuir
e recolher os questionários, facilitando assim a
concretização da segunda fase deste estudo).
Construiu-se também uma escala de sintomas para
ver qual a relação que existia entre os factores de
stresse e os sintomas psicológicos e físicos
detectados.
Na primeira fase o que fizemos foi essencialmente
listar ocorrências, situações ou tarefas percepcionadas como indutoras de stresse.
3.º Painel - Dr.ª Cristina Soeiro
A segunda fase, consistiu numa avaliação da magnitude dos factores de
stresse e da sua correlação com uma lista de sintomas, para tentar identificar
quais as sintomatologias que as pessoas apresentavam nos últimos 6 meses.
As amostras são sempre um problema. Conseguimos numa primeira fase
obter 89 questionários bons para trabalho, completos, mas só para o nível
de inspector. As variáveis que foram alvo de controlo foram os anos de
experiência, o estado civil, o género, o tipo de crime investigado e o local de
trabalho. Sobre esta fase temos bastante informação detalhada, até
relativamente às diferenças entre directorias e departamentos de investigação
criminal.
Na segunda fase obtivemos cerca de 80 questionários, bons para trabalho.
Nesta fase trabalhamos as mesmas variáveis para ver se existiam diferenças
entre as pessoas que trabalhavam em directorias, entre departamentos
centrais, diferenças entre homens e mulheres, diferenças entre os diferentes
tipos de crime investigados etc.
Como já referi elaboramos um questionário com 3 questões abertas, onde
pedíamos às pessoas para referenciarem o que é que mais as incomodava
no seu trabalho, o que é que mais gostavam e, depois, realizou-se uma
análise de conteúdo.
Na segunda fase a par da escala de acontecimentos de vida utilizamos uma
escala de sintomas, elaborada com base no «Dicionário de Doenças Mentais
Psiquiátricas», norte-americano, onde estão listados todos os sintomas de
stresse, inclusive pós traumático, que vão desde a simples dor de cabeça a
problemas comportamentais, como a agressividade.
Da primeira fase, para além dos resultados mais específicos, obtivemos um
conjunto vasto de factores de stresse que agrupamos em 4 grupos de
categorias:
A - Factores de stresse associados à rotina - desempenho das
actividades diárias e rotineiras do trabalho do agente de investigação
criminal
B - Factores de stresse associados a situações de contexto
operacional - detenções, buscas, seguimentos, confrontos, …
C - Factores de stresse associados ao contexto extra-profissional desempenho das actividades relativas à vida pessoal do agente de
investigação criminal
D - Factores de stresse associados à gestão e contexto
organizacional - factores relacionais entre colegas e chefias, com a
própria organização, relacionamento com a sociedade em geral e com
instituições externas.
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3.º Painel - Dr.ª Cristina Soeiro
Vou agora apresentar os resultados da segunda fase que são aqueles que
identificam coisas mais específicas.
Nesta listagem dos factores mais relevantes, o funcionário tinha que classificar
de zero a cem a importância que aquele acontecimento podia ter em termos
de o prejudicar na sua vida profissional.
Como vocês podem ver, no topo está «a morte ou ferimentos de um colega
durante uma operação», situação que, apesar de não ocorrer com muita
frequência na nossa organização, não deixa de ser um dos maiores receios
sentido pela maioria dos profissionais que respondeu ao questionário.
Depois desse aparecem outro tipo de indicadores:
Itens
Média
Desvio Padrão
P50 - Morte ou o ferimento de um colega
durante uma operação
84,97
26,56
P41 - Ferir ou matar alguém durante uma
operação
75,29
31,98
P61 - Mau ambiente de trabalho
73,16
31,01
P75 - Abuso sexual de crianças e trabalho
infantil
69,77
31,16
P62 - A falta de confiança na equipa de
trabalho
66,52
35,80
P44 - Confronto com arguidos que por vezes
estão armados
65,73
30,84
P71 - Mau relacionamento com os colegas
65,71
33,26
P45 - Ser ferido durante uma operação
65,31
34,40
P64 - Falta de recursos materiais/técnicos
61,98
28,51
P70 - Mau trabalho de equipa
61,04
32,53
P63 - O não reconhecimento do trabalho
desenvolvido
60,65
31,18
P29 - Elevado volume de carga processual
58,75
32,50
P40 - Operações com risco e perigo físico
57,88
32,31
P25 - Trabalho muito envolvente e
emocionalmente desgastante
55,33
31,24
P80 - Recordação de experiências salientes,
p.e. a morte de um familiar num
acidente horrível ou num homicídio
54,46
33,84
P28 - Envolvimento excessivo no trabalho
52,90
29,85
P58 - Isolamento social e da família
51,26
33,43
P59 - Conflitos familiares
50,69
32,37
3.º Painel - Dr.ª Cristina Soeiro
P72 - Limitações impostas pelo funcionamento
do sistema de justiça: M.P. e tribunais
50,19
30,99
P66 - A indefinição do objectivo de uma
investigação
49,13
26,66
P52 - Momentos que antecedem uma
operação
48,82
31,84
Podemos concluir então, que no topo dos factores mais stressantes para o
trabalho dos funcionários de investigação criminal da PJ, estão factores
associadas não ao contexto operacional ou à rotina, como é frequente
aparecer nas outras polícias, mas sim factores de stresse associados à gestão
de contexto organizacional, aos problemas que têm a ver com as práticas
internas da organização.
Só a seguir é que aparecem as questões associadas ao contexto operacional
traduzidas em vários indicadores.
Em terceiro lugar aparece então a rotina e só em último nível o contexto
extra profissional que no caso da PJ, curiosamente, surge na base, ou seja,
um indicador que se posiciona com diferença relativamente às outras polícias,
onde não surge tão em baixo.
Relativamente à escala de sintomas devo referir que fiquei agradavelmente
surpreendida porque os resultados em termos de verbalizações de sintomas
não foram muito elevados, ou seja, a maior parte dos funcionários
responderam não ter sentido nenhum sintoma particular nos últimos 6 meses.
Ainda assim aqui estão listados os sintomas que apareceram com alguma
frequência:
% de respostas por cada item
Itens
Presente
102
Sinais crescentes de fadiga ou de
ausência de motivação
30,0
121
Crescente irratibilidade
25,0
125
Queixa-se de crescentes dificuldades
em adormecer ou de acordar
frequentemente durante a noite
21,3
127
Queixa-se de dores de cabeça intensas
e frequentes
16,3
104
Abandona o local de trabalho ou a
família por períodos de tempo cada vez
mais longos
15,0
105
Crescentes perdas de memória ou de
dificuldades em recordar pormenores
ou prazos
15,0
89
90
3.º Painel - Dr.ª Cristina Soeiro
106
Crescente apatia, desinteresse ou
insensibilidade
15,0
108
Crescente desinteresse por actividades
(desporto, caça ou pesca) a que se
dedicava
15,0
110
Isola-se cada vez mais frequentemente
de colegas, amigos ou familiares
15,0
113
Súbitas e repentinas explosões de raiva
ou de fúria, totalmente desajustadas às
situações
12,5
Estes são os sintomas que surgiram, que não são muitos, atendendo à lista
apresentada, que é muito mais extensa.
Agrupando os sintomas em comportamentais, sociais, biológicos e físicos,
há nitidamente um maior número de referências a sintomas de natureza
comportamental do que a problemas de natureza biológica. Parece assim
que os sintomas comportamentais são aqueles que mais preocupam os
funcionários que responderam ao questionário.
Tentei verificar a existência de algumas relações relevantes entre os factores
de stresse e os sintomas, mas não obtive nada de especial, a não ser, por
exemplo, que as pessoas que apresentam níveis de stresse mais elevados na
categoria extra profissional são aquelas que estão associadas a um maior
número de sintomas.
Relativamente a esta problemática do que é que faz um polícia ser mais
adaptado ou menos adaptado às situações do seu próprio trabalho, os
trabalhos de investigação feitos nesta área e este não é excepção,
demonstram que um dos factores mais importantes é o equilíbrio e a saúde
mental. Quer isto dizer, que os polícias que se adaptam melhor são aqueles
que constróem uma rede de apoio afectivo fora do seu próprio espaço de
trabalho - extra colegas de trabalho. Ou seja, têm um modelo familiar próprio,
têm um círculo de amigos que foge à prática da polícia.
O tipo de trabalho que vocês realizam conduz a um comportamento a que
os americanos dão um nome que eu não gosto muito: «o síndroma do John
Wayne, o cowboy solitário». Em termos psicológicos, chamamos a isso o
isolamento emocional, ou seja, executam um trabalho difícil, que tem um
grau de confidencialidade muito alto, que vos obriga a construir à volta da
informação de que são detentores, um muro que ninguém que não pertença
ao vosso círculo restrito profissional pode passar. Ora, sem se aperceberem,
tendem a estender esse muro à vossa parte afectiva e vão deixando de
partilhar fora do vosso contexto profissional certas emoções. Este
comportamento com o tempo pode levar a uma crescente dificuldade de
adaptação.
3.º Painel - Dr.ª Cristina Soeiro
Depois tentamos verificar se conseguíamos obter alguns resultados
interessantes, diferenciando algumas das variáveis que referi anteriormente.
As únicas variáveis que se mostraram com algum interesse foram, o género,
a idade e os anos de experiência profissional e o local de trabalho:
Género: as investigadoras apresentam indicadores de stresse mais
elevados, do que os investigadores
Local de trabalho: os investigadores que trabalham nas Directorias
apresentam indicadores de stresse mais elevados
Idade: O grupo etário entre os 41 e os 50 anos apresentam indicadores
de stresse mais elevados.
Anos de experiência profissional: os investigadores com mais anos
de experiência profissional apresentam indicadores de stresse mais
elevados.
Verificamos que as mulheres, as investigadoras, apresentam indicadores de
stresse mais elevados do que os homens. Porque é que isso acontece?
Acontece porque fazem mais trabalho de rotina do que os homens e menos
trabalho operacional? Esta questão fica em aberto....
Relativamente aos factores extra profissionais e de gestão de contexto
organizacional, não se identificam diferenças significativas para as variáveis
estudadas. O que é que isto quer dizer? Quer muito simplesmente dizer que
estes resultados são partilhados por todos os grupos e não especificamente
mais por um grupo que por outro.
Vou agora abordar sumariamente as estratégias de intervenção para fazer
face a este tipo de problemas. Sem me querer repetir, ficamos a saber que
o trabalho de polícia tem as suas próprias dinâmicas e as suas próprias
características e que estas são elas próprias indutoras de stresse menos
positivo e que as pessoas reagem diferentemente consoante os respectivos
níveis de resistência.
As estratégias de intervenção compreendem em termos gerais duas vertentes:
a da prevenção e a da intervenção propriamente dita.
Em termos de prevenção, a componente mais trabalhada é a da formação.
Uma boa formação científica, técnica e comportamental ajuda o indivíduo a
superar este tipo de problemas.
Uma boa formação ao nível do planeamento do trabalho, a valorização de
um bom trabalho de equipa e o acompanhamento sistemático dos problemas
individuais são instrumentos que resultam de forma muito positiva na
resolução deste tipo de problemas.
Existem ainda outros instrumentos preventivos importantes, como seja o
suporte extra profissional que deve ser assegurado pela própria organização,
ao nível de apoio médico, apoio psicológico, apoio familiar e tudo o mais.
91
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3.º Painel - Dr.ª Cristina Soeiro
A intervenção passa por instrumentos também
específicos, por exemplo, de «Debriefing de
incidentes críticos traumáticos», sem deixar passar
nenhum em branco; é extremamente importante
que se torne uma prática na organização, ou seja,
que se transforme num procedimento normal, a
análise de todos os incidentes críticos, não apenas
numa perspectiva meramente técnica, mas sim
psicológica.
A análise técnico profissional é certamente
importante, mas não é dessa que eu estou aqui a
falar, mas sim do impacto psicológico que esses
incidentes, que estão geralmente associados ao
uso de armas de fogo, causam nas pessoas; usar
uma arma de fogo, mesmo com treino, sabendo
qual é a sua utilidade, deixa sempre as suas marcas.
Existem modelos de trabalho já desenvolvidos para
lidar com este tipo de situações, mas não chega.
É preciso criar um suporte organizacional que
depois aplique esses mesmos modelos e que
mostre que existe uma resposta institucionalizada
clara, de modo que os funcionários saibam que
em certas situações podem contar com o apoio
da organização.
Muitas vezes essas respostas têm que extravasar
o próprio meio policial, nomeadamente através
do acompanhamento familiar. As famílias são
muitas vezes a chave para resolver uma dada
situação. São o melhor elo de socorro a que se
pode recorrer. Existem hoje muitas organizações
policiais que já têm um acompanhamento individual médico e psicológico, extensivo às próprias
famílias.
Isto era resumidamente o que eu tinha para vos
dizer. Quero agradecer uma vez mais aos que
colaboraram nos questionários e, já agora, aproveito esta oportunidade para antecipadamente
agradecer aos que irão a partir de hoje colaborar
nos próximos. Tenham isto que vos vou dizer como
certo: sem a vossa colaboração seria impossível
melhorar, quer a selecção, quer a formação. É claro
que aproveitei para fazer também um bocadinho
de marketing...
Muito obrigado.
3.º Painel - Dr.ª Cristina Soeiro
Dr. Teodósio Jacinto
Muito obrigado Senhora Dr.ª Cristina. O marketing que fez foi muito bem
feito, porque foi feito no interesse de todos, não só do interesse do gabinete
de psicologia e selecção do nosso Instituto ou no seu interesse pessoal.
Já tivemos um homem da casa que tem larguíssimos conhecimentos, uma
larguíssima experiência de vida e profissional, que tem hoje a grande
responsabilidade de dirigir a DCCB.
Já tivemos os eminentes Professores de Direito que nos trouxeram aqui a
sua visão.
Já tivemos a vertente da medicina e acabamos de ter a vertente da psicologia.
Mais uma vez quero salientar o facto de este painel ter sido concebido com
um notável cuidado e rigor.
Vamos ter agora uma visão essencial, que foi aqui muitas vezes salientada
pelo Professor Jorge Leite e que é também uma das meninas dos meus
olhos, que é a vertente europeia.
A Polícia Judiciária tem feito muito ao nível da cooperação europeia, mas é
preciso fazer ainda muito.
O próprio ISPJCC está também muito envolvido na Academia Europeia de
Polícia, que vai ser um instrumento absolutamente essencial.
Os problemas que aqui abordamos hoje também certamente ocorrem nas
outras polícias europeias, com esta ou com aquela diferença, assim como,
eventualmente, com soluções diferentes.
Quem melhor que o Secretário-geral do Conselho Europeu dos Sindicatos
de Polícia poderá abordar esta matéria?
O Senhor Gerard Greneron tem de facto condições privilegiadas para falar
da realidade laboral nas polícias europeias, não apenas por ter as funções
importantes que tem no CESP, mas também por poder falar com a autoridade
de alguém que também acumulou uma enorme experiência no terreno como
investigador criminal.
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A Realidade Laboral nas Polícias Europeias
Gérard Greneron
Secretário-Geral do CESP
Apresentar um estudo sintético sobre as normas de trabalho relativas às
polícias de investigação europeias é algo de muito complexo.
Por essa razão, vou limitar a minha intervenção aos seguintes aspectos:
1. A actividade profissional e os seus horários constrangedores.
2. Os impactos sobre a vida profissional e privada do polícia.
3. As compensações existentes (Horas extras e descansos compensadores).
A actividade profissional e os seus horários constrangedores
Uma polícia de investigação deve forçosamente adaptar a sua actividade
profissional à do seu alvo - a actividade criminal.
Podemos facilmente comparar a actividade policial à laboração dos SERVIÇOS
DE URGÊNCIAS, dos hospitais.
É um facto que os polícias estão subordinados ao acontecimento e é sabido
que os delinquentes não praticam os seus delitos nas horas regulares de
expediente.
Razões que explicam que o polícia, como funcionário do Estado, seja regido
por leis específicas que em muitos aspectos derrogam o estatuto geral da
função pública.
Este estatuto confere-lhe poderes legais importantes mas, por outro lado,
submete-o a imperativos constrangedores.
Esta actividade particular impele-me naturalmente a esboçar um rápido
retrato do polícia de investigação europeu: “é um Homem apaixonado
pelo seu trabalho e o seu investimento está à altura da sua paixão”.
Constata-se igualmente que a administração usa e abusa desta paixão para
o submeter a horários de trabalho excessivos. Chegamos a um paradoxo: o
polícia que tem como missão velar pelo cumprimento das leis e dos
regulamentos está submetido a constrangedores horários que o põem à
margem das leis aplicadas aos outros cidadãos! - Os garantes da lei estão
fora da lei!
3.º Painel - Gerard Greneron
Os impactos sobre a vida profissional e privada do polícia
• A vida profissional:
Como explanou a Dra. Cristina SOEIRO, psicóloga do ISPJCC, na sua
exposição “Os factores stressantes na investigação criminal", a
acumulação de horas conduz as pessoas, sujeitas a tais efeitos, a uma
fadiga e a um stress que lhes é prejudicial.
Com efeito, o stress é prejudicial ao polícia mas também o pode ser para
o cidadão que ele tem por missão proteger.
Os médicos, unanimemente, aclaram com provas científicas que os efeitos
negativos sobre o organismo se materializam por desequilíbrios físicos e
psicológicos.
Esses desequilíbrios diminuem o potencial profissional das pessoas a cargo
da investigação criminal.
A qualidade dos processos tem assim um desfecho diminuído,
prejudicando a demonstração da verdade sob o aspecto de erros
processuais ou de uma falta de lucidez na condução das investigações.
Por outro lado nas situações de intervenção urgente que são bastante
triviais no exercício da profissão policial - flagrante delito, detenções,
etc. - a tensão e o nervosismo são abundantes e adicionam-se aos efeitos
negativos engendrados pela fadiga.
O stress daí resultante pode conduzir a situações prejudiciais para o policia
e, nalguns casos, para o cidadão - má apreciação do perigo, utilização
intempestiva de armas, assunção de riscos desproporcionados, etc. • A vida privada:
A fadiga é um fenómeno que gera uma falta de disponibilidade e um
nervosismo frequentemente nefasto ao equilíbrio familiar.
As ausências do seio familiar, intrinsecamente relacionadas com os ritmos
de trabalho que um polícia tem de suportar, são frequentemente males
também vividos pelo meio familiar que o rodeia.
Esta falta de disponibilidade, de diálogo no seio familiar intensifica esta
incompreensão que muitas vezes é ressentida reciprocamente.
NB: O número de divórcios verificados nos elementos desta profissão, é
disso um elemento comprovante.
As tensões que surgem no seio familiar alimentam, por sua vez, o nível
de stress suportado pelo polícia e constatamos, desta forma, o
levantamento de um fenómeno de "espiral infernal" contra o qual é
difícil de lutar e no qual encontramos os mesmos ingredientes: - fadiga - stress - falta ou ausência de audição - nervosismo - incompreensão - stress …
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3.º Painel - Gerard Greneron
As compensações existentes
• O pagamento de horas extras:
Nos países que optaram pelo pagamento de horas extras, tais como a
Alemanha, a Bélgica e a Itália constatamos que a taxa horária fixada pela
administração é largamente abaixo da taxa horária praticada para as horas
ditas normais.
De notar que não existe taxa horária no sentido concreto do termo mas
que se trata de uma extrapolação baseada no seguinte cálculo: vencimento
mensal dividido pelo número de horas prestados.
O resultado deste cálculo demonstra que as horas extras são pagas a
uma tarifa horária situada entre 1,28€ e 3,30€.
É costume comparar, nos polícias europeus, a taxa horária que lhes
atribuída àquela que habitualmente é paga a uma empregada de limpeza.
Cada um estará, certamente, convenientemente capacitado para
comparar e verificar se a polícia é equitativamente paga, atendendo ao
seu nível de formação, qualificação técnica e suas responsabilidades.
Todavia, a legislação europeia e mais concretamente a « Charte Sociale
Européenne » prescreve no artigo 4:
" …O exercício efectivo do direito a uma remuneração equitativa, o direito
a uma remuneração justa, o direito dos trabalhadores a uma taxa de
remuneração ampliada pelas horas de trabalho extra…
O exercício destes direitos deve ser assegurado quer por via de convenções
colectivas, livremente concluídas, quer por métodos legais de fixação dos
salários, ou então, por qualquer outra forma apropriada às condições
nacionais".
Recordo a este propósito que Portugal assinou e ratificou a «Charte Sociale
Européenne» e os seus protocolos adicionais, entre os quais aquele que
prevê um sistema de reclamações colectivos.
• Os descansos compensadores:
Outra solução veiculada nalguns países, entre os quais a França, é o
princípio da compensação horária.
Esta compensação pode ser de 100, 150, ou 200 % em função das
características do dia laborado: dia de semana, descanso legal, descanso
semanal, feriado ou horário nocturno.
À luz da realidade dos serviços de polícia e dos seus constrangimentos
este princípio dos descansos compensadores rapidamente atinge os seus
limites.
3.º Painel - Gerard Greneron
Na maior parte dos serviços de investigação o "acontecimento" torna,
frequentemente, difícil ou impossível usufruir o gozo desses dias de
descanso.
É frequente constatar que as horas extras acumuladas ultrapassam
largamente a possibilidade que é oferecida ao policia - durante o ano - de as recuperar.
Desta forma e como exemplo, em França o número acumulado de
horas a recuperar eleva-se a vários milhões!
Para terminar, diria que é indispensável encontrar o melhor equilíbrio
entre o interesse da sociedade e o interesse dos profissionais de polícia, e
que, nesse sentido, se torna urgente encontrar soluções.
Tais soluções, se devem ter em conta os imperativos profissionais ligados
à função investigadora, não podem, contudo, esquecer, que é impensável
que os polícias aceitem sem reacção, o sacrifício dos seus direitos sociais
legítimos - Antes que a corda parta!
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Adaptação do Trabalho na Investigação
Criminal à Lei e às suas
Especificidades - Soluções possíveis
Dr. A. Jorge Braga
Jurista especializado em Direito do trabalho, na área
da Administração Pública
É com muita satisfação que aqui estou hoje para, com todos vós, reflectir
sobre a problemática da polícia judiciária no cruzamento jurídico-legal da
sua acção, numa perspectiva jus laboral.
Obviamente, que a minha intervenção desde logo aparecerá como que
ofuscada pelas ilustres prelecções que a antecederam, desde logo, pela
"maturidade", idoneidade e reconhecido estatuto dos seus autores. De igual
forma, alguns assuntos terão já sido aflorados nessas intervenções, embora
entenda que o terão sido em contexto diverso.
Por outro lado, o tema que nos é proposto "ADAPTAÇÃO DO TRABALHO
NA INVESTIGAÇÃO CRIMINAL À LEI E ÀS SUAS ESPECIFICIDADES - SOLUÇÕES POSSIVEIS" poderia deixar-nos aqui a falar durante um tempo
de que não dispomos nesta conferência, tanto mais que se prevê de seguida
um debate sobre os temas abordados neste período da tarde.
Estamos assim limitados no tempo, único aspecto comum a todos os oradores
e imbuídos na expectativa do debate que se irá seguir, onde poderemos
aclarar alguns aspectos da tese que defendemos.
Quando comecei a pensar o tema que me foi proposto desenvolver, desde
logo me deparei com a impossibilidade de uma qualquer adaptação sobre o
trabalho na Investigação criminal com uma qualquer forma das existentes,
tanto mais que foi preocupação nossa encontrar referenciais que permitissem
um solução interna e, portanto, fora de uma situação de direito comparado
a que os nossos governantes dão mais crédito quando se trata de cobrar e
não de pagar.
Acresce que, dada a imensidão do tema, haveria ab initio que curar de um
rumo e assunto sob pena de nos perdermos e, o que seria mais grave, de
nos cortarem a palavra. Assim, e sem me querer repetir em relação ao que
os ilustres oradores que me antecederam já afirmaram, mas pegando na
própria LEI ORGNICA DA POLICIA JUDICIÁRIA, enquanto "…corpo superior
de policia criminal auxiliar da administração da justiça…" centrarei esta
intervenção em torno da desadequação do regime de horários à prestação
do serviço. Desde logo,
3.º Painel - Dr. A. Jorge Braga
I - a dicotomia patente no art. 79.º entre a disponibilidade funcional e o
carácter permanente e obrigatório enquanto condicionantes da politica
de trabalho na investigação criminal como se de anamnese se tratasse;
II - A revogação e a repristinação de normas no mesmo diploma legal,
como sinais da dificuldade de abordagem temática nesta área
(regulamentação dos tempos de trabalho e sua remuneração)
a) Trabalho extraordinário;
b) Unidades de prevenção passiva;
c) A prevenção activa como evolução no estágio da prevenção passiva
III - O nosso entendimento como contributo para uma possível solução
negocial que dignifique a Polícia Judiciária enquanto auxiliar da
administração da justiça.
I - Vejamos então como entendemos a dicotomia - disponibilidade
funcional (prevista no n.º 6) / carácter permanente e obrigatório
(prevista no n.º 1) ambas do art. 79.º da Lei Orgânica da Policia
Judiciária - uma anamnese sobre os direitos que os funcionários de
investigação criminal têm enquanto funcionários e agentes do Estado.
Temos para nós que o pessoal de investigação criminal não pode ter as
mesmas regras sobre horários de trabalho como os demais funcionários e
agentes do Estado, mas, isso não pode significar que não haja que criar
regras, e que essas, não possam dimanar da lei geral. Lei geral que não será
mais o decreto-lei 187/88, base em que assentam os despachos e alguns
regulamentos de horários na sua maioria mas sim o decreto-lei 259/98 (claro
está que aqui incluímos os bem conhecidos despachos 68/91 alterado pelo
248/MJ/96, e naturalmente os despachos internos 7/SEC-DG de 31 /01/97,
06/2002-SEC/DN, de 15 de Fevereiro, o 11/2002-SEC/DN, de 20 de Março,
24/2002-SEC/DN e naturalmente o Desp. Normativo 18/2002, perfeitamente
incompleto).
A observação destes pressupostos será o desígnio do respeito pelas normas
constitucionais que nos impõe direitos de que se não pode dispor, quer se
esteja perante acto legislativo quer perante a sua omissão. Contudo, a
omissão legislativa não pode de forma alguma significar que os funcionários
afectos à investigação não possam gozar dos seus direitos constitucionais
designadamente quanto "à organização do trabalho em condições
socialmente dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a permitir
a conciliação da actividade profissional com a vida familiar" - art. 59.º, n.º 1
al. b). Ora,
É este esquecimento que está de facto em causa já que a falta de
regulamentação nesta matéria é de per se bastante elucidativa. Tenhamos
como referencia o que nos diz o art. 178.º da LOPJ, que no n.º 1 refere que
no prazo de 180 dias serão publicados os diplomas regulamentadores da lei
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3.º Painel - Dr. A. Jorge Braga
orgânica mas, no n.º 3 prevê que enquanto não for publicada a legislação a
que se referem os n.º anteriores continuarão a aplicar-se, com as necessárias
adaptações, os regulamentos actualmente em vigor. No fundo diz-se que
em matéria da prestação de trabalho nada se altera, tudo será mantido de
forma quase que imutável. Por isso mesmo, ou talvez não, o regulamento
de horários aprovado pelo Despacho Normativo n.º 18/2002 apenas se refere
à duração de trabalho, período de funcionamento e atendimento ao público,
não curando da especificidade dos horários como deveria ter feito.
Diríamos assim que embora com uma LEI ORGNICA que data de 9 de
Novembro de 2000 e que no seu art. 179.º revoga toda a legislação anterior,
com excepção dos regulamentos, como vimos por força do n.º 3 do
art. 178, os funcionários da Policia Judiciária vivem alguns momentos em
nada abonatórios para o desenvolvimento do seu trabalho.
Começamos por constatar que dos regulamentos a aprovar apenas um foi
publicado - Despacho Normativo n.º 18/2002 respeitante ao horário de
trabalho. Ora, certo apenas é que até à data apenas um regulamento foi
aprovado e, adaptações ou despachos internos não podem significar ou
justificar a criação de direito novo, como parece ser intenção da Direcção da
Polícia Judiciária.
Em boa verdade, fazia de todo sentido que fosse publicado um novo
regulamento de horários, tanto mais que o então em vigor, face à publicação
do decreto-lei 259/98, não estava já em conformidade com a lei, pelo que
se impunha a sua revogação e substituição por outro regulamento. Porém,
na prática, este limita-se a definir períodos de funcionamento e de
atendimento, controlo de assiduidade e pontualidade, e regimes de prestação
de trabalho com especial enfoque nos horários flexíveis e turnos.
Não há, ainda, nada publicado que de forma clara expresse o funcionamento
dos piquetes, prevenção passiva e activa e trabalho extraordinário. Isto é, o
regulamento de serviços de piquete e de unidades de prevenção e turnos
não está ainda em lei, porquanto o n.º 3 do art. 178 ex vi do art. 179.º
ambos da LOPJ, mantém o regulamento aprovado pelo Despacho
248/MJ/96 precisamente aquele que de certa forma define os Serviços de
Piquete, Unidades de Prevenção e Turnos de Funcionários, e que por aquela
apontada razão se mantém em vigor.
Quanto ao trabalho extraordinário nada se diz, pelo que é nosso
entendimento que a omissão de uma regulamentação específica deste
trabalho para a Policia Judiciária acarreta um pesado fardo que de todo se
regulamenta, exclusivamente, no decreto-lei 259/98 Por isso defendemos
que de pouco valem as interpretações paradoxalmente confusas dadas à
prestação de trabalho extraordinário. Isto vale por dizer que um funcionário
que não esteja de piquete ou de prevenção terá, obviamente, de receber a
respectiva compensação pelo trabalho que vier a prestar para além do seu
horário normal.
3.º Painel - Dr. A. Jorge Braga
Compensação de trabalho que terá de ser efectuada segundo a livre escolha
do funcionário e nunca por decisão unilateral da chefia, que nesta matéria
não alvitra, mas insiste em querer alvitrar. É nossa convicção que nesta matéria
terá de ser aplicado o previsto no decreto-lei 259/98, designadamente, no
n.º 1 do art. 28.º que em nada colide com a disponibilidade funcional e o
carácter permanente e obrigatório do art. 79.º.
II - A revogação e repristinação de normas no mesmo diploma legal,
como sinal da abordagem temática
Aquilo a que pacificamente se vem assistindo, não é de forma alguma
abonatório deste importantíssimo corpo de investigação criminal.
Efectivamente, o dizer-se que findo o horário de trabalho o funcionário
entra em regime de prevenção activa ou, para dizer com o despacho 11/
2002 entram em reforço às unidades de prevenção, carece no mínimo de
uma interrogação quanto à legalidade de tão abrupta afirmação.
Efectivamente, não podemos de forma alguma concordar com o que se
vem praticando à luz deste despacho interno que, vigora apenas por se não
ter regulamentado como deveria o trabalho em regime de prevenção passiva,
activa e extraordinário. E, como veremos, não se nos afigura difícil a destrinça.
Eventualmente, só no pagamento e por razões de cariz financeiro ou
económico, não por dificuldade de precisão jurídica quanto às respectivas
classificações.
Mas, não se pode também, por inverosímil, com arremesso de teses centradas
na disponibilidade e ou carácter obrigatório do serviço, obrigar um
funcionário a estar ao serviço mais de 72 horas consecutivas sem dormir
e/ou retirar um pouco de tempo para o seu descanso e recuperação física e
psíquica. Não é uma questão de horários que aqui se coloca, outrossim,
uma questão humanitária e de ciência que um qualquer dirigente tem
obrigação de conhecer e respeitar. Temos até dúvidas quanto à
obrigatoriedade de obediência em ordens como esta, já que a mesma, pelo
risco, poderá em si conter elementos típicos de crime, isentando assim de
responsabilidade disciplinar o funcionário conforme resulta do n.º 2 do
art. 11.º do Regulamento disciplinar da Policia Judiciária (DL 196/94, de
21 de Julho).
Isto apenas acontece por ser enorme a indefinição legislativa que graça no
seio da Policia Judiciária e por se estar a viver com despachos internos, ilegais
por incompetência absoluta dos seus autores para o efeito, desde logo por
estarem a criar direito novo. Ou seja, classificar trabalho extraordinário como
prevenção activa se não é direito novo não sabemos o que será.
Naturalmente que entendemos necessário cobrir esta e outras lacunas, se é
que de lacuna aqui se poderá falar já que se vem insistindo pelo não
pagamento como extraordinário do trabalho que efectivamente o é e, com
a agravante de se efectuar o pagamento apenas através da compensação e
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3.º Painel - Dr. A. Jorge Braga
não no pagamento em numerário como o define a lei. Muito há por fazer
nesta matéria, importando uma regulamentação que não deixe em aberto
estas questões pois que não será mais aceitável que um regulamento seja
substituído por um despacho da Direcção Nacional. E, não deve, nem pode
ser aceite, na exacta medida em que há uma incompetência em razão da
matéria por parte deste órgão de polícia já que foi intenção do legislador,
que apenas o Ministro da Justiça alvitrasse em tão complexa matéria.
Quer isto significar que continuamos a defender uma posição de refutação
do despacho produzido pelo Director Nacional da Policia Judiciária com o
n.º 6/2002-SEC/DN - Logicamente aqui inserimos todos os despachos
posteriores que pretenderam esclarecer este, designadamente os
despachos 11/2002-SEC/DN, e, por maioria de razão, o despacho
24/2002-SEC/DN - Que entendemos ser nulo por se encontrar ferido de
vicio de incompetência absoluta. Efectivamente, o art. 79.º da LOPJ atribui
competência exclusiva ao Ministro da Justiça para elaborar e aprovar os
regulamentos o que este apenas fez com o Despacho Normativo 18/2002
de 13 de Março.
Vejamos, o despacho 6/2002-SEC/DN é, em nosso entender, ilegal por, entre
outros, tentar criar direito novo, na exacta medida em que vem dar uma
definição de prevenção activa e passiva que não estão plasmadas na lei e
por não resultar desta. Se neste último caso o vicio é de erro na interpretação,
no caso da prevenção activa há de facto uma tentativa de criar direito
novo. Na verdade, a definição de prevenção passiva que o despacho
comporta, e os despachos n.º 11/2002-SEC/DN e 24/2002-SEC/DN
corroboram, não só não constam da lei como acaba por dar justificação ao
que injustificado fica. Efectivamente, quer se queira, quer não, a única
definição válida para a prevenção passiva será a constante do art. 14.º do
Despacho 248/MJ/96.
Ou seja, através da definição de unidade de prevenção se alcança que a
prevenção passiva será aquela em que o pessoal não está obrigado a
permanecer fisicamente nas instalações, fica permanentemente contactável
e disponível para acorrer às necessidades de serviço…". Mas, deste normativo
não se alcança o conceito de prevenção activa que retiramos apenas da sua
conjugação com a Portaria n.º 98/97, de 13 de Fevereiro, quando entende
diversificar o pagamento do serviço de prevenção consoante o funcionário
seja ou não chamado à prestação efectiva de trabalho - O n.º 4 da portaria
a que se faz referência diz expressamente "A prestação efectiva de trabalho
por parte do pessoal que integra o serviço de unidades de prevenção ..."
enquanto que o n.º 3 quando se refere a "O suplemento de prevenção é
fixado em..." pretende de facto e de direito assegurar a percepção de uma
importância pelo facto do funcionário estar escalado e como tal retido sem
poder ausentar-se, mas sem que tenha sido chamado à prestação efectiva.
Mais grave ainda quando se pretende e se afirma que apenas há "... lugar
ao pagamento da prestação de trabalho para além da sua duração normal
(prevenção activa) quando esta tiver lugar entre as 20horas e as 08horas.",
3.º Painel - Dr. A. Jorge Braga
quando bem se sabe que enquanto não houver alterações, sobre a matéria,
funciona o despacho 248/MJ/96 do qual se conclui que o serviço de unidades
de prevenção será sempre feito - quer se trate de prevenção passiva quer
activa - "...durante o espaço de tempo não abrangido pelo horário de
trabalho diário.". E, sendo certo que o período de trabalho diário é o que
decorre do despacho normativo 18/2002, sempre se dirá que não há qualquer
fundamento para o que vem sendo definido pelo Director Nacional. Ou
seja, um funcionário que não estando integrado em unidade de prevenção
careça - enquanto conceito novo que terá de ser observado como
especificidade ao trabalho extraordinário do pessoal de investigação - ou lhe seja exigido a continuidade de funções para além do seu horário de
trabalho, tem de ser remunerado como trabalho extraordinário.
Eventualmente, os despachos a que nos vimos referindo estarão vocacionados
apenas para a tentativa de não remuneração do trabalho extraordinário,
pelo menos assim se nos afigura. Propendemos porém, para análise algo
diversa daquela, pois que sendo nosso entendimento que as unidades de
prevenção funcionam por escala, não se pode remunerar de igual forma
um funcionário que não estando escalado seja chamado ao serviço. Neste
caso, temos uma situação de trabalho extraordinário que, na ausência de
regulamentação terá de obedecer, na íntegra, ao estipulado no decreto-lei
259/98, designadamente quanto à forma de remuneração.
O Despacho n.º 6/2002-SEC/DN constitui, assim, e em nosso entendimento,
um acto administrativo nulo por estar a criar direito novo, em área para a
qual tem competência exclusiva o Ministro da Justiça, tal como melhor se
alcança do art. 79.º da LOPJ. Entendemos desta feita, independentemente
do conceito que se use de acto administrativo não ser pacífica a questão,
tanto mais que à luz do art. 123.º do CPA faltar-lhe-iam elementos, mas,
com a inequívoca certeza da sua ilegalidade. De facto, e a titulo de parêntesis
podemos verificar que além do conceito de acto administrativo decorrente
do art. 120.º do Código de Procedimento Administrativo e dos conceitos
formulados pela doutrina - para Rogério Soares - Direito Administrativo,
Coimbra, 1978, pág. 76 - o acto administrativo "é uma estatuição autoritária,
relativa a um caso individual, manifestada por um agente da Administração
no usos dos poderes de Direito Administrativo, pelo qual se produzem efeitos
jurídicos externos, positivos e negativos". Para Freitas de Amaral - Direito
Administrativo, Vol. III, pág. 66 - o acto administrativo será "o acto jurídico
unilateral praticado por um órgão da administração no exercício do poder
administrativo e que visa a produção de efeitos jurídicos sobre uma situação
individual num caso concreto". E, por fim e para não ser fastidioso, Alves
Correia - alguns conceitos de Direito Administrativo, 1998, pág. 7 e segs. - comunga da opinião de Rogério Soares. Diremos assim que o aspecto
individual terá in casu, de ser entendido como uma aplicação casuística sob
pena de termos de considerar aqueles actos como verdadeiros regulamentos.
Não concorre por isso o entendimento de Freitas do Amaral quando afirma
que a individualidade do acto terá de ser levada ao pormenor de que "é
103
104
3.º Painel - Dr. A. Jorge Braga
preciso individualizar o destinatário pelo seu nome e morada para que haja
acto administrativo", pois que no nosso entendimento este será antes um
acto geral e como tal resignados a uma situação concreta mas com plurimos
destinatários. De qualquer das formas, e mesmo que de forma diversa se
entenda, estaremos eventualmente sobre um conflito entre o que nos diz o
art. 120.º e o 114.º do Código de Procedimento Administrativo. Mas, de
qualquer das formas perante a ilegalidade destes despachos enquanto
regulamentos feridos que estão de nulidade.
Em suma, a dificuldade de abordagem da questão que nos toma o tempo
nesta altura, centra-se apenas em termos de um duplo prejuízo para os
funcionários da investigação, porque não são remunerados pelo trabalho
executado como o deveriam ser e, porque se lhe cria um entrave
presumivelmente legal que obsta ao seu direito de remuneração pelo trabalho
efectivamente prestado nem ao descanso devido entre o terminus da
prestação e o inicio do período seguinte.
Em boa verdade, com esta revogação de diplomas e sua repristinação por
outro, é conseguido que o trabalho seja executado com todo um conjunto
de prejuízos quer económicos quer físicos e psíquicos. Mesmo assim, como
veremos de seguida, importa desde já que esforços sejam desenvolvidos no
sentido de uma dignificação do trabalho de polícia, ao nível das correctas
definições e balizamentos do trabalho extraordinário, de prevenção passiva
e activa e consequente remuneração sem limitações, que a todos importa
quer como funcionários de investigação quer como cidadãos deste país.
III - O nosso entendimento como contributo para uma possível solução
É para nós líquido que aos funcionários de investigação em matéria de
horários de trabalho lhe terá de ser aplicado o disposto no decreto-lei
259/98, de 18 de Agosto - aliás, na senda do que admite o Ministério da
Justiça no âmbito do despacho 18/2002. Reconhecemos também que
dificilmente aquele diploma poderá ser aplicado tout court sob pena de
paralisação da investigação. Efectivamente, não será possível conceber a
investigação sujeita a limites temporais, designadamente por aqueles que
são impostos pelos art. 27.º (duas horas por dia/120 por ano e com o limite
de 9 horas diárias de trabalho) e 30.º (receber mais de um terço do índice
remuneratório respectivo). Aliás, a este último limite se refere o art. 7.º da
Portaria 98/97, de 13 de Fevereiro.
Contudo, a imperatividade deste limite poderá levar à paralisação dos
serviços, ou pelo menos funcionará, naturalmente, como elemento de
clivagem na organização e funcionamento daqueles por nítida falta de
incentivos, e não como catalizador de esforços no agilizar do serviço.
3.º Painel - Dr. A. Jorge Braga
Por outro lado, deverá vingar a definição de unidade de prevenção, de onde
decorre o conceito de prevenção passiva - que pugnamos de forma clara
e definitiva faça prevalecer a ideia de que as unidades de prevenção passiva
são constituídas por funcionários de investigação, para estarem alerta e em
situação de inteira disponibilidade, sempre fora do período normal de
trabalho. Por esta situação deverá ser atribuído um suplemento remuneratório
(que a actual lei já prevê) e que, desta decorrerá a prevenção activa. Ou seja,
só poderá passar à situação de prevenção activa o funcionário de
investigação que se encontra integrado na respectiva unidade de
prevenção. Quer isto significar que a prevenção activa, terá de ser
considerada unicamente como um estádio da prevenção passiva. Por seu
turno, todas as situações de trabalho para além destas e das dos piquetes
devem ser consideradas como trabalho extraordinário. Este deverá ainda
não estar sujeito à regra rígida de ordem expressa do superior hierárquico
mediato mas do imediato.
Finalmente, não entendemos como será possível conceber toda esta carga
de trabalho com limite de 1/3 da remuneração base, que em alguns casos
será rapidamente esgotada.
Impõe-se assim, sem necessidade de reclamar os direitos decorrentes da lei
23/98, de 26 de Maio, que o governo, através do Ministério da Justiça, ouça
as organizações representativas do pessoal de investigação sobre esta matéria
e ponha assim cobro ao vazio, ou se quisermos, à repristinação de normas
revogadas neste momento obsoletas. Este diploma a aprovar, deveria
consagrar não apenas os conceitos mas essencialmente as regras de aplicação
(períodos máximo de trabalho, descanso semanal, descanso complementar,
etc) e valores a atribuir às diferentes situações em que pode decorrer o
trabalho extra horário (piquete, prevenção passiva, prevenção activa e
extraordinário).
É ainda nosso entendimento que estas disposições surjam através de
regulamento e sem limite de pagamento – já que situações menos
reclamantes deste princípio já existem no seio da Administração Pública
(motoristas, etc.), com a indicação expressa de que este poderá ser efectuado
por compensação ou em numerário, mas sempre por opção unilateral do
funcionário.
Deverá ainda ser fixado um número máximo de horas de trabalho consecutivo
para obstar a situações de violência sobre os funcionários, que em nada
aproveitam ao serviço e os coloca em risco.
Afigura-se-nos assim urgente a publicação deste diploma como forma de
por cobro a situações menos claras e, sobretudo a atropelos da lei. Pela
nossa parte, com o que nos for solicitado por tal pugnaremos, já que
entendemos que a solução é possível e dignificante da Polícia Judiciária
mas, acima de tudo, do Estado Português.
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3.º Painel - Debate
Debate
Dr. Teodósio Jacinto
Estas propostas não serão o milagre de que falava o Sr. Gérard, mas serão
certamente um contributo muito válido. Quem é que se inscreve em primeiro
lugar? Faça favor...
Dr. Carlos Ribeiro (Psicólogo)
A minha questão vai directamente para o Dr. Jorge Braga. Eu tenho duas
coisas para lhe dizer: em primeiro lugar, quero agradecer-lhe, porque me
tirou dos ombros o peso der ser o contestatário de serviço,...
Dr. Teodósio Jacinto
Desculpe interromper, isto é uma discussão franca e aberta, não há
contestatário de serviço...
Dr. Carlos Ribeiro
As palavras não são minhas..., em segundo lugar devo-lhe dizer que me
assustou e assustou-me porquê? Eu já tinha percebido há cerca de dois
anos, a partir da análise, quer do regulamento de classificações de serviço,
quer do regulamento de carreiras da PJ, que a tutela da PJ não era
propriamente constituída por "expert’s", quer em gestão de recursos
humanos, quer em psicologia do trabalho. Hoje fiquei a perceber que,
pasme-se, também não é constituída por "expert’s" em Direito!
Dr. Teodósio Jacinto
Se me permite... a Direcção da Polícia não está aqui para responder e é das
regras do jogo que se estabeleça o contraditório. Quem me conhece sabe
bem que não é do meu feitio coarctar a palavra a ninguém. Mas aprendi no
Direito Romano que é preciso ouvir a outra parte e como penso que quem
está aqui não está mandatado para esse efeito, devemos prosseguir o debate
evitando acusações a quem não esteja presente para se defender...
João Rouxinol
Queria colocar uma questão à Dr.ª Cristina Soeiro: sendo certo que já foi
testado ou pelo menos foram feitos estudos dentro da Polícia e no quadro
dos investigadores que apontam no sentido de que um dos principais factores
indutores do stress é a má gestão organizacional da polícia, com
consequências negativas nas condições de trabalho, em injustiças
permanentes, no não reconhecimento do mérito, no crescendo de
3.º Painel - Debate
burocratização e de formulários, nos concursos com irregularidades e
ilegalidades, etc., etc., etc., pergunto-lhe claramente se os resultados desses
estudos são transmitidos à Direcção da Polícia.... Porque se realmente a
Direcção da Polícia tem acesso a estes dados e não faz nada para modificar
este estado de coisas, alguém está a cometer uma falha muito grave...
Miguel Freitas (Inspector no DIC da Guarda)
Eu queria fazer duas perguntas. Não sei se me é permitido aqui interpelar
também a ASFIC... A primeira era para a Dr.ª Cristina Soeiro e era para
saber se existe um perfil de polícia, para a Polícia Judiciária, se esse perfil é
aplicado nos concursos.
Penso que há aqui uma clara contradição entre a teoria e a realidade: por
um lado o gabinete de psicologia da Polícia vem-nos dizer que o polícia
bem adaptado é aquele que tem uma vida equilibrada fora da polícia, que
tem oportunidade de conviver com a família e com os amigos, mas a
realidade, que aliás estamos hoje precisamente a discutir aqui, é
rigorosamente o contrário, ou seja, a Polícia exige que trabalhemos quase
em permanência.
Por outro lado estamos vinculados ao segredo profissional e ao segredo de
justiça... eu pergunto como é que nós podemos contar as nossas angústias
e os nossos problemas concretos à nossa mulher ou à nossa família?
A família não percebe nem aceita que passemos tanto tempo fora a trabalhar
e por outro lado é muito difícil para nós dar-lhe uma explicação sem entrar
em pormenores...
A outra questão é para a ASFIC, mas é mais um alerta que uma questão. Eu
queria que a ASFIC ficasse agora mais alerta depois de ouvir a opinião dos
juristas que aqui vieram falar no que concerne aos horários de trabalho e à
compensação. Julgo que perspectiva deles deve passar a ser também a nossa.
É preciso que se diga também que o trabalho de investigação criminal incide
quase exclusivamente sobre o inspector e é por isso mesmo que ele tem
problemas de horário de horário de serviço e de compensação e sofre com
isso.
Porque é claro, se um inspector tem de estudar o processo, nomeadamente
as implicações penais e processuais penais, tem de estabelecer um plano
de trabalho, se tem de fazer as inquirições, os interrogatórios, as vigilâncias,
os exames, as buscas, as capturas, se ainda tem de fazer os ofícios à
máquina, conduzir as viaturas, preencher as fichas das viaturas, mudar as
mobílias quando há mudanças... Bom, eu vou parar por aqui... É claro que
se coloca aqui uma questão de tempo e de horas que muitas vezes não é
compatível, nem com a dignidade do investigador, nem com a qualidade
da investigação.
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3.º Painel - Debate
António Pedro (Inspector na Polícia Judiciária do Porto)
Queria colocar uma questão ao Dr. Jorge Braga, relativamente aos Piquetes:
fazemos um piquete de vinte e quatro horas, que pode acontecer prolongar-se por mais cinco, sete, dez horas... há dias um colega fez quarenta e
quatro horas consecutivas. A questão concreta que eu coloco é esta: para
além das vinte e quatro horas como é que deve ser contabilizado este tempo
excedente? Prevenção activa ou trabalho extraordinário?
Dr.ª Cristina Soeiro
Eu vou responder ali ao...como é que se chama o Sr.?... Eu acho que percebeu
mal a minha explicação, entendeu claramente mal o que eu disse e eu vou
explicar melhor, está bem?
A primeira é relativamente à questão do perfil de polícia da PJ. Eu costumo
dizer que não gosto de trabalhar com a noção de perfil. O perfil é para
outras coisas. Quando estamos a seleccionar profissionais que trabalham
nesta área, em primeiro lugar tentamos saber o que é que caracteriza esta
realidade profissional. Bom, nós não precisamos do perfil de um certo tipo
de pessoa. Como vocês sabem melhor que eu, este trabalho é composto
por diferentes tipos de realidade. Na verdade, a realidade é tão vasta que a
PJ precisa de pessoas com diferentes formações, com diferentes apetências
e até diferentes fisicamente. O que há de certeza é um conjunto de
características que as pessoas têm que ter para poderem desempenhar este
trabalho.
De resto, este estudo contribuiu para identificar um conjunto de
competências para nós trabalharmos na selecção, para podermos fazer uma
melhor triagem das pessoas que terão potencialidades para se adaptar melhor
à função e levamos isso muito a sério.
Neste aspecto a resposta é sim, tudo isso é trabalhado e é utilizado na
selecção. E temos em conta também as experiências das outras polícias que
têm o mesmo tipo de trabalho, para saber como é que resolvem estes
problemas.
Na verdade, não há um perfil de polícia, mas sim um conjunto de
competências que são extremamente importantes ao desempenho da
função. Quero com isto dizer, que nem todas as pessoas podem ser polícias
se não tiverem determinadas competências, como por exemplo o controlo
emocional, a capacidade de resposta em situações imprevisíveis, etc.
Há pessoas que de facto não têm essas capacidades de resposta, e outras
que não as conseguem treinar. Algumas destas competências podem ser
treinadas e aperfeiçoadas na formação e depois na experiência profissional,
mas outras não e, portanto, nós temos de saber escolher as pessoas levando
em linha de conta tudo isso.
3.º Painel - Debate
Julgo que não é preciso contarem os casos que têm em mãos em pormenor
para conseguirem explicarem às pessoas o que é que os preocupa. Quando
não se fala o que acontece frequentemente é que os familiares imaginam
que estão a realizar trabalhos altamente secretos, com um risco muito
superior ao risco real. É que se os vossos familiares e amigos não perceberem
exactamente o que é que fazem ganham um estereótipo muito mais
acentuado, o que dificulta a capacidade deles para vos perceber e dar-vos o
apoio que precisam, foi só isso que eu quis dizer.
Relativamente à segunda questão o que eu quis dizer foi o seguinte: o estudo
detectou e listou os factores de stress identificados pelas pessoas que
responderam aos questionários. A partir dele podem-se tirar conclusões sobre
o que ajuda e não ajuda a facilitar o desempenho da vida profissional do
investigador criminal, que é complexa e de facto origina situações de elevado
nível de stress.
Relativamente à questão que o Rouxinol me colocou, posso dizer que a
informação que resultou deste trabalho está a ser utilizada em várias vertentes
e que este encontro que vocês promoveram é mais uma forma de passar
esta informação para todos os níveis da organização.
Dr. Jorge Braga
Bom, vamos lá ver se eu consigo responder. Antes de mais eu, enquanto
advogado, primo e defendo a cem por cento o contraditório, aliás eu vivo
do contraditório, não é?... Eu tive o cuidado de deixar o texto que escrevi à
ASFIC, que passa a ser proprietária dele e que fará dele aquilo que muito
bem entender.
Quanto à questão dos piquetes de vinte e quatro horas, quero para já
dizer-vos o seguinte: um dos aspectos que se prende com esta questão é a
questão de sabermos qual será o número máximo de horas de trabalho
diário. Já vimos de manhã que eventualmente terá que haver aqui o
envolvimento da área médica e eventualmente da área da psicologia que
permita definir qual será o número de horas máximo de trabalho para o
pessoal de investigação criminal.
De qualquer das formas posso dizer-vos uma coisa: nove horas poderão
não ser o máximo. Nós já temos neste momento na administração pública
horários de doze horas; se vocês forem aos hospitais, as noites são de doze
horas; portanto não seria impossível, por exemplo, que o serviço de prevenção
ultrapassasse as doze ou até as vinte e quatro horas, mas em serviço de
prevenção passiva, entendamo-nos.
É óbvio que a prevenção passiva implica uma organização da estrutura e do
tempo de trabalho e isso já é aqui com o colega da frente que eu não sei o
nome.
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3.º Painel - Debate
De qualquer das formas, relativamente à questão que me coloca directamente
do Piquete ao fim das vinte e quatro horas, o que é que acontece se eu não
for rendido no Piquete? É óbvio que a lei diz que tem de continuar no
exercício de funções e isso compreende-se. Isso também acontece no regime
de turnos. Portanto, quem termina um Piquete ou quem termina um turno
terá que aguardar a sua rendição.
Como é que vai ser remunerado? Não tenho quaisquer dúvidas! Eu não
tenho aqui dúvidas nenhumas, tem que ser remunerado como trabalho
extraordinário...
Prevenção activa, não. Como é que podia entrar em prevenção activa se
nem sequer estava escalado para a prevenção?
Para este e para outros casos o que está implícito num esclarecimento ou
despacho, salvo erro o 11/2002, é que o funcionário entraria numa situação
de reforço à unidade de prevenção, portanto entraria em prevenção activa.
Aqui, como disse, levanta-se logo esta questão: como é que eu posso reforçar
uma coisa se eu nem sequer lá estou? Como é que eu posso ser considerado
de prevenção activa se eu nem sequer faço parte da escala de prevenção,
isto é, se eu não estou em prevenção passiva?
Há aqui incongruências graves e lamentáveis entre os conceitos. É como se
quisessem impingir uma interpretação que de antemão sabem que é... Bom,
no fundo isto não é uma interpretação, mas sim uma aplicação que, em
cada caso concreto, gera uma nulidade, que vocês podem e devem
individualmente atacar, certo? Nunca esquecendo que o acto de
processamento de vencimento constitui um acto administrativo e portanto
esse é que é o acto a atacar, atenção a isso...
Portanto, no caso concreto que foi aqui indicado haverá, sem qualquer
dúvida, lugar à prestação de trabalho extraordinário e como tal à respectiva
compensação, compensação esta que deve ser feita por opção do funcionário
e não por decisão unilateral de um despacho que diz que é por compensação
em tempo. Como é que nós pagamos a alguém com uma coisa de que não
dispomos? Se o trabalho é muito e não temos funcionários suficientes, se
não temos tempo para lhes dar como compensação? Bom, como diziam há
pouco, qualquer dia vocês têm um ano de férias para gozar, não é? Não
pode ser.
Dr. Reis Martins
(...)
Dr. Jorge Braga
É a portaria Sr. Dr.
3.º Painel - Debate
Dr. Reis Martins
(...)
Dr. Jorge Braga
É a portaria
Dr. Reis Martins
(...)
Dr. Jorge Braga
Está previsto na portaria na 97/98...
Dr. Reis Martins
(...)
Tavares Rijo (Inspector-Chefe na Polícia Judiciária do Porto)
Se me permitem, eu queria, não propriamente fazer uma pergunta directa
a nenhum dos elementos da mesa, mas fazer aqui uma ligeira reflexão,
porque vejo a conversa encaminhar-se num sentido que eu penso não se
coadunar com o alto nível que esta conferência teve até aqui.
Já agora cabe-me aqui felicitar todos os palestrantes e acima deles a ASFIC
pela realização desta tão importante e oportuna iniciativa.
A julgar por algumas intervenções até pode parecer que os funcionários da
Polícia Judiciária estão aqui a pedir esmola ou a discutir tostões.
A polícia Judiciária no seu todo é formada na generalidade por gente de
grande dignidade e é por isso mesmo uma instituição reconhecida nacional
e internacionalmente. O que eu ouvi aqui defendido por vozes de mérito
inquestionável, se é que percebi bem e não me enganei é que, em toda e
qualquer circunstância, deve ser sempre preservado o primado da pessoa
humana. Foi isto que eu percebi e creio que percebi bem.
No fundo o que todos nós temos vindo aqui a condenar é o modo como se
tem tentado o sucesso da instituição PJ, à custa da degradação da pessoa
humana, dos seus funcionários, em especial da investigação criminal... este
é que é o cerne principal da questão.
Não há nenhuma razão para alguém se sentir beliscado com as criticas que
aqui são feitas que, tenho a plena convicção, são feitas com intuitos positivos
e não negativos. Há que ter alguma serenidade para que isto termine com o
nível com que começou.
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3.º Painel - Debate
Eu fiquei deliciado com a intervenção do Sr. Dr. Jorge Braga, que não tinha
o grato prazer de conhecer. O Senhor Doutor modestamente disse logo no
início da sua intervenção que não tinha certezas, mas percebi rapidamente
ao longo da sua intervenção que essa falta de certezas era compensada
pelo facto de haver direitos, haver deveres, haver dados científicos e acima
de tudo haver uma lei, acima da qual ninguém pode querer estar, tenho
dito.
Manuel Rodrigues
Bom, eu queria resumidamente fazer aqui uma referência, sem pretender
aumentar o conflito e, obviamente, agradeço ao colega Tavares Rijo o ponto
da situação que fez neste momento.
Mas se me permitem, gostava de lembrar o seguinte: o Dr. Reis Martins
afirmou que a "casa", a Direcção da polícia, tentou com os normativos em
questão, melhorar ou aperfeiçoar situações. Gostava de lhe dizer, com a
franqueza com que sempre falamos, que se a intenção tivesse sido essa,
poderia ter procurado um espaço que permitisse, pelo menos, o diálogo
com a ASFIC como representante da maioria dos trabalhadores da
investigação criminal, e não o fez. E quero acrescentar ainda o seguinte: as
soluções que neste momento estão em vigor, foram na realidade impostas,
e não fruto de um diálogo ou pelo menos de um pedido de opinião a uma
organização que tem tentado ao longo do tempo, através de um diálogo
construtivo e de uma postura participativa, resolver graves problemas dentro
da instituição.
Joaquim Conceição (Inspector na DCCB)
Tenho uma questão para o Dr. Jorge Braga: tive o grato prazer de o ouvir e
concordo consigo, aliás acho que a maioria das pessoas aqui presentes
concordaram com a sua dissertação.
Estamos numa altura do debate em que se procuram soluções para esta
situação. O estudo que fiz em relação a esta matéria, que não é tão profundo
quanto o do senhor vai exactamente na mesma esteira. A questão é a
seguinte: vê alguma solução que passe pela isenção do horário de trabalho?
Dr. Jorge Braga
Não quis de forma alguma com a minha intervenção ser polémico, apenas
trazer aqui a minha análise, o meu ponto de vista estritamente jurídico-legal, só e mais nada; não alimento outro tipo de focos.
Em relação ao Dr. Reis Martins, com quem tive o grato prazer de almoçar na
mesma mesa, digo-lhe que eu nem sequer sabia que era membro da direcção
da Polícia Judiciária.
3.º Painel - Debate
Bom, eu entendo que tenho razão! Peço desculpa! E sem querer aumentar
polémica nenhuma, com o devido respeito pelo trabalho que foi feito e por
todas as opiniões diversas da minha, não posso deixar de reagir criticamente,
quando, por exemplo, leio a definição ou a tentativa de aclaramento de
definição de prevenção activa constante no despacho 11/2002. Só posso
reforçar mais uma vez aquilo que disse na intervenção anterior.
Diz-se aqui (no despacho) que a prevenção activa é considerada prestada
em regime de serviço à unidade de prevenção, considerando-se prevenção
activa o serviço que deva ser realizado fora do horário normal de trabalho.
Ora, estamos aqui a meter no conceito de prevenção activa situações que
são claramente de trabalho extraordinário.
Mais: a definição de prevenção activa retiro-a da portaria 98/97 onde ao
contrário se entende que a prevenção activa é um estádio da prevenção
passiva.
Aquilo que eu defendo é tão-somente isto: mantenhamos a definição de
prevenção passiva e em relação à prevenção activa digamos claramente que
é um estádio da prevenção passiva, o que portanto obriga uma forma de
regulação diferente.
As situações que caírem fora do âmbito destas duas situações serão
obviamente tidas como trabalho extraordinário; é tão simples quanto isto!
Não estou a tirar o coelho da cartola, esta é uma solução evidente.
É óbvio que também tive o cuidado de dizer que os problemas aqui são
mais do foro económico-financeiro, do que propriamente jurídico ou de
interpretação de conceitos. Até admito que a Polícia Judiciária e a Direcção
da Polícia Judiciária tenham problemas financeiros até dizer basta! Não é?
Principalmente quando chega ao fim do mês e tem de gerir a crise e a forma
de vos pagar a todos. De qualquer das formas, os recursos como dizia, e
bem, aliás é um principio que aprendemos logo nas primeiras lições de
faculdade, os recursos são sempre escassos, por muito que tenhamos temos
sempre pouco.
A questão que se me coloca em relação à isenção do horário de trabalho, é
de saber se ela será solução para o vosso caso. Na minha opinião nunca
seria solução na forma em que ela existe hoje formulada, porque a fórmula
em que ela está hoje formulada implica apenas a atribuição de um subsídio
e a possibilidade de não respeitarmos horas de entrada e de saída, há ali
uma plataforma fixa. Ora eu penso que isto não se coaduna com o serviço
de investigação, pelo menos numa forma de transposição automática.
Se optássemos e a discussão poderá ser essa, se optássemos eventualmente
por uma situação de isenção de horário teríamos que regulamentar bem
esta isenção de horário, porque ainda hoje temos isenção de horário de
vinte e quatro sobre vinte e quatro horas e este é um risco que eu entendo
que vocês não devem correr; eu dou-vos um exemplo: os funcionários das
direcções regionais de educação que exercem funções nas residências de
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3.º Painel - Debate
estudantes têm isenção de horário, para trabalhar vinte e quatro sobre vinte
e quatro horas. Acabam por dormir com os filhos na própria residência de
estudantes, porquê? Porque têm uma isenção de horário que lhes dá mais
trinta por cento da remuneração, sendo o horário normal das oito às vinte.
Só que, a partir das vinte entram no regime de isenção; está escrito, é um
tipo de isenção que eu não compreendo nos dias de hoje e que vai dentro
de dias evoluir para tribunais internacionais de certeza absoluta.
A pensar nessa solução teriam que ter o máximo de cuidado na sua
regulamentação para não cair na situação de o simples subsídio de isenção
implicar que a todo o momento vocês devessem estar ao serviço.
De qualquer modo, parece-me a mim que é com aquilo que temos hoje que
devemos trabalhar, ou seja com as noções de prevenção passiva, prevenção
activa e trabalho extraordinário. Teríamos era que regulamentar tudo isto
convenientemente.
Por outro lado, reparem que eu tive o cuidado de não dizer quais os valores
que entendia que deveriam figurar, porque também entendo que não devem
ser os mesmos da lei geral. Agora quais serão? Isso é uma questão que só a
discussão fará nascer; só depois de muito bem discutidos os conceitos.
Quando se optar por uma solução é que se deve partir para os números que
devem estar por detrás; admito perfeitamente que os valores do trabalho
extraordinário sejam inferiores aos da lei geral desde que tenhamos em
atenção por exemplo a questão dos limites.
É assim que eu entendo, não sei se a ASFIC entende assim ou não porque
nunca conversei com eles sobre isso, nem tenho que o fazer. De qualquer
das formas, parece-me a mim que dentro do actual quadro é perfeitamente
possível encontrar uma solução.
Agora, também digo muito claramente uma coisa: a forma como se está a
fazer hoje na Polícia Judiciária não é solução, nem sequer tem validade
jurídica.
Dr. Reis Martins
(...)
Miguel Freitas (Inspector no DIC da Guarda)
Eu peço desculpa por estar a incomodar os colegas com particularidades de
um departamento pequeno, como o da Guarda, mas queria aproveitar esta
oportunidade para colocar uma questão ao Dr. Jorge Braga, que é a seguinte:
por exemplo, no DIC da Guarda, não existe, apesar de ser obrigatório, um
serviço de prevenção, ou seja, todos temos que estar, todos os dias, de
prevenção passiva, mas sem receber nada por estar de prevenção passiva.
3.º Painel - Debate
Pura e simplesmente não há funcionários, não há serviço de prevenção, não
há escalas de prevenção, não há nada. Eu peço desculpa por estar a colocar
estes problemas, mas a Polícia Judiciária não é uma realidade homogénea.
Se as Directorias e as Direcções Centrais têm problemas, os departamentozitos como o DIC da Guarda têm problemas idênticos, só que acrescidos.
Interveniente que não se identificou
Eu só gostaria que me explicassem, por favor, se existe alguma
incompatibilidade na lei orgânica, que impeça a percepção de horas
extraordinárias. Nós não podemos ter horas extraordinárias? Qual é o
fundamento legal para isso?
Interveniente que não se identificou
Eu só queria colocar a seguinte questão: até há pouco tempo a prevenção
era feita vinte e quatro horas, entretanto, no último despacho passamos a
fazer prevenção de sete dias seguidos. Eu ainda não percebi porque razão é
que passamos de vinte e quatro horas para sete dias seguidos. São sete dias
que uma pessoa não consegue dormir ou não pode dormir descansado, era
só isso.
Interveniente que não se identificou
É só para aclarar a questão do meu colega: é que para além de serem sete
dias, no meu caso é só um funcionário de prevenção!
Dr. Jorge Braga
Dr. Reis Martins efectivamente estou de acordo, de facto criaram direito
novo, ainda bem que o admite. Mas permita-me: eu tive o cuidado de dizer
que o onze visava interpretar aquilo que o seis não conseguiu fazer.
De qualquer das formas e eu tive o cuidado de o referir no início da minha
intervenção, a questão que se coloca é esta: é que eu penso precisamente
ao contrário do que pensa o professor Liberal Fernandes. Eu entendo que,
em primeira-mão, à Policia Judiciária se aplica "tout court" a legislação da
função pública.
Na administração pública central e não só existem mais serviços, como o da
Polícia Judiciária, que têm legislação específica e que, ao contrário dos outros,
é essa a sua lei base, ou seja, a lei geral passa para eles a ser o regime
supletivo.
É assim que eu entendo de facto o art. 172 da LOPJ. Ou seja, quando a lei
específica da Polícia judiciária nada refere, resta-me o art. 172, que por sua
vez me remete para a lei geral.
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3.º Painel - Debate
Em termos de lei geral o que funciona é o 259/98, mas reparem, eu não
estou para aqui a dizer nenhuma inverdade ou extravagância, porque é o
próprio Ministro da Justiça, que no despacho 18/2002 o refere, quando diz:
no que cá não estiver funciona o 259/98.
Isto para lhe dizer que eu compreendi perfeitamente aquilo que disse, mas
se me permite, a limitação ao pagamento do trabalho extraordinário só
vem aparecer no despacho 13/2002. É o despacho 13/2002 que diz que o
trabalho extraordinário é compensado em tempo e não remunerado.
À luz desse despacho se passássemos à prevenção activa eu recebia, senão,
recebia em tempo e em tempo já se sabe que não recebo coisa nenhuma.
Eu entendo o que se pretende e como tal também não posso deixar de
entender isto como um subterfúgio infeliz.
Não posso deixar de entender enquanto advogado, colaborador da justiça,
não sei se está aí a Sr.ª Procuradora-Adjunta, que todos nós, operadores da
justiça, tudo devemos fazer para aplicar correctamente a lei e para assegurar
que esta esteja de acordo com a realidade, porque senão não andamos
aqui a fazer nada.
No vosso caso é necessário ajustar a lei, mais do que tentarem fazer
remendos. Quando me dizem que no DIC da Guarda não há unidades de
prevenção, bom, se não houver unidades de prevenção terá que haver
trabalho suplementar. Penso que aqui o Dr. Reis Martins já tomou nota
para ver o que se passa lá na Guarda.
A última questão está mais ou menos respondida, tem a ver com o facto de
se saber se a lei orgânica prevê ou não o pagamento de trabalho
extraordinário. É óbvio que sim, o art. 79 não tem qualquer limitação. O art.
79, aquilo nos diz é que o serviço permanente é assegurado fora do horário
normal por... mas não diz que todo o serviço fora do horário normal seja
permanente, não é isso que a lei diz, nem podia dizer.
O que a lei diz é que o serviço permanente é assegurado, fora do horário
normal, por piquetes de atendimento, por unidades de prevenção ou turnos
de funcionários. Portanto, quando eu não estou numa coisa, nem noutra,
eu estou em trabalho extraordinário.
Vamos lá a ver, vamos cortar a direito: eu hoje saio às 17h30 e não estou
integrado em nenhuma unidade de prevenção passiva. Logo não posso passar
à prevenção activa. No entanto, exigem a continuação da minha prestação
de trabalho, logo eu vou entrar em trabalho extraordinário. É tão
simplesmente como isto. É isto o que está previsto na lei.
Se a LOPJ não regula e a lei geral também não é adequada, vamos então
regulamentar criar regras novas justas e equilibradas, independentemente
3.º Painel - Debate
dos montantes, porque isso para mim é sempre suplementar. Para mim o
importante é começar por definir com rigor os conceitos de forma a coadunar,
por um lado, um serviço da Polícia Judiciária eficiente, que sirva bem os
cidadãos, e por outro, que tenha ao mesmo tempo em atenção que vocês,
tal como eu, são cidadãos com plenos direitos, são seres humanos e portanto
carecem de ser tratados como tal.
É isto que me preocupa e que deve preocupar-vos, a forma de pagamento
virá por arrasto, isso é acessório, convençam-se disso.
Agora o que nós não podemos fazer, como tem sido feito pela Polícia
Judiciária é chamar burro ao cavalo e cavalo ao burro...
No Direito temos que ser precisos nos conceitos que utilizamos; a precisão
de conceitos é elementar no direito e portanto nós não podemos classificar
como prevenção activa situações que são claramente de trabalho
extraordinário, entendido?
De qualquer das formas a lei orgânica prevê o pagamento de trabalho
extraordinário, O que acontece agora é que o despacho normativo 18/2002
quando vem regulamentar o horário de trabalho na polícia Judiciária acaba,
salvo erro no art. 13, por dizer que a compensação deste trabalho é feita
em tempo e isto é que me parece que está profundamente errado.
A lei geral 259/98 aquilo que diz é que o trabalho extraordinário é pago em
tempo ou em numerário, por opção do funcionário e este tem de exercer
esse direito no prazo de oito dias após a realização do trabalho. Parece-me
que é isso que deve funcionar também no vosso caso, porque se vamos
dizer que a compensação é feita apenas por compensação em tempo vamos
cair no laxismo de mandar fazer porque sabemos que nunca mais vamos
pagar esse tempo. Este é que é o círculo vicioso que deve ser evitado.
Interveniente que não se identificou
Não é nenhuma questão, é só um esclarecimento. Antes de se pagarem
prevenções activas havia uma figura que fazia com que nos pagassem as
horas de trabalho, digamos as extraordinárias, ou seja a continuação de um
serviço que se prolongava para além das 17h30, que tinha este título
pomposo: "extensão de Piquete". Isto existia desde os anos 80 e o valor era
exactamente igual ao que hoje existe para a prevenção activa, com as devidas
actualizações, porque inicialmente eram trezentos e tal escudos à hora e
agora já são quinhentos escudos.
Dr. Reis Martins
(...)
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3.º Painel - Debate
João Rouxinol
Eu não quero acreditar no que ouvi, mas infelizmente todos ouvimos.
O que se pretende dizer é o que não foi dito, ou seja, havia um pagamento
que sempre foi feito entre as 17h30 e as 20h como qualquer outro que era
feito, só que a partir do dia um de Junho a direcção entendeu unilateralmente
que o pagamento pelo trabalho prestado entre as 17h30 e as 20 horas
passaria não a ser remunerado em dinheiro mas sim em compensação
temporal. Portanto a remuneração passou de remuneração em dinheiro
para a compensação temporal. E querem que consideremos esta solução
como um acto normal cheio de boa fé...
Dr. Jorge Braga
Bom, ainda bem que há limites porque senão... Eu vou muito rapidamente,
até porque sou mais parco em palavras do que o Professor Jorge Leite.
Infelizmente não tenho a possibilidade de falar como ele fala, nem todos
somos dotados desse dom. Mas só para dizer ao Dr. Reis Martins isto: entrar
às oito ou entrar fora das oito horas, ou sair às dezanove ou sair às vinte,
não é isso o que conta, o que conta é se eu ou vou para a modalidade A, ou
para a modalidade B, das plataformas fixas, ou seja, dentro do horário flexível
há um hiato de tempo em que eu tenho que estar ao serviço e portanto
esse hiato vai-me permitir aferir do horário de trabalho que eu estou a
praticar.
Agora vou repetir aquilo que disse o Professor Dr. Jorge Leite, assunto sobre
o qual ele escreveu muitas páginas: é que, efectivamente, o horário de
trabalho tem que ser aferido ao dia, e do dia à semana, e portanto é nesta
base e é com esta base que nós temos que trabalhar.
Por isso é que, na intervenção que fiz eu me referi ao descanso e ao descanso
semanal.
Pegando agora numa questão, mesmo para terminar, tendo em atenção
que somos um país tradicionalmente católico, apostólico romano, que
fazemos como Cristo, «ao sétimo pararás». Isto significa que a nossa semana
tem que ter sete dias e desses sete, dois são de descanso, portanto é nestes
cinco que eu tenho que aferir o horário das trinta e cinco horas, é esta a
questão que se coloca.
Portanto, se eu nestes sete, retiro dois para descanso e descanso
complementar, se já cumpri as trinta e cinco, nas restantes horas só posso
estar em Prevenção ou em Piquete ou então em trabalho extraordinário.
É tão simples quanto isto! Peço desculpa, mas continuo ainda com a minha
bitola.
3.º Painel - Debate
Gérard Greneron (Secretário-Geral do CESP)
No seguimento de toda esta discussão quero apenas fazer um pequeno
reparo: constatei que o representante da Direcção da PJ, aqui presente,
construiu uma autêntica barreira de considerações, pelos vistos sem qualquer
fundamento legal, às questões e às preocupações que aqui foram tratadas
de um modo muito técnico e científico.
Desculpem-me agora, porque eu vou fazer o mesmo que ele: proponho
como solução destes problemas todos, que numa futura candidatura para o
ingresso de Inspectores, nos critérios de selecção se passe a incluir, como
requisito eliminatório, que os candidatos não saibam fazer contas.
Pelo que ouvi, até fico surpreendido de ainda não terem ainda encontrado
essa solução.
Dr. Teodósio Jacinto
Antes do encerramento e de dar a palavra ao Presidente da ASFIC/PJ quero
sublinhar que aqui ficou mais vez reafirmado o papel essencial que a Polícia
Judiciária desempenha numa sociedade democrática, onde é seguramente
um dos pilares mais fortes do Estado de Direito.
Hoje este Corpo Superior de Polícia que é a PJ defronta-se com uma realidade
altamente complexa, com uma criminalidade cada vez mais grave e cada
vez mais sofisticada. Por outro lado, temos também cidadãos cada vez mais
exigentes, que querem que a PJ dê respostas não só eficazes, mas também
céleres.
Como é evidente tudo isto nos confronta com um problema de difícil
resolução, que é o miolo e a essência do que estivemos aqui a tratar.
Foi sublinhado muitas vezes e bem, que isto de resultados rápidos e em
cima da hora não pode ser feito e conseguido há custa dos investigadores,
tendo sido apontado como limite a dignidade da pessoa humana.
Pessoalmente também considero que para ter bons resultados o polícia,
como qualquer cidadão, tem que ter a sua vida pessoal garantida e
organizada.
O grande Jorge Luís Borges dizia uma coisa parecida: para bem
desempenharmos a nossa profissão temos que estar felizes.
Se formos felizes conseguimos resultados. É com muito agrado que eu noto
que quem vem para a Polícia Judiciária vem com um sentido de opção muito
forte. Aqui há dias uma aluna partiu uma clavícula num acidente e a primeira
coisa que ela perguntou foi se isso a ia fazer perder a frequência do curso.
Recordo também um jovem Inspector licenciado que foi connosco à
Universidade Nova falar do acesso à carreira do investigador criminal
responder, a dada altura, que sendo licenciado já não punha a hipótese de
desempenhar outra profissão.
119
120
3.º Painel - Debate
O nosso colega Gérard Greneron também falou da paixão de ser polícia e
todos sabemos que a paixão é essencial ao desempenho desta actividade.
A Polícia Judiciária porque é grande, vai continuar a dar a resposta que o
cidadão exige, ao mesmo tempo que vai resolver os problemas que hoje
foram aqui debatidos e clarificados, para que esse combate contra a
criminalidade não seja efeito à custa dos direitos dos investigadores. Isto
para mim é muito elementar.
Para terem resultados têm que estar em boa forma, a todos os níveis. Como
é que vamos resolver o problema dos horários de trabalho? Como é que
vamos enquadrar a disponibilidade funcional? Como é que esta deve ser
compensada?
O Gérard Greneron também aqui disse que a solução tem sido muito difícil
de encontrar e que continua a ser um problema pendente nos outros países
europeus.
Eu acredito com o contributo de todos e de cada um de nós, não apenas da
Direcção, que a solução vai rapidamente ser encontrada.
A grandeza da PJ não é da Direcção A ou B é de todos os seus quadros que
são a sua maior riqueza.
São problemas complexos para resolver, mas ficou também aqui dito que as
soluções podem e devem ser encontradas no tal balanceamento entre os
diferentes interesses em jogo, o interesse público, por um lado e os direitos
legalmente consagrados dos funcionários que têm de ser respeitados.
Termino a felicitar mais uma vez a ASFIC, por esta notável organização e
pela escolha de um painel tão extraordinário.
Manuel Carneiro Rodrigues (Presidente Nacional da ASFIC)
Muito obrigado Sr. Presidente. Eu não vou fazer as conclusões deste encontro,
vou apenas dizer que as conclusões vão ser divulgadas no mais breve espaço
de tempo possível num livro que a ASFIC/PJ irá publicar e comprometemo-nos
a fazê-lo porque penso ser do maior interesse de todos nós.
Não posso deixar de agradecer a forma como os trabalhos de hoje
decorreram, o nível dos oradores, a sua disponibilidade, a forma superior
como foi moderada pelo Dr. Teodósio Jacinto. Penso que na realidade a
ASFIC/PJ está de parabéns e ousava ainda dizer, que a Polícia Judiciária está
de parabéns também.
Queria informar que estão disponíveis no secretariado, certificados de
presença na conferência, os quais serão levantados individualmente.
3.º Painel - Debate
Queria enviar um agradecimento especial a toda a comissão organizadora
desta conferência, porque demonstrou um nível muito acima do amadorismo
que nos é exigido, por terem feito o possível e o impossível para permitir
que os trabalhos decorressem da forma e nas condições em que decorreram.
Queria agradecer à representante da Ordem dos Médicos, e permitam-me
este aparte, porque esteve estoicamente a acompanhar-nos o dia inteiro,
com uma atenção completa ao que aqui se passou, e obviamente merece
por isso uma referência muito especial. Sr.ª Dr.ª muito obrigado.
Queria agradecer ao Dr. Reis Martins, porque heroicamente compareceu
neste encontro e eu penso que ele sabe que todos nós lhe atribuímos a
responsabilidade dos despachos que estão em vigor e, por isso mesmo, a
sua presença aqui merece ser registada e dignificada. Sr. Dr. muito obrigado.
Por último, queria agradecer também ao Gérard Greneron, que penso ter
sido prejudicado pela dificuldade da tradução, mas acho que acompanhou
os trabalhos de um modo geral, o que lhe permitiu algumas observações
com importante significado.
Concluo, oferecendo ao Dr. Teodósio Jacinto, na qualidade de moderador
da Conferência, uma pequena lembrança da ASFIC/PJ, como forma de
agradecimento pela sua disponibilidade e superior participação.
A todos, muito obrigado pela vossa presença, um bom regresso a casa,
convidamo-vos como já disse a tomar um café e a conversarmos mais um
bocado. Obrigado a todos, espero que este dia como disse no início, não
tenha sido um dia perdido, antes pelo contrário, tenha sido um dia bastante
útil para todos nós.
A ASFIC/PJ vai oferecer também aos oradores uma lembrança igual à que
foi oferecida ao Dr. Teodósio Jacinto. Muito obrigado a todos.
121
122
Conclusões
Conclusões
Foi-me solicitado pela organização da Conferência a elaboração das
conclusões finais dos trabalhos ali apresentados.
É por demais óbvio que tal tarefa constitui um desafio ao qual a minha
qualidade de Presidente da Associação Sindical dos Funcionários de
Investigação Criminal da Polícia Judiciária em exercício, me obriga a não
declinar.
Não fosse essa circunstância e certamente procuraria alguém mais avalizado
uma vez que a complexidade do tema objecto de análise, o elevado nível
dos oradores e a qualidade técnica e científica das intervenções, não se
compadecem com uma leitura precária efectuada por um leigo na matéria.
Assim, espero conseguir a clarividência necessária para que a síntese
conclusiva que irei efectuar não prejudique de alguma forma todo o trabalho
desenvolvido em 21 de Março do corrente ano, o qual seguramente constitui
um marco significativo na vida da ASFIC/PJ.
Procurou-se com a realização desta Conferência, promover um espaço de
estudo, análise e debate, suportado num rigoroso contexto técnico e
científico, que possibilitasse a abordagem das questões inerentes ao Regime
de Trabalho na Investigação Criminal, uma vez que as diferentes perspectivas
de tratamento destas questões, essencialmente ao longo dos últimos anos,
apenas contribuíram para a criação de um indesejável nível de
desestabilização organizacional da instituição, traduzido pelo surgimento
de situações de conflito entre Investigadores e Direcção, entre Direcção e
Ministério da Justiça, entre Investigadores e Ministério e, mais grave ainda
pela repercussão quotidiana negativa que representa, entre Investigadores
e Chefias directas.
Quando aludo às diferentes perspectivas de tratamento destas questões,
refiro-me em primeiro lugar aos diversos normativos internos que surgiram,
os quais desde a primeira hora, na opinião da ASFIC/PJ, não conduziriam
à resolução dos problemas existentes no que concerne a uma justa
compensação das muitas horas que os investigadores trabalham para
além do horário normal de serviço.
De forma simples e directa, porque creio que argumentação excessiva só
serve quem pretende contornar as questões fundamentais, torna-se
necessário para uma abordagem abrangente da questão, a referência a três
vectores fundamentais:
O trabalho extraordinário na Polícia Judiciária nunca foi
reconhecido pela tutela como tal;
O mesmo sempre foi parcamente pago com recurso a fórmulas
compensatórias inadequadas;
Conclusões
A denominada compensação temporal, imposta unilateralmente,
contraria as leis do Trabalho e da Administração Pública vigentes,
com a agravante de ser impossível a sua aplicação aos investigadores
criminais, por força da natureza e condições específicas das funções
que desempenham.
Embora possa à primeira vista parecer inadequado estabelecer um paralelo
relativamente a outras medidas tomadas pela tutela no passado, os
normativos internos aplicados a esta questão resultaram inequivocamente
negativos, seguindo uma linha de pensamento idêntica à do Regulamento
de Piquete em vigor, no qual para furtar-se ao pagamento justo de tal serviço,
a Administração optou pela compensação em folga, poupando
aparentemente dinheiro mas falhando na não efectivação de um estudo
previsional que permitisse calcular o impacto que tal medida iria ter na
organização do trabalho, na produtividade e na eficiência da instituição.
Em termos de gestão, as polícias não são comparáveis a empresas
vocacionadas para a produção de lucro. As polícias constituem uma obrigação
estatal para defesa do cidadão, das instituições e da sociedade em geral.
O cidadão comum, que cumpre com as suas obrigações legais, tais como o
pagamento de impostos, respeitador do seu semelhante e da ordem jurídica,
tem absoluto direito a viver numa sociedade livre de crime e consequentemente, segura, sendo esta uma das regras basilares da democracia.
A gestão economicista das polícias, aplicada salvo honrosas excepções pelos
sucessivos governos, só contribuiu para que estas se tornassem instituições
obsoletas, compostas por quadros com deficiente formação, mal
apetrechadas de meios humanos técnicos e científicos.
Tal fórmula é constatada na realidade, pelo reconhecimento unânime que a
criminalidade evolui salvo raríssimas excepções mais rapidamente do que as
polícias e se encontra melhor apetrechada tecnologicamente, dificultando
acentuadamente as vertentes essenciais de prevenção e combate.
Voltando à essência da Conferência realizada pela ASFIC/PJ, convirá relembrar
que o tema no qual se centra, tem vindo a ser objecto de sucessivas tentativas
de solução que se arrastam no tempo sem que seja encontrada uma posição
consensual entre trabalhadores e tutela, bem como, contribua para os
pressupostos e objectivos da própria instituição.
Em reunião de trabalho efectuada a 08 de Outubro de 2002 no Ministério
da Justiça, foi unânime entre a ASFIC/PJ, o Director Nacional da Polícia
Judiciária e Ministra da Justiça, a constatação que, o trabalho desenvolvido
para além das horas normais de serviço na instituição não era
devidamente compensado, sendo urgente encontrar-se uma formula
consensual entre as partes que traduzisse ponderado reconhecimento
e justeza.
123
124
Conclusões
Na reunião em causa, foi solicitado pela Sr.ª Ministra da Justiça à ASFIC/PJ,
que contribuísse para a resolução deste problema apresentando uma solução
viável, enquanto o Ministério se iria igualmente empenhar no estudo de
uma solução a apresentar em curto prazo para discussão.
A Direcção da ASFIC/PJ assumiu o desafio proposto com a mesma postura
de sempre relativamente a qualquer problema que urge solucionar, e decidiu
que a discussão de uma questão desta natureza, não se deveria circunscrever
ao núcleo restrito dos órgãos dirigentes da Associação, mas sim, alargada a
todos os associados, para que estes se pudessem pronunciar e contribuir
activamente para que a desejada solução consensual e justa fosse encontrada.
Para que esse caminho fosse percorrido de forma sensata, correcta e
sustentada em argumentação rigorosa, a Direcção da ASFIC/PJ entendeu
necessário que o estudo desta problemática englobasse uma análise profunda
sobre as diversas vertentes relacionadas com a especificidade das funções
que o investigador criminal desempenha, razão pela qual, solicitou a
colaboração de especialistas de diversas áreas, possibilitando dessa forma
uma abordagem científica que constituiu um complemento à vertente
sindical, amplamente reconhecida por diversas personalidades, comunicação
social e pela generalidade dos participantes.
Poder-se-á então questionar. Mas o que está em causa não se trata de uma
mera reivindicação sindical relacionada com o pagamento das horas de
trabalho que os investigadores efectuam para além do horário normal? O
que eles querem não será mensalmente uns euros a mais? Francamente,
eles que até já ganham bem..., para quê todo esta panóplia de questões
técnicas e científicas que a Associação Sindical insiste em apresentar?
Esta é normalmente a perspectiva como os problemas relacionados com o
mundo do trabalho são analisados por um número infelizmente significativo
de individualidades ou equipas dirigentes, sobre quem recai o dever e
responsabilidade não só moral mas também de tutela, relativamente àqueles
que prestam serviços, perspectiva que no caso de organismos de Estado se
revela ainda mais comum.
Mas também acreditamos naqueles que têm consciência plena de que uma
gestão eficaz e moderna, deve obrigatoriamente ter em consideração um
conjunto de factores directos e indirectos, de formação, de meios, sejam
eles técnicos, científicos ou humanos, de higiene, de segurança, de
instalações, de condições psíquicas e físicas, etc... factores estes que
necessitam de tratamento específico e individualizado, orientados na
perspectiva dos objectivos finais perseguidos pela instituição ou organismo,
fórmula única que permite a obtenção de resultados eficazes, evitando
desperdícios materiais, temporais, doenças profissionais, desmotivação,
enfim, um sem número de consequências prejudiciais que dispensam
explicação pormenorizada, mas que caracterizam o universo do trabalho no
Conclusões
nosso país e cuja responsabilidade, por conveniência, ou por incapacidade
de realização de estudos especializados das causas, são frequentemente, de
forma insustentada, atribuídas aos trabalhadores.
Pelas razões expostas, a ASFIC/PJ procurou trazer a debate os circunstancialismos que revestem a vida profissional de um investigador criminal,
possibilitando uma visão alargada e clara, dos riscos não só físicos e da
própria vida, directamente interligados com a profissão, mas também
procurar percepcionar a existência de riscos de outra índole, tais como
psicossociais, físico-patológicos que se desenvolvam ou agravem como
consequência do desempenho profissional.
Assim, consideramos que o grande objectivo da Conferência era o de tornar
perceptível a existência ou não desses riscos, e em caso afirmativo sensibilizar
as instâncias de decisão para a necessidade e até, obrigatoriedade legal, de
uma atitude preventiva desses mesmos riscos, numa perspectiva de gestão
de recursos humanos.
Simultaneamente, tendo como pano de fundo o regime de trabalho na
Função Pública (definido pelo DL 259/98) onde se prevê a possibilidade de
restrições de direitos através de leis especiais (regulamentos de trabalho)
para os considerados "Corpos Especiais" (polícias, médicos, enfermeiros,
bombeiros, etc...), o outro objectivo desta conferência era o de saber até
onde essas restrições de direitos podem afectar o corpo de funcionários de
investigação criminal da Polícia Judiciária, os quais são frequentemente
sujeitos a cargas horárias de intenso trabalho, sem limites de horário, sem
pausas para descanso ou mesmo refeições, com rotinas de jornadas de
trabalho contínuo por vezes superiores a 24 horas.
Em suma, com esta Conferência, a ASFIC/PJ pretendeu proporcionar
condições para uma reflexão serena, séria e multidisciplinar, sobre o Regime
de Trabalho na Investigação Criminal, e as suas condições de prestação,
visando encontrar soluções a aplicar num futuro próximo que
compatibilizem o interesse público com os direitos dos funcionários.
Assim, julgo chegado o momento de extrair as ideias chave das sábias
intervenções com que os brilhantes oradores enriqueceram a Conferência,
complementadas pelo debate vivo que o conjunto de participantes
proporcionou, enriquecimento esse que resultou da participação não só de
profissionais da Polícia Judiciária, mas também de magistrados do ministério
público, médicos, sociólogos e advogados.
Tentarei desenvolver esta síntese conclusiva em quatro vectores diferenciados,
embora consciente de que todos eles convergem para uma finalidade. Seguro
que o recurso ao analogismo me será perdoado, teremos quatro secções
instrumentais que trabalham individualmente as respectivas partes melódicas,
para num segundo momentos já reunidos em orquestra interpretarem a
melodia no seu todo.
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126
Conclusões
Teremos assim as vertentes:
1. Médica (medicina do trabalho);
2. Psicossocial (factores stressantes, de risco, psicológicos);
3. Direito do trabalho (Regime de trabalho da função pública, limites às
normas especiais que o excepcionam, regulamentação interna da P.J.);
4. Laboral (especificidades e exigências da Investigação Criminal, realidade
laboral das polícias europeias).
1. Médica
A comunidade científica e médica, conforme sublinhou o Dr. Carlos Sobral,
na sua intervenção, não duvida que da sujeição prolongada a horários de
trabalho nocturnos ou a horários irregulares, compreendendo períodos de
privação do sono, poderão resultar consequências gravíssimas para o
desempenho, resultantes de alterações da coordenação motora, com reflexos
em todas as áreas com ela directamente implicadas.
Alertou para a existência de estudos científicos recentes que provam que os
efeitos da privação do sono em tarefas que envolvam coordenação, é
equivalente ao efeito provocado pela intoxicação por álcool.
Exemplificando através do desempenho de uma tarefa de coordenação
motora com duração de 24 horas sem dormir, referiu ser equivalente a uma
taxa de álcool no sangue de 1 grama por litro.
Demonstrou a existência de factores lesivos para a saúde resultantes da
desregulação do ritmo circadiano normal, em resultado do trabalho por
turnos, trabalho nocturno, horários irregulares.
Referiu ainda, ser com base nestes conhecimentos, que os médicos do
trabalho procuram nos exames de admissão ou pré-colocação, identificar
características individuais associadas à redução da tolerância ao trabalho
nocturno, de forma a estabelecer estratégias de impedimento, vigilância
particular ou aconselhamento de factores de higiene psico-fisiológica.
O Professor Doutor Martins da Silva complementou a intervenção do
colega, referindo uma síntese de vários estudos efectuados em universidades
americanas e europeias, incidindo sobre voluntários sujeitos a horários
nocturnos e frequentes fases de privação do sono.
Desses estudos, resultou que os voluntários, se queixaram de sinais e
apresentavam sintomas em tudo semelhantes a quem realiza uma viagem
transoceânica ou transcontinental, nas quais se estabelece uma
dessincronização entre o relógio biológico interno e as condições ambientais
externas à chegada (jet lag).
Esses sinais e sintomas incluem a sonolência diurna, fadiga, dificuldade em
adormecer, baixa concentração, reflexos diminuídos, irritabilidade, queixas
digestivas e mesmo sintomas depressivos.
Conclusões
Realçou, que estes problemas são uma realidade e por isso devem ser tidos
em consideração na gestão de recursos humanos, pois, na sua opinião, as
organizações (sociais e profissionais) devem pugnar para que os seres
humanos vivam em harmonia, incluindo por maioria de razão a harmonia
biológica.
(ponderando-se as especificidades da função de investigação criminal,
nomeadamente a necessidade de utilização de armas de fogo, de condução
por vezes em situações limite, a perigosidade de inúmeras intervenções, a
concentração exigível na realização audições ou de interrogatórios, é óbvio
que a reflexão sobre os dados apresentados deverá constituir motivo de
preocupação).
2. Psicossocial
A Dr.ª Cristina Soeiro, psicóloga com extensa experiência na problemática
e condicionantes relativas à Investigação Criminal, face à sua larga experiência
de docente no Instituto Superior de Polícia Judiciária e Ciências Criminais,
incidiu a sua intervenção sobre os problemas específicos dos polícias.
Começou por considerar a investigação criminal como uma das profissões
mais stressantes, por se tratar de uma actividade extremamente absorvente
que conduz frequentemente a quadros de grande cansaço e até de
depressão.
Fez referência ao designado "Síndroma de John Waine", ou seja "cowboy
solitário" o qual se constata existir em muitos investigadores da Polícia
Judiciária, e que se traduz por um comportamento evolutivo de isolamento
familiar e social.
Concluiu através de um estudo recentemente efectuado, que muitos
investigadores criminais não se apercebem que já estão a conviver em circuitos
fechados, fortemente inibidores das relações familiares e de amizade,
consequência do exercício de uma actividade profissional fortemente exigente
e muito condicionada pela discrição e pelo sigilo profissional.
Destacou como principal fonte de pressão negativa e de stress nos Inspectores
da Polícia Judiciária, os factores relacionados com a organização interna
da Instituição, nomeadamente, o relacionamento com as chefias, as
condições de trabalho, a falta de pessoal, o excesso de trabalho, etc...
Conclui assim que na P.J., os problemas de natureza organizacional
têm mais impacto negativo no dia a dia do investigador, do que os
perigos inerentes à actividade profissional.
No topo dos medos expressos pelos investigadores, surgem duas situações
directamente relacionadas com a actividade operacional e concretamente
com o uso de armas de fogo:
Atingir alguém acidentalmente no decurso de uma operação;
Ver um colega ferido ou morto.
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128
Conclusões
Dado curioso nos investigadores da P.J., refere-se ao receio de ser morto ou
ferido, factor que surge na escala de avaliação do estudo efectuado, somente
em oitavo lugar. A curiosidade deste resultado resulta da comparação com
os resultados dos factores de preocupações de polícias congéneres de outros
países, nos quais surge no topo da tabela.
Por último, outro dado que surpreendeu a Psicóloga por também contrariar
a tendência observada em polícias congéneres, prende-se com a
desvalorização do factor "rotina", o qual surge como factor de stress, numa
terceira grandeza de importância.
NOTA: Este resultado (e não pretendendo de modo algum alterar os
resultados obtidos) poderá traduzir alguma dificuldade de identificação de
causa, facto que, consequentemente, não permitirá uma análise
perfeitamente correcta das consequências resultantes deste factor, numa
perspectiva abrangente.
3. Direito do Trabalho
Na sua intervenção, o Professor Doutor Jorge Leite da Faculdade de Direito
da Faculdade de Coimbra, indicou as instâncias internacionais que produziram
normas supranacionais interligadas com a problemática da Polícia Judiciária,
destacando duas dessas normas:
A Organização Internacional de Trabalho (OIT), que produziu importante
documentação sobre os problemas de duração de jornadas de trabalho,
de organização e gestão do tempo de trabalho, e:
O Conselho da Europa, sobretudo através da Carta Social Europeia.
Sublinhou que não existe nenhum princípio no Direito Internacional
relativamente às questões que afectam os profissionais da Polícia Judiciária,
que não tenha tradução na ordem jurídica portuguesa.
Referiu que, independentemente do estatuto de serviço permanente e
obrigatório a que os investigadores da Polícia Judiciária estão sujeitos, o
qual, no seu entendimento, é mais dirigido à instituição do que ao indivíduo,
existe um conjunto de princípios fundamentais do Direito Internacional que
não podem nem devem estar vedados a qualquer ser humano, incluindo
obviamente os polícias, entre os quais se poderão destacar:
• Princípio da preservação da vida e da promoção da saúde, que tem
por base a ideia de que todos os responsáveis institucionais têm o dever
de adoptar medidas que acautelem e diminuam eventuais riscos para a
vida e saúde das pessoas.
No exercício de algumas profissões, como a de polícia, existem riscos
inerentes à própria profissão os quais devem estar sempre sujeitos ao
princípio de os reduzir ao mínimo possível.
Conclusões
• Princípio de que todos nós temos direito a um espaço de auto
disponibilidade, o qual é insuperável e inultrapassável e que significa
que ninguém pode estar relativamente a coisa alguma em situação de
disponibilidade permanente, em virtude de todos terem direito a ter tempo
e espaço para a vida e obrigações extra profissionais.
Considerou a este propósito, que uma grande e sistemática carga de trabalho
como a que existe na Polícia Judiciária, não pode ser uma regra de vida
porque viola este princípio básico de liberdade pessoal. A conciliação entre
a vida profissional e a vida extra profissional tem tradução jurídico-constitucional recente em Portugal (1997), mas consta há mais tempo no
Direito Internacional, em Convenções da OIT e no Direito Comunitário.
Dissertou ainda sobre o Princípio de Adaptação do Trabalho ao Homem,
hoje também inserido nos grandes textos nacionais e internacionais. Explicou
este princípio como contraponto à ideia Taylorista e mesmo Fordista de
considerar o homem como uma espécie de prolongamento da máquina,
obrigando-o a uma adaptação a esta.
Este princípio veio inverter por completo a ideia de que a máquina é que
controla o homem, determinando que o elemento fundamental é, e será
sempre o homem, e que todas as formas de organização do trabalho que se
revelem particularmente agressivas em relação à vida e à saúde das pessoas
devem ser alteradas.
O Professor Doutor Liberal Fernandes, da Faculdade de Direito da
Universidade do Porto, iniciou a sua intervenção defendendo que os
Inspectores da Polícia Judiciária beneficiam do estatuto da Função Pública,
embora com algumas limitações que a Lei Orgânica contempla. Entenderse o contrário seria atribuir um estatuto jurídico de menoridade ao Inspector
da Polícia Judiciária comparativamente com o normal trabalhador da função
pública, o que não seria justo, correcto, nem mesmo viável do ponto de
vista legal.
Relativamente à questão do trabalho prestado na instituição ser de carácter
permanente e obrigatório, bem como à disponibilidade funcional,
considerou que uma interpretação literal destes conceitos colidiria desde
logo com um conjunto de direitos constitucionais, nomeadamente o direito
ao repouso, o direito ao lazer, o direito à conciliação da vida profissional
com a vida familiar, etc...
Na sua perspectiva, a interpretação conjugada dos conceitos referidos, traduzse do ponto de vista jurídico, apenas e somente, num dever acrescido de
disponibilidade para o serviço por parte do Inspector da Polícia Judiciária
relativamente aos outros agentes do estado.
Significa assim, em sua opinião, que pode ser exigível ao inspector da Polícia
Judiciária a disponibilidade para ocorrer a uma chamada a qualquer hora ou
mesmo a disponibilidade para períodos de tempo contínuos de trabalho
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Conclusões
superiores a outros trabalhadores da função pública, disponibilidade essa
que deriva directamente da própria natureza do serviço que a P.J. presta, ou
seja, de um corpo policial apto a responder de forma imediata e permanente
às necessidades da investigação criminal.
Contudo, na sua opinião, a Lei Orgânica da Polícia Judiciária, não resolve
e deveria resolver o problema de saber a partir de que momento é
que cessa esse dever de disponibilidade, ou seja, ao fim de quantas
horas de serviço consecutivo pode o Inspector da P.J. recusar-se a prosseguir
um serviço.
E como a Lei Orgânica não resolve e não regula esta situação, será obrigatório
procurar soluções no regime geral da função pública, no qual porventura
também não serão encontradas as mais ajustadas à realidade concreta da
investigação criminal.
A questão que não oferece qualquer dúvida é a de que, o Inspector da P.J.
está sujeito a um regime de horário normal de trabalho de 7 horas por dia,
35 horas semanais, como a restante função pública, o que significa em seu
entender que todo o trabalho desenvolvido pelo Inspector da P.J. para além
das 7 horas diárias ou das 35 horas semanais, só pode ser considerado
como trabalho extraordinário, mais uma vez à luz do regime geral da
função pública, pois trata-se de outra matéria não regulamentada no Lei
Orgânica da Polícia Judiciária.
Em matéria de compensação pelo trabalho extraordinário, também não tem
qualquer dúvida, que do ponto de vista normativo, serão de aplicar na Polícia
Judiciária as regras vigentes para os outros trabalhadores da função pública,
mesmo que isso se traduza em pagar 5 vezes mais do que actualmente
se está (ilegalmente) a pagar.
4. Laboral
Pelo Dr. Jorge Braga, jurista especializado em Direito do Trabalho, na área
da Administração Pública, foi explicado que o pessoal de investigação criminal
não pode ter as mesmas regras sobre horários de trabalho que os demais
funcionários e agentes do Estado, mas que isso não pode significar que haja
que criar regras e que essas não possam dimanar da lei geral.
Em seu entender é inultrapassável o respeito pelas normas constitucionais
que a todos impõe direitos de que não se pode dispor, quer se esteja
perante acto legislativo, quer perante a sua omissão.
Nesse sentido, a omissão legislativa (caso da PJ) não poderá significar um
prejuízo no tocante aos direitos constitucionais relativamente aos funcionários
de investigação criminal, designadamente quanto "à organização do trabalho
em condições socialmente dignificantes de forma a facultar a sua realização
pessoal".
Conclusões
Considerar que, finda a jornada de trabalho diário e sendo necessário
prosseguir qualquer tipo de trabalho de investigação, o trabalhador entra
em regime de "reforço às unidades de prevenção" ou "regime de
prevenção activa" (como é classificado pelas normas internas emanadas
pela Direcção), carece no mínimo de uma interrogação quanto à ilegalidade
de tão abrupta afirmação.
Mas também não se pode, por inverosímil, sublinhou, com recurso a teses
centradas na "disponibilidade", ou no "carácter obrigatório do serviço",
obrigar um funcionário a estar ao serviço 24, 48 ou 72 horas consecutivas
sem dormir e/ou retirar um pouco de tempo para o seu descanso e
recuperação física ou psíquica. Não se trata de uma questão de horários
que aqui está em causa, mas sim uma questão humanitária e de ciência que
qualquer dirigente tem obrigação de respeitar e pugnar para que não suceda.
Surgem até dúvidas quanto à obrigatoriedade de obediência a ordens como
esta.
Isto apenas sucede, por ser enorme a indefinição legislativa que graça no
seio da Polícia Judiciária e por se estar a viver com despachos internos,
ilegais por incompetência absoluta dos seus autores para o efeito, e
desde logo por estarem a criar direito novo.
Classificar trabalho extraordinário como prevenção activa, se não é direito
novo, não se sabe o que será.
E desta indefinição, resulta em sua opinião, um duplo prejuízo para os
funcionários de investigação criminal, porque não são remunerados pelo
trabalho executado como o deveriam ser, e porque se cria um entrave
ao descanso devido entre o terminus da prestação e o início do período
seguinte.
Uma das intervenções aguardadas com especial expectativa por se tratar de
um dirigente da Instituição era, como aliás se mostra compreensível, a do
Dr. Ferreira Leite, Director Nacional Adjunto da Polícia Judiciária,
responsável actualmente pela Direcção Central de Combate ao Banditismo
(departamento que combate o terrorismo e outras formas de crime violento).
Porque se trata de um resumo conclusivo, irei limitar-me a sublinhar as
grandes linhas apontadas na referida intervenção, as quais na opinião do
orador, são consideradas essenciais para possibilitar alcançar um equilíbrio
entre os interesses pessoais e organizacionais inerentes à Polícia Judiciária.
Preencher o mais rapidamente possível os quadros previstos na Lei
Orgânica da Polícia Judiciária, (o que na prática significa aumentar os
actuais efectivos de 1326 para os 2450 previstos na L.O.), por considerar
que muito embora a conjuntura não seja a mais adequada para as
despesas públicas, os custos resultantes do continuado não preenchimento
do quadro, acabam por ser significativamente elevados, conduzindo à
crónica falta de recursos humanos, à insatisfação e redução de eficácia.
131
132
Conclusões
Pagar de forma efectiva o trabalho extraordinário, considerando
que se devem afastar liminarmente teses que se baseiam num alegado
incumprimento reiterado e generalizado do período normal de trabalho
e em que a compensação temporal assume foros de punição e não de
retribuição. Dentro da mesma linha de raciocínio, opõe-se a visões de
controlo burocrático e formal dos funcionários de investigação criminal
pois, até prova em contrário, os investigadores da P.J. são pessoas de
bem, que procuram dar o melhor de si próprios na realização das tarefas
que à Polícia Judiciária incumbe realizar.
Estabelecer limites obrigatórios e vinculativos para o trabalho
contínuo, criticando as situações reais e muito frequentes de
prolongamento de trabalho em contínuo que foram trazidas à conferência
pela ASIC/PJ, considerando que as mesmas não são claramente adequadas
aos tempos em que vivemos. Não sendo técnico para poder dizer quais
são os limites, tem, contudo, a consciência de que eles existem, limites a
partir dos quais se está a exercer uma autêntica violência sobre o
funcionário.
Gérard Greneron, Secretário-Geral do Conselho Europeu de Sindicatos de
Polícia (CESP), alicerçou a sua intervenção numa abordagem aos aspectos
profissional e humano, encontrados nas Polícias Europeias.
1. A actividade profissional e as suas contrariedades horárias.
2. As incidências sobre a vida profissional e privada do polícia.
3. As compensações existentes (horas extraordinárias e descanso
"compensatório").
1. A actividade profissional e os condicionalismos horários:
Os serviços de polícia de investigação devem forçosamente adaptar a sua
actividade profissional à do seu alvo - a actividade criminal.
Pode-se facilmente comparar a actividade policial à dos "Serviços de
Urgências" em meio hospitalar.
Assim, os polícias são tributários do acontecimento e os delinquentes não
praticam os delitos às horas normais dos empregados de escritório.
É por essa razão que o polícia é um funcionário do Estado regido por leis
específicas que divergem do estatuto geral da função pública.
Este estatuto confere-lhe poderes legais importantes mas, em contrapartida,
submete-o a obrigações constrangedoras.
Esta actividade característica, leva naturalmente a que se possa esboçar um
rápido retrato do polícia de investigação europeu: "É um Homem
apaixonado pela sua profissão e o seu empenhamento está à altura
da sua paixão".
Conclusões
Constata-se também que a Administração usa e abusa desta paixão
submetendo-o a horários de trabalho excessivos. Chega-se a um paradoxo:
o polícia que tem por missão velar pelo respeito das leis e regulamentos é
submetido a cargas horárias que o colocam à margem das leis aplicadas aos
demais cidadãos! - Os garantes da lei são foras-da-lei!
2. As incidências sobre a vida profissional e privada do polícia:
• Sobre a vida profissional:
Tal como sublinhou a Dr.ª. CRISTINA SOEIRO, psicóloga do ISPJCC, na
sua exposição "Os factores stressantes na investigação criminal", a
acumulação de horas origina uma fadiga e um stress prejudicial à pessoa
de quem o sofre.
De facto, sendo o stress prejudicial para o polícia também o pode ser
para o cidadão a quem é seu dever proteger.
O corpo médico traz provas científicas de que os efeitos negativos sobre
o organismo se materializam através de desequilíbrios físico e psicológico.
Estes desequilíbrios diminuem o potencial profissional do pessoal que
realiza a investigação criminal.
A qualidade no desempenho resulta também ela diminuída, prejudicando
a manifestação da verdade, quer através de erros processuais quer de
uma falta de lucidez na condução das investigações.
Por outro lado, em casos de intervenção urgente, inúmeras vezes
encontrados no exercício da profissão de polícia - intervenções em flagrante delito, detenções, etc. - é elevada a tensão nervosa, somando-se
aos efeitos negativos gerados pelo cansaço.
O stress daí decorrente pode gerar situações prejudiciais para o
polícia e, em certos casos, para o cidadão - defeituosa avaliação do
perigo, uso intempestivo de armas de fogo, tomada de riscos
desproporcionados, etc.
• Sobre a vida privada:
O estado de fadiga é um fenómeno que gera uma falta de disponibilidade
e um nervosismo muitas vezes nocivos ao equilíbrio familiar.
As ausências do polícia enquanto pai, aliadas aos ritmos de trabalho que
este tem de suportar, são inúmeras vezes mal vividas pelo seu meio
familiar.
Esta falta de disponibilidade, de "escuta do outro" no seio da família,
intensifica a incompreensão que é, com frequência, sentida
reciprocamente.
NB: O número de divórcios registados entre os membros desta profissão
é disso exemplo notório.
133
134
Conclusões
As tensões que aparecem na célula familiar alimentam por seu turno o
nível de stress suportado pelo polícia, e constata-se o surgimento de um
fenómeno de "espiral infernal" contra o qual é difícil lutar e onde se
encontram os mesmos ingredientes: cansaço - stress - falta ou ausência
de escuta - nervosismo - incompreensão - stress...
3. As compensações existentes:
• O pagamento das horas extraordinárias:
Nos países que optaram pelo pagamento das horas extraordinárias,
Alemanha, Bélgica, Itália, constata-se que a taxa horária fixada pela
Administração está muito abaixo da taxa horária praticada relativamente
às horas ditas "ordinárias".
Note-se que não existe nenhuma taxa horária propriamente dita,
tratando-se antes de uma extrapolação a partir da base de cálculo
seguinte: rendimento mensal dividido pelo número de horas efectuadas.
É usual comparar, entre polícias europeus, a taxa horária que lhes é
aplicada, àquela que é habitualmente atribuída a uma empregada de
limpeza. Qualquer um poderá comparar e constatar se o polícia é
equitativamente pago, tendo em conta o seu grau de formação académica
e técnico-profissional e as suas responsabilidades.
No entanto, a legislação europeia, e mais precisamente a Carta Social
Europeia estipula no seu artigo 4.º:
"...o exercício efectivo do direito a uma remuneração equitativa, O Direito
a uma remuneração equitativa, a reconhecer o direito dos
trabalhadores a uma taxa de remuneração acrescida para as horas
extraordinárias..."
O exercício destes direitos deve ser assegurado quer por via de convenções
colectivas livremente acordadas, quer por métodos legais de fixação dos
salários, quer ainda de qualquer outra forma apropriada às condições
nacionais".
Lembrou a propósito que Portugal assinou e ratificou a Carta Social
Europeia e os seus protocolos adicionais, entre os quais aquele que
prevê um sistema de reclamações colectivas.
• Os descansos compensatórios:
Outra solução adoptada em certos países, como a França, é o princípio
da compensação horária.
Esta compensação pode ser de 100, 150, ou 200% em função do dia de
trabalho em causa: dia útil, descanso legal, descanso semanal, feriado
ou hora nocturna.
Conclusões
À luz da realidade dos serviços de polícia e dos seus ónus, este princípio
de descanso compensatório atinge rapidamente os seus limites.
Em grande número de serviços de investigação, o "acontecimento" torna
muito frequentemente difícil o gozo destes dias de descanso.
É comum constatar que as horas extraordinárias acumuladas
ultrapassam em muito a possibilidade oferecida ao polícia (durante
o ano) de as recuperar.
Assim, por exemplo em França, o cúmulo de horas por gozar ascende a
vários milhões!
Comparando os diversos regimes aplicados nas Polícias dos países
membros do Conselho Europeu dos Sindicatos de Polícia (CESP), ressalta
a não existência de um regime uniforme ou equivalente, que tenha em
conta os imperativos profissionais ligados à função de investigador, sendo
todavia impensável que se aceite sem reagir o sacrifício dos legítimos
direitos sociais do polícia;
- Antes que a corda parta!
Do teor das intervenções anteriormente resumidas, tornam-se evidentes três
pontos fundamentais:
1. Todas elas foram produzidas, cada uma na sua área, por pessoas sobre
as quais não recai qualquer sombra de dúvida relativamente à qualidade
do seu saber, à sua experiência profissional e ao seu rigor e independência;
2. Todas são unânimes em reconhecer que a legislação aplicada no caso
concreto à Polícia Judiciária, levanta no mínimo sérias dúvidas no tocante
à sua legalidade, carecendo de rectificação urgente;
3. Urge efectuar um trabalho de reformulação da legislação referente à
forma de compensação do trabalho extraordinário produzido pelos
profissionais de investigação criminal, minimizando simultaneamente os
prejuízos que resultam para a saúde dos profissionais, bem como, o
transtorno a nível organizacional da própria instituição e balizando as
jornadas de trabalho contínuo com duração extremamente excessiva.
A ASFIC/PJ, julga que as conclusões resultantes desta Conferência,
ultrapassaram as expectativas e contribuíram para um esclarecimento
aprofundado de uma matéria essencial para a realização diária do trabalho
produzido pela, e na, Polícia Judiciária.
Faremos chegar aos responsáveis que tutelam o Ministério da Justiça e a
Polícia Judiciária o resultado desta conferência, esperando que o mesmo
contribua para alcançar as soluções que se impõem com manifesta urgência.
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136
Conclusões
Prosseguiremos simultaneamente junto dos Tribunais competentes com as
acções que seguem já seus trâmites, nomeadamente a de Acção de
Reconhecimento de Direitos, bem como, as avulsas, que forem surgindo no
decorrer do tempo.
Divulgaremos através do CESP o presente livro a todos os polícias europeus,
por entendermos com toda a modéstia, que o seu conteúdo poderá contribuir
para melhor compreensão de problemas que são sentidos pelos profissionais,
que em qualquer parte, desenvolvem a investigação criminal, problemas
esses que sabemos serem transversais a várias polícias de diversos países.
À Sr.ª Ministra da Justiça atrevo-me a retribuir-lhe o desafio que nos lançou.
Cumprimos com a nossa parte efectuando uma reflexão aprofundada sobre
a matéria em causa, apontando causas, desenvolvimento e consequências.
Fizemo-lo, recorrendo a bases rigorosas e científicas, permitindo que a
reivindicação sindical fosse suportada por bases praticamente indiscutíveis.
Continuamos, como sempre estivemos, abertos ao diálogo, mas exigimos
que o mesmo se desenvolva com celeridade com o objectivo de servir a
Instituição, os funcionários e o cidadão, em virtude estarmos na presença
de vectores que interagem e são obviamente interdependentes.
Para além do mais, julgo não existirem dúvidas de que, o Ministério da
Justiça deve ser, em toda e qualquer circunstância, o espelho da aplicação
da mesma.
Se a algumas das partes compete apresentar uma proposta concreta, é lógico
que será ao Ministério. A nós competirá estudá-la, apreciar da sua justeza,
dialogar no sentido de que a solução encontrada seja justa e viável para
ambas as partes. Queremos evitar que se torne realidade a figura base de
apresentação da nossa Conferência, ou seja, queremos evitar que a corda
parta...
NOTA: Em nome da ASFIC/PJ, seria uma enorme injustiça não dirigir uma
simples palavra de agradecimento, pelo empenhamento e dedicação
demonstrada, a todos os que trabalharam afincadamente na realização desta
Conferência e em todos os trabalhos colaterais que permitiram a sua
divulgação.
O Presidente Nacional da ASFIC/PJ
MANUEL CARNEIRO RODRIGUES
137
Legislação Citada
na Conferência
138
Despacho 248/MJ/96
Despacho
248/MJ/96
(Regulamento
dos Serviços
de Piquete e
de Unidade
de Prevenção)
O sistema de funcionamento dos serviços da Polícia Judiciária baseado em
piquetes de atendimento e em unidades de prevenção não voltou a ser
reequacionado, de forma global e integrada, desde a aprovação do despacho
conjunto publicado no DR, 2.ª, de 4-11-83. Já o sistema de trabalho por
turnos, também regulado nesse despacho, passou a ser enquadrado pelo
regime estabelecido na lei geral.
Os crimes e os seus agentes não conhecem horários de trabalho ou dias de
descanso semanal, pelo que o serviço de polícia criminal é, desde sempre,
de carácter permanente e obrigatório, garantindo vinte e quatro horas por
dia a prossecução das atribuições da Polícia Judiciária.
Esta característica da actividade policial determina a adopção de modalidades
específicas de organização do serviço e de prestação de trabalho que obstem
à duplicação de efectivos sem sujeitarem os funcionários a um regime de
trabalho excessivamente penoso.
Se há acções que devem ser imediatamente desencadeadas, exigindo-se,
por isso, a permanência, a todo o instante, dos meios operacionais
indispensáveis, outras actividades há, porém, que só ocasionalmente têm
de ser asseguradas fora do horário normal de prestação de serviço. O serviço
de piquete e os turnos de funcionários cumprem o objectivo primeiramente
enunciado, sendo o segundo assegurado pelo serviço de unidades de
prevenção.
Embora não se justifiquem, para já, alterações profundas do regime vigente,
importa todavia moldá-lo de forma a adaptar os serviços de piquete e de
unidades de prevenção ao actual sistema de articulação das diferentes
unidades orgânicas que integram a instituição, reflectindo os novos modelos
estratégicos de combate à criminalidade.
O trabalho por turnos não apresenta, na Polícia Judiciária, qualquer
especialidade que determine o seu afastamento do regime acolhido na lei
geral.
Assim, atento o disposto no n.º 4 do art. 13.º do Dec.-Lei 295-A/90, de
21-9, o Ministro da Justiça determina:
1 - É aprovado o Regulamento dos Serviços de Piquete e de Unidades de
Prevenção ou Turnos de Funcionários da Polícia Judiciária, que se publica
em anexo.
2 - É rovogado o despacho conjunto dos Ministros das Finanças e da Justiça,
publicado no DR, 2.ª, de 4-11-83, bem como os n.os 4 e 5 do art. 2.º e o n.º
1 do art. 5.º do Desp. 68/91, do Ministro da Justiça, publicado no DR, 2.ª de
14-8-91.
3 - O Regulamento a que se refere o n.º 1 entra em vigor no primeiro dia do
mês seguinte ao da sua publicação.
10-12-96. – O Ministro da Justiça, José Eduardo Vera Cruz Jardim.
Despacho 248/MJ/96
Regulamento dos
Serviços de Piquete
e de Unidades de
Prevenção ou Turnos
de Funcionários
I - Serviço de Piquete
Artigo 1.º - Definição e organização
1 - Designa-se por Serviço de Piquete o sistema organizado de meios
humanos e materiais que assegura, em regime de permanência, o
funcionamento dos serviços operacionais e de atendimento da Polícia
Judiciária.
2 - O Serviço de Piquete é organizado em função das necessidades e dos
meios disponíveis, no âmbito da Directoria-Geral e de cada directoria,
inspecção e subinspecção, sendo constituído por elementos dos grupos
de pessoal de investigação criminal e de apoio à investigação criminal.
3 - Em Lisboa, o Serviço de Piquete é comum à Directoria-Geral e à respectiva
directoria, funcionando na directa dependência do director-geral.
Artigo 2.º - Competência do Serviço de Piquete
1 - Ao Serviço de Piquete compete:
a) Tomar conta das ocorrências que, por qualquer forma, lhe sejam
comunicadas e providenciar pelo seu devido encaminhamento;
b) Formalizar queixas e informações;
c) Acorrer prontamente aos apelos que lhe sejam dirigidos em matéria
criminal ou suspeita de o ser, realizando as diligências de investigação
de carácter urgente;
d) Estabelecer a ligação com as secções de investigação e outras
autoridades sempre que as acções a desenvolver se revistam de
importância, urgência ou complexidade notória;
e) Proceder a diligências de prevenção ou investigação, ou quaisquer
outras com elas relacionadas, que lhe sejam superiormente ordenadas;
f) Canalizar para as secções de investigação as queixas que requeiram
tratamento imediato e não possam ser, por si, efectuadas;
g) Assegurar o funcionamento dos serviços de atendimento fora do
horário normal de prestação de serviço.
Artigo 3.º - Funções do inspector
1 - Compete ao inspector de Piquete dirigir, coordenar e orientar
superiormente o respectivo Serviço e, em especial:
a) Apreciar e decidir sobre o destino a dar aos detidos em flagrante
delito pelo Piquete ou neste apresentados por qualquer cidadão;
b) Decidir, nos termos das leis de processo, sobre a detenção fora de
flagrante delito de indivíduos suspeitos da prática de infracções
directamente denunciadas ao Piquete;
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Despacho 248/MJ/96
c) Decidir sobre o procedimento a adpotar relativamente a indivíduos
procurados em processos pendentes cuja localização o Piquete tenha
obtido;
d) Controlar a legalidade dos actos de investigação criminal,
nomeadamente no âmbito das medidas cautelares e de polícia;
e) Esclarecer as dúvidas que lhe sejam expostas pelo subinspector na
recepção de denúncias pelo Piquete, designadamente no que se refere
ao carácter jurídico-penal dos factos que se pretendem denunciar;
f) Dar pronto conhecimento superior de todas as ocorrências ou factos
que, pela sua natureza, gravidade ou especial interesse, devam ser
transmitidos;
g) Ordenar a intervenção dos elementos do grupo de pessoal de apoio
à investigação;
h) Até às 9 horas, visar o relatório que lhe será apresentado pelo
subinspector após o termo do período de Piquete e dar destino ao
expediente elaborado.
2 - Nos casos previstos nas alíneas b) e c) do número anterior, a decisão
será tomada pelo inspector da secção competente sempre que se
encontre nas instalações ou seja possível contactá-lo.
Artigo 4.º - Obrigatoriedade e prioridade
O Serviço de Piquete é obrigatório e tem prioridade sobre qualquer outro
serviço, função ou actividade.
Artigo 5.º - Escalas do Serviço de Piquete
1 - Em cada um dos departamentos em cujo âmbito é organizado o Serviço
de Piquete serão estabelecidas duas escalas de piquete, uma ordinária e
outra extraordinária.
2 - A escala extraordinária aplica-se ao serviço prestado nas vésperas e dias
de Ano Novo, Páscoa e Natal.
Artigo 6.º - Horário
1 - O Serviço de Piquete funciona, diariamente, durante vinte e quatro horas.
2 - O início de cada período de serviço do pessoal que integra o Piquete
terá lugar às 8 horas e 30 minutos e o seu termo às 8 horas e 30 minutos
do dia seguinte.
3 - O pessoal que termine o período de Serviço de Piquete não pode
abandonar o serviço sem que se apresente aquele que o deva substituir.
Despacho 248/MJ/96
Artigo 7.º - Permanência do Inspector
1 - O inspector que integra o Serviço de Piquete conservar-se-á nas
instalações até às 20 horas, salvo o disposto nos numeros seguintes.
2 - Aos sábados, o período normal de permanência obrigatória termina às
12 horas e 30 minutos.
3 - Nos domingos e feriados considera-se dispensada a presença do
inspector.
4 - Nos períodos em que não permaneça nas instalações, o inspector de
Piquete deverá manter-se contactável, de modo a garantir a sua imediata
comparência logo que necessária.
Artigo 8.º - Ausência
1 - O pessoal que inicie o Serviço de Piquete não pode ausentar-se das
intalações, salvo no exercício de funções próprias do Serviço ou por outros
motivos de carácter urgente, precedendo autorização do respectivo
inspector ou subinspector.
2 - O subinspector designa sempre o funcionário que o substitui na sua
ausência.
Artigo 9.º - Alimentação
Ao pessoal que integre o Serviço de Piquete são fornecidas duas refeições,
correspondentes ao jantar e a uma ceia ligeira.
Artigo 10.º - Relatório do Serviço de Piquete
Diariamente é apresentado o relatório do Serviço de Piquete ao dirigente do
departamento em cujo âmbito é organizado.
Artigo 11.º - Folgas
1 - O pessoal que tenha integrado o Serviço de Piquete folga no primeiro
dia útil imediato ao do termo da prestação daquele serviço.
2 - Quando as disponibilidades de pessoal do departamento não permitam
a observância do disposto no número anterior, e sem prejuízo do gozo
de folga nas vinte e quatro horas seguintes ao termo da prestação do
Serviço de Piquete, os dias de folga não gozados são contados como
dias de descanso para serem gozados conjuntamente com o período de
férias anual.
Artigo 12.º - Faltas
As faltas ao Serviço de Piquete são consideradas faltas ao serviço.
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Despacho 248/MJ/96
Artigo 13.º - Regulamentos de execução
1 - Os departamentos em cujo âmbito seja organizado o Serviço de Piquete
elaboram e submetem à aprovação do director-geral, no prazo de dois
meses, as normas necessárias à execução do presente Regulamento,
definindo a composição e o modo de funcionamento do Serviço, as
funções de cada um dos elementos que o integra, o regime de
substituições, permutas e dispensas, o modelo de escalas e quaisquer
outras matérias que devam ser especialmente reguladas.
2 - As normas referidas no número anterior revestem a forma de instrução
permanente de serviço (IPS).
3 - Os actuais regulamentos dos piquetes cessam a sua vigência quatro meses
após a entrada em vigor do presente Regulamento, se antes não tiverem
sido substituídos pelos regulamentos de execução a que se refere o
n.º 1.
II - Serviço de Unidades de Prevenção
Artigo 14.º - Definição
Entende-se por Serviço de Unidades de Prevenção aquele em que o pessoal,
não estando obrigado, permanecer fisicamente nas instalações, fica
permanentemente contactável e disponivel para acorrer às necessidades do
serviço quando para tal seja solicitado.
Artigo 15.º - Horário de funcionamento
O Serviço de Unidades de Prevenção funciona durante o espaço de tempo
não abrangido pelo horário normal de trabalho diário.
Artigo 16.º - Organização
1 - O Serviço de Unidades de Prevenção é organizado no âmbito da
Directoria-Geral e de cada directoria, inspecção e subinspecção,
encontrando-se a ele sujeito todo o pessoal, independentemente da
sua categoria, em funções no departamento.
2 - As áreas funcionais abrangidas pelo Serviço de Unidades de Prevenção
serão definidas por despacho do director-geral, a publicar em todas as
ordens de serviço, mediante proposta fundamentada dos dirigentes dos
departamentos em cujo âmbito aquele Serviço é organizado.
Artigo 17.º - Designação e contacto com o pessoal
1 - A designação do pessoal que, no âmbito de cada departamento, integra
o Serviço de Unidades de Prevenção bem como a gestão da respectiva
escala competem ao dirigente do departamento.
Despacho 248/MJ/96
2 - Tendo em vista potenciar a eficácia do Serviço, provilegiar-se-á a utilização
de meios electrónicos no contacto com o pessoal que o integre, os quais
lhe serão fornecidos na medida das disponibilidades logísticas e
orçamentais dos respectivos departamentos.
Artigo 18.º - Alimentação
Quando o pessoal que integra o Serviço de Unidades de Prevenção presta
efectivamente serviço entre as 20 e as 22 horas, bem como aos sábados,
domingos e feriados entre as 12 e as 14 horas tem direito ao fornecimento
de uma refeição em termos idênticos aos do pessoal do Serviço de Piquete.
Artigo 19.º - Faltas
Ao pessoal que integre o Serviço de Unidades de Prevenção e que não se
encontre contactável ou não compareça ao serviço quando solicitado para
tal será averbada uma falta, sem prejuízo da responsabilidade disciplinar
que venha a ser apurada.
Artigo 20.º - Gestão administrativa do Serviço
1 - O responsável por cada uma das áreas funcionais abrangidas pelo Serviço
de Unidades de Prevenção remeterá ao sector ou núcleo com
competências de administração financeira, até ao dia 10 de cada mês, a
relação do pessoal que, no mês anterior, se encontrou integrado naquele
Serviço.
2 - O responsável pelo serviço que tenha efectivamente utilizado pessoal
integrado no Serviço de Unidades de Prevenção remeterá ao sector ou
núcleo com competências de administração financeira uma relação do
pessoal que utilizou, da qual constará a hora em que foi feita a
convocatória, bem como as horas de início e do termo do serviço
prestado.
III - Turnos de funcionários
Artigo 21.º - Remissão
Quando as características de um serviço o justifiquem, poderá ser adoptada
a modalidade de trabalho por turnos nos termos da lei geral.
143
144
Despacho
07-SEC/DG
Regime de
folgas
decorrente
da prestação
de serviço
efectivo
por parte dos
funcionários
em regime
de prevenção
1. Serviço efectivo de prevenção prestado nos dias úteis
1.1. Os funcionários de prevenção que prestem serviço efectivo:
a) Por seis horas, contadas depois das 20 horas,
b) ou que se prolongue para além das 02 horas,
c) ou que se inicie entre as 02 horas e as 06 horas,
têm direito a folga, a gozar nesse dia, salvo se necessidades de serviço
impuserem a sua conveniência em dia diverso.
1.2. Os funcionários de prevenção que prestem serviço efectivo que não
ultrapasse as 02 horas e que tenha duração mínima de quatro horas,
contadas a partir das 20 horas, terão direito a folga durante a manhã
seguinte.
2. Serviço efectivo de prevenção prestado aos sábados, domingos e
feriados.
2.1. Terá direito ao gozo da manhã do dia útil imediato ao da prestação
efectiva do serviço, o funcionário que o tenha efectuado nas noites de
sexta-feira para sábado, de sábado para Domingo ou da véspera de
feriado para o feriado, sempre que esse serviço tenha cessado entre as
23 horas e as 02 horas e tenha havido uma prestação laboral, no mínimo
de 4 horas;
2.2. Terá direito ao gozo da manhã e tarde do dia útil imediato ao da
prestação efectiva do serviço, o funcionário que o tenha efectuado
nas noites de sexta-feira para sábado, de sábado par Domingo ou da
véspera de feriado para o feriado, sempre que esse serviço se prolongue
para lá das 02 horas ou que se inicie entre estas e as 07 horas;
2.3. Terá direito ao gozo da manhã e tarde do dia útil imediato ao da
prestação efectiva do serviço, o funcionário que o tenha efectuado,
por mais de sete horas, ao sábado, Domingo ou feriado.
Lisboa, 31 de Janeiro de 1997
O Director-Geral
(Fernando Negrão)
Portaria n.º 98/97
Portaria
n.º 98/97 de
13 de Fevereiro
Os serviços de piquete e de unidades de prevenção visam assegurar a
prossecução das atribuições da Polícia Judiciária em regime de permanência.
Os montantes da retribuição destas formas específicas de prestação de
trabalho foram fixados, pela última vez, em 1993, tendo, desde então, sofrido
uma depreciação, que importa corrigir, sobretudo tendo em conta que o
incremento do nível qualitativo da criminalidade tem correspondentemente
gerado uma elevação das exigências da prestação de trabalho naquelas
modalidades.
De notar, ainda, que, tendo em vista garantir uma actualização anual
automática dos montantes da retribuição em causa, se abandona o sistema
de fixação do seu concreto montante em favor da afinação de uma
percentagem do índice 100 da escala salarial do pessoal de investigação
criminal.
Por outro lado; e finalmente; importa transpor para regulamento assinado
pelos Ministros das Finanças e da Justiça o regime retributivo do trabalho
por turnos em vigor na Polícia Judiciária.
Assim, tendo em conta o disposto no n.º 3 do artigo 13.º e no n.º 1 do
artigo 100.º do Decreto-Lei n.º 295-A/90, de 21 de Setembro:
Manda o Governo, pelos Ministros das Finanças, da Justiça e Adjunto, o
seguinte:
1.º O suplemento de piquete a que tem direito o pessoal da Polícia Judiciária
é fixado nas seguintes percentagens do índice 100 da escala salarial do
pessoal de investigação criminal:
a) Dias úteis:
Inspectores - 4,8%;
Subinspectores - 4,4%;
Agentes e outro pessoal - 4,3%;
b) Sábados, domingos e feriados:
Inspectores - 6%;
Subinspectores - 5,5 %;
Agentes e outro pessoal - 5,4%.
2.º Os montantes resultantes do cálculo das percentagens fixadas no número
anterior são arredondados para a centena de escudos imediatamente
superior.
3.º O suplemento de prevenção é fixado em 40% dos valores obtidos nos
termos dos números anteriores.
4.º A prestação efectiva de trabalho por parte do pessoal que integra o
serviço de unidades de prevenção é remunerada em função do valor-hora calculado da seguinte forma:
Valor do suplemento de piquete
12
145
146
Portaria n.º 98/97
5.º O valor da hora de trabalho prestado a partir das 24 horas sofre um
acréscimo de 100% relativamente ao fixado no número anterior.
6.º Em caso algum o montante total auferido em função do disposto nos
n.ºs 3.º, 4.º e 5.º pode exceder o do correspondente suplemento de
piquete.
7.º O montante mensal dos suplementos referidos nos números anteriores,
auferido por qualquer funcionário, não pode ultrapassar um terço da
respectiva remuneração base.
8.º O pessoal da Polícia Judiciária que trabalha em regime de turnos tem
direito a um suplemento correspondente a um acréscimo de remuneração
calculado sobre a sua remuneração base, de acordo como as seguintes
percentagens:
a) Regime de turnos permanente, parcial e total - respectivamente 22%
e 25%;
b) Regime de turnos semanal prolongado, parcial e total - respectivamente 20%, e 22%;
c) Regime de turnos semanal, parcial e total - respectivamente 15% e
20%.
9.º Os encargos resultantes da execução do disposto nos n.ºs 1.º a 7.º serão
satisfeitos, na medida em que excederem as disponibilidades das
correspondentes dotações inscritas no Orçamento do Estado, pelos cofres
administrados pelo Gabinete de Gestão Financeira do Ministério da
Justiça.
10.º Os valores ora fixados vigoram a partir do mês imediato ao da
publicação da presente portaria.
11.º São revogados a Portaria n.º 447/93; de 28 de Abril, e o n.º 2 do
artigo 5.º do Despacho n.º 68/91 do Ministro da Justiça, publicado no
Diário da República, 2.ª série, de 14 de Agosto de 1991.
Presidência do Conselho de Ministros e Ministérios das Finanças e da Justiça.
Assinada em 28 de Janeiro de 1997.
Pelo Ministro das Finanças, Maria Manuela de Brito Arcanjo Marques da
Costa, Secretária de Estado do Orçamento. - O Ministro da Justiça, José
Eduardo Vera Cruz Jardim. - O Ministro-adjunto, Jorge Paulo Sacadura
Almeida Coelho.
Decreto-Lei n.º 275-A/2000
Decreto-Lei
n.º 275-A/2000
(Lei Orgânica
da Polícia
Judiciária)
Artigo 79.º - Serviço Permanente
1. O serviço na Polícia Judiciária é de carácter permanente e obrigatório.
2. O horário normal de trabalho é definido por despacho do Ministro da
Justiça.
3. O serviço permanente é assegurado fora do horário normal, por piquetes
de atendimento e unidades de prevenção, ou turnos de funcionários,
tendo os funcionários direito a suplementos de piquete, de prevenção e
de turno.
4. A regulamentação de serviço de piquete e do serviço de unidades de
prevenção ou turnos de funcionários é fixada pelo despacho do Ministro
da Justiça.
5. Mediante despacho do Director Nacional, sempre que tal se revele
necessário, podem ser estabelecidos serviços, em regime de turno,
destinados a acções de prevenção e de investigação de crimes, sem
prejuízo do regime geral da função pública.
6. Com excepção do disposto no número seguinte, 25% da remuneração
base corresponde ao factor de disponibilidade funcional.
7. Sem prejuízo do disposto no n.º 3 do presente artigo, o pessoal operário
e auxiliar tem direito a um suplemento de prevenção, de modo a ser
assegurado o carácter permanente e obrigatório do serviço da Polícia
Judiciária, de montante a fixar por portaria conjunta dos Ministros das
Finanças e da Justiça, sendo devido a partir da data de entrada em vigor
do presente diploma.
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Despacho n.º 006/2002-SEC/DN
Despacho
n.º 006/2002-SEC/DN
("Serviço de
Prevenção/
/Trabalho
extraordinário/
/Pagamento")
Considerando,
- que, nos termos do Dec. Lei n.º 275-A/2000, de 9 de Novembro, o serviço
prestado fora do horário normal é assegurado por unidades de prevenção
ou piquete.
- que é perceptível a falta de uniformidade quer na autorização quer no
pagamento da prestação de trabalho efectivo fora do horário normal de
trabalho,
- que o atraso na publicação da legislação complementar referida no art.
79.º do Dec. Lei n.º 275-A/2000, de 9 de Novembro, não deve impedir a
adopção de critérios de uniformização,
- que o serviço prestado para além do horário normal, quando não
assegurado por funcionários que integrem tais unidades, poderá ser
remunerado nos termos dos arts. 4.º, 5.º, 6.º e 7.º da Portaria n.º 98/97,
de 13 de Fevereiro,
- ainda o disposto no Regulamento do Horário de Trabalho do Pessoal da
Polícia Judiciária, de 9 de Julho de 1991 e as limitações à prestação de
trabalho extraordinário previstas no Dec. Lei n.º 259/98, de 18 de Agosto,
Determino:
1. Serviço de Prevenção
1.1. O Serviço que à Polícia Judiciária compete assegurar em regime de
permanência é regularmente prestado, fora do horário normal, por
serviços de unidades de prevenção (prevenção passiva) ou piquete,
para o efeito previamente escalados.
1.2. Considera-se de carácter permanente o serviço que, correspondendo
à necessidade de assegurar a realização, ou continuação da realização,
de actos de prevenção, investigação ou apoio à investigação, de cujo
adiamento, ou interrupção da prestação, resultaria irremediável prejuízo
para o sucesso da investigação.
1.3. O serviço que, nos termos do número anterior, se deva realizar fora do
horário normal de trabalho e não possa ser assegurado pelas unidades
de prevenção ou piquete, será prestado em regime de reforço às
unidades de piquete ou prevenção (prevenção activa) e remunerado
nos termos dos arts. 4.º, 5.º, 6.º e 7.º da Portaria n.º 98/97, de 13 de
Fevereiro.
1.4. Compete ao dirigente da unidade orgânica, suportado no juízo de
imprescindibilidade referido em 1.2, a decisão de prestação de trabalho
fora do período normal (prevenção activa), não estando por isso na
disponibilidade do funcionário que o presta.
Despacho n.º 006/2002-SEC/DN
1.5. Do trabalho realizado nas circunstâncias dos números anteriores, bem
como da prestação efectiva de trabalho quando integrando o serviço
de unidades de prevenção, será elaborado, individualmente, um "Mapa
do Serviço de Prevenção e Prestação Efectiva de Trabalho", cujo
impresso modelo se encontra disponível na rede, o qual, depois de
visado pelo superior hierárquico, será submetido a despacho do
dirigente da unidade.
2. Trabalho Extraordinário
2.1. A prestação de trabalho extraordinário nos termos do art. 25.º e
seguintes do Dec. Lei n.º 259/98, de 18 de Agosto, apenas terá lugar
quando necessidades do serviço imperiosamente o exigirem, em virtude
de acumulação anormal ou imprevista do trabalho e,
fundamentadamente, não seja possível, aconselhável ou adequado o
recurso ao mecanismo previsto nos números anteriores.
2.2. Sempre que seja prestado trabalho extraordinário, deverá o dirigente
da unidade orgânica:
a) Remeter aos serviços de administração financeira, até ao dia cinco
do mês seguinte a que respeita, "Mapa de Prestação de Trabalho
Extraordinário", cujo impresso modelo se encontra disponível na
rede;
b) Remeter mensalmente ao Director Nacional cópia do referido mapa,
com a fundamentação exigida no número anterior, bem como
informação actualizada sobre os limites ao trabalho extraordinário
referidos no art. 27.º do Dec. Lei 259/98, de 18 de Agosto.
3. Gestão e Controlo Administrativo
3.1. Para além da fundamentação atrás referida, porque a prestação de
trabalho fora do horário normal se reveste de carácter excepcional, o
recurso a tal prestação apenas deverá ter lugar para a execução de
tarefas que não possam e/ou não devam ser realizadas dentro do
período normal de trabalho ou pelas unidades que têm por finalidade
assegurar o trabalho fora deste período;
3.2. Como consequência do pressuposto referido no número anterior, sobre
as chefias nos diversos níveis da cadeia hierárquica, em geral, e sobre
os dirigentes, em particular, impende um duplo dever de garantir a
plena execução da missão de cada unidade dentro do período normal
de trabalho e o de garantir o rigoroso cumprimento do horário de
trabalho.
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Despacho n.º 006/2002-SEC/DN
3.3. Para efeitos de controlo e avaliação da gestão, deverão os responsáveis
pelas unidades orgânicas sediadas fora da cidade de Lisboa, remeter
ao Departamento de Administração Financeira e Patrimonial:
a) Relação dos funcionários que integraram os serviços de unidades
de prevenção (prevenção passiva) organizada mensalmente e por
áreas funcionais abrangidas;
b) Relação dos funcionários que, integrando os serviços de unidades
de prevenção, prestaram efectivo trabalho (prevenção activa),
organizada mensalmente, por áreas funcionais abrangidas e número
de horas de trabalho prestado;
c) Relação dos funcionários que, não integrando os serviços de
unidades de prevenção, prestaram efectivo trabalho fora do período
normal (prevenção activa) organizada mensalmente, por áreas
funcionais abrangidas, valores e número de horas de trabalho
prestado.
4. As dúvidas resultantes da interpretação a aplicação do presente despacho
serão resolvidas pelo Director Nacional.
5. O presente despacho entra imediatamente em vigor.
Lisboa, 15 de Fevereiro de 2002
O Director Nacional
(LUÍS BONINA)
Despacho Normativo n.º 18/2002
Despacho
Normativo
N.º 18/2002
Nos termos do disposto no N.º 2 do artigo 79.º do Decreto-Lei N.º 275-A/
/2000, de 9 de Novembro, e ouvidas as associações sindicais representativas
do pessoal da Polícia Judiciária, determino o seguinte:
1 - É aprovado o Regulamento do Horário de Trabalho do Pessoal da Polícia
Judiciária, anexo ao presente despacho e do qual faz parte integrante.
2 - É revogado o despacho N.º 68/1991, de 9 de Julho, publicado no Diário
da República, II.ª série, de 14 de Agosto de 1991.
3 - O presente despacho entra em vigor no dia 1 do mês seguinte ao da sua
publicação.
Ministério da Justiça, 13 de Março de 2002. - Pelo Ministro da Justiça, Diogo
Campos Barradas Lacerda Machado, Secretário de Estado da Justiça.
ANEXO
Artigo 1.º - Âmbito
Regulamento do
Horário de Trabalho
do Pessoal da Polícia
Judiciária
O presente Regulamento aplica-se a todos os funcionários e demais pessoal
ao serviço da Polícia Judiciária, qualquer que seja o vínculo e natureza das
suas funções.
Artigo 2.º - Natureza do serviço na Polícia Judiciária
O disposto no presente Regulamento não prejudica o carácter permanente
e obrigatório do serviço, de acordo com o previsto no N.º 1 do artigo 79.º
do Decreto-Lei N.º 275-A/2000, de 9 de Novembro.
Artigo 3.º - Duração do trabalho
1 - A duração semanal do trabalho é, nos termos do artigo 7.º do Decreto-Lei N.º 259/1998, de 18 de Agosto, de trinta e cinco horas semanais.
2 - A semana de trabalho é, em regra, de cinco dias, tendo os funcionários
direito a um dia de descanso semanal acrescido de um dia de descanso
complementar, que devem, em princípio, coincidir com o domingo e o
sábado, respectivamente.
Artigo 4.º - Período de funcionamento dos serviços
1 - O período de funcionamento dos serviços da Polícia Judiciária é das 8 às
20 horas dos dias úteis, sem prejuízo da duração normal do trabalho
estabelecida no artigo anterior.
2 - A definição em concreto do período de prestação de trabalho dos
funcionários, dentro daquele período de funcionamento, será
determinada pelas necessidades do serviço.
3 - Se nada for determinado, o período normal de prestação de trabalho,
dentro do período de funcionamento dos serviços, é das 9 horas às
12 horas e 30 minutos e das 14 horas às 17 horas e 30 minutos.
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Despacho Normativo n.º 18/2002
4 - O período de prestação de trabalho referido no número anterior não
pode ser alterado sem que seja a seu pedido, ou com o seu
consentimento, relativamente aos funcionários:
a) Que tenham a seu cargo descendentes, afins na linha recta
descendente, adoptandos ou adoptados menores de 12 anos que
desejem orientar directa e pessoalmente;
b) Que necessitem de cuidar de descendentes, afins na linha recta
descendente, adoptandos ou adoptados cuja enfermidade ou situação
específica exija cuidados e acompanhamento directo do ascendente;
c) Que necessitem de cuidar de descendentes, afins na linha recta
descendente, adoptandos ou adoptados portadores de deficiência e
que se encontrem nas situações previstas no artigo 5.º do Decreto-Lei N.º 170/1980, de 29 de Maio;
d) Que pretendam assistir o cônjuge, ou pessoa com quem vivam em
condições análogas à dos cônjuges, ascendente ou afim na linha recta
ascendente, na sequência de acidente ou doença grave, o seu estado
exigir a presença de uma terceira pessoa;
e) Quando sejam portadores de deficiência ou sofram de doença grave
e sempre que a junta médica competente recomende o exercício de
funções em tempo parcial.
5 - A prestação do trabalho fora do período de funcionamento dos serviços
será assegurada por unidades dos serviços de piquete e prevenção ou
turnos de funcionários.
6 - A prestação de trabalho durante o período de funcionamento dos
serviços, por períodos que ultrapassem a duração normal do trabalho,
será objecto de correspondente compensação temporal.
7 - O disposto no número anterior não é aplicável ao trabalho prestado em
serviço de piquete.
Artigo 5.º - Atendimento ao público
1 - O período de atendimento decorre, de segunda-feira a sexta-feira, das
9 horas às 12 horas e 30 minutos e das 14 horas às 17 horas e
30 minutos.
2 - Fora do período referido no número anterior, o atendimento ao público
é assegurado, com carácter permanente, pelo serviço de piquete.
Artigo 6.º - Controlo da assiduidade e pontualidade
1 - A verificação do cumprimento dos deveres de pontualidade e assiduidade,
bem como do período normal de trabalho, é feita nos termos da lei
geral.
Despacho Normativo n.º 18/2002
2 - O pessoal dirigente e de chefia, embora isento de horário de trabalho,
está obrigado à observância do dever geral de assiduidade, bem como
ao cumprimento da duração semanal de trabalho legalmente
estabelecida.
3 - Face à especificidade das funções do pessoal de investigação criminal e
dos funcionários de segurança, os respectivos deveres de assiduidade e
pontualidade ficam exclusivamente sujeitos ao controlo da hierarquia.
Artigo 7.º - Regime de prestação de trabalho
1 - Compete ao director nacional, tendo em conta a natureza e complexidade
das tarefas a executar, determinar o regime de prestação de trabalho e
os horários a praticar.
2 - Em casos especiais, devidamente fundamentados, poderão ser adoptados
diferentes regimes de trabalho, diferentes modalidades de horário ou
horários diferenciados dentro de uma mesma unidade orgânica, ou
relativamente a funcionários de uma mesma categoria, carreira ou grupo
profissional.
Artigo 8.º - Horário flexível
1 - O horário flexível rege-se pelos seguintes princípios.
2 - A prestação decorre entre as 8 e as 20 horas, com plataformas fixas
(períodos de presença obrigatória), de harmonia com as modalidades
que a seguir se descrevem:
Modalidade A
Manhã
Tarde
Entrada
Saída
Entrada
Saída
9 Horas
11 Horas e
30 minutos
14 Horas
16 Horas e
30 minutos
Modalidade B
Manhã
Tarde
Entrada
Saída
Entrada
Saída
10 Horas
12 Horas e
30 minutos
15 Horas
17 Horas e
30 minutos
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Despacho Normativo n.º 18/2002
3 - A flexibilidade não pode afectar o regular e eficaz funcionamento dos
serviços, especialmente no que respeita ao atendimento do público e ao
apoio à investigação criminal.
4 - No que se refere ao número anterior e sempre que a natureza das
actividades desenvolvidas por um serviço o exija, podem ser fixados pelo
director nacional, directamente ou por delegação, sem prejuízo dos
princípios gerais previstos neste Regulamento, regimes de flexibilidade
mais adequados àquelas situações.
5 - O regime de horário flexível não dispensa o funcionário de comparecer
no respectivo local de trabalho, sempre que seja convocado para tal,
dentro do período normal de funcionamento dos serviços.
6 - Regras de assiduidade e faltas:
a) As entradas e saídas serão registadas de harmonia com o previsto no
artigo 14.º do Decreto-Lei N.º 259/1998, de 18 de Agosto;
b) O débito de horas, apurado no final de cada período de aferição
afixado, dá lugar à marcação de uma falta que deve ser justificada
nos termos da legislação aplicável, por cada período igual ou inferior
à duração média diária do trabalho;
c) As faltas dadas nos termos da alínea anterior serão reportadas ao
último dia em que não foi prestado o tempo de trabalho normal
diário e aos que imediatamente o precedem, consoante o número de
faltas;
d) As ausências ao serviço no período das plataformas fixas referidas no
Nº 2 do presente artigo não são compensáveis e implicam a perda
total do tempo de trabalho normal correspondente ao dia em que
verificaram, dando origem à marcação de uma falta.
7 - Controlo da assiduidade:
a) Sem prejuízo do disposto na alínea a) do número anterior, compete
aos superiores hierárquicos a verificação da observância dos deveres
de pontualidade e assiduidade;
b) O cômputo das horas de serviço prestadas será efectuado pelo serviço
responsável pelo assunto de pessoal;
c) Qualquer reclamação de contagem será apresentada no prazo de
cinco dias contados a partir da data do seu conhecimento ou do dia
em que o funcionário regressar ao serviço, caso este se encontre em
situação de ausência;
d) As correcções a introduzir, resultantes de reclamação, serão
efectuadas, sempre que possível, no período seguinte àquele a que
respeitem.
Despacho Normativo n.º 18/2002
8 - Regime de compensação:
a) Sem prejuízo do normal e eficaz funcionamento do trabalho, é
concedido, dentro do respectivo período de aferição, o regime de
livre compensação dos tempos das plataformas móveis,
salvaguardados que se mostrem os limites fixados na alínea c) do
N.º 2 do artigo 16.º do Decreto-Lei N.º 259/1998, de 18 de Agosto;
b) Quando, por necessidade do serviço, venham a ser prestadas mais
horas do que as consideradas obrigatórias e o saldo positivo seja
confirmado pela respectiva hierarquia, poderá o mesmo ser utilizado
como crédito nas margens móveis, transitando para o período de
aferição seguinte, no caso de absoluta impossibilidade de a
compensação ser efectuada no período a que se reporta.
Artigo 9.º - Regime de turnos
1 - Sempre que as necessidades prementes de serviço assim o aconselhem,
pode ser adoptado um regime especial de turnos, com as particularidades
previstas no número seguinte.
2 - É admitida uma coincidência parcial nos horários dos turnos, por forma
a concentrar o esforço do trabalho em períodos de maior solicitação de
serviço.
3 - O disposto no N.º 1 não impede o estabelecimento pelo director nacional,
de acordo com o previsto no artigo 79.º, N.º 5, do Decreto-Lei N.º 275-A/
/2000, de 9 de Novembro, do regime de turnos previsto na lei geral.
4 - Em casos especiais, devidamente fundamentados, poderão ser adoptados
dentro de uma mesma unidade orgânica, ou relativamente a funcionários
de uma mesma categoria, carreira ou grupo profissional, um ou,
simultaneamente, mais do que um dos regimes de turno previstos neste
artigo.
Artigo 10.º - Protecção à maternidade e paternidade
Na fixação da prestação de serviço dos funcionários procurará acautelar-se,
sempre que possível, a situação daqueles que tenham a seu cargo menores
de 12 anos, ou portadores de deficiência que careçam de acompanhamento
pelos progenitores.
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Despacho n.º 011/2002-SEC/DN
Despacho
n.º 011/2002-SEC/DN
(Aclaramento
ao Despacho
n.º 06/2002-SEC/DN)
A ocorrência e exposição de algumas dúvidas suscitadas pela aplicação do
despacho em epígrafe impõe que se proceda a algumas precisões por forma
aumentar o espaço interpretativo comum e, desta forma, contribuir para a
sua uniforme aplicação.
As principais dúvidas têm surgido na definição dos pressupostos do estipulado
no 1.2 e 1.3 - prevenção activa - e 2.1 - trabalho extraordinário - do referido
despacho, bem como na distinção entre as situações de prevenção passiva
e activa.
Assim, nos termos do n.º4 do Despacho em epígrafe, procede-se ao
esclarecimento seguinte.
1. Prevenção activa
1.1. Os 1.2 e 1.3 consideram prestado em regime de reforço às unidade de
prevenção - prevenção activa - o serviço que deva ser realizado fora do
horário normal de trabalho e que corresponda à necessidade de
assegurar a realização, ou continuação da realização, de actos de
prevenção, investigação ou apoio à investigação, de cujo adiamento
ou interrupção da prestação resulte prejuízo para o sucesso da
investigação.
1.2. Formulada deste modo, parece não suscitarem dúvidas quanto à
aplicação do regime de prevenção activa ao pessoal de investigação
criminal. Contudo, o mesmo parece não acontecer quando se trate de
pessoal de apoio à investigação.
1.3. A dúvida estabelece-se porque entre os actos de apoio investigação e
o sucesso da mesma se não vislumbra, em regra, uma directa ou material
relação.
1.4. Mas, sob pena de se desvirtuar o sistema em que assenta a construção
orgânica e funcional da Polícia Judiciária, não é possível deixar de
considerar a área do apoio à investigação como precioso contribuinte
para o sucesso da investigação, quer se trate uma investigação em
concreto, quer da investigação em abstracto, vista como a finalidade
da Organização.
1.5. Na verdade, se um acto de apoio à investigação ou, dito de outro
modo, praticado por funcionários de apoio, poderá, pela sua natureza,
encontrar-se numa especial e directa relação com o sucesso da mesma - por exemplo, a intervenção no sistema de telecomunicações no
decurso de uma operação - outros haverá que, não se encontrando
embora em tão especial relação - por exemplo o tratamento
administrativo e distribuição do expediente - não poderão também
deixar de o ser contribuintes para tal sucesso.
1.6. A diferença está no grau ou na intensidade dessa participação ou
contribuição para tal sucesso.
Despacho n.º 011/2002-SEC/DN
1.7. Donde, lançando mão dos exemplos referidos, o insucesso da
investigação (ou das investigações) tanto pode advir da ausência de
comunicações ou da suspensão da necessária intervenção, como do
atraso no recebimento da devida correspondência, na medida em que
esta contenha ou veicule informações úteis.
1.8. Deste modo o regime previsto nos 1.2 e 1.3 do despacho n.º 06/2002-SEC/DN, de 15/02/2002, desde que se trate de serviço realizado fora
do horário normal de trabalho, tanto se aplica ao pessoal de investigação
criminal como ao pessoal de apoio à investigação criminal.
2. Trabalho Extraordinário
2.1. A prestação de trabalho extraordinário, nos termos da Lei n.º 259/98,
de 18 de Agosto, apenas terá lugar em situações que imperiosamente
o exijam, tal como a acumulação anormal ou imprevista de trabalho
ou realização de tarefas especiais, afastando-se assim a possibilidade
de recurso a tal regime para a realização de tarefas regulares e
constantes do plano de actividades da respectiva unidade orgânica.
2.2. Deste modo e tendo em conta o considerado a propósito do regime
de reforço à prevenção - prevenção activa - o trabalho extraordinário
apenas poderá ter lugar sob fundamento de impreterível necessidade
inerente ao próprio serviço, isto é, sem relação com a investigação
(embora se destine a criar condições para um melhor desempenho),
que inculque a ideia de trabalho de empreitada, temporalmente definida
e com referências de partida e objectivos de chegada.
2.3. Visto por outro ângulo, trata-se de desenvolver um trabalho acrescido
que, atentas as razões de partida e os objectivos de chegada, não
justifica o recurso ao aumento de efectivos.
2.4. Caberão neste quadro, por exemplo, o esforço de diminuição de
pendências no LPC (instalada que foi a situação de completo
descontrolo), o trabalho decorrente da informatização de determinado
serviço que em simultâneo terá de continuar a dar resposta às
necessidades correntes, ou uma bem definida empreitada como o
esvaziamento de um armazém de automóveis apreendidos e a sua
transferência para outro lugar.
2.5. Em consequência, o envio ao Director Nacional da fundamentação
referida em 2.1 e 2.2 alínea b) do Despacho n.º 06/2002-SEC/DN, de
15 de Fevereiro, deverá ser prévio à autorização da prestação do
trabalho extraordinário.
3. Prevenção Passiva e Prevenção Activa
3.1. Importa finalmente esclarecer a relação entre "prevenção passiva" e
"prevenção activa" bem como as situações a que cada um dos
respectivos regimes se aplicará.
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Despacho n.º 011/2002-SEC/DN
3.2. Embora não expressa na lei a "prevenção passiva" tem vindo a assumirse como sendo a situação em que se encontra o funcionário escalado
para integrar as unidades de prevenção, independentemente de, nessa
qualidade, prestar ou não serviço efectivo.
3.3. Donde, nos termos da regulamentação em vigor - Portaria n.º 98/97,
de 13 de Fevereiro - encontrar-se-ão em tal situação e, consequentemente, remunerados nos termos do art. 3.º do mesmo diploma,
apenas os funcionários pertencentes às áreas funcionais definidas no
Despacho n.º 09/00-SEC/DG, de 12 de Abril.
3.4. Igualmente ausente da letra lei o conceito de "prevenção activa" resulta
da necessidade de, simplificadamente, distinguir a situação e respectivo
regime aqueles que, integrando as unidades de prevenção, são
chamados à prestação efectiva de trabalho, daqueles que, integrando
também tais unidades, o não são.
3.5. Assim, considerar-se-ão de prevenção activa e, consequentemente,
remunerados nos termos dos arts. 4.º, 5.º, 6.º e 7.º da Portaria referida,
todos os funcionários que, integrando unidades de prevenção - prevenção passiva - forem chamados à prestação efectiva de trabalho
e aqueles que, não integrando tais unidades, prestarem serviço nos
termos dos 1.2 e 1.3 do despacho em epígrafe - reforço às unidades
de prevenção.
3.6. Do exposto resulta a possibilidade de ocorrência de três regimes
diferentes para remunerar três diferentes situações: os regimes de
"prevenção passiva", de "prevenção passiva e activa" e o de "prevenção
activa", consoante os funcionários, respectivamente, integrem as
unidades de prevenção mas não sejam chamados à prestação efectiva
de trabalho, integrem as unidades de prevenção e sejam chamados à
prestação efectiva de trabalho ou não integrem a unidades de prevenção
e sejam, nos termos do despacho em epígrafe, chamados à prestação
de serviço fora do horário normal de trabalho.
Lisboa, 20 de Março de 2002
O Director Nacional
(LUÍS BONINA)
Despacho n.º 024/2002-SEC/DN
Despacho
n.º 024/2002-SEC/DN
(Serviço de
prevenção,
ajudas de
custo e
trabalho
extraordinário)
Considerando:
- A recente entrada em vigor (no dia 1 de Maio de 2002) do Regulamento
do Horário de Trabalho dos Funcionários da Polícia Judiciária aprovado
pelo Despacho Normativo n.º18/2002;
- a necessidade de determinar o início e o termo do serviço de prevenção
bem como proceder à elaboração de escalas de serviço;
- o aumento da capacidade de controlo, decorrente da informatização em
curso do processo de contabilização do serviço de prevenção e de ajudas
de custo;
- a verificação de alguma falta de rigor na aplicação das disposições
regulamentares e despachos relativos ao serviço de prevenção e trabalho
extraordinário;
- a necessidade de assunção da competência, por parte dos dirigentes das
unidades orgânicas, para autorizar a prestação efectiva de trabalho
(prevenção activa);
Para aplicação em todas as unidades orgânicas da Polícia Judiciária,
determino:
1. Serviço de prevenção
1.1. A participação dos funcionários nas unidades de prevenção far-se-á
por escala de serviço de duração semanal a organizar nas unidades
orgânicas abrangidas, com início às 08H00 de segunda feira e termo
às 08H00 da segunda feira seguinte.
1.2. A escala de serviço referida no número anterior será, no final de cada
semana, remetida ao DAFP/AAF para efeito de processamento.
1.3. Apenas haverá lugar ao pagamento da prestação de trabalho para
além da sua duração normal (prevenção activa) quando esta tiver lugar
entre as 20H00 e as 08H00.
1.4. Contudo, sempre que a compensação temporal não seja materialmente
possível, poderá o dirigente da unidade orgânica, em caso da prestação
de trabalho dentro do período de funcionamento dos serviços, autorizar
o pagamento referido no número anterior.
1.5. Competindo ao dirigente da unidade orgânica o "juízo de imprescindibilidade" da prestação do trabalho fora do período normal - prevenção
activa - referido em 1.4 do despacho n.º 06/2002-SEC/DN, de 15 de
Fevereiro de 2002, sobre ele recai a responsabilidade pela manutenção
efectiva da natureza rigorosamente excepcional deste tipo de
prevenção.
1.6. O "mapa de serviço de prevenção e prestação efectiva de trabalho"
referido em 1.5 do mesmo despacho é substituído pelo "mapa mensal
de prevenção activa", cujo modelo se junta em anexo e se encontra
disponível na rede.
159
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Despacho n.º 024/2002-SEC/DN
1.7. A fim de promover e facilitar o efectivo controlo da prevenção activa,
será instituída a utilização do "boletim diário" cujo modelo se encontra
disponível na rede, devendo ser obrigatoriamente preenchido em todos
os campos (junto a título identificativo).
1.7.1. O campo referente à identificação do expediente (b)) deverá
conter a identificação do Processo, AI, Referência ou Outro.
1.7.2. O campo "Relato sumário da diligência" (c)) deverá compreender
a descrição sucinta da natureza do serviço e dos actos, em
concreto, praticados.
1.8. O referido "boletim diário" serve de suporte ao "mapa mensal de
prevenção activa", o qual, juntamente com os boletins diários
correspondentes, deverá ser entregue no DAFP/AAF até ao dia cinco
do mês imediato àquele a que respeite.
2. Ajudas de custo
2.1. O "boletim diário" referido em 1.7 aplicar-se-á também às deslocações
em serviço, sendo o seu preenchimento obrigatório, nos termos
referidos em 1.7.1 e 1.7.2, sempre que estas dêem lugar ao pagamento
de ajudas de custo.
2.2. O impresso referido no numero anterior servirá de suporte ao "boletim
de itinerário de ajudas de custo".
3. Trabalho extraordinário
3.1. Assumindo o trabalho extraordinário, no quadro da regulamentação
legal do horário de trabalho dos funcionários da Polícia Judiciária,
carácter excepcional, reafirma-se a sua prestação sob autorização prévia
do Director Nacional e nos estritos termos definidos nos despachos
n.ºs 06/02-SEC-DN e 11/02-SEC-DN, de 15 de Fevereiro de 2002 e
20 de Março de 2002, respectivamente.
4. Processamento e entrada em vigor
4.1. Não será processado o serviço de prevenção, ajudas de custo ou trabalho
extraordinário que, do controlo efectuado no DAFP/AAF, venha a ser
considerado em desconformidade com o regulamentado.
4.2. O presente despacho entra em vigor em 1 de Julho de 2002
Lisboa, 26 de Junho de 2002
O Director Nacional
(ADELINO SALVADO)
Constituição da República Portuguesa
Constituição
da República
Portuguesa
Artigo 13.º (Princípio da igualdade)
V Revisão
Constitucional
2. ————
1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais
perante a lei.
Artigo 18.º (Força jurídica)
1. ————
2. A lei só pode restringir os direitos, liberdades e garantias nos casos
expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições
limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou
interesses constitucionalmente protegidos.
3. ––––––––
Artigo 21.º (Direito de resistência)
Todos têm o direito de resistir a qualquer ordem que ofenda os seus
direitos, liberdades e garantias e de repelir pela força qualquer
agressão, quando não seja possível recorrer à autoridade pública.
Artigo 22.º (Responsabilidade das entidades públicas)
O Estado e as demais entidades públicas são civilmente responsáveis,
em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionários ou
agentes, por acções ou omissões praticadas no exercício das suas
funções e por causa desse exercício, de que resulte violação dos
direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para outrem.
Artigo 59.º (Direitos dos trabalhadores)
1. Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania,
território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm
direito:
a) À retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e
qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual
salário igual, de forma a garantir uma existência condigna;
b) A organização do trabalho em condições socialmente
dignificantes, de forma a facultar a realização pessoal e a
permitir a conciliação da actividade profissional com a vida
familiar;
c) A prestação do trabalho em condições de higiene, segurança e
saúde;
161
162
Constituição da República Portuguesa
d) Ao repouso e aos lazeres, a um limite máximo da jornada de
trabalho, ao descanso semanal e a férias periódicas pagas;
e) ––––––––
f) ––––––––
2. Incumbe ao Estado assegurar as condições de trabalho, retribuição
e repouso a que os trabalhadores têm direito, nomeadamente:
a) ––––––––
b) A fixação, a nível nacional, dos limites da duração do trabalho;
c) ––––––––
d) ––––––––
e) ––––––––
f) ––––––––
3. Os salários gozam de garantias especiais, nos termos da lei.
Lei n.º 23/98
Lei n.º 23/98
de 26 de Maio
Estabelece o regime de negociação colectiva e a participação dos
trabalhadores da Administração Pública em regime de direito público.
A Assembleia da República decreta, nos termos dos artigos 161.º, alínea c),
165.º, alínea b), e 166.º, n.º 3, e do artigo 112.º, n.º 5, da Constituição,
para valer como lei geral da República, o seguinte:
Artigo 1.º - Objecto
1. O presente diploma regula as condições do exercício dos direitos de
negociação colectiva e de participação dos trabalhadores da Administração
Pública em regime de direito público.
2. Os direitos de negociação colectiva e de participação têm por objecto,
no âmbito do presente diploma, a fixação ou alteração do estatuto dos
trabalhadores da Administração Pública, bem como o acompanhamento
da sua execução.
3. Os direitos de negociação colectiva e de participação dos trabalhadores
da Administração Pública, em regime de direito privado, regem-se pela
legislação geral referente à regulamentação colectiva das. relações de
trabalho.
Artigo 2.º - Legitimidade
Os direitos de negociação colectiva e de participação, no que respeita às
organizações sindicais, apenas podem ser exercidos através daquelas que,
nos termos dos respectivos estatutos, representem interesses de
trabalhadores da Administração Pública e se encontrem devidamente
registadas.
Artigo 3.º - Princípios
1. A Administração e as associações sindicais respeitam os princípios da
boa fé, nomeadamente respondendo com a máxima brevidade quer aos
pedidos de reunião solicitados, quer às propostas mútuas, fazendo-se
representar nas reuniões destinadas à negociação ou participação e à
prevenção ou resolução de conflitos.
2. As consultas dos representantes da Administração e dos trabalhadores,
através das suas organizações sindicais, não suspendem ou interrompem
a marcha do procedimento de negociação ou participação, salvo se as
partes nisso expressamente acordarem.
3. Cada uma das partes pode solicitar à outra as informações consideradas
necessárias ao exercício adequado dos direitos de negociação colectiva e
de participação, designadamente os estudos e elementos de ordem técnica
ou estatística, não classificados, que sejam tidos como indispensáveis à
fundamentação das propostas e das contrapropostas.
163
164
Lei n.º 23/98
Artigo 4.º - Cláusula de salvaguarda
A Administração e as associações sindicais devem assegurar a apreciação,
discussão e resolução das questões colocadas numa perspectiva global e
comum a todos os serviços e organismos e aos trabalhadores da
Administração Pública no seu conjunto, respeitando o princípio da
prossecução do interesse público e visando a dignificação da função pública
e a melhoria das condições sócio-económicas dos mesmos trabalhadores.
Artigo 5.º - Direito de negociação colectiva
1. É garantido aos trabalhadores da Administração Pública em regime de
direito público o direito de negociação colectiva do seu estatuto.
2. Considera-se negociação colectiva a negociação efectuada entre as
associações sindicais e a Administração das matérias relativas àquele
estatuto, com vista à obtenção de um acordo.
3. O acordo, total ou parcial, que for obtido consta de documento autónomo
subscrito pelas partes e obriga o Governo a adoptar as medidas legislativas
ou administrativas adequadas ao seu integral e exacto cumprimento, no
prazo máximo de 180 dias, sem prejuízo de outros prazos que sejam
acordados, salvo nas matérias que careçam de autorização legislativa,
caso em que os respectivos pedidos devem ser submetidos à Assembleia
da República no prazo máximo de 45 dias.
Artigo 6.º - Objecto de negociação colectiva
São objecto de negociação colectiva as matérias relativas à fixação ou
alteração:
a) Dos vencimentos e das demais prestações de carácter remuneratório;
b) Das pensões de aposentação ou de reforma;
c) Das prestações da acção social e da acção social complementar;
d) Da constituição, modificação e extinção da relação de emprego;
e) Das carreiras de regime geral e especial e das integradas em corpos
especiais, incluindo as respectivas escalas salariais;
f) Da duração e horário de trabalho;
g) Do regime das férias, faltas e licenças;
h) Do regime dos direitos de exercício colectivo;
i) Das condições de higiene, saúde e segurança no trabalho;
j) Da formação e aperfeiçoamento profissional;
k) Do estatuto disciplinar;
l) Do regime de mobilidade;
m) Do regime de recrutamento e selecção;
n) Do regime de classificação de serviço.
Lei n.º 23/98
Artigo 7.º - Procedimento de negociação
1. A negociação geral anual deverá iniciar-se a partir do dia 1 de Setembro,
com a apresentação, por uma das partes, de proposta fundamentada
sobre qualquer das matérias previstas no artigo anterior, procedendo-se
seguidamente à calendarização das negociações, de forma que estas
terminem tendencialmente antes da votação final global da proposta do
Orçamento, nos termos constitucionais, na Assembleia da República.
2. As matérias sem incidência orçamental constantes do artigo anterior
podem ser objecto de negociação a qualquer momento, desde que as
partes contratantes nisso acordem, e desde que não tenham sido
discutidas na negociação geral anual precedente.
3. As partes devem fundamentar as suas propostas e contrapropostas,
impendendo sobre elas o dever de tentar atingir, em prazo adequado,
um acordo.
4. Das reuniões havidas são elaboradas actas, subscritas pelas partes, donde
constará um resumo do que tiver ocorrido, designadamente os pontos
em que não se tenha obtido acordo.
5. As negociações sectoriais iniciam-se em qualquer altura do ano e têm a
duração que for acordada entre as partes, aplicando-se-lhes os princípios
constantes dos números anteriores.
Artigo 8.º - Convocação de reuniões
A convocação de reuniões dentro do procedimento negociai tem de ser
feita sempre com a antecedência mínima de cinco dias úteis, salvo acordo
das partes.
Artigo 9.º - Resolução de conflitos
1. Terminado o período da negociação sem que tenha havido acordo poderá
abrir-se uma negociação suplementar, a pedido das associações sindicais,
para resolução dos conflitos.
2. O pedido para negociação suplementar será apresentado no final da
última reunião negocial, ou por escrito, no prazo de cinco dias úteis,
contado a partir do encerramento de qualquer dos procedimentos de
negociação previstos no artigo 7.º, devendo dele ser dado conhecimento
a todas as partes envolvidas no processo.
3. A negociação suplementar, desde que requerida nos termos do número
anterior, é obrigatória, não podendo a sua duração exceder 15 dias úteis,
consiste na tentativa de obtenção de um acordo e tem como consequência
que não pode ser encerrado qualquer procedimento negociai em curso
sobre as mesmas matérias com qualquer outra entidade.
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166
Lei n.º 23/98
4. Na negociação suplementar a parte governamental será constituída por
membro ou membros do Governo, sendo obrigatoriamente presidida
pelo que for responsável pela Administração Pública e, no caso das
negociações sectoriais, pelo que for responsável pelo sector.
5. Finda a negociação suplementar sem obtenção de acordo, o Governo
toma a decisão que entender adequada, sem prejuízo do disposto no
n.º 3 do artigo 5.º.
Artigo 10.º - Direito de participação
1. É garantido aos trabalhadores da Administração Pública o direito de
participarem, através das suas associações sindicais:
a) Na elaboração de programas de emprego;
b) Na fiscalização e implementação das medidas relativas às condições
de higiene, saúde e segurança no trabalho;
c) Na gestão das instituições de segurança social dos trabalhadores
da função pública e de outras organizações que visem satisfazer o
interesse dos trabalhadores, designadamente as obras e serviços
sociais, a ADSE e a Caixa Geral de Aposentações;
d) Nas alterações ao Estatuto da Aposentação;
e) Na definição da política de formação e aperfeiçoamento profissional
da Administração Pública;
f) No controlo de execução dos planos económico-sociais;
g) No domínio da melhoria da qualidade dos serviços públicos;
h) Nas auditorias de gestão efectuadas aos serviços públicos;
i) Na elaboração dos pedidos de autorização legislativa sobre matéria
sujeita à negociação ou participação;
j) Na elaboração da regulamentação interna relativa às condições
específicas de trabalho de cada serviço;
l) Na definição do regime de acidentes de serviço e doenças
profissionais;
m) Na elaboração da legislação respeitante ao regime geral ou especial
da função pública que não for objecto de negociação.
2. A participação na elaboração de programas de emprego tem a natureza
de consulta e tem como referência o plano anual de actividades previsto
no Decreto-Lei n.º 183/96, de 27 de Setembro.
3. A participação na fiscalização das medidas relativas às condições de
higiene e segurança faz-se nos termos da lei.
Lei n.º 23/98
4. A participação nas instituições de segurança social dos trabalhadores
da função pública e de outras organizações que visem satisfazer o
interesse dos trabalhadores consiste no direito de ser informado sobre
a gestão daquelas instituições pelos respectivos órgãos e no de lhes
fazer recomendações visando a melhoria dos serviços prestados,
regendo-se, quanto ao mais, pelo disposto na lei.
5. A participação na definição da política de formação e aperfeiçoamento
profissional faz-se, designadamente, no âmbito da comissão
intersectorial de formação e dos conselhos consultivos.
6. A participação no controlo da execução dos planos económico-sociais
faz-se de acordo com o disposto na lei.
7. A participação na melhoria da qualidade dos serviços públicos envolve
a consulta das associações sindicais sobre a elaboração dos programas
de qualidade e o acompanhamento da sua execução.
8. A participação nas auditorias de gestão faz-se através da consulta dos
respectivos relatórios finais e emissão de sugestões, podendo as
associações sindicais propor fundadamente a realização daquelas
auditorias.
9. A participação nas alterações ao Estatuto da Aposentação e na
elaboração da legislação respeitante ao regime geral ou especial da
função pública, que não for objecto de negociação, tem a natureza de
consulta, oral ou escrita, pressupondo, caso a iniciativa seja do Governo,
a existência de documento escrito a apresentar por este.
10. A participação na legislação prevista nas alíneas i) a m) do n.º 1 tem a
natureza de consulta, oral ou escrita, podendo para o efeito constituirse comissões técnicas especializadas, segundo regulamento a adoptar
caso a caso.
11. Das reuniões das comissões técnicas especializadas que vierem a ser
constituídas serão lavradas actas nos termos do n.º 4 do artigo 7.º.
12. O prazo para apreciação escrita dos projectos de diploma por parte
das associações sindicais nunca pode ser inferior a 20 dias a contar da
sua recepção por parte da associação sindical, salvo acordo expresso
em contrário.
13. O prazo previsto no número anterior é, porém, contado a partir do dia
útil imediatamente seguinte ao do recebimento das informações
solicitadas ao abrigo do n.º 3 do artigo 3.º
Artigo 11.º - Casos especiais
Ao pessoal com funções de representação externa do Estado, bem como ao
que desempenhe funções de natureza altamente confidencial, é aplicado,
em cada caso, o procedimento negociai adequado à natureza das respectivas
funções, sem prejuízo dos direitos reconhecidos no presente diploma.
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Lei n.º 23/98
Artigo 12.º - Matérias excluídas
A estrutura, atribuições e competências da Administração Pública não podem
ser objecto de negociação colectiva ou de participação.
Artigo 13.º - Informação sobre política salarial
As associações sindicais podem enviar ao Governo, até ao fim do 1.º semestre
de cada ano, a respectiva posição sobre os critérios que entendam dever
orientar a política salarial a prosseguir no ano seguinte.
Artigo 14.º - Interlocutor da Administração nos processos de
negociação e participação
1. O interlocutor pela Administração nos procedimentos de negociação
colectiva e de participação que revistam carácter geral é o Governo, através
daquele dos seus membros que tiver a seu cargo a função pública, que
coordena, e do Ministro das Finanças, os quais intervêm por si ou através
de representantes.
2. O interlocutor pela Administração nos procedimentos de negociação
colectiva e de participação que revistam carácter sectorial é o Governo,
através do ministro responsável pelo sector, que coordena, do Ministro
das Finanças e do membro do Governo que tiver a seu cargo a função
pública, nos quais intervêm por si ou através de representantes.
3. Compete à Direcção-Geral da Administração Pública apoiar o membro
do Governo que tiver a seu cargo a função pública nos procedimentos
de negociação colectiva e de participação referidos nos números
anteriores.
Artigo 15.º - Representantes das associações sindicais
1. Consideram-se representantes legítimos das associações sindicais:
a) Os membros dos respectivos corpos gerentes portadores de credencial
com poderes bastantes para negociar e participar;
b) Os portadores de mandato escrito conferido pelos corpos gerentes
das associações sindicais, do qual constem expressamente poderes para
negociar e participar.
2. A revogação do mandato só é eficaz após comunicação aos serviços
competentes da Administração Pública.
Artigo 16.º - Transcrição oficiosa do registo das associações sindicais
A Direcção-Geral da Administração Pública deve requerer ao Ministério do
Trabalho e da Solidariedade a transcrição oficiosa do registo das associações
sindicais que representem interesses dos trabalhadores da Administração
Pública e comunicá-la às Regiões Autónomas.
Lei n.º 23/98
Artigo 17.º - Aplicação à administração regional autónoma
1. O presente diploma aplica-se a todo o território nacional.
2. Os órgãos de governo próprio das Regiões Autónomas dos Açores e da
Madeira observam, relativamente às administrações regionais e no âmbito
das suas competências, o regime previsto no presente diploma.
Artigo 18.º - Revogação
É revogado o Decreto-Lei n.º 45-A/84, de 3 de Fevereiro, com excepção do
artigo 10.º.
Artigo 19.º - Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no dia imediato ao da sua publicação.
Aprovada em 2 de Abril de 1998.
O Presidente da Assembleia da República, António de Almeida Santos.
Promulgada em 8 de Maio de 1998.
Publique-se.
O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendada em 14 de Maio de 1998.
O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.
169
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Decreto-Lei n.º 259/98
Decreto-Lei
n.º 259/98 de
18 de Agosto
Com a publicação do Decreto-Lei n.º 187/88, de 27 de Maio, consagrou-se,
pela primeira vez na Administração Pública, um instrumento legal que, de
modo sistemático, reuniu os princípios fundamentais enformadores do
regime jurídico da duração de trabalho.
Decorridos cerca de 10 anos sobre a sua aplicação, impõe-se adaptar este
regime às transformações sócio-laborais que se têm vindo a verificar, bem
como às alterações que a experiência vem ditando, no sentido de melhorar
o funcionamento e a operacionalidade dos serviços e organismos da
Administração Pública, tendo em vista a sua adequação às necessidades e à
disponibilidade dos cidadãos.
De entre as alterações introduzidas merecem realce: a distinção entre o
período de funcionamento e o período de atendimento, com a obrigatoriedade de afixação pública deste, a uniformização da duração do horário
de trabalho, sem prejuízo da fixação de um período transitório, a consagração
da audição dos trabalhadores, através das suas organizações representativas,
na fixação das condições de prestação de trabalho, a faculdade da abertura
dos serviços em dias de feiras e mercados relevantes, a criação do regime de
prestação de trabalho sujeito apenas ao cumprimento de objectivos, situação
que facilita a concretização do designado «teletrabalho», o alargamento do
âmbito de aplicação do trabalho a meio tempo e a atribuição dos dirigentes
máximos dos serviços da responsabilidade de gestão dos regimes de prestação
de trabalho, entre outras.
As alterações, ora propostas, foram negociadas com as organizações
representativas dos trabalhadores da função pública, no quadro do acordo
salarial para 1996 e compromissos de médio e longo prazos.
Foram ouvidos os órgãos de Governo próprio das Regiões Autónomas e a
Associação Nacional de Municípios Portugueses.
Assim:
No uso da autorização legislativa concedida pelo n.º 1 do artigo único
da Lei n.º 11/98, de 24 de Fevereiro, e nos termos do n.º 5 do artigo
112.º e da alínea b) do n.º 1 do artigo 198.º da Constituição, o Governo
decreta o seguinte:
CAPÍTULO I
Artigo 1.º - Objecto e âmbito
Objecto, âmbito
e princípios gerais
1. O presente diploma estabelece as regras e os princípios gerais em matéria
de duração e horário de trabalho na Administração Pública.
2. O regime instituído no presente diploma aplica-se a todos os serviços da
Administração Pública, incluindo os institutos públicos que revistam a
natureza de serviços personalizados ou de fundos públicos.
Decreto-Lei n.º 259/98
Artigo 2.º - Período de funcionamento
1. Entende-se por período de funcionamento o período diário durante o
qual os serviços exercem a sua actividade.
2. Sem prejuízo do disposto no artigo 10.º, o período normal de funcionamento dos serviços não pode iniciar-se antes das 8 horas, nem terminar
depois das 20 horas, sendo obrigatoriamente afixado de modo visível
aos funcionários e agentes.
Artigo 3.º - Período de atendimento
1. Entende-se por período de atendimento o período durante o qual os
serviços estão abertos para atender o público, podendo este período ser
igual ou inferior ao período de funcionamento.
2. O período de atendimento deve, tendencialmente, ter a duração mínima
de sete horas diárias, abranger o período da manhã e da tarde e ter
obrigatoriamente afixadas, de modo visível ao público, nos locais de
atendimento, as horas do seu início e do seu termo.
3. Na definição e fixação do período de atendimento deve atender-se aos
interesses dos utentes dos serviços e respeitar-se os direitos dos respectivos
funcionários e agentes.
4. Os serviços podem estabelecer um período excepcional de atendimento,
sempre que o interesse do público fundamentadamente o justifique,
designadamente nos dias de feiras e mercados localmente relevantes,
ouvindo-se as organizações representativas dos trabalhadores e sem
prejuízo do disposto nos artigos 26.º e 33.º.
5. Fora dos períodos de atendimento, os serviços colocam ao dispor dos
utentes meios adequados a permitir a comunicação, através da utilização
de tecnologias próprias que permitam o seu registo para posterior
resposta.
Artigo 4.º - Regimes de prestação de trabalho
O trabalho pode, de acordo com as atribuições do serviço ou organismo e
com a natureza da actividade desenvolvida, ser prestado nos seguintes
regimes:
a) Sujeito ao cumprimento do horário diário;
b) Sujeito ao cumprimento de objectivos definidos.
Artigo 5.º - Fixação e compatibilização dos períodos de funcionamento
e de atendimento com os regimes de prestação de trabalho
Compete ao dirigente máximo dos serviços fixar os períodos de funcionamento e atendimento dos serviços, assegurando a sua compatibilidade com
a existência de diversos regimes de prestação de trabalho, de forma a garantir
o regular cumprimento das missões que lhes estão cometidas.
171
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Decreto-Lei n.º 259/98
Artigo 6.º - Responsabilidade da gestão dos regimes de prestação de
trabalho
1. Compete ao dirigente máximo do serviço, em função das atribuições e
competências de cada serviço ou organismo:
a) Determinar os regimes de prestação de trabalho e horários mais
adequados;
b) Aprovar o número de turnos e respectiva duração;
c) Aprovar as escalas nos horários por turnos;
d) Autorizar os horários específicos previstos no artigo 22.º.
2. As matérias constantes nas alíneas a) e b) do número anterior devem ser
fixadas em regulamento interno após consulta prévia dos funcionários e
agentes, através das suas organizações representativas.
3. Compete ao pessoal dirigente e de chefia autorizar os funcionários e
agentes hierarquicamente dependentes a ausentar-se do serviço durante
o período de presença obrigatória.
CAPÍTULO II
SECÇÃO I - Regime geral da duração de trabalho
Duração do trabalho
Artigo 7.º Duração semanal do trabalho
1. A duração semanal do trabalho nos serviços abrangidos pelo presente
diploma é de trinta e cinco horas.
2. O disposto no número anterior não prejudica a existência de regimes de
duração semanal inferior já estabelecidos, nem os que se venham a
estabelecer mediante despacho conjunto do membro do Governo
responsável pelo serviço e do membro do Governo que tiver a seu cargo
a Administração Pública.
Artigo 8.º - Limite máximo do período normal de trabalho
1. O período normal de trabalho diário tem a duração de sete horas.
2. O limite previsto no número anterior não é aplicável no caso de horários
flexíveis.
Artigo 9.º - Semana de trabalho e descanso semanal
1. A semana de trabalho é, em regra, de cinco dias.
2. Os funcionários e agentes têm direito a um dia de descanso semanal,
acrescido de um dia de descanso complementar que devem coincidir
com o domingo e o sábado, respectivamente.
Decreto-Lei n.º 259/98
3. Os dias de descanso referidos no número anterior podem deixar de
coincidir com o domingo e o sábado nos seguintes casos:
a) Pessoal. dos serviços que encerrem a sua actividade noutros dias da
semana;
b) Pessoal dos serviços cuja continuidade de actividade não possa ser
interrompida;
c) Pessoal dos serviços de limpeza e de outros serviços preparatórios ou
complementares que devem necessariamente ser efectuados nos dias
de descanso do restante pessoal;
d) Pessoal dos serviços de inspecção de actividades que não encerrem
ao sábado e ao domingo;
e) Pessoal de outros serviços em que o interesse público o justifique,
designadamente nos dias de feiras ou de mercados.
4. Quando a natureza do serviço ou razões de interesse do público o exijam,
pode o dia de descanso complementar ser gozado, segundo opção do
funcionário, do seguinte modo:
a) Dividido em dois períodos imediatamente anteriores ou posteriores
ao dia de descanso semanal;
b) Meio-dia imediatamente anterior ou posterior ao dia de descanso
semanal, sendo o tempo restante deduzido na duração normal de
trabalho dos restantes dias úteis, sem prejuízo da duração semanal de
trabalho.
SECÇÃO II - Regimes especiais da duração de trabalho
Artigo 10.º - Regime dos serviços de funcionamento especial
1. Nos serviços de regime de funcionamento especial, a semana de trabalho
é de cinco dias e meio, sendo reconhecido ao respectivo pessoal o direito
a um dia de descanso semanal, acrescido de meio-dia de descanso semanal
complementar.
2. Consideram-se serviços de regime de funcionamento especial:
a) Os serviços de laboração contínua;
b) Os estabelecimentos de ensino;
c) Os serviços de saúde e os serviços médico-legais;
d) Os mercados e demais serviços de abastecimento;
e) Os cemitérios;
f) Os serviços de luta contra incêndios e de ambulâncias;
173
174
Decreto-Lei n.º 259/98
g) Os serviços de recolha e tratamento de lixos;
h) Os museus, palácios, monumentos nacionais, sítios e parques
arqueológicos, salas de espectáculo e serviços de produção artística,
dependentes do Ministério da Cultura;
i) Os serviços de leitura das bibliotecas, arquivos e secções abertos ao
público dependentes do Ministério da Cultura;
j) Os postos de turismo.
3. Nos serviços de regime de funcionamento especial, o meio dia de descanso
complementar é sempre gozado no período imediatamente anterior ou
posterior ao dia de descanso semanal o qual, por determinação do
dirigente máximo do serviço, pode deixar de coincidir com o domingo.
4. Relativamente a certos grupos profissionais que exerçam funções nos
serviços de regime de funcionamento especial, pode, em alternativa, ser
determinada a adopção do regime previsto nos n.ºs 2 a 4 do artigo anterior
por despacho do dirigente máximo do serviço.
5. O regime da semana de cinco dias deve ser progressivamente estendido
aos serviços com regime de funcionamento especial, por portaria do
membro do Governo competente, do Ministro das Finanças e do membro
do Governo que tutela a Administração Pública, desde que daí não resulte
o encerramento dos serviços aos utentes nem agravamento dos encargos
com o pessoal.
Artigo 11.º Regime do trabalho a meio tempo
1. Os funcionários ou agentes com mais de três anos de serviço efectivo
podem requerer redução a meio tempo da duração de trabalho, por um
período mínimo de trinta dias e máximo de dois anos, podendo esta ser
autorizada desde que não implique qualquer prejuízo para o serviço e as
características da actividade desenvolvida pelos requerentes o permitam.
2. O trabalho a tempo parcial a que se refere o número anterior tem a
duração de metade do horário normal de trabalho e pode ser prestado
diariamente, de manhã ou à tarde, ou três vezes por semana, conforme
houver sido requerido.
3. O requisito de tempo de serviço efectivo estabelecido no n.º 1 não é
exigido aos funcionários e agentes que se encontrem nas seguintes
situações:
a) Tenham a seu cargo descendentes, afins na linha recta descendente,
adoptandos ou adoptados menores de 12 anos que desejem orientar
directa e pessoalmente;
b) Necessitem de cuidar de descendentes, afins na linha recta
descendente, adoptandos ou adoptados cuja enfermidade ou situação
específica exija cuidados e acompanhamento directo do ascendente;
Decreto-Lei n.º 259/98
c) Tenham a seu cargo descendentes, afins na linha recta descendente,
adoptandos ou adoptados portadores de deficiência e que se
encontrem nas situações previstas no artigo 5.º do Decreto-Lei
n.º 170/80, de 29 de Maio;
d) Pretendam assistir o cônjuge, ou pessoa com quem vivam em condições
análogas às dos cônjuges, ascendente ou afim na linha recta
ascendente, na sequência de acidente ou doença grave, o seu estado
exigir a presença de uma terceira pessoa;
e) Quando sejam portadores de deficiência ou sofram de doença grave
e sempre que a junta médica competente recomende o exercício de
funções em tempo parcial;
f) Frequentem com aproveitamento cursos de vários graus de ensino
com vista à obtenção de habilitações académicas que Ihes permitam
ingressar ou progredir nas carreiras da função pública.
4. O gozo de dois anos de redução da duração de trabalho a meio tempo,
seguido ou interpolado num período de três anos, impede que se requeira
nova redução no prazo de três anos, excepto nas situações previstas no
número anterior.
5. As reduções de duração de trabalho a meio tempo superiores a três meses
conferem aos serviços a possibilidade de contratar um trabalhador a termo
certo, por período idêntico ao autorizado para a redução, com vista ao
desempenho de funções no restante meio tempo.
6. O funcionário ou agente a quem tenha sido autorizada a redução de
trabalho a meio tempo superior a três meses não pode requerer o regresso
antecipado ao regime de duração de trabalho a tempo inteiro quando se
tenha verificado a sua substituição nos termos do número anterior e só
enquanto esta durar.
7. O trabalho a meio tempo conta, proporcionalmente, para efeitos de
carreira e dos decorrentes da antiguidade, sendo a retribuição correspondente a 50% da remuneração base a que o funcionário ou agente tem
direito no exercício de funções em tempo completo.
8. É vedado aos funcionários ou agentes referidos no n.º 1 a prestação de
trabalho extraordinário.
Artigo 12.º - Outros regimes especiais de duração de trabalho
1. Sempre que a política de emprego público o justifique, designadamente
a renovação dos efectivos da Administração Pública, podem ser
estabelecidos outros regimes de trabalho a tempo parcial.
2. Quando as características de risco, penosidade e insalubridade decorrentes
da actividade exercida o exijam, devem ser fixados regimes de duração
semanal inferiores aos previstos no presente diploma.
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Decreto-Lei n.º 259/98
CAPÍTULO III
SECÇÃO I - Princípios gerais
Regimes de trabalho
e condições da sua
prestação
Artigo 13.º - Horário de trabalho
1. Entende-se por horário de trabalho a determinação das horas do início e
do termo do período normal de trabalho diário ou dos respectivos limites,
bem como dos intervalos de descanso.
2. O período normal de trabalho diário é interrompido por um intervalo de
descanso de duração não inferior a uma hora nem superior a duas, excepto
em casos excepcionais devidamente fundamentados, de modo que os
funcionários e agentes não prestem mais do que cinco horas de trabalho
consecutivo, salvo no caso de jornada contínua.
3. Pode ser fixado para os funcionários e agentes portadores de deficiência,
pelo respectivo dirigente máximo e a pedido do interessado, mais do
que um intervalo de repouso e com duração diferente da prevista no
número anterior, mas sem exceder no total o limite nele estabelecido.
4. Ao pessoal encarregado da limpeza dos serviços deve ser fixado um horário
especial que recaia apenas num dos períodos do dia e evite a completa
coincidência do exercício das suas funções com os períodos normais do
serviço ou plataformas fixas.
Artigo 14.º - Modo de verificação dos deveres de assiduidade e de
pontualidade
1. Os funcionários e agentes devem comparecer regularmente ao serviço
às horas que Ihes forem designadas e aí permanecer continuamente,
não podendo ausentar-se salvo nos termos e pelo tempo autorizados
pelo respectivo superior hierárquico, sob pena de marcação de falta, de
acordo com a legislação aplicável.
2. O cumprimento dos deveres de assiduidade e pontualidade, bem como
do período normal de trabalho, deve ser verificado por sistemas de registo
automáticos, mecânicos ou de outra natureza.
3. No caso de horários flexíveis, a verificação a que se refere o número
anterior deve ser feita, no local de trabalho, através de sistemas de registo
automáticos ou mecânicos.
4. Nos serviços com mais de 50 trabalhadores, a verificação dos deveres de
assiduidade e de pontualidade é efectuada por sistemas de registo
automáticos ou mecânicos, salvo casos excepcionais, devidamente
fundamentados e autorizados pelo dirigente máximo do serviço, com a
anuência do respectivo Ministro da tutela e do membro do Governo que
tenha a seu cargo a Administração Pública, mediante despacho conjunto.
Decreto-Lei n.º 259/98
SECÇÃO II - Modalidades de horário de trabalho
Artigo 15.º - Modalidades de horário
1. Em função da natureza das suas actividades, podem os serviços adoptar
uma ou, simultaneamente, mais do que uma das seguintes modalidades
de horário de trabalho:
a) Horários flexíveis;
b) Horário rígido;
c) Horários desfasados;
d) Jornada contínua;
e) Trabalho por turnos.
2. Para além dos horários referidos no número anterior, podem ser fixados
horários específicos de harmonia com o previsto no artigo 22.º.
Artigo 16.º - Horários flexíveis
1. Horários flexíveis são aqueles que permitem aos funcionários e agentes
de um serviço gerir os seus tempos de trabalho, escolhendo as horas de
entrada e de saída.
2. A adopção de qualquer horário flexível está sujeita às seguintes regras:
a) A flexibilidade não pode afectar o regular e eficaz funcionamento dos
serviços, especialmente no que respeita às relações com o público;
b) É obrigatória a previsão de plataformas fixas da parte da manhã e da
parte da tarde, as quais não podem ter, no seu conjunto, duração
inferior a quatro horas;
c) Não podem ser prestadas, por dia, mais de nove horas de trabalho;
d) O cumprimento da duração do trabalho deve ser aferido à semana, à
quinzena ou ao mês.
3. O débito de horas, apurado no final de cada período de aferição, dá
lugar à marcação de uma falta, que deve ser justificada nos termos da
legislação aplicável, por cada período igual ou inferior à duração média
diária do trabalho.
4. Relativamente aos funcionários e agentes portadores de deficiência, o
excesso ou débito de horas apurado no final de cada um dos períodos de
aferição pode ser transportado para o período imediatamente seguinte e
nele compensado, desde que não ultrapasse o limite de cinco e dez horas,
respectivamente, para a quinzena e para o mês.
5. Para efeitos do disposto no n.º 3, a duração média do trabalho é de sete
horas e, nos serviços com funcionamento ao sábado de manhã, a que
resultar do respectivo regulamento.
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6. As faltas a que se refere o n.º 3 são reportadas ao último dia ou dias do
período de aferição a que o débito respeita.
Artigo 17.º - Horário rígido
1. Horário rígido é aquele que, exigindo o cumprimento da duração semanal
do trabalho, se reparte por dois períodos diários, com horas de entrada e
de saída fixas idênticas, separados por um intervalo de descanso.
2. O horário rígido é o seguinte:
a) Serviços de regime de funcionamento comum que encerram ao
sábado:
Período da manhã - das 9 horas às 12 horas e 30 minutos;
Período da tarde - das 14 horas às 17 horas e 30 minutos;
b) Serviços de regime de funcionamento especial que funcionam ao
sábado de manhã:
Período da manhã - das 9 horas e 30 minutos às 12 horas e 30 minutos
de segunda-feira a sexta-feira, e até às 12 horas aos sábados;
Período da tarde - das 14 horas às 17 horas e 30 minutos de segunda-feira a sexta-feira.
3. A adopção do horário rígido não prejudica o estabelecido no n.º 3 do
artigo 13.º
Artigo 18.º - Horários desfasados
Horários desfasados são aqueles que, embora mantendo inalterado o período
normal de trabalho diário, permitem estabelecer, serviço a serviço ou para
determinado grupo ou grupos de pessoal, e sem possibilidade de opção,
horas fixas diferentes de entrada e de saída.
Artigo 19.º - Jornada contínua
1. A jornada contínua consiste na prestação ininterrupta de trabalho, salvo
um período de descanso nunca superior a trinta minutos, que, para todos
os efeitos, se considera tempo de trabalho.
2. A jornada contínua deve ocupar, predominantemente, um dos períodos
do dia e determinar uma redução do período normal de trabalho diário
nunca superior a uma hora, a fixar na regulamentação a que se refere o
n.º 2 do artigo 6.º.
3. A jornada contínua pode ser adoptada nos casos previstos no artigo 22.º
e em casos excepcionais devidamente fundamentados.
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Artigo 20.º - Trabalho por turnos
1. O trabalho por turnos é aquele em que, por necessidade do regular e
normal funcionamento do serviço, há lugar à prestação de trabalho em
pelo menos dois períodos diários e sucessivos, sendo cada um de duração
não inferior à duração média diária do trabalho.
2. A prestação de trabalho por turnos deve obedecer às seguintes regras:
a) Os turnos são rotativos, estando o respectivo pessoal sujeito à sua
variação regular;
b) Nos serviços de funcionamento permanente não podem ser prestados
mais de seis dias consecutivos de trabalho;
c) As interrupções a observar em cada turno devem obedecer ao princípio
de que não podem ser prestadas mais de cinco horas de trabalho
consecutivo;
d) As interrupções destinadas a repouso ou refeição, quando não
superiores a 30 minutos, consideram-se incluídas no período de
trabalho;
e) O dia de descanso semanal deve coincidir com o domingo, pelo menos
uma vez em cada período de quatro semanas;
f) Salvo casos excepcionais, como tal reconhecidos pelo dirigente do
serviço e aceites pelo interessado, a mudança de turno só pode ocorrer
após o dia de descanso.
Artigo 21.º - Subsídio de turno
1. O pessoal em regime de trabalho por turnos, desde que um dos turnos
seja total ou parcialmente coincidente com o período nocturno, tem
direito a um subsídio correspondente a um acréscimo de remuneração.
2. O montante do subsídio de turno é variável em função do número de
turnos adoptados, bem como do carácter permanente ou não do
funcionamento do serviço.
3. As percentagens fixadas para o subsídio de turno incluem a
remuneração devida por trabalho nocturno.
4. A prestação de trabalho em regime de turnos confere direito a atribuição
de um subsídio correspondente a um acréscimo de remuneração
calculada sobre o vencimento fixado no índice remuneratório da
categoria onde o trabalhador estiver posicionado de acordo com as
seguintes percentagens:
a) A 22% quando o regime de turnos for permanente, total ou parcial;
b) A 20% quando o regime de turnos for semanal prolongado, total
ou parcial;
c) A 15% quando o regime de turnos for semanal total ou parcial.
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5. As percentagens de acréscimo de remuneração referidas no número
anterior são estabelecidas no regulamento interno a que se refere o
n.º 2 do artigo 6.º tendo em conta o regime de turnos.
6. O regime de turnos será permanente quando o trabalho for prestado
em todos os sete dias da semana, semanal prolongado quando for
prestado em todos os cinco dias úteis e no sábado ou domingo e
semanal quando for prestado apenas de segunda-feira a sexta-feira.
7. O regime de turnos será total quando for prestado em, pelos menos,
três períodos de trabalho diário e parcial quando for prestado apenas
em dois períodos.
8. A percepção do subsídio de turno não afasta a remuneração por
trabalho extraordinário e em dias de descanso semanal ou
complementar, nos termos da lei geral, sempre que haja necessidade
de prolongar o período de trabalho.
9. Só há lugar a subsídio de turno enquanto for devido o vencimento de
exercício.
10. O subsídio de um turno está sujeito ao desconto da quota legal para a
Caixa Geral de Aposentações e intervém no cálculo da pensão de
aposentação pela forma prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 47.º do
Estatuto da Aposentação.
Artigo 22.º - Horários específicos
1. Os dirigentes dos serviços devem fixar aos trabalhadores-estudantes, nos
termos da Lei n.º 116/97, de 4 de Novembro, horários de trabalho
adequados à frequência das aulas e às inerentes deslocações para os
respectivos estabelecimentos de ensino.
2. De igual modo, aos funcionários e agentes com descendentes ou afins
na linha recta descendente, adoptandos ou adoptados a cargo, com idade
inferior a 12 anos ou que sejam portadores de deficiência e se encontrem
em alguma das situações previstas no artigo 5.º do Decreto-Lei
n.º 170/80, de 29 de Maio, devem ser fixados, nos termos do artigo 15.º
da Lei n.º 4/84, de 5 de Abril, alterada pela Lei n.º 17/95, de 9 de Junho,
pelo Decreto-Lei n.º 194/96, de 16 de Outubro, e pela Lei n.º 102/97, de
13 de Setembro, horários de trabalho ajustados, na medida do possível,
ao acompanhamento dos mesmos.
3. No interesse dos funcionários e agentes, podem ainda ser fixados horários
específicos sempre que outras circunstâncias relevantes, devidamente
fundamentadas, o justifiquem.
4. Os horários referidos nos números anteriores são fixados pelos dirigentes
dos serviços, a requerimento dos interessados, e podem incluir, para além
da jornada contínua, regimes de flexibilidade mais amplos, sem prejuízo
da observância do disposto no artigo 13.º.
Decreto-Lei n.º 259/98
5. Podem ainda ser fixados outros horários específicos sempre que
circunstâncias relevantes relacionadas com a natureza das actividades
desenvolvidas, devidamente fundamentadas e sujeitas a consulta prévia
dos funcionários e agentes, através das suas organizações representativas,
o justifiquem.
SECÇÃO III - Não sujeição a horário de trabalho e isenção de horário
de trabalho
Artigo 23.º Não sujeição a horário de trabalho
1. Entende-se por não sujeição a horário de trabalho a prestação de trabalho
não sujeita ao cumprimento de qualquer das modalidades de horário
previstas no presente diploma, nem à observância do dever geral de
assiduidade e de cumprimento da duração semanal de trabalho.
2. A adopção de qualquer regime de prestação de trabalho não sujeita a
horário obedece às seguintes regras:
a) Concordância expressa do funcionário ou agente relativamente às
tarefas e aos prazos da sua realização;
b) Destinar-se à realização de tarefas constantes do plano de actividades
do serviço, desde que calendarizadas, e cuja execução esteja atribuída
ao funcionário não sujeito a horário;
c) Fixação de um prazo certo para a realização da tarefa a executar, que
não eleve exceder o limite máximo de 10 dias úteis;
d) Não autorização ao mesmo funcionário mais do que uma vez por
trimestre.
3. O não cumprimento da tarefa no prazo acordado, sem motivos
justificados, impede o funcionário ou agente de utilizar este regime
durante o prazo de um ano a contar da data do incumprimento.
4. A não sujeição a horário de trabalho não dispensa o contacto regular do
funcionário com o serviço, nem a sua presença no local do trabalho,
sempre que tal se mostre necessário.
Artigo 24.º - Isenção de horário de trabalho
1. Gozam da isenção de horário de trabalho o pessoal dirigente, bem como
os chefes de repartição e de secção e o pessoal de categorias legalmente
equiparadas, bem como o pessoal cujas funções não conferem direito a
trabalho extraordinário.
2. A isenção de horário não dispensa a observância do dever geral de
assiduidade, nem o cumprimento da duração semanal de trabalho
legalmente estabelecida.
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CAPÍTULO IV
SECÇÃO I - Trabalho extraordinário
Trabalho
extraordinário,
nocturno, em dias
de descanso e em
feriados
Artigo 25.º - Noção
1. Considera-se extraordinário o trabalho que for prestado:
a) Fora do período normal de trabalho diário;
b) Nos casos de horário flexível, para além do número de horas a que o
trabalhador se encontra obrigado em cada um dos períodos de aferição
ou fora do período de funcionamento normal do serviço.
2. Não há lugar a trabalho extraordinário no regime de isenção de horário e
no regime de não sujeição a horário de trabalho.
Artigo 26.º - Prestação de trabalho extraordinário
1. Só é admitida a prestação de trabalho extraordinário quando as
necessidades do serviço imperiosamente o exigirem, em virtude da
acumulação anormal ou imprevista de trabalho ou da urgência na
realização de tarefas especiais não constantes do plano de actividades e,
ainda, em situações que resultem de imposição legal.
2. Salvo o disposto no número seguinte, os funcionários e agentes não
podem recusar-se ao cumprimento de trabalho extraordinário.
3. Não são obrigados à prestação de trabalho extraordinário os funcionários
ou agentes que:
a) Sejam portadores de deficiência;
b) Estejam em situação de gravidez;
c) Tenham à sua guarda descendentes ou afins na linha recta, adoptandos
ou adoptados de idade inferior a 12 anos ou que, sendo portadores
de deficiência, careçam de acompanhamento dos progenitores;
d) Gozem do estatuto de trabalhador-estudante;
e) Invoquem motivos atendíveis.
Artigo 27.º - Limites ao trabalho extraordinário
1. O trabalho extraordinário não pode exceder duas horas por dia, nem
ultrapassar cento e vinte horas por ano.
2. A prestação de trabalho extraordinário não pode determinar um período
de trabalho diário superior a nove horas.
3. Os limites fixados nos números anteriores podem, no entanto, ser
ultrapassados:
a) Em casos especiais, regulados em diploma próprio, a negociar com as
associações sindicais;
Decreto-Lei n.º 259/98
b) Quando se trate de motoristas, telefonistas e outro pessoal auxiliar
que seja indispensável manter ao serviço;
c) Quando se trate de pessoal administrativo e auxiliar que preste serviço
nos gabinetes dos membros do Governo ou equiparados e de pessoal
da Presidência da República destacado para, normal ou eventualmente,
prestar apoio ao Gabinete do Presidente da República;
d) Em circunstâncias excepcionais e delimitadas no tempo, mediante
autorização do membro do Governo competente ou, quando esta
não for possível, mediante confirmação da mesma entidade, a proferir
nos 15 dias posteriores à ocorrência.
4. Nos casos das alíneas b) e d) a não oposição dos trabalhadores vale como
assentimento à prestação do trabalho.
5. Na administração local, os limites fixados nos n.ºs 1 e 2 do presente
artigo podem ser ultrapassados quando se trate de pessoal administrativo
ou auxiliar que preste apoio às reuniões ou sessões dos órgãos autárquicos,
bem como motoristas, telefonistas e outro pessoal auxiliar ou operário,
cuja manutenção em serviço seja expressamente fundamentada e
reconhecida como indispensável.
Artigo 28.º - Compensação do trabalho extraordinário
1. As horas extraordinárias são compensadas, de acordo com a opção do
funcionário ou agente, por um dos seguintes sistemas:
a) Dedução posterior no período normal de trabalho, conforme as
disponibilidades de serviço, a efectuar dentro do ano civil em que o
trabalho foi prestado, acrescida de 25% ou de 50%, respectivamente,
nos casos de trabalho extraordinário diurno e nocturno;
b) Acréscimo na retribuição horária, com as seguintes percentagens: 25%
para a primeira hora de trabalho extraordinário diurno, 50% para as
horas subsequentes de trabalho extraordinário diurno, 60% para a
primeira hora de trabalho extraordinário nocturno e 90% para as
restantes horas de trabalho extraordinário nocturno.
2. Na remuneração por trabalho extraordinário só são de considerar, em
cada dia, períodos mínimos de meia hora, sendo sempre remunerados
os períodos de duração inferior como correspondentes a meia hora.
3. Quando o trabalho extraordinário diurno se prolongar para além das 20
horas, a meia hora que abranger o período de trabalho diurno e nocturno
é remunerada como extraordinária diurna ou nocturna, consoante não
haja ou haja efectiva prestação de trabalho para além daquele limite
horário, conferindo, ainda, direito ao subsídio de refeição.
4. As percentagens referidas na alínea b) do n.º 1 para o trabalho
extraordinário nocturno são mantidas quando, no prosseguimento
daquele, se transitar para trabalho extraordinário diurno.
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5. Nos primeiros oito dias do mês seguinte àquele em que foi realizado
trabalho extraordinário, o funcionário ou agente deve comunicar aos
serviços o sistema por que tenha optado.
Artigo 29.º - Compensação por dedução do período normal de
trabalho
1. O sistema previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior pode revestir
uma das seguintes formas:
a) Dispensa, até ao limite de um dia de trabalho por semana;
b) Acréscimo do período de férias no mesmo ano ou no ano seguinte
até ao limite máximo de cinco dias úteis seguidos.
2. Nos horários flexíveis, a compensação das horas extraordinárias faz-se,
em regra, por dedução no período normal de trabalho, salvo quando se
mostrar inviável por razões de exclusiva conveniência do serviço e nos
casos previstos na alínea d) do n.º 3 do artigo 27.º, em que o pessoal
mantém o direito de opção.
3. As horas extraordinárias que não possam ser compensadas nos termos
dos números anteriores são remuneradas de acordo com o disposto na
alínea b) do, n.º 1 do artigo anterior.
Artigo 30.º - Limites remuneratórios
1. Os funcionários e agentes não podem, em cada mês, receber por trabalho
extraordinário mais do que um terço do índice remuneratório respectivo,
pelo que não pode ser exigida a sua realização quando implique a
ultrapassagem desse limite.
2. Exceptua-se do disposto no número anterior o pessoal referido na alínea
c) do n.º 3 do artigo 27.º, bem como os motoristas afectos a directores-gerais ou a pessoal de cargos equiparados, os quais podem receber pelo
trabalho extraordinário realizado até 60% do vencimento do índice
remuneratório respectivo.
3. O disposto nos números anteriores não prejudica os limites fixados para
o pessoal operário e auxiliar afecto às residências oficiais do Presidente
da República e do Primeiro-Ministro, nos termos da legislação em vigor.
4. Na administração local podem, ser abonadas importâncias até 60% do
respectivo índice remuneratório do pessoal administrativo ou auxiliar que
preste apoio a reuniões ou sessões dos órgãos autárquicos, bem como
aos motoristas, telefonistas e outro pessoal auxiliar, afectos, por
deliberação expressa, ao serviço da presidência dos órgãos executivos e
ainda aos motoristas afectos a pessoal de cargos equiparados a director-geral.
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Artigo 31.º - Registo de horas extraordinárias
Os serviços devem preencher e enviar mensalmente à Direcção-Geral do
Orçamento em impresso próprio a indicação do número de horas
extraordinárias por cada funcionário ou agente, o respectivo fundamento
legal e as correspondentes remunerações.
SECÇÃO II - Trabalho nocturno
Artigo 32.º - Noção e regime
1. Considera-se trabalho nocturno o prestado entre as 20 horas de um dia
e as 7 horas do dia seguinte.
2. O trabalho nocturno pode ser normal ou extraordinário.
3. A retribuição do trabalho normal nocturno é calculada através da
multiplicação do valor da hora normal de trabalho pelo coeficiente 1,25.
4. O disposto no número anterior não se aplica às categorias cujas funções,
pela sua natureza, só possam ser exercidas em período
predominantemente nocturno, salvo casos excepcionais devidamente
autorizados pelos Ministros da tutela, das Finanças e do membro do
Governo responsável pela Administração Pública, mediante despacho
conjunto.
SECÇÃO III - Trabalho em dias de descanso semanal, de descanso
complementar e em feriados
Artigo 33.º - Regime
1. A prestação de trabalho em dia de descanso semanal, de descanso
complementar e em feriado pode ter lugar nos casos e nos termos
previstos no artigo 26.º, não podendo ultrapassar a duração normal de
trabalho diário.
2. O trabalho prestado em dia de descanso semanal é compensado por um
acréscimo de remuneração calculado através da multiplicação do valor
da hora normal de trabalho pelo coeficiente 2 e confere ainda direito a
um dia completo de descanso na semana de trabalho seguinte.
3. A prestação de trabalho em dia de descanso complementar ou feriado é
compensada apenas pelo acréscimo de remuneração referido no número
anterior.
4. Nos casos em que o feriado recaia em dia de descanso semanal aplica-se
na íntegra o regime previsto no n.º 2.
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5. O regime previsto nos n.os 2, 3 e 4 pode ser aplicado ao pessoal dirigente
e de chefia, desde que a prestação de trabalho seja autorizada pelo
membro do Governo competente.
6. O disposto no n.º 1 é aplicável aos funcionários e agentes que se deslocam
ao estrangeiro em representação do Estado Português.
7. A prestação de trabalho efectuada nos termos do número anterior confere
o direito a um dia completo de descanso, a gozar de acordo com a
conveniência do serviço.
SECÇÃO IV - Autorização e responsabilização
Artigo 34.º - Autorização
1. A prestação de trabalho extraordinário e em dia de descanso semanal,
descanso complementar e feriado deve ser previamente autorizada pelo
dirigente do respectivo serviço ou organismo ou pelas entidades que
superintendem nos gabinetes a que alude a alínea c) do n.º 3 do artigo
27.º.
2. Exceptuam-se do disposto no número anterior, quanto aos feriados, os
serviços que, por força da actividade exercida, laborem normalmente
nesse dia.
3. Os funcionários e agentes interessados devem ser informados, salvo casos
excepcionais, com a antecedência de quarenta e oito horas, da
necessidade de prestarem trabalho extraordinário e em dia de descanso
semanal ou complementar e em feriado.
Artigo 35.º - Responsabilização
1. Os dirigentes devem limitar ao estritamente indispensável a autorização
de trabalho nas modalidades previstas no presente capítulo.
2. Os funcionários e agentes que tenham recebido indevidamente quaisquer
abonos são obrigados à sua reposição, pela qual ficam solidariamente
responsáveis os dirigentes des respectivos serviços.
CAPÍTULO V
Artigo 36.º - Cálculo da remuneração horária normal
Disposições finais
e transitórias
A remuneração horária é calculada através da fórmula (Rx12) /(52xN), sendo
R o vencimento mensal auferido e N o número de horas correspondente à
normal duração semanal do trabalho.
Decreto-Lei n.º 259/98
Artigo 37.º - Pessoal dirigente
1. As referências feitas no presente diploma aos dirigentes máximos dos
serviços entendem-se reportadas aos secretários-gerais, directores-gerais
e pessoal de cargos equiparados, bem como ao pessoal dirigente
directamente dependente de qualquer membro do Governo.
2. As competências atribuídas no presente diploma aos dirigentes máximos
dos serviços são, na administração local, cometidas:
a) Ao presidente da câmara municipal - nas câmaras municipais;
b) Ao presidente do conselho de administração - nas associações de
municípios e nos serviços municipalizados;
c) À junta de freguesia - nas juntas de freguesia;
d) Ao presidente da mesa da assembleia distrital - nas assembleias
distritais.
Artigo 38.º - Pessoal docente, saúde e justiça
Mantêm-se em vigor os regimes de trabalho e condições da sua prestação
fixados em legislação especial para o pessoal docente e da saúde e, bem
assim, para o sector da justiça, sem prejuízo do previsto artigo 15.º.
Artigo 39.º - Pessoal dos grupos operário e auxiliar
1. Para o pessoal dos grupos operário e auxiliar, a duração semanal do
trabalho é, transitoriamente, a seguinte:
a) Em 1998: trinta e sete horas semanais;
b) Em 1999: trinta e seis horas semanais.
2. A duração semanal de trabalho referida no número anterior produz
efeitos a partir do dia 1 de Janeiro de cada ano.
3. O disposto no n.º 1 não prejudica a existência de regimes de duração
semanal de trabalho inferiores já estabelecidos.
4. O limite máximo do período normal de trabalho diário é, em função da
duração semanal, o constante do anexo A ao presente diploma, que
dele faz parte integrante.
5. O horário rígido a que se refere o artigo 17.º do presente diploma é,
nos anos de 1997 a 1999, o que consta dos anexos B e C ao presente
diploma, que dele fazem parte integrante, consoante se trate de serviços
de regime de funcionamento normal que encerrem ao sábado ou de
serviços de regime de funcionamento especial que funcionam ao sábado
de manhã, respectivamente.
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Decreto-Lei n.º 259/98
6. Transitoriamente até à generalização da duração de trabalho de trinta
e cinco horas semanais, no caso de horários flexíveis devem seguir-se
as seguintes regras:
a) É obrigatória a previsão das plataformas fixas da parte da manhã e
da parte da tarde, as quais não podem ter, no seu conjunto, duração
inferior a quatro horas, no caso de horários até trinta e sete horas, e
de cinco horas, nos restantes casos;
b) Não podem ser prestados, por dia, mais de nove horas de trabalho,
no caso de horários até trinta e sete horas, ou de dez horas, nos
restantes casos.
7. Para efeitos do disposto no n.º 3 do artigo 16.º, a duração média de
trabalho é de sete ou oito horas para o pessoal abrangido por uma
duração semanal inferior a trinta e sete horas, ou superior a este limite,
respectivamente, e ainda a que resultar do respectivo regulamento,
nos serviços com funcionamento ao sábado de manhã.
8. Em caso de jornada contínua, até à generalização da duração de trabalho
de trinta e cinco horas semanais, a redução referida no n.º 2 do artigo
19.º do presente diploma não pode ser superior a uma hora ou a uma
hora e trinta minutos por dia, conforme a duração semanal de trabalho
seja, respectivamente, inferior, ou não, a trinta e sete horas.
9. Ao pessoal a quem, nos termos do artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 159/
96, de 4 de Setembro, foi concedido um crédito de não trabalho de
três dias é mantido o direito ao subsídio de refeição durante o uso
deste crédito.
10. O crédito de não trabalho de três dias, referido no número anterior,
que não foi usado até ao termo do ano civil de 1996, por razões de
conveniência de serviço ou interesse relevante do próprio trabalhador,
deve ser gozado durante o ano civil de 1997.
11. Os créditos de não trabalho que não foram usados até ao termo do
ano civil de 1996 podem ser gozados seguida ou interpoladamente,
repartidos por meios-dias ou não, e ser associados ao gozo de férias ou
a um período de faltas, de qualquer natureza, mantendo-se, também,
o direito ao subsídio de refeição.
Artigo 40.º - Revisão do regime de trabalho a meio tempo e da não
sujeição a horário de trabalho
Os regimes de trabalho a meio tempo e da não sujeição a horário de trabalho,
constantes dos artigos 8.º e 23.º, serão obrigatoriamente revistos no prazo
máximo de dois anos a contar da data da entrada em vigor do presente
diploma.
Decreto-Lei n.º 259/98
Artigo 41.º - Legislação revogada
É revogada a Lei n.º 17/89, de 5 de Julho, e o Decreto-Lei n.º 167/80, de
29 de Maio, o Decreto-Lei n.º 235/81, de 6 de Agosto, o Decreto-Lei
n.º 187/88, de 27 de Maio, o Decreto-Lei n.º 263/91, de 26 de Julho, e o
Decreto-Lei n.º 159/96, de 4 de Setembro.
Artigo 42.º - Entrada em vigor
O presente diploma entra em vigor no dia seguinte ao da sua publicação.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 14 de Maio de 1998. - António
Manuel de Oliveira Guterres - José Veiga Simão - António Luciano Pacheco
de Sousa Franco - Jorge Paulo Sacadura Almeida Coelho - Jorge Paulo
Sacadura Almeida Coelho - João Cardona Gomes Cravinho - José Eduardo
Vera Cruz Jardim - Joaquim Augusto Nunes de Pina Moura - Fernando Manuel
Van-Zeller Gomes da Silva - Eduardo Carrega Marçal Grilo - Maria de Belém
Roseira Martins Coelho Henriques de Pina - Eduardo Luís Barreto Ferro
Rodrigues - Elisa Maria da Costa Guimarães Ferreira - Manuel Maria Ferreira
Carrilho - José Mariano Rebelo Pires Gago - José Sócrates Carvalho Pinto de
Sousa.
Promulgado em 31 de Julho de 1998.
Publique-se.
O Presidente da República, JORGE SAMPAIO.
Referendado em 6 de Agosto de 1998.
O Primeiro-Ministro, António Manuel de Oliveira Guterres.
ANEXO A
Limite máximo do período normal de trabalho diário
Dias da Semana
Ano
Duração
semanal
Segunda-Feira
Terça-Feira
Quarta-Feira
Quinta-Feira
Sexta-Feira
1997
38
8
8
8
7
7´
1998
37
8
8
7
7
7
1999
36
8
7
7
7
7
189
190
Decreto-Lei n.º 259/98
ANEXO B
ANEXO C
Dias
da
Semana
1997
1998
Segunda-Feira
8.30-12.30
8.30-12.30
9-12.30
14-18
14-18
14-18
Terça-Feira
8.30-12.30
9-12.30
9-12.30
14-18
14-18
14-18
Quarta-Feira
9-12.30
9-12.30
9-12.30
14-18
14-18
14-17.30
Quinta-Feira
9-12.30
9-12.30
9-12.30
14-18
14-17.30
14-17.30
Sexta-Feira
9-12.30
9-12.30
9-12.30
14-17.30
14-17.30
14-17.30
Dias
da
Semana
Manhã
Tarde
1999
1997
Manhã
1997
1998
1999
Tarde
1998
1999
1997
1998
1999
14-17.30
Segunda-Feira
9-12.30
9.30-12.30
9.30-12.30
14-17.30
14-17.30
Terça-Feira
9-12.30
9.30-12.30
9.30-12.30
14-17.30
14-17.30
14-17.30
Quarta-Feira
9-12.30
9-12.30
9-12.30
14-17.30
14-17.30
14-17.30
Quinta-Feira
9-12.30
9-12.30
9-12.30
14-17.30
14-17.30
14-17.30
Sexta-Feira
9-12.30
9-12.30
9-12.30
14-17.30
14-17.30
14-17.30
9-12
9-12
9-12
–
–
–
Sábado
191
Apoio Científico:
Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra
Faculdade de Direito da Universidade do Porto
Instituto Superior de Polícia Judiciária e Ciências
Criminais
Ordem dos Médicos - Secção Regional Norte
Polícia Judiciária
Patrocínios:
Agência Catorze
Caixa Geral de Depósitos
Companhia de Seguros Açoreana
Fastrent
Livraria Almedina
192
As especificidades e as exigências da prestação de trabalho na Investigação Criminal
Dr. Ferreira Leite
Director Nacional Adjunto da Polícia Judiciária (Director da DCCB)
Medicina do trabalho na Investigação Criminal
Dr. Carlos Sobral
Médico de Medicina do Trabalho indicado pela Ordem dos Médicos
Alterações do sono e alterações dos ritmos biológicos
Prof. Dr. A Martins da Silva
Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar, do Porto
O regime de trabalho na investigação criminal - Princípios de Direito Internacional
Prof. Dr. Jorge Leite
da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra
Regime de trabalho na função pública portuguesa - Limites às normas especiais que o excepcionem:
o art. 79.º da LOPJ
Prof. Dr. Liberal Fernandes
da Faculdade Direito da Universidade do Porto
Factores stressantes na Investigação Criminal:
Dr.ª Cristina Soeiro
Psicóloga, do Instituto Superior de Polícia Judiciária e Ciências Criminais
A realidade laboral nas polícias europeias
Gerard Greneron
Comandante de Polícia e Secretário-geral do Conselho Europeu de Sindicatos de Polícia (CESP)
Adaptação do Trabalho na Investigação Criminal à Lei e às suas especificidades - Soluções possíveis
Dr. A. Jorge Braga
Jurista especializado em Direito do Trabalho, na área da Administração Pública
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