CONSULTA PÚBLICA DA CMVM Nº 1/2011 PROJECTO DE ENTENDIMENTO SOBRE A APLICAÇÃO DO ART. 7º DO CÓDIGO DOS VALORES MOBILIÁRIOS À APRESENTAÇÃO E DIVULGAÇÃO DE INFORMAÇÃO FINANCEIRA DE FORMA SINTÉTICA 1 – ÂMBITO Este entendimento é aplicável a todos os tipos de informação de natureza financeira que seja divulgada publicamente pelas entidades emitentes de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado, em antecipação ou complemento aos documentos de prestação de contas elaborados nos termos legais. São assim abrangidos, os comunicados, as apresentações de resultados ou qualquer outra forma de divulgação de informação contendo indicadores económicos ou financeiros, muitas vezes disseminados antes da disponibilização completa dos documentos de prestação de contas. Os investidores muitas vezes acedem a estas informações sintéticas como primeira fonte de divulgação de resultados da sociedade. Estas informações, igualmente divulgadas como informação privilegiada, são susceptíveis de influenciar as perspectivas dos investidores sobre o valor dos instrumentos financeiros admitidos à negociação e, consequentemente, influenciar as suas decisões de investimento. Não se encontrando ainda no momento da divulgação dessas comunicações, disponibilizado ao mercado o conjunto dos documentos de prestação de contas, de forma integral, incluindo o relatório de auditoria, os investidores apenas poderão aferir da posição financeira da entidade e da sua performance através dos dados sintéticos que são apresentados pela empresa. Em alguns casos, mesmo quando a sociedade disponibiliza os documentos de prestação de contas, é feita igualmente uma apresentação sintética destinada aos investidores e à imprensa, onde se confere maior destaque a determinados indicadores financeiros. Alguns desses indicadores são extraídos directamente das demonstrações financeiras, outros são calculados com base em rubricas dessas demonstrações financeiras. Esses indicadores são muitas vezes apresentados com terminologia não definida nas IFRS, como seja o caso de “operating earnings”, “cash earnings”, “EBITDA”, “produto bancário” ou “margem financeira”. Também são divulgados indicadores, tais como o “cash-flow operacional”, definidos de forma diversa da que resulta, por exemplo, da aplicação da IAS 7, que regula a Demonstração de Fluxos de Caixa e os fluxos de caixa da actividade operacional, omitindo-se o indicador que, efectivamente, resulta dessa Demonstração. 2 – OBJECTIVOS E ENQUADRAMENTO 1/5 O artigo 7º do Código dos Valores Mobiliários (Cód.VM) estabelece que a informação prestada pelas entidades emitentes deve ser completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita. A informação que permite aos investidores uma correcta aferição da posição financeira das entidades emitentes, do seu desempenho e da geração de fluxos de caixa encontra-se de forma claramente definida e regulada pelas IFRS, assumindo a forma de um conjunto completo de documentos, incluindo a opinião do auditor e o parecer do órgão de fiscalização. Em regra, a divulgação dessa informação, de modo completo, é condição necessária para satisfazer os critérios do artigo 7º Cód.VM referentes à qualidade da informação. A preparação desse conjunto completo de informação envolve procedimentos extensos com calendários definidos internamente pelas entidades emitentes. Em alguns casos, tratando-se de informação sensível que vai sendo conhecida em termos definitivos pela entidade emitente de modo faseado, pode surgir a necessidade de se proceder a divulgações autónomas, ao mercado, antes de estar finalizado o conjunto completo dos documentos de prestação e contas previstos na lei. Os emitentes podem proporcionar aos investidores informação complementar ou antecipada, desde que seja adequadamente apresentada, de modo a permitir àqueles o conhecimento do desempenho da empresa e da sua estratégia de forma tempestiva. No entanto, se essa informação não satisfizer os critérios de qualidade previstos no artigo 7º do Cód.VM, poderá ser mal interpretada e colocar em causa o normal funcionamento do mercado. De facto, e a título de exemplo, refira-se que, não raras vezes, a informação é apresentada com auxílio de gráficos ou quadros, que destacam as variações positivas dos referidos indicadores e não dão o mesmo relevo a outros em que se tenha verificado tendência inversa. É, por isso, objectivo deste entendimento melhorar a qualidade da divulgação das informações financeiras sintéticas. Os comunicados ou apresentações que contêm essa informação não se encontram subordinados a conteúdos regulamentados e procuram sintetizar indicadores financeiros com recurso a uma linguagem adaptada ao que as entidades emitentes entendem ser o respectivo público-alvo. Essa informação é, porém, retirada da contabilidade e dos documentos de prestação de contas, que se regem por conceitos e definições regulamentadas pelas IFRS. A título de exemplo refirase a necessidade de que sejam divulgadas informações específicas e seja realizada a reexpressão de comparativos, quando se verifiquem alterações de políticas contabilísticas ou de erros (IAS 8), de forma a que os destinatários dos documentos possam ter bases comparáveis de evolução. Da mesma forma se prevê a divulgação de informação por segmentos (IFRS 8) em que se exige, para cada segmento, a divulgação de determinadas rubricas de performance (IFRS 8.23), como sejam as “depreciações e amortizações” e “gasto/rendimento de impostos sobre rendimento” e onde se refere o dever de, por exemplo, proceder à separação entre “rédito de juros” e “gasto de juros” para cada segmento reportado. 2/5 Nos comunicados ou apresentações são divulgados indicadores sobre segmentos de actividade (por exemplo, o EBITDA), não sendo, todavia, em alguns casos, perfeitamente claro para o leitor de que forma foi identificado o referido “gasto de juro” implícito no indicador, ou de que modo foram apuradas outras componentes que integram a sua composição. A utilização de indicadores na divulgação sintética de informação que não correspondem a um conceito adoptado no âmbito das IFRS, pode induzir o público em erro e deve, por isso, em regra, ser evitada. Também quando a entidade altera critérios contabilísticos sem que isso seja evidenciado na divulgação da informação sintética, a informação torna-se dificilmente comparável. O mesmo se diga da variação, de ano para ano, do destaque dado a determinados indicadores financeiros, que deixa na sombra outros igualmente importantes e que constam dos documentos de prestação de contas, ou quando se apresentam os fluxos de caixa que não decorrem directamente do documento regulado “Demonstração dos Fluxos de Caixa”. Algumas entidades de referência já se pronunciaram sobre este tema, definindo-o mesmo, como muito relevante. A título de exemplo, a OICV/ IOSCO, já em 2002 realçava a importância da existência de um quadro orientador para uso de medidas de mensuração não GAAP na informação financeira fornecida ao mercado (IOSCO Caucionary Statement Regarding Non GAAP Results Measures disponível em http://www.iosco.org/news/pdf/IOSCONEWS4.pdf). Também o CESR emitiu em 2005 uma recomendação sobre a apresentação de Medidas Alternativas de Desempenho, muitas vezes definidas como Non-GAAP Measures (CESR Recommendation on Alternative Performance Measures – CESR/05-178b) disponível em: http://www.esma.europa.eu/index.php?page=document_details&id=3601&from_id=13 A CMVM adoptou estas recomendações e tem vindo quer a divulga-las quer, no caso das medidas do CESR, a incluí-las e a reitera-las nas circulares que remete anualmente às entidades emitentes. 3 – ENTENDIMENTO De forma a assegurar que toda a informação antecipada ou complementar atrás referida, divulgada pelas entidades emitentes seja completa, verdadeira, actual, clara, objectiva e lícita e, nessa medida, conforme ao artigo 7º do Código dos Valores Mobiliários, as entidades emitentes devem atender ao seguinte: (a) Terminologia A terminologia usada, quando corresponda a conceitos regulados, deve reflectir de modo rigoroso o conteúdo desses conceitos. Tratando-se de conceitos não regulados, estes devem ser clara e objectivamente definidos e a sua definição deve constar dos documentos divulgados. Quando as IFRS definem determinados conceitos, estes não podem ser substituídos por outros ou reformulados sem que tal seja claramente destacado e devidamente justificado. 3/5 (b) Fórmulas de cálculo Os emitentes deverão definir e divulgar as fórmulas de cálculo utilizadas (isto é, definir e divulgar as componentes incluídas no seu cálculo e a forma como este se processa), sendo que, quando aplicável, devem ser divulgados todos os pressupostos utilizados nesses cálculos. (c) Fontes de informação Deverá ser referido se a informação apresentada deriva das demonstrações financeiras elaboradas de acordo com as IFRS ou de outras fontes. De facto, quando a informação não for preparada com base no normativo contabilístico que é aplicado às demostrações financeiras, deverá ser dada essa informação aos investidores, devendo sempre ser identificadas as fontes de informação e apreciada a sua fiabilidade. (d) Reconciliação Quando sejam utilizados indicadores de performance alternativos ou indicadores compostos com vários elementos, deverá ser divulgada uma reconciliação com as rubricas incluídas nas demonstrações financeiras prestadas de acordo com as IFRS que estiveram na base da sua composição. (e) Características Toda a informação financeira prestada deverá, designadamente quanto à sua compreensibilidade, relevância, comparabilidade e fiabilidade, apresentar nível qualitativo não inferior ao que deriva de informação produzida em plena conformidade com as IFRS. Por forma a garantir a completude da informação, numa apresentação de resultados deverão ser descritos todos os eventos relevantes ocorridos no período de análise, independentemente da natureza positiva ou negativa do seu impacto. (f) Informação Comparativa A entidade emitente deverá igualmente fornecer informação comparativa para outros períodos, que deverão coincidir com os períodos cobertos pelas demonstrações financeiras. Quando seja necessário ajustar os comparativos para que possam ser comparáveis em bases iguais (isto é, a informação histórica não seja produzida em plena conformidade com as IFRS), tal deverá ser acompanhado de uma explicitação do efeito e da forma como foi realizada a sua re-expressão. (g) Consistência A informação deverá ser consistente entre períodos homólogos, para evitar a tomada de decisões pelos investidores baseadas em tendências de evolução pouco fiáveis e distorcidas, sendo que, nas circunstâncias excepcionais em que essa consistência não seja assegurada, a entidade emitente deve explicitá-la e justificá-la. A consistência deverá revelar-se a todos os níveis, nomeadamente: 4/5 • face à informação prestada historicamente, quer em termos do tipo de informação, quer em termos da composição e mensuração dos indicadores. Por exemplo, se a apresentação de resultados de um determinado ano contiver determinados indicadores para analisar a performance financeira da entidade, no ano seguinte a entidade emitente deverá apresentar os mesmos indicadores e manter a sua forma de mensuração; • face à informação apresentada nas demonstrações financeiras. Por exemplo, se na apresentação de resultados constar uma análise por segmentos, esta deverá ser coerente com o reporte por segmentos divulgado nas demonstrações financeiras produzidas ao abrigo da IFRS 8; • face à informação apresentada no próprio documento. Se, por exemplo, na apresentação de resultados for apresentada uma análise por segmentos, os indicadores utilizados para esse efeito terão de ser consistentes, não devendo, para um dos segmentos, apresentar a variação do EBITDA e para outro apresentar a variação dos resultados operacionais ou dos resultados líquidos. (h) Envolvimento do Auditor O emitente deve divulgar se a informação financeira em que se baseia a divulgação foi objecto de opinião do auditor independente e, em caso afirmativo, indicar a natureza de tal revisão e a sua conclusão. 5/5