PARA UM 'MODELO' DE QUALIDADE NAS BIBLIOTECAS ESCOLARES Lino Moreira da Silva (Universidade do Minho) - Trabalho elaborado para a Fundação Calouste Gulbenkian, no âmbito do Projecto Theka, Bibliotecas Escolares. Apresentação Pública em 25 de Fevereiro de 2005. 1 - INTRODUÇÃO Vivemos na era da informação e do conhecimento, deles se fazendo depender o progresso dos indivíduos e da sociedade. É intensa, como nunca, a mobilidade e o relativismo dos saberes (L. M. Silva, 1998). Tal facto exerce um peso enorme nas fontes de informação e de conhecimento, sujeitos a uma constante actualização, para que, pelo seu contributo, os indivíduos e a sociedade se possam manter informados e conhecedores, e desse modo não ponham em risco o seu desenvolvimento. Um papel essencial na informação e no conhecimento cabe às bibliotecas. A todas as bibliotecas: as bibliotecas nacionais, as bibliotecas públicas, as bibliotecas públicas locais/municipais, as bibliotecas especializadas, as bibliotecas infantis/juvenis… as bibliotecas escolares. Elas podem concorrer em muito para a qualidade no ensino, que se não obtém mediante intervenções pontuais (O.C.D.E., 1992, p.11), mas sempre através de esforços organizados. Embora todos os tipos de bibliotecas sejam importantes, um papel especial fica reservado às bibliotecas escolares. Elas participam, antes de mais, das características das bibliotecas em geral. Mas elas são, mais que bibliotecas, no sentido comum do termo, bibliotecas… escolares, bibliotecas sediadas na escola, fazendo parte da escola, servindo os objectivos da escola e de toda a comunidade educativa. Devido a que a escola é, sobretudo, um espaço de formação, as bibliotecas escolares não podem ser senão isso mesmo – espaço de formação, dinamização e trabalho, com ligação profunda ao processo educativo. A biblioteca escolar não surge em oposição aos outros tipos de bibliotecas, antes deve colocar-se em interacção com eles. Entre os seus grandes objectivos está a resposta às situações de ensino-aprendizagem suscitadas pela escola e a preparação dos seus reais ou potenciais leitores (com destaque para os alunos) para a frequência (no presente, mas sobretudo no futuro) de outras bibliotecas, com a consciência de que, com o seu desempenho, se pode ganhar ou perder leitores, que os outros tipos de bibliotecas muito dificilmente poderão recuperar. Dada a importância da biblioteca escolar no presente da escola e no futuro da sociedade (e a realidade das nossas bibliotecas escolares, sobretudo fruto da intervenção do projecto das Redes de Bibliotecas Escolares, tem-se transformado no bom sentido, tornando-se mais exigente), importa preocuparmo-nos com a instituição de um modelo de qualidade que lhe seja aplicável. Sendo necessário trabalhar nesse sentido, e cabendo-nos essa reflexão, propomo-nos reflectir, antes de mais, acerca dos conceitos de modelo e qualidade, e depois acerca das finalidades das bibliotecas escolares, como factores de padronização da qualidade, e de uma proposta de modelo de qualidade para as bibliotecas escolares, através da aplicação de referenciais de qualidade e da avaliação do seu desempenho. 2 - OS CONCEITOS DE 'MODELO' E 'QUALIDADE' Pelo muito que há a esperar delas, é importante que as bibliotecas escolares sejam referidas, a sua existência orientada, os seus objectivos interiorizados, as suas estratégias aferidas, o seu desempenho estudado, os seus resultados avaliados. Faz assim todo o sentido reflectir acerca de "modelos de qualidade de bibliotecas escolares" que permitam orientar a sua instituição e o seu funcionamento, de modo a poderem cada vez mais responder às exigências de fundo que delas são esperadas. Mas falar em "modelos de qualidade de bibliotecas escolares" é um âmbito muito aberto. Dadas as faltas de comunicação a que poderemos estar sujeitos, face ao défice de entendimentos comuns sobre a realidade focalizada, importará, antes de mais, procurar dilucidar, ainda que sucintamente, acerca da expressão "modelo de qualidade", que aqui é posta em destaque. A) MODELO O que entender por 'modelo'? Socorrendo-nos dos dicionários (M. Casteleiro, 2001, p.2500), um 'modelo' é algo que se destina a ser reproduzido por imitação, uma reprodução, uma representação de alguma coisa tomada como exemplo. Porque ser criativo e inovador rejeita modelos, pode-se pôr em causa a necessidade ou não da sua existência. Por um lado, um modelo prende, obriga a que nos cinjamos a determinados critérios. Mas por outro, um modelo orienta, institui padronizações, o que não deixa de ser importante em termos de desenvolvimento da sociedade. Para que seja construtivo, um modelo terá de transmitir orientações, ser dinâmico, estruturado, suficientemente abrangente para que nele possam caber as várias concretizações da mesma realidade. Pelo menos em ciências humanas, nunca será aceitável entender um modelo como um 'molde', mas sempre como uma referência. Quem institui um modelo terá, por isso, de, conhecendo a realidade a que se reporta, dotá-lo de grande flexibilidade, para que ele responda ao maior número de possibilidades. Quem o aplica terá de adaptar essa matriz de referência à situação específica por que é responsável. B) QUALIDADE a) Os termo e conceito de qualidade são insistentemente referidos no mundo de hoje. Todavia, nem sempre todos quantos os aplicam revelam ter verdadeiramente consciência daquilo que é expresso por eles. O conceito de qualidade é um dos mais maltratados no quodiano social (e talvez seja por isso que se falha tanto, relativamente à qualidade, em projectos sociais e políticos, vida de instituições, escolas e empresas). Porque assim é, se justifica que façamos uma breve reflexão sobre o que entender por 'qualidade', de modo a facilitarmos a comunicação nas linhas que se seguem. b) Os termo e conceito de qualidade são sobretudo focados no mundo da economia e do mercado. Daí se têm generalizado para as mais variadas aplicações. Definir qualidade não é fácil, e sobre isso não existe consenso entre todos quantos o procuram fazer. De nossa parte, porque é necessário, nestas matérias, dotarmo-nos de uma linguagem comum, diremos que um sentido funcional a atribuir a qualidade passa pela sua perspectivação em duas vias: - Por um lado, tem qualidade aquilo que melhor responde às exigências de um padrão instituído. - Por outro lado, tem qualidade aquilo que, segundo o ponto de vista de um utilizador, melhor se adequa às finalidades para que se encontra instituído. Quanto melhores forem as características de um produto ou serviço, face a padrões definidos, maior é a sua qualidade . Quanto mais exigente é o utilizador, e mais o produto corresponde, mais qualidade o produto possui (J. M. Juran, 1992, p.9). Deste modo, importa considerarmos os seguintes factores: - O factor de padronização, baseado em finalidades, eficácia, estudos, experiência, inquirições, auscultação, constatação… É objectivo, caminha no sentido de uma visão alargada da realidade. - O Factor de utilização, baseado na perspectiva do utilizador e no seu grau de necessidade e exigência. É subjectivo, apresenta uma visão relativizada da realidade. Ambos os factores são complementares. Se não é suficiente a instituição de um padrão de qualidade, também não basta considerar apenas a satisfação do utilizador. Ambos são interactivos, porque o utilizador forma-se, educa-se, evolui em função do padrão instituído, e o padrão actualiza-se face à realidade, mas também face à evolução do utilizador. É assim que, considerada deste modo, a aferição da qualidade depende do padrão estabelecido para o produto ou serviço e da entidade a quem o produto ou serviço é destinado e por quem ele é recebido. Se tal entidade é mais ou menos exigente ou rigorosa, se ela se fica por uma satisfação elementar das necessidades ou se desce a todo o tipo de pormenores, isso vai influenciar o nível de qualidade. Deste modo, a definição de qualidade de um produto ou serviço é estabelecida pela via objectiva (pelo menos pretende sê-lo), em relação ao padrão instituído, e pela via subjectiva, em relação ao grau de exigência do destinatário que a aprecia. O produto/serviço está entre o padrão e a exigência do utilizador, exercendo estes factores pressões uns sobre os outros, obrigando-se mutuamente a melhorar: o produto responde melhor às necessidades, o utilizador é educado, o padrão adequa-se e actualiza-se. c) Não se pretende, muito longe disso, aproximar a gestão e o funcionamento de uma biblioteca escolar dos de uma empresa. As interferências economicistas nos domínios da biblioteca escolar, como da escola em geral, dão sempre maus resultados. Foi por estar convicta de que assim é que a Unesco definiu, já há alguns anos, que o serviço prestado pelas bibliotecas à comunidade, além de isento de censura e de pressões sociais (Unesco, s/d.), seja gratuito (Unesco, 1976, pp.13-16), na oferta que faz de materiais de informação, conhecimento, formação, ocupação de tempos livres, acompanhando e de certo modo dirigindo a evolução da sociedade. Só que alguma coisa está a mudar nesse domínio. Ainda muito recentemente a Comissão Europeia ameaçou Portugal com sanções pesadas por não ter acabado com o empréstimo gratuito de livros nas bibliotecas e instituições oficiais. Argumentando que o empréstimo gratuito de um livro pode ter efeitos negativos na sua venda (jornal Jornal de Notícias, de 23.12.2004), a Comissão europeia ameaça levar o estado português a tribunal por essa prática. As consequências negativas são evidentes. A leitura pública, no interior de uma comunidade, está directamente relacionada com o desenvolvimento. Ao onerar-se deste modo a leitura pública, está-se a interferir no desenvolvimento do país. Se o pagamento for feito pelos utilizadores, se mesmo com gratuitidade eles vão pouco às bibliotecas, com o serviço pago eles passarão a ir muito menos. Se o pagamento for feito pelo estado, as verbas gastas para o satisfazer serão necessariamente retiradas da satisfação de outras necessidades. Trata-se de uma medida infeliz, que terá de ser revista pela Comissão Europeia. Mas embora a biblioteca escolar não seja uma empresa (o próprio economicismo empresarial pertence mais ao passado que ao presente), tal não significa que ela não possa aprender muitas coisas com a experiência colhida no mundo das empresas, e as aplique à sua estrutura. Uma biblioteca, não se destinando a dar 'lucro', não pode alhearse do facto de por ter fortes responsabilidades sócio-educativas e culturais (os serviços que é suposto prestar "com qualidade" são decisivos para a comunidade de que faz parte), precisar de ter qualidade e ser eficaz e de que a sua existência sai pesada ao erário público. O objectivo das bibliotecas não é económico-financeiro, mas educativo-cultural, mas no resto há muito a aprender com o modelo optimizado das empresas. Os princípios que servem para presidir à dinâmica das empresas devem ser apropriados, com as devidas adaptações, pelas bibliotecas escolares a fim de também elas produzirem 'lucros', 'mais valias', 'sobreviverem no mercado', resistirem 'aos desafios' do mundo de hoje. 3 – AS FINALIDADES DAS BIBLIOTECAS ESCOLARES, COMO FACTORES DE PADRONIZAÇÃO DA QUALIDADE Nas bibliotecas escolares, o factor de padronização está contido nas finalidades que para elas são institituídas, e que pretendem registar os princípios por que se deseja que sejam orientadas tais bibliotecas. É pelas finalidades objectivamente definidas para as bibliotecas escolares que se deve pautar o funcionamento de cada biblioteca concreta. Essa é a referência. Mas são igualmente determinantes as expectativas localizadas, fruto da sensibilidade dos indivíduos e das especificidades regionais e locais. E isso relativiza a aplicação que lhe é feita do factor de padronização. Se pretendemos instituir um 'modelo', desde que suficientemente aberto, dinâmico, flexível, para a promoção da qualidade nas bibliotecas escolares, para que delas possamos tirar o melhor proveito, importa referir as finalidades que se pretende que persigam as bibliotecas escolares. As finalidades da biblioteca escolar derivam, antes de mais, de uma dupla circunstância: de serem 'biblioteca' e de serem 'escolares'. a) Finalidades da biblioteca, em geral: - Ser memória da humanidade. - Contribuir para a compreensão do passado, a descoberta do presente, a planificação do futuro. - Conservar o legado cultural, civilizacional, humanista, social da humanide. - Proporcionar e favorecer a informação, a pesquisa, a fundamentação, a investigação e a formação. - Promover a partilha dos saberes de forma livre e democrática. - Proporcionar empréstimo documental. - Apoiar a ocupação de tempos livres. - Desenvolver actividades de animação e difusão cultural. - Promover o desenvolvimento e o progresso. b) A biblioteca escolar, enquanto biblioteca que é, participa de tudo isto. Mas não se fica por aí. Pelo facto de ser 'escolar', o seu papel na sociedade e na escola é muito mais exigente. Outras bibliotecas poderão praticar algumas destas especificidades, mas é à biblioteca escolar que competirá fazê-lo de modo determinante. São finalidades específicas da biblioteca escolar: - Servir a comunidade educativa (alunos, professores, auxiliares de acção educativa, encarregados de educação, interventores do meio). - Contribuir para a construção do sucesso institucional na escola. - Contribuir para a construção do sucesso educativo dos alunos. - Responder às exigências do Sistema Educativo. - Colaborar na formação dos alunos, preparando-os para situações futuras de aprendizagem e para a vida. - Preparar para o acesso a outras bibliotecas e arquivos. - Ensinar a ler e, no que lhe é consequente, a escrever. - Desenvolver o gosto e a competência de leitura. - Desenvolver nos alunos hábitos de leitura e estudo. - Orientar os alunos na consulta de obras de referência. - Iniciar os alunos no desenvolvimento de competências no campo da informação, da fundamentação, da investigação. - Garantir o trabalho com projectos, na escola – projecto educativo, projecto curricular de escola, projecto curricular de turma, área de projecto (I. P. Veiga, 2000). - Servir de apoio às actividades curriculares (da sala de aula) criando um espaço (diversificado, plural, personalizado) de aprendizagem. - Servir de apoio a projectos livres, da sala de aula e da escola (L. M. Silva, 2002-a). - Elaborar 'boletim periódico' da biblioteca escolar. - Divulgar as existências e as novidades junto da comunidade educativa e disponibilizálas, fazendo-se centro cultural da escola. - Promover interacções com outras escolas e outras bibliotecas. - Criar nos utentes da biblioteca hábitos de responsabilidade, autonomia e organização, a par do enraizamento de valores humanos e de formação. - Fazer frente ao analfabetismo funcional dos utentes da biblioteca e de toda a comunidade educativa. - Elaborar relatórios periódicos sobre o funcionamento da biblioteca escolar e divulgálos, como forma de dar cada vez melhor resposta às solicitações por que ela vai sendo envolvida. - Promover-se na comunidade educativa e na escola, tornando-se cada vez mais indispensável, procurada e eficaz. Uma biblioteca escolar de qualidade será aquela que, sem descurar os pontos relativos às bibliotecas em geral, melhor conseguir responder às finalidades específicas que lhe são atribuídas. 4 - PARA UM MODELO DE QUALIDADE NAS BIBLIOTECAS ESCOLARES São duas as vias por que optar para a instituição de um modelo de qualidade nas bibliotecas escolares. a) Uma delas será a opção por um modelo 'utópico', criado de raiz, segundo o nosso melhor sonho e aquilo em que, pela nossa experiência ou reflexão, mais acreditamos. Será um modelo aceitável como proposta desinteressada, não exequível hoje, mas que poderá servir de referência para bibliotecas no futuro. b) Outra delas é um modelo de continuidade em relação ao que já existe, que podendo não ser optimizado, vai respondendo às necessidades, importando mais que tudo melhorá-lo continuamente. A nossa opção recairá sobre esta última, dado que não faz sentido, com todos os custos que isso acarreta, fazer propostas que impliquem recomeçar tudo de novo. Temos bibliotecas, uma rede a funcionar, um apoio regulamentado por parte de bibliotecas municipais. Conhecemos as finalidades que importa perseguir. Temos consciência da realidade que nos envolve, e que se tem vindo a acentuar com razoável dinamismo (jornal O Primeiro de Janeiro, de 19.12.2004). Há que dar sequência a tudo o que existe, melhorando, optimizando, continuando. A propor-se uAqualidade', na biblioteca escolar, ele terá de ser suficientemente aberto para que cada biblioteca concreta, das nossas escolas – do litoral e do interior, do norte do centro e do sul, das cidades das vilas e das aldeias, do meio urbano, semi-urbano e rural… possa tirar proveito dele, integrando-se e adoptando-o. Não é tarefa fácil, dada a multiplicidade das situações, exigindo-se muito da proposta a ser feita. 5 – REFERENCIAIS DA QUALIDADE, NAS BIBLIOTECAS ESCOLARES Determinante para a instituição de um "modelo de qualidade" a definir para as bibliotecas escolares é a consideração dos objectivos das bibliotecas em geral e das bibliotecas em especial. Eles funcionam como padrões de qualidade a perseguir na biblioteca escolar. Tais finalidades deverão ser compaginadas com referenciais do tipo: PRIMEIRO – A biblioteca escolar é comparável a um ser vivo (A. Bernillon & O. Cérutti, 1990, p.17). Só estando de boa saúde ela pode desempenhar as funções para que foi criada. Se não tem suficiente energia, se sofre de deficiências graves, desenvolvemse nela reacções internas que será impossível não se reflectirem no exterior. Como organismo vivo que é, todos os seus interventores deverão revelar-se operacionais e interactivos, contribuindo para os fins comuns e combatendo os insucessos, a falta de qualidade. Operacionalidade, interacção, combate ao insucesso. SEGUNDO – Os espaços e mobiliário da biblioteca escolar deverão ser adequados, funcionais, continuamente melhorados. Importa considerar a centralidade do espaço físico, o número de salas, a área disponível, o tipo de instalações. E depois o mobiliário da biblioteca escolar (estantes, mesas e cadeiras, postos de catálogo, balcão de atendimento ou expediente, expositores gerais, expositor de jornais e revistas, secção de livros gerais de consulta, material audiovisual). Adequação, funcionalidade, sujeição a melhoria constante. TERCEIRO – Documentos/acervo. Terá de se atender ao enriquecimento bibliográfico constante, à optimização da disponibilização e acesso, em resposta às necessidades. E depois à sua organização (registo, catalogação, classificação, ordenação, indexação, arrumação), de modo competente, eficaz. Acervo suficiente, adequado, actualizado. Organização competente e eficaz. QUARTO – Os destinatários da biblioteca escolar são toda a comunidade educativa, mas sobretudo os alunos (os seus destinatários principais). É para estes, mais que tudo, que existe a biblioteca escolar. Há que os conhecer, motivar, acompanhar, atender com prontidão e eficácia. Receptividade, participação, empenhamento, empreendedorismo. QUINTO – Os interventores habituais na biblioteca escolar são de três tipos: pedagógico-didácticos, biblioteconómicos e administrativos. a) Interventores pedagógico-didácticos (professor bibliotecário, funcionário da biblioteca, núcleo de apoio à biblioteca, professores da escola, especialistas). b) Interventores biblioteconómicos externos (BP/BM) e internos (professor bibliotecário, funcionário da biblioteca, núcleo de apoio à biblioteca). c) Interventores administrativos (que podem pertencer à própria escola, ou serem disponibilizados por ela, mas liderados pelo professor bibliotecário). Os interventores na biblioteca escolar deverão manifestar: Conhecimento da realidade da escola (directivas institucionais, pedagógico-didácticas, comunidade educativa) e do meio. Conhecimento do espaço alargado (em todos os domínios) da biblioteca escolar. Conhecimento dos destinatários (sobretudo alunos). Saber para agir (formação de base). Motivação e dinamismo para agir. Autonomia para agir. Criatividade e inovação. Capacidade de iniciativa e optimização constantes. Capacidade de resposta às necessidades e deficiências detectadas. Interesse pela informação e pelo conhecimento. Capacidade de resposta face às necessidades de promoção e de visibilidade da biblioteca escolar. Qualificação técnica e humana. Formação de base (nomeadamente no domínio de teorias relacionadas com o conhecimento, o ensino-aprendizagem, o pensamento sistémico, o pensamento estatístico, a psicologia (W. W. Scherkenbach, 1993). Empenhamento na persecução das finalidades gerais e restritas da biblioteca escolar. Mais especificamente: a) Espera-se do professor bibliotecário: Cuidadosa preparação e formação profissional especializada. Determinação e espírito de liderança, fazendo-os integrar num desempenho colegial. Capacidade de diagnóstico constante da qualidade conseguida na biblioteca escolar. Capacidade de gestão e de envolvimento dos interventores na biblioteca escolar. Preocupação com a optimização constante de todos desempenhos. b) Espera-se do funcionário da biblioteca (facultando-se-lhe estímulos e formação): Espírito colaborativo (face ao processo orgânico que for definido para a biblioteca escolar). Sensibilidade humanista. Formação específica adequada (nomeadamente em relações humanas e dinâmica de grupos (A. Bernillon & O. Cérutti, 1990, pp.24-25). Competência, conhecimento e desempenho adequado. c) Espera-se do núcleo de apoio à biblioteca: Voluntarismo e colaboração (face ao processo orgânico que for definido para a biblioteca escolar). Produção de materiais de apoio às aulas e aos projectos. Acompanhamento dos projectos da escola e das aulas. Colaboração em actividades de organização da biblioteca escolar (registo, catalogação, classificação, ordenação, indexação, arrumação). Organização de sessões culturais (celebrações, conferências…). Orientação dos leitores na biblioteca escolar. Apoio na recepção e disponibilização de materiais requisitados. Apoio a iniciativas para dinamização da biblioteca escolar. d) Espera-se dos professores escola: Relacionamento estreito e directo com a biblioteca escolar (face ao processo orgânico que for definido para a biblioteca escolar). Motivação dos alunos para a frequência da biblioteca escolar (fins de informação, formação e ocupação de tempos livres, meios complementares e alternativos aos das aulas). Depósito na biblioteca escolar de materiaisproduzidos nas aulas. Apoio a projectos da escola e das aulas, em que os alunos se possam integrar com participação na biblioteca escolar. Resposta às solicitações da biblioteca escolar. e) Espera-se dos especialistas (no interior e exterior da escola, a serem contactados caso a caso): Resposta pronta e eficaz às situações para que são chamados. f) Espera-se dos interventores biblioteconómicos (externos e internos): Competência, responsabilidade, empenhamento no trabalho de bastidores que lhes compete realizar. g) Espera-se dos interventores administrativos: Boa gestão da relação custos e qualidade, na biblioteca escolar. Gestão optimizada dos apoios materiais disponíveis. Apoio na aquisição de materiais. Empenhamento na anulação de desperdícios e perturbações. Preocupação com a instituição de produtividade e eficácia na biblioteca escolar. SEXTO – Quanto à dinâmica da biblioteca escolar, ela deverá revelar-se através de duas posturas a assumir continuamente de modo complementar: a) Postura receptiva (a biblioteca escolar corresponde a quantos a procuram). Atende e acolhe quem a procura. Faculta materiais adequados em todos os suportes. Promove o catálogo. Aconselha e orienta. Produz (e faz produzir) materiais solicitados. Responde a necessidades de estudo orientado. Disponibiliza e empresta materiais. Apoia a leitura informativa, recreativa, formativa. Responde a solicitações da escola e de grupos específicos. Responde a solicitações da sala de aula. Responde aos projectos da escola, de grupos específicos, da sala de aula. b) Postura interventiva (a biblioteca escolar promove-se a si e aos seus serviços junto da comunidade educativa, procurando ainda atrair a si quem não a procura). Incentiva à leitura recreativa, informativa, formativa. Dinamiza a leitura (sessões de leitura, encontros, conferências, actividades, iniciativas…). Promove o livro, o disco, a internete. Coopera com o Conselho Pedagógico da escola. Elabora ou solicita a elaboração de materiais adequados. Estabelece ligação com projectos da escola e do meio. Responde a necessidades da escola e do meio no âmbito da informação e do conhecimento, do livro e da leitura. Estabelece ligações com a sala de aula. Procura optimizar a sua intervenção de modo a evitar quaisquer ruídos e desperdícios. Procura visibilidade, autopromove-se, publicita-se. Importará, ainda, que a biblioteca escolar, na sua actividade dinamizadora: Funcione em termos de "processo" (W. W. Scherkenbach, 1993), atendendo sempre ao que os seus interventores fazem ou pensam. Desenvolva um trabalho de bastidores adequado às suas necessidades. Trabalhe no curto, médio e longo prazo, embora mais nestes dois últimos tempos que no primeiro. Distribua as responsabilidades relativas à qualidade por toda a equipa que a integra. Promova, perante as dificuldades, a coesão e a solidariedade entre os seus membros e colaboradores. Procure uma melhoria contínua, através da anulação de problemas detectados nos desempenhos correntes, desenvolvendo uma política (orientações para o desempenho, delineadas de forma estruturada e coerente) e uma cultura (interiorização e prática das orientações assumidas). Recorra a processos de inovação, através da substituição dos processos antes usados e que não produziram resultados (re-engenharia). Considere, de forma adaptada, princípios e normativos (1) aplicados à qualidade em geral. Elabore e faça cumprir um Regulamento, claro e conciso, visando tirar a maior efecácia do seu funcionamento (L. M. Silva, 2002-b, p.250). SÉTIMO - Procura constante de qualidade total, na biblioteca escolar. Para se instituir qualidade total na biblioteca escolar, enquanto conjunto de princípios e de métodos organizados em estratégia global, visando mobilizar para uma maior satisfação de um utente com a maior eficácia e ao menor custo (A. Bernillon & O. Cérutti, 1990, pp.17-24), é preciso serem conhecidos, e depois aplicados, relativamente a todos os intervenientes, princípios como: a vontade de agir, o envolvimento na melhoria dos níveis de desempenho, a interacção de todos quantos nela trabalham e com ela colaboram, a prevenção dos defeitos e desperdícios, a mediação da qualidade, a anulação de 'todas' as limitações e impedimentos à qualidade. Tal como uma empresa, a biblioteca escolar não pode alhear-se da satisfação das necessidades dos seus utentes. Aplica-se à biblioteca escolar, com as devidas adaptações, o princípio da procura da qualidade total, corrente em qualquer empresa, enquanto "conjunto de princípios, de métodos organizados em estratégia global, visando mobilizar toda a empresa para uma maior satisfação do cliente, ao menor custo" (A. Bernillon & O. Cérutti, 1990, p.17) e através do melhor desempenho. 6 – AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO DAS BIBLIOTECAS ESCOLARES Uma vez aplicado um modelo de funcionamento à biblioteca escolar, em favor da optimização na aplicação de factores de qualidade, importa avaliar o seu desempenho. Tal avaliação deverá ser feita pelos: a) frequentadores da biblioteca – avaliam o desempenho da biblioteca escolar nos itens seleccionados, b) interventores na biblioteca - avaliam a intrinsecidade do funcionamento da biblioteca escolar em itens seleccionados, c) auditores externos à biblioteca, designados para o efeito – avaliam o desempenho da biblioteca escolar, considerando a intervenção de frequentadores e interventores, pondo as suas respostas em confronto com a realidade (factos e documentos). Elaboram relatório final, a ser discutido por todos com o fim de ser continuamente melhorado o desempenho da biblioteca (constante procura da qualidade). (1) - Nomeadamente: directivas da ISO (L. F. S. D. Reis A. V. Mañas, 1999); práticas de TQC (total quality control), enquanto sistema para o desenvolvimento e manutenção da qualidade, com vista à melhoria da produção, do serviço e da satisfação do consumidor (I. Kaoru, 1990, p.90); práticas de TQM (total quality management), enquanto gestão do grau de eficácia em relação a todos os elementos participantes (internos e internos) envolvidos, promovendo-se a máxima eficácia. Mas tudo isto (que se procurou ter em conta nos princípios enunciados no presente trabalho) terá de passar, obrigatoriamente, por uma adaptação à realidade da biblioteca, sendo desejável que os interventores na biblioteca escolar recebam formação neste domínio, para melhorarem a prazo os seus desempenhos. Não se visa, de modo algum, atribuir classificações ao desempenho da biblioteca escolar, e muito menos estabelecer qualquer rânquim com elas. Nada se ganharia com isso. Esta prática, aplicada hoje, generalizadamente, a muitas instituições, se em alguns casos pode ter algo de positivo, pelas comparações que permite, na maioria dos casos é mais prejudicial que positiva, pois desvia o foco das atenções, do essencial (o desempenho das finalidades para que foi criada) para a artificialidade e a mera procura de imagem, apresentando as instituições, não como aquilo que verdadeiramente são, mas como aquilo que se fazem parecer. Nada ganharemos com a introdução de tais práticas nas nossas bibliotecas. Ao avaliálas, pretende-se 'somente' (e já é muitíssimo, é o essencial) obter elementos o mais possível objectivos para uma orientação futura. Os frequentadores da biblioteca (a comunidade educativa, mas sobretudo os alunos) e os interventores na biblioteca (com destaque para os pedagógico-didácticos) têm toda a vantagem em colaborar, participando na sua detecção e depois na aplicação dos resultados. A sua apreciação deverá incidir sobre itens de qualidade definidos (como os que acima delineámos), pronunciando-se sobre o nível em que os consideram (alto+, alto, alto-, médio, médio-, baixo, nulo) e descrevendo as manifestações de desempenho que os levaram a assinalar, do modo como o fizeram, o item salientado. Ficaria deste modo: ITEM Nº x Designação do item: Assinale o nível de desempenho presenciado: Alto + Alto Alto médio Médio Baixo Nulo Descreva manifestações de desempenho que o/a levou a assinalar, do modo como o fez, o item assinalado: ………………………………………………………………………… ………………………………………………………………………… ………………………………………………………………………… ………………………………………………………………………… Quanto aos auditores (A. L. Gil, 1994), o seu trabalho será o de coligirem e tratarem os resultados fornecidos pelos frequentadores e interventores, e depois o de os confrontarem com a realidade. A sua interevenção culminará com a elaboração de uma relatório crítico prospectivo, a ser debatido por frequentadores e interventores, tomando-se as conclusões como determinantes para o desempenho futuro da biblioteca. Importaria introduzir nas nossas bibliotecas escolares a prática das “auditorias da qualidade” – empenhadas em avaliar a qualidade conseguida, e, aplicando um processo construtivo, prevenir e superar a sua limitação ou ausência. Importará formar auditores competentes, capazes de realizar auditorias de sucesso às bibliotecas escolares, definindo-se e trabalhando-se o seu perfil, facultando-se-lhes formação, estabelecendo-se as fases em que eles deverão intervir, o conteúdo das suas intervenções, como deverão planificar e conduzir o seu trabalho, como deverão proceder à elaboração dos relatórios consequentes, à delineação das estratégias correctivas e ao acompanhamento da sua implementação. 7 – CONCLUSÕES A grande finalidade de qualquer modelo de qualidade aplicado às bibliotecas escolares será fazer delas um espaço da maior qualidade, segundo os fins para que elas foram criadas. A biblioteca escolar destina-se à satisfação das necessidades dos seus utentes. Aplicase-lhe, com as devidas adaptações, o princípio da procura da qualidade total no desempenho de quanto com elas estão envolvidos. O lema da biblioteca escolar (que não é uma empresa, mas pode aprender muito com a organização das empresas) deverá ser o de qualquer empresa de sucesso: de que não basta já ser bom, mas é preciso procurar ser sempre melhor. A proposta do modelo de qualidade aqui formulado assenta na combinação de três pontos: na definição das finalidades das bibliotecas (em geral, e das bibliotecas escolares, em especial); na apresentação de referenciais de qualidade para as bibliotecas escolares (7 itens), que pretendem sumular o que, combinado com os objectivos encontrados para as bibliotecas, é determinante para o desempenho de uma biblioteca escolar de qualidade; a avaliação, envolvendo frequentadores da biblioteca, interventores na biblioteca, auditores externos à biblioteca. Pretende-se com a presente proposta estabelecer referência para desempenhos futuros da biblioteca escolar cada vez mais eficazes e produtivos, intervindo sobre os alunos e a comunidade educativa, servindo a escola, ajudando no desenvolvimento da sociedade. BIBLIOGRAFIA BERNILLON, Alain & CÉRUTTI, Olivier (1990). A qualidade total. Implementação e gestão. Lisboa: Lidel, Edições Técnicas. CASTELEIRO, Malaca (org.) (2001). Dicionário da Língua Portuguesa contemporânea. Lisboa: Academia das Ciências de Lisboa. GIL, António de Loureiro (1994). Auditoria da qualidade. São Paulo: Edições Atlas. JURAN, J. M. (1992). A qualidade desde o projecto. Os novos passos para o planejamento da qualidade em produtos e serviços. São Paulo: Livraria Pioneira Editora. KAORU, Ishikawa (1990). Introdution to quality control. Tokyo: 3ª Corporation. O.C.D.E. (1992). As escolas e a qualidade. Porto: Edições ASA. REIS, Luiz Filipe Sousa Dias & MAÑAS, António Vico (1999). Iso 9000. 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