FORMANDO O ENFERMEIRO PARA O C U I DADO À SAÚ DE DA FAMíLIA: U M OLHAR SOB R E O ENSINO D E G RADUAÇÃ01 Beatriz Regina Lara dos SantoS! Eliane Pinheiro de Moraes3 Gema Conte PiccininP He/ena Victória Sagebirf O/ga Rosária Eidf' Regina Rigatto Witf' INTRODUÇÃO Atualmente, no B ras i l , considerar a fam ília como foco do cu idado de Enfermagem parece ser consenso, ao mesmo tempo que realizar tal cuidado Universidade, enquanto fonte de produ tem constitu ído um desafio para prática profissional . ção de conhecimento e enquanto respon Segu ndo O'Espiney ( 1 997) , pelo caráter prático da sá vel pela formação de profissionais de profissão, a formação profissional tem uma forte alto nível, pode potencialmente a fetar a l igação com o contexto de trabalho, ass i m , formar enferme i ros para o cu idado ao g rupo fam i l i a r, qualidade e a direção do desen volvimen t a m b é m , c o n st i t u i o u t ro d e s af i o , q u e e s t á to em que ela se insere. Buscar aperfei relacionado a fatores oriu ndos d o contexto pol ítico çoar as a tividades-fim parece-nos com e social brasileiro . promisso inevitável daqueles que a cons E n t re t a i s fato res , d e s t a c a - s e q u e a tituem. Educação de Enfermagem i ncorporou, por m uito Marisa Japur tempo, a pol ítica vigente no país , enfatizando o ensino de especialidades oriu ndas do modelo biomédico, priorizando, dessa forma, os aspectos práticos centrados no hospita l , na cura da doença do indivíduo, de maneira descontextual izada. As ações de promoção à saúde e de prevenção de problemas coletivos que afetam as fam íl ias, por m u itos anos, não foram valorizadas. Apenas, na ú ltima década, a Educação em Enfermagem avanço u , preconizando q u e u m a das finalidades d o currículo é responder à s necessidades d e saúde d a população, através da atenção à clientela hospitalizada e a q u e vive coletivamente. ( Santos et alo 1 998) . No momento atua l , os cu rrículos dos cu rsos de g raduação, conforme Canário( 1 997) , vivem m utações importantes. Tais modificações, originam-se de uma nova visão paradigmática que enfatiza, na prestação de cu idados, a promoção da saúde articulada com contextos sociais e ambientais. Ass i m , no ú lti mos anos, a l iteratura , os eventos e a prod ução científica, oriunda dos programas de pós-g raduação, mostram g ru pos organ izados e comprometidos com o desenvolvimento desta área, principalmente , após as V I I I e I X Conferências Nacionais de Saúde e a implantação em n ível nacional do P rograma de Saúde da Fam ília (PSF), como estratégia de implantação do S istema Ú n ico de Saúde (SUS) . 1 Artigo elaborado por docentes e pesquisadores vinculados ao Núcleo de Estudo e Pesquisa em Educação e Saúde na Família e Comunidade (NESFA C) da Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (EEUFRGS). 2 Professora adjunta, doutora em Educação. 3 Professora assistente, mestre em Enfermagem. 4 Professora adjunta, livre docente em Enfermagem em Saúde Comunitária. S Professora adjunta, doutora e livre docente em Enfermagem Pediátrica. 6 Professora assistente, mestre em Saúde Pública. R. Bras. Enferm. , B ras íl i a , V. 53, n. especial, p. 49-59 , dez. 2000 49 SANTOS, Beatriz Regina Lara dos et ai. Paralelamente, a Associação B rasileira de Enfermagem (AB En) , por meio do Decreto que reg u lamenta a Lei do Exercício P rofissional do Enfermeiro, determ ina que o profissional enfermeiro, como i nteg rante da eq uipe de saúde "( . . . ) participe em prog ramas e atividades e educação san itária, visando a mel horia da saúde do indivíduo, da fam ília e da população em geral ( . . . )." ( ABEn 1 987, p.26) . Mendes ( 1 996) , ao estudar as mudanças cu rriculares dos cu rsos de graduação em Enfermagem, nas d iversas u n iversidades brasileiras da década de 70 a 90, aponta o pionei rismo da Escola de Enfe rmagem da U n iversidade Federal do Rio G rande do Sul ( E E U FRGS) ao inseri r em seu cu rrícu lo, no i n ício da década de 80, uma disciplina que enfatizava a assistência à fam ília em n ível de comunidade. Destaca-se que tal i n iciativa contrariava as pol íticas de saúde e educação vigentesna época e , conseq uentemente, enfrentou resistências de várias ordens. Atendendo uma solicitação da ABEn, como professores da área de Enfermagem de Saúde Comun itária do curso de g raduação EEU FRGS, que vivenciam , há mais de duas décadas, o processo educativo na área de cu idado à saúde da fam ília, tentamos responder duas q uestões centrais desta temática: como a EEUFRGS tem constituído o processo de formação do profissional enfermeiro para o cuidado a saúde da família ?; e, conforme nossa vivência, quais são os aspectos relevantes que devem nortear um planejamento pedagógico para o ensino do cuidado a saúde da família ? Para tal , em um primeiro momento, busca-se traçar uma relação entre as pol íticas de saúde adotadas no nosso país, no ú ltimo século, e a educação de enfermagem, a fim de auxiliar o desvelamento de alguns valores e atitudes que, até hoje, d ificu ltam o processo de formação de profissionais para o cuidado ao g rupo fami l iar, bem como a implantação de algu mas pol íticas públ icas de saúde. Logo após , destaca-se a articulação da enfermagem na pol ítica de atenção à saúde da fam ília. A segu i r, é relatada a experiência da E E U FRGS na formação de enfermei ros para o cu idado a saúde da fam ília, bem como são apontados alguns princípios norteadores da dinâmica da atividade pedagógica inerente ao p rocesso re l atado . Destaca-se q u e tais p r i n c íp i os são c o n s i d e rados esse n c i a i s , para o estabelecimento de u m p rojeto pedagógico para o ensino da atenção a saúde do g rupo fam i l iar. AS POL ÍTI CAS DE SAÚ DE NO B RAS I L E A EDUCAÇÃO EM E N FERMAG E M No B ras i l , a s primeiras pol íticas de saúde aparecem como preocupação do governo com a formação das cidades, a aglomeração das pessoas em precárias condições de vida e a proliferação das doenças i nfecto-contagiosas. Como proposta da saúde públ ica, o movimento san itarista , vigente nas duas primeiras décadas deste sécu lo, apresentou para a sociedade um projeto de i nte rvenção o campanhista/pol icial (Mehry apud Rizzotto, 1 999) . Embora as intervenções propostas tivessem alguma eficiência, foram contestadas pela popu lação, devido ao autoritarismo empregado nas ações , como, por exemplo, na vacinação obrigatória e no confi namento dos doentes. Neste contexto, surgiu a enfermagem profissional na qual, segundo Germano ( 1 985) , o cu rrículo adotado, na época, priorizava as discipli nas vinculadas à Saúde Públ ica, porém era exigido que as alu nas trabalhassem em institu ições hospitalares . Concom itantemente, a i ntenção i n icial de formar profissionais que assum issem o papel de educadores em saúde, não se concretizou por uma série de fatores . Entre eles, destaca-se a forma como a enfermagem foi inserida na sociedade brasileira, "de cima para baixo", causando estranheza a população e conseq üente rejeição do trabalho educativo, pois esse era visto como uma forma de interferência na privacidade e individualidade, que desconsiderava os l i m ites de assimilação e alcance das orientações, além de não propor mudanças estrutu rais na sociedade ( Rizzotto, 1 999) . Ao mesmo tempo, s u rgia o paradigma da medicina cl ínica, cujo discurso era individualista privatista exigi ndo outro espaço para se desenvolver, o hospital . O cu rrícu lo recomendado em 1 949, para Germano ( 1 985) , privilegia a área preventiva, porém o mercado de trabalho privilegia a área hospitalar, para onde os profissionais de enfermagem foram , pau lati namente, d i recionados . Neste espaço , o paciente tinha o d i reito de ser ouvido sobre as alternativas terapêuticas e, até mesmo, decidi r sobre os proced imento aos quais deveria se submeter, sendo responsabil izado por sua saúde, uma vez que esta seria alcançada a partir de uma mudança de comportamento do mesmo. Na década de 40, o papel do p rofissional , como educador, é retomado com a criação dos 50 R . Bras. Enferm. , B ras ília, v. 53, n . espec i a l , p . 49-59, dez. 2000 Formando o enfermeiro para o cuidado à Saúde da Família . . . centros d e saúde, nos q uais a atenção era organizada em programas, sendo, a educação san itária, a base da ação e o poder coe rcitivo su bstitu ído pela persuasão . Ass i m , origi na-se a tendência contemporânea da organização no campo da saúde sob a forma de prog ramas de atenção individual, por exemplo os Programas de Atenção I ntegral à Saúde da Criança, da M u l h e r, entre outros . Nos anos 60, com o " M i lagre Brasileiro" , o entendimento da saúde como assistência medica especializada, sofisticada, fragmentada e que privi legia a i nternação hospitalar, favorece os negócios das indústrias farmacêuticas e de eq u i pamentos médico-hospitalares. A e nfermagem caracteriza-se por valorizar a organização dos serviços de saúde, a melhoria do ensino e a organização dos princípios científicos que norteavam sua prática. Com isso, o profissional distancia-se , cada vez mais, do paciente e procu ra assumir cargos ad ministrativos , relacionados à gerência das ações de enfermagem. As ações de promoção à saúde e de prevenção dos problemas, que afetam as fam ílias e as comunidades deixam de ser valorizadas . Segundo Germano ( 1 985) , a área de enfermagem em saúde públ ica não era configu rada no cu rrículo proposto em 1 962 , como disciplina obrigatória para o cu rrículo m ínimo de g raduação . Assi m como a resolução n Q 04/72 do CFE de 1 968, recomendava que o enfermei ro fosse formado, para dominar as técnicas avançadas de saúde e acompanhar a sua evol ução científica. O desenvolvimento de medidas terapêuticas provoca uma mudança gradativa no quadro nosológico com a d i m i n u ição das doenças transmissíveis e da mortal idade i nfant i l , o aumento da expectativa de vida e das doenças degenerativas . Na década de 70, s u rgem os primeiros cu rsos de pós-g rad uação em enfermagem. Em meio à crise do modelo cu rativista-privatista, as pol íticas de cuidados primários à saúde esti m u lariam o autocuidado e a autonomia das com u n idades. As décadas de 80 e 90, caracte rizam-se pela organização de trabalhadores e entidades dos setores da saúde e educação . A V I I I e I X Conferências Nacionais de Saúde, propõem a adoção de modelos assistenciais mais cond izentes com a realidade sócio-econôm ico-cultural de nosso país , c o m ações que visualizem o cliente , de forma i nteg ra l , ultrapassando o modelo preventivo-cu rativo pelo enfoq ue hol ístico, e a participação da população na organ ização e na gestão do sistema de saúde ( Santos, 1 996) . O reconhecimento da saúde, como d i reito do cidadão e dever do Estado, é incorporado à Constituição de 1 988. A criação de canais de participação impõe uma real democratização das relações entre profissionais e clientela. Em 1 990, a participação da com u n idade no Sistema Ú n ico de Saúde é defi nida em lei e são criados os Consel hos de Saúde. Nesta mesma década, a portaria nQ 1 72 1 de 1 5 de dezembro de 1 994, estabelece o Cu rrículo M ín i mo de Enfermagem , cujos pressu postos fora m : a conju ntu ra e o contexto de saúde do país; a relação do processo de formação com o processo de trabalho da enfermagem e do enfermeiro , com a finalidade de responder às necessidades de saúde da popu lação; a consonância da formação e da prática profissional com os princípios oriu ndos da Atenção P ri mária à Saúde; a Lei do Exercício Profissional ; e a abordagem dos problemas individuais e coletivos de saúde, através do método cl ínico e epidemiológico. Como estratégia de desenvolvimento cu rricular, precon iza a teoria emanando da prática, inclui atividades educativas, além das terapêuticas e administrativas e destaca que a atenção de Enfermagem deve ser destinada à clientela hospitalizada, bem como a que vive coletivamente, su pondo-se que nesta, esteja incl u ída a fam ília ( Santos, 1 996) . Frente ao desafio de constru i r referenciais que orientem a formação do enfermeiro para a saúde da fam ília, deve-se considerar as diversidades impressas pela pol ítica e prática de saúde na sociedade brasi leira. Entre as quais destacam-se : - os pad rões de comportamento da popu lação, q uando questiona o trabalho do enfermeiro ju nto à fam ília, principalmente, no espaço domiciliar, quanto por parte do profissional que continua a reproduzir postu ras moralizantes e normatizadoras, herdadas do projeto campanh ista/policial ( Kaloustian, 1 994) ; - as pol íticas de fracionar os segmentos portadores de d i reitos, por exemplo a criança, o adolescente , a mulher e o idoso , também fracionaram a fam ília e, em certas situações, o próprio indivíduo, nas suas diversas fases do desenvolvi mento e crescimento, acabando por embaçar as demandas de justiça e proteção do g rupo fam i l iar; R . Bras. Enferm. , Bras ília, v . 53, n . especial , p . 49-59, d e z . 2000 51 SANTOS, Beatriz Regina Lara dos et ai. - a crise econômica do setor saúde, que gera dificu ldades de acesso e qual idade dos serviços públ icos, impu lsionando a venda de planos p rivados, inacess íveis para a maior parte da popu lação; - o crescente distanciamento da fam ília, i mposta ao enfermeiro pelas pol íticas de saúde que valorizaram a organização dos serviços de saúde, colocando-os em cargos administrativos relacionados a gerência das ações de enfermagem; - a dicotomia entre teoria e prática, na origem da formação do enfermeiro. Este quadro apresenta o desafio de propor estratégias de formação de enfermei ros para atuarem j unto às fam ílias. Na atual idade, algu mas estratégias são propostas pelo PSF. o PROG RAMA DE SAÚ DE DA FAM í LIA (PSF) E A E N FERMAG E M Diante da necessidade de agi l izar a reforma do sistema de saúde, o M i n istério d a Saúde concebeu , no final de 1 993, o PSF, elegendo o n úcleo fami l iar como foco de suas ações . Tal iniciativa justifica-se à medida que este g rupo primário, origem de todos os outros, está pres e n te mesmo q u e de forma indireta, em todas as instituições e na sociedade, condicionando e sendo por ela condicionado. A fam ília é, neste sistema, um sub-sistema decisório, consumidor, parceiro. Esta proposta, constitui u-se em uma alternativa para enfrentar os pro b l emas n a i m p l a ntação do SUS. As características deste sistema, proposto na constituição de 1 988 e consolidado n a Lei O rgân ica da Saúde de 1 990, exige a organização de serviços descentral izados , á g e i s democráticos e m s u a gestão , com novos tipos de ações, capazes de atender as demandas da rápida t ra n sf or m a ção da estrutu ra etária da popu lação, a complexa evolução dos problemas d e saúde e as caracte rísticas regionais. O P rograma Saúde da Fam ília, colocado como uma estratégia i mportante para reorganização da atenção básica do S U S , tem o aspecto marcante de agi l izar, de forma efetiva , a descentralização de serviços baseados nas reais necessidades da população , que se man ifestam como prioridades e refletem problemas concretos. É no cotidiano, no concreto do espaço da fam ília, que os profissionais do sistema, em i nteração com estas , buscam a construção da saúde, priorizando proteção , a promoção do auto-cu idado, a troca solidária, buscando, dessa manei ra, sair do modelo biomédico, dependente, centrado na doença. Vê-se , ass i m , que a filosofia que perpassa é mais do que uma simples extensão de serviços, pois enseja uma prática que oportu n ize crítica, mudanças , construção de saber. Garrido e Levcovitz ( 1 998 , p.3) concebem as u n idades do PSF como uma "porta de entrada do sistema", uma " reforma substitutiva" para reestruturar o modelo assistencial . As d i retrizes operacionais, para implantação das unidades do PSF, determinam que tenham uma cl ientela adstrita de 600 a 1 000 fam ílias, com l i m ite máximo de 4500 pessoas e recomenda que cada u nidade conte com uma equipe composta de, no m ínimo, u m médico generalista ou de fam íl ia, u m enfermeiro, auxiliares de enfermagem e agentes com u nitários de saúde (Bras i l , 1 994) . A reorientação do modelo, proposta no PSF, indica que a prestação de serviços deve privi legiar a atenção primária, a i ntegralização das ações , num território definido, no espaço familiar, constitu indo u m verdadei ro desafio para todos os profissionais de saúde. No documento ministerial do PSF, estão defi n idas as atribuições da equipe e de cada uma das categorias que a compõe ( BRASIL, 1 998) . A anál ise do documento perm ite afi rmar que a proposta é de atenção à com u n idade, uma vez que se propõe a assistir a "todos os homens" e ao "homem total". Não o d ivide em cu rativo e preventivo. A ênfase é a prevenção, por meio de ações educativas e a democratização do saber. O enfermeiro é um profissional , obrigatoriamente, i ntegrante da equipe de trabalho do PSF, tem explicitada atribuições em dois campos essenciais: na un idade de saúde e na comunidade , prestando, permanentemente, cu idados e promovendo aspectos de educação ( BRASIL, 1 998) . Isto exige que esse profissional , disponha de u m repertório que lhe perm ita assumir m ú ltiplos papéis: de educador, prestador de cuidados, consultor, uma vez que está sujeito a constantes solicitações e transformações da sua prática, i nserida nas constantes mudanças que ocorrem no seu espaço de trabalho. Em 1 998, o M i n istério da Saúde solicitou às U n iversidades que inclu íssem em seus cu rrícu los , , 52 R. Bras. Enterm. , B ras íl ia, v. 53, n . especial , p . 49-59 , dez. 2000 Formando o enfermeiro para o cuidado à Saúde da Família . . . d e g raduação a p roposta e o s princípios do PSF. Tal solicitação foi u m a tentativa de sensib i lizar as institu ições de ensino su perior para a capacitação de profissionais, principalmente , médicos e enfermeiros, para atuarem nesta proposta de reorganização do sistema de saúde . Para tornar tal sistema resol utivo, seg u ndo Souza ( 1 999) , é imprescindível que os cu rrículos de g ra d u ação e nfat ize m : o traba l h o em e q u i p e ; a competê n c i a téc n i ca ; o reco n h e c i m e nto da responsabi l idade pelo território de atuação, valorizando a cu ltu ra, os valores dos atores sociais e as situações de risco; a capacitação para o processo de gerenciamento em saúde, observando a concepção de Saúde Coletiva, subsidiado na análise do cotidiano como suporte para a ação profissional que contri b u i para a mel horia da qualidade de vida da população. A b u sca de um modelo de cuidado, que enfatiza a relação entre profissional e a fam ília, como estratégia para garanti r uma cobertu ra eficiente da comunidade, tem sido, há várias décadas, o norteador da e d u cação e m enfermagem com u n itária da E E U FRGS. P I O N E R I S M O NA FORM A ÇÃO D E E N F E R M E I ROS PARA A SAÚ D E DA FAM í LIA trajetória da E E U FRGS, i n ú meros fatos fizeram com que esta institu ição se n u m marco para a formação de enfermeiros na área de saúde da fam ília. E m pesq u isa real izada por Santos ( 1 996 , p . 1 97)l, vários professores de enfermagem, dessa Esco l a , q u a n d o q uestionados sobre suas vivências no ensino de práticas p rofissionais com fam ílias, declara m que "a preocupação com a área da saúde da família era um aspecto presente desde o início da EEUFRGS . . seguramente, na área da saúde, no nosso meio, a nossa escola foi uma das primeiras instituições de ensino superior que valorizou a família como unidade merecedora de atenção e, também, teve a preocupação de preparar a enfermeira para uma prática capaz de atender as características ao longo de seu ciclo de vida." Tal depoimento , vai ao encontro do estabelecido como filosofia pela E E U FRGS, em 1 97 1 , "formar enfermeiros capazes de auto dirigir-se e . . . p roporcionar cuidados i ntegrais aos indivíduos, fam íl ias e g rupos" . Esta perspectiva filosófica tem determi nado as trajetórias das atividades de ensino, pesqu isa e extensão , c u l m i nando com a organização do N ú cleo de Estudos e Pesq uisa em Educação e Saúde na Fam ília e Com u n idade (N EESFAC) , nesta instituição. As produções desse núcleo têm sido objeto de divulgação em eventos científicos e periódicos, subsidiando a construção teórico prática das propostas pedagógicas adotadas nas d isciplinas da área de Enfermagem em Saúde Comu nitária. Ao l o n g o d a tran sform asse . O PROCESSO EDUCATIVO VIVENCIADO NO ENSINO DO C U I DADO D E EN FERMAGEM À FAM í LIA Da pesq u isa i n icialmente referida, trazemos à reflexão a experiência dos professores que desenvolvem o processo educativo de cuidado à fam íl ia no Cu rso de G rad uação de Enfermagem. Seg u i ndo a orientação de André ( 1 995) , este p rocesso contempla as d i mensões pedagóg ica, institucional e a sócio-pol ítico-cu ltu ra l , acrescidas da dimensão pessoal e profissional do professor. As experiências próprias do professor, enquanto aluno e profissional , e a gênese de ser professor e suas motivações para a área de prática profissional com fam ílias, inserem-se no referido por Mosquera ( 1 984) , sobre o que é ser docente . Esse renomado educador, afi rma ser este , uma pessoa que possui uma trajetória histórica determinada por suas experiências, ações e comportamentos . E considera que cada professor imprime um significado próprio a sua profissão e que, tal sign ificado, está ligado ao seu processo de ind ividual ização , à sua trajetória enquanto pessoa e profissional e à sua i nte ração com a sociedade e cu ltu ra. As concepções dos professores ouvidos, enquanto pessoas e profissionais, acerca do significado da fam íl ia, o sign ificado da fam ília para o cuidado e o cu idado à fam ília são traduzidas por uns, de 7 A descrição dos depoimentos obtidos na coleta de dados dessa Tese de Doutorado subsidiaram o conteúdo deste artigo. R. Bras. Enferm. , B ras ília, v. 53, n . especial , p. 49-5 9 , dez. 2000 53 SANTOS, Beatriz Regina Lara dos et aI. acordo com Boyd ( 1 990) , como um sistema de membros que interatuam , ou seja, um sistema h u m ano que está sempre aberto a trocas e as m udanças , ao mesmo tempo que sign ifica mu ito m a i s q u e a soma das características e condições de cada um de seus membros. Alguns professores , consideram a fam ília como uma unidade biopsicossocial , conforme o enfatizado por Akcerman ( 1 982) . Entre os vários relatos discorridas, um refe re que: . . . entendo q u e a fam ília é a base, é o centro da refe rência, o primeiro n úcleo psicossoal que as pessoas têm para conviver, para poder a partir daí conviver na sua com u n idade, no seu emprego, na sua escola . . . " . Outros, enfatizam que a fam ília é u m sistema aberto que s e apresenta na s u a organ ização moderna, ou seja, n uclear, m u itas vezes , monoparentais ou extensas e sal ientam que a fam íl ia " . . . enq uanto g rupo tem funções que determinam os papéis assumidos pelos diversos elementos . . . " Vários docentes consideram que fam ília é " . . . basicamente senti mento . . . cada g rupo tem sua própria pe rcepção sobre fam ília." No entanto, a experiência de um outro professor traz que ( . . . ) a fam ília, nem sempre é um l ugar, um núcleo que recebe bem , que aconchega, que supre necessidades ." Acrescenta que às vezes entrevista uma aluna e esta diz " . . . não querer ninguém, querer ficar sozinha, morar sozinha ( . . . ) parece que não existe pai e nem mãe." A criação desses espaços , para os alu nos e professores olharem para as suas trajetórias de vida e resgatarem o seu próprio processo vivenciado de fam ília, facilita a abertu ra necessária para entender o processo no outro. Através do cotidiano, onde os professores experenciam o ensinar e cuidar, vem a importância constatada de que valorizam e acreditam no cu idado à fam íl ia, mas reconhecem as dificuldades em executar tal cu idado. Consideram, também , a fam íl ia como cliente da enfermagem , porém sal ientam que prestar assistência à saúde da fam ília tem constitu ído um desafio para a formação e prática profissional . Destacam que precisam aprender mais e recomendam a necessidade de estabelecer estratégias para desenvolver o cuidado à fam ília que extrapolem a i nstitu ição hospitalar. Para Elsen ( 1 994, p . 69) , a fam ília constitui uma unidade de saúde para seus componentes, apesar dos estudos que abordam as fu nções da fam ília não inclu írem, "( . . ) de forma expl ícita, o cuidado à saúde de seus membros ." Entretanto , destaca que essa u n idade nem sempre é eficiente no desempenho desse papel e, apenas , é considerada saudável q uando cu ida da saúde de seus componentes de forma adequada. Ainda em referência a concepção do professor sobre o cu idado à fam ília, os docentes têm observado a necessidade e importância de atenção e orientação aos membros do g rupo fam i l iar, à medida que, freq uentemente , no âmbito do domicílio, estes são os cu idadores naturais. Assu mindo a responsabilidade do processo de cuidado, na pe rcepção dos professores , os cuidadores também podem desenvolver p roblemas de saúde, principal mente, por estresse e desemprego, este ú ltimo ocasionado pela necessidade de permanecerem constantemente no domicílio. Ass i m , configura-se um problema para a enfermagem i ntervir j u nto com suportes adicionais i nterdisciplinares e da comunidade. Segundo Elsen ( 1 994, p.72) , sendo a fam ília a u n idade básica de saúde para seus membros, instala-se para a Enfermagem o desafio de "cuidar de quem cuida ." Tal desafio, gera novas perspectivas tais como cuidar da fam íl ia no local que essa se encontra, seja ele ambulatório ou no próprio domicílio. Conforme u m professor desse estudo man ifesto u : "( . . . ) cada membro da fam ília devia encontrar no profissional de saúde, na equipe de saúde, u m espaço que ele possa depositar suas angústias , aflições , problemas relacionadas com a doença fam i l iar, que mexe com a fam ília toda." A dimensão pedagógica está di retamente relacionada com a atividade de ensino que o professor desenvolve, tanto em atividades teóricas como, também, em teórico-práticas, que ocorrem em n ível de com u n i dade. Sua organização abrange o estabelecimento de: marcos norteadores , objetivos e conteúdos prog ramáticos com as experiências teórico práticas e o processo aval iativo. A importância de contextualizar a fam ília no ambiente humano, físico, pol ítico, social e econômico que esta vive é enfatizada pelos professores : " ( . ) primeiro eu acho i mportante que eles tenham uma visão de quem é a com u n idade, onde eles moram , se é pobre , rica, quem é que mora. Ass i m , os alu nos vão ter mais elementos para conhecer e cuidar da fam ília, já con hecerão a com u n idade" . " " . . . 54 R . Bras. Enferm. , Bras ília, v . 5 3 , n . especial , p . 49-59 , dez. 2000 Formando o enfermeiro para o cuidado à Saúde da Família . . . Como princípio norteado r d o processo educativo, foi destacado a atitude d o aluno e professor compartil harem decisões com a fam íl ia, portanto, real izando a prática com a fam ília e n ão para ou na fam ília. O processo educativo deve ser de forma participativa, derrubando o método de processo ensino verticalizado, q u e não atende a necessidade de ensino dos alunos com as fam ílias e a com u n idade. Uma professora refere que "o nosso trabalho é m u ito mais com o enfoque dentro , em conj unto, em comum acordo com a comunidade, dentro da fam ília. Participando com ela na identificação das necessidades, valorizando ao máximo seus próprios recu rsos, aj udando na busca e uti lização de recu rsos i nstitucionais." A relevância de trabalhar em eq u i pe é enfatizada, u m professor aponta ser " . . . i mportante trabalhar em equipe . . . relatar casos em equipe, d iscutir d úvidas e condutas e solicitar apoio sempre que senti r necessidade. Geral mente, as primeiras cond utas são conversar, ouvir a fam ília e fazer a aproximação ou vínculo com esta. Não existe receita, tudo o que vai acontecer a posteori , nós não sabemos. E , m u itas vezes, nos sentimos i mpotentes." Os docentes procu ram , constantemente , apri morar as relações h u manas , profissionais e institucionais que se desenvolvem no cotidiano da assistência à fam íl ia nos serviços de saúde. Essa possi bil idade i nterativa, numa perspectiva crítica, é possibil itada no convívio profissional entre os trabal hadores de saúde, usuários do serviço, professores e alunos. Visualiza-se , então , a necessidade do processo pedagógico alin har-se ao modelo i nterdiscipl i nar. Na concepção de Fourrez apud Maggi ( 1 999, p .2 1 ) , a i nterdisciplinaridade "nasceu da tomada de consciência de que a abordagem do m u ndo por meio de uma d isci plina particular é parcial, e por vezes , estreita." Daí a compreensão que uma q uestão do cotidiano remeta a uma m u lticidade de enfoq ues no cu idado, para buscar a solução de u m p roblema concreto de saúde nas fam íl ias ou na com u n idade onde vive m : violência fam i l iar, desemprego, exclusão social , DST/S I DA , desn utrição, i nternação dom iciliar, não aderência aos programas específicos , às necessidades próprias do ciclo vital da fam ília e do indivíduo, entre outros relativos a situação etária, cultu ral , socioeconômica, mental , san itária e ambiental . A i m p o rtância d e v i s u a l i za r a fam íl i a , como u m a u n idade de c u idado, é expressada , freq üentemente , refe rindo q u e " o paciente não é sozinho, e l e vem de algum l ugar e s e trabalha a valorização das pessoas cuidadoras de quem necessita o cu idado quer sejam as figu ras parentais e/ ou outros fam iliares." Ao desenvolver, no processo educativo , a atenção ao g rupo fam i l iar, o cuidado é citado pelos professores como "forte norteador desta atenção. A fam ília, sendo n úcleo de saúde, responsável pelo cuidado de seus filhos e de todos os entes, precisa ser cu idada". A partir deste enfoque, os professores preconizam que, na atividade pedagógica, o cu idado à fam ília seja desenvolvido a partir da vivência do aluno com este g rupo social , bem como q u e , tal cu idado , seja sistematizado, por meio da uti l ização do Processo de Enfermagem , que auxil iará a compreensão do processo de viver da própria fam íl ia. Outro marco norteador da atividade pedagógica é a comu n i cação i nterpessoa l . Os docentes acreditam que esta tem de ser vivenciada a cada instante e consideram que o aluno, enquanto ser com responsabil idade e i nteressado, " ( . ) tem suas propostas que devem ser ouvidas, ele é u m ser com capacidade de trazer excelentes alternativas para as situações mais variadas em termos de cuidado." Ass i m , os alunos experenciando a oportu n idade de senti rem-se sujeitos no próprio processo educativo , aprendem a considerar sujeitos o usuário dos serviços de saúde e os outros p rofissionais da equ ipe. No que se refere aos objetivos das atividades pedagógicas , os docentes pretendem capacitar o aluno para a prestação do cuidado de enfermagem à fam ília como uma unidade; demonstrar capacidade de aplicar o processo de enfermagem ao g rupo familiar; compreender e reconhecer os múltiplos fatores que interatuam no p rocesso saúde-doença deste g rupo; identificar a estrutu ra fam i l iar adotada pelos clientes; p ropor ações de e nfermagem com pat íveis com o g rau de dependência da fam íl ia; e instrumentalizar a fam ília para o autocu idado. A d i nâmica da atividade pedagógica, vivenciada pelos docentes com os alunos, engloba vários temas que oferecem oportunidades para instrumental izar o processo educativo no cuidado à saúde da . . R. Bras. Enferm. , B ras íl i a , v. 53, n . especial , p . 49-59, dez. 2000 55 SANTOS, Beatriz Regina Lara dos et ai. fam íl ia. E ntre estes temas , destacam-se os relacionados as características do g rupo fam i l iar, a sistematização do cu idado de enfermagem e a dinâm ica das relações entre os componentes do n úcleo fam i liar, bem como entre a eq u i pe de saúde e a fam ília. Na real idade, diante de sua amplitude, esses temas são articu lados e complementados no decorrer das vivências teórico-práticas dos professores e alunos. Para tal , como estratégia metodológica, os professores adotam a interdependência entre o processo educativo e os programas das instituições de saúde em que as atividades pedagógicas são desenvolvidas, o que possibilita as trocas constantes entre aqueles que ensinam , os que aprendem e os que viabi l izam o cu idado no cotidiano da prática profissional . Como procedimentos nas atividades teóricas, os professores utilizam aula expositiva dialogada, leitu ra, i nterpretação e d iscussão de textos, atividade de reflexão em g rupo a partir de questões norteadoras e questões vivenciais dos alu nos. Salientam que o procedimento que proporcionou maior i nteração entre o professor e o grupo, foi a atividade de reflexão. Por exemplo, uma das professoras solicitou que os alu nos refletissem sobre d uas questões: "O que é fam ília para você? " e "Você está feliz com a fam íl ia que tem ?" Percebe-se que, desta forma, o professor contribui para que cada aluno exerça o pensamento reflexivo em relação à sua própria construção e acerca da construção de seus colegas. Afastando, assim, a idéia de verdades e conceitos únicos e aceitando a relatividade da questão, sendo reconhecida a variedade de elementos que impl icam na construção dessa conceituação. Os momentos de diálogo e de troca de experiência, entre alunos e professores, são considerados extremamente positivos para o exerc ício da i ntersubjetividade no processo educativo. Acredita-se que a análise das situações vivenciadas por todos sujeitos envolvidos em tal processo, os auxi liarão em situações futu ras, até mesmo em suas próprias fam ílias, principalmente , q uando exercerem o papel de cuidadores. A parti r dessas vivências, acredita-se que as atividades pedagógicas, pautadas por u m enfoque que construa o conheci mento a partir da realidade vivida pelos próprios alunos, ao mesmo tempo que desperta o i nteresse, contribui para a transferência do conhecimento constru ído para situações imprevisíveis, que serão enfrentadas, por estes, na prática profissional. No que se refere à metodologia uti l izada pelos professores nas atividades teórico-práticas , estas são sempre real izadas no âmbito da com u n idade, em subg rupos de alunos e converge para a uti lização do processo de Enfermagem que, conforme George ( 1 993, p.25) , foi desenvolvido " . . . como um método específico de aplicação de uma abordagem à prática de enfermagem ." Destaca-se que a prática não deve ser pré-determinada, mas sim constru ída ao longo da relação profissional/cliente, no contexto desse trabalho, traduzida para professor/ aluno/ cliente. Na experiência relatada, os professores d i recionam-se para o conhecimento oriundo do pensamento reflexivo , que para Garcia ( 1 992) , constitui um fator determ i nante da prática de ensino. E, para SchOn ( 1 992), é derivação da ação prática e, portanto, é tácito, pessoal e não sistematizado, experi menta l , não fixo, sujeito à m udança através da dialética entre a teoria e a prática. Ass i m , na dinâm ica da ação educativa, os professores procu ram relacionar a fundamentação teórica, legal e metodológica do exercício profissional , englobando situações de cu idado à fam ília em seu d o m i c í l i o , u n i dades sanitárias, com u n idades e a m b u l atórios . Essa a p roximação com o desenvolvimento do papel profissiona l , i nserindo o aluno no contexto sócio pol ítico san itário e cu ltu ral em que vivem as fam ílias, possibil ita a abertura, envolvimento e compromisso do aluno e professor para considerar a saúde da fam ília na sua total idade, bem como espera-se q u e proporcione transformações significativas, no sentido ético e bioético, que deve embasar toda a relação profissional . Os momentos de discussão de fatos vivenciados no dia a dia, segundo os docentes, aproxima m u ito mais o g rupo de alu nos e professores. O professor contribui para o desvelamento da realidade, por parte dos alu nos, à medida que acrescenta elementos de sua vivência, como profissional da área. A incl usão de sem inários, contando com relatos de profissionais que trabalham em prog ramas de atenção à fam ília e a visita as instituições que desenvolvem práticas com fam ílias, também, são destacadas pelos docentes. Esses, consideram inquestionável a repercussão da realização da visita domici liar e consu lta de enfermagem para aprendizagem dos alunos, pois nestas atividades é que 56 R . Bras. Enferm. , B ras ília, v . 53, n . especial , p . 49-59 , d e z . 2000 Formando o enfermeiro para o cuidado à Saúde da Família . . . ocorre a abordagem com a s fam ílias e, conseq uentemente, a ação educativa de como cuidar com a fam ília. A capacitação profissional , incl u i ndo a pesqu isa, é considerada, pelos p rofessores, como um fator que acresce significativamente o processo educativo. Um professor referiu ''ter utilizado bastante da m i n h a vivência, por ocasião da dissertação de mestrado . . . eu p rocuro , agora, trabalhar com este enfoque, porque todos os alunos necessitam de uma instru mental ização para conseguir vivenciar esta situação de dor e dificu ldade que a possibil idade de perda da criança, como os fami l iares também . . . e u acho que m u ito daquilo que a gente evidencia n a pesqu isa qualitativa vai nos dando suporte para também trabalhar esses fenômenos j unto com os alu nos." Segundo Moraes ( 1 999) , quando a pesq uisa em sala de aula é compreendida e assumida de forma adequada pode traze r m u itas vantagens, pois perm ite aos participantes " . . . u m melhor conhecimento de si mesmos e do m u ndo, estabelecendo relações significativas entre conhecimento que já têm e novos conhecimentos investigados ." Entre as dificu ldades sentidas por professores, encontra-se a de visualizar o cliente , indivíduo, ou fam ília, como u m todo , porque o enfoque domi nante , tanto nas i nstitu ições de saúde como nas i nstituições formadoras de profissionais de saúde, ainda é biomédico e curativo. Assim, o distanciamento do enfoque hol ístico na formação, não fornece, m uitas vezes, a esses alunos, a compreensão profunda dos problemas h u manos. O utra d ificuldade no desenvolvimento da atividade teórico-prática, relacionada por alguns p rofesso res , é associada às co n d i ções aprese ntadas pelos a l u nos. Dois aspectos são aq u i considerados . A aceitação dos alunos a esta p rática apresenta particularidades, algu mas delas decorrentes do próprio perfi l pessoal do aluno: " . . . tem os que chegam ávidos para conhecer, exercitar; e tem os que chegam céticos e com os estudos descobrem o enorme campo de trabalho que oferece a prática com fam ílias" . Também , a falta de motivação dos alu nos refere-se ao fato de nas visitas domicil iares haver "grande dificuldade de entrar na casa das pessoas . E o ambiente , porque em uma i nstituição as pessoas chegam despidas do cotidiano, ( . . . ) o cotidiano tem um peso m u ito forte ( . . . ) que a gente sente no domicil io". As formas de avaliar a p rática acadêmica , a fim de mel hora-lá, necessitam além das já conhecidas determinações regimentais, oferecer uma ampla oportu n idade de analisar o que se faz, comparando os resu ltados alcançados com os objetivos constitu ídos e como percorreu-se o caminho. Na percepção dos professores o processo de aval iação é participativo, inclue autoavaliação e analise do desempenho dos alunos em atividades propostas, tais como seminários e estudo de caso . O trabalho conj unto professor/aluno/família, decorrente das atividades pedagógicas, propricia o crescimento mútuo, a valorização do processo vivencial e a h u manização da ação educativa. CONSI D E RAÇÕES FINAIS Ensinar a promoção , recuperação e man utenção da saúde na fam ília, a fim de promover saúde para cada u m de seus membros e da fam ília como u n idade, é um p rocesso complexo e , nesse sentido, reconhece-se que os próprios estágios familiares, gerando múltiplas necessidades, demandam constante i nteração com d ive rsos profissionais i nterdisciplinares e institu ições . Aprende-se , então , que o apoio teórico a i nterdisciplinariedade, o con heci mento e o confronto das situações e condições vivenciais, bem como das relações fam i l i ares habituais e em crises contextualizam e fundamentam as i ntervenções e atividades de enfermagem determi nantes aos processos educativo e assistencial , colaboradores à apredizagem acadêmica e a mel horia das necessidades do g rupo fami l iar. É portanto na prática com a d isci plina de Enfermagem na Comunidade que a assistência à fam ília torna-se u m contín uo acadêmico-assistencia l , justamente por ocorrer no espaço que a fam ília experencia a complexidade do seu viver, que é u ma resu ltante de sua confi g u ração , estrutu ra, organização, funções papéis, estilo de vida, crenças , valores, m itos, riscos, rede de apoio i ntra fami l iar e com u n itária e o g rau de competência para cumprir seus comprom issos . R. Bras. Enferm. , B ras ília, v. 53, n. especial , p. 49-59, dez. 2000 57 SANTOS, Beatriz Regina Lara dos et aI. A leitu ra da vivência dos professores, leva-nos a pensar que a Educação de Enfermagem na área de P rática Profissional com fam ílias, encontra-se em u m estado de arte , que tenta não i ncorporar o conhecimento oriundo do modelo biomédico e da educação tradicional, pois busca, g radativamente, o entendimento da vivência dos sujeitos do processo educativo, o conhecimento proveniente da análise de situações vivenciadas na prática, assim como a h uman ização de suas élções. REFERÊNCIAS BI BLIOGRÁFICAS AC K E R M A N , Nathan W. Diagnóstico y tra tamiento de las relaciones familiares: psicod i na m i s m o s d e la vida fam i l ia r. Buenos Ai res : Paidós, 1 982. A N D R É , Marl i E l iza D . A . de Etinografia da prática escolar. Campi nas: Pap i rus, 1 995. ASSOC IAÇÃO BRAS I L E I RA D E E N F E R M AG E M . A nova lei do exercício profissional da enfermagem. Bras ília: A B E n , 1 987. BRAS I L, M i n istério da Saúde. Programa Saúde da Família: na saúde dentro de casa. 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