. . ESTUDO DAS INUNDAÇÕES DO RIO MONDEGO A JUSANTE DA CONFLUÊNCIA DO RIO CEIRA FLOOD INUNDATION STUDY OF RIVER MONDEGO DOWNSTREAM OF THE CONFLUENCE WITH RIVER CEIRA ÉTUDE DES INONDATIONS DU FLEUVE DU MONDEGO EN AVAL DE LA CONFLUENCE DU FLEUVE DU CEIRA Cliente Cofinanciamento ESTUDO DAS INUNDAÇÕES DO RIO MONDEGO A JUSANTE DA CONFLUÊNCIA DO RIO CEIRA RESUMO Neste estudo procede-se à caracterização das inundações do rio Mondego a jusante da confluência do rio Ceira. O estudo integra-se na Componente 2 - Modelação de recursos hídricos – cartas de zonas inundáveis fluviais do projeto “Modelação de dados geográficos e modelação matemática dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos para o planeamento e gestão dos recursos hídricos sob jurisdição da ARH do Centro”. O estudo assenta em três vertentes complementares, nomeadamente, análise bibliográfica, análise da informação de base e simulação em modelo matemático de eventos extremos de cheias e elaboração de cartas de zonas inundáveis. A análise da informação de base revelou a inexistência de valores de níveis e caudais no trecho regularizado do rio Mondego o que inviabilizou a calibração dos coeficientes de rugosidade do modelo. Atendendo aos limites da informação de base, efetuaram-se várias hipóteses de trabalho no estudo e na definição dos cenários de simulação. As simulações em modelo computacional conduziram a resultados que, embora não definitivos face às lacunas de informação de base, permitiram caracterizar as condições de escoamento no rio Mondego e elaborar as cartas de zonas inundáveis em Coimbra. LNEC - Proc. 0605/541/5759 i ii LNEC - Proc. 0605/541/5759 ÍNDICE 1. INTRODUÇÃO .............................................................................................................................. 1 2. DESCRIÇÃO GERAL DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO MONDEGO E DAS INTERVENÇÕES REALIZADAS .................................................................................................. 3 2.1. Descrição da bacia hidrográfica do rio Mondego ........................................................3 2.2. Intervenções realizadas na bacia hidrográfica do rio Mondego .................................4 2.3. 3. 5. Enquadramento ....................................................................................................4 2.2.2. Aproveitamentos Aguieira-Raiva e Fronhas .........................................................5 2.2.3. Regularização fluvial do Baixo Mondego..............................................................6 2.2.4. Açude-Ponte de Coimbra ...................................................................................12 2.2.5. Rega e enxugo dos campos do Mondego ..........................................................12 Cheias .............................................................................................................................13 2.3.1. Cheias históricas .................................................................................................13 2.3.2. Cheias em regime natural ...................................................................................15 INFORMAÇÃO DE BASE .......................................................................................................... 16 3.1. Informação disponível ...................................................................................................16 3.2. Análise da informação disponível ................................................................................18 3.3. 4. 2.2.1. 3.2.1. Dados de geometria............................................................................................18 3.2.2. Dados hidráulicos ...............................................................................................23 3.2.3. Ocupação do solo ...............................................................................................25 Comentários finais .........................................................................................................26 METODOLOGIA ......................................................................................................................... 27 4.1. Hipóteses simplificativas ..............................................................................................27 4.2. Metodologia ....................................................................................................................27 4.3. Modelo HEC-RAS ...........................................................................................................29 APLICAÇÃO DO MODELO. ANÁLISE DOS RESULTADOS ................................................... 30 5.1. Identificação dos cenários de simulação ....................................................................30 5.2. Valores adotados da rugosidade do leito e margens ................................................33 5.3. Análise dos resultados..................................................................................................34 5.4. 5.3.1. Cenários 1 e 2 .....................................................................................................34 5.3.2. Cenários 3 e 4 .....................................................................................................37 5.3.3. Cenários 5 e 6 .....................................................................................................40 Análise de sensibilidade dos resultados a variações dos coeficientes de rugosidade e níveis a jusante ......................................................................................43 6. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES..................................................................................... 47 LNEC - Proc. 0605/541/5759 iii iv LNEC - Proc. 0605/541/5759 ÍNDICE DE QUADROS Quadro 1 – Características da secção transversal tipo considerada no projeto do leito central do rio Mondego nos seus diferentes troços .................................................................7 Quadro 2 – Caudais de cheia nos afluentes do Baixo Mondego (extraído de Lencastre 2004) .....7 Quadro 3 – Sistema de descarga controlada ...................................................................................8 Quadro 4 – Estimativas das cheias em regime natural na bacia do rio Mondego (extraído de PGBH do Mondego, Vouga e Lis)..............................................................................15 Quadro 5 – Tipo de ocupação na zona em estudo ........................................................................26 Quadro 6 – Cenários de simulação ................................................................................................31 Quadro 7 – Secções de referência .................................................................................................32 Quadro 8 – Valores adotados da rugosidade do leito e margens do rio Mondego .......................34 Quadro 9 – Resultados do modelo para os cenários 1 e 2 ............................................................37 Quadro 10 – Resultados do modelo para os cenários 3 e 4 ..........................................................39 Quadro 11 – Resultados do modelo para o cenário 5 ...................................................................42 Quadro 12 – Resultados do modelo para o cenário 6 ...................................................................43 Quadro 13 – Influência dos níveis de maré (NM) nas cotas da superfície livre relativas ao cenário 1 ....................................................................................................................45 Quadro 14 – Influência dos coeficientes de rugosidade nas cotas da superfície livre relativas ao cenário 1 ...............................................................................................................46 LNEC - Proc. 0605/541/5759 v ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 – Rede hidrográfica no trecho final do rio Mondego ..........................................................1 Figura 2 – Distribuição anual dos valores médios da precipitação, temperatura, evapotranspiração potencial e do escoamento em regime natural na bacia hidrográfica do rio Mondego (PGBH, 2011) ................................................................4 Figura 3 – Secção transversal tipo considerada no projeto do leito central do rio Mondego ..........7 Figura 4 − Leito central do rio Mondego na fase de construção. Margens e esporão .....................9 Figura 5 − Leito central do rio Mondego. Aspeto do 1º esporão no troço regularizado a jusante do Açude-Ponte de Coimbra. Foto de 10/12/1999 .........................................9 Figura 6 − Leito central do rio Mondego. Vista para montante: esporão nº 3 e vegetação no interior da secção transversal. Foto de 01/04/2003...................................................10 Figura 7 − Leito central do rio Mondego. Ilha formada a jusante do 2º esporão no troço regularizado a jusante do Açude-Ponte de Coimbra. Foto de 10/12/1999 ...............10 Figura 8 − Leito central do rio Mondego. Aspeto da destruição do esporão nº 4 na sequência da cheia de janeiro de 2001. Foto de 22/06/2001 .....................................................11 Figura 9 − Leito central do rio Mondego. Reconstrução do esporão nº6. Banco de areia localizado junto à margem direita. Foto de 01/04/2003 .............................................11 Figura 10 − Leito central do rio Mondego. Vista para montante. Bancos de areia junto à margem esquerda a jusante do esporão nº 4. Foto de 22/06/2001 ..........................12 Figura 11 – Caudal afluente ao Açude-Ponte de Coimbra entre 1 de dezembro de 2000 e 1 de fevereiro de 2001 ..................................................................................................14 Figura 12 – Caudal afluente ao Açude-Ponte de Coimbra entre 26 e 31 de janeiro de 2001 .......14 Figura 13 – Informação utilizada na construção do modelo digital do terreno ..............................18 Figura 14 – Secções transversais do rio Mondego ........................................................................20 Figura 15 – Perfil longitudinal do rio Mondego a jusante da confluência do rio Ceira ...................22 Figura 16 – Configuração típica do leito do fundo a jusante da zona de esporões e quedas .......22 Figura 17 – Caudais médios diários efluentes do Açude-Ponte de Coimbra ................................23 Figura 18 – Relação entre cotas do nível na albufeira do Açude-Ponte de Coimbra e caudais descarregados no período de 1 de dezembro de 2000 a 31 de janeiro de 2001 ......24 Figura 19 – Relação entre o nível médio do escoamento no leito central do Mondego junto à estação elevatória do rio Foja e os caudais médios diários efluentes do AçudePonte de Coimbra no período de 2004 a 2012..........................................................25 Figura 20 – Perfil longitudinal da superfície livre para o cenário 1 ................................................35 Figura 21 – Pormenor dos perfis da superfície livre e da velocidade média do escoamento para o cenário 1 .........................................................................................................35 vi LNEC - Proc. 0605/541/5759 Figura 22 – Perfil longitudinal da superfície livre para o cenário 2 ................................................36 Figura 23 – Perfil longitudinal da superfície livre para o cenário 3 ................................................38 Figura 24 – Perfil longitudinal da superfície livre para o cenário 4 ................................................38 Figura 25 – Cotas do nível na albufeira do Açude-Ponte de Coimbra observadas na cheia de 2001 e calculadas pelo modelo .................................................................................40 Figura 26 – Perfil longitudinal da cota máxima da superfície livre para o cenário 5 ......................41 Figura 27 – Perfil longitudinal da cota máxima da superfície livre para o cenário 6 ......................41 Figura 28 – Propagação do hidrograma de cheia no cenário 5 .....................................................42 Figura 29 – Influência da variação dos níveis de maré nos resultados relativos ao cenário 1......44 Figura 30 – Influência da variação dos níveis de maré nos resultados relativos ao cenário 1 (pormenor) .................................................................................................................44 Figura 31 – Influência da variação dos coeficientes de rugosidade nos resultados relativos ao cenário 1 ...............................................................................................................46 ÍNDICE DE FIGURAS DO ANEXO Figura I.1 – Altimetria na zona em estudo......................................................................................53 Figura I.2 – Secções transversais do rio Mondego utilizadas no modelo ......................................55 Figura I.3 – Secções transversais do rio Mondego utilizadas no modelo: pormenor da zona próxima de Coimbra ...................................................................................................57 Figura I.4 – Ocupação do solo na zona de estudo ........................................................................59 Figura I.5 – Ocupação do solo na zona de estudo: pormenor da zona próxima de Coimbra .......61 Figura I.6 – Carta de zonas inundáveis junto a Coimbra ...............................................................63 Figura I.7 – Identificação dos trechos dos diques do leito regularizado do rio Mondego passiveis de serem galgados.....................................................................................65 LNEC - Proc. 0605/541/5759 vii ESTUDO DAS INUNDAÇÕES DO RIO MONDEGO A JUSANTE DA CONFLUÊNCIA DO RIO CEIRA 1. INTRODUÇÃO Foi solicitado ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC), pela Administração da Região Hidrográfica do Centro (ARH Centro), a execução do projeto “Modelação de dados geográficos e modelação matemática dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos para o planeamento e gestão dos recursos hídricos sob jurisdição da ARH do Centro”. O projeto compreendeu quatro componentes (estudos), desenvolvidas paralelamente, designadamente: • Componente 1: Desenvolvimento e implementação da especificação de informação geográfica através de modelos de dados geográficos; • Componente 2: Modelação de recursos hídricos – cartas de zonas inundáveis fluviais para os trechos dos rios Mondego e Vouga compreendidos entre a confluência do rio Ceira e o limite de propagação da maré e, entre Águeda e Cacia respectivamente; • Componente 3: Modelação da inundação na ria de Aveiro e no estuário do rio Mondego; • Componente 4: Modelação qualitativa e quantitativa em aquíferos. O presente relatório diz respeito à Componente 2, elaboração de cartas de zonas inundáveis fluviais, em particular para o trecho do rio Mondego entre a confluência do rio Ceira e o limite de propagação da maré (Figura 1). Figura 1 – Rede hidrográfica no trecho final do rio Mondego LNEC - Proc. 0605/541/5759 1 O trecho do rio Mondego em estudo integra-se no conjunto de intervenções realizadas no âmbito do plano geral do Aproveitamento Hidráulico da bacia do Mondego. Essas intervenções incluíram a regularização fluvial do leito central do rio Mondego e a construção de diques de proteção de cheias, a construção de barragens a montante para o controlo de cheias e produção de energia, e a realização de obras de rega e enxugo dos campos do Baixo Mondego. A caracterização do comportamento hidráulico do trecho regularizado do rio Mondego reveste-se de grande importância no contexto da proteção contra cheias dos campos do Baixo Mondego, em particular, após os eventos de cheias ocorridos em 2001. Nesse âmbito procedeu-se à simulação das condições de escoamento no trecho do rio Mondego a jusante da confluência do rio Ceira tendo como objetivo a determinação das zonas inundáveis. Antecedendo a elaboração deste relatório procedeu-se a uma recolha da informação de base disponível, incluindo referências bibliográficas relevantes. Este relatório foi organizado em seis capítulos. Após a introdução, procede-se no Capítulo 2 a uma descrição sumária da bacia hidrográfica do rio Mondego e das intervenções realizadas tendo em vista a regularização fluvial e o controle e defesa contra cheias do Baixo Mondego. No Capítulo 3 analisase a informação de base disponibilizada para a realização do estudo, identificando-se os limites e lacunas da informação e a necessidade de se obterem mais dados. No Capítulo 4 é descrita a metodologia utilizada no estudo, incluindo as hipóteses e simplificações consideradas e a descrição sumária do modelo computacional. No Capítulo 5 são definidos os cenários de simulação e apresentados os resultados da aplicação do modelo computacional. Por último, no Capítulo 6 apresentam-se as conclusões e recomendações do estudo. 2 LNEC - Proc. 0605/541/5759 2. DESCRIÇÃO GERAL DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO MONDEGO E DAS INTERVENÇÕES REALIZADAS 2.1. Descrição da bacia hidrográfica do rio Mondego O rio Mondego nasce na Serra da Estrela, a 1425 m de altitude e percorre 258 km até desaguar no Oceano Atlântico, junto à Figueira da Foz. A sua bacia hidrográfica, com uma área de cerca de 2 6645 km , tem uma forma alongada com eixo maior na direção NE-SW. É limitada a Norte e Este pelas bacias dos rios Vouga e Douro, e a Sul, pelas bacias dos rios Lis e Tejo. Os principais afluentes do rio Mondego são, na margem esquerda, os rios Pranto, Arunca, Ceira e Alva, e, na margem direita, o rio Dão. A bacia hidrográfica do rio Mondego estende-se por duas unidades geológicas distintas: a Meseta Ibérica e a Orla Mesocenozóica Ocidental, que imprimem características diversas à sua rede hidrográfica. A maior parte do trajeto do rio Mondego faz-se em vales bastante encaixados em rochas metamórficas e granitóides (anteordovícios e pré-câmbricos), comprimindo-se na passagem Entre Penedos, na crista quartzítica Buçaco-Penacova. O troço terminal, a jusante de Coimbra (Baixo Mondego), com cerca de 40 km, percorre uma planície aluvial instalada na cobertura mesocenozóica, até desaguar no oceano Atlântico junto da cidade de Figueira da Foz. Na bacia hidrográfica do rio Mondego predominam as zonas de florestas, as áreas de vegetação arbustiva e as zonas agrícolas. Na região do Baixo Mondego os espaços florestais são também predominantes mas as culturas de regadio e arrozais e as culturas de sequeiro e as zonas artificializadas assumem nesta região maior representação. O clima na bacia hidrográfica do rio Mondego é do tipo mesotérmico (temperado), húmido, com estações de Verão e Inverno bem definidas, inserindo-se nos climas do tipo mediterrânico, com influência oceânica. A temperatura média do ar na bacia é aproximadamente de 13,4ºC. Nas zonas montanhosas da Serra da Estrela e da Serra do Caramulo a temperatura média é de cerca de 10ºC, enquanto na zona do Baixo Mondego e junto à costa a temperatura média atinge os 15ºC. De acordo com o Plano de Gestão das Bacias Hidrográficas do Mondego, Vouga e Lis (PGBH, 2011), o valor médio da precipitação anual ponderado na bacia hidrográfica do rio Mondego é de 1073 mm, e os valores médios ponderados da evapotranspiração potencial e do escoamento de 1042 mm e 569 mm, respectivamente. Na Figura 2 apresenta-se a distribuição anual dos valores médios da precipitação, temperatura, evapotranspiração potencial e do escoamento em regime natural na bacia hidrográfica do rio Mondego. O escoamento mensal, tal como as restantes variáveis hidrológicas, apresenta uma acentuada variação sazonal, marcada por um semestre húmido, de outubro a março, e um semestre seco, de abril a setembro. Verifica-se que mais de 70% da precipitação e das afluências anuais em LNEC - Proc. 0605/541/5759 3 regime natural concentram-se no semestre húmido. A afluência média anual na bacia do rio Mondego 3 em regime natural é de 3790 hm , a que corresponde um escoamento médio anual de cerca de 160 25 140 20 120 100 15 80 10 60 40 5 Temperatura média (ºC) Precipitação, evapotranspiração potencial e escoamento médios (mm) 569 mm. 20 0 0 Out Nov Dez Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Mês Precipitação Evapotranspiração potencial Escoamento (regime natural) Temperatura Figura 2 – Distribuição anual dos valores médios da precipitação, temperatura, evapotranspiração potencial e do escoamento em regime natural na bacia hidrográfica do rio Mondego (PGBH, 2011) 2.2. Intervenções realizadas na bacia hidrográfica do rio Mondego 2.2.1. Enquadramento No passado, devido ao regime irregular do rio Mondego e às características do seu vale aluvionar, os campos do Baixo Mondego eram sucessivamente inundados, provocando graves prejuízos às populações aí instaladas, com a perda de vidas humanas, danificando campos agrícolas e vias de comunicação. Simultaneamente, a erosão da parte superior da bacia hidrográfica e o consequente transporte de sedimentos originou o assoreamento progressivo do leito do rio e da planície aluvionar, traduzido numa subida de 15 m do vale aluvionar do Mondego. O aparecimento de mouchões e ínsuas diminuíram a capacidade de vazão do rio, enfraquecendo as motas e agravando a frequência das inundações nos campos. A necessidade de defesa do Baixo Mondego cedo motivou a procura de soluções para minorar os prejuízos das inundações. Em Sanches (1996) são descritas as sucessivas intervenções preconizadas para o rio Mondego, bem como os conceitos e objetivos que as presidiram. Entre outras, refere-se a abertura de um novo leito do rio Mondego, no século XVIII, de acordo com o 4 LNEC - Proc. 0605/541/5759 projeto elaborado pelo padre Estêvão Cabral, e o projeto do “Aproveitamento Hidroagrícola e Hidrelétrico da Bacia do Mondego”, datado de 1940, da Junta Autónoma das Obras de Hidráulica Agrícola. Em 1962, a Direcção-Geral dos Serviços hidráulicos apresentou o plano geral do aproveitamento hidráulico da bacia do rio Mondego. Este plano preconizava a regularização das cheias através de albufeiras de fins múltiplos a criar a montante, nomeadamente pelas barragens da Aguieira e do Alva (Fronhas) e a criação de um sistema de leitos regularizados no Baixo Mondego. De acordo com DGRN (1988) o plano visava “o aproveitamento integrado dos recursos hídricos da bacia e a sua utilização em múltiplos fins: produção energética, regularização fluvial, correcção torrencial, controle e defesa contra cheias, abastecimento de água a populações e indústrias, reorganização da rede viária regional, valorização das componentes ambientais, piscícolas, recreativas e de apoio ao turismo e o desenvolvimento agrícola através da rega.” Com a aprovação do Plano de 1962 foram executadas diversas obras na bacia hidrográfica do rio Mondego, que se descrevem nas secções seguintes. 2.2.2. Aproveitamentos Aguieira-Raiva e Fronhas Tendo como objetivo a regularização dos caudais do rio Mondego e dos seus afluentes (rios Dão e Alva) foram criadas as albufeiras da Aguieira (rio Mondego) e de Fronhas (rio Alva). 3 O aproveitamento da Aguieira cria uma albufeira com a capacidade total de 430 hm que permite a regularização das afluências para fins de controlo de cheias, rega e produção de energia. A jusante da barragem da Aguieira, a albufeira da Raiva cria o contra-embalse necessário para permitir aos grupos da central a bombagem de água antes turbinadas, mantendo assim a reserva de água constituída para garantia da rega. O caudal máximo descarregado através dos descarregadores de 3 cheias das barragens da Aguieira e da Raiva é de 2000 m /s. As barragens da Aguieira e da Raiva entraram em funcionamento em 1981. A albufeira de Fronhas destina-se ao controle de cheias do rio Alva e ao desvio, através de túnel, de afluências para a albufeira da Aguieira reforçando a produtividade da central. A capacidade do 3 descarregador de cheia da barragem das Fronhas é de 500 m /s. A barragem entrou em funcionamento em 1985. LNEC - Proc. 0605/541/5759 5 2.2.3. Regularização fluvial do Baixo Mondego As obras de regularização fluvial do Baixo Mondego têm como objetivo a criação de um sistema de leitos estáveis, de forma a poder garantir o escoamento dos caudais líquido e sólido sem a inundação dos campos marginais (DGRN, 1988). O sistema de leitos é constituído pelo leito central e pelos leitos periféricos, que ladeando os campos marginais do rio Mondego recebem os caudais dos afluentes a jusante de Coimbra. O leito central do rio Mondego tem cerca de 36 km de extensão sendo limitado a montante pelo Açude-Ponte de Coimbra e a jusante pela bifurcação do troço estuarial do Mondego que forma a ilha da Murraceira. As obras de regularização do leito central do rio Mondego implicaram a alteração do traçado do rio e da configuração da sua secção transversal. O trecho inicial do leito central, entre Coimbra e Santo Varão, e o trecho final, têm um traçado quase coincidente com o do antigo rio Mondego. Entre Santo Varão e a confluência do rio Foja, o leito central afasta-se do leito aberto no século XVIII em resultado das obras do padre Estêvão Cabral e retoma o traçado do rio Velho de Verride (junto à encosta do lado esquerdo) (DGRN, 1988). O leito central permite o escoamento dos caudais líquidos e sólidos provenientes da bacia hidrográfica a montante do Açude-Ponte de Coimbra e das bacias dos afluentes a jusante do referido açude. Os caudais gerados nos afluentes são escoados pelo leito periférico direito e o rio Foja na margem direita e o leito periférico esquerdo e os rios Ega, Arunca e Pranto na margem esquerda (Figura 1). De acordo com o projeto, o leito central encontra-se dividido em sete troços definidos pelas secções de confluência dos leitos regularizados: o primeiro troço, entre o Açude-Ponte de Coimbra e a confluência do leito periférico esquerdo; o segundo troço, entre as confluências do leito periférico esquerdo e do leito do rio Ega; o terceiro troço, entre as confluências do leito do rio Ega e do leito periférico direito; o quarto troço entre as confluências do leito periférico direito e do leito do rio Arunca; o quinto troço, entre as confluências dos leitos dos rios Arunca e Foja; o sexto troço, entre as confluências dos leitos dos rios Foja e Pranto; o sétimo troço, entre a confluência do leito do rio Pranto e a secção terminal, junto da bifurcação da ilha da Murraceira. O leito central tem uma secção transversal composta por um leito menor, de fundo móvel e margens fixas, e por um leito maior de fundo e margens fixas (Figura 3). O leito menor tem secção trapezoidal com largura variável entre 88,0 e 142,2 m e alturas que oscilam entre 3,7 m a 4,5 m. O leito maior, também com secção trapezoidal, apresenta larguras que variam entre 112,0 m e 380,0 m (Quadro 1). Os taludes do leito menor, bem como zonas localizadas do leito maior (incluindo taludes interiores dos diques) estão protegidos contra a erosão através de um tapete de enrocamento. 6 LNEC - Proc. 0605/541/5759 Figura 3 – Secção transversal tipo considerada no projeto do leito central do rio Mondego Quadro 1 – Características da secção transversal tipo considerada no projeto do leito central do rio Mondego nos seus diferentes troços Troço LM (m) Lm (m) h (m) 1 112,00 88,00 4,50 2 150,00 89,40 4,50 3 166,00 91,80 4,50 4 228,00 91,40 4,50 5 316,00 91,40 a 96,42 4,50 6 332,00 96,42 a 124,48 4,50 a 4,00 7 362,00 124,48 a 142,20 4,00 a 3,70 3 O leito maior foi dimensionado para a cheia centenária amortecida de 1200 m /s associada aos caudais de cheias com período de retorno de 25 anos dos afluentes do Baixo Mondego (Quadro 2). O 3 leito menor foi dimensionado para o caudal dominante de 340 m /s. Quadro 2 – Caudais de cheia nos afluentes do Baixo Mondego (extraído de Lencastre 2004) T = 100 anos T = 25 anos Bacia Giandotti Mockus Sherman Snyder Snyder Regional Ançã 276 172 166 135 95 100 Foja 399 210 265 168 109 151 Cernache 171 65 280 133 77 54 Ega 592 316 104 95 66 122 Arunca 767 698 1075 1213 846 346 Pranto 617 318 480 444 297 167 LNEC - Proc. 0605/541/5759 7 O troço inicial do leito central do rio Mondego, entre o Açude-Ponte de Coimbra e a confluência do leito periférico esquerdo, com uma extensão de 11 872 m, possui onze descontinuidades no fundo do leito menor, de altura igual a 0,5 m, materializadas por soleiras transversais de enrocamento, reforçadas por esporões oblíquos no sentido do escoamento. O objetivo principal dos esporões é gerar perdas de carga localizadas de forma a compatibilizar a -3 perda de carga prevista no leito regularizado do rio Mondego (≅ 0,3×10 ) com o declive do vale -3 envolvente (≅ 0,6×10 ) (Lemos et al. 1991). Os esporões estão inclinados para jusante, fazendo um ângulo com a secção transversal do escoamento igual a 20º. A altura dos esporões é variável entre 4,5 m na zona de encontro com os taludes e 4,0 m na cabeça. A largura do coroamento na cabeça é de 3,0 m e os taludes estão inclinados a 3:1 (Ramalho, 1982). Os esporões e o fundo a jusante das descontinuidades estão revestidos a enrocamento. Da mesma forma estão revestidos com enrocamento os taludes das margens do leito menor na vizinhança do estreitamento e ao longo do canal, como já referido. 3 Para evitar o galgamento dos diques em situações de ocorrência de caudais superiores a 1200 m /s, foram executadas quatro estruturas de descarga ao longo do leito central que constituem o sistema de inundação controlada dos campos. As estruturas, localizadas a montante da confluência do leito periférico esquerdo com o leito central, consistem num dique fusível com capacidade para 3 descarregar 160 m /s, seguindo-se para jusante três descarregadores em sifão com capacidade de 3 descarga de 200 m /s cada. As descargas são iniciadas de jusante para montante, diretamente para o vale central, e posteriormente drenadas através da rede de enxugo e conduzidas até à estação elevatória da Foja que bombeia estes caudais para o leito central. Quadro 3 – Sistema de descarga controlada Caudal em Coimbra Descarregador Tipo 3 (m /s) Caudais de funcionamento 3 (m /s) Período de retorno (anos) Capacidade de descarga 3 (m /s) 1200 4 Sifão 1200-1400 25 200 1400 3 Sifão 1400-1600 75 200 1600 2 Sifão 1600-1800 200 200 1800 1 Fusível 1800-2000 400 160 Nas fotografias que se seguem é possível constatar a evolução do leito central do rio Mondego ao longo do tempo, em particular no que respeita ao revestimento das margens e do leito. O cenário de inexistência de vegetação nas margens, logo após a conclusão das obras de regularização do leito 8 LNEC - Proc. 0605/541/5759 central (Figura 4), foi substancialmente alterado pelo aparecimento de vegetação nas margens que, em determinados locais, cobrem também os próprios esporões (Figura 5 e Figura 6). Figura 4 − Leito central do rio Mondego na fase de construção. Margens e esporão Figura 5 − Leito central do rio Mondego. Aspeto do 1º esporão no troço regularizado a jusante do AçudePonte de Coimbra. Foto de 10/12/1999 LNEC - Proc. 0605/541/5759 9 Figura 6 − Leito central do rio Mondego. Vista para montante: esporão nº 3 e vegetação no interior da secção transversal. Foto de 01/04/2003 A dinâmica do leito central é visível através do desenvolvimento de mouchões nos trechos entre esporões. Estes mouchões resultaram da deposição de materiais erodidos nos trechos aluvionares situados entre os esporões, podendo estar parcialmente cobertos de vegetação incluindo árvores (Figura 7). Estes mouchões podem desaparecer em situações de cheias. Figura 7 − Leito central do rio Mondego. Ilha formada a jusante do 2º esporão no troço regularizado a jusante do Açude-Ponte de Coimbra. Foto de 10/12/1999 Na sequência de um cheia importante ocorrida em janeiro de 2001, que originou a rotura dos diques longitudinais e a consequente inundação dos campos marginais do rio Mondego alguns dos mouchões existentes desapareceram, devido às elevadas velocidades do escoamento. Verificou-se 10 LNEC - Proc. 0605/541/5759 também a destruição de vários esporões (Figura 8), originado o arrastamento dos materiais que constituíam o enrocamento daquelas estruturas para o leito do rio. Os esporões destruídos foram posteriormente reconstruídos, como mostra a Figura 9. Figura 8 − Leito central do rio Mondego. Aspeto da destruição do esporão nº 4 na sequência da cheia de janeiro de 2001. Foto de 22/06/2001 Figura 9 − Leito central do rio Mondego. Reconstrução do esporão nº6. Banco de areia localizado junto à margem direita. Foto de 01/04/2003 A deposição de material aluvionar junto às margens do leito central do rio Mondego que terá sido transportado pelo escoamento durante a cheia de 2001 é ilustrada na Figura 10. LNEC - Proc. 0605/541/5759 11 Figura 10 − Leito central do rio Mondego. Vista para montante. Bancos de areia junto à margem esquerda a jusante do esporão nº 4. Foto de 22/06/2001 2.2.4. Açude-Ponte de Coimbra O Açude-Ponte de Coimbra destina-se a permitir a articulação dos regimes de exploração dos aproveitamentos da Aguieira, Fronhas e Raiva com o regime de caudais na tomada de água para rega e outros fins. Como ponte, foi aproveitado para apoiar a rede viária local. O açude entrou em 3 funcionamento em 1981 e cria um volume total de 1,6 hm . Dispõe de 9 vãos de 15,4 m de largura, separados por pilares com 3 m de espessura, equipados com comportas do tipo sector de 5,5 m de 3 altura. Na margem direita fica situada a tomada de água para um caudal de 25 m /s e na margem esquerda a escada para peixes. A soleira descarregadora do Açude-Ponte tem 26,6 m de altura. A montante, a soleira do açude está à cota 14,3, descendo até à cota 12,7 e terminando a jusante à cota 13,3. O nível de Pleno Armazenamento (NPA) está fixado à cota 18,00 permitindo garantir a alimentação dos canais de rega. O nível de máxima cheia (NMC), à cota 19,0, corresponde ao caudal de 3 2000 m /s valor da cheia milenária modificada pelas albufeiras da Aguieira e de Fronhas. 2.2.5. Rega e enxugo dos campos do Mondego O vale do Baixo Mondego corresponde a uma extensa planície aluvionar, situada entre as cidades de Coimbra e da Figueira da Foz. De acordo com Lencastre (2004) a área total do perímetro de rega 12 LNEC - Proc. 0605/541/5759 perfaz cerca de 15 000 ha, dos quais 30% dedicados à cultura do arroz e 70% correspondentes a outras culturas, nomeadamente, milho e forragens. A rede de rega tem origem na tomada de água do Açude-Ponte e é formada pelo canal condutor geral que se desenvolve em aterro junto aos diques longitudinais do leito central, com uma extensão total na margem direita de cerca de 37 km e na margem esquerda cerca de 4 km. Este canal apresenta uma secção transversal tipo trapezoidal com os taludes inclinados a 1/1,5 (V/H). Este canal permite não só beneficiar as zonas de cultura do Baixo Mondego como ainda reforçar o abastecimento às indústrias da região. A rede de enxugo visa a evacuação das águas em excesso provenientes da rega e da precipitação. A rede é constituída por um sistema de valas principais e secundárias e por um conjunto de estações elevatórias As águas resultantes da drenagem são depois conduzidas para o leito central. 2.3. Cheias 2.3.1. Cheias históricas O regime hidrológico do rio Mondego é muito irregular, em parte devido às características da precipitação, mas sobretudo devido ao papel desempenhado pela morfologia da bacia hidrográfica na geração do escoamento. Efetivamente, a passagem brusca do rio para uma planície aluvionar ampla, depois de percorrer uma série de vales inclinados e estreitos que favorecem a drenagem rápida da bacia a montante de Coimbra, confere ao regime de escoamento na bacia características torrenciais. Antes das intervenções na bacia hidrográfica do rio Mondego, os caudais de cheia podiam atingir 3 3 valores da ordem dos 3000 m /s, muito superiores aos caudais de estiagem, da ordem de 1 m /s. Em DGSHE (1936) são feitas referências às maiores cheias ocorridas no século XX no rio Mondego: a de Fevereiro de 1900, que atingiu a altura de 6 metros acima da estiagem na escala da ponte de Santa Clara, em Coimbra; a de Fevereiro de 1902, cuja cota foi de 5,85 m; a de Dezembro de 1909, que atingiu a altura de 5,75 m; a de Janeiro de 1915, que chegou à altura excepcional de 6,40 m; a de Março de 1924, que atingiu a grande altura de 6,18 m, e, finalmente, a de Dezembro de 1927, que apenas atingiu a altura de 5,30 m. Posteriormente a 1927 não atingiram as águas do Mondego na ponte de Santa Clara a altura de 5 m, nem mesmo durante as notáveis cheias de inverno de 1935-36, pois o máximo registado durante esta época na escala daquela ponte foi de 4,96 m no dia 26 de Dezembro de 1935. 3 O maior caudal observado em Coimbra, com o valor de 2457 m /s, ocorreu no dia 2 de janeiro de 1962. Para efeitos de comparação, referem-se que os caudais no Açude-Ponte de Coimbra com LNEC - Proc. 0605/541/5759 13 períodos de retorno de 25 e 100 anos, calculados recentemente considerando o regime hidrológico 3 3 natural (PGRH, 2011), são de 2131 m /s e 2756 m /s, respectivamente. Mais recentemente, em 27 de janeiro de 2001, a cheia ocorrida na bacia hidrográfica do rio Mondego teve como consequência a rotura dos diques a jusante de Coimbra e a inundação do vale. De acordo 3 com o estudo de Rodrigues et al. (2001) o valor de caudal atingiu os 1990 m /s no Açude-Ponte de Coimbra. Se não existisse qualquer controlo na bacia a montante (em particular a barragem da 3 Aguieira) o valor teria sido de 2800 m /s ao invés do valor anteriormente referido. O mesmo estudo 3 apresenta o caudal afluente à Figueira da Foz que, em regime natural teria sido de 3400 m /s mas, 3 com o encaixe na barragem da Aguieira, terá atingido o valor de 2470 m /s. A cheia de janeiro de 2001 ocorreu após um período de sucessivos eventos de cheia com caudais de ponta acima dos 3 1600 m /s (Figura 11 e Figura 12). Figura 11 – Caudal afluente ao Açude-Ponte de Coimbra entre 1 de dezembro de 2000 e 1 de fevereiro de 2001 Figura 12 – Caudal afluente ao Açude-Ponte de Coimbra entre 26 e 31 de janeiro de 2001 14 LNEC - Proc. 0605/541/5759 2.3.2. Cheias em regime natural A estimativa das cheias em regime natural na bacia hidrográfica do Mondego foi recentemente revista no Plano de Gestão das Bacias Hidrográficas do Mondego, Vouga e Lis (PGBH, 2011). Os caudais de cheia em regime natural são os que se verificariam se não existisse o efeito de amortecimento das cheias nas diferentes albufeiras da bacia hidrográfica do Mondego, em particular, a albufeira da Aguieira. No Quadro 4 reproduzem-se os valores dos caudais de ponta de cheia obtidos para os afluentes do rio Mondego na zona em estudo (jusante da confluência com o rio Ceira). Quadro 4 – Estimativas das cheias em regime natural na bacia do rio Mondego (extraído de PGBH do Mondego, Vouga e Lis) 3 Caudal de ponta de cheia (m /s) Curso de água Área da 2 bacia (km ) T=5 anos T = 10 anos T = 25 anos T = 50 anos T = 100 anos Mondego – AçudePonte de Coimbra 4919,6 1395 1725 2131 2453 2756 rio Ceira 734,0 359 452 566 654 737 Vala de Pereira 75,7 71 91 116 135 153 rio Ega 173,6 128 164 207 240 272 rio Arunca 507,5 276 349 437 506 571 rio Pranto 257,0 170 216 272 315 356 Vala de Ançã 112,8 94 121 153 178 201 Vala Real 329,6 202 257 324 375 423 rio Foja 164,6 123 158 200 231 262 LNEC - Proc. 0605/541/5759 15 3. INFORMAÇÃO DE BASE 3.1. Informação disponível O estudo das condições de escoamento em rios exige informação de base de diferentes tipos, incluindo dados geométricos, hidráulicos e relativos ao material sólido e dados relativos à exploração de albufeiras e de infraestruturas De acordo com o enunciado na proposta do estudo, consideraram-se necessários os seguintes elementos, a disponibilizar pela ARH Centro, para uma caracterização fundamentada das condições de escoamento no rio Mondego: • Planos de Bacia Hidrográfica dos rios Mondego e Vouga; • Levantamentos atualizados dos leitos dos rios e zonas adjacentes a uma escala adequada à modelação hidráulica (por exemplo: 1/500, 1/1000 ou 1/2000); • Levantamentos das infra-estruturas existentes nos leitos dos rios (por exemplo, açudes, pontes, passagens hidráulicas, etc.); • Informação sobre níveis de água (incluindo marcas de cheia), caudais de cheia e hidrogramas de cheia; • Cartografia da ocupação do território (identificação da densidade populacional, identificação das edificações/construções, rede viária e ferroviária, infra-estruturas, zonas agrícolas e atividades económicas existentes). O conjunto de informação disponibilizada para este estudo é composto pelos seguintes elementos: i) Levantamentos do leito do rio Mondego • 301 perfis transversais do rio Mondego desde a foz até ao Açude-Ponte de Coimbra. Estes perfis foram extraídos de “Aproveitamento hidráulico do Baixo Mondego. Levantamento topográfico dos diques, canais, estradas e estruturas fixas do leito central e do leito periférico”, desenhos 159-002-003 (Leito Central – Perfis Transversais), 159-008-001 (Leito Central – Soleiras com Desnível), 159-015-001 (Planta Geral). O levantamento dos perfis foi executado por Visão Topográfica e Geosolve, entre Dezembro de 2004 e Abril de 2005, para o Instituto da Água (INAG). • Levantamento hidrográfico “multipontual” na albufeira do Açude-Ponte de Coimbra. Este levantamento foi executado para o estudo “Desassoreamento da albufeira do açude ponte de Coimbra - Projecto de Execução”, elaborado por CENOR - Projectos de Engenharia, Lda e DHV Portugal, S.A. para a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC) em 2009. • Conjunto de 42 perfis transversais do rio Mondego (26 úteis, na zona do estudo), cujo levantamento foi executado em datas diferentes até 2004, e que constam do estudo “Plano 16 LNEC - Proc. 0605/541/5759 específico da extracção de inertes em domínio hídrico nas bacias do Mondego e do Vouga”, elaborado por FBO Consultores, S.A. e pela CENOR, Projectos de Engenharia, Lda para o Instituto da Água (INAG). ii) Altimetria das margens • Carta militar de Portugal Série M888, do Instituto Geográfico do Exército, à escala 1:25000. • Topografia e altimetria da cidade de Coimbra. Informação extraída do estudo: “Desassoreamento da albufeira do açude ponte de Coimbra - Projecto de Execução”, elaborado por CENOR - Projectos de Engenharia, Lda e DHV Portugal, S.A. para a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC) em 2009. iii) Regime de caudais e cheias • Os caudais de cheia considerados no dimensionamento do leito central do rio Mondego foram extraídos de Lencastre (2004). • Os caudais de cheia em regime natural no rio Mondego e seus afluentes foram extraídos do Plano de Gestão das Bacias Hidrográficas dos rios Vouga, Mondego e Lis (PGBH 2011). • As características da cheia ocorrida em 2001 foram obtidas em Rodrigues et al. (2001) e em Lencastre (2004). iv) Ocupação do solo • Carta de Ocupação do Solo (designada por COS’ 90) do Instituto Geográfico Português, à escala 1:25 000. Período de referência da carta: 1 de julho de 1990 a 31 de agosto de 1990. v) Características do Açude-Ponte de Coimbra • As características geométricas do Açude-Ponte de Coimbra foram consultadas em Sanches (1996) e Lencastre (2004). • A curva de vazão do descarregador do açude e a curva de vazão do rio a jusante do açude foram extraídas dos estudos Faceira (1986) e Rocha (2001), respectivamente. • A série de níveis na albufeira e caudais afluentes e efluentes ao açude durante a cheia ocorrida em janeiro de 2001 foi disponibilizada pelo INAG. vi) Outros dados • Níveis horários da superfície livre do escoamento no leito central do rio Mondego junto à estação elevatória do rio Foja, entre abril de 2004 e janeiro 2012, disponibilizados através do INAG. LNEC - Proc. 0605/541/5759 17 3.2. Análise da informação disponível 3.2.1. Dados de geometria A informação relativa a levantamentos do leito e margens do rio Mondego, a jusante da confluência do rio Ceira, foi disponibilizada em formato digital. Essa informação provém de várias fontes, identificadas na secção 3.1, foi obtida em diferentes datas e possui uma resolução espacial distinta. Tendo em vista a obtenção das secções transversais do rio mondego, incluindo o leito e as zonas de inundação, foi construído um modelo digital do terreno com base na informação geográfica disponível. Na Figura 13 identificam-se os limites da área em estudo e a informação utilizada. As margens foram estendidas aproximadamente até às cotas 20 e 30, respectivamente, a jusante e a montante do Açude-Ponte de Coimbra. Figura 13 – Informação utilizada na construção do modelo digital do terreno Para a caracterização das secções transversais do leito do rio Mondego foram considerados os levantamentos disponibilizados pelo INAG (301 perfis transversais do rio Mondego desde a foz até ao Açude-Ponte de Coimbra) e o levantamento hidrográfico na albufeira do Açude-Ponte de Coimbra (designado por hidrografia de Coimbra). Na caracterização das margens foi utilizada a topografia de Coimbra e a Carta Militar M888. Por vezes foi necessário compatibilizar o terreno na interface entre as várias fontes: em caso de conflito os perfis e a hidrografia tiveram sempre preferência, resultando na eliminação ou alteração dos dados da topografia ou da carta miliar. 18 LNEC - Proc. 0605/541/5759 Na construção do modelo digital do terreno, foi considerado o sistema de referencial PTTM06/ETRS89 - European Terrestrial Reference System 1989. Na Figura I.1 do Anexo I apresenta-se a altimetria da zona em estudo. A partir do modelo digital do terreno foram obtidas as secções transversais do rio Mondego necessárias à aplicação do modelo. Estas secções incluem o leito do rio e as margens e foram determinadas através do traçado de alinhamentos aproximadamente perpendiculares às linhas de corrente. No leito do rio Mondego a jusante do Açude-Ponte, coincidem com os perfis fornecidos pelo INAG. A montante do referido açude, foram definidas secções com espaçamento aproximadamente constante. Refira-se que para a caracterização das singularidades existentes no leito do rio, como por exemplo os esporões e soleiras, foi necessário definir secções adicionais. No Anexo I, Figura I.2 e Figura I.3, indica-se a implantação, em planta, das secções transversais utilizadas na caracterização do trecho do rio Mondego a jusante da confluência do rio Ceira. As secções, num total de 385, foram designadas de S1 a S385, correspondendo a S1 ao limite de jusante do trecho e S385 ao limite de montante. Com exceção das zonas de singularidades, o espaçamento médio entre secções transversais é de 170 m. Na Figura 14 apresenta-se algumas secções transversais do rio Mondego no trecho em estudo. As secções S315 a S385 localizam-se a montante do Açude-Ponte de Coimbra e as secções S10 a S299 localizam-se a jusante, ao longo do trecho regularizado do rio Mondego. O trecho do rio Mondego em estudo tem cerca de 44,7 km de extensão. Nesse trecho, o perfil longitudinal do rio Mondego apresenta três troços distintos (Figura 15). O primeiro, a montante do Açude-Ponte de Coimbra possui declive 0,05%. A jusante do açude, numa extensão de cerca de 25 km, o declive do fundo é idêntico ao anterior mas as cotas do fundo são relativamente inferiores às do trecho inicial. Finalmente, no trecho final do rio Mondego, dada a proximidade da foz e a influência do nível da maré, o declive do fundo é nulo. No trecho intermédio do rio Mondego observam-se sucessivas erosões localizadas no leito do rio. Essas erosões localizam-se a jusante das descontinuidades no fundo do leito (Figura 16), materializadas por quedas de altura igual a 0,5 m e reforçadas por esporões oblíquos no sentido do escoamento (ver 2.2.3). No estudo em modelo físico realizado no LNEC (Ramalho 1982) já havia sido constatada a possibilidade de virem a ocorrer erosões no leito do rio a jusante destas descontinuidades. Em modelo físico foram obtidas profundidades máximas das erosões a cerca de 80-100 m a jusante. Refira-se que no estudo da CENOR/DHV (2009) foi efetuado em 2008 o levantamento do perfil longitudinal do leito na zona da queda nº7. Esse perfil confirmou a erosão localizada a jusante dessa descontinuidade. No mesmo estudo é referido “O possível colapso destas quedas é uma LNEC - Proc. 0605/541/5759 19 eventualidade que suscita preocupação, dado que pode pôr em causa a estabilidade das margens do rio e a dos diques de defesa que lhe estão anexos” (CENOR/DHV 2009). Figura 14 – Secções transversais do rio Mondego 20 LNEC - Proc. 0605/541/5759 Figura 12 – Secções transversais do rio Mondego (cont.) LNEC - Proc. 0605/541/5759 21 25 Açude-ponte de Coimbra 20 15 10 Cota (m) 5 0 -5 -10 0 5000 10000 15000 20000 25000 30000 35000 40000 45000 Distância (m) Figura 15 – Perfil longitudinal do rio Mondego a jusante da confluência do rio Ceira Figura 16 – Configuração típica do leito do fundo a jusante da zona de esporões e quedas 22 LNEC - Proc. 0605/541/5759 3.2.2. Dados hidráulicos O caudal afluente ao limite de montante do trecho do rio Mondego em estudo corresponde à soma do caudal efluente da barragem da Aguieira e de todas as afluências ao rio até essa secção. Entre essas afluências, a contribuição do rio Ceira é a mais importante. Na Figura 17 apresentam-se os caudais médios diários efluentes do Açude-Ponte de Coimbra entre 1 de janeiro de 1987 e 31 de julho de 2012. Num período de mais de 25 anos, os caudais médios 3 diários ultrapassaram os 1000 m /s durante vários eventos de cheia. Nessa figura é evidente a importância dos eventos de cheia de 2001, em que os caudais médios diários aproximaram-se de 3 1800 m /s, valor superior ao caudal de dimensionamento do leito regularizado do rio Mondego. Figura 17 – Caudais médios diários efluentes do Açude-Ponte de Coimbra O Açude-Ponte de Coimbra é operado com nível aproximadamente constante (NPA = 18). Durante cheias intensas as comportas elevam-se acima da superfície livre do escoamento. Nestas situações, o efeito do armazenamento na albufeira criada pelo açude é reduzido ao do volume de água contido no leito em condições naturais. Este tipo de funcionamento é característico das barragens vulgarmente designadas de barragens móveis. Na Figura 18 representa-se a relação entre os níveis na albufeira do Açude-Ponte de Coimbra e os caudais descarregados relativos ao período de 1 de dezembro de 2000 a 31 de janeiro de 2001, no qual ocorreram caudais elevados no rio Mondego. Como se pode observar, para caudais inferiores a 3 cerca de 1200 m /s os níveis mantêm-se próximo do NPA e o caudal efluente é função da abertura das comportas e do número de comportas em funcionamento. Acima daquele valor, os caudais efluentes resultam da curva de vazão do descarregador do açude. LNEC - Proc. 0605/541/5759 23 Figura 18 – Relação entre cotas do nível na albufeira do Açude-Ponte de Coimbra e caudais descarregados no período de 1 de dezembro de 2000 a 31 de janeiro de 2001 Os níveis do escoamento no troço final do rio Mondego são influenciados pela propagação da maré no estuário do Mondego. A caracterização desses níveis é fundamental para estabelecer as condições de fronteira de jusante no modelo matemático. Como foi referido em 3.1, dispôs-se dos níveis horários da superfície livre do escoamento no trecho final do leito central junto à estação elevatória do rio Foja, entre abril de 2004 e janeiro de 2012. Para ilustrar a influência da maré nos níveis do escoamento de jusante apresenta-se na Figura 19 a relação entre o nível médio do escoamento no leito central do Mondego junto à estação elevatória do rio Foja e os caudais médios diários efluentes do Açude-Ponte de Coimbra. Nesta relação, não são tidas em consideração as contribuições dos afluentes do Baixo Mondego devido à inexistência de informação. Como seria de esperar, o efeito da influência da maré nos níveis do escoamento reduz-se com o 3 aumento do caudal. Para caudais inferiores a cerca de 400 m /s, os níveis médios do escoamento podem apresentar variações médias ligeiramente superiores a 2 m, entre baixa- e preia mares. Importa referir que, no período referido, o caudal médio efluente no Açude-Ponte de Coimbra foi 3 inferior a 870 m /s o que não permite caracterizar os níveis a jusante para situações de cheias intensas. 24 LNEC - Proc. 0605/541/5759 Figura 19 – Relação entre o nível médio do escoamento no leito central do Mondego junto à estação elevatória do rio Foja e os caudais médios diários efluentes do Açude-Ponte de Coimbra no período de 2004 a 2012 3.2.3. Ocupação do solo A aplicação do modelo matemático de simulação do escoamento requer a definição de coeficientes de rugosidade no leito do rio Mondego bem como nas margens. Tendo em conta este objetivo foi necessário identificar o tipo de ocupação das margens do Mondego utilizando a Carta de Ocupação do Solo (COS’90) do Instituto Geográfico Português, à escala 1:25 000, datada de 1990, e as imagens aéreas da BING-Microsoft datadas de 2009. Numa fase inicial, e para a zona em estudo, agruparam-se as subclasses de ocupação do solo definidas na COS’90 em 12 classes consideradas representativas do tipo de ocupação na zona. Posteriormente, os limites das áreas associadas a cada uma das 12 classes foram verificados e corrigidos mediante a comparação com imagens aéreas da BING-Microsoft datadas de 2009, obtendo-se o mapa final com a ocupação tipo, que se apresenta no Anexo I (Figura I.4 e Figura I.5). No Quadro 5 apresentam-se as áreas associadas a cada uma das classes de ocupação do solo consideradas. Como seria de esperar, na zona em estudo predominam as áreas de cultura e pomar/floresta com cerca de 83% da área total. LNEC - Proc. 0605/541/5759 25 Quadro 5 – Tipo de ocupação na zona em estudo Tipo de ocupação 2 Área (km ) Área (%) Curso de água - leito 11,76 8,54% Curso de água - margens 3,65 2,65% Áreas pavimentadas abertas/vias de comunicação 0,18 0,13% Áreas pavimentadas semi-ocupadas 0,77 0,56% Edificado pouco denso 3,57 2,59% Edificado denso 2,37 1,72% Terreno improdutivo 0,03 0,03% Vegetação arbustiva 2,08 1,51% Culturas de regadio/sequeiro/arrozais 94,40 68,50% Pomar/floresta pouco denso 8,93 6,48% Pomar/floresta denso 5,48 3,97% Pomar/floresta muito denso 4,59 3,33% 3.3. Comentários finais Do conjunto de informação disponível para a caracterização das condições de escoamento no rio Mondego, a jusante da confluência do rio Ceira, ressalta a inexistência de medições dos níveis de escoamento a jusante do Açude-Ponte de Coimbra. A ausência desta informação impossibilita a calibração do modelo matemático, em particular os coeficientes de rugosidade, aspeto fundamental quando se pretende caracterizar e modelar eventos de cheia no rio e avaliar as zonas suscetíveis de inundação. Para este efeito também não se dispõe de marcas de cheia. Para a monitorização e eventual estudo da evolução do leito aluvionar do rio Mondego e consequente atualização das condições de escoamento, considera-se fundamental o levantamento do leito do rio com uma periodicidade não superior a 5 anos e sempre que ocorram cheias intensas no Baixo Mondego. É conveniente também proceder ao levantamento das margens, a jusante da confluência do rio Ceira. Por último importa referir que o levantamento do leito do rio Mondego a jusante do Açude-Ponte de Coimbra, efetuado em 2004/2005, revelou a existência de erosões localizadas acentuadas a jusante das descontinuidades no leito. Considera-se fundamental o acompanhamento da evolução dessas erosões através de levantamentos periódicos desses trechos do rio. 26 LNEC - Proc. 0605/541/5759 4. METODOLOGIA 4.1. Hipóteses simplificativas O estudo das inundações do rio Mondego a jusante da confluência do rio Ceira baseou-se nas seguintes hipóteses simplificativas: 1) A geometria atual do leito central do rio Mondego pode ser representada pelos levantamentos efetuados em 2004/2005 (trecho a jusante do Açude-Ponte de Coimbra) e em 2009 (trecho a montante do Açude-Ponte de Coimbra) uma vez que, posteriormente a essas datas, não ocorreram cheias intensas capazes de mobilizar e alterar significativamente o leito do rio. 2) O modelo matemático utilizado no cálculo das condições de escoamento no rio Mondego é unidimensional. Atendendo às características geométricas do leito central do rio Mondego, considera-se que a hipótese de unidimensionalidade permite reproduzir adequadamente as condições de escoamento que aí ocorrem. O escoamento nas margens resulta do galgamento dos diques, não existindo, por isso, interação entre o escoamento no leito principal e nas margens. 3) As inundações nas margens do rio Mondego resultam diretamente das cheias ocorridas naquele curso de água e, consequentemente, do galgamento dos diques longitudinais. As eventuais inundações nos campos do Baixo Mondego resultantes das cheias ocorridas nos afluentes não são tidas em consideração neste estudo. Esta hipótese resulta de se admitir que a sua extensão seja relativamente limitada e localizada e ao facto do âmbito deste estudo não incluir a simulação do escoamento nesses afluentes. 4) Na simulação das condições de escoamento no trecho regularizado do rio Mondego não foram considerados cenários de rotura dos diques. Optou-se também por considerar a situação menos favorável correspondente ao não funcionamento das estruturas de descarga. 4.2. Metodologia A metodologia considerada neste estudo assenta numa análise da bibliografia e da informação de base, na simulação em modelo matemático de eventos extremos de cheias e na elaboração de cartas de inundação. A análise bibliográfica e da informação de base foram apresentadas nos capítulos anteriores. Para a aplicação do modelo matemático HEC-RAS e posterior elaboração de cartas de inundação foi seguida a seguinte metodologia: LNEC - Proc. 0605/541/5759 27 i) Análise dos elementos que compõem a zona em estudo a. Delimitação da área de estudo (limites do leito central e cotas máximas das margens) b. Análise de ortofotomapas e fotografias aéreas de Google Earth c. Identificação das estruturas existentes (pontes, açudes, soleiras, esporões) d. Identificação da geometria de base a considerar para a caracterização do leito e das margens e das singularidades ii) Criação de um modelo digital do terreno composto pela informação do leito central, das margens e da topografia e altimetria da cidade de Coimbra e. Verificação do modelo digital do terreno com base na análise de ortofotomapas e fotografias aéreas de Google Earth iii) Obtenção das secções transversais do rio Mondego (leito e margens) iv) Classificação da superfície do modelo digital do terreno em classes de rugosidade f. Análise da ocupação do solo através da COS’90 e de imagens aéreas de elevada resolução do BING/Microsoft. Esta análise incluiu a atualização dos limites da classes com base nas imagens aéreas recentes g. Agrupamento das diferentes classes de ocupação do solo consideradas na COS’90 em 12 classes de ocupação tipo h. Correspondência das classes de ocupação de solo a valores do coeficiente de rugosidade, com base em elementos da bibliografia i. Refinamento dos limites e classes de rugosidade das áreas mediante comparação com as imagens aéreas iv) Utilização do programa ARCGIS com a ferramenta HEC-GeoRAS para preparação dos dados geométricos e de rugosidade para o modelo HEC-RAS j. Construção de TIN com o terreno, rede hidrográfica, secções transversais, classificação de rugosidades vi) Definição dos cenários de simulação k. A definição dos cenários de simulação decorreu diretamente da análise bibliográfica e da informação de base disponível vii) Aplicação do modelo HEC-RAS l. 28 Definição das secções transversais que constituem o domínio de cálculo LNEC - Proc. 0605/541/5759 m. Definição das condições de fronteira do modelo n. Definição das opções de cálculo para a simulação em regime permanente e em regime variável o. Aplicação do modelo HEC-RAS/ realização de simulações do escoamento p. Análise dos resultados viii) Elaboração das cartas de zonas inundáveis para vários cenários de cheias extremas 4.3. Modelo HEC-RAS As condições de escoamento no rio Mondego foram calculadas e analisadas com o software HECRAS – River Analysis System versão 4.1.0, de Janeiro de 2010, que foi desenvolvido pelo Hydrologic Engineering Center para o U. S. Army Corps of Engineers (software disponível em www.hec.usace.army.mil). O software HEC-RAS permite calcular e apresentar graficamente as curvas de regolfo de escoamentos unidimensionais em rios, em regime permanente, lentos ou rápidos, e em regime variável, numa rede de canais com secção natural ou regularizada. Permite considerar no cálculo várias singularidades como: pontes, coletores, diques, confinamentos longitudinais, descarregadores e açudes. O HEC-RAS é um sistema integrado de software concebido para uma utilização interativa das suas diferentes componentes na manipulação dos dados de entrada, na simulação do escoamento e análise dos resultados. Através da sua interface gráfica é possível proceder à gestão de ficheiros, introduzir e editar dados, simular as condições de escoamento, visualizar os dados de entrada e os resultados em tabelas e gráficos e emitir relatórios. O modelo HEC-RAS necessita de informação de base de diferentes tipos: dados geométricos, dados hidráulicos e informação relativa à natureza e rugosidade do leito. O HEC-RAS possui os seguintes quatro módulos de cálculo hidráulico: 1) curva de regolfo em regime permanente; 2) curva de regolfo em regime não-permanente; 3) transporte sedimentar em fundo móvel; e 4) análise de qualidade da água. Os quatro módulos partilham a informação de base e as rotinas computacionais geométricas e hidráulicas. Neste estudo aplicaram-se os módulos de cálculo das condições de escoamento em regime permanente gradualmente variado e em regime variável. LNEC - Proc. 0605/541/5759 29 O módulo de regime permanente foi concebido para apoiar a gestão de zonas inundáveis e análise de risco de inundação de leitos de cheia. Com este módulo é possível analisar as variações na curva de regolfo em resultado das modificações do canal e dos diques das margens. Como foi referido anteriormente, o escoamento é calculado em regime lento, rápido ou ambos, podendo ter em conta o efeito de várias obstruções (pontes, passagens hidráulicas, açudes, descarregadores e outras estruturas). O procedimento computacional é baseado na solução da equação unidimensional da conservação da energia. As perdas de carga são tidas em conta através do atrito (equação de Manning) e pela contração/expansão (produto do coeficiente de contração/expansão pela variação da altura cinética). A equação de conservação da quantidade de movimento é utilizada em situações onde a curva de regolfo varia muito rapidamente. Estas situações ocorrem quando existe a mudança do regime de escoamento (por exemplo no ressalto hidráulico), no atravessamento de pontes e nas confluências de trechos de rio. O módulo de regime variável calcula o escoamento em regime misto (lento, rápido e transições entre ambos, incluindo o ressalto hidráulico) e inclui ferramentas para a análise da rotura de barragens, análise de galgamento e rotura de diques, modelação do funcionamento de estações de bombagem, operação de eclusas e considerar circuitos hidráulicos em pressão. 5. APLICAÇÃO DO MODELO. ANÁLISE DOS RESULTADOS 5.1. Identificação dos cenários de simulação Tendo como objetivo caracterizar as condições de escoamento no trecho do rio Mondego a jusante da confluência com o rio Ceira e obter as cartas de zonas inundáveis foram considerados nas simulações em modelo computacional os cenários apresentados no Quadro 6. A escolha dos cenários teve como objetivo simular situações próximas das consideradas no projeto do leito regularizado e situações correspondentes a eventos de cheias intensas. Como foi referido em 2.2 o leito central do rio Mondego foi dimensionado para a cheia centenária 3 amortecida de 1200 m /s associada aos caudais de cheia com probabilidade de ocorrência uma vez em 25 anos dos afluentes do Baixo Mondego. Os cenários 1 e 2 têm como objetivo simular estas condições diferindo entre si apenas na consideração (ou não) da contribuição dos afluentes. 3 Nos cenários 3 e 4 correspondem à simulação do caudal de 2000 m /s correspondente, no AçudePonte de Coimbra, ao valor da cheia milenária modificada pelas albufeiras da Aguieira e de Fronhas. 30 LNEC - Proc. 0605/541/5759 À semelhança dos cenários anteriores, também se admitem as situações com e sem contribuição dos afluentes. A simulação do hidrograma da cheia ocorrida em janeiro de 2001 é contemplada nos cenários 5 e 6. No cenário 5 pretende-se analisar a propagação do hidrograma de cheia sem a consideração da contribuição dos afluentes. A contribuição dos afluentes do Baixo Mondego é considerada no cenário 6. Quadro 6 – Cenários de simulação Cenário Caudais de cheia • rio Mondego: 1200 m /s 3 1 • sem contribuição dos afluentes do Baixo Mondego • simulação em regime permanente • rio Mondego: 1200 m /s 3 2 • afluentes do Baixo Mondego: 1296 m /s 3 • simulação em regime permanente • rio Mondego: 2000 m /s 3 3 • sem contribuição dos afluentes do Baixo Mondego • simulação em regime permanente • rio Mondego: 2000 m /s 3 4 • afluentes do Baixo Mondego: 1296 m /s 3 • simulação em regime permanente • rio Mondego: hidrograma da cheia de 2001 5 • sem contribuição dos afluentes do Baixo Mondego • simulação em regime variável • rio Mondego: hidrograma da cheia de 2001 6 • afluentes do Baixo Mondego: 1695 m /s 3 • simulação em regime variável Para além dos cenários de simulação referidos no Quadro 6, foram realizadas outras simulações com o objetivo de definir e testar parâmetros do modelo e efetuar uma análise de sensibilidade dos resultados a variações de alguns desses parâmetros (por exemplo, variações da rugosidade do leito e margens e a variações dos níveis de maré a jusante). Estas simulações foram consideradas necessárias uma vez que não se dispõe de valores de níveis e caudais ao longo do rio Mondego para calibração e validação do modelo. A existência de dados de níveis no Açude-Ponte de Coimbra permitiu a calibração e validação de alguns parâmetros do modelo relativos ao funcionamento hidráulico da soleira descarregadora. LNEC - Proc. 0605/541/5759 31 Refira-se que na apresentação e análise dos resultados das simulações selecionaram-se algumas secções transversais, correspondentes a secções de referência do trecho do rio Mondego em estudo. No Quadro 7 identificam-se as secções selecionadas. Quadro 7 – Secções de referência 32 Secção Distância (km) Localização P385 44,7 Limite de montante do trecho a modelar P370 43,2 Secção a montante da confluência com o rio Ceira P332 39,4 Ponte Rainha Santa Isabel (Ponte Europa) P322 38,4 Ponte Pedonal Pedro e Inês P321 38,3 Parque do Choupalinho P315 37,7 Ponte de Santa Clara P299 36,1 Ponte ferroviária P297 35,8 Secção a montante do trecho com as soleiras P247 32,2 Ponte A1 P120 24,0 Secção a montante da confluência com o Leito Periférico Esquerdo; Terminam as soleiras P88 18,4 Secção a montante da confluência com o rio Ega P72 14,9 Secção a montante da confluência com o Leito Periférico Direito P65 13,3 Secção a montante da confluência com o rio Arunca P40 7,9 Secção a montante da confluência com o rio Foja P32 6,3 Ponte A17 P10 1,9 Próximo do limite de jusante LNEC - Proc. 0605/541/5759 5.2. Valores adotados da rugosidade do leito e margens No estudo das condições de escoamento em rios e canais a rugosidade do leito é usualmente traduzida pelo coeficiente de rugosidade de Manning. A rugosidade do leito depende de vários fatores como a configuração do rio, a profundidade do escoamento, as formas de fundo e a granulometria dos materiais do leito, o tipo e a quantidade da vegetação, presença de edificado e outras estruturas, etc. O coeficiente de rugosidade de Manning pode ser obtido através de tabelas, calculado através de expressões empíricas, ou sujeito a calibração. No presente estudo, dado que não se dispõe de informação sobre níveis e caudais que possibilitem a calibração do referido coeficiente, foi necessário recorrer a tabelas disponibilizadas no manual do HEC-RAS. Nessas tabelas são indicados os valores mínimos, médios e máximos do coeficiente de rugosidade de Manning para o leito e margens em função das características do material de que é constituído o leito e também do tipo de ocupação do leito e das margens do rio. O trecho do rio Mondego em estudo (a jusante da confluência do rio Ceira) apresenta características morfológicas e de ocupação das margens diferenciadas. Na secção 3.2.3 foi classificada a ocupação das margens do rio Mondego em áreas pavimentadas abertas/vias de comunicação, áreas pavimentadas semi-ocupadas, edificado pouco denso, edificado denso, terreno improdutivo, vegetação arbustiva, culturas de regadio/sequeiro/arrozais e pomar/floresta pouco denso. Relativamente ao leito do rio, o fundo é móvel e, a jusante do Açude-Ponte de Coimbra, o rio está confinado por diques cobertos de vegetação, incluindo árvores (ver secção 2.2.3). A montante do referido açude, intensifica-se a presença do edificado e de zonas pavimentadas relativas à região urbana de Coimbra. Assim, para aplicação do modelo HEC-RAS foram considerados valores do coeficiente de rugosidade de Manning compreendidos entre 0,013 e 0,150, de acordo com os diferentes tipos de ocupação do leito e margens (Quadro 8). Refira-se que, de acordo com Lencastre (2004), no projeto de regularização do Baixo Mondego foram considerados valores do coeficiente de rugosidade de Manning para o leito central de 0,03. LNEC - Proc. 0605/541/5759 33 Quadro 8 – Valores adotados da rugosidade do leito e margens do rio Mondego Tipo de ocupação Coeficiente de rugosidade de Manning Curso de água - leito 0,028 Curso de água - margens 0,045 Áreas pavimentadas abertas/vias de comunicação 0,013 Áreas pavimentadas semi-ocupadas 0,040 Edificado pouco denso 0,100 Edificado denso 0,150 Terreno improdutivo 0,030 Vegetação arbustiva 0,050 Culturas de regadio/sequeiro/arrozais 0,040 Pomar/floresta pouco denso 0,060 Pomar/floresta denso 0,080 Pomar/floresta muito denso 0,100 5.3. Análise dos resultados 5.3.1. Cenários 1 e 2 Nos cenários 1 e 2 as condições de fronteira de montante correspondem ao caudal de cheia de 3 1200 m /s. Como condição de fronteira de jusante foi considerando o nível médio do escoamento (NM) correspondente à combinação de uma preia-mar e do caudal afluente à foz, ou seja, NM = 3,25 m e NM = 4,25 m, respectivamente para o cenário 1 e 2. Em ambos os cenários consideraram-se os coeficientes de rugosidade do Quadro 8 e no cenário 2 consideraram-se as contribuições dos afluentes do Baixo Mondego. Na Figura 20 apresentam-se os perfis longitudinais do leito do rio Mondego e da superfície livre para o cenário 1. Nessa figura é possível observar o efeito das estruturas de dissipação de energia nas cotas da superfície livre do escoamento. As onze descontinuidades existentes no leito do rio Mondego, constituídas por uma queda e dois esporões inclinados para jusante, provocam um estreitamento brusco da secção transversal e um aumento da velocidade do escoamento (ver Figura 21). Em resultado da maior velocidade do escoamento, a jusante das descontinuidades observa-se a 3 erosão localizada do leito. De acordo com os resultados do modelo, para o caudal de 1200 m /s o 34 LNEC - Proc. 0605/541/5759 valor médio da perda de energia nas descontinuidades é de cerca de 30 cm, próximo do valor obtido no estudo em modelo físico (Ramalho 1982). Figura 20 – Perfil longitudinal da superfície livre para o cenário 1 Figura 21 – Pormenor dos perfis da superfície livre e da velocidade média do escoamento para o cenário 1 LNEC - Proc. 0605/541/5759 35 O perfil longitudinal da superfície livre para o cenário 2 é apresentado na Figura 22. Na mesma figura é representada a variação do caudal ao longo do trecho de simulação resultante da contribuição dos afluentes do Baixo Mondego. Observa-se que a cota da superfície livre se aproxima da cota de coroamento dos diques nos últimos 10 km do trecho em estudo. Figura 22 – Perfil longitudinal da superfície livre para o cenário 2 Os valores das cotas da superfície livre e da velocidade média do escoamento para os cenários 1 e 2 são apresentados no Quadro 9. No troço a montante do Açude-Ponte de Coimbra (secções S315 a S385) os resultados obtidos em ambos os cenários são iguais uma vez que se está a simular o mesmo caudal afluente. No trecho a jusante do açude, as diferenças nos valores das cotas da superfície livre e da velocidade do escoamento acentuam-se à medida que a contribuição dos afluentes se faz sentir. De acordo com os resultados do modelo, os valores máximos da velocidade do escoamento podem atingir os 4 m/s junto a algumas das descontinuidades (soleiras e esporões oblíquos). 36 LNEC - Proc. 0605/541/5759 Quadro 9 – Resultados do modelo para os cenários 1 e 2 Cenário 1 Cenário 2 Secção Distância (km) Cota da superfície livre (m) Velocidade média do escoamento (m/s) Caudal 3 (m /s) Cota da superfície livre (m) Velocidade média do escoamento (m/s) S385 44,7 23,4 2,7 1200 23,4 2,7 S370 43,2 22,6 1,8 1200 22,6 1,8 S332 39,4 20,1 1,8 1200 20,1 1,8 S322 38,4 19,3 2,1 1200 19,3 2,1 S321 38,3 19,4 1,6 1200 19,4 1,6 S315 37,7 18,7 2,2 1200 18,7 2,2 S299 36,1 16,7 2,2 1200 16,7 2,2 S297 35,8 16,6 1,9 1200 16,6 1,9 S247 32,2 14,3 1,7 1200 14,3 1,7 S120 24,0 8,8 1,8 1200 9,3 1,6 S88 18,4 6,8 1,6 1277 7,8 1,4 S72 14,9 5,6 1,5 1399 7,0 1,2 S65 13,3 5,2 1,2 1499 6,9 1,0 S40 7,9 4,3 0,9 2345 5,9 1,3 S32 6,3 4,2 0,9 2496 5,6 1,4 S10 1,9 3,6 0,5 2496 4,7 0,7 5.3.2. Cenários 3 e 4 Nos cenários 3 e 4 procedeu-se à simulação das condições de escoamento para as situações de 3 3 3 caudal constante igual a 2000 m /s e caudal variável (2000 m /s em Coimbra e 3296 m /s na secção no trecho final), respectivamente. A condição de fronteira de jusante corresponde ao nível médio do escoamento (NM), considerado igual a NM = 4,0 m no cenário 3 e igual a NM = 4,5 m no cenário 4. Os coeficientes de rugosidade correspondem aos valores apresentados no Quadro 8. Os perfis longitudinais da superfície livre para os cenários 3 e 4 são apresentados na Figura 23 e na Figura 24. LNEC - Proc. 0605/541/5759 37 Figura 23 – Perfil longitudinal da superfície livre para o cenário 3 Figura 24 – Perfil longitudinal da superfície livre para o cenário 4 3 Como foi anteriormente referido, o caudal de 2000 m /s corresponde, no Açude-Ponte de Coimbra, ao valor da cheia milenária modificada pelas albufeiras da Aguieira e de Fronhas. Para este caudal, os resultados do modelo indicam que, no trecho a jusante do açude, as cotas da superfície livre do 38 LNEC - Proc. 0605/541/5759 escoamento podem ultrapassar as cotas dos diques em algumas secções. No cenário 4, em que a contribuição dos afluentes é tida em consideração, estas situações são mais frequentes. Importa referir que, para evitar o galgamento dos diques em situações de ocorrência de caudais 3 superiores a 1200 m /s, existem quatro estruturas de descarga ao longo do dique da margem direita que permitem a inundação controlada dos campos e, consequentemente, o decréscimo do caudal no leito central. No entanto, neste estudo optou-se por considerar a situação menos favorável correspondente ao não funcionamento dessas estruturas. No Quadro 10 apresentam-se os resultados do modelo para os cenários 3 e 4. Quadro 10 – Resultados do modelo para os cenários 3 e 4 Cenário 3 Cenário 4 Secção Distância (km) Cota da superfície livre (m) Velocidade média do escoamento (m/s) Caudal 3 (m /s) Cota da superfície livre (m) Velocidade média do escoamento (m/s) S385 44,7 24,8 3,3 2000 24,8 3,3 S370 43,2 23,9 2,3 2000 23,9 2,3 S332 39,4 21,2 2,1 2000 21,2 2,1 S322 38,4 20,6 2,2 2000 20,6 2,2 S321 38,3 20,6 1,8 2000 20,6 1,8 S315 37,7 20,0 2,6 2000 20,0 2,6 S299 36,1 18,5 2,6 2000 18,5 2,6 S297 35,8 18,3 2,4 2000 18,3 2,4 S247 32,2 15,6 2,3 2000 15,6 2,3 S120 24,0 10,3 2,3 2000 10,6 0,3 S88 18,4 8,3 2,0 2077 8,7 2,0 S72 14,9 6,8 1,9 2199 7,6 1,7 S65 13,3 6,4 1,5 2299 7,3 1,5 S40 7,9 5,4 1,2 3145 6,1 1,7 S32 6,3 5,2 1,2 3296 6,0 1,1 S10 1,9 4,4 0,6 3296 4,9 0,8 LNEC - Proc. 0605/541/5759 39 5.3.3. Cenários 5 e 6 Nos cenários 5 e 6 procedeu-se à simulação do hidrograma da cheia ocorrida em janeiro de 2001. Nestas simulações, em regime variável, as condições de fronteira de montante correspondem ao hidrograma afluente ao Açude-Ponte de Coimbra entre os dias 26 e 30 de janeiro de 2001. À semelhança das simulações anteriores, a condição de fronteira de jusante corresponde a nível médio do escoamento e os coeficientes de rugosidade aos valores do Quadro 8. Na Figura 25 comparam-se as cotas do nível na albufeira do Açude-Ponte de Coimbra registadas na cheia de 2001 e os valores calculados pelo modelo. Confirma-se a boa aproximação dos resultados do modelo aos valores observados. Refira-se que as diferenças iniciais se devem ao facto de, no modelo, não se ter considerado o efeito das comportas no controlo dos níveis. Este aspeto apenas é refletido nas cotas iniciais e não nos valores dos caudais afluentes e descarregados no açude. Uma vez abertas as comportas, os valores das cotas observadas e estimadas no modelo apresentam boa concordância. Figura 25 – Cotas do nível na albufeira do Açude-Ponte de Coimbra observadas na cheia de 2001 e calculadas pelo modelo Na Figura 26 e na Figura 27 apresentam-se os perfis longitudinais das cotas máximas da superfície livre do escoamento atingidas nas simulações dos cenários 5 e 6. De acordo com os resultados do modelo, na simulação do hidrograma da cheia de 2001 sem contribuição dos afluentes do Baixo Mondego (cenário 5) o desfasamento temporal do pico do hidrograma de cheia entre as secções limítrofes de montante e de jusante do trecho em estudo é de cerca de 9 horas (Figura 28). 40 LNEC - Proc. 0605/541/5759 Figura 26 – Perfil longitudinal da cota máxima da superfície livre para o cenário 5 Figura 27 – Perfil longitudinal da cota máxima da superfície livre para o cenário 6 Os resultados das simulações dos cenários 5 e 6 são apresentados no Quadro 11 e Quadro 12, respectivamente. Nesses quadros, são indicados para cada secção de referência o caudal máximo atingido, a cota máxima da superfície livre e a velocidade máxima do escoamento. Estes valores máximos são registados em instantes temporais diferentes ao longo da simulação do hidrograma da cheia afluente ao Açude-Ponte de Coimbra em janeiro de 2001. LNEC - Proc. 0605/541/5759 41 Figura 28 – Propagação do hidrograma de cheia no cenário 5 Quadro 11 – Resultados do modelo para o cenário 5 42 Secção Distância (km) Caudal máximo 3 (m /s) Cota máxima da superfície livre (m) Velocidade máxima do escoamento (m/s) S385 44,7 1913 24,7 3,2 S370 43,2 1913 23,6 2,3 S332 39,4 1910 21,0 2,1 S322 38,4 1909 20,4 2,3 S321 38,3 1909 20,3 1,9 S315 37,7 1909 19,8 2,6 S299 36,1 1909 18,0 2,7 S297 35,8 1909 17,8 2,5 S247 32,2 1909 15,1 2,4 S120 24,0 1890 10,1 2,2 S88 18,4 1870 8,1 2,0 S72 14,9 1869 6,6 1,8 S65 13,3 1868 6,2 1,5 S40 7,9 1864 5,2 1,2 S32 6,3 1863 5,0 1,1 S10 1,9 1861 4,2 0,6 LNEC - Proc. 0605/541/5759 Quadro 12 – Resultados do modelo para o cenário 6 Secção Distância (km) Caudal máximo 3 (m /s) Cota máxima da superfície livre (m) Velocidade máxima do escoamento (m/s) S385 44,7 1913 24,7 3,2 S370 43,2 1913 23,6 2,3 S332 39,4 1910 21,0 2,1 S322 38,4 1909 20,3 2,3 S321 38,3 1909 20,3 1,9 S315 37,7 1909 19,8 2,6 S299 36,1 1909 18,0 2,6 S297 35,8 1909 17,8 2,5 S247 32,2 1909 15,1 2,4 S120 24,0 1913 10,3 2,2 S88 18,4 1942 8,7 1,8 S72 14,9 2126 7,6 1,7 S65 13,3 2401 7,3 1,5 S40 7,9 3005 6,2 1,6 S32 6,3 3190 5,9 1,6 S10 1,9 3198 4,8 0,8 No estudo de Santos et al. (2002), pág. 28, é referida a existência de levantamentos dos níveis de cheia ocorridos em 2001, efetuados pela DRAOT-Centro. No Centro Náutico do Choupalinho, localizado a montante da Ponte de Santa Clara, a cota do nível de inundação terá atingido os 20,86 m e na secção da Ponte Europa os 21,05 m. De acordo com as simulações realizadas, obteve-se nas secções do Parque do Choupalinho (S321) e da Ponte Europa (S332), respectivamente, 20,3 m e 21,0 m, valores muito próximos dos levantamentos. 5.4. Análise de sensibilidade dos resultados a variações dos coeficientes de rugosidade e níveis a jusante Os resultados das simulações apresentados anteriormente foram obtidos admitindo certos valores do coeficiente de rugosidade de Manning e dos níveis de escoamento a jusante, condicionados pelos níveis da maré. De seguida procede-se a uma análise sobre a influência da variação desses parâmetros nos níveis de escoamento no trecho do rio Mondego anteriormente obtidos. Para esta LNEC - Proc. 0605/541/5759 43 análise, considerou-se como situação de referência os resultados do cenário 1 relativo à simulação 3 em regime permanente do caudal de 1200 m /s. Na Figura 29 apresentam-se os perfis longitudinais das cotas das superfícies do escoamento obtidas considerando diferentes valores do nível de escoamento a jusante, designadamente, 2,5 m, 3,0 m, 3,5 m e 4,0 m. Figura 29 – Influência da variação dos níveis de maré nos resultados relativos ao cenário 1 Figura 30 – Influência da variação dos níveis de maré nos resultados relativos ao cenário 1 (pormenor) 44 LNEC - Proc. 0605/541/5759 Observa-se que o efeito da variação do nível da maré se faz sentir no trecho final do rio Mondego, numa extensão de cerca de 15 km (Figura 30). Esse efeito é progressivamente atenuado à medida que se progride para montante (Error! Not a valid bookmark self-reference.). Na secção S72, localizada a cerca de 15 km do limite de jusante do trecho em estudo, a variação da cota do nível da superfície do escoamento é aproximadamente de 20 cm, para uma variação do nível da maré de 1,5 m. Quadro 13 – Influência dos níveis de maré (NM) nas cotas da superfície livre relativas ao cenário 1 Secção Distância (km) Cotas da superfície livre (m) NM = + 2,5 NM = + 3,0 NM = + 3,5 NM = + 4,0 S88 18,4 6,8 6,8 6,8 6,9 S72 14,9 5,5 5,5 5,6 5,7 S65 13,3 5,1 5,1 5,2 5,4 S40 7,9 4,1 4,3 4,4 4,7 S32 6,3 3,9 4,1 4,3 4,6 S10 1,9 3,1 3,4 3,8 4,2 Relativamente à influência da variação dos valores de rugosidade nos resultados do modelo, considerou-se que os valores médios adotados para o coeficiente de Manning podem apresentar uma variação em relação aos valores adotados (valores de referência) da ordem dos 100 %, ou seja, podem ser 10 % superiores ou 10 % inferiores. Considerando estes cenários de variação dos 3 coeficientes de rugosidade, efetuaram-se novas simulações considerando o caudal de 1200 m /s (cenário 1). Na Figura 31 apresentam-se os perfis longitudinais das cotas das superfícies do escoamento obtidas considerando diferentes valores dos coeficientes de rugosidade de Manning. A consideração de valores superiores do coeficiente de Manning (rugosidades mais elevadas) conduz a níveis de escoamento mais elevados e a consideração de valores inferiores conduz a menores níveis do escoamento. No Quadro 14, e para as secções selecionadas, apresentam-se as cotas do nível da superfície livre correspondentes às simulações efetuadas com os coeficientes de rugosidade de referência e com valores 10% superiores e 10% inferiores. De acordo com os resultados, a diferença das cotas da superfície livre em relação às obtidas no cenário 1 apresenta um valor máximo de 30 cm, ou seja, podem ser 30 cm superiores ou inferiores aos valores de referência. LNEC - Proc. 0605/541/5759 45 Figura 31 – Influência da variação dos coeficientes de rugosidade nos resultados relativos ao cenário 1 Quadro 14 – Influência dos coeficientes de rugosidade nas cotas da superfície livre relativas ao cenário 1 Cotas da superfície livre (m) Secção 46 Distância (km) Coef. rugosidade: Coef. rugosidade: Coef. rugosidade: -10% valores de referência valores de referência +10% valores de referência S385 44,7 23,1 23,4 23,6 S370 43,2 22,4 22,6 22,8 S332 39,4 19,9 20,1 20,2 S322 38,4 19,2 19,3 19,5 S321 38,3 19,2 19,4 19,5 S315 37,7 18,6 18,7 18,9 S299 36,1 16,6 16,7 16,9 S297 35,8 16,5 16,6 16,8 S247 32,2 14,3 14,3 14,4 S120 24,0 8,5 8,8 9,1 S88 18,4 6,6 6,8 7,1 S72 14,9 5,4 5,6 5,8 S65 13,3 5,0 5,2 5,4 S40 7,9 4,2 4,3 4,5 S32 6,3 4,1 4,2 4,3 S10 1,9 3,5 3,6 3,6 LNEC - Proc. 0605/541/5759 6. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES Neste estudo procedeu-se à simulação das condições de escoamento no trecho do rio Mondego a jusante da confluência do rio Ceira tendo como objetivo a determinação das zonas inundáveis. A metodologia considerada no estudo compreendeu as seguintes componentes: i) análise bibliográfica; ii) análise da informação de base; iii) definição de cenários de simulação; e iv) simulação em modelo matemático de eventos extremos de cheias e elaboração de cartas de zonas inundáveis. A análise da bibliografia existente sobre as intervenções realizadas na bacia hidrográfica do rio Mondego, concebidas para a regularização fluvial e controlo de cheias, foi fundamental para a identificação dos cenários de simulação. As afluências ao trecho em estudo são condicionadas pela exploração das barragens existentes, designadamente, da Aguieira e de Fronhas, que permitem o amortecimento de cheias com elevado período de retorno. Assim, as simulações em modelo 3 matemático incluíram os seguintes cenários: i) caudal de 2000 m /s correspondente, no Açude-Ponte de Coimbra, ao valor da cheia milenária modificada pelas albufeiras da Aguieira e de Fronhas; 3 ii) caudal de 1200 m /s considerado no dimensionamento do leito central do rio Mondego; e iii) hidrograma da cheia ocorrida em 2001. Nestes cenários foi considerada a contribuição dos afluentes do Baixo Mondego. Da análise da informação de base constatou-se a inexistência de medições de níveis e caudais no trecho regularizado do rio Mondego. Considera-se que esta informação é fundamental para a calibração do modelo (em particular dos coeficientes de rugosidade) e para a verificação da qualidade dos resultados. Um estudo mais aprofundado das condições de escoamento deverá necessariamente passar pela obtenção dessa informação. Os vários cenários de simulação mostraram que: − 3 Para caudais superiores a 1200 m /s, as condições de escoamento na zona final do trecho simulado (∼15 km) são afetados pelos níveis da maré. Uma vez que não se dispõe de observações de níveis para esses caudais os resultados do modelo devem ser encarados com reserva. − Os resultados do modelo dependem dos valores da rugosidade adotados pelo que, para a sua validação, seria fundamental proceder à medição simultânea de níveis e caudais. − O escoamento dos caudais considerados no dimensionamento do leito regularizado 3 3 (1200 m /s em Coimbra e cerca de 2500 m /s no troço final) não apresenta problemas do ponto de vista das cotas da superfície livre atingidas ao longo do rio. − Na simulação do caudal da cheia milenária modificada pelas albufeiras da Aguieira e de 3 Fronhas (2000 m /s) e na ausência de funcionamento das estruturas de descarga existentes no dique da margem direita, as cotas da superfície livre atingem as cotas dos diques podendo dar origem a galgamento destas estruturas. LNEC - Proc. 0605/541/5759 47 BIBLIOGRAFIA CENOR/DHV (2009) – Desassoreamento da albufeira do Açude-Ponte de Coimbra. 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Figura I.1 – Altimetria na zona em estudo LNEC - Proc. 0605/541/5759 53 54 LNEC - Proc. 0605/541/5759 Figura I.2 – Secções transversais do rio Mondego utilizadas no modelo LNEC - Proc. 0605/541/5759 55 56 LNEC - Proc. 0605/541/5759 Figura I.3 – Secções transversais do rio Mondego utilizadas no modelo: pormenor da zona próxima de Coimbra LNEC - Proc. 0605/541/5759 57 58 LNEC - Proc. 0605/541/5759 Figura I.4 – Ocupação do solo na zona de estudo LNEC - Proc. 0605/541/5759 59 60 LNEC - Proc. 0605/541/5759 Figura I.5 – Ocupação do solo na zona de estudo: pormenor da zona próxima de Coimbra LNEC - Proc. 0605/541/5759 61 62 LNEC - Proc. 0605/541/5759 Figura I.6 – Carta de zonas inundáveis junto a Coimbra LNEC - Proc. 0605/541/5759 63 64 LNEC - Proc. 0605/541/5759 Figura I.7 – Identificação dos trechos dos diques do leito regularizado do rio Mondego passiveis de serem galgados LNEC - Proc. 0605/541/5759 65 66 LNEC - Proc. 0605/541/5759 Divisão de Divulgação Científica e Técnica - LNEC