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[das imagens às coisas]
Texto curatorial para exposição realizada na Escola São Paulo em abril de 2009.
Desde Marcel Duchamp, ao longo de toda a história da arte do século XX,
discute-se o objeto, a autoria, a despersonalização do gesto criativo, o jogo
conceitual e linguístico. A partir dos ready-mades, observa-se a
recontextualização dos objetos cotidianos. Dentro dessas questões, pode-se
abordar os objetos ou as videoinstalações desta exposição por um viés
específico. A complementaridade entre a linguagem videográfica e os elementos
físicos é uma característica comum às três obras expostas.
Ana Paula Lobo insere uma projeção em looping numa maquete. Sua obra O Nu
descendo a escada realiza-se quando a imagem da mulher toca a matéria, ou
seja, quando seus pés tocam delicadamente os degraus da escada da maquete.
E ainda, a estratégia de repetição é ampliada num “eco visual”, pois a imagem
da figura fragmenta-se em várias imagens da mesma mulher. Por outro lado, a
representação do movimento é desacelerada, na medida em que, na edição, a
velocidade é alterada e diminuída.
A inter-relação entre os sistemas físicos e digitais também aparece em Bem-tevi. Nesse trabalho, Eduardo Salvino capta imagens, com um celular, do
mecanismo de uma caixinha de música. Esse vídeo, sem áudio, é exibido no
mesmo celular, que por sua vez está dentro de uma cópia de uma casinha de
João de Barro. A complementaridade dos elementos cria um jogo entre a
mobilidade e a fixidez, entre o antigo e o atual. O celular e o próprio pássaro
remetem ao movimento, entretanto, esse celular está dentro de uma casa, um
ponto fixo. E ainda, o vídeo exibido no celular mostra o mecanismo da caixinha
de música rodando, porém, ele gira em torno do seu próprio eixo. Dentro do
celular, símbolo do movimento na contemporaneidade, está a imagem de um
“movimento analógico”, que explicita uma relação homem-máquina das
primeiras décadas do século XX.
Marcelo Salum exibe um vídeo de um passeio por uma barreiro, local de onde
retira-se material para a produção de cerâmica. A característica volátil da
linguagem do vídeo é transportada para uma “construção” de gordura vegetal
que se desmancha, durante o período da exposição, em contato com o calor e a
luminosidade de uma lâmpada. Mitologias Marginais: Sítio Paciência constrói-se
em processos, formaliza uma experiência multicamadas. Nesse trabalho, o
fragmento torna-se um fluxo de um mesmo movimento: o movimento da
imagem, o movimento do que é mostrado no vídeo, o movimento da luz da
lâmpada, o movimento da gordura vegetal derretendo.
Caracterizo essas três obras como vídeo-coisas, pois ao separar-se signo e
significado dos objetos, estes tornam-se coisas. Coisas porque remetem a
pensamentos abstratos, ou seja, dão vida às relações do mundo. Em seus
tamanhos reduzidos, as coisas chamam a atenção do olhar para o detalhe, a
delicadeza. As imagens fazem parte das coisas e estabelecem um jogo entre
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aquilo que é material e imaterial. Por outro lado, as coisas são imagens, na
medida em que possibilitam experiências sensórias de relações estéticas.
Essas obras abrem uma série de exposições e encontros com os artistas e
curadores do grupo de pesquisa arte&meios tecnológicos (CNPq/FASM), que
integra o mestrado em Artes Visuais da Faculdade Santa Marcelina. Os
membros do grupo são: Christine Mello (coordenação), Ana Paula Lobo, Ananda
Carvalho, Carolina Toledo, Cláudio Bueno, Denise Agassi, Eduardo Salvino,
Josy Panão, Lucas Bambozzi, Marcelo Salum, Mariana Shellard, Monique Allain,
Nancy Betts e Paula Garcia. O grupo, formado em 2007, investiga os processos
artísticos tendo em vista uma posição crítica e experimental no campo das
mediações tecnológicas. Aqui a reflexão e a criação estreitam suas relações.
Texto originalmente publicado na Escola São Paulo, disponível em <!
http://www.escolasaopaulo.org/exposicoes/exposicoes-1/exposicoes-realizadas1/arte-meios-tecnologicos/grupo-1/das-imagens-as-coisas>
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Desde Marcel Duchamp, ao longo de toda a história