Âncora: posturas e evolução de uma atividade jornalística Camila Pérez Gonçalves da Silva* RESUMO Os telejornais são verdadeiros agentes sociais que não apenas transmitem notícias, mas também interpretam e quase sempre opinam sobre os grandes acontecimentos do mundo. Essa opinião fica à cargo do âncora e é isto que abordamos no presente trabalho: a evolução e o espaço cada vez maior ocupado por esses jornalistas que, ao longo do tempo, passaram a representar um importante papel social. Torna-se, portanto, relevante, entender o papel exercido por um único profissional que carrega a responsabilidade, junto aos telespectadores, da veracidade e credibilidade do que está sendo dito. Esta pesquisa tem como objetivo a análise e compreensão do surgimento e evolução da figura do âncora no telejornalismo brasileiro. Constatamos que os âncoras brasileiros podem ser divididos em três diferentes perfis: o formal, o opinativo e o informal. Palavras-Chave: Âncoras. Telejornalismo. Televisão. INTRODUÇÃO Um jornalista que participa de todo o processo de produção de um telejornal e, não só apresenta, como também comenta, interpreta e opina sobre as notícias. Esse é o âncora. O telejornalismo tem evoluído bastante desde o seu surgimento, e, junto com ele, a produção, os textos, as reportagens, a linguagem utilizada e, claro, a performance dos seus apresentadores. Com a evolução tecnológica e o uso frequente da internet como fonte para o telejornalismo, o acesso à informação tem se tornado cada vez mais homogêneo. Dessa forma, os telejornais apresentam praticamente as mesmas notícias. O que vai diferenciá-los é justamente a maneira como essas notícias são apresentadas e quem as apresenta. É aí que * Graduada em Radialismo e graduanda em Jornalismo pela UFPB. Especialista em Redação Jornalística pela Universidade Potiguar/RN. Ano V, n. 06 – junho/2009 2 o âncora entra em ação. Seu carisma, credibilidade e talento para apresentar serão decisivos na escolha do público. Esses profissionais têm transformado o universo do telejornalismo, tal a sua interação com o telespectador. A linguagem que eles usam e a forma como olham para a câmera os tornam íntimos de quem os assiste, fortalecendo assim a credibilidade das notícias que são apresentadas. Eles são a personificação da notícia. Algo que surgiu com a televisão, que é filha do cinema e do espetáculo. No jornal, a informação é impessoal, transmitida por palavras que formam idéias e se transformam em opiniões. No rádio, um locutor intermedia as notícias acrescentado alguma entonação, mas é só com a TV que vem surgir a figura do âncora de fato. O que vemos hoje na televisão é muito mais do que simples locutores que lêem notícias ou jornalistas robotizados que repetem o que está escrito no teleprompter. Temos hoje à frente dos telejornais, verdadeiros agentes sociais que não apenas transmitem notícias, mas também interpretam e quase sempre opinam sobre os grandes acontecimentos do mundo. A performance e o estilo de cada âncora variam de acordo com a linha editorial do programa que apresentam e, também, com os interesses da emissora a que estão ligados. Barbeiro e Lima (2002, p. 76), quando falam desse profissional, destacam que ele não é a notícia, trabalha com ela. Ele “integra um processo para contar a uma parte da sociedade o que a outra está fazendo. Não é a estrela do telejornal, mas é o rosto mais conhecido e familiar do telespectador". São inúmeros os estilos, posturas e formas de apresentar que podemos encontrar, como também são muitos os fatores que determinam essas performances. E é isso que queremos abordar aqui: a evolução e o espaço cada vez maior ocupado por esses profissionais que, ao longo do tempo, passaram a representar um importante papel social. Torna-se, portanto, relevante, compreender esse papel exercido por um único profissional que geralmente carrega a responsabilidade junto aos telespectadores da veracidade e credibilidade do que está sendo dito. Um profissional que é responsável por formar a opinião da grande maioria da população de um país que não lê e onde a televisão costuma ser a única fonte de informação diária. Ano V, n. 06 – junho/2009 3 É um estudo que tem sua importância embasada pelo atual cenário telejornalístico do país onde há mais espaço para um novo modelo de apresentação. Um modelo flexível, que permite um maior nível de informalidade e descontração não apenas na linguagem, como também na dinâmica dentro do cenário. Os objetivos específicos deste trabalho são explicar a origem do âncora no telejornalismo brasileiro; tipificar o âncora da atualidade e relacionar, comparativamente, considerando a apresentação, os principais telejornais dos quatro grandes canais abertos do país. 1 A COMUNICAÇÃO E O SURGIMENTO DO ÂNCORA 1.1 A comunicação e seus meios Imagina-se que tudo tenha começado através de gritos e grunhidos que imitavam os animais. A necessidade de comunicação é inerente ao ser humano desde o mais remoto registro de sua existência. Aos poucos surgiram os signos que inicialmente remetiam a objetos ou ações específicas. Ou seja, o desenho de um sol significava o próprio sol! Os signos, juntamente com seus significados se tornariam a base da linguagem. Percebeu-se, no entanto, que era preciso uma forma de linguagem que permanecesse, um suporte que tivesse maior alcance que a linguagem oral. Daí então se sucederam as pedras, os pergaminhos de couro, depois a imprensa móvel em barro cozido, estanho, madeira e bronze até chegarmos ao papel. Os pictogramas (signos que guardam correspondência direta entre a imagem gráfica e o objeto representado), a escrita ideográfica (onde os signos representam idéias e não mais objetos) e, finalmente, a escrita fonográfica, que é baseada nos fonemas que formam os nomes dos objetos. Esta escrita trouxe o conceito de letra e conseqüentemente o alfabeto tal qual conhecemos até hoje. Paralelamente à evolução da linguagem, desenvolveram-se também os meios de comunicação. E foi em 1450 que Johannes Gutenberg, jovem alemão, fez seus primeiros Ano V, n. 06 – junho/2009 4 experimentos de imprimir com caracteres móveis, criando assim a tipografia e dando o primeiro grande passo para o surgimento da imprensa.† A partir daí, livros que antes eram copiados à mão, passaram a ser impressos repetidamente em muitos exemplares. A tecnologia evoluiu até chegarmos às ultramodernas impressoras computadorizadas de hoje, capazes de receber sinais transmitidos por satélites. Inventou-se a fotografia! Forte aliada no desenvolvimento da comunicação visual, que passou a ilustrar livros, jornais e revistas, originou o cinema e não parou por aí. Depois disso, vieram o telégrafo, o telefone, o rádio, a televisão, o satélite e a internet. Meios cada vez mais rápidos e eficazes na emissão, transmissão e recepção de mensagens e informações, tornando o processo da comunicação cada vez mais ágil e instantâneo. 1.1.1 O jornal impresso O primeiro órgão regular a divulgar notícias foi a gazeta romana Acta Diurna (Realizações Diárias), que começou a ser publicada diariamente em 59 A.C. Afixado por toda a cidade, o jornal foi iniciado pelo imperador Júlio César, e não era muito diferente dos tablóides diários de hoje em dia. Mas aqui o "jornal" não era um meio de comunicação, o objetivo era apenas expor, tornar públicas as novidades sociais e políticas, detalhes de julgamentos criminais e execuções, anúncios de nascimentos, casamentos e mortes, e, até mesmo, os destaques de eventos esportivos e teatrais no Coliseu. É desse "tornar público" que, bem depois, vem surgir o termo publicidade. No início do século XVII, os jornais ganharam a forma atual. O mais antigo deles, que se originou de um boletim comercial que circulava entre os mercadores de Antuérpia e Veneza, talvez tenha sido o holandês Nieuwe Tijdinghen, publicado em 1605. Os mercadores holandeses, que viajavam por todo o mundo, serviam de "correspondentes internacionais", coletando uma variedade de informações das terras distantes.‡ † Retirado do artigo Johannes Gutenberg disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Johannes_Gutenberg. Acesso em 12/02/09. ‡ Retirado do artigo "Jornal e cia" disponível em http://www.triacanto.com.br/down/Jornal.doc. Acesso em 12/02/09. Ano V, n. 06 – junho/2009 5 O primeiro jornal a circular no Brasil foi o Correio Brasiliense, lançado em junho de 1808, por Hipólito da Costa. O jornal, escrito e impresso em Londres, era distribuído no país clandestinamente. Com a vinda da corte portuguesa para o Brasil e a instauração da Imprensa Régia (oficina tipográfica oficial), surge o primeiro jornal impresso no Brasil – A Gazeta do Rio de Janeiro -, dirigido por Frei José Tibúrcio da Rocha. Em meados do século XIX, o jornalismo político entra em declínio. Aparecem as primeiras revistas culturais e os jornais começam a publicar em folhetins, obras de grandes escritores da época como Manoel Antônio de Almeida, José de Alencar e Machado de Assis. Neste mesmo século são fundadas a Cadeia Jornalística Diários Associados, a empresa Folha de São Paulo e as Organizações Globo. 1.1.2 O jornalismo no rádio Após a Primeira Guerra Mundial, com o fim da produção amparada pelo conflito no front europeu, as grandes indústrias eletro-eletrônicas norte-americanas buscam novos mercados para garantir e ampliar seus níveis de lucro. Ainda em 1919, o pernambucano Oscar Moreira Pinto traz para Recife um transmissor fazendo as primeiras experiências do que, depois, se tornaria a Rádio Clube de Pernambuco. Mas, oficialmente, é a pedido da Repartição Geral dos Telégrafos que a Westinghouse promove a primeira demonstração pública, no Brasil, de radiodifusão sonora, feita pelo paraibano Epitácio Pessoa, no dia 7 de Setembro de 1922, durante a Exposição Internacional do Rio de Janeiro, que comemorava o centenário da independência. (FERRARETTO, 2001, p. 93) A demonstração promovida pelo capital norte-americano atingiria o seu objetivo, despertando o interesse dos pioneiros do rádio no Brasil, reunidos em torno de Edgard Roquette-Pinto. Com a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro, criada no ano seguinte, começa efetivamente a trajetória da radiodifusão sonora no país. O rádio começa então a ganhar contornos massivos, embora lentamente, em 1924, quando Elba Dias populariza as transmissões, lançando a Rádio Clube do Brasil, no Rio de Janeiro. Dias começa a incentivar cantores em ascensão na época, divulgando shows e discos, despertando assim o interesse comercial do rádio. (FERRARETTO, 2001, p. 94) Ano V, n. 06 – junho/2009 6 Mas é só em 28 de agosto de 1941, com o mundo na Segunda Guerra, que o radiojornalismo brasileiro cria forma. Foi a estréia do Repórter Esso. Inicialmente na Rádio Nacional, no Rio de Janeiro e na Record em São Paulo, estendendo-se no ano seguinte para o Rio Grande do Sul (Farroupilha), Minas Gerais (Inconfidência) e Pernambuco (Jornal do Comércio). Patrocinado pela Esso Brasileira de Petróleo, com noticiário da United Press International, o Repórter Esso introduziu no Brasil “um modelo de texto linear, direto, corrido e sem adjetivações, apresentado em um noticiário ágil e estruturado”, como afirma Luiz Artur Ferraretto, em seu livro Rádio: o veículo, a história e a técnica. (2001, p. 127). A fórmula copiada dos Estados Unidos confere grande credibilidade ao jornal. Tanto que dois grandes furos que o Esso levou (a morte de Getúlio Vargas, noticiada pela Rádio O Globo e o fim da guerra na Europa, divulgada pela Tupi), não foram levados a sério pela população até que o Repórter Esso tivesse noticiado. Com tanta credibilidade, ser locutor do programa conferia certo prestígio. O mais famoso talvez tenha sido o gaúcho Heron Domingues, a voz mais conhecida do noticiário. E foi o próprio Heron que em 1948 criou o primeiro departamento dedicado ao jornalismo numa emissora de rádio – a Seção de Jornais Falados e Reportagens da Nacional – que organizou pela primeira vez um sistema de equipe numa redação de jornalismo radiofônico. (FERRARETTO, 2001, p. 128) O Repórter Esso e a curiosidade por assuntos da guerra incentivaram o surgimento de outros noticiosos. Em 1942, Coripheu de Azevedo Marques e Armando Bertoni criam o primeiro radiojornal brasileiro moderno: o Grande jornal falado Tupi, que reproduzia a estrutura comum à imprensa escrita. Os departamentos de jornalismo proliferam nos anos 50, mas o espetáculo dos programas de auditório, humorísticos e novelas dominam o rádio. É nessa mesma época que a televisão começa a dar seus primeiros passos no Brasil e é justamente o modelo de informação ágil, atual e vibrante, introduzido pelo Repórter Esso e pelo Grande jornal falado da Tupi que vai auxiliar a radiodifusão sonora a renascer nas décadas seguintes, depois do inevitável abalo provocado pela televisão. (FERRARETTO, 2001, 130-1) Ano V, n. 06 – junho/2009 7 1.1.3 E surge a televisão A televisão, no início, era praticamente a transmissão dos programas de rádio. Naquela época (década de 50), tínhamos uma grande intimidade com o rádio, mas a TV ainda era um mistério a ser desvendado. Não se sabia direito o que fazer com a nova mídia que surgia. Achava-se inclusive que ela viria para substituir o rádio. Em princípio, o modelo de televisão brasileiro foi o americano. Nisso, como em tantas outras coisas, começamos imitando os americanos, nossa influência mais forte. Os nossos primeiros produtores foram aos Estados Unidos, fizeram cursos na CBS, na NBC, para aprender as técnicas e os procedimentos fundamentais e os utilizaram para implantar a televisão no Brasil. (DANIEL FILHO, 2001, p. 14). Finalmente no dia 18 de setembro a TV Tupi de São Paulo, PRF-3 TV, canal 3, foi inaugurada. Era a concretização do sonho de um pioneiro da comunicação no Brasil: o paraibano Francisco de Assis Chateaubriand Bandeira de Melo, que já controlava uma cadeia de jornais e emissoras de rádio chamada Diários Associados. Depois de poucos meses de treinamento, alguns radialistas escolhidos por Chateaubriand lançaram-se à aventura de fazer TV. Os estúdios eram pequenos, o equipamento precário, mas o nascimento da TV Tupi foi solene. Com uma hora de atraso, às 21horas, a entrou no ar o espetáculo inaugural que chamou-se O show da Taba. Com música, humor, dança e quadro de dramaturgia, foi apresentado por Homero Silva. Na ocasião, Lolita Rodrigues cantou "O hino da Televisão", com a participação de todo o cast artístico das Rádios Associadas. (DANIEL FILHO, 2001, p. 15) Acostumados à improvisação e rapidez do rádio, os pioneiros não tiveram problemas em se adaptar ao moderno veículo e aprenderam muito: ator virava sonoplasta, autor dirigia, diretor entrava em cena. A TV Tupi dos primeiros anos era uma verdadeira escola. Aos poucos, os programas ganharam forma: o primeiro telejornal... a primeira novela. Naquela época as estações de televisão funcionavam de maneira autônoma, em cada estado do país. E, até que se adotasse o conceito de grade de programação, o dia seguinte era sempre um novo desafio. (DANIEL FILHO, 2001, p. 16-7) Ano V, n. 06 – junho/2009 8 1.1.3.1 O telejornalismo no Brasil O telejornalismo chegou ao Brasil com o início da implantação da indústria da televisão, em setembro de 1950. Imagens do dia foi o primeiro programa do gênero a ser veiculado pela TV Tupi. Ainda sem muita estrutura, não tinha hora certa para ir ao ar, pois estava sempre a mercê dos ajustes à nova tecnologia. A pequena equipe, formada por Ruy Resende, apresentador e redator, e pelos cinegrafistas Jorge Kurjian, Paulo Salomão e Afonso Ribas produzia todas as noites um noticiário que continha uma sequência de filmes com os últimos acontecimentos locais. A primeira reportagem exibida foi o desfile cívicomilitar pelas ruas de São Paulo. (REZENDE, 2000, p. 105) Para Sérgio Mattos, "ao contrário da televisão norte-americana, que se desenvolveu apoiando-se na forte indústria cinematográfica, a brasileira teve de se submeter à influência do rádio, utilizando inicialmente sua estrutura, o mesmo formato de programação, bem como seus técnicos e artistas".§ No início, os telejornais funcionavam como um rádio com imagens. Os apresentadores liam as notas extraídas dos jornais impressos, faziam o chamado “gilettepress”. O modelo utilizado na televisão foi importado do rádio, ou seja, não se criou uma linguagem específica para o veículo. Além disso, as imagens eram feitas em filmes de 16 mm, o que demandava um tempo grande para a revelação, impedindo desta forma de se fazer uma cobertura jornalística com notícias factuais. Por isso, no início, a programação televisiva apresentava um baixo índice de noticiários. Na competição com o rádio ela perdia em instantaneidade. Por causa da demora na revelação dos filmes, as imagens dos fatos sofria um atraso de até doze horas entre o acontecimento e a divulgação no telejornal.(REZENDE, 2000, p.106-7) O Imagens do dia durou pouco mais de dois anos no ar e, em 1952, a TV Tupi de São Paulo criou o Telenotícias Panair. Este ficou no ar por tempo reduzido e era produzido pela equipe de jornalismo da emissora. (REZENDE, 2000, p. 105) Mas o telejornal mais importante da TV brasileira da década de 50 só iria surgir um pouco depois. Inicialmente, em 1952, na TV Tupi do Rio e, no ano seguinte, na TV Tupi de § Retirado do artigo "Um perfil da TV brasileira", por Sérgio Mattos disponível em http://www.multirio.rj.gov.br/sec21/chave_artigo.asp?cod_artigo=3732. Acesso em 15/02/09. Ano V, n. 06 – junho/2009 9 São Paulo, o Repórter Esso, que já vinha de uma carreira consolidada no rádio, se firmou por muitos anos no horário nobre da noite. Foi esse radiojornal que veio impor o primeiro padrão para a apresentação de notícias no jornalismo eletrônico brasileiro e também para questões ligadas à imagem do programa e de seus apresentadores que, em sua maioria, eram locutores com experiência no veículo, mas que não eram jornalistas profissionais. Paralelamente ao Repórter Esso veio ainda, em 1953, o Mapping Movietone, na então TV Paulista, onde surgiram as primeiras apresentadoras de telejornal (as atrizes Cacilda Lanuza e Branca Ribeiro); Pela precariedade técnica e inexperiência dos primeiros profissionais, as falhas aconteciam. Mas a repercussão na comunidade era muito pequena, dado o número limitado de pessoas que tinha acesso às imagens de TV. Naquela época, possuir um televisor era sinônimo de status. (REZENDE, 2000, p. 106) Por causa dos obstáculos que impediam as coberturas externas, o jornalismo direto do estúdio, ao vivo, predominava por quase todo o tempo do noticiário. Não deixava de ser uma alternativa simples e econômica. O equipamento disponível na época era uma câmera de filmar de 16 milímetros, sem som direto, que não foi o bastante para suavizar a influência da linguagem radiofônica sobre os telejornais. (REZENDE, 2000, p. 106) Na versão televisiva, apresentada por Gontijo Teodoro, o Repórter Esso representava a típica manifestação do modelo de telejornalismo feito por gente que vinha do rádio. Em termos visuais, "todos os telejornais eram parecidos: uma cortina de fundo, uma mesa e uma cartela com o nome do patrocinador". (LIMA apud REZENDE, 2000, p. 106). O Repórter Esso sintetizava as duas características mais evidentes do início da TV brasileira: a herança radiofônica e a subordinação dos programas aos interesses dos patrocinadores. (PRIOLLI, 1985, p. 23 apud REZENDE 2000, p. 106) Mas foi justamente o apoio de um patrocinador de grande porte e o acordo com a agência de notícias norte-americana United Press International (UPI) que proporcionou a libertação da narração exclusivamente oral e o uso mais frequente de matérias ilustradas. No início da década de 60, a TV brasileira recebe o impulso da exibição de filmes estrangeiros dublados e da chegada do videoteipe, encomendado especialmente para registrar a inauguração de Brasília, a nova capital do país. È um momento de grande Ano V, n. 06 – junho/2009 10 evolução no telejornalismo brasileiro que entrava numa fase de muita criatividade e expansão intelectual. (REZENDE, 2000, p. 107) Em 1962, confirmando essa nova fase, surge na TV Excelsior, o Jornal de Vanguarda, que trouxe muitas novidades na concepção do telejornalismo. A principal delas foi a participação de jornalistas como produtores e de cronistas especializados como apresentadores das notícias, fato até então inédito no telejornalismo do país. Assim, os brasileiros contavam com os comentários de Newton Carlos, Millor Fernandes, João Saldanha, Villas-Bôas Correia e Stanislaw Ponte Preta, entre outros nomes. Além de enorme prestígio no país, o Jornal de Vanguarda obteve também grande reconhecimento no exterior. Chegou a receber, em 1963, na Espanha, o prêmio Ondas como melhor telejornal do mundo pela originalidade de sua estrutura e forma de apresentação distinta de todos os outros informativos. Tanto reconhecimento esbarrou na censura imposta pelos militares e o Jornal de Vanguarda foi extinto em 1968. (REZENDE, 2000, p.107) É em 1969 que a TV Globo, inaugurando o verdadeiro conceito de “rede” no país, coloca no ar o Jornal Nacional, primeiro programa gerado para Brasília e mais oito estados. O Jornal Nacional entrou no ar no em primeiro de setembro com apresentação de Cid Moreira e Hilton Gomes. Com recursos correspondentes aos de um programa caro e caprichado como uma novela, ao anunciar a criação do Jornal Nacional a Rede Globo salientou: "vamos lançar um telejornal para que 56 milhões de brasileiros tenham mais coisas em comum, além de um simples idioma" (Veja 52, p. 68 apud REZENDE, 2000, p. 109). Interesses políticos e mercadológicos foram os objetivos reais que motivaram a iniciativa de criar o novo telejornal. A Globo queria ter um noticiário de prestígio e que competisse com o Repórter Esso da TV Tupi, que, na época, dominava o horário e tinha uma importante audiência cativa. Mas a primeira edição do Nacional demonstrava o momento político pelo qual passava o país. A originalidade só poderia estar presente na qualidade técnica, já que o conteúdo estava sacrificado pela intervenção da censura. Citando Nogueira, Mello e Souza (1984, p. 12) explica: Ano V, n. 06 – junho/2009 11 Nossa preocupação maior, quase que única, era operar convenientemente todo esse complexo mecanismo de televisão (...) do ponto de vista de conteúdo (...) nenhum de nós poderia estar empolgado naquele primeiro dia. Nossa preocupação em matéria de jornalismo (...) não ia além da forma, do formato, da parte visual, porque sofríamos restrições ao exercício da plena liberdade de informação. (REZENDE, 2000, p. 111) O Jornal Nacional foi ganhando cada vez mais espaço e derrubou o Repórter Esso que, em 31 de dezembro de 1970, foi ao ar pela última vez, e passou a ser a grande vedete do telejornalismo brasileiro. Ainda em 1970, a TV Bandeirantes de São Paulo trouxe Os Titulares da Notícia, onde o principal atrativo era a presença da dupla sertaneja Tonico e Tinoco apresentado as notícias do interior do estado de São Paulo. Enquanto isso a TV Tupi tentava se recuperar da crise com o fim do Esso e lançou o Rede Nacional de Notícias. Inaugurava um cenário diferente onde os locutores apareciam em primeiro plano e uma sala de redação compunha o ambiente do fundo. Talvez os primórdios dos modernos cenários atuais. A Hora da Notícia, exibido pela TV Cultura de São Paulo, também em 1970, chegou a alcançar a liderança de audiência da emissora, apostando num formato que priorizava o depoimento popular a respeito dos problemas da comunidade. Conceito que também foi vítima dos interesses políticos dominantes no país. Outra experiência telejornalística de sucesso nesse mesmo período foi proposta pela TV Bandeirantes. Os Titulares da Notícia foi reformulado, depoimentos populares foram incluídos no programa que também passou a valorizar mais o trabalho do repórter que, independente de aparência e voz, passava a apresentar as notícias. Isso conferia uma credibilidade maior ao noticiário uma vez que quem transmitia a notícia não era um simples locutor, mas alguém que participava do processo de apuração dos fatos. Os anos de 1970 foram de desenvolvimento e apuro técnico alcançado, principalmente, pela Rede Globo que desde então já iniciava a carimbar o seu padrão de qualidade em suas produções. A câmera de 16 mm saiu de cena e deu lugar às câmeras portáteis de videoteipe com muito mais mobilidade e beleza. Mas, apesar da evolução tecnológica à favor, o discurso ainda continuava submetido à censura. O cuidado estético, no entanto, visto na escolha dos cenários, dos locutores, da qualidade das imagens e da edição das matérias, fizeram a Globo se adequar cada vez mais Ano V, n. 06 – junho/2009 12 às potencialidades da linguagem televisiva. O padrão foi se consolidando e o sucesso era medido pela audiência sempre crescente. A escolha dos locutores era cuidadosa. Homens de boa aparência e bonito timbre de voz eram estratégia para "segurar" o público feminino que estava nas novelas. Cid Moreira foi o escolhido para encarar o Jornal Nacional. Experiente (já havia se destacado no Jornal de Vanguarda), tornou-se a filosofia do programa por anos a fio. Muitos artifícios foram usados para driblar a censura que no final dos anos 70 e início de 80 começava a afrouxar as rédeas. Coberturas nacionais superficiais e mais espaço para notícias internacionais serviam também para, sutilmente, alertar a consciência do público para assuntos polêmicos. (REZENDE, 2000, p. 111-6) Animada com o sucesso do JN, a Globo cria outros telejornais: o Hoje, na hora do almoço e outro no fim da noite que recebeu vários títulos (Amanhã, Painel, Jornal da Globo, segunda edição do Jornal Nacional). Anos depois surgiu um jornal em um horário pouco convencional, no início da manhã, o Bom dia São Paulo, que seria a semente para o hoje consagrado Bom dia Brasil. Na década de 1980 muitos programas de entrevistas e debates se seguiram como o Vox Populi na TV Cultura, o Encontro com a Imprensa, na TV Bandeirantes e o Diário Nacional na TV Record. A Globo também fez uma tentativa pouco duradoura com um programa nessa linha jornalística com o Globo em Revista. Ainda em 1981, a TV Bandeirantes abriu espaço para uma diversificada série de programas jornalísticos: Variety, ETC, Outras Palavras, Bastidores, Nova Mulher e Crítica e Autocrítica. Com exceção desse último, todos os outros duraram pouco tempo, mas marcaram uma nova etapa na história do telejornalismo brasileiro. No início dos anos 1980, a notável relevância da Globo já não estava só. Da concorrência pública para os canais da Tupi, duas novas cadeias de televisão se projetaram: o Sistema Brasileiro de Televisão, SBT, do empresário Sílvio Santos e a Rede Manchete, do grupo Bloch. No telejornalismo, a Manchete vinha com idéias novas e audaciosas. A começar pela cobertura do desfile das escolas de samba que roubou preciosos pontos da audiência da Globo. A Manchete colocou o jornalismo no horário nobre enquanto a Globo exibia suas Ano V, n. 06 – junho/2009 13 telenovelas. O Jornal da Manchete impediu a hegemonia da Globo priorizando o comentário e a análise dos fatos.(REZENDE, 2000, 117-122) Enquanto isso na Bandeirantes, Joelmir Beting tornava-se o primeiro âncora a atuar na televisão brasileira. Ficou quase seis anos à frente do Jornal da Bandeirantes e relembra: A gente editava o jornal na hora, na marra. Era uma ancoragem cirúrgica, porque às vezes eu tinha dois minutos e vazio no jornal e precisava preenchê-lo ou precisava chamar uma notícia para o próximo bloco e eles nem sabiam de fato qual seria a próxima notícia. A exigência de criatividade era um absurdo, eu perdia adrenalina toda noite (...) Aquilo era um 'tampão', ao vivo, com a nossa cora sob o risco de fazer ou dizer besteiras como andou acontecendo. (VIEIRA, 1991 apud REZENDE, 2000, p. 123) Da experiência fracassada do SBT no telejornalismo surgiram os telejornais Cidade 4, 24 horas, Noticentro, Últimas notícias. A imagem de uma emissora incapaz de produzir um jornalismo de qualidade só começou a mudar em 1998 quando da contratação de três profissionais: Marcos Wilson e Luiz Fernando Emediato para a direção do departamento de jornalismo e Boris Casoy, que assumiu a ancoragem do Telejornal Brasil. (REZENDE, 2000, p.126) Consagrado no jornalismo impresso, onde chegou ao cargo de editor-chefe da Folha de S. Paulo, Casoy desenvolveu um jeito bem particular de apresentar o programa que fugia do modelo norte-americano. Além de ler notícias e conduzir o telejornal, ele passou a fazer entrevistas e emitir comentários pessoais sobre os fatos noticiados. O que levou muitos críticos e profissionais de outras emissoras a acreditar que aquilo era uma deturpação do trabalho do âncora. (REZENDE, 2000, p. 127) Ele, no entanto, se justificava dizendo que "a audiência brasileira de televisão é muito mais carente desse tipo de informação, da entrevista e do comentário, do que a opinião pública norte-americana” (VIEIRA, 1991, p. 71 apud REZENDE, 2000, p. 127). E ele estava certo. Prova disso foi o reflexo na audiência do TJ Brasil que logo assumiu a segunda posição em faturamento na emissora. Em agosto do mesmo ano, a TV Cultura traz o ex-repórter Carlos Nascimento para também estruturar o Jornal da Cultura na figura do âncora. Nascimento se sai muito bem e, no ano seguinte, muda para a Rede Record. Ano V, n. 06 – junho/2009 14 Na Bandeirantes, Marília Gabriela passa a atuar como uma espécie de âncora no Jornal da Bandeirantes, construindo um novo parâmetro para o telejornalismo brasileiro. A Globo, incomodada com o novo estilo inaugurado por Boris Casoy, decide investir no jornalismo fora do estúdio. Acredita que o verdadeiro papel do âncora é sair do conforto do estúdio e ir até os acontecimentos. Foi assim, com grande sucesso, a cobertura da Guerra do Golfo, onde a emissora entrava "ao vivo" com o repórter Pedro Bial de diversas capitais do oriente e da Europa e Estados Unidos com jornalistas como Ernesto Paglia, Paulo Henrique Amorim e Rodolfo Gamberini. (REZENDE, 2000, p. 128-130) Com um time de peso que já contava com nomes como Hermano Henning e Lílian Witte Fibe, o SBT não se encontra no telejornalismo até criar o Aqui Agora. Telejornal popularesco que usava do plano-sequência para dar mais realismo às histórias que narrava. Um sucesso fenomenal em São Paulo que fez com que a empresa quisesse reformular o TJ para aumentar a sua audiência. Boris Casoy reagiu à idéia e a solução foi desmembrar o TJ do departamento de jornalismo, o que concedeu a Casoy ainda mais autonomia. (REZENDE, 2000, p. 131) Desde então muito se evoluiu no telejornalismo brasileiro. Seu formato, linguagem, reportagens e, claro, seus apresentadores e âncoras que, de simples narradores (locutores) de imagens passaram a verdadeiras estrelas da televisão brasileira. Ao longo dessa evolução, muitos programas entraram e saíram do ar. Atualmente a televisão brasileira apresenta uma grande variedade de telejornais. O JN continua a ser o modelo, mas as outras emissoras e a própria Globo vêm se modernizando e abrindo mais espaço para a informalidade e a descontração nesses programas. E, na luta pela audiência, os âncoras tornaram-se arma fundamental. 1.2 O âncora: origem e chegada ao Brasil 1.2.1 O âncora norte-americano Squirra (1993, p.65) relata que, ainda na década de 50, a figura do apresentador de telejornais nos Estados Unidos recebeu o nome de âncora (anchorman). A primeira definição para este profissional aconteceu na Convenção dos dois principais partidos Ano V, n. 06 – junho/2009 15 políticos realizada na cidade de Philadelfia, em 1948. O diretor de jornalismo da CBS Sig Mickelson conta que: Eu visualizei o homem-âncora como a pessoa melhor informada na Convenção. Todas as nossas linhas de comunicação deveriam terminar nele. Repórteres no local, no ar e nos hotéis do centro da cidade deveriam transmitir para uma mesa central. Esta deveria apresentar na tela informações que seriam difundidas por ele. O estúdio onde nós o colocamos deveria ser o coração e o cérebro da nossa cobertura. Nos EUA os âncoras são verdadeiras "instituições vivas", recebem os maiores salários, são profundamente confiáveis para a audiência e extremamente ativos em todos os assuntos que envolvem a nação. Verdadeiras estrelas no melhor estilo Hollywood com a ressalva de que representam uma figura séria, inspiram confiança, segurança e honestidade. Eles são, para Goldberg e Goldberg "a face identificável dos departamentos de jornalismo das redes, os chamados ´logotipos vivos'". O sucesso dos âncoras norte-americanos se dá, segundo o agente de âncora Richard Leibner, por causa da crescente obsessão dessa sociedade pelos ricos e famosos. Depois das estrelas do cinema, do rock, do esporte e da TV, foi a vez dos jornalistas virarem estrelas também. (SQUIRRA, 1993, p. 66) Goldberg e Goldberg (apud SQUIRRA, 1993, p. 66) destacam ainda um detalhe interessante: "ironicamente, os três são surpreendentemente similares. Eles (os âncoras da ABC, CBS e NBC) são brancos, homens, casados, pais com 2 ou mais filhos, ricos, estão na meia idade, e são protestantes. ... Os três são 'bonitões', cheios de energia, ambiciosos, atentos e enormemente competitivos. Eles são, é desnecessário dizer, profundamente representativos da maioria dos americanos". Walter Cronkite, o mais importante âncora norte-americano, assim definiu este cargo: Basicamente, é um jornalista com a paciência e a curiosidade de ler, com a maior isenção possível, os jornais impressos do dia; esse jornalista deve ter uma visão de mundo, dispor de uma cultura humanística e histórica que lhe permita descobrir, mesmo em uma pequena anedota, a sua importância trágica ou sua terrível comicidade; alguém em condições de estar permanentemente chocado pela realidade, mas com o poder de se apresentar diante dos telespectadores sem que olhos e músculos reflitam Ano V, n. 06 – junho/2009 16 qualquer tipo de comoção indesejável; alguém que acompanhe, na redação, o nascimento e o desenvolvimento da notícia; uma pessoa capaz de sofrer, durante dez minutos, para escrever um bom texto de duas linhas e, ao mesmo tempo, improvisar com naturalidade e conhecimento de causa uma locução de dois minutos sobre algum acontecimento de última hora; alguém com ar de serenidade e respeito pelos outros; traços corretos, boa voz, um ritmos dialogal de leitura e – exigência suprema! – um ar inteligente. (SQUIRRA, 1993, p.119) Outros âncoras norte-americanos como Dan Rather – que sucedeu Cronkite na CBS -, Peter Jennings, na CBC, e Tom Brokaw na NBC, mantiveram esse perfil de poder e autoridade que permanece até hoje nos âncoras desse país. 1.2.1.1 Walter Cronkite Walter Cronkite foi o primeiro jornalista que acumulou a função de editor-chefe além de apresentador. Ou seja, tinha o poder de decidir o que deveria ou não ser mostrado no jornal. Toda a liberdade para mudar o que achasse necessário. Já fazia sucesso apresentando eventos especiais da CBS desde 1954 quando assumiu o Evening News em abril de 1962, substituindo o então apresentador Douglas Edward que já não estava atendendo às expectativas da audiência. (SQUIRRA, 1993, p. 69) Competente, solucionador e ágil na tomada de decisões, Cronkite logo se tornou o símbolo da ancoragem norte-americana. Permanecendo quase absoluto nos dezenove anos em que esteve à frente do programa. Excelente improvisador, tinha uma incrível capacidade de pensar rápido, organizando os fatos e apresentando de forma clara e eficiente aos telespectadores. Chegou a ser, inclusive, segundo uma pesquisa realizada pela Oliver Quayle e Co. a "mais acreditada figura pública na América". (SQUIRRA, 1993, p. 80) Foi ele quem inaugurou o 'star system' no telejornal em rede nos EUA. Tinha acesso a todos os políticos, empresários, intelectuais e artistas que desejasse, e as fontes estavam sempre abertas para quando ele quisesse conversar com alguém. Chegou até a ser cotado para presidente do país tamanha a sua popularidade. Mas, para Arthur Taylor, então presidente corporativo da CBS, Walter Cronkite "vai ficar na história por ter tido o caráter de não explorar o poder que ele possuía. Não tivesse ele tido o caráter de fazer isto, Ano V, n. 06 – junho/2009 17 seguramente teria provocado uma enorme mudança nos critérios...". (SQUIRRA, 1993, p. 81) Em seis de março de 1981, Cronkite passou o posto mais invejado do telejornalismo nos EUA para Dan Rather. Até hoje, a figura do âncora nos Estados Unidos é a de um profissional de prestígio, que detém o poder da informação e o respeito da sociedade. 1.2.2 O âncora no telejornalismo brasileiro No Brasil, a primeira referência que se faz ao uso do termo âncora data de 1976 quando da cobertura das eleições municipais, um plano interno especial de trabalho foi preparado pela Rede Globo e, Mello e Souza registra que "desse documento constava ... uma sugestão importante: a utilização do repórter Costa Manso como uma espécie de 'anchorman'" (SQUIRRA, 1993, p. 118). Mas, ao aplicar a definição de Cronkite para 'âncora' percebe-se que essa primeira experiência indica que nem todos os padrões norte-americanos foram adotados integralmente pelo jornalismo eletrônico brasileiro. Mello e Souza esclarece ainda que Costa Manso não exerceu a função de comentarista, como querem achar alguns críticos. Mas, apenas, a função de centralizador das informações que chegavam de todos os estados. Fez um bom trabalho. Tal como aconteceu, em São Paulo, com os apresentadores Luís Lopes Correia, Celso Freitas, Sérgio Roberto e Teresa Corbett que, nas circunstâncias de improvisação, tiveram uma performance à altura do esforço dos repórteres e de toda a equipe dos bastidores, que assumiram com êxito a operação Eleições-76. (SQUIRRA, 1993, p. 120) Apesar de a Rede Globo ter introduzido o conceito de rede de televisão no Brasil aproximando-se dos padrões técnicos e de produção norte-americanos, a partir do acordo com a Time-Life, nem todas as formas de produção foram adotadas imediatamente ou copiadas de forma fiel ao modelo original. E o conceito de âncora é um exemplo disso. Muitos jornalistas se definem como âncoras no Brasil sem nunca terem, de fato, atuado ou exercido esse papel. Ano V, n. 06 – junho/2009 18 Este papel começou a tomar forma de fato no Brasil com o jornalista Boris Casoy, em 1988, quando foi contratado pelo SBT para ancorar o Telejornal Brasil. Mas o próprio Boris ressalta que, antes dele, Joelmir Beting já havia exercido o papel de âncora à frente do Jornal da Bandeirantes nos início dos anos 80. (CASOY, 1994, p. 41 apud REZENDE, 2000, p.123) Por ser o único no Brasil a manter-se continuadamente no posto, Boris é considerado, até hoje, o âncora mais bem sucedido do país. Com vasta experiência anterior no jornal impresso, ele chega à televisão adaptando o seu estilo ao modelo norte-americano de ancoragem. Pela primeira vez no telejornalismo brasileiro, o apresentador passou a entrevistar e comentar os acontecimentos anunciados. A resposta do público à novidade foi imediata e logo se refletiu no faturamento e, em pouco tempo, o TJ Brasil passou a ser o segundo produto do SBT a atrair mais publicidade. Boris Casoy e seu Telejornal Brasil causaram certo desconforto nas outras emissoras que passaram também a adotar novos estilos de apresentação. Na TV Cultura de São Paulo, o Jornal da Cultura é reestruturado e passa a contar com o ex-repórter Carlos Nascimento para ancorar a atração. Nascimento, que então comandava uma equipe dividida em editorias de economia, política, internacional e geral, se destaca e se populariza com a cobertura da agonia do presidente Tancredo Neves. (REZENDE, 2000, p. 127) Marília Gabriela, já conhecida do público pelo seu programa de entrevista Cara a Cara, assume tarefas típicas de âncora à frente do Jornal da Bandeirantes. Mas diferente de Boris, preferia adotar um estilo menos opinativo. A Globo, que até então mantinha seu estilo frio inalterado, depois do conturbado episódio do último debate entre Fernando Collor e Lula , nas eleições de 1989, quando o JN exibiu uma edição adulterada que favorecia a Collor, a emissora passa a adotar um jornalismo de rua, fora do estúdio. O resultado positivo dessa experiência fica evidente na cobertura da Guerra do Golfo, em 1991, quando a Globo, trazendo seus repórteres ao vivo, direto dos lugares de conflito, deixa claro seu potencial jornalístico e tecnológico que poderia ser equiparado ao das grandes redes mundiais de televisão. (REZENDE, 2000, p. 128-30) Ano V, n. 06 – junho/2009 19 Nesse momento, o telejornalismo brasileiro passa então a considerar fundamental a presença de um jornalista que participe do processo de elaboração do jornal por acreditar que isso repercute em uma maior credibilidade para o noticiário. É assim que em abril de 1996, os apresentadores símbolos do maior telejornal do país, Cid Moreira e Sergio Chapelin, se despedem do JN para dar lugar ao casal de jornalistas William Bonner e Lílian Witte Fibe. Na verdade este foi um momento de mudança geral no telejornalismo da Globo, que não se limitava à troca de apresentadores. Novos cenários e uma edição mais dinâmica também foram adotados. (REZENDE, 2000, p. 133) A partir daí os apresentadores passaram a ser praticamente como jogadores de futebol. Assim como os clubes, as emissoras passaram a "brigar" pelos jornalistas, agora com passes supervalorizados, pois ter uma estrela no time era meio caminho andado para a vitória. E assim começou o troca-troca. Os interesses mercadológicos das emissoras definem quem vai para onde e, depois de muitas mudanças, o panorama atual está assim: no Bom dia Brasil, da Rede Globo, Renato Machado e Renata Vasconcelos dividem a apresentação com a participação e comentários de Miriam Leitão e Alexandre Garcia; Sandra Annemberg e Evaristo Costa comandam juntos o Jornal Hoje; o casal Fátima Bernardes e William Bonner segue há mais de dez anos à frente do maior telejornal no país, o Jornal Nacional; desde 2005, o Jornal da Globo é apresentado pelos jornalistas William Waack e Christiane Pelajo que contam ainda com os comentários fixos de Arnaldo Jabor e Carlos Alberto Sardenberg. Na Band, o Primeiro Jornal é ancorado por Fernando Vieira de Mello; o Jornal da Band fica a cargo dos jornalistas Ricardo Boechat e Ticiana Villas-Bôas, e Boris Casoy comanda o Jornal da Noite. No SBT, Hermano Henning e Analice Nicolau ancoram o Jornal do SBT – Edição da Manhã; o Jornal do SBT- Edição da Noite é apresentado por Carlos Nascimento e Cynthia Benini e o mesmo Carlos Nascimento esta à frente também do SBT Brasil. Na Rede Record, Luciana Liviero e Marcos Hummel apresentam as notícias do matinal Fala Brasil e à noite o Jornal da Record é comandado por Celso Freitas e Adriana Araújo. E é sobre o perfil desses telejornais e seus diferentes estilos de ancoragem que nós vamos tratar adiante. Ano V, n. 06 – junho/2009 20 2 OS ÂNCORAS DOS TELEJORNAIS BRASILEIROS 2.1 Tipologia Para facilitar a compreensão do papel exercido pelo âncora no telejornalismo brasileiro e tornar possível, didaticamente, uma classificação desses profissionais a partir de seus perfis, tratamos de criar uma tipologia específica, já que não há nada do gênero que seja de nosso conhecimento. Verificamos, assim, que os respectivos âncoras podem ser classificados em três tipos distintos: 1) O primeiro tipo é o mais formal, amarrado ao script. Um âncora que praticamente se detém na leitura da notícia, sem muito envolvimento emocional e com pouco espaço para dar opiniões. Os poucos comentários proferidos são previamente definidos. Normalmente apresentam telejornais mais clássicos nos quais a bancada é o cenário e eles permanecem sentados durante todo o programa. Há, no entanto, algumas variações de estilo. Jornalistas que, quando a linha editorial do programa permite, gesticulam mais e interagem entre si, tornando a apresentação mais leve, neutralizando um pouco a formalidade; 2) O segundo tipo engloba aqueles profissionais com maior liberdade de opinião dentro do telejornal que apresentam. O roteiro é apenas a base da apresentação e ele dialoga com o telespectador acrescentado nuances particulares ao que está sendo noticiado. Geralmente tem uma autonomia maior com relação ao que será exibido e acaba se tornando polêmico por um ou outro comentário mais ousado. O cenário continua sendo a bancada e ele está sempre sentado, mas a postura adotada por esse tipo de âncora já é um pouco mais solta que o tipo anterior; 3) A leveza e certo grau de informalidade são traços fortes do terceiro tipo de âncora. Um profissional que segue um roteiro pré-estabelecido, mas também pode opinar sobre os assuntos apresentados. Adotam uma linguagem mais informal e próxima Ano V, n. 06 – junho/2009 21 do telespectador e, normalmente interagem diretamente com correspondentes ou comentaristas no estúdio como numa conversa natural. Neste caso, os apresentadores podem ser vistos em cenários diferentes das tradicionais bancadas, geralmente algo semelhante a uma sala de estar, com poltronas confortáveis e centros de mesa. Caminham pelo ambiente e alternam a postura, ora em pé, ora sentados nessas poltronas ou na própria bancada. Tomando como base esta tipologia que acabamos de apresentar, analisaremos a seguir os diferentes tipos de âncora que estão à frente dos principais telejornais das maiores emissoras de canal aberto do Brasil. 2.2 Os telejornais da Globo 2.2.1 Bom dia Brasil O Bom Dia Brasil nasceu no dia 3 de janeiro de 1983 e a proposta inicial era ser um noticiário de trinta minutos essencialmente político e econômico, com entrevistas e análises de comentaristas, exibido direto de Brasília. Com a entrada de Renato Machado, em 1996, o programa ganha um novo formato de revista abrindo espaço para outras editorias como moda, culinária e cultura, o que confere ao telejornal um clima mais leve e, ao mesmo tempo, dinâmico. Tudo com uma abordagem sempre informal e uma linguagem acessível que buscava esclarecer ao telespectador todas as questões levantadas pelos assuntos abordados.** Atualmente, Renato Machado divide a apresentação com Renata Vasconcelos, também editora. Com leveza e credibilidade, eles se alternam entre a tradicional bancada (que ganhou ares bem modernos em tons alaranjados) e confortáveis poltronas em um ambiente distinto que lembra uma sala de estar. Os apresentadores ora estão sentados ora em pé e essa alternância dá ao programa um ritmo agradável para o início da manhã. ** Disponível em http://g1.globo.com/bomdiabrasil/0,,MUL746686-16020,00CONHECA+A+HISTORIA+DO+BOM+DIA+BRASIL+DESDE+A+ESTREIA.html. Acesso em 11/02/09. Ano V, n. 06 – junho/2009 22 Renato e Renata interagem entre si com muita naturalidade assim como fazem com Cláudia Bontempo, que traz as notícias da capital Federal, e Mariana Godoy que faz a ponte ao vivo de São Paulo. Miriam Leitão na economia e Alexandre Garcia na política são presenças freqüentes no matutino que ainda abre espaço para a previsão do tempo apresentada por Michelle Loreto. A dupla de apresentadores é, portanto, o único exemplo do tipo 3 de âncora na Rede Globo. Ao apresentar o telejornal, eles demonstram certo desapego do script e se permitem comentários particulares e reações menos programadas, o que os torna mais próximos dos telespectadores. Cláudia Bontempo e Mariana Godoy, que entram apresentando as notícias de Brasília e São Paulo, respectivamente, não chegam a ser consideradas âncoras, mas apenas apresentadoras. Embora seja um jornal longo, hoje com uma hora de duração, não é cansativo pela diversidade de editorias e pelo próprio entrosamento dos apresentadores com os comentaristas e correspondentes. Fora do ar, costumam ser discretos e pouco badalados pela imprensa. 2.2.2 Jornal Hoje O Hoje é um dos mais antigos telejornais da Globo. Estreou em 21 de abril de 1971, como uma revista diária com matérias sobre arte, espetáculos e entrevistas. Em 1981, traços modernos invadiram o cenário e o programa passou a abrir espaço para o turismo mostrando ao telespectador lugares pouco conhecidos e paraísos ecológicos. Dez anos depois, outras mudanças e, dessa vez, mais abertura para correspondentes internacionais, colunas de beleza e cultura. Foi no Hoje que os primeiros repórteres apareceram sem gravata e de cabelos compridos e até um novo jeito de entrevista surgiu, em que as personalidades eram abordadas em sua própria casa.†† Desde 2004, Evaristo Costa, que antes apresentava o quadro do tempo, passou a ocupar a bancada ao lado de Sandra Annemberg. O entrosamento foi imediato e a dupla †† Disponível em http://g1.globo.com/jornalhoje/0,,TLI1028-16025,00.html. Acesso em 12/02/09. Ano V, n. 06 – junho/2009 23 mantém o estilo inovador, leve e descontraído característico do programa, abusando da criatividade no fazer telejornalismo. Muito espontâneos na apresentação, Evaristo e Sandra conversam entre si enquanto ancoram a atração e, assim como o matutino Bom Dia Brasil, eles também conduzem com muita naturalidade as intervenções dos correspondentes internacionais, dos entrevistados que, de vez em quando, estão no estúdio e com Flávia Freire, que apresenta a previsão do tempo. Gesticulam bastante e deixam fluir naturalmente a expressão facial. Embora se encaixem no tipo 1, o formal e pré-definido, eles têm um estilo mais solto de apresentar que quebra um pouco o protocolo. Outro fator que contribui para o clima descontraído do programa é a flexibilidade com relação às roupas usadas principalmente por Sandra Annemberg. Cores mais vibrantes e modelos que fogem um pouco aos já tradicionais terninhos dão mais vida às expressões da apresentadora que consegue se sobrepor à estática bancada. Evaristo Costa às vezes aparece fora do estúdio atuando também como repórter em séries especiais, como aconteceu recentemente na semana que antecedeu o carnaval. Entrando ao vivo de diversos lugares do país, ele fez entrevistas e mostrou vários ângulos da festa mais famosa do país, sempre conversando com Sandra que permaneceu no estúdio. Fora da TV, eles mantêm a discrição comum aos profissionais da Rede Globo e raramente são alvo de matérias, publicidades ou coisas do gênero. 2.2.3 Jornal Nacional Primeiro telejornal em rede do país, o Jornal Nacional inaugurou um padrão diferente dos outros noticiosos da época. Lançado para competir com o Repórter Esso, o JN logo se tornou campeão de audiência, o maior destaque da programação jornalística brasileira. Para Lins da Silva, o Jornal Nacional da Rede Globo inaugurou um novo estilo de jornalismo na TV brasileira. Primeiro, por iniciar a era do jornal em rede nacional até então inédito entre nós. Depois, por consolidar um modelo de 'timing' da informação ... terceiro, porque consagrou um estilo de apresentação visual requintado e frio, Ano V, n. 06 – junho/2009 24 pretensamente objetivo... quarto, pela extensão dos assuntos abrangidos, com a instalação de escritórios no exterior... (SQUIRRA, p. 109). O nome surgiu naturalmente, partindo-se do princípio que seria um programa para atingir todo o país. Tinha quinze minutos de duração e era transmitido de segunda à sexta. As manchetes, em geral, curtas e fortes, eram lidas alternadamente por dois apresentadores de maneira rápida e ágil. Diferente do Esso, o Nacional terminava sempre com uma notícia leve, de conteúdo lírico ou pitoresco. Mas o principal diferencial era que o telejornal da Globo apresentava matérias testemunhais, com a fala dos entrevistados. Imagens cobertas com áudio do locutor se alternavam com depoimentos com voz direta da pessoa falando. Cid Moreira e Hilton Gomes formaram a primeira dupla de apresentadores. Em 1972, Sergio Chapelin assume a parceria com Cid que duraria até 1983. Em maio de 1989, Celso Freitas - que havia assumido a apresentação do jornal ao lado de Cid Moreira em 1984 – deixa a bancada e Sergio Chapelin reassume como no início. Paralelo a isso, algumas mudanças no cenário que agora passava a ter três dimensões.‡‡ Em 1991 a novidade foi o quadro do tempo apresentado por Sandra Annemberg. Ela foi a primeira figura feminina a aparecer diariamente, num quadro fixo, no JN. A apresentação seguia um padrão diferente do atual. Sandra não ficava o tempo inteiro de frente para o telespectador. Acreditava-se que ela deveria levar o público até o mapa e, por isso, ela dava as costas para a câmera para mostrar onde estavam as coisas. (JORNAL NACIONAL, 2004, P. 231) É só em março de 1996 que jornalistas assumem o comando do Jornal Nacional. A intenção era colocar à frente do telejornal, jornalistas profissionais, envolvidos com a produção das matérias. Buscava-se dar maior credibilidade e dinamizar as coberturas. Isso possibilitava uma maior flexibilidade durante o jornal. Abria-se a possibilidade de improvisar, de intervir no noticiário, a realização de entrevistas ao vivo, perguntas aos repórteres e entrevistados. O que não poderia acontecer com os locutores que apenas liam o que estava no script. Foi assim que William Bonner e Lillian Witte Fibe chegaram ao JN. Uma das mudanças mais sentidas pelo público, já que Cid Moreira e Sergio Chapelin haviam se ‡‡ Disponível 14/02/09. em http://jornalnacional.globo.com/Telejornais/0,,GEN971-10405,00.html. Ano V, n. 06 – junho/2009 Acesso em 25 tornado a marca do telejornal. Cid Moreira permaneceu na emissora e tinha entradas esporádicas no programa para leitura de editoriais que manifestavam a opinião da empresa sobre determinados assuntos. Sergio Chapelin assumiu a apresentação do semanal Globo Repórter. Dois anos depois, em 1998, Lillian Witte Fibe deixa o Jornal Nacional para assumir a edição e apresentação do Jornal da Globo. Sandra Annemberg apresenta o jornal provisoriamente por um mês e, em seguida, Fátima Bernardes passa a dividir a bancada com Bonner que acumula também as responsabilidades de editor-chefe, como acontece até hoje. O casal já conseguiu se tornar a nova "cara" do noticiário. Encabeçam a lista dos âncoras do tipo 1. A identificação com público é evidente. Adotam uma postura bastante formal e séria suavizada pela redação que, vez por outra, aparece ao fundo em determinados enquadramentos. Em circunstâncias muito específicas, a formalidade característica dá lugar a um pouco de descontração, geralmente quando um dos dois está fora do estúdio. Foi o caso, por exemplo, da Copa do Mundo de 2006, quando Fátima Bernardes acompanhou a seleção e entrava, ao vivo, direto da Alemanha, interagindo com Bonner que estava no estúdio do JN. A cobertura das eleições dos Estados Unidos é outro exemplo recente. Dessa vez quem saiu do estúdio foi Bonner que também entrava ao vivo trazendo as últimas informações direto de Washington, enquanto Fátima, do estúdio, apresentava o noticiário. Do ponto de vista da apresentação, mantêm-se fiéis ao script, os comentários são raros e, normalmente, com os dois no estúdio, interagem muito pouco entre si. Bonner e Fátima, como acontece com os âncoras no seu país de origem, passaram a ser considerados personalidades importantes no país. Suas vidas particulares são alvo da curiosidade dos brasileiros e assunto freqüente nas revistas de fofoca. Fatos como a gravidez e o nascimento dos trigêmeos, um nódulo operado por Fátima e até as férias internacionais da família se tornam pautas para os seus colegas de profissão sedentos por manchetes que aumentem a tiragem de tais revistas. São, sem sombra de dúvida, os jornalistas mais noticiados no mundo das celebridades brasileiras, embora assumam sempre uma postura bastante discreta quando fora dos estúdios. Ano V, n. 06 – junho/2009 26 2.2.4 Jornal da Globo No ano em que a Globo completou o seu décimo quarto aniversário, estreou o Jornal da Globo. Um noticiário de fim de noite recheado de análises, grandes reportagens, séries e entrevistas de estúdio. Era apresentado por Sérgio Chapelin e contava com a participação de repórteres especiais, analistas e entrevistadores.§§ Em 1982, o formato sofre uma pequena modificação: um dos blocos passa a ser dedicado ao detalhamento do fato mais importante do dia. Entrevistas ao vivo complementam o material gravado sobre o assunto. Renato Machado, Belisa Ribeiro e Luciana Villas Boas formavam o time fixo do noticiário que contava ainda com a participação de Carlos Monforte como comentarista. O jornal falava de política, economia e cultura no Brasil e no mundo, e passou a abrir espaço para o esporte. Em 1983, Jô Soares e Chico Caruso passam a integrar a equipe do JG com comentários e charges animadas, que nessa época, com equipamentos pouco sofisticados, levavam uma semana para ficar prontas. Depois de muitas mudanças de apresentadores, em 2005, o Jornal da Globo passa a ser ancorado por William Waack e Christiane Pelajo. Pela primeira vez uma dupla de repórteres à frente do programa. O JG, talvez pelo horário em que é apresentado, é um noticiário mais frio. Tanto William quanto Christiane adotam uma postura mais seca e direta. O cenário respeita o modelo clássico de bancada onde os apresentadores permanecem durante todo o programa. Quando há entrevistas, o convidado divide a bancada com os jornalistas que costumam seguir o script com bastante formalidade. Os assuntos abordados, geralmente do âmbito econômico ou político, tomam forma com a participação dos comentaristas fixos Carlos Alberto Sardenberg e Arnaldo Jabor. A interação entre eles também carrega o tom formal do programa tornando-o um pouco árido. Uma linha editorial menos flexível, exige dos apresentadores uma performance mais centrada na notícia e não no telespectador. Eles nunca saem do estúdio mantendo assim o distanciamento do fato. §§ Disponível em http://g1.globo.com/jornaldaglobo/0,,TLA1027-16024,00.html. Acesso em 12/02/09. Ano V, n. 06 – junho/2009 27 São, talvez, os âncoras de menor prestígio popular da Globo. 2.3 Os telejornais da Band 2.3.1 Primeiro Jornal O Primeiro Jornal é exibido de segunda à sexta, às 7h00 da manhã e é apresentado por FernandoVieira de Mello e Nadja Haddad. É o telejornal mais informal da Band do ponto de vista do cenário e da movimentação dos apresentadores. Eles se alternam entre sentados numa pequena bancada, em pé numa espécie de púlpito ou ao lado de um monitor que mostra a logomarca do programa e de onde "saem" as primeiras imagens das matérias apresentadas. Fernando Vieira de Mello pode se encaixar no tipo 2 de âncora, o opinativo. Adota uma linguagem acessível e direta e tem espaço para comentar sobre os assuntos abordados. Já Nadja Haddad, embora divida a apresentação com Mello, não chega a ser considerada âncora do programa. Ela é apresentadora e assume uma postura mais formal restringindo-se a apresentar as notícias sem opinar. Além disso, ainda atua como repórter em matérias especiais e também costuma apresentar a previsão do tempo, papel que, normalmente, não seria de um âncora. Percebe-se então um modelo diferente de apresentação adotado pela Band no Primeiro Jornal, onde há dois jornalistas mas apenas um é âncora de fato enquanto o outro, nesse caso Nadja Haddad, complementa a apresentação sem espaço para opiniões. 2.3.2 Jornal da Band No ar desde o surgimento da emissora, em 1967, o Jornal da Band foi por trinta anos conhecido como Jornal da Bandeirantes. Na década de 1980, o programa ganha alcance nacional e, nessa época, nomes como Joelmir Beting, Belisa Ribeiro, Ronaldo Rosas e Marília Gabriela se alternaram na apresentação. Chico Pinheiro e Carla Vilhena também ancoraram a atração entre 1995 e 1997. Ano V, n. 06 – junho/2009 28 Em 1997, Paulo Henrique Amorim assume a apresentação do JB e inicia uma fase extremamente opinativa e independente do telejornal. Essa fase não dura muito e, por desentendimentos com políticos e com a própria emissora, Paulo Henrique Amorim é substituído por Marcos Hummel e Janine Borba. Em 2004, Carlos Nascimento sai da Globo e assume o Jornal da Band por dois anos. É só em 2006 que, com a saída de Nascimento para o SBT, Ricardo Boechat passa de comentarista a apresentador da atração. A então moça do tempo, Mariana Ferrão, é convidada para dividir a bancada com Boechat.*** Hoje, Boechat, além de apresentador âncora, é editor-chefe responsável pela produção e linha editorial das matérias do telejornal e divide a bancada com Ticiana Villas Boas desde março de 2008. O esquema de apresentação é semelhante ao adotado no Primeiro Jornal. Aqui, Boechat tem maior tempo de fala e espaço para opinião. Ficaria entre os tipos 1 e 2 de ancoragem, já que assume características da formalidade do tipo 1 e da opinião do tipo 2. Ticiana é apresentadora e costuma ser fiel ao roteiro. Na bancada é o perfil do âncora formal (1), mas tem um estilo mais leve que é acentuado pela versatilidade que demonstra ao apresentar também o quadro do tempo e de atuar como repórter em matérias especiais. Tarefas que geralmente não são executadas pelos âncoras. Ambos mantêm uma postura formal, nos moldes tradicionais da bancada, seguem um script previamente definido e interagem pouco entre si. . O programa conta ainda as intervenções de Joelmir Beting que divide a bancada com os apresentadores fazendo comentários a respeito da economia. Assume uma postura essencialmente formal. 2.3.3 Jornal da Noite Sob o comando de Boris Casoy desde 2008, o Jornal da Noite assumiu um novo formato: os 3 primeiros blocos são integralmente noticiosos, pontuados pelas opiniões do âncora. Já o último bloco é mais flexível, com participação eventual de entrevistados e *** Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Jornal_da_Band. Acesso em 15/02/09. Ano V, n. 06 – junho/2009 29 comentaristas. É um dos jornais mais antigos da Band e já foi apresentado por Líllian Witte Fibe, Chico Pinheiro, Carla Vilhena, Roberto Cabrini, entre outros.††† Atualmente, o telejornal tem como marca principal a ousadia e irreverência de Boris Casoy que é considerado o primeiro âncora do telejornalismo brasileiro e, na nossa análise, o principal exemplo do tipo 2 de ancoragem. Com uma postura forte e carregada de opinião, ele tornou famosos bordões como "Isso é uma vergonha!" ou "É preciso passar o Brasil a limpo!". É uma figura polêmica, pois não se furta a dar sua opinião sobre qualquer assunto que seja abordado, até os mais delicados e constrangedores. Isso já lhe trouxe muitas desavenças políticas e demissões de empresas de comunicação. Usa uma linguagem simples e direta, buscando explorar diferentes nuances da notícia e solta seus comentários sempre cheios de ironia. O cenário é a bancada de sempre, mas a postura é de ataque e crítica na maior parte do tempo. 2.4 Telejornais do SBT 2.4.1 Jornal do SBT Manhã É atualmente o telejornal nacional que vai ao ar mais cedo, às seis da manhã. Apresentado hoje pelos jornalistas Hermano Henning e Analice Nicolau, o Jornal do SBT – Manhã é um programa novo. Está no ar há apenas quatro anos e adota um formato tradicional. Uma bancada de onde os apresentadores lêem o script previamente definido. Não há espaço para comentários fora do que eé previsto no script. Hermano, até pela longa experiência anterior, tem mais propriedade para falar fora do roteiro, mas isso acontece pouco. Geralmente, eles se limitam a seguir o que foi planejado e, às vezes, trocam algumas palavras mais informalmente entre si. São âncoras do tipo 1, o mais formal, embora abram espaço para certa descontração em determinados momentos. Analice Nicolau, antes de fazer parte do time de jornalistas do SBT, trabalhava como modelo e, depois de participar de um reality show, foi convidada para apresentar um ††† Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Jornal_da_noite. Acesso em 15/02/09. Ano V, n. 06 – junho/2009 30 noticiário ao lado de Cynthia Benini. Uma experiência mal sucedida que lhe rendeu a falta de credibilidade que carrega até hoje. 2.4.2 Jornal do SBT Noite Desde fevereiro de 2006, o Jornal do SBT – Noite é apresentado pela dupla de jornalistas Carlos Nascimento e Cynthia Benini. É praticamente a segunda edição da versão matutina do telejornal que leva o mesmo nome. O cenário é exatamente o mesmo: a bancada com cenas de redação ao fundo. Os apresentadores adotam uma postura bem semelhante à dos colegas de emissora que apresentam o matutino. Carlos Nascimento, com larga experiência anterior, inclusive na Rede Globo, tornou-se sinônimo de credibilidade. Está entre os primeiros nomes citados de jornalistas que atuaram como âncora. Nesse caso, quando ele trabalhava na TV Cultura. Pode ser inclído, no caso deste telejornal, entre os âncoras do tipo 1, o formal. Segue o roteiro previamente definido com espaço para poucos e breves comentários. Interage bastante com os telespectadores que, vez por outra, participam do programa opinando, pelo telefone, sobre o assunto do dia. Cynthia Benini, embora não tenha currículo anterior como jornalista, chegou ao time do SBT junto com Analice Nicolau para apresentar o mau sucedido SBT Notícias Breves, que ficou conhecido por valorizar mais as cruzadas de pernas das apresentadoras em minissaias,do que as notícias. Diferente de Analice, Cynthia assume uma postura mais séria e as experiências anteriores não abalaram muito a credibilidade que transmite. Se encaixa no perfil do tipo 1. É fiel ao roteiro, interage pouco com Nascimento, mas tem empatia com o público telespectador que participa do programa. Juntos, Nascimento e Cynthia formam a dupla 2.4.3 SBT Brasil O SBT Brasil surgiu em agosto de 2005. A formato era exibido às 19h15 com apresentação da então recém-contratada e vinda da Rede Globo, Ana Paula Padrão. Em Ano V, n. 06 – junho/2009 31 dezembro de 2006, com a chegada de Carlos Nascimento à casa, Ana Paula Padrão passa a apresentar o SBT Realidade e um novo formato se cria para o SBT Brasil. Nascimento divide por pouco tempo a bancada com Juliana Alvin. Nesta fase, o programa passa por várias mudanças de horário de exibição, até que se define por exibi-lo às 21h45. Em março de 2007, Cynthia Benini assume o lugar de Juliana Alvin e o programa passa a contar com a participação dos telespectadores ao vivo, por telefone, e com os comentários de José Nêumanne Pinto, Denise Campos de Toledo, Carlos Chagas e Joseval Peixoto. Em outubro de 2007, o programa é reformulado outra vez e volta ao formato original com apresentação única de Carlos Nascimento. Os comentaristas vão para o Jornal do SBT e novas vinhetas são criadas para o programa.‡‡‡ Aqui, Nascimento assume uma postura diferente de ancoragem, mais compatível com o tipo 2, com maior abertura para o comentário e a opinião. 2.5 Os telejornais da Record 2.5.1 Fala Brasil O formato original do Fala Brasil era semelhante ao que é o programa Hoje em dia. Nesta época, nos anos de 1998, a parte jornalística era apresentada por Doris Giesse, e na bancada do programa ficavam Rosana Hermann, Rafael Moreno, Renata Vianello, Duda Seidl, Virgínia Novicki e Bob Floriano. Em 1999, a Record tentou fazer frente ao Fantástico da Globo e lançou o Fala Brasil Domingo, mas a iniciativa não teve sucesso. É só em 2001, com a contratação de Mônica Waldvogel e Miguel Dias, que o Fala Brasil assume o formato atual. Desde então as mudanças foram só de apresentadores para em 2006 chegar à dupla que permanece até hoje formada pelos jornalistas Marcos Hummel e Luciana Livieiro.§§§ ‡‡‡ §§§ Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/SBT_Brasil. Acesso em 15/02/09. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Fala_brasil. Acesso em 15/02/09. Ano V, n. 06 – junho/2009 32 A dupla assume uma postura formal, dentro de um cenário de estrutura tradicional, mas com toques de modernidade com o ambiente de redação compondo o fundo do quadro. São exemplos do tipo 1 de ancoragem. Seguem o roteiro definido e já lido previamente e fazem poucos comentários livres. Adotam uma linguagem simplificada e interagem com descontração com os repórteres que entram ao vivo de todo o país e também com os entrevistados que vão para o estúdio. Depois do encerramento da edição do dia, permanecem no ar com boletins informativos dentro de outros programas da grade da emissora. 2.5.2 Jornal da Record O Jornal da Record estreou em 1972 quando a emissora ainda pertencia à família Machado de Carvalho e ao apresentador Silvio Santos. No início era apresentado por Ricardo Carvalho, contava com os comentários dos jornalistas Celso Ming e Paulo Markun e com reportagens de Sílvia Poppovic que estava no início da carreira. Em 1989, o telejornal passa a ser apresentado com sucesso pelo jornalista Carlos Nascimento. A partir do ano seguinte, sucessivas mudanças de apresentadores acontecem e em 1997, Boris Casoy deixa o SBT e assume a bancada do Jornal da Record. Ele permaneceu até dezembro de 2005 quando foi demitido sob alegação de que não se adequava mais aos padrões de jornalismo vigentes na emissora. Logo depois, ele foi então substituído pela atual dupla de apresentadores formada pelos jornalistas Celso Freitas e Adriana Araújo, que permanecem até hoje à frente do noticiário..**** A dupla, vinda de longa experiência na Rede Globo, assume uma postura que nos leva a crer que se encaixem no tipo 1 de ancoragem. São formais na postura, seguem o roteiro sem acrescentar comentários imprevistos. Interagem pouco entre si e com repórteres ou correspondentes e, na maioria das vezes, se detém a ler as notícias. **** Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Jornal_da_record. Acesso em 12/02/09. Ano V, n. 06 – junho/2009 33 2.6 Considerações da análise Ao compararmos os profissionais analisados neste trabalho, percebemos que a postura do âncora mudou muito nos telejornais brasileiros ao longo dos anos. O espaço ocupado por este profissional é cada vez maior e tornou-se decisivo para garantir credibilidade ao programa e às notícias apresentadas Os estilos são variados e estão diretamente relacionados à linha editorial do programa que apresentam. Das quatro emissoras pesquisadas, a Rede Globo é ainda a que mantém um padrão de qualidade diferenciado que demonstra, na prática, uma preocupação com os detalhes, que incluem não só a questão dos profissionais que estão na frente das câmeras, como também dos que trabalham na parte técnica, como editores e designers gráficos. Isso resulta em um telejornal melhor elaborado do ponto de vista visual tanto no cenário, como no conteúdo das matérias. A Rede Record, no entanto, tem investido bastante e conquistado mais espaço nos últimos anos, diminuindo a distância da Rede Globo no que se refere à qualidade no telejornalismo. Embora a maioria dos profissionais que hoje trabalham na Record tenham vindo da Globo, ou seja, tenham sido treinados no padrão de qualidade adotado pela emissora, essa evolução fica evidente nos cenários, na produção e na finalização das matérias e de todo material que é exibido. A Band, pioneira no canal fechado de notícias, investe num jornalismo aparentemente mais crítico e opinativo. Visualmente, em termos de cenários principalmente, apresenta pouca sofisticação, utilizando muitas vezes o recurso do já praticamente aposentado chroma key, uma técnica que isola o personagem e permite que se coloque qualquer outro vídeo ou gravura ao fundo, inclusive cenários virtuais. Tem em seu time os principais representantes do tipo 2 de ancoragem. Em 2005, o SBT tentou implantar um jornalismo de credibilidade contratando renomados profissionais de outras emissoras e foi quando mais investiu neste tipo de programa. Mas, o canal de Silvio Santos já carrega um estigma de baixa qualidade no que produz e são raras as iniciativas de sucesso no telejornalismo da emissora. Com esta pesquisa vimos que a maioria dos profissionais brasileiros que estão atualmente à frente de algum telejornal, já passou por diversas emissoras e quase todos Ano V, n. 06 – junho/2009 34 passaram pelo padrão da Rede Globo, que foi quem instituiu o modelo que impera entre os âncoras do telejornalismo brasileiro. Isso os coloca em um patamar muito semelhante no que concerne às competências da profissão. O que realmente vai diferenciar esses jornalistas apresentadores é o estilo adotado por cada um deles. Percebemos que o maior número de profissionais se encaixa no que classificamos como âncora do tipo 1. Um jornalista que prioriza o roteiro e assume uma postura marcada pela formalidade, tanto na questão da linguagem como no que se refere ao apelo visual figurinos e cenários. Os principais exemplos de apresentador com esse perfil são Fátima Bernardes e William Bonner, âncoras do Jornal Nacional da Rede Globo. Já são referência do noticiário e desse modelo formal de apresentação. Com pouco espaço para comentários e opinião, eles detêm a maior audiência entre os telejornais do país. Ao lado do casal padrão da Rede Globo, encontramos os também globais William Waack e Christiane Pelajo, do Jornal da Globo. A formalidade impera na forma de apresentar o último telejornal da emissora. Sandra Annemberg e Evaristo Costa também se encaixam no time dos âncoras tipo 1, o formal. No entanto, ao ancorar o Jornal Hoje, eles têm um estilo muito particular de apresentação que acaba por conferir ao telejornal um clima mais leve e descontraído. Eles sempre encontram um espaço para trocar pequenos comentários entre si. A exceção da Rede Globo fica por conta dos apresentadores do primeiro telejornal da emissora, o Bom Dia Brasil. Renato Machado e Renata Vasconcelos são os únicos exemplos de âncoras do tipo 3, o informal. Com um cenário que permite uma dinâmica maior de movimentação dos apresentadores, Renato e Renata adotam posturas variadas ao longo do programa. Sentados na bancada, em pé ou nas poltronas que lembram uma sala de estar, os apresentadores interagem entre si e com os comentaristas e correspondentes de uma maneira bastante natural, sem muita formalidade. Isso os aproxima dos telespectadores e torna este programa mais atraente no horário da manhã. Na Band, o tipo 2, o opinativo, é predominante. A começar pelo maior representante deste tipo de ancoragem, o jornalista Boris Casoy, que apresenta o Jornal da Noite. Com uma postura de muita crítica e opinião, Casoy, que é considerado o primeiro âncora do telejornalismo brasileiro, tem total liberdade de decisão sobre o que vai ao ar e faz questão Ano V, n. 06 – junho/2009 35 de externar suas impressões sobre o assunto abordado sem esquecer de usar os seus já famosos bordões: "Isso é uma vergonha!" e "É preciso passar o Brasil a limpo!". Logo cedo da manhã, Fernando Vieira de Mello comanda o Primeiro Jornal ao lado de Nadja Haddad. O cenário é moderno, fugindo um pouco das tradicionais bancadas, e, por esse aspecto, ele poderia se encaixar no mesmo grupo do global Bom Dia Brasil. Mas a semelhança se restringe ao aspecto visual porque Mello adota um estilo bastante opinativo ao apresentar as notícias, o que o deixa ao lado de Casoy no grupo dos jornalistas do tipo 2 de ancoragem. Já Nadja Haddad, embora esteja no mesmo programa, assume uma postura mais parecida com a do tipo 1, o formal. Em pé ou na bancada, ela se detém na leitura das notícias sem fazer comentários fora do script. Ricardo Boechat, no Jornal da Band, acompanha os colegas de emissora no tipo 2 de ancoragem. Entre uma notícia e outra ele sempre encaixa algum comentário que parece estar fora do roteiro. Ao seu lado está Ticiana Villas-Bôas que, assim como Nadja no Primeiro Jornal, adota uma postura diferente que se encaixa no tipo 1. Ela também se restringe a ler o teleprompter com as notícias sem acrescentar nenhum comentário relativo ao assunto. No SBT, assim como na Globo, a maioria se encaixa no perfil tipo 1 de ancoragem, o formal. No Jornal do SBT – Manhã, Analice Nicolau e Hermano Henning assumem uma postura mais comedida e, no máximo, trocam rápidos comentários entre si, o que não chega a ser suficientes para classificá-los como tipo 2. Carlos Nascimento, conforme nossa análise, assume uma postura diferenciada a depender do telejornal que está apresentando. No Jornal do SBT – Noite, ao lado de Cynthia Benini, seu perfil está mais de acordo com o tipo formal (1), de pouca opinião, a mesma postura adotada por Cynthia, que apenas apresenta as notícias conforme o roteiro. Mas quando está sozinho, à frente do SBT Brasil, Nascimento se comporta como um âncora do tipo 2, o opinativo. Nesse caso ele abre espaço para comentários e analisa de diferentes ângulos a notícia apresentada. Na Record a predominância também é de profissionais que adotam o perfil mais formal (1). No comando do Fala Brasil, Marcos Hummel e Luciana Livieiro assumem uma postura semelhante à dos apresentadores do Jornal Hoje, da Globo. Basicamente seguem o Ano V, n. 06 – junho/2009 36 script com espaço para rápidos comentários entre si e bastante interação com repórteres que entram ao vivo ou correspondentes internacionais. O mesmo acontece com a dupla de apresentadores do Jornal da Record. Celso Freitas e Adriana Araújo, ambos vindos da Rede Globo, ancoram a atração noturna com uma postura essencialmente formal. Estariam, portanto, ao lado de Fátima Bernardes e William Bonner, do Jornal Nacional, em perfil e estilo de apresentação. Discurso marcado pela formalidade, pouca interação entre si e comentários previamente definidos. CONCLUSÃO Verificamos durante esta pesquisa que, assim como a televisão, a figura do âncora foi inicialmente "importada" dos Estados Unidos. Boris Casoy, considerado o primeiro jornalista brasileiro a atuar como âncora de fato, baseou-se no modelo norte-americano para criar um estilo próprio, que hoje é consenso como sendo um âncora. Nas terras americanas, o âncora tem poderes de autoridade. Pode inclusive admitir e demitir funcionários, dependendo do que ache conveniente. Além disso, tem total autonomia dentro do programa, sendo responsável por decidir o que deve ou não ser exibido. Mas no Brasil, a realidade um pouco diferente. Os primeiros telejornais surgiram ainda na TV Tupi, na década de 1950, mas só com a Rede Globo, alguns anos mais tarde, se criou o padrão de qualidade que acabou se tornando modelo no Brasil. A Globo definiu muita coisa no que diz respeito à atuação desse profissional no país. Inaugurou um novo estilo que, por muito tempo, foi responsabilidade de locutores que vinham do rádio e não de jornalistas. Os jornalistas só passaram a assumir a posição de âncoras quando se tornou necessário que esse profissional compreendesse o processo de produção e fosse capaz de fazer interferências de última hora, entrevistas e comentários que não estivessem previstos no roteiro. Foi então que o roteiro passou a ser apenas um guia para a apresentação do telejornal e, assim, o comentário ganhou espaço. Ao longo do tempo muita coisa mudou. Novas tendências chegaram para quebrar a hegemonia da bancada. Sofás e poltronas de sala de estar passaram a fazer parte do cenário e o apresentador, que antes ficava apenas sentado, ganhou o direito de ficar de pé e Ano V, n. 06 – junho/2009 37 caminhar pelo estúdio, tornando-se quase um convidado de quem o assiste. Os enormes monitores de LCD invadiram os programas e mostram com precisão o que está sendo dito pelo apresentador. É aí que interação com o público ganha força e a desenvoltura e naturalidade com que apresenta as notícias tornam-se fundamentais para o sucesso do âncora e conseqüente sucesso do programa, pois ele passa a ser o símbolo do programa que apresenta. O âncora carrega a responsabilidade da veracidade do que está sendo noticiado. A credibilidade do telejornal passa a ser vinculada a quem o apresenta. Praticamente todos os jornalistas que atuam como âncoras no Brasil são também editores-chefes dos seus telejornais. Portanto, está na mão deles a escolha do material que será exibido. Ele decide o que deve ser notícia no telejornal. Daí a responsabilidade com o que é veiculado no programa que apresenta. Criam-se, então, as linhas editoriais dos programas. E a depender da linha escolhida, a postura adotada pelo apresentador vai ser diferenciada. Observando os âncoras da atualidade, percebemos três tipos distintos de perfil, conforme tipologia definida neste trabalho. O primeiro, e predominante entre os jornalistas brasileiros, seria o formal. Aquele que segue à risca o roteiro que foi previamente definido, interage pouco com outros apresentadores ou correspondentes e com o telespectador e quase não emite comentários fora do script. Neste grupo estão quase todos os âncoras da Rede Globo - William Bonner e Fátima Bernardes do Jornal Nacional, William Waack e Christiane Pelajo do Jornal da Globo e Sandra Annemberg e Evaristo Costa que apresentam o Jornal Hoje – além de todos os jornalistas analisados da Rede Record - Marcos Hummel e Luciana Livieiro, que ancoram o matutino Fala Brasil, e Celso Freitas e Adriana Araújo do Jornal da Record – e ainda os âncoras do SBT - Hermano Henning e Analice Nicolau, que apresentam o Jornal do SBT – Manhã e Carlos Nascimento e Cynthia Benini do Jornal do SBT – Noite. O segundo tipo é o opinativo, encabeçado por Boris Casoy que hoje apresenta o Jornal da Noite na Band. É aquele que tem mais espaço para fazer comentários livres em cima do que está sendo abordado nas matérias ou entrevistas. Os companheiros de emissora Fernando Vieira de Mello, do Primeiro Jornal, e Ricardo Boechat Jornal da Band também se encaixam nesse perfil de ancoragem, lembrando que Boechat também apresenta fortes traços do tipo 1. Ano V, n. 06 – junho/2009 38 Ticiana Villas Boas e Nadja Haddad, que dividem a bancada com Boechat e Mello, respectivamente, não chegam a ser consideradas âncoras. Elas são apresentadoras e também atuam como repórteres em matérias especiais e ainda apresentam a previsão do tempo. Mas esse modelo de apresentação só foi observado na Band. A ressalva é para Carlos Nascimento quando está sozinho à frente do SBT Brasil. Nesse caso, percebemos que ele assume uma postura coerente com o tipo 2 de âncora. Mais solto do roteiro e com espaço para comentários. Os únicos representantes do tipo 3 de ancoragem são os âncoras do Bom Dia Brasil, da Rede Globo, Renato Machado e Renata Vasconcelos. De fato, entre os telejornais analisados, este é o que mais consegue fugir dos padrões tradicionais tanto na questão do cenário, onde os sofás quebram um pouco a formalidade e permitem que os apresentadores se movimentem e assumam posturas inusitadas, como no que diz respeito à apresentação propriamente dita. Há uma interação maior entre eles e com os outros apresentadores (Cláudia Bontempo, Mariana Godoy e Michelle Loreto) e comentaristas, além dos correspondentes que ora são convidados a falar. Muito se evoluiu no telejornalismo brasileiro ao longo dos anos. Tanto do ponto de vista tecnológico com câmeras e suportes digitais para edição e design gráfico, quanto na atuação dos jornalistas diante das câmeras, em especial os âncoras que, com o passar do tempo, assumiram um papel importante no comando dos programas de notícia. Tornaramse o símbolo do telejornal que apresentam e carregam consigo, cada um com seu estilo próprio, a responsabilidade com a veracidade dos fatos que são notícia. REFERÊNCIAS ANKERKRONE, Elmo Francfort. Telejornais que fizeram história. Disponível em http://www.sampaonline.com.br/colunas/elmo/coluna2001set28.htm: acesso em 07/02/09. BARBEIRO, Heródoto e Lima, Paulo Rodolfo. Manual de telejornalismo. Os segredos da notícia na Tv. Rio de Janeiro: Elsevier, 2002 – 3 reimpressão. BORDENAVE, Juan E. Díaz. O que é comunicação. 1 ed. – São Paulo: Brasiliense, 1982. (Coleção Primeiros Passos; 67) FERRARETTO, Luiz Artur. Rádio: o veículo a história e a técnica. Porto Alegre: Editora Sagra Luzzatto, 2001. Ano V, n. 06 – junho/2009 39 DANIEL FILHO. O circo eletrônico: fazendo TV no Brasil. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor Ltda, 2001. GIL, Antonio Calos. Como elaborar projetos de pesquisa. 4. Ed. São Paulo: Atlas, 2002. LOPES, Luís Carlos. A parole do telejornalismo brasileiro. Disponível em http://www.ucm.es/info/especulo/numero31/telejorn.html: acesso em 10/02/09. GIL, Antonio Carlos. Métodos e técnicas de pesquisa social. 5. Ed. São Paulo: Atlas, 1999. HOINEFF, Nelson. Telejornalismo e a crise do velho modelo. Disponível em http://www.observatoriodaimprensa.com.br/artigos.asp?cod=306TVQ001: acesso em 10/02/09 MATTOS, Sérgio. Um perfil da TV brasileira: 40 anos de história:1950-1990. Salvador, ABAP, 1990, p.3. REDE GLOBO DE TELEVISÃO. Jornal Nacional: a notícia faz história. (Memória Globo). Rio de Janeiro : Jorge Zahar, 2004. 407 pp., 420 il. REZENDE, G. J. de. Telejornalismo no Brasil: um perfil editorial. São Paulo: Summus, 2000. SILVA, Antonio Carlos Ribeiro. Metodologia da pesquisa aplicada à contabilidade. São Paulo: Atlas, 2003. SQUIRRA, Sebastião. Boris Casoy: o âncora no telejornalismo brasileiro. Petrópolis (RJ): Vozes, 1993. 206 pp. Ano V, n. 06 – junho/2009