ID: 53249498 03-04-2014 Tiragem: 34258 Pág: 2 País: Portugal Cores: Cor Period.: Diária Área: 27,28 x 30,48 cm² Âmbito: Informação Geral Corte: 1 de 3 ESTUDO Turismo de saúde e bem-estar pode render 400 milhões/ano Operar ingleses às cataratas ou pôr próteses da anca em franceses e alemães pode tornar-se uma prática corrente dentro de alguns anos em Portugal. Um estudo apresentado hoje faz recomendações concretas sobre o turismo médico Alexandra Campos S ão grandes as esperanças dos que acreditam que o turismo de saúde e bem-estar pode passar a ser uma importante fonte de receitas para Portugal. Um estudo encomendado pela Associação Empresarial Portuguesa (AEP) — Câmara de Comércio e Indústria e pelo Health Cluster Portugal (HCP), avança com argumentos e números que fazem sonhar: tem potencial para contribuir com mais de 400 milhões de euros por ano para a economia portuguesa. Em 2020. O grosso das receitas será proveniente do turismo de bem-estar (spa, talassoterapia e termas), projectando-se para o turismo médico uma contribuição bem mais modesta, que passará dos 19 milhões, em 2016, para 94,6 milhões, em 2020, estimam os consultores. O relatório Definição da estratégia colectiva para o sector do turismo de saúde e bemestar português vai ser apresentado hoje numa conferência sobre o tema, em Leça da Palmeira. Depois de terem seleccionado procedimentos médicos e avaliado os respectivos preços em vários países europeus, os consultores da Accenture e Neoturis concluem que há áreas em que Portugal pode ser competitivo. No turismo médico, considerando os preços médios praticados cá e a abertura dos doentes estrangeiros para serem tratados fora do seu país, recomendam a aposta estratégica em sete países europeus, numa primeira fase. Reino Unido, Alemanha e França são os principais mercados, mas a lista inclui Espanha, Holanda, Suécia e Áustria. Percebe-se, porém, que os cus- tos dos tratamentos são elevados em Portugal. Nas cirurgias às cataratas, por exemplo, o preço praticado cá (2500 euros) é superior ao de quase todos os países considerados. Na Alemanha, o custo da operação é menos de metade (980 euros) e até na Suécia e Áustria as cirurgias às cataratas são mais baratas (1900 e 2000 euros). Em França o preço é semelhante e só mesmo no Reino Unido é que a intervenção é mais cara (2940 euros). Nas angioplastias coronárias, o custo médio em Portugal (11 mil euros) também não atrairá doentes alemães, espanhóis ou franceses, apenas britânicos. Nas prostatectomias (remoção de uma parte da próstaEm Portugal, a cirurgia às cataratas é mais cara do que em quase todos os países considerados ta, que custa quase 5 mil euros cá) acontece o mesmo. Em contrapartida, nas artroplastias (colocação de próteses) da anca e do joelho os preços médios praticados em Portugal são competitivos em todos os países considerados (à excepção de Espanha, onde as artroplastias do joelho são mais em conta), e o mesmo verifica-se nas colecistectomias (remoção da vesícula biliar). A grande vantagem de Portugal no turismo médico não passa pela oferta de serviços low cost, admite Joaquim Cunha, director executivo da Health Cluster Portugal, o pólo de competitividade da saúde que junta vários parceiros do sector e que lançou com a AEP o projecto Healthhy’n Portugal já em 2012. A ideia é estruturar a oferta em pacotes complementares que, além do procedimento clínico propriamente dito, incluam viagens e acomodação, até porque os custos de transporte e alojamento “são muito competitivos”. O estudo inclui exemplos de pacotes na artroplastia da anca que vão desde o básico (quatro dias, incluindo cirurgia, viagens, alojamento e a reabilitação motora), até ao premium, com a duração de 60 dias, e que engloba, além de tudo o resto, assistência linguística, sessões de termas ou SPA, turismo religioso e mesmo golfe. No turismo de bem-estar, os principais mercados identificados são EUA, Alemanha, Japão, França e Áustria. Mas para os cálculos das receitas são de novo considerados os sete países europeus seleccionados. No cenário base, em que se define uma quota de 4% do mercado total estimado, é da Alemanha que resulta metade da receita global, 153 milhões de euros. Segue-se o Reino Unido, com perto de 56 milhões, e a França, com mais de 28 milhões. No total, no turismo de bem-estar as receitas potenciais estimadas ultrapassam os 314 milhões de euros. Outra área analisada é a do “turismo médico proactivo”. Aqui, de novo, há tratamentos em que Portugal não parece ser competitivo, como a infertilidade. Em contrapartida, na estética, fazemos rinoplastias a preços mais baixos do que todos os países considerados (aqui, além dos sete referidos, são incluídos a Bélgica, Lituânia e República Checa). Este último oferece, porém, preços mais baratos nas redução do peito, nos facelift e nas abdominoplastias. Na odontologia, somos competitivos nas extracções dentárias simples e nas próteses em acrílico, mas a Hun- gria, que se especializou nesta área, pratica preços mais baixos nos implantes dentários. Neste âmbito, para além dos sete países europeus, há outros mercados considerados estratégicos, como Angola, Moçambique e o Brasil. “O país está farto de viver no mundo da estratosfera”, reage Artur Osório, presidente da Associação Portuguesa da Hospitalização Privada, que olha para estas projecções com uma grande dose de cepticismo. 400 milhões de receitas? “É uma perspectiva optimista, para não dizer utópica”, defende. “Acredito que o turismo do bem-estar é promissor. Basta investirmos nos milhões de pessoas que nos visitam porque gostam do país, da comida, da afabilidade das pessoas. Já o turismo médico é diferente. Só avança com hospitais altamente diferenciados e estruturas especializadas”, pondera. Primeiro, Portugal tem de dar passos para “conquistar credibilidade”, propõe Osório que lembra que a Turquia, desde há anos a investir no turismo de saúde, conseguiu captar clientes “mas de países subdesenvolvidos no campo da saúde”. Deve ser essa a estratégia a seguir por Portugal? Convencido de que o país “pode captar uma parte da diáspora”, Osório responde sugerindo que se dêem “passos realistas” e se aposte “sobretudo nos PALOP”. Os hospitais privados ainda estão a dar os primeiros passos no turismo de saúde e Portugal continua a ter preços muito caros “por causa da ineficiência do sector” e dos honorários médicos, justifica. Em 2012, Neil Lunt, da Universidade de York, deixou um aviso: “Não é suficiente querer. Há sucessos, mas também há muitos sítios onde os doentes não se materializaram.” As termas e os spa são uma das potenc ID: 53249498 03-04-2014 Tiragem: 34258 Pág: 3 País: Portugal Cores: Cor Period.: Diária Área: 27,55 x 30,61 cm² Âmbito: Informação Geral Corte: 2 de 3 PAULO RICCA No global, Portugal não é propriamente low cost Joaquim Cunha Director executivo do Health Cluster Portugal Turquia duplicou pacientes-turistas A Turquia passou de 74 mil pacientes-turistas, em 2008, para 156 mil, em 2011. O segredo? Forte promoção internacional, preços acessíveis, cuidados de saúde de elevada qualidade, localização geográfica e atracções turísticas, sintetizam os autores do estudo. Hoje, a Turquia recebe doentes da Europa, Médio Oriente, EUA e de países como a Albânia, Arménia, Azerbaijão, Bulgária, Geórgia, Grécia, Moldávia, Roménia, Rússia e Ucrânia. Para chegar aqui, desenvolveu um programa de investimento específico, criou uma unidade especial dentro do Ministério da Saúde e incentivou a acreditação das unidades. A Hungria é outro país destacado no estudo, por se ter notabilizado neste sector nos anos 1980, com a chegada de turistas alemães e austríacos que procuravam tratamentos dentários de elevada qualidade a preços acessíveis. Hoje, a Hungria “vende” operações plásticas, tratamentos de ortopedia, reabilitação cardíaca, fertilidade, dermatologia, obesidade e oftalmologia. Como é que chegou aqui? Além de oferecer preços muito baixos, tem um Instituto de Turismo Médico, responsável pela dinamização do sector, e o Governo lançou um plano de 117 milhões de euros para financiar a expansão do mercado, melhorar os equipamentos e evitar a emigração de dentistas. Na Lituânia, o Governo apostou nas feiras internacionais ligadas ao sector e em missões diplomáticas ao estrangeiro, enquanto na Polónia o Polish Medical Tourism Consortium, iniciativa do Ministério da Economia suportada pelo sector privado, está a trabalhar para captar clientes da Rússia, Alemanha, Dinamarca, Suécia, Noruega, Reino Unido e EUA. Com fundos europeus. ciais fontes de receitas “Há mercado e competência, falta-nos reputação” Entrevista Alexandra Campos P romoção é o que é preciso para pôr Portugal no mapa do turismo de saúde, defende Joaquim Cunha, director executivo do Health Cluster Portugal. O estudo veio reforçar as vossas convicções de que Portugal tem tudo para ser um destino de turismo de saúde? As principais conclusões são as de que há procura, temos mercado, temos competência para responder a esse mercado, mas falta-nos a reputação. O défice reputacional está associado à imagem menos positiva dos países do Sul da Europa. Mas a Turquia já conseguiu resultados. Sim, mas a Turquia investiu fortemente. Eles têm um secretário de Estado que só trata do turismo de saúde. A Turkish Airlines faz um desconto aos acompanhantes. O Ministério da Economia paga 50% de todos os investimentos que as entidades de saúde fazem em termos de promoção externa. Mesmo assim, a Turquia tem tido sucesso só numa zona. Podemos mesmo chegar a receitas da ordem dos 400 milhões de euros por ano? Em termos de turismo médico são 100 milhões. Se incluirmos o turismo de bem-estar chegamos 400 milhões. Não é para já, é um trabalho de anos, diria cinco anos. Temos uma posição muito cautelosa. Portugal vai concorrer com países que há já vários anos se posicionaram neste sector... Por isso falamos em quotas de mercado modestas. Temos que encontrar aqui o nosso caminho. Esse caminho passa pelos sete países europeus apontados? Sim. Alemanha, Reino Unido e França em conjunto representam já quase 90% do mercado. Na cirurgia das cataratas, por exemplo, os nossos preços são mais do dobro dos praticados na Alemanha. Estas coisas precisam depois de uma leitura mais fina. Estes são exemplos, uma forma que se encontrou para dimensionar o mercado. Agora, no global, Portugal não é propriamente low cost. Essa não é uma das principais razões que levam as pessoas a fazer turismo de saúde? Podemos ser competitivos nos pacotes que incluem hoteleira. Porque é que os preços dos procedimentos médicos são tão elevados em Portugal? É um tema muito polémico. Os especialistas dizem que os honorários médicos são muito elevados em Portugal. Defende-se no estudo que o sector privado vai ser o grande motor desta estratégia, apesar de haver tentativas de captação de doentes estrangeiros em hospitais do Serviço Nacional de Saúde. Os hospitais públicos vão apostar em certas franjas, em certos nichos. Um hospital público não vai, desde logo, poder prestar cuidados em áreas em que tem listas de espera. É consensual que o sector privado é que vai ser o motor. Mas é importante que possamos ter uma abordagem nacional. Em relação a países fora da Europa não se avançou muito neste estudo. Temos uma dificuldade terrível em obter valores. É pacífico que Angola é um mercado muito interessante, Moçambique começa a ser, o Norte de África pode ter algum interesse. O que é que é preciso fazer para pôr Portugal no mapa do turismo de saúde? Não precisamos de construir hospitais. Os investimentos devem ser feitos em promoção, promoção, promoção. Vai ser necessário fazer uma promoção conjunta coordenada, as agências governamentais serão o chapéu. A AICEP, que vende o país num conjunto de frentes, também passa a vender nesta. O Turismo de Portugal, além da oferta normal, inclui mais esta. A nossa rede diplomática também pode ajudar. O que é preciso é colocar esta temática na agenda nacional. ID: 53249498 03-04-2014 Tiragem: 34258 Pág: 1 País: Portugal Cores: Cor Period.: Diária Área: 18,15 x 1,41 cm² Âmbito: Informação Geral Corte: 3 de 3 Turismo de saúde e bem-estar pode render 400 milhões por ano p2/3