1 JULHO / AGOSTO DE 2009 Caravelas - Julho/Agosto de 2009 - Edição nº 05 Foto: Acervo ECOMAR Caravelas ganha Reserva Extrativista 14| Barcelona: viagem ao distrito rural 5| O São João da Comunidade 13 | Filme é premiado no Rio de Janeiro 6 | Costa das Baleias: a um passo da união 12 |Caravelas é 10 | Entrevista ponto de com o prefeito Luiz Antônio Alvim cultura da Bahia 2 JULHO / AGOSTO DE 2009 D Território e desenvolvimento esde o início dos anos 70 e apesar de todos os esforços da eco-eficiência, a demanda européia de recursos naturais aumentou em 70%. Cada europeu necessita de cerca de 5 hectares de terra produtiva para manter seu estilo de vida. Já o estilo de vida norte-americano exige 9,5 hectares. A média mundial é de 2,2 hectares. A incapacidade de Europa e EUA proverem-se dos recursos naturais e do espaço físico necessário a satisfação de seu estilo de vida determina a expansão de seus negócios para todos os territórios do mundo, e a busca constante por recursos naturais a preço de custo. A luta territorial que apenas começa se faz notar em inúmeros espaços da América Latina e do Brasil. A aquisição de enormes áreas de terra por empresas multinacionais, é um tema inexplorado pelos jornais, mas está se dando de forma contínua: expulsão de trabalhadores rurais, exportação massiva de produtos naturais sem valor agregado, venda dos espaços turísticos cenográficos já desprovidos das pessoas que antes neles habitavam, estas são as características de um apregoado desenvolvimento que não melhora jamais as condições de vida da população. Em um mundo em que o capital abocanha enormes territórios, destituindo as pessoas de sua forma de vida tradicional sem compensá-las de nenhuma outra forma, ter garantido um pedaço de terra talvez não seja tão má idéia. De fato, os inúmeros movimentos sociais que se consolidam nas últimas duas décadas no Brasil estão em sua maioria voltados para a luta territorial e étnica. Novas formas de pensar o desenvolvimento partem de uma visão local, de como organizar-se desde dentro e a partir da própria comunidade inserindo-se estrategicamente nos mercados regionais, nacionais e internacionais para alcançar a melhoria da qualidade de vida de populações historicamente marginalizadas. O caso da criação da Reserva do Cassurubá abriu em Caravelas um amplo debate: discutiu-se pela primeira vez, talvez em séculos, um projeto de desenvolvimento para a cidade, e dois pólos com visões distintas de mundo chocaram-se. Um deles, baseava-se na exploração em larga escala de camarão para a exportação, que resultaria na acumulação de capital pelo pequeno grupo detentor do negócio, no emprego assalariado de uma centena de pessoas e em graves danos ao meio ambiente, prejudicando todo um coletivo de pescadores e extrativistas que necessitam da qualidade do meio natural para sobreviver. No outro pólo, a busca da preservação da natureza como vocação de desenvolvimento, enfocada em alternativas locais baseadas no extrativismo, no turismo ecológico e histórico, nas enormes potencialidades culturais. No dia 05 de junho uma área pública foi criada pelo governo federal para manter o meio ambiente preservado e permitir à população viver da natureza à sua volta. Não se trata de uma terra do governo federal ou do antigo IBAMA, hoje Instituto Chico Mendes de Biodiversidade. É a comunidade de Caravelas que é chamada a usufruir de um patrimônio ambiental e social, para o qual serão necessárias políticas públicas de desenvolvimento local, sob pena de manter a região com os mesmos problemas de educação, saúde, transporte, infra-estrutura de comercialização, entre tantos outros que desanimam e paralisam os sonhos dos moradores de Caravelas. Um verdadeiro projeto de desenvolvimento local implica primeiramente a necessidade de olhar para as potencialidades da terra e das pessoas que nela vivem, ao invés de almejar salvações externas que não geram sinergias locais e desconfiguram a vocação territorial. A prepotência de ações levadas a cabo de forma unilateral e arbitrária deve ceder espaço à negociação, à colaboração e a uma conduta inteligente de gestão por parte dos órgãos que tem a responsabilidade de proteger o direito público e o espaço legítimo de cidadania, dando lugar inclusive, às críticas, que não são outra coisa que a demonstração da existência de uma democracia. Chefiar deve ser necessariamente uma ação de responsabilidade para com os membros do grupo, e não uma oportunidade de exercer o poder indiscriminadamente. Enquanto humanidade, a alternativa que temos diante de nós se dá de modo excludente: ou adaptamos a tecno-esfera ao meio natural ou adaptamos o organismo humano, os organismos vivos em geral e todo o meio natural à tecno-esfera, à tecno-ciência sintética. A opção não poderia ser mais radical. Hoje, não só se estão extinguindo espécies vegetais e animais, mas também necessidades humanas, prioridades humanas que são diariamente e sistematicamente aniquiladas por agentes que matam qualquer idéia de história e de justiça. Especialmente atacadas pela visão tecnocrática do mundo são as prioridades que procedem da necessidade humana de compartilhar, consolar, compreender e ter esperança. Vale a pena destacar: prioridades que procedem de necessidades. Porque uma das maiores dificuldades de fazer frente à crise ecológica e social reside em que não conseguimos nos fazer cargo coletivamente da gravidade da mesma. Sua excepcional idade e gravidade não são simples quimeras, nem delírios alarmistas de quatro irresponsáveis. Reconhecer o que somos e o que devemos ser, como afirmou Camus, basta para encher nossas vidas e ocupar nossos esforços. É um magnífico plano de trabalho para superar todo o niilismo paralisador. O jornal comunitário de Caravelas Endereço: Rua Dr. José André Cruz, 487 - Bairro Nova Coréia Telefone: (73) 3297-2177 | E-mail [email protected] Reportagem: Almay Souza, Lourival Matos, Marilene Figueredo, Francisco de Almeida Oliveira, Vanessa Norberto da Silva, Fernanda Norberto da Silva, Joyce Trindade, Leidiane Assunção, Bárbara Dehmmer, Professor Benito, Danilo Ferreira Fotos: Anerivan Reinalda da Silva, Almay de Souza, Mônica Linhares, Arquivo IBJ, Arquivo Arte Manha, Arquivo Ecomar, André Esteves Secretaria de Redação: Anerivan Reinalda Ilustrações: Almay Souza, Dó Galdino Colunas: Sandro Lyrio Monteiro, Carlos Benedito de Souza, Lierte Siquara Poesias: Cecy Dantas Nascimento, Alessandra Lírio Motorista reportagem Barcelona: Fisher de Souza Santana Departamento Comercial: Marilene Figueredo Conselho Editorial Edição 5: Dó Galdino, Jaco Galdino, Anerivan Reinalda da Silva, Almay de Souza, Kleber Passos Saúde, Marilene Figueredo, Paulo Roberto Júnior, Joaquim Rocha dos Santos Neto, Marcello Lourenço Diagramação: Samuel Miranda 73 9964-9950 Impressão: Gráfica Original 73 3291-8832 [email protected] Coordenação Geral: (Direção de Reportagens, Reportagem, Redação, Edição e Projeto Gráfico): Mônica Linhares Eles também lêem o Timoneiro Agnaldo Timóteo Encontro dos pescadores de Caravelas com representantes da Bahia Pesca CARTA DO CARAVELENSE Educação em vista de um pensamento livre Por meio de uma maneira peculiar de ver, sentir e reagir. É que podemos compreender o quanto a nossa Educação precisa se ater ao fenômeno da autonomia. Hoje, em pleno apogeu da democracia e tendo a luta como instrumento de cidadania, será que ainda continuaremos alienados!? Alienados aos mesmos problemas educacionais de sempre, sobretudo, àqueles que se restringem à realidade eqüidistante entre a escola e orçamento público? Vergonhosamente, os acrônimos Fundef e Fundeb jamais foram compreendidos por nenhum prefeito e por nenhum vereador ao longo desses anos, seja do ponto de vista jurídico, orçamentário ou moral. De lá para cá, a verba da educação nada mais foi do que uma moeda de troca para pagar favores políticos; do que um álibi para legitimar o lado obscuro da lei; do que um estigma falacioso na narrativa educacional de Caravelas... Por isso, é necessário que se desenvolva hoje, um conjunto de propostas, que possa impulsionar a Educação Caravelense. Isto é, direcioná-la na busca da escola autônoma e nos caminhos corretos das leis educacionais. Para que assim se possa resgatar a dignidade do aluno, do professor e de todos os envolvidos no “ Temos a obrigação moral de salvar uma geração de caravelenses “ COM A MÃO NO TIMÃO processo educativo. Todavia, para que isso aconteça, é imprescindível que cada um de nós levante a bandeira da Educação para além das nossas convicções políticas. Uma vez que o verdadeiro valor da Educação transcende a qualquer ideologia de ordem partidária ou eleitoreira. E vale acrescentar também, que cada um de nós deve ser cidadão. Lembrando sempre que: cidadão “é aquele que participa do governo e só pode participar do governo quem tiver poder, liberdade e autonomia” (GADOTTI,1999). A partir de agora, creio que temos a obrigação moral de salvar uma geração de caravelenses. De construir as bases administrativas e, sobretudo, educacionais para as gerações vindouras da nossa amada cidade. No entanto, é preciso acreditar, também, que um homem não é somente um homem. Ele é sempre a soma de todos os homens, homens de ontem e de hoje, e também de amanhã! Enfim, nesse sentido, deve-se saber que o progresso da nossa Educação implicará de maneira decisiva para declínio do fatídico continuísmo político municipal. Isso porque, “todas as grandes épocas de cultura são épocas de decadência política” (NIETZSCHE). Para finalizar, não queremos lutar por uma Educação empreendida pelo poder público como proposta de um saber fossilizado, mas por uma Educação transformadora. Que tão logo, transformará as aspirações de cada um de nós, em realidade. Sandro Lyrio Monteiro (ex-professor da rede pública de ensino) 3 JULHO / AGOSTO DE 2009 Fotos: Anerivan Reinaldo da Silva PERFIL Dona Sinhá: mestre popular do Brasil “Viver lutando graças a Deus, porque quem não trabalha não pode ter nada” Por Lourival Matos N esta edição O Timoneiro traz no perfil a história de Dona Ubelina Lopes dos Santos, conhecida como Dona Sinhá, uma das mais antigas integrantes do Bloco Folclórico Nagôs, tradicional bloco afro que valoriza a matriz africana do Iorubá. Agora com 86 anos esbanjando alegria e lucidez conta pra gente a história de sua vida. Nascida em Araçuaí, estado de Minas Gerais, ainda menina veio com sua família para Caravelas. “Foram um mês e 13 dias de caminhada” lembra Dona Sinhá. Os pais trazendo seus irmãos menores em um carrinho de mão, os mantimentos no lombo do jumento, dormindo debaixo de árvores ou em alguma casa na estrada, até chegar a Caravelas. “A estrada de ferro começava de lá... minha mãe era mineira, filha de Araçuaí e meu pai baiano de Caravelas. Eles trabalhavam carregando malas nas estações de trem da Bahia/ Minas”. Foto: Arquivo Arte Manha Dona Sinhá cercarda de amigos no churrasco que ofereceu para comemorar o título de mestre popular outorgado pelo Ministério de Cultura O traço lapidar de sua vida pode ser visto nesta frase: “Viver lutando graças a Deus, porque quem não trabalha não pode ter nada”. Dona Sinhá se orgulha de ter trabalhado desde a infância para ajudar a criar os irmãos: foi lavadeira, engomadeira, cozinheira e servente durante 10 anos no Colégio Polivalente. Ela se orgulha também da criação dada aos filhos e netos. Perguntada sobre o quê gostava de fazer na infância, ela cantou o trecho de uma música: “Vem moreninha, vem tentação, voando assim tão sozinha uma andorinha não faz verão”. Dona Sinhá mostra-se preocupada com a perda dos valores morais das novas gerações, “muitas moças perdidas e ninguém sabe quem é quem… os pais não chamam mais pra acertar e casar… muitas adolescentes grávidas e os avós acabam assumindo a responsabilidade de criar”. Para dona CIDADÃO TIMONEIRO Seu João da Padaria Há mais ou menos dois meses quem pegava o caminho para Ponta de Areia podia ver umas plaquinhas enterradas no chão à beira da estrada onde se destacavam umas frases pedindo a atenção do passante: “Psiu, cuidado, quero crescer”. Era um alerta para que ninguém pisasse naquele terreno prenhe de frágeis sementes. O tempo passou e ali brotaram uma dúzia de bonitos girassóis. O responsável pelo trabalho, seu João da Padaria, é uma figura conhecida em Caravelas por criar símbolos que nos ajudam a lembrar de nossa história e cultura. Nesta edição ele foi eleito Cidadão Timoneiro, pela importante iniciativa de embelezar a entrada de Ponta de Areia com o amarelo vibrante dos girassóis. A repórter Marilene Figueredo foi entrevistá-lo para conhecer um pouquinho de sua história. Por Marilene Figueredo J oão Luis Benetti, o conhecido João da Padaria, veio para Ponta de Areia em 1972 para trabalhar como pedreiro. Foi só em 1993, após muitos anos de trabalho, que conseguiu montar a própria padaria, em Ponta de Areia, batizada de “Nossa Senhora de Lourdes” em homenagem à santa de devoção. O Timoneiro perguntou-lhe como surgiu sua preocupação com a história e a cultura de Ponta de Areia. Seu João disse que os turistas que passavam pelo seu estabelecimento para bater papo traziam sempre à tona a mesma questão: qual era a história da estação ferroviária Bahia Minas? Foi assim que lhe surgiu a idéia de expor no jardim da atual estação rodoviária, o troler, uma das peças da máquina que fazia o transporte dos ferroviários. Seu objetivo era levantar um símbolo da história que havia se perdido com a demolição do antigo prédio da estação ferroviária. Depois, achou que os pescadores também deveriam ser homenageadas e teve a idéia de colocar um pequeno barco no canteiro que dá acesso à Barra de Caravelas. Com o tempo foi levantando pequenos objetos que criavam im- Foto: Almay Souza Sinhá a molecagem acabou com Caravelas. E também outro grave problema: as drogas. “O rapaz lá em casa foi tomar a benção e quando ajoelhou, na mão tinha dois pacotes de crack! Quem não conhece pensa até que é uma bala”. Ela fala com pesar do descaso das autoridades com a Rua do Porto, uma das primeiras ruas da cidade. “Está uma bagunça, uma mata, ninguém liga, se eu pudesse alguma coisa na minha vida eu ia falar com o prefeito a quem eu vi nascer, engatinhar e assisti ao casamento dos pais dele, para dar assistência àquela rua, aonde chegavam os navios, tinha lojas, muitos comerciantes… Hoje está tudo acabado. E a Cacimba de Santo Antonio caindo aos pedaços… o prefeito não liga, e nem pra Rua do Porto, aquilo ali está uma devassidão, eu já cansei de falar”, desabafa. “Se eu pudesse falar com o POESIA Saudades do Ribeirão Desde quando eu nasci eu vi Você correndo à minha frente Por isto eu luto e não consigo Tirar você da minha mente. Por muito mais que eu queira De você me esquecer Eu não consigo pensar que um dia, Meu amigo, eu fosse te perder. portantes lembranças. A idéia dos girassóis veio da sua preocupação com os problemas ambientais, com a falta de um projeto paisagístico para o distrito. Pretende agora fazer um trabalho que venha a relembrar a vida das pessoas que já não estão entre nós, e que marcaram a história de Ponta de Areia. Seu João afirma ter muitos planos para o povoado, e espera contar com o apoio do poder público municipal em suas pequenas grandes ações. Diz que escolheu viver em Ponta de Areia porque a ama de paixão. Seu João é um exemplo de que não se precisa de muito dinheiro para realizar algo, o que se precisa é de força de vontade. governo eu falaria, ele teve aí (referindo-se ao Presidente Lula), mas eu não pude ir até ele”. Uma vida nas Nagôs Dona Sinhá recebeu recentemente o Título de Mestre Popular pelo Ministério da Cultura como reconhecimento por sua vida junto às Nagôs. “Fiz até um churrasco, com cerveja. Assim mesmo na cadeira” diz, referindo-se à amputação dos pés. O maior significado das nagôs para Dona Sinhá está nos laços de amizade e respeito que ela construiu ao longo de todos esses anos. “ Tenho muito respeito por aquelas meninas que cuidam de tudo lá... e por Piaba, eu o vi nascer e gosto muito da família dele”. Ao encerrar a entrevista ela canta uma música das Nagôs. “Todo mundo já dizia que a Nagô não saia, a Nagô está na rua com prazer e alegria, é a Nagô eu vim brincar, olha a Nagô”. Me lembro de horas alegres Dias de pleno verão Olhava para você Com tanta satisfação Banhando toda aquela gente Meu querido Ribeirão. Ribeirão que águas doces Que nas águas do mar caía Recebia barrenses, cariocas e mineiros A qualquer hora do dia. Aceitava tudo o que vinha Até mesmo a traição Pois não respeitaram seus direitos Meu querido Ribeirão. Ribeirão de águas correntes Que embaixo de uma ponte corria Lembro-me de você a qualquer hora Dia, noite, noite e dia. Gente que daqui não era Por isso não te respeitou Sem saber que você, Ribeirão, Os filhos da Barra criou. Adeus, Ribeirão amado, De águas frias, inocente. Que lavava pratos e roupas E as maldades dessa gente. Senhores, desculpem meus erros, Não sei ler, nem escrever Eu queria saber mais, Ribeirão Para poder te defender. Voltar a minha alegria Voltar suas águas correr Só esqueço de ti, Ribeirão, No dia que eu morrer. Cecy Dantas Nascimento (literatura de cordel) 4 JULHO / AGOSTO DE 2009 FESTAS POPULARES Santo Antônio de Pádua, rogai por nós! No dia 13 de junho acordamos ao som da filarmônica tocando entusiasticamente às 5 horas da manhã. A natureza desperta e nos traz um sentimento de nostalgia, alertando para a realidade: é o último dia das trezenas, agora só no ano que vem... Por Francisco de Almeida Oliveira A alvorada continua, com o repicar dos sinos e os fogos de tiro em profusão. Às dez horas, missa solene com a igreja lotada de fiéis envergando sua roupa nova. Chega o momento do abraço e todos se cumprimentam, rola a emoção que se estende até a comunhão, quando com lágrimas na voz, entoamos Cristo Amigo. Após a missa, a praça transforma-se no palco da confraternização: fogos pipocam no ar, os sinos tocam, a filarmônica nos brinda os dobrados tradicionais, e os caravelenses se reencontram neste segundo Natal... As lágrimas silenciosamente, molham os nossos rostos desejosos de novo encontro ano que vem. A Festa se fará todos os anos impreterivelmente de 31 de maio a 13 de junho – dia da morte de Santo Antônio em Pádua, na Itália, em 1231. Consta das Trezenas, que acontecem de 31 de maio a 12 de junho. No dia 13, uma missa solene é celebrada em latim, seguida pela Procissão de Santo Antônio que percorre as principais ruas da cidade. Cada trezena começa com a Alvorada às cinco da manhã, com repicar de sinos, fogos de tiro e banda de música (optativa). Ao meio dia tudo se repete. Às 19h ocorre a celebração da Santa Missa. Após o culto, o povo aguarda na praça onde todas as noites as barraquinhas oferecem comidas típicas baianas e juninas, salgadinhos, doces e bolos. Há queima de fogos de artifício e, logo em seguida, a filarmônica, sob a batuta do maestros Watson Lopes e José dos Anjos (Popô), apresenta um recital com músicas populares famosas. Todo este aparato festivo foi importado de Lisboa (Portugal), onde nasceu Santo Antônio em 1195. Os Irmãos vestindo Opas e carregando tocheiros durante toda a celebração, também as partituras musicais e a liturgia das trezenas com o Veni – invocação ao Divino Espírito Santo; as jaculatórias – invocação a Santo Antônio; a ladainha de Nossa Senhora; o Salutaris de Gounod – para exposição do SS. Sacramento; o Responso de Santo Antônio, o Tantum Ergo, a benção com o SS. Sacramento e as jaculatórias Finais, cantados pelo Coral de Santo Antônio sob a regência da professora Rosélia Andrade de Souza. Às dezesseis horas sai a Procissão com Santo Antônio vestido de frade em andor, artisticamente ornamentado por Sinval e Nonato, para percorrer e abençoar as ruas que o consagraram Padroeiro há 428 anos. Quando termina a procissão de Santo Antônio, vem a bênção com o SS. Sacramento. Logo é feito o sorteio dos irmãos festeiros do ano vindouro e as palmas enchem o velho templo. Irmandade de Santo Antônio: uma longa trajetória Caravelas foi elevada a condição de cidade no dia 23 de abril de 1855. Apenas três dias depois, Dom Pedro II assinava a autorização para que a Irmandade de Santo Antônio fosse legalizada. Seus objetivos eram os mesmos de hoje: trabalhar para que Santo Antônio seja festejado todos os anos, para o bem espiritual dos irmãos e pelo engrandecimentos da religião Católica Apostólica Romana. A Irmandade é composta de católicos praticantes que aceitem os dogmas da religião. No tempo do Império, os irmãos tinham o privilégio dos principais lugares na igreja. Eram sepultados nos carneiros, catacumbas feitas dentro do próprio templo. Quando se criaram os cemitérios, por lei, em 1858, os irmãos passaram a ser sepultados nas catacumbas da Irmandade na necrópole local. Desde 1581 Caravelas tomou Santo Antônio como o seu padroeiro. Duas capelas foram erguidas em sua homenagem, mas depois destruídas. A primeira, em 1581, por um Frade Capuchinho de origem francesa, atacada pelos indígenas da região; e a segunda, erigida no mesmo local, atacada pelos holandeses em 1636. Uma terceira construção foi então realizada com pedra, cal e óleo de baleia pelo Padre Jesuíta Antônio do Espírito Santo, no sítio fundado por Manoel Fernandes Chaves e Roque Jorge, local da atual cidade, inaugurada em 1750. Por ser um templo majestoso, a 18 de janeiro de 1755 passou a ser a Matriz da Freguesia Eclesiástica. “ A festa de Santo Antônio é a vida do povo” Padre Wanderley Oliveira (Pároco da Cidade de Caravelas) Em sua opinião, qual a importância que a festa de Santo Antônio tem para a comunidade de Caravelas? A importância para a comunidade é gigantesca, o povo vê essa festa como a própria vida. Então realmente é a vida do povo. Como foi para o senhor realizar pela primeira vez a Festa de Santo Antônio aqui em Caravelas? A festa de Santo Antônio é famosa, é milenar, mas aqui em Caravelas tem uma tradição específica, eu diria especial, foi realmente uma experiência agradabilíssima. De quem foi a iniciativa de aumentar o número de famílias neste ano de 2009? Esta é uma experiência minha já há 13 anos. Na paróquia anterior eu trabalhava com umas 200 famílias, sempre me ajudavam, então eu quis fazer essa experiência também aqui, e valeu a pena. Então o Senhor pretende aumentar o número de famílias nos próximos anos? Sem dúvida, pretendo até colocar 300 famílias por noite, quem sabe! “O importante é a integração” Marilene Gouvêa (Moradora de Caravelas e trezenária) Qual a importância desta festa religiosa para a comunidade de Caravelas? Eu acho que a maior importância está na integração. Vêm pessoas de fora, a comunidade de Ponta de Areia, da Barra, Juerana, Taquari participa também. Há uma confraternização entre as comunidades do nosso setor e as comunidades vizinhas que vêm de Prado e Alcobaça. A senhora acha que tem algum ponto da festa que poderia ser mudado? Falta uma parte cultural na praça, acabava a trezena e não tinha nada, não é só forró não. Um ano atrás a gente convidou um coral de música, eu convidei o bate barriga de Helvécia, convidei o coral Vozes que educam de Alcobaça, eu acho que está faltando isso na festa de Santo Antônio. A senhora acha que essa iniciativa deveria vir de quem? Eu acho que tem que ter aí uma interação da igreja com a Secretaria de Turismo, a Secretaria de Cultura. Eu já consegui com o prefeito de Alcobaça um ônibus, consegui com o prefeito de Nova Viçosa que o bate barriga de Helvécia viesse, mas tem que correr atrás, entendeu? Só que isso dá trabalho, então seria bom se houvesse uma interação. Isso não tem tanto gasto não, é só ter boa vontade de fazer. 5 JULHO / AGOSTO DE 2009 O São João da Comunidade Noite de São João Quadrilhas e sanfonas Fazem aquela animação Entre damas e cavalheiros Nesta noite de São João. Por Vanessa Noberto da Silva e Fernanda Norberto da Silva E ste ano uma boa parte da comunidade de Caravelas se mobilizou para festejar o seu São João. Uma semana foi suficiente para o pessoal da rua do Eucalipto arrecadar 1.300 reais entre os moradores, contratar duas bandas, montar os palcos e inaugurar a festa no dia 23 de junho com os grupos de Daniel Show e sensação do Forró. No dia 24 foi a vez da quadrilha Maria Bonita, organizada por Telma Siquara, que saiu do Clube dos 40 desfilando pelas ruas do centro com uma animação que dava orgulho de ver. “Chupa que é de uva”, a quadrilha organizada pelo grupo de jovens da Zaguizara na que homem se veste de mulher e mulher se veste de homem - também fez um enorme sucesso. No dia 28 a comunidade de Alcobaça apresentou sua quadrilha de São João na Praça da Olaria. A prefeitura ajudou na animação com a programação do Forró de Rua, contratando vários grupos para tocar em diferentes pontos da cidade, entre os dias 23 e 28 de junho. E muita gente montou o seu arraial na frente de casa. Foram seis dias de muita dança e animação. As ruas enfeitadas com bandeirolas, as fogueiras e fogos de artifício deram brilho a esta festa tão Fogueiras aquecem a fria noite Bandeirolas enfeitam as ruas Tem forró, arrasta pé Tem comida pra quem quiser. O céu está todo estrelado Crianças não param de brincar O povo está todo encantado Com a bela noite de luar. Saia rodada, chapéu de palha No meio do salão Vai deixando saudades Em cada coração. Balões e foguetes Soltos no ar Festejam esta noite Que está prestes a findar. (Alessandra Lírio) Ceres Scofield tradicional e tão esperada por todos. Agora, o quê a comunidade achou deste São João e o quê propõe para o ano que vem? As repórteres Vanessa Norberto da Silva e Fernanda Norberto da Silva saíram pelas ruas entrevistando os compadres e as comadres para saber a opinião do povo caravelense. Confira as entrevistas e mande a sua opinião para O Timoneiro ([email protected]). Que a festa de 2010 seja ainda melhor! Moradora de Caravelas e professora do município Ericson Bruno da Silva Avelar Morador da rua do eucalipto e organizador da festa comunitária Como surgiu a iniciativa e por quê você resolveu fazer esse São João comunitário? Em primeiro lugar, foi porque ficamos sabendo através de pessoas que trabalham na Prefeitura que não iria ter o São João. Eu conversei com os moradores e com Daniel Show que é o dono da banda, perguntei quanto ele cobraria para fazer essa festa, aí conversei com os moradores da rua do Eucalipto, se eles poderiam colaborar com a quantia de dez reais. Essa arrecadação foi na Rua do Eucalipto ou na cidade toda? Teve a contribuição das ruas vizinhas e de alguns moradores da Barra. No total arrecadamos o valor de mil e trezentos reais em uma semana. Mas estamos começando e não queremos parar devido a comunidade estar elogiando bastante, vamos continuar e daqui pra frente torcer para fazer um trabalho melhor. Emerson Santana Rodrigues Morador de Caravelas e participante da Quadrilha “Chupa que é de Uva” De quem foi a iniciativa de organizar a quadrilha ”Chupa que é de Uva”? Os componentes da turma “Zanguizarra”, um grupo de jovens que se formaram juntos e que até hoje se reúnem para organizar confraternizações para unir a turma. Qual o objetivo dos homens vestirem-se de mulher e as mulheres de homens? Pra ficar diferente, mais extrovertido, levando mais alegria para a comunidade. Qualquer pessoa pode participar da quadrilha “Chupa que é de Uva”? Sim, quem quiser participar é só entrar em contato com uma das organizadoras Daiana, Jovana ou Aline. Há quantos anos vocês formaram essa quadrilha? Faz três anos que existe a quadrilha e eu participei em todos os anos. Vocês pretendem continuar alegrando a comunidade com a “Quadrilha Chupa que é de Uva” nos próximos anos? Pretendemos, pois queremos que ela vire tradição em nossa cidade e que os jovens participem mais desta festa que é tradicional da região. Telma Siquara Moradora de Caravelas e organizadora da Quadrilha Maria Bonita De quem foi essa iniciativa de fazer essa Quadrilha da Maria Bonita? Foi do grupo, porque a gente já faz outras coisas juntos, e como é São João, é natural que agente engate alguma coisa para alegrar um pouco mais a cidade. É importante que todo mundo se una, porque isso é o bem comum, é uma diversão, então eu acho que cada um fazendo um pouquinho faz uma coisa grande, e isso é muito bom. Hoje nós poderíamos ter muito mais gente aqui, mas como resolvemos em cima da hora há menos pessoas, mas no ano que vem podem nos procurar porque vai ser bacana. O que a senhora está achando do São João? Eu gostei, eu não gostava muito da festa da gestão anterior, era animada, realizada naquele espaço próximo à igrejinha, mas tinha tirando essa coisa gostosa tradicional da festa nas ruas de Caravelas. Essa idéia de colocar palcos em vários lugares é legal, porque faz com que movimente mais a cidade. Uma coisa que eu achava sempre que devia fazer é concurso de rua, porque se fizesse concurso de rua ia animar mais ainda, a turma ia participar e promoveria mais a cidade, mas é uma idéia que pode vir ainda a acontecer. Itamar dos Anjos Morador de Caravelas e artista plástico Você está acompanhando o São João aqui de Caravelas? O que você está achando? Eu acho maravilhoso essa forma das pessoas não esperarem só que a prefeitura faça, como o pessoal da rua do eucalipto, como Curinha lá na avenida, como outras ruas que as famílias se juntaram e organizaram a sua festa. Eu acho que ano no que vem e outros anos que virão vale a pena estar nessa forma de encontro, de integração, de movimento, tem muito mais amor na história por que você está fazendo junto, está construindo junto. Paulo Roberto Barbosa dos Santos Morador de Caravelas e vereador Você acha que o São João comunitário deve continuar nos próximos anos? Eu acho que tem que ter as duas partes, esse ano rolou por uma questão econômica, a prefeitura não teve dinheiro para fazer um forró centralizado, mas acredito que ano que vem com o planejamento, com a secretaria de cultura, a secretaria de turismo e o próprio poder executivo fazendo o planejamento antes, vai dar pra fazer o forró centralizado e também dá pra ajudar a comunidade dos bairros a fazer o forró de rua. Wagner Antonio Petersen da Silva Morador de Caravelas e enfermeiro A comunidade teve uma boa aceitação do São João? Na realidade a nossa comunidade ainda tem um grande bloqueio com cultura, como a festa de São João, hoje as pessoas querem bandas famosas e acabam com a cultura, com a crise que a gente passa não dá pra sustentar esse luxo. Acho que a comunidade tem que ir desarmada para todas as festas, pois em Caravelas o índice de violência está aumentando cada dia que passa, tirando o espírito e o prazer junino que é o que esperamos. 6 JULHO / AGOSTO DE 2009 TURISMO Costa das Baleias: a um passo da união O Ministério do Turismo e Sebrae apóiam o fortalecimento dos Conselhos Municipais de Turismo em busca de uma estratégia de trabalho conjunta para a região Por Joyce Trindade A gião, o Secretário de Turismo da Bahia, Domingues Leonelli e autoridades do município de Bonito (MS), um dos melhores destinos de ecoturismo do Brasil. Leonelli disse que o Governo do Estado reconhece a importância de todo o Extremo Sul e que tem um compromisso estratégico com a Costa das Baleias. Informou que o Estado está investindo cerca de 12 milhões em qualidade profissional entre 2008 e 2009. “Isso é fundamental, pois 80% dos turistas no mundo decidem as viagens a partir de informações de outras pessoas que estiveram no destino pretendido”, destacou. Mas foi a bem sucedida experiência de turismo ecológico em Bonito a que chamou a atenção de todos. Augusto Barbosa Mariano - Secretário Municipal de Indústria, Comércio e Turismo e Cícero Ramos Peralta - Presidente do COMTUR, ambos de Bonito-MS apresentaram o bem sucedido caso de seu município, que gera em media 2.600 empregos diretos ao setor. O segredo, segundo eles, está na união do poder público, setor privado e comunidade, Costa das Baleias é composta pelos municípios de Caravelas, Alcobaça, Prado, Nova Viçosa, Mucuri, Teixeira de Freitas e Itamarajú. Junto a Costa do Descobrimento, conforma o que o governo federal intitulou de Pólo do Descobrimento. A região apresenta uma série de potencialidades derivadas do turismo ecológico, histórico e cultural. Mas sofre com problemas de infra-estrutura em suas estradas, com a precariedade das instalações hoteleiras, a falta de bons serviços e produtos formatados para a compra. O início da solução pode estar na ação concertada dos Conselhos Municipais de Turismo com a Câmara de Turismo da Costa das Baleias para a criação de políticas públicas para a região. No dia 29 de maio foi realizado no Hotel Residencial do Mirante em Prado, Balneário Praia de Guaratiba, o I Encontro de Fortalecimento das Instancias de Governanças Locais, que teve o objetivo de fortalecer os conselhos municipais de turismo da Costa das Baleias. O evento reuniu prefeitos e representantes dos municípios da re- A promessa de Reativação do Aeroporto Durante o I Encontro de Fortalecimento das Instancias de Governanças Locais, o prefeito de Caravelas Luiz Antonio Alvim Delgado, solicitou mais atenção do governo do Estado para o extremo sul e pediu a recuperação do aeroporto de Caravelas. Repetiu a reivindicação no dia 5 de junho, para o presidente Lula e o governador da Bahia, Jaques Wagner, reunidos no ato de criação da Reserva Extrativista do Cassurubá. O presidente comprometeu-se diante do público presente e ao vivo em rede nacional, que iria reativar o aeroporto. O prefeito se reúne com o governador da Bahia, Jaques Wagner em meados de agosto para discutir o assunto. N Bonito é exemplo de ecoturismo no Brasil ão se pode negar o progresso dos últimos anos em função do turismo. Atualmente mais de 56% da mão-de-obra de Bonito está voltada diretamente para esta atividade econômica. A proximidade com o Pantanal, as cachoeiras e rios oferecem um atrativo natural que empresários e poder público do município souberam aproveitar, criando atividades de ecoturismo que encantam o visitante. Foto: Joyce Trindade ENTREVISTA O Comtur de Caravelas foi criado em maio de 2006, mas nunca chegou a funcionar como deveria. As reuniões eram improdutivas e muitos membros do conselho não participavam dos encontros, o que dificultava o avanço na geração de políticas públicas para o setor em Caravelas. “O desafio principal é ter resultados”, ressalta Simone da Silva, presidente do Comtur, eleita no último dia 25 de maio. Com foco em ações imediatas, ela criou uma comissão para a discussão de uma estratégia de arrecadação para o Fundo Municipal de Turismo (Fumtur), outra para discutir a gestão do cais - 214 mil reais para reestruturação do cais foram perdidos por falta de organização na gestão anterior - e outra para o inventário turístico de Caravelas, que deve ser apresentado à Bahiatursa (órgão oficial de turismo do governo do Estado) no próximo ano. Está discutindo também a formulação de uma parceria com o SENAC para oferecer cursos de formação à comunidade caravelense na área de turismo. O Timoneiro entrevistou a nova presidente do Conselho Municipal de Turismo de Caravelas, Simone da Silva, gerente do hotel Marina, integrante da Associação de Turismo de Caravelas e profissional respeitada pela sua capacitação e seriedade. “Abrolhos é o único produto que temos formatado. Precisamos de empresas que criem atrativos diferenciados, coisas feitas com qualidade” Timoneiro - Como se pode promover o desenvolvimento local de Caravelas a partir do turismo? Através da inserção da comunidade na atividade turística. Em Caravelas há necessidade de agregar algo mais para a gente oferecer aos nossos clientes, criar produtos. Nós temos uma série de atrações não aproveitadas. E o contato com a comunidade é importante. O turista aceita bem isto, valoriza este contato. Timoneiro – Como pequenos projetos de que trabalham juntos pelos mesmos objetivos. No dia 14 de julho os representantes dos Conselhos de Turismo de Caravelas, Alcobaça e Prado se encontraram no Centro de Visitantes do Parque Nacional Marinho dos Abrolhos para o II Encontro para o Fortalecimento dos Conselhos Municipais de Turismo da região da Costa das Baleias. Organizado pelo Ministério de Turismo e pelo Sebrae, o evento serviu para trocar experiências e começar a sedimentar um projeto comum de turismo para toda a Costa das Baleias. “A região da Costa das Baleias ainda é nova turisticamente, é necessário que os Conselhos tenham um projeto comum do tipo de turismo que desejam ter, que pensem a região como um todo”, aconselhou Ricardo Cerqueira, consultor do Sebrae e funcionário do programa de regionalização do Ministério do Turismo. O próximo encontro de fortalecimento do Conselhos de Turismo Municipais será realizado no dia 17 de agosto em Alcobaça. desenvolvimento local podem ser apoiados a partir do turismo? Por exemplo, as frutas que estragam na estação de verão, poderiam servir para fabricar produtos típicos da terra? Essa é uma idéia antiga na Associação de Turismo de Caravelas, de fazer uma cooperativa de doces. Em novembro vai encher de manga, de caju, e a gente vê aquilo sendo desperdiçado. Então, a cooperativa de doceiros da região é algo muito importante, pois pode ajudar a comunidade. A vontade de fazer isto é muito grande, e existe São vários destinos turísticos e empresas que procuram o Município ao longo do ano, em busca do Modelo de Gestão Sustentável, como forma de inspiração para adaptar na sua realidade. Atualmente existem 67 empresas oferecendo serviços de hospedagem, entre hotéis e pousadas de pequeno a grande porte. Existem 32 agências operando no mercado; aproximadamente 80 guias de turismo credenciados pelo Ministério do Turismo; mais de 25 sítios turísticos, vários serviços de locação de automóveis, vans, motos e bicicletas; entre bares, restaurantes e lanchonetes existem mais de 40 opções. Além disso, o Município conta com um moderno centro de convenções e um aeroporto. Todos esses serviços provenientes do Turismo fazem com que a comunidade também desfrute de uma melhor qualidade de vida. uma tendência do Ministério do Turismo a apoiar este tipo de projetos também, de apoiar o associativismo da comunidade. Timoneiro - Há uma senhora na Barra que faz um maravilhoso licor de jenipapo, inclusive trabalha a garrafa artesanalmente, fica muito bonita, mas diz que não tem para quem vender... O licor de jenipapo da região aqui é famoso e está escondido, a própria moqueca de Camarão… eu estou há dez anos aqui e há muita coisa que eu não conheço. Há coisas que a gente precisa resgatar que fazem parte do próprio patrimônio cultural de Caravelas. A gente no Comtur quer apoiar estas propostas, mas estamos no começo, estruturando a idéia. há uma regularidade nas apresentações, quer dizer, ainda não podemos vender estas apresentações como um produto turístico. O Timoneiro - Quais são os principais problemas na área turística de Caravelas? Falta de infra-estrutura e de produtos turísticos. O centro histórico está bem depreciado, Abrolhos é o único produto que temos formatado. Precisamos de empresas que criem atrativos diferenciados, coisas feitas com qualidade. O Timoneiro - Caravelas possui uma produção cultural que poderia apoiar a geração destes atrativos? A parte cultural de Caravelas é muito forte. Uma vez no Hotel Marina recebemos um grupo de estudantes de São Paulo, agendamos para que eles assistissem a uma apresentação do grupo de dança do Arte manha, e eles adoraram! Mas há um problema porque não O Timoneiro - O turismo de Caravelas é um turismo de grandes hotéis, ou um turismo comunitário? O turismo de Caravelas é um turismo de meios de hospedagem de médio e pequeno porte. Isso a princípio pode parecer que é pouco, mas não é. Por quê? Nós estamos dimensionados a demanda atual. A gente é auto-sustentável o ano todo. O Hotel Marina se sustenta o ano todo, e também as empresas de turismo que são bem administradas. Agora você vê as cidades de Prado e Alcobaça com um grande número de leitos que estão desocupados. Acho que Caravelas tem a medida certa, e tem que crescer na medida em que a demanda cresce. E crescer de qualquer jeito também não adianta, tem que crescer com qualidade. O Timoneiro - O Turismo comunitário na casa das pessoas também pode ser importante? A ATC apóia o projeto da Ecomar, o turismo de base comunitária no Cassurubá, que é justamente isto, levar o turismo para a casa das pessoas. Havia um projeto de grande hotel para esta região, mas com a criação da Reserva do Cassurubá não é mais viável. Acho que se tem que respeitar o modo de vida das pessoas, então não é assim, chegar e fazer. Tem que perguntar primeiro se pode fazer. 7 JULHO / AGOSTO DE 2009 Novas perspectivas para a pesca em Caravelas dor em Caravelas por RS 2,30 e para a comunidade acaba custando R$ 5,00. Cooperativa - Muitas das dificuldades seriam resolvidas com o trabalho conjunto em uma cooperativa corretamente administrada. De fato, a antiga COPESBA (Cooperativa do Pescadores do Extremo Sul da Bahia) funcionou bem durante as décadas de 70 e 80, dando suporte ao pescador, através da compra de toda a produção de seus associados. A Cooperativa disponibilizava ainda aos pescadores uma oficina náutica que dava auxílio à manutenção das embarcações e um mercadinho que oferecia os produtos a preço de custo, diminuindo os gastos dos pescadores com o material de pesca. A falência em 1999, atribuída a graves problemas administrativos e de transparência em sua gestão, deixou muitos pescadores em uma situação penosa. “A diretoria desapareceu e tudo ficou abandonado”, afirma Lierte COMUNICADO AO PESCADOR Siquara, presidente da APESCA, atualmente instalada no mesmo espaço físico da antiga Cooperativa. A dívida astronômica com o Banco do Nordeste não foi jamais sanada e ficaram sem resolução uma série de pendências trabalhistas com os antigos funcionários, que hoje lutam na justiça para reaver seus direitos (veja a opinião de Carlos Benedito, antigo funcionário da cooperativa). Hoje a APESCA busca revitalizar o setor pesqueiro através da aquisição de novas máquinas para a produção e o beneficiamento do pescado. (Veja comunicado abaixo) “Somos uma associação sem fins lucrativos, o que estamos recebendo é uma doação”, ressalta Lierte Siquara. Ele lembra também à comunidade que estará passando um livro de ouro para saldar compromissos de rotina - telefone, internet, aluguel, entre outros - que hoje giram em torno a 2 mil reais. O Por Lierte Siquara Presidente da APESCA A Associação dos Pescadores de Rede de Arrasto, Boeira, Fundo e Arraieira (APESCA) foi criada há três anos, com objetivo de desenvolver projetos para a melhoria da qualidade de vida do pescador e seus familiares na região de Caravelas. Pretende trabalhar para aprimorar a qualidade do produto e do trabalho dos associados, promovendo a capacitação profissional do pescador e desenvolvendo projetos de geração de renda alternativa, aliados com programas de educação ambiental e extensão agroecológica. Possui hoje 42 associados e está aberta a novas afiliações. A APESCA vem trabalhando em parceria com a Colônia Z-25 desde a mudança de sua diretoria e da posse no início deste ano de Gilson Guedes Caetano, o “Du”, para o cargo de presidente, que se revelou preocupado em defender os interesses dos pescadores em nosso município. Também desenvolve hoje um projeto junto à Aracruz Celulose para a captação de recursos junto ao BNDES, com o objetivo de instalar uma unidade de processamento, armazenamento e comercialização de pescado e frutos do mar. Trata-se de uma doação da Aracruz à Associação com o fim de beneficiar o setor pesqueiro, buscando a melhoria da qualidade de vida dos pescadores, sua família e, con- sequentemente, a comunidade caravelense em geral. Com o financiamento que a Aracruz está buscando junto ao BNDES será possível instalar novo maquinário para a produção e o beneficiamento do pescado. Nesse projeto a APESCA está articulando a aquisição de uma máquina de gelo de 20 toneladas diária (como a antiga), um poço artesiano de 120 metros de profundidade, uma máquina de descascar camarão, acessórios necessários para manuseio e guarda do produto e a reforma de toda a parte de produção e beneficiamento das instalações físicas da antiga COPESBA, que se encontra em total abandono, com ferrugem e cupim destruindo tudo. A Associação também vem trabalhando para a implantação da Reserva Extrativista do Cassurubá, e tem o objetivo de apoiar projetos de desenvolvimento sustentável em nossa comunidade, gerando crescimento e renda à comunidade envolvida. A APESCA não é para meia dúzia. O objetivo da Associação é atender a todos os pescadores de Caravelas, Barra, Ponta de Areia e Zona Ribeirinha. Aqueles que tenham interesse de afiliar-se à APESCA podem procurar sua secretaria, localizada na Rua Dom Felipe, sem número, na sede da antiga Cooperativa. Foto: Anerivan Reinalda Por Carlos Benedito de Souza Funcionário de 1980-2000 COOPERATIVA DE PESCA Foto: Anerivan Reinalda A APESCA não é para meia dúzia José Soares Medeiros foi pescador da Barra de Caravelas durante toda sua vida e hoje trabalha na comercialização. Um retrato aos olhos de quem vivenciou município de Caravelas durante 19 anos ficou caracterizado junto aos governos, como pólo significativo das atividades pesqueiras, fruto de uma equipe de trabalho séria da Cooperativa Mista dos Pescadores do Extremo Sul da Bahia Responsabilidade Limitada - COPESBA, e de uma administração voltada para os interesses da classe que lhe sustentava. Em 1986, chegou a absorver 648 toneladas de produtos de origem da pesca, representando um percentual de 76% do produto anual capturado em nosso município, beneficiando mais de cerca de 200 associados e contando com uma frota de 40 embarcações, oferecendo diversos tipos de serviços e gerando mais 150 empregos diretos. Após atuar durante estes anos e depois da busca incansável por recursos para diversificar a sua produtividade, ficou obrigada a desativar as suas ações administrativas cooperativistas, tornando-se inoperante, alcançando em 1999, um insignificante percentual de participação na produtividade de pescados do município de 10%, vindo assim a contribuir para a sua desativação e inviabilizando o compromisso da dívida contraída junto ao Banco do Nordeste em 1994, cujo montante chega a mais de R$ 305 mil reais. No dia 14 de setembro de 1999, em Assembléia Geral Extraordinária, foi aprovado o pedido de demissão conjunta dos seus Diretores. Pode-se dizer que durante estes 14 anos (1982-1996), alguns diretores procuraram dentro de suas capacidades alguma forma para minimizar a situação crítica em que se encontrava a empresa. Em 1996, o Assessor Administrativo Sr. Carlos após apresentar o relatório de situação financeiro-econômica constatando para os Diretores um “passivo a descoberto” (prejuízo), procurou imediatamente o apoio do Dep. Federal Jaime Fernandes para ajuda, o que fez através do Estado/BAHIA PESCA, a liberação de 89 mil reais (o que supriu por 2 meses) e viabilizou com o Presidente da empresa Sr. Manoel, uma viagem para Brasília para uma audiência com o Ministro de Agricultura Dr. Arlindo Porto na tentativa de se “ Foi um sonho que se perdeu na realidade “ A pesca extrativista marinha, apesar da crise de sustentabilidade que vive, esta longe de ser uma atividade decadente e condenada ao fracasso. Caravelas produz mensalmente centenas de toneladas de pescado, enviado em sua maior parte aos mercados de Salvador e Espírito Santo através dos 20 atravessadores locais, que trabalham com a comercialização e o armazenamento do produto. Apenas um atravessador chega a manejar o envio de 5 ou 6 toneladas de arraia por semana. Acredita-se que o quilo comprado a R$ 1,50 no mercado local seja revendido por cerca de R$ 5,00 nos mercados de destino. Por falta de estrutura de armazenamento e comercialização o pescador acaba impedido de estabelecer o preço final de seu produto. A inexistência de um frigorífico coletivo é outro problema. O gelo que chega em Alcobaça, cidade vizinha, a R$ 2,00 é vendido ao pesca- buscar soluções para a então crise, que aparentemente era de gestão administrativa. Neste ínterim, foi-nos sugerido participarmos do RECOOP – Programa de Revitalização das Cooperativas (projeto este feito por mim, Sra. Walquíria e Sr. Ivo Lima) na época, eram aproximadamente 471 Cooperativas no país com situações semelhantes. Para a sustentabilidade dos custos operacionais da empresa eram necessários 15/ton de produtos/mês. Chegamos no final com uma produção anual de 9 ton/ano (contribuiu em grande parte o desvio de produtos por alguns associados) o que inviabilizou consideravelmente o funcionamento. Era preciso se ter uma solução ousada, inteligente e a curto prazo. O tal projeto suscitado falava em capacitação de sua diretoria (causa do maior entrave), quadro funcional e associados. Com o fechamento advindo de várias situações desconfortáveis a empresa criada há duas décadas pela CEPLAC foi entregue (na ilegalidade) para que os seus 19 funcionários dessem um rumo a esta situação desastrosa. Ao não aceitarmos (por não haver amparo legal), foi constituído (pela justiça) um depositário fiel (pessoa responsável por todos os bens recebidos para cuidar e zelar) até que quando solucionado o caso o mesmo deverá desocupar o imóvel sem ônus para as partes, entregando tudo o que foi repassado conforme documento firmado. A pobre situação vivida pelo ex-funcionário Arnaldo Francisco de Jesus (diga-se passando até mesmo fome) e que tempos depois veio a falecer foi um dos fatores deste caos. Até hoje, muitos estão desempregados. A situação social em muito piorou, pois dali alimentava-se centenas de pessoas e circulava diariamente 15 mil reais na cidade. Foi um sonho que se perdeu na realidade. A verdade é que os seus funcionários, foram lançados ao mar, como uma nau sem rumo, onde somente há 4 anos, as portas da justiça trabalhista foram abertas para a solução final e que só depende agora dos funcionários.. Espera-se um pouco de respeito e dignidade para àqueles que tiveram o seu suor derramado durante anos e sequer foram ouvidos no novo processo de gestão. Somos parte de uma adição e queremos partilhar desta soma, até mesmo com uma simples palavra. Festa de São Pedro celebra o dia dos Pescadores D as tradições populares do Brasil não há outra que melhor represente o povo no trabalho da navegação e da pesca que a festa que se celebra no dia de São Pedro, santo protetor dos pescadores, das embarcações e das pescarias. Ao poder do santo muitas vezes acreditou-se dever a vida disputada contra as tempestades e à sua graça se reconheceram as miríades de peixes trazidos às praias e dispostos sobre as areias, nas épocas de fartura do mar. Em Caravelas a festa em homenagem ao Santo aconteceu entre os dias 28 e 29 de junho na comunidade da Barra, atraindo pescadores, marisqueiras e moradores de toda a região. “Antigamente a tradição Foto: Mônica Linhares OPINIÃO era realizar apenas missa na praia com procissão marítima. Mas nos últimos três anos, a participação da comunidade permitiu que muita coisa mudasse, para melhor. Agora oferecemos festa a noite com variadas bebidas e comidas tradicionais, forró, quadrilhas e sorteio com vários prêmios tanto para a comunidade, quanto para a embarcação melhor organizada, com prêmios para 1º, 2º e 3º lugares” explica Normélia Medeiros Mota, conhecida como Nona, uma das principais organizadoras da celebração. A procissão marítima foi finalizada com a prometida premiação para os barcos mais chamativos, atraentes e organizados. O primeiro lugar ficou com Roberto, para o barco Problema Meu, o segundo com seu Arlindo, para o barco Regiane, e o terceiro lugar foi concedido a Pedro, pelo barco Tramps. Para arrecadar fundos Nona buscou patrocínio junto aos comerciantes da Barra, Ponta de Areia e Caravelas. Contou também com o apoio do Parque Nacional Marinho dos Abrolhos. “O Parque nos deu uma força muito grande.Mas para que aconteça uma festa assim maravilhosa, gastamos muito e por isso queremos agradecer também a toda a comunidade, porque sem ela não teríamos condição nenhuma de realizar esta comemoração”, completa Nona. 8 A pesca na Reserva do C JULHO / AGOSTO DE 2009 Foto: André Esteves Em Caravelas cerca de 1.200 famílias dependem da pescaria e da mariscagem para viver. Muitas ainda não sabem que a Reserva Extrativista do Cassurubá, que foi criada por decreto do presidente Lula em Ponta de Areia, no dia 05 de junho de 2009, poderá ajudar a melhorar a pesca na região, resguardando o espaço marinho para o uso exclusivo dos pescadores da comunidade e criando formas de manter ou até aumentar a quantidade de peixes, camarões e caranguejos da área. O Timoneiro apresenta nesta edição uma reportagem sobre as vantagens que a recém-criada Reserva Extrativista do Cassurubá trará para esta classe profissional. As repórteres Bárbara Demmer, Joyce Trindade e Marilene Figueiredo entrevistaram vários pescadores e marisqueiras para mostrar os problemas que vivem e saber o quê pensam sobre a nova Reserva Extrativista. Por Bárbara Dehmmer, Joyce Trindade e Marilene Figueredo “ Foto: Mônica Linhares Seu Raul Rocha, pecador de Ponta de Areia res da cidade, como Antônio Teixeira, conhecido por Tonico, também morador de Ponta de Areia: “A situação está mais difícil. Os peixes estão mais longe, o preço do quilo está diminuindo e o material encarecendo. O camarão também está diminuindo e há muitas embarcações no mar”, lamenta. Não é o único que pensa assim. Para Roberto da Silva, pescador e morador da Barra de Caravelas, a quantidade de barcos vindos de outras áreas já está passando dos limites. “Só as embarcações de Caravelas já são o bastante, e ain- da vem os barcos de fora... a maioria coloca rede de dia e à noite”, adverte. Em Caravelas aproximadamente 200 embarcações trabalham diariamente com a pesca. Este número triplica quando somados os municípios de Nova Viçosa e Alcobaça. O presidente da Associação APESCA, Lierte Abreu Siquara, considera que de meados dos anos 70 para cá Caravelas perdeu algo como 80% do seu pescado. Esta situação, segundo ele, foi gerada em boa medida pela atitude do próprio pescador. “Hoje não se tem mais o cuidado que se tinha antes, antigamente toda área era considerada uma reserva. Agora o peixe vai se afastando. Para ir matar uma arraia você tem gastar umas seis horas, antes você saía numa beirada de praia e matava o peixe”, diz. Espera-se que a implantação da Reserva Extrativista do Cassurubá (RESEX) apóie modos mais sustentáveis de pesca, ajude a demarcar os locais para a reprodução das espécies, a proteger o estuário e o mangue, e o que não é menos importante, resguarde o espaço marinho e do manguezal para o uso dos pescadores e catadores de caranguejo da comunidade. Garantia - Foi exatamente para preservar os estoques locais de caranguejos da coleta por extrativistas de outras regiões que a Associação de Marisqueiros de Ponta de Areia e Caravelas (AMPAC) realizou o primeiro pedido de criação da RESEX, no dia 12 de janeiro de 2005. Naquela época, vinha muita gente de outras regiões para extrair o caranguejo de Caravelas, usando métodos pouco sustentáveis como os da “redinha”, causando a morte desnecessária de centenas e centenas de animais. Foi em 2005 também que veio a público a notícia da possível implantação de um mega empreendimento de carcinicultura em Caravelas, o que desencadeou na cidade um acirrado debate sobre o tipo de desenvolvimento que ela deveria seguir. A proposta era a de instalar na cidade do projeto da Cooperativa de Criadores de Camarão do Extremo Sul da Bahia – Coopex, que traria graves prejuízos ambientais, e diminuiria ainda mais a quantidade de peixes da área por contaminar o ecossistema manguezal com esgotos sem tratamento e com altas taxas de metabisulfito. (Um veneno que diminui drastica- mente o oxigênio da água, acabando com a vida). Todas estas ameaças foram afastadas no dia 05 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, quando o presidente Lula assinou o decreto de Criação da Reserva do Cassurubá. A importante batalha de centenas de pescadores e marisqueiras havia chegado ao fim. E o espaço de trabalho e de renda de milhares de pessoas que vivem da pesca e da mariscagem em Caravelas havia sido finalmente garantido. Foto: Acervo ECOMAR Às 03 horas da manhã eu acordo, faço o café, a farofa, pego minha linha, o anzol, o samburá e vou a caminho do porto, onde fica minha batera. Às vezes vou sozinho, tem dias que vou com um dos meus filhos. Chegando ao porto empurro minha batera às margens do rio para minha pescaria que é dentro do rio mesmo. Tem dias que faço uma boa pescaria, mas às vezes não pego nem pra comer”. O dia-a-dia de Raul Rocha é parecido ao dos muitos pescadores de Caravelas que trabalham de sol a sol dentro da área da Reserva Extrativista do Cassurubá. Mora com a mulher e um dos dez filhos em uma pequena casa localizada na Rua do Ceará, em Ponta de Areia, e vive da pesca “desde que se entende por gente”. Com o passar do tempo, diz, a quantidade de peixes foi diminuindo. Permaneceram os problemas de distribuição, comercialização e armazenamento. Com menos peixes no mar e uma grande dificuldade em negociar o seu produto, seu Raul dificilmente consegue mais do que 450 reais por mês para o sustento da sua família. O problema está presente no depoimento de muitos outros pescado- Foto: Acervo ECOMAR Foto: André Esteves “A RESEX vai proteger o banco camaroneiro” O presidente da Colônia de Pescadores de Nova Viçosa, Valdeck Rosentino Neves, considera que a criação da Reserva foi uma grande vitória do movimento de pescadores. “Apoiamos a RESEX porque vai proteger o banco camaroneiro. Ela vai ser bem vinda aos pescadores, aos ribeirinhos e aos pegadores de caranguejo, já que hoje os caranguejos acabaram, do mesmo jeito que vão acabando os peixes. Além de ter impedido a instalação do projeto de carcinicultura aqui, que seria muito impactante para a natureza. Agora podemos sonhar com um futuro em que nossos filhos tenham condições de viver da pesca”, destacou. Para Lierte Siquara, da Associação APESCA, a criação da RESEX foi bem aceita exatamente por resolver o problema da preservação das espécies. “Todos os peixes nascem dentro do estuário do manguezal. Com a Reserva a gente espera que os peixes venham a se multiplicar”. Cassurubá 9 JULHO / AGOSTO DE 2009 Foto: Ricardo Stuckert “Não estamos fazendo nenhuma coisa que vá prejudicar a cidade” N Foto: Ricardo Stuckert um grande empreendimento naquele mangue e os pobres sendo escorraçados, para onde? Para beira de um morro ou para a beira de um córrego. Ora, o que nós estamos dando com essa RESEX é um direito da cidade de Caravelas e de Nova Viçosa poderem dizer, que nessas cidades a natureza será preservada para que os nossos filhos e os nossos netos possam continuar, se quiserem, a profissão dos seus pais e das suas mães e tirar o seu caranguejo lá no mangue. Porque vocês sabem o que é enfiar a mão em uma toca para pegar o caranguejo até o cotovelo. E eu até os dez anos de idade, não só pegava caranguejo como pegava... Até esse dedo aqui foi um caranguejo que comeu (brinca). Então, o que nós estamos garantindo aqui é o seguinte: o que tem de mangue, mangue é uma coisa muito importante para a natureza. Mangue é uma coisa importantíssima. Se a gente acabar com o manguezal, a gente muda o tipo de coisa que tem no rio ou no mar, perto do manguezal. Então, nós precisamos preservar. Não é apenas para garantir aos pescadores pescar o seu marisco, pegar o seu caranguejo ou pescar o seu peixe. Não é só para isso, é também para isso. Mas a gente quer que quando um cidadão de classe média de São Paulo ou do Rio de Janeiro ou um professor da USP, ou da Unicamp, ou de Salvador quiser visitar o local virgem, onde está preservado, onde o pedaço de mar está preserva- do, onde não vai ter poluição e aí eu vou entrar na questão do esgoto, ele vem aqui em Caravelas e fala: Eu fui lá, comi um peixe de qualidade, não poluído, um caranguejo de qualidade, um marisco de qualidade, e aí até vão vender ou em Vitória do Espírito Santo ou o Jacques Wagner vai comprar tudo para levar para a merenda escolar lá em Salvador e daí por diante. Então, é para isso que a gente está aqui. Para a gente dizer ao povo de Caravelas que nós não estamos fazendo nenhuma coisa que vá prejudicar a cidade. Até porque, se nós tivermos do um lado algum ambientalista radical e tivermos do outro lado um prefeito, ou um fazendeiro radical, o governo não estará de nenhum dos dois lados.” A RESEX foi criada. E agora? A Reserva do Cassurubá abrange uma área de 100.687 hectares de estuários, restingas, mangues e ambientes marinhos entre as cidades de Caravelas, Nova Viçosa e Alcobaça. Contribuirá para a proteção dos principais ambientes costeiros do Banco dos Abrolhos, onde estão 95% dos manguezais da região, considerados berçários de várias espécies de importância ecológica e econômica. A Reserva é uma área do governo federal, concedida para o uso das populações extrativistas: os pegadores de caranguejo, os pequenos agricultores e os pescadores. Após a regularização fundiária, os moradores tradicionais devem receber um documento que lhes garanta permanecer e utilizar a área da Reserva - o termo de concessão de direito de uso. A RESEX é gerida por um Conselho Deliberativo, constituído por represen- tantes de órgãos públicos, de organizações da sociedade e das populações tradicionais residentes na área, que devem ser maioria. É o Conselho que elabora o Plano de Manejo, ou o plano de utilização da Reserva. No plano de manejo se define o quê pode e o quê não pode ser feito dentro da Reserva, quais áreas vão ser utilizadas para o extrativismo e quais vão ser utilizadas para a conservação. Na Reserva não será permitido realizar atividades de grande impacto para a natureza, tudo terá que ser pensado em termos da relação do ser humano com o meio ambiente. Há algumas regras a seguir: não é permitida a pecuária em grande escala nem a plantação em grandes extensões de terra. O corte de árvores também tem que ser sustentável, para proteger a mata nativa. Mas podem e devem ser criados projetos que ajudem a população a melhorar a qualidade de vida e a obter renda, como os de turismo comunitário, artesanato, apoio à pequena agricultura, a apicultura, e a própria comercialização e beneficiamento dos peixes e caranguejos, apenas para citar alguns exemplos. O grande problema da maior parte das RESEX - em 2007 eram 80 as Reservas Sustentáveis no Brasil - é exatamente a falta de projetos de desenvolvimento local para a população. Caravelas neste ponto começou bem. No final de julho a ONG Ecomar aprovou no Ministério de Turismo um projeto para promover o turismo comunitário na zona ribeirinha do Cassurubá. Se projetos como este forem multiplicados e a prefeitura ajudar com políticas públicas, a qualidade de vida da população poderá melhorar consideravelmente. Demarcação da área da Reserva Extrativista do Cassurubá Foto: Ricardo Stuckert Não vai mais poder construir nada na cidade. Está tudo proibido”. Ele está desinformado. Então, é preciso a gente informar adequadamente. Tem outros que acham “olha, eu sou contra porque eu sou contra. Eu não acredito nessa história de meio ambiente. É tudo mentira. Chove muito porque Deus quer, faz seca porque Deus quer. Então, não tem essa de meio ambiente, não. Pode derrubar tudo, quebrar tudo, porque não vai ter jeito”. Esse é um ignorante. Nós temos que tratar dele com cuidado porque também ele precisa de informação, ele precisa de informação. Ele não é uma pessoa ruim, é uma pessoa desinformada. Agora, têm outros que utilizam um discurso fácil. Aquele discurso de que: “Olha, fazendo isso, está impedindo o desenvolvimento”. E assim vão falando. Acontece que quanto mais a gente preservar, mais chance a gente tem de desenvolvimento. Porque hoje, quando um turista quer viajar para uma cidade, ele quer saber se ele tem coisa para ver, coisa nossa. E o que tem acontecido nas cidades médias brasileiras? Primeiro, é o mangue. O pobre vai sendo expulso da cidade e ele vai para a beira do mangue. Daqui a pouco, ele começa a fazer aterro no mangue e vai fazendo seu barraquinho. Daqui a pouco faz uma palafita. Quando está tudo errado e o pessoal morando em favela, aí chega um rico, compra aquele mangue e faz Foto: Ricardo Stuckert o palco erguido na cidade dos Pescadores, em Ponta de Areia, observado por milhares de caravelenses, o presidente Lula declarou: “A gente está aqui para dizer ao povo de Caravelas que nós não estamos fazendo nenhuma coisa que vá prejudicar a cidade. Até porque, se nós tivermos de um lado algum ambientalista radical e tivermos do outro lado um prefeito, ou um fazendeiro radical, o governo não estará de nenhum dos dois lados”. Fez um importante discurso, que explicou muita coisa para quem ainda não tinha entendido a importância da RESEX. Leia você mesmo o quê disse o presidente: - “Nós, que habitamos o planeta terra, estamos contribuindo, a cada dia que passa, para que ele seja destruído mais rápido. E quando ele for destruído, nós estaremos destruídos enquanto espécie animal, enquanto ser humano. Não vai acontecer agora, mas pode acontecer daqui a 1 milhão de anos, daqui a cem anos... mas se a gente não cuidar agora, os nossos filhos irão viver em um mundo cada vez pior do que aquele em que a gente vivia quando nasceu, porque a tentação do homem é destruir e não construir. Nós temos três tipos de gente. Nós temos um tipo de gente que às vezes não concorda com uma RESEX porque não está bem informado. Então, dizem para ele: “Olha, vai proibir de fazer qualquer coisa na cidade. 10 Foto: Joyce Trindade ENTREVISTA JULHO / AGOSTO DE 2009 Luiz Antônio Alvim Delgado Prefeito de Caravelas “Só o fato de preservar já é um benefício” “Na área da RESEX tem muita coisa bonita que você pode explorar, mas é preciso ter uma casa digna para estar recebendo visitantes, para fazer o turismo. Pode-se explorar o turismo ecológico, fazer trilhas, as próprias casinhas podem oferecer alimentação. Acho que é por aí que a gente começa a valorizar e aproveitar essa riqueza que temos”. estaduais e federais criando algumas coisas, mas não dão o apoio necessário. Espero que realmente cuidem, que dêem condições a essas famílias que fazem parte da RESEX, para que possam desempenhar um bom trabalho. Não adianta criar e não fiscalizar, o IBAMA diz que não tem condições de fiscalizar, porque são poucos funcionários para abranger uma área grande, não adianta criar no papel e não funcionar. Essa é a nossa preocupação. Timoneiro - Que benefícios o Senhor acha que a RESEX vai trazer para a comunidade? Só o fato de preservar já é um benefício! Agora está tudo muito difícil, quando eu era pequeno, ia pescar na ponte e pescava mais de vinte quilos de peixe, agora não se consegue pegar mais. Com a criação da RESEX, algumas medidas vão ser tomadas para beneficiar somente a comunidade, porque pessoas de outros lugares terão que obedecer critérios. E esses critérios com certeza vão beneficiar a comunidade, que com isso vai ganhar muito. “ Toda essa resistência é por falta de informação Foto: Joyce Trindade “ Timoneiro - Como o Senhor avalia a criação da RESEX para a cidade? Eu e a comunidade estamos cheios de dúvidas. Quando o presidente Lula veio, eu até comentei com ele que muitas pessoas não sabem o que é uma RESEX, porque faltaram informações. A gente que tem um pouco mais de esclarecimento tem noção de alguma coisa, mas não sabemos a fundo como ela funciona. Eu espero que seja uma coisa boa para a comunidade, pois temos que preservar a natureza, mas acho que só vai somar se o governo federal der condições para que seja feito um bom trabalho, pois não adianta criar uma RESEX e não dar o apoio devido. Vemos muitos órgãos Timoneiro - E quanto às políticas públicas, a prefeitura pretende dar algum tipo de suporte aos pescadores? Uma das coisas que eu sonho e que poderá se tornar realidade será comprar o produto desse pessoal para inserir na merenda escolar. Infelizmente ainda não foi possível fazer isso. Existe uma grande burocracia quando se mexe com recursos federais e estaduais, temos que obedecer a todo um processo licitatório, com a população local se organizando ficará mais fácil de conseguir comprar esses produtos para a merenda escolar. Outra coisa diz respeito aos moradores da Zona Ribeirinha. Em viagem a Salvador conversei com alguns deputados, pois só vemos reformas nas casas da Zona Urbana, na zona rural a gente vê cada casebre sendo escorado na cumeeira para não cair. O nosso plano também é ir na zona ribeirinha para recuperar essas casas. Na área da RESEX tem muita coisa bonita que você pode explorar, mas é preciso ter uma casa digna pra estar recebendo visitantes, para fazer o turismo. Pode-se explorar o turismo ecológico, fazer trilhas, e quem sabe as próprias casinhas podem oferecer alimentação. Acho que é por aí que a gente começa a valorizar e aproveitar essa riqueza que temos. Também é uma maneira da gente ajudar a comunidade. Timoneiro - Prefeito, qual é a posição da Associação de Prefeitos do Extremo Sul (APES) quanto a RESEX? Eu conversei com o presidente Lula, comentei que eu, prefeito de Caravelas, não sabia qual era o limite da RESEX, assim como os outros prefeitos da Costa das Baleias que fazem parte da APES. Acho que isso é um desrespeito muito grande. Toda essa resistência é por falta de informação, falei para o presidente Lula que isso poderia ter sido evitado. Pensávamos que a Área da Zona de Amortecimento de Abrolhos seria a área da RESEX. Era uma área muito extensa. Depois conversando, que eu fui ver que era bem menor. Todos os prefeitos querem ver o município crescer, querem geração de emprego e renda, e o que o pessoal ouve dizer é que com a RESEX não poderá criar mais gado, não poderá ter indústria de grande porte e redes de hotéis, então ficou todo mundo preocupado com a situação dos municípios. A grande resistência foi essa. Timoneiro - Agora, com mais informações, qual o grau de aceitação da APES? Os prefeitos começaram a olhar de forma diferente, mas ainda falta um pouco de informação. De diálogo. Falei para os prefeitos que não era hora de fazer manifesto, o presidente assinaria de qualquer forma, aqui, ou em Brasília. Deveríamos aproveitar o momento para cobrar algumas coisas. Tiveram alguns que não concordaram. Eu aproveitei o momento e cobrei o que meu município precisa. A té os anos sessenta a atividade pesqueira no Brasil era artesanal e sua produção estava voltada basicamente para atender as necessidades do país. O quadro começou a se modificar a partir de 1967, quando a política de incentivo à pesca passou a priorizar o desenvolvimento industrial: grandes barcos, alta tecnologia e enfoque na exportação. Esta mudança fez com que a produção pesqueira passasse de 280 mil toneladas em 1960 para quase um milhão de toneladas em 1985, num grande salto em apenas 25 anos (dados do Anuário Estatístico do Brasil). Não demorou muito para que a natureza começasse a perder suas forcas e desgastasse sua capacidade de produção. A prova disso veio no ano 2000, quando a produção do pescado no país diminuiu para 650 mil toneladas. No mundo inteiro a quantidade de peixes e crustáceos está diminuindo. Parte deste problema está relacionado à destruição dos manguezais, berçário de 2/3 das espécies de peixes mais exploradas economicamente. Outra causa é a pesca excessiva. O quê fazer para reverter esta situação? O presidente da APESCA, Lierte Siquara, acredita que existam algumas soluções para Caravelas. Ele diz que, em primeiro lugar, é preciso acabar com o sistema de arrasto de balão, que funciona como espécie de “trator do mar”, limpando o fundo e apanhando peixes de todos os tamanhos, além de conchas, camarões, caramujos e outros pequenos animais. “É capaz de pegar uma jamanta (arraia gigante) que fica lá no fundo do mar. Esse modo de pescar está acabando com os peixes da nossa região. O que é melhor? Voltar ao que era ou continuar assim e acabar com tudo?”, pergunta. Outras possibilidades seriam: limitar a quantidade de barcos, freando a fabricação de novos e realizando as reformas necessárias nos já existentes, criar normas para limitar a caça subaquática, promover medidas de preservação para que as gerações futuras possam usufruir desses recursos naturais, utilizando as áreas de pesca em sistema de mosaico, ou seja, aproveitando algumas áreas e deixando outras descansado para depois fazer a troca. Foto: Arquivo ECOMAR A Pesca no Brasil a partir dos anos 70: sistema industrial e foco na exportação Mas há quem cite outras razões para o problema. Para a pescadora e marisqueira Elizete dos Santos Figueiredo, moradora da Barra de Caravelas, foi a implantação da dragagem que afetou a prática da pescaria. “A dragagem afetou muito, trouxe muitos prejuízos para o pescador, pois ela é feita no canal dos peixes e o estrondo dos eucaliptos e a hélice das barcaças assustam os peixes”. Cassurubá: “Terra de grandes árvores para construir canoas” Foto: André Esteves O primeiro núcleo de colonização portuguesa de Caravelas instalou-se na Ilha do Cassurubá, local que nos idos 1500 era conhecido pela sua terra fértil e árvores majestosas. Os portugueses só saíram de lá por causa da quantidade de piratas e corsários que trafegavam na região com o objetivo de tomar a enorme carga de pau-brasil que nela existia. Sofrendo constantes ataques, os portugueses buscaram um lugar mais protegido. Em 1571 constru- íram a capela de Santo Antônio na atual praça matriz, dando origem a vila de Caravelas. Fica a lembrança que na língua tupi a palavra Cassurubá significa “Terra de grandes árvores para construir canoas” Sendo: Ca: árvore Assu: grande Uba: canoa. Informações do coronel José, que há anos vem estudando a história da região. 11 JULHO / AGOSTO DE 2009 Foto: Almay Souza Zona ribeirinha terá projeto de turismo comunitário O projeto apresentado pela ONG local Ecomar para desenvolver atividades de turismo comunitário no Complexo do Cassurubá foi aprovado pelo Ministério do Turismo no final de julho. Seu objetivo é implantar a gestão participativa das atividades ecoturísticas na zona ribeirinha, visando a melhoria socioambiental, a geração e distribuição de renda e a criação de novos produtos turísticos para Caravelas A zona ribeirinha possui uma infinidade de atrações que ainda hoje não são aproveitadas para o turismo em Caravelas. Com um rico meio ambiente, situado num dos mais importantes manguezais do Nordeste brasileiro e uma população residente receptiva e dona de inúmeras tradições, a região oferece ao ecoturista a possibilidade de vivenciar atividades em meio à natureza e de entrar em contato com uma cultura muito particular. O projeto aprovado pela ONG Eco- mar junto ao Ministério do Turismo visa promover a qualificação dos ribeirinhos para a gestão e prestação de serviços ecoturísticos, o planejamento e implantação de trilhas interpretativas, além de apoiar a criação de infra-estruturas, hoje precárias ou inexistentes. Para alcançar os objetivos a Ecomar pretende estimular a organização comunitária dos ribeirinhos beneficiados, partindo dos princípios da economia solidária. “Queremos que a comunidade se torne forte e independente para gradativamente Foto: Acervo ECOMAR Várias farinheiras artesanais ainda estão em funcionamento na zona Ribeirinha. criar e gerenciar suas próprias atividades sustentáveis no Complexo Estuarino do Cassurubá, considerando o que já existe lá dentro, considerando a cultura e modos de vida do ribeirinho”, diz Paulo Beckenkamp, diretor presidente da Ecomar e coordenador do projeto. Histórico - Entre os anos de 2002 a 2004 o Centro de Pesquisa e Gestão de Recursos Pesqueiros do Litoral Nordeste (CEPENE), através do Projeto Manguezal, elaborou o levantamento das potencialidades para o desenvolvimento do ecoturismo de base comunitária na região ribeirinha de Caravelas e Nova Viçosa. O estudo oferece uma descrição detalhada das atividades que os ecoturistas poderiam desfrutar na zona ribeirinha: participar de atividades culturais, como a festa de São Cosme e Damião; da visita às casas de farinha e a patrimônios arquitetônicos como as casas de pau-a-pique, realizar trilhas em áreas de restinga conservada, passeios de canoas nos rios, cavalgada, camping em áreas naturais, contemplar a paisagem, observar as aves, etc. O ecoturista poderia também degustar a culinária local, compartilhar o conhecimento tradicional dos ecossistemas, observar o uso de técnicas tradicionais de pesca e mariscagem, participar em oficinas de aprendizagem Parque Nacional Marinho dos Abrolhos retoma Programa Professores no Parque Foto: André Esteves O Programa beneficiará a 50 professores das escolas municipais da região com informações sócio-ambientais de Abrolhos e do Manguezal O Programa Professores no Parque está de volta para formar mais 50 professores da rede pública dos municípios de Alcobaça, Prado, Nova Viçosa e Caravelas em temáticas ambientais. Seu objetivo é apoiar o desenvolvimento de projetos em sala de aula sobre a biodiversidade regional, o mar, o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos e o mangue, envolvendo os professores em atividades teórico-práticas de capacitação e sensi- bilização, que incluem a visita ao Parque Nacional Marinho dos Abrolhos e ao Manguezal. O Programa Professores no Parque busca a conscientização e da aquisição de valores, comportamentos e práticas mais éticas e responsáveis em relação ao meio ambiente. “A idéia é que as pessoas efetivamente se preocupem e se responsabilizem por suas ações, desenvolvendo o sentido de cuidado e de conservação. Para isto é fundamental que se construam relações mais interativas, críticas e participativas”, destaca Érika Almeida, coordenadora do Programa. Na primeira etapa, que acontece nos próximos dias 24 e 25 de agosto os professores participam de palestras, atividades lúdicas e da visita monitorada ao Centro de Visitantes. Nos dias 26 e 27 de agosto partem para a visita ao Parque Nacional Marinho dos Abrolhos e ao Manguezal, na que terão a oportunidade de aprender sobre as espécies e o rico ecossistema que conforma a região de Caravelas. A etapa seguinte prevê o desenvolvimento de projetos ambientais dos professores junto aos estudantes das escolas participantes. No final do ano, todos os trabalhos elaborados pelos alunos e professores serão apresentados em uma grande confraternização realizada no Centro de Visitantes. da história e das técnicas da produção artesanal de apetrechos de pesca, apreciar e comprar artesanatos.... ou simplesmente curtir a vida no meio da natureza. Em parceira com as instituições locais, a Ecomar pretende aproveitar todo este potencial para ajudar uma parte das 300 famílias que atualmente vivem na área, com um projeto que bem poderia se transformar em modelo de desenvolvimento sustentável. “É um nicho de mercado que pode ser considerável na economia do ribeirinho”, considera Paulo. Vários foram os parceiros que apoiaram o projeto desde a sua formulação, como o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, os empresários do setor de turismo e o Conselho Municipal de Turismo. A Zona Ribeirinha está atualmente situada na área da Reserva Extrativista do Cassurubá. Uma região de muitos atrativos naturais A área do Complexo Estuarino do Cassurubá apresenta inúmeros atrativos naturais. Os manguezais ocupam uma área de 11 mil hectares, com a vegetação em estado conservado e incidência dos três tipos de mangues (Vermelho, Manso e Siriba). Nesse ecossistema habitam crustáceos, bivalves e peixes, usados também na culinária local. A Restinga, também em bom estado de conservação, está situada no entorno dos manguezais e apresenta uma grande biodiversidade de fauna e flora. Nos manguezais e na restinga, é possível desenvolver atividades de observação de fauna e flora, principalmente das aves, canoagem e navegação nos rios que formam o complexo, caminhadas em trilhas, ecociclismo, acampamento no ambiente natural e cavalgada. Foto: Acervo ECOMAR Personalidades de Caravelas são homenageadas Líderes comunitários, mestres da cultura popular, pescadores, marisqueiras, educadores e instituições culturais que contribuíram ao desenvolvimento de Caravelas receberam no final de abril uma grande homenagem pelos serviços prestados de forma voluntária por tantos anos à comunidade. O Parque Nacional Marinho dos Abrolhos realizou no final de abril junto a Fundação Benedito Ralile e a Prefeitura Municipal a cerimônia de entrega de diplomas e medalhas a 26 líderes comunitários e instituições que se dedicam a manter viva a cultura popular e a educação em Caravelas. O ato teve o objetivo de valorizar as pessoas que têm lutado pelo desenvolvimento social e educativo, pelas expressões folclóricas e pelo resgate da cultura e tradições no município. A comemoração foi realizada em uma grande festa no Centro de Visitantes do Parque, localizado na Praia do Quitongo, como parte das ações de comemoração de seu 26º aniversário. Na ocasião, o chefe substituto do Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, Joaquim Neto, recebeu da Fundação Benedito Ralile uma placa de homenagem pelo aniversário da Instituição. 12 JULHO / AGOSTO DE 2009 CULTURA Foto: Arquivo Arte Manha Caravelas é Ponto de Cultura da Bahia com Projeto Pererê No último 23 de maio o movimento cultural Arte Manha lançou oficialmente o Projeto Pererê, selecionado e contemplado em primeiro lugar no território Extremo Sul como um dos Pontos de Cultura da Bahia. O lançamento foi feito junto às comemorações dos 21 anos de história do grupo, que agora ensaia novos vôos, intensificando as atividades destinadas a jovens e crianças em Caravelas F ilmes, teatro, poesia, shows de bandas, grupos folclóricos e até uma roda de viola caipira animaram a grande festa cultural que inaugurou, no dia 23 de maio, a nova fase de atuação do mais combativo e intrigante grupo cultural de Caravelas: o Arte Manha. Ninguém diria há 21 anos que daquelas reuniões de jovens sonhadores da Avenida brotaria uma iniciativa de poder revolucionário para uma cidade que havia sido culturalmente abandonada pelo poder público. Apoiado pelo Governo do Estado até 2011, o Arte Manha oferece uma série de oficinas para crianças e jovens de Caravelas. Atividades nas áreas de artes plásticas, dança afro-indígena, capoeira angola, serigrafia, percussão, audiovisual, costura de figurinos e adereços, teatro, literatura, contos e cantigas da cultura popular, que acontecem em sua maioria dentro da sede do Arte Manha e no Espaço de Cultura e Lazer Dandara Zumbi. Inscrições - O projeto tem como prioridade oficinas com crianças e adolescentes entre 07 a 17 anos, filhos de famílias de baixa renda e estudantes da rede pública de ensino. Quem tiver interesse em se inscrever em alguma delas deve ir juntamente com os pais ao Arte Manha para verificar a existência de vagas (levar documento de identidade dos pais e/ou da crian- Quem ainda não assistiu à Exposição Fotográfica “Retratos de Caravelas: Memória e Identidade de uma Cidade Histórica”, tem agora outra oportunidade para apreciar as 200 fotos e documentos antigos recolhidos entre diversas famílias da cidade que resgatam parte da história caravelense desde os princípios do século XIX. A mostra fotográfica, de caráter itinerante, reabre a partir de 20 de agosto, na Fundação Benedito Ralile. A exposição revela uma Caravelas de grandes casarões e de antigas festas populares, marcada pelo vai e vem dos navios e aviões que circulavam diariamente pelo porto da cidade. De imagem a imagem, pode-se apreciar as antigas Alvoradas, trezenas , as passeatas nos dias da independência do Brasil, as apresentações das Pastorinhas, entre muitas outras mani- Ana Carla Santos Silva em sua apresentação no Mini Festival Anual da Canção Estudantil “Incomparável” é grande vencedora do Festival da Canção Estudantil O jurado foi composto pelo Secretário de Cultura Jorge Galdino, o músico local Alexandre dos Anjos, a professora Ceres Nicolau, a professora Luciana Fuzetti, sob a coordenação do professor Agenário Cabral. Mobilizar jovens para produzir programas de televisão e pequenos documentários com enfoque principal em temáticas relacionadas à cultura popular tradicional, o patrimônio histórico e cultural e o turismo. Este é o objetivo do núcleo audiovisual do Projeto Pererê, que será instalado dentro do Colégio Polivalente de Caravelas. As oficinas do projeto abrem em setembro, dando início às atividades da TV Pererê. Seus repórteres percorrerão as ruas de Carave- las em busca de notícias, histórias, personagens e entrevistas, que informem e divulguem questões de interesse da comunidade. Os programas serão exibidos no cinema localizado no auditório do Colégio Polivalente e em mostras itinerantes realizadas em diversas localidades de Caravelas. As fichas de inscrição podem ser retiradas na Secretaria do Colégio. Nesta primeira fase do projeto, as oficinas serão dirigidas somente aos alunos do Colégio Polivalente. Foto: Arquivo Fundação Cultural Professor Benedito Ralile. festações culturais que percorreram o fio do tempo e que hoje conformam a rica memória caravelense. Acontecimentos como o funeral de Teófilo Otoni e o descarrilamento do trem na antiga ferrovia Bahia – Minas, a devolução da imagem do santo padroeiro da cidade à igreja, entre muitos outros, que nos abrem a capa do tempo e criam pontes para a memória. A Mostra, de caráter itinerante, foi aberta pela primeira vez ao público no Centro de Visitantes do Parque Nacional Marinho dos Abrolhos entre os dias 22 e 30 de abril. É patrocinada pelo Parque Nacional Marinho dos Abrolhos e pela Fundação Cultural Professor Benedito Ralile. Foto: Arquivo Fundação Cultural Professor Benedito Ralile. nada poderá participar das finais do Festival Anual da Canção Estudantil em Salvador. O Colégio Polivalente já providenciou a reprodução da canção em CD e o restante da documentação que habilitará a jovem Ana Carla a representar a cidade na etapa regional. “Acreditamos que esforços, como este, contribuem para fortalecer nossa cultura e propõem novos horizontes para nossos alunos”, destaca o diretor do colégio, Luiz Leonardo Soares Ferreira. Foto: Arquivo Arte Manha Um público de cerca de 200 pessoas compareceu ao Colégio Polivalente no dia 30 de maio para assistir a segunda edição do Mini Festival Anual da Canção Estudantil (FACE). As oito canções inscritas foram analisadas de acordo aos quesitos de letra, melodia e interpretação. O primeiro lugar foi para Ana Carla Santos Silva, pela canção “Incomparável”, o segundo lugar para Gilberto Lima Firmino, pela canção “Vuco-vuco” e o terceiro lugar concedido a Gilmar Flora dos Santos, pela canção “Realidade”. Os candidatos Caio Magno e Paulo Jr., infelizmente, foram eliminados por problemas na matrícula e na freqüência escolar, respectivamente. Agora a grande vencedora, Ana Carla Santos Silva, irá representar a cidade na etapa regional do Festival realizada no final de agosto em Teixeira de Freitas. Caso seja selecio- Oficinas para aprender a fazer televisão abrem em setembro Mostra Fotográfica “Retratos de Caravelas” reabre na Fundação Benedito Ralile Foto: Arquivo Arte Manha Por Danilo Ferreira ça). As atividades são em sua maioria gratuitas, abertas à comunidade inteira, sem qualquer distinção de classes sociais, exceto, os eventos pagos, cuja função é arrecadar recursos para manutenção da instituição. O projeto Pererê tem como objetivo principal o resgate e fortalecimento da identidade cultural afro e indígena no município de Caravelas. Procura promover e potencializar a capacidade de criação e o desenvolvimento artístico de crianças e jovens em situação de vulnerabilidade social, estimular e possibilitar a geração de trabalho e renda às famílias envolvidas e promover o fortalecimento cultural. 13 JULHO / AGOSTO DE 2009 CINEMA Não Mangue de Mim é premiado no Rio de Janeiro F oi com um largo sorriso que o diretor Jaco Galdino subiu ao palco do III Festival Audiovisual Visões Periféricas para receber a Menção Honrosa para o filme Não Mangue de Mim, uma produção caravelense dirigida por ele e realizada na “raça e na coragem” por mais de trinta integrantes e apoiadores do Cine Clube entre os anos de 2007 e 2008. “Quero agradecer todo o grupo que vem trabalhando em Caravelas para o fortalecimento do Cine Clube. Dizer também que esta é uma homenagem a todos os povos que estão no litoral - quilombolas, indígenas, ribeirinhos - lutando para manter os seus territórios. É um prêmio também destinado a todos os que vem dando visibilidade aos conflitos em torno da terra, que acontecem tanto na área urbana e rural, e que dificilmente são conhecidos porque normalmente não saem na Rede Globo”, discursou. Não Mangue de mim narra a história de um morador da área de man- Foto: Arquivo Arte Manha O diretor do filme, Jamilton Galdino, na entrega dos prêmios do 3º Festival Audiovisual Visões Periféricas gue em Caravelas que resolve manter suas terras ante a tentadora proposta de um comerciante de fora, prezando sua cultura e forma de vida. O filme foi gravado no Sítio de Seu Silvano localizado no Rio do Macaco, no sitio do Massapê, na comunidade do Marobá, na Praia do Tororão e no Quitongo, lugares bem conhecidos pela comunidade de Caravelas. “Foi uma baita produção. Por isso ficou legal, tem a mão de várias pessoas”, diz o diretor. Competição Oficial - Não Mangue de Mim foi selecionado na sessão principal, a Visorama, pelo jurado da ABDeC(Associação Brasileira de Documentaristas e Curta-metragistas do Rio de Janeiro), entre outros 20 curtas e medias metragens que participaram da competição oficial. Em 2007 o Cine Clube Caravelas já havia recebido o prêmio pelo curtametragem “Lia”, vencedor do jurado paralelo Cachaça Cine Clube. Desta vez, o reconhecimento veio do jurado oficial, celebrando a breve mas bem sucedida trajetória do coletivo criado em janeiro de 2007 para produzir documentários e filmes de ficção sobre a Caravelas tem cinema a partir de setembro I Integrantes do Cine Clube Caravelas zação de oficinas de audiovisual em parceria com o projeto Pererê e de um festival de filmes do Extremo Sul da Bahia, em parceria com o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos. A nova sala de cinema é uma conquista do Cine Clube Caravelas, que inaugura na cidade o ponto do Cine Mais Cultura, como parte do programa de incentivo aos Cine-clubes do Ministério da Cultura. Os equipamen- As sessões vão ser promovidas pelo cine Clube Caravelas, que ganhou do Ministério da Cultura uma série de equipamentos para exibição: um telão 3x3 metros, um projetor, uma mesa de som de 12 canais, uma filmadora e 150 filmes da programadora Brasil, além da capacitação dos videastas Almay de Souza e Anerivam Reinaldo, que partiram no final de julho para Salvador para aprender a usar os equipamentos e compartilhar com outros 50 integrantes do movimento de cine clubes da Bahia. tos chegam ao final do mês, graças a parceria do Cine Clube com o FEPA (Fórum de Experiências Populares em Audiovisual), criado em junho de 2007 junto ao I Festival Audiovisual Visões Periféricas, que vem trabalhando para dar visibilidade à diversidade de olhares no Brasil. O acordo feito com o Ministério da Cultura é de realizar em Caravelas uma exibição semanal pelo período dois anos. Os integrantes do Cine Clube Caravelas, Anerivan Reinalda e Almay Souza junto a Guido Araújo, um dos pioneiros do movimento de cineclubes da Bahia, durante o Encontro promovido pelo Ministério da Cultura, em Salvador. bilidade aos projetos educacionais que se utilizam do recurso audiovisual, ou seja, fundir educação e tecnologia. O Cine Clube Caravelas é um movimento cinematográfico local composto pelas seguintes instituições: Pastoral da Juventude, Movimento Cultural Arte Manha, Portal Caravelas e Parque Nacional Marinho dos Abrolhos. É apoiado por inúmeras pessoas, e instituições locais, regionais, nacionais e internacionais. Andanças de um cineasta caravelense O diretor Jaco Galdino aproveitou a viagem ao Rio de Janeiro para divulgar as ações de comunicação do Cine Clube Caravelas e do Jornal O Timoneiro em dois eventos que estavam sendo realizados na cidade. No dia 23 de julho participou da Jornada de Educomunicação do VI Fórum Nacional de Educação Ambiental, que reuniu organizações de todo pais para discutir temas de comunicação e meio ambiente. Lá foram exibidos o filme Não Mangue de Mim e distribuídos exemplares do jornal “O Timoneiro”. No dia 24 de julho, Jaco ofereceu uma palestra sobre a experiência audiovisual em Caravelas, na sessão “Deseducando o olhar, uma apropriação livre do audiovisual pelos coletivos”, que era parte da Programação do Festival Visões Periféricas. Um artigo de sua autoria foi publicado no site do FEPA (Fórum de Experiências Populares em Audiovisual - www.fepabrasil.org.br). Instituto Baleia Jubarte realiza projeto audiovisual na comunidade de Caravelas Informação e entretenimento. São esses os principais objetivos do Projeto Áudio e Vídeo na Comunidade, realizado pelo Instituto Baleia Jubarte em Caravelas. O projeto oferece uma solução de acesso cultural a um público diversificado, que nem sempre tem acesso a este tipo de diversão e lazer. Os filmes são exibidos gratuitamente na última sexta-feira e último domingo de cada mês, respectivamente na quadra coberta e em alguma praça dos distritos de Caravelas, como Ferraznópolis, Nova Tribuna, Taquari, Rancho Alegre, Barcelona e Juerana. O Projeto visa também divulgar ações desenvolvidas pelos parceiros e veicular mensagens de cunho ambiental, cultural e social antes do início de cada sessão. São parceiros do projeto a Prefeitura Municipal de Caravelas (Secretarias de Educação, Meio Ambiente e Turismo), a Patrulha Ecológica - Escola da Vida, o Cine Clube Caravelas, o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos e o Movimento Cultural Arte Manha. Confira a nossa agenda. Agora é só trazer a pipoca!!! Cinema na quadra: 28 de agosto; 25 de setembro; 30 de outubro. Cinema nos distritos: 30 de agosto (Rancho Alegre); 27 de setembro (Juerana); 25 de outubro (Taquari) Foto: Equipe EA Caravelas / IBJ magine que o domingo avança sonolento sem pista de distração ou atividade cultural para salvar a mesmice. De repente você lembra: Caravelas tem cinema! Pois isto logo deixará de ser ficção para transformar-se na realidade de todos os finais de semana. A partir de setembro o auditório do Colégio Polivalente será transformado no quartel general da sétima arte. Todos os finais de tarde serão exibidos curtas e longas-metragens, e durante a manhã, filmes infantis e educativos. “Queremos criar o rito de ir ao cinema, das pessoas saírem de casa para encontrar gente e participar de atividades culturais. E exibir filmes que possam trazer reflexões, produções que você não vai ver na globo, nem na locadora, para que as pessoas possam entrar em contato com outras formas de realidades, outras formas de resolver problemas”, diz Jaco Galdino, coordenador geral do Movimento Arte Manha e integrante do Cine Clube Caravelas. Ao final das sessões devem ser realizados debates sobre as temáticas dos filmes, para os quais serão convidadas diferentes personalidades da cidade. A iniciativa de promoção do cinema inclui a criação de um grupo de estudos cinematográficos, a reali- Foto: Arquivo Arte Manha realidade do sul da Bahia. O III Festival Audiovisual Visões Periféricas aconteceu entre os dias 21 e 26 de julho no Rio de Janeiro, reunindo produtores, videastas, artistas e integrantes de cineclubes de todo o país. O Festival foi criado com objetivo de contemplar as produções realizadas nas periferias brasileiras, através de associações, ONGs, coletivos, grupos informais organizados e produtores independentes. O conceito que o diferencia de outros festivais audiovisuais que privilegiam os vídeos realizados em comunidades carentes permanece o mesmo: oferecer visi- Apresentação de filmes para a comunidade Ferraznópolis 14 JULHO / AGOSTO DE 2009 BARCELONA O distrito rural de Caravelas Fotos: Mônica Linhares Desde criança ouvimos nas escolas, na roda de amigos o chavão “recordar é viver”. Foi com esta vontade que retornei a Barcelona, distrito que fica a quase três horas em carro da sede de Caravelas, logo depois de Teixeira de Freitas. Antes de chegar fiquei imaginando como estaria aquela terra de grandes plantações, de criadores de gado e cortadores de cana, a terra de Santo Antônio de Barcelona, como o povo simples hospitaleiro gosta de chamar. Lembrei da Igreja Santo Antônio, antiga e bem conservada, uma das primeiras construções do distrito, e das suas ruas estreitas e enladeiradas.... Por Professor Benito B arcelona é um dos distritos mais prósperos de Caravelas e também o mais rural. Os quase oito mil moradores orgulham-se da fartura da região e do fato de que lá não falte emprego para ninguém. O trabalho no corte de cana, nas lavouras de mamão, maracujá, melancia, abóbora, café; na criação de gado e na construção civil, absorve a maior parte da população economicamente ativa. Barcelona possui também uma grande usina de álcool, a Santa Maria, que atraiu nos últimos anos cerca de 1.500 novos moradores, vindos de inúmeras cidades do Nordeste brasileiro. Apesar da fartura e da fertilidade das terras, este importante distrito necessita urgentemente de políticas públicas. Hoje a maior parte das terras são propriedade de grandes fazendeiros que começam a optar pela monocultura de cana e eucalipto, levando ao declínio na variedade de culturas da região. O pequeno distrito se expande velozmente sem infra-estutura de saneamento básico e com graves deficiências na qualidade da educação. A única rua que possui esgoto o envia diretamente para o Córrego de Barcelona, utilizado também para lavar roupas e como local de banho por muitos moradores. No bairro Novo, centenas de novas casas são construídas em pequenos lotes de terra, rompendo a tradicional economia rural de subsistência que caracterizou a região por décadas. Por falta de mandioca está sendo fechada a última farinheira artesanal do distrito. Barcelona começou devagar, fundada em 1948, quando um grande fazendeiro da região, Antônio Salviani, doou parte de suas terras à comunidade para que os trabalhadores se instalassem e começassem a estabelecer ali um pequeno povoado. As terras podiam ser tomadas por qualquer pessoa que se interessasse em empreender naquele pedaço de chão ainda cercado de mata, um pequeno comércio. Foi o próprio Salviani quem batizou o povoado em formação como Santo Antônio de Barcelona, em homenagem ao santo padroeiro, Santo Antônio. A luz elétrica só chegaria em 1958. Com ela, os fazendeiros, que vinham de Minas Gerais e de Ilhéus para comprar grandes propriedades, e que foram se instalando pouco a pouco. Para contar a história da origem de Barcelona há que bater à porta da casa de um dos mais antigos moradores, seu Milton Ferreira Braga, conhecido como seu Sinuca. Tem 82 anos, dez filhos, “todos eles nascidos dentro desta casa”, a primeira do distrito, comprada em 1950 do próprio Antônio Salviani, por cinco contos de réis ou 5 mil cruzeiros. Era na época uma pequena construção de taipa de 4 cômodos, que seu Sinuca pagou em três prestações. Ele chegou a Barcelona em 1938, com 11 anos de idade, quando o lugar ainda estava tomado pela Mata Atlântica. “O pessoal abria um pedaço de mata, abria uma meia quarta, colocava uma casinha, e caçava. Tinha queixada, anta, porco do mato, onça pintada, canguçu mão torta e sussuarana. Esse é o lugar que teve mais caça nesta região. Chegamos a matar três onças”, lembra. Também havia uma grande quantidade de ervas. “A gente vendia muita puaia. Eu mesmo arranquei muita, se fazia um chá e se limpava todas as tripas. E mandava vender em presidente Bueno, em Nanuk. Hoje você não encontra uma por aqui”. A esposa de seu Sinuca, Adaídes Rocha Braga, também traz bem viva a lembrança da antiga Barcelona. “Eu tinha um medo danado de onça. Esse córrego aí era cheio e para cruzar muita gente passava por dentro da água, que vinha até o pescoço. Agora o rio secou, porque cortaram toda a mata e era ela que conservava”. Aquela era uma época em que as vias de transporte praticamente não existiam. Seu Sinuca conta que de Barcelona a Medeiros Neto era necessário um dia de viagem a cavalo. Para ir a Caravelas era preciso primeiro ir até a Serra dos Anaús para pegar o trem. “ Se gastavam dois dias para ir e dois dias para voltar”, lembra. “Antigamente todo mundo tinha terra” N Cópia do documento de venda da casa, uma pequena construção de taipa de 4 cômodos, comprada em 1951 por 5 contos de réis do fazendeiro Antônio Saviano. “Foi ele que deu as terras do distrito, para o padroeiro Santo Antônio. E fez essa casa, a primeira de Barcelona”. “O pessoal pequeno não tem espaço” Um dos primeiros moradores de Barcelona, seu Sinuca casou-se em agosto de 1958, abriu comércio e se estabeleceu. “Colocava umas garrafinhas na prateleira, matava um porquinho e ia levando.” A partir de 1960 passou a assumir cargos públicos. Foi vereador, juiz de paz e até subdelgado, função que carregou como “uma cruz nas costas”, segundo suas palavras. De sua casa, situada no centro do antigo povoado, viu o tempo passar trazendo transformações para todos. Quando o Timoneiro perguntou-lhe sobre como começaram as grandes fazendas, seu Sinuca pensou, matutou e disse que não há explicação para como isto aconteceu. Simplesmente foi acontecendo, as pessoas de fora chegando e comprando as terras. “O caso é que vinha gente a cavalo, colocava uma roça, colocava gente para trabalhar... Em 1948 que começaram a medir as terras. Foram comprando a mata, os poderosos foram chegando e comprando, tinham dinheiro, então colocavam o camarada para trabalhar e se beneficiavam”. Para ele as mudanças ocorridas nos últimos 50 anos troxeram coisas boas e ruins. - “Eu acho que agora está bem porque a pecuária evoluiu mais. Está tudo beneficiado. Mas o pessoal pequeno não tem espaço. É só os grandes. Antes era melhor em uma parte porque a gente tinha muita fartura e hoje não tem. Tinha mandioca, tinha milho, todo mundo tinha roça. Criava porco, galinha. Agora a maior parte aqui é operário, trabalhador. Hoje a pecuária reduziu, e com esse eucalipto todo não tem onde botar a roça, o pessoal que tinha roça por aí vendeu tudo”. ão há como ir a Barcelona e deixar de visitar Isaura Francisca da Silva, personagem popular conhecida carinhosamente no distrito como dona Dadá, que fez questão de ceder ao Timoneiro o seu tempo para um dedo de prosa. Vai completar 70 anos de idade e chegou a Barcelona quando tiha apenas dois. Pouco restou das terras do pai, que as vendeu quando ela ainda era adolescente. Dona Dadá casou-se com um comerciante local e criou os cinco filhos, dois homens e três mulheres com muito trabalho e dedicação. Ela lembra do tempo em que todo mundo tinha terra, dois ou três alqueires, época em que se plantava muito feijão, milho, abóbora e mandioca. Seu próprio pai era um fazendeiro próspero, com terras que alcançavam os 50 alqueires. “Meu pai colhia 50 sacos de feijão, que serviam aos 20 agregados da fazenda, mas ainda lhe sobravam 20 sacos. E não havia como comercializar, por falta de transporte. Ele vendeu a fazenda para um senhor de Minas quando eu tinha 15 anos. Depois ainda muita gente vendeu as terras, venderam e foram para Teixeira de Freitas... e quebraram a cara. São umas 50 famí- lias que estão fora. Muitas famílias que foram para lá não puderam voltar mais. Mas os que ficaram aqui estão melhor que os que estão lá”. Dona Dada orgulha-se de seu município por causa da fartura e variedade de produtos e acredita que os moradores ainda têm sorte por poder pescar nas represas das fazendas. Mas lhe preocupa o crescimento das plantações de cana e eucalipto, que começam a tomar o espaço de muitas outras culturas. “No ano passado tinha 30 ônibus aqui que levavam gente para a Medasa (atual Santa Maria, fábrica de álcool) porque aquilo é uma coisa enorme. Os fazendeiros hoje estão pegando as terras, plantando cana e vendendo para a usina. A maioria, que criava gado, está já querendo passar para a cana. Eu acho que a cana está bem, mas leva o dinheiro é para o álcool, não dá comida na nossa mesa. Está diminuindo a plantação de milho e mandioca, quase não tem mais”. Carismática líder popular, Dona Dada foi candidata a vereadora duas vezes. “Eu tive 197 votos e estava na frente. Mas na hora de fechar o mapa colocaram que o outro candidato tinha três votos na frente. Se fosse hoje, nem Lula passava a perna em mim”, diz. 15 JULHO / AGOSTO DE 2009 H o nosso cantinho. O dinheirinho que eu ganhei em Belho Horizonte eu comprei aqui. Nós trabalhávamos mexendo com o gado, tirando leite para os outros”, diz seu Antônio. Dona Elza lembra que sequer recebiam salário. O patrão dava o leite, que o casal comercializava. “Ficávamos agradecidos, pois com o dinheiro do leite a gente comprava uns bezerros... Ele deixava a gente usar a terra para criar os animais”. Foi gerindo esta micro-economia que eles construíram uma bela casa e uma exemplar horta familiar. “Gente de Teixeira vem aqui agora na nossa terra e tem gosto de ver, isso não tem praga não tem nada, é tudo orgânico”, orgulha-se seu Antônio. Foto: Mônica Linhares oje poucas casas em Barcelona possuem quintais com hortas e criação de animais. Assim, foi uma surpresa quando a equipe de reportagem se deparou com a prosperidade da horta de seu Antônio Silva, que ele cuidadosamente regava no fim da tarde. No terreno do fundo de sua casa, seu Antônio e sua esposa Elza Galdino da Silva plantam mandioca, couve, alface, cebolinha, cuentro, mandioca mansa, entre outras hortaliças e criam umas 30 galinhas. A pequena produção é orgulho do casal. “Nós pagamos um empréstimo de 1.500 reais do Banco do Nordeste só com a nossa horta. Outro dia veio um pessoal de Teixeira e levou 100 reais só de galinhas”, diz seu Antônio. “Mas o comércio aqui não é forte, não dá para plantar muito porque senão não vende e depois estraga”, adverte Foi com o trabalho de uma vida que o casal comprou a terra em que hoje vive. “O pobre tem que trabalhar com os braços. Eu trabalhei muito em fazenda dos outros, muito tempo, para construir Foto: Mônica Linhares Uma vida de trabalho para adquirir a própria casa A última farinheira do distrito Seu Almerindo Pereira de Oliveira é dono da última farinheira em funcionamento de Barcelona. Outras cinco fecharam nos últimos anos e ele parece ser obrigado a seguir o mesmo caminho. O problema, diz, é que já não encontra mandioca para fazer farinha. “O pessoal agora planta mais cana, a plantação de mandioca acabou”, lamenta. Há 20 anos, conta, ele produzia diaramente 30 sacos de farinha, que eram vendidos para para Teixeira de Freitas, Medeiros Neto e até São Paulo. A tristeza enche os olhos de seu Almerindo, que perdeu a esposa Eurides Pereira Nunes, merendeira da escola do distrito, em junho deste ano. E agora, sob a preemência de ter que fechar a farinheira que tanto orgulho lhe trouxe, seu mundo ameaça perder o sentido. Para se despedir da equipe de reportagem ele faz questão de presentear um saco de farinha ainda quentinha, produzida aquela tarde mesmo, com o pouco de mandioca que conseguiu das terras de um parente. Feliz de poder dar o fruto de seu trabalho, que não é só farinha, mas também dignidade. Foto: Mônica Linhares Dona Idê Ribeiro Queiroz é sobrinha de Antônio Salviani, o grande fazendeiro que doou as terras para a construção do distrito há cerca de 50 anos. “Meu pai tinha uns 12 alqueirões de terra, vendeu a metade e o resto repartiu com os seis filhos. Hoje só dois irmãos meus têm terras, um alqueire cada um. Agora o meu tio tinha muito mais terras, ele doou para a comunidade para fazer o povoado, que ele mesmo batizou de Santo Antônio de Barcelona” Foto: Mônica Linhares “Uns 800 alqueirões de terra foram vendidos para a Suzano há uns 8 anos Esta área era toda de terras de fazendas, agora está com eucalipto. A empresa tentou fechar o córrego do povo, o pessoal se revoltou e colocou fogo no eucalipto. O assunto foi parar na Câmara e a comunidade garantiu o acesso à represa”, informa Anilson Francisco de Souza, filho de dona Dadá e ex-morador de Barcelona. O problema do córrego de Barcelona Foto: Mônica Linhares A primeira situação, logo à entrada do povoado de Barcelona, revela à equipe de reportagem a imagem ao lado. Não haveria problema se a água do Córrego de Barcelona não estivesse totalmente poluída. “O rio antes era limpo e nós podíamos usar a água para beber, mas hoje é depósito dos dejetos dos açougues... isso traz muito urubu, desses urubus que são mais limpos que os administradores”, ironiza Nelson Magalhães, motorista escola, casado, natural de Medeiros Neto, residente em São Antônio de Barcelona há muito tempo. “O problema é que não há rede de esgoto. Há uns 20 anos eles calçaram tudo aqui, mas fizeram o calçamento sem rede de esgoto. Só tem esgoto na rua principal, que vai todo para o Córrego”, diz Dona Dadá. Foto: Mônica Linhares PATRIMÔNIO HISTÓRICO Foto: Almay Souza O comunicado do tombamento do centro histórico de Caravelas pelo município foi recebido e assinado pelas 176 famílias que moram na área em novembro do ano 2005. Os documentos guardados na secretaria de Turismo comprovam que toda a comunidade foi devidamente informada sobre a decisão, aprovada em 27 de agosto de 2002 pelo Conselho Municipal de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural de Caravelas - COMDEPHAC, em um ato que tratava de pôr fim à série de descaracterizações que as fachadas vinham sofrendo. Pese a que a comunidade tenha sido informada do tombamento, a destruição do patrimônio histórico da cidade continuou. “As pessoas estão degradando um bem que é de todos, a maioria não apresenta projeto no COMDEPAC para a reforma da fachada das casas, não pede um alvará de construção ou reforma na Prefeitura. Muitas casas foram destruídas não por falta de dinheiro, mas por desinformação ou má vontade”, ressalta Moema Chimento, secretária de turismo do Município. Ela pede às pessoas que queiram reformar suas casas que venham pedir informação na Secretaria de Turismo. “A cidade ganha com o cuidado do patrimônio histórico, em Ouro Preto e Mariana isto é um exemplo, as pessoas devem entender que o cuidado com o patrimônio é muito im- portante para o turismo”, ressalta. Para o Secretário Municipal de Cultura, Dó Galdino, é necessário sensibilizar não só a comunidade, mas todas as instâncias do poder público para a importância do patrimônio histórico da cidade. - “O que acontece é que a comunidade não está sensível a questão da preservação do patrimônio. Quem tem dinheiro se acha no direito de desobedecer as regras da lei de tombamento. Precisamos de um trabalho de educação patrimonial e esse trabalho deve ser feito por um técnico. Estamos vendo junto ao Instituto de Patrimônio Artístico Cultural da Bahia, o IPAC, se conseguimos trazer um técnico para cá para fazer um trabalho de conscientização junto a vereadores, prefeito e comunidade. É um trabalho lento de sensibilização. Caravelas vem de hábitos diversos que são difíceis de mudar de uma hora para outra. Mas nestes cinco meses conseguimos sensibilizar pessoas que estavam reformando suas casas a adotar um modelo semelhante ao originário no período colonial. É algo inédito porque a comunidade antes não se sensibilizava. A cultura de transformar para o moderno é evidente em vários municípios no Brasil, o Brasil tem a cultura de sempre querer mudar, e não a cultura de restaurar e preservar”. A responsabilidade sobre o patrimônio passará para a pasta da Secretaria de Cultura, logo que for feita a nomeação de um funcionário para o cargo de chefe de patrimônio histórico, até o momento vago. Foto: Mônica Linhares Tombamento do centro histórico vem sendo desconsiderado J O exemplo do Coronel José osé de Almeida Oliveira, conhecido como “coronel José”, é um dos mais importantes restauradores privados do patrimônio histórico de Caravelas. Por suas ações em favor da cultura e seus amplos conhecimentos, poderia ser, ele mesmo, considerado um patrimônio cultural da cidade. Voltou definitivamente a Caravelas, para sorte do município, entre 1986 e 1987, após uma vida agitada e repleta de andanças pelo Nordeste, Rio Grande do Sul e Amazônia, em sua longa trajetória de trabalho para Armas de Engenharia. Atualmente está reformando seu sexto casarão na cidade. Três deles devem ser destinados ao uso cultural da comunidade de Caravelas: o Casarão da Cultura, imóvel que o avô adquiriu em 1901 e que será destinado ao Museu do Município; a casa situada em frente à praça Santo Antônio, construída com óleo de baleia e cal no início do século XIX, onde funcionará a biblioteca; e a casa anteriormente cedida à Escola de Samba Coroa Imperial, e que será agora destinada à Secretaria de Cultura para a realização de eventos. Todas passaram por um processo cuidadoso de reforma em suas fachadas e no interior. “Tenho um capital que preciso empregar e faço esta aplicação a fundo perdido”, brinca o coronel. Mas por quê investir todo o dinheiro conseguido em uma vida de trabalho na restauração do patrimônio histórico e no incentivo à cultura? pergunta-lhe O Timoneiro. O exemplo vem na resposta: “São as raízes, o apego à terra”, responde. 16 JULHO / AGOSTO DE 2009 Foto: Almay Souza MEMÓRIA Casarões antigos são obras de arte da arquitetura colonial Janelas peculiares de Caravelas Foto: Almay Souza Boa parte da história de Caravelas foi e continua sendo destruída. Transformações desenfreadas e irreparáveis nas fachadas dos casarões vão acabando com o testemunho da longa história da cidade. Conheça a história dos casarões de Caravelas e entenda por quê este patrimônio deve ser preservado. Por Almay Souza e Leidiane Assunção A lém de obras arquitetônicas de beleza e bom gosto, os casarões de Caravelas são testemunhas dos longos anos de influência da colonização portuguesa. Os primeiros casarões da cidade foram construídos a partir de modelos europeus trazidos pelos jesuítas de Portugal em meados de 1600, baseados no estilo arquitetônico que ficou conhecido como barroco português. A igreja Santo Antônio é um exemplo deste tipo de construção, pequeno ícone do amplo movimento artístico que se espalhou por toda Europa e América Latina em contraposição à arte renascentista (veja reportagem abaixo). Sua construção, de estilo colonial barroco simples, teve inicio em 1698, quando chegou à cidade o Padre jesuíta Antônio do Espírito Santo, vindo a ser concluída somente em 1750. Pouco restou daquela época. Dos sobrados do século XVIII, o último que estava de pé era o da Prefeitura, incendiada em 1959 em condições ainda pouco esclarecidas. Depois dos sobrados vieram os casarões do início e de meados do século XIX (anos 1800) hoje a maioria na cidade, construídos quando Caravelas atingia a fase áurea de sua economia em conseqüência do plantio de café e da intensa atividade do Porto de Caravelas que movimentava o Extremo Sul da Bahia e o Norte de Minas Gerais, ligados também por ferrovia. Hoje cada uma destas construções guarda um histórico infindável das funções que assumiu. O Casarão de Cultura, por exemplo, já foi estamparia, depósito, cadeia, escritório Bahia Minas, pensão e órgão de prefeitura. O casarão “Céu azul”, um dos antigos prostíbulos da cidade, virou pensão e depois orfanato! Requinte - Até o final século XIX as moradias eram feitas com requintes e detalhes que as caracterizavam como verdadeiras obras de arte. “Quanto mais beirais tinha uma casa, mais ricos eram os seus donos” lembra o historiador caravelense Francisco de Almeida, o Chiquinho. A riqueza de detalhes nas fachadas das edificações era considerada um signo de distinção. Ainda hoje as ruas do centro histórico de Caravelas possuem trabalhos arquitetônicos surpreendentes. É o caso da mansão dos Soares, cuja construção data de 1805. O casarão foi todo revestido em azulejos Portugueses, originários de Macau (antiga possessão portuguesa) utilizados para dar graça e requinte à fachada. Sua frente tem 5 janelas em guilhotinas encaixilhadas com bandeira em estilo rabo de pavão, típicos da arquitetura colonial portuguesa. Casas como as das famílias Almeida Costa, a família PhiladePho Monteiro, o Foto: Almay Souza casarão da Cultura, a biblioteca, a casa da professora Célia, e as do herdeiro do Seu Almiro Fonseca, em frente a Casa da Professora Marilene Gouvêa… a casa de Valdir e do Coronel José, a atual Secretaria de Turismo, a Secretaria de Educação, a casa da Abrolhos Turismo, os sobrados da Família Carvalhal, o casarão de Fernando e Sandra (filha de finado Doninho), o prédio do Sindicato dos Estivadores, a casa do Professor Francisco onde atualmente funciona o IBJ (Instituto Baleia Jubarte) são algumas que preservam a tradição e a história de construções consideradas patrimônio histórico Caravelense. Revelam um passado não tão distante, que ficou empobrecido pelo descaso e pela busca insensata de modernidade. Destruição e Reconstrução - As mudanças nos casarões antigos começaram na década de 40, quando a então Prefeitura Municipal de Caravelas ofereceu dez anos de isenção de imposto Foto: Mônica Linhares Um problema que dificulta a preservação do patrimônio histórico é o do custo das reformas para a população com menos recursos financeiros. Somente a restauração de uma frente de casa (duas janelas e uma porta) sai em média R$ 3 mil reais. Veja o depoimento de Alex Gonçalves, que trabalha na restauração de janelas e portas de estilo barroco na única marcenaria da cidade especializada: a LuciaAlex “Eu acho um pouco triste toda esta mudança na fachada dos casarões. Uma coisa bonita que aconteceu aqui foi tombar a cidade, mas isso é para ter sido feito desde 1995, 1990. Eu tenho pouca lembrança, mas na rua do Porto, na rua Sete, havia muitos casarões antigos que foram destruídos. Aí vem o problema também da sociedade que é pobre, desmanchar e fazer no estilo moderno é mais barato. Há pessoas que acham bonito, mas têm que desmanchar porque não têm dinheiro para colocar como deveria ser. Se a prefeitura tivesse um projeto para ajudar as pessoas, tenho certeza de que Caravelas voltaria a ser o que era antes. O projeto de revitalização do centro histórico de Caravelas foi enviado ao Ministério de Turismo em 2006, quando foi aprovada a primeira etapa, para a pavimentação da Rua do Porto. Na época, a Prefeitura não tinha certidão negativa de débitos e os cerca de R$ 200 mil que já haviam sido destinados pelo governo federal ao município não puderam ser utilizados para realizar esta obra tão esperada pela comunidade. A segunda etapa previa a recaracterização das fachadas, mas não se passou sequer da primeira. O valor total previsto no projeto entregue em 2006 para a revitalização do centro histórico era da ordem de R$ 3 milhões de reais. Uma cópia do mesmo foi entregue ao presidente Lula em sua vinda a Caravelas, no dia 05 de junho de 2009. Fone: (73) 3647-1060 Galdino, ainda falta atenção à questão cultural, que é estratégica para Caravelas. “Para manter os valores da comunidade é fundamental que esta preserve a sua história. Caravelas tem uma vocação para o turismo histórico, mas para isso necessitamos revitalizar o centro histórico e preservar as fachadas”, destaca. Com o foco na preservação, o projeto da Secretaria de Cultura para o centro histórico está em sintonia com o que vem acontecendo (de forma bem sucedida) há décadas nas históricas cidades européias. Dó Galdino fala em transformar o centro histórico em um espaço cultural, onde existam restaurantes com comidas típicas, pousadas, salas de visitas, museus e centros de apresentações culturais. “Isto traria um diferencial enorme na região, pois nem mesmo Porto Seguro possui estes espaços. O turismo histórico é um grande agregado para o turismo de Abrolhos”, ressalta. Barroco: Um movimento para expressar as emoções A arte barroca nasceu na Itália, no século XVII, e acabou se espalhando pela Europa e então colônias americanas. Era uma arte de formas opulentas e rebuscadas, que encontrou na Igreja Católica um espaço importante de manifestação, numa época em que se via ameaçada pelas igrejas protestantes. Contrariamente à arte do Renascimento, que pregava o predomínio da razão, no Barroco há uma exaltação dos sentimentos, a religiosidade é expressa de forma dramática, intensa, procurando envolver emocionalmente as pessoas. Na arquitetura, elementos curvos, impetuosos, tomaram o lugar de elementos retangulares e harmônicos, com amplas volutas e profusão de detalhes.. No Brasil, o barroco floresceu ao longo da maior parte de sua curta história “oficial” de 500 anos, num período em que os residentes lutavam por estabelecer uma economia auto-sustentável, até onde permitisse sua condição de colônia Foto: Almay Souza Projeto de revitalização do centro histórico “Se a prefeitura tivesse um projeto para ajudar as pessoas, tenho certeza de que Caravelas voltaria a ser o que era antes” (IPTU), para os moradores que reformassem suas casas de fachadas coloniais transformando-as em casas modernas, com o objetivo de acompanhar o dito “progresso”. “O que queriam era modernizar uma cidade que consideravam velha. Nessa época ninguém falava em turismo, nem em preservação de prédio antigo”, afirma Francisco. Com essa oferta, vários proprietários de casarões optaram por reformar seus lares para dar lugar a modernidade, e é claro, ficar 10 anos sem pagar IPTU. Ao contrário do que as pessoas imaginavam, Caravelas não ficou mais bonita: as mudanças levaram à descaracterização de toda a beleza histórica singular dos casarões. “É uma pena que Caravelas nunca tenha um prefeito voltado para a cultura, que tivesse a visão da cultura como um processo de desenvolvimento”, lamenta o Coronel José, um dos mais atuantes reconstrutores do patrimônio histórico da cidade. Para o Secretário de Cultura, Dó pesadamente explorada pela metrópole. Ergueu-se num terreno em luta, nos longos séculos de construção de um novo e imenso país. O resultado de seus entrecruzamentos e mesclas é o acervo original e riquíssimo que hoje se vê espalhado em praticamente todo o litoral brasileiro. Essa arquitetura encontrou maior expressão em Minas Gerais – onde a tendência era equilibrar as formas – e no Nordeste (sobretudo Bahia e Pernambuco), onde a tendência era rebuscar o estilo.