A ATUAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NOS CASOS OFICIAIS DE HOMOFOBIA NA SSP/SE ENTRE OS ANOS DE 2010 E 2013 Moisés Santos de Menezes1 Elaine de Jesus Souza2 RESUMO O objetivo desta pesquisa qualitativa foi analisar a atuação do Serviço Social da Secretaria de Segurança Pública do Estado Sergipe- SSP/SE frente aos casos oficiais de homofobia entre 2010 e 2013. Para tanto, foi utilizada pesquisa documental em Boletins de Ocorrência (BO) e o levantamento exploratório de dados se deu através da pesquisa de campo com a aplicação de entrevistas semiestruturadas com homossexuais e transgêneros que sofreram violências homofóbicas e notificaram através de (B.O), em órgãos da SSP/SE entre os anos de 2010 a 2013. Destarte, observou-se que o Serviço Social como profissão dentro deste contexto ainda possui uma intervenção limitada e insuficiente para atender tais demandas, e que a homofobia precisa ser trabalhada como uma questão social de responsabilidade de todos em combatê-la. Palavras-chave: Homofobia; Homossexualidade; Serviço Social. 1 2 Universidade Federal de Sergipe/UFS. E-mail: [email protected]. Universidade Federal de Sergipe/UFS. E- mail: [email protected]. INTRODUÇÃO No Estado de Sergipe, para o combate aos diversos tipos de violência direcionados também contra os homossexuais foram criados órgãos notificadores de violência que buscam defender e luta pelos direitos humanos tais como o Departamento de Homicídios e Proteção a Pessoa- DHPP e a Delegacia de Grupos Vulneráveis – DAGV, setores gerenciados pela Secretaria de Segurança Pública do Estado de SergipeSSP/SE. A DAGV possui uma equipe multidisciplinar na qual está inserido o Serviço Social como profissão que, através de suas dimensões teórico-metodológica, éticopolitica e técnico-operativas, é responsável por viabilizar a garantia de direitos sociais. O profissional dessa área possui uma formação que o habilita a observar os fatos em sua totalidade desfazendo-se de qualquer senso comum, defendendo a luta pela igualdade social e a busca pela eliminação de todas as formas de preconceitos e discriminações sociais. Entre estes preconceito e discriminações, destaca-se a homofobia, que na contemporaneidade tem se revelado um grave problema social, basta sabermos que no Brasil o número de assassinatos de homossexuais (e outros indivíduos que fazem parte da diversidade sexual), nos últimos 30 anos, ultrapassa o quantitativo de um milhão de vítimas. Além desse tipo de crime somam-se outras violências como as agressões verbais, físicas, patrimoniais, dentre outras (OLIVEIRA, 2013). Dessa forma, este trabalho possui como objetivo central analisar os encaminhamentos realizados pela Secretaria de Segurança Pública do Estado Sergipe frente aos casos oficiais de homofobia entre 2010 e 2013, bem como a atuação do Serviço Social dentro deste contexto. Serviço Social e Homofobia: entre conceitos e práticas O Serviço Social é uma profissão que trabalha diretamente com as expressões da questão social, inserido em diversos contextos institucionais possuindo o objetivo de viabilizar a garantia de direitos a todos os seus usuários. Esta profissão é regulamentada pelo Código de Ética Profissional dos Assistentes Sociais, aprovado em 15 de março de 1993, com as alterações introduzidas através das resoluções de n° 290/94 e 293/94, e pela lei de regulamentação profissional dos assistentes sociais de 1993 de n° 8.662, de 7 de junho de 1993. Entre os princípios fundamentais do Código de Ética se destacam o “reconhecimento da liberdade como valor ético central e das demandas políticas a ele inerentes – autonomia, emancipação e plena expansão dos indivíduos sociais” (CFESS, 1993), em que, no âmbito profissional, defende-se diretamente o respeito a todas as especificidades de cada usuário. Em relação às várias formas de preconceito e discriminação, o Serviço Social busca em seus princípios o “empenho na eliminação de todas as formas de preconceito, incentivando o respeito á diversidade, á participação de grupos socialmente discriminados e a discursão das diferenças” (CFESS, 1993), em um olhar profissional voltado na luta pelo “exercício do Serviço Social sem ser discriminado/a, nem discriminar, por questões de inserção de classe social, gênero, etnia, religião, nacionalidade, orientação sexual, identidade de gênero, idade e condição física” (CFESS, 1993), carregando consigo uma postura a favor dos direitos de todos os sujeitos sem discriminar nenhuma de suas especificidades analisando os sujeitos em sua totalidade. Destarte, o Serviço Social pode atuar no combate a diversos tipos de preconceitos e discriminações, incluindo as manifestações de violência contra os grupos de Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgêneros/LGBT, ou seja, tal área pode contribuir com o combate à homofobia. Nesse sentido, informa-se que embora o termo homofobia ter sido utilizado inicialmente para se referir à rejeição irracional ou mesmo aos sentimentos de ódio, medo, aversão e repulsa em relação a gays e lésbicas, não pode mais ser reduzido a isso. Visto que, esse sentido original se mostrou limitado, não abrangendo toda a extensão e complexidade do fenômeno homofóbico (BORRILO, 2009) Em consonância, muitos/as estudiosas/as adotam o conceito homofobia de forma abrangente, englobando os preconceitos e discriminações perpetrados contra lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e outras formas de diversidade sexual, em decorrência dos seus comportamentos, estilos de vida e aparências divergentes dos padrões impostos. E, portanto, envolve elevado grau de violação dos direitos humanos de tais indivíduos e/ou grupos sociais. Dessa forma, o conceito homofóbico não está mais centrado somente no indivíduo e na sua “reação anti-homossexual”, visto que, passa a envolver aspectos culturais, educacionais, políticos, institucionais, jurídicos, antropológicos que demandam a reflexão, crítica e denúncia acerca da imposição de normas sexuais e de gênero (JUNQUEIRA, 2009; RIOS, 2009). No ano de 2006, o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS), junto aos Conselhos Regionais de Serviço Social (CRESS), em parceria com as entidades políticas LGBT, através do XXXIV Encontro Nacional CFESS/CRESS, lançaram a campanha pela liberdade de orientação e expressão sexual intitulada de: "O amor fala todas as línguas: assistente social na luta contra o preconceito", que tinha como principal objetivo: “sensibilizar a categoria dos assistentes sociais para o debate em torno da livre orientação e expressão sexual como direito humano” (CFESS, 2006, p. 14), além de favorecer a construção de espaços de diálogos e parcerias interdisciplinares na defesa da livre orientação e expressão sexual como de todos, contribuindo para disseminação de práticas não discriminatórias entre os assistentes sociais na perspectiva da consolidação do projeto ético-político da profissão, no enfrentamento das várias formas de homofobia, incentivando o conjunto CFESS – CRESS a garantir o respeito à diversidade humana nos espaços institucionais, nos trabalhos dos assistentes sociais e na formação profissional em Serviço Social (CFESS, 2006). Um dos resultados desta campanha foi a aprovação da Resolução de n°. 489 de 3 de junho de 2006, publicada no Diário Oficial da União em 7 de junho do mesmo ano, que estabelece normas, vedando condutas discriminatórias ou preconceituosas, por orientação e expressão sexual para com sujeitos LGBT no exercício profissional dos assistentes sociais. Esta resolução fundamenta-se nos princípio da Constituição Federal Brasileira de 1988 e do Código de Ética Profissional dos Assistentes Sociais de 1993, bem como pela Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, e a “Declaração de Durban” adotada em setembro de 2001 que reafirma o princípio da igualdade e da não discriminação. Em seu art. 1° a resolução assegura que: Art. 1º - O assistente social no exercício de sua atividade profissional deverá abster-se de práticas e condutas que caracterizem o policiamento de comportamentos, que sejam discriminatórias ou preconceituosas por questões, dentre outras, de orientação sexual; (RESOLUÇÃO, 489/06, CFESS, 2006). Nos artigos seguintes da resolução, a mesma responsabiliza aos profissionais de Serviço Social pela busca do respeito em relação aos seus usuários independentemente de sua orientação afetivo-sexual, como a luta na eliminação de práticas discriminatórias e preconceituosas em seus espaços de trabalho decorrentes da orientação sexual entre pessoas do mesmo sexo. No art. 4° e seguintes, é vedado a estes profissionais a utilização de instrumentos e técnicas para criar, manter ou reforçar preconceitos, estigmas ou estereótipos de discriminação em relação à livre orientação sexual de seus usuários, bem como os Conselhos Regionais de Serviço Social – CRESS se colocam como os órgãos responsáveis em receber denúncias condizentes a atitudes discriminatórias ou preconceituosas relacionados à orientação sexual ou identidade de gênero de quaisquer profissional ou usuário, devendo estes Conselhos tomarem os encaminhamentos cabíveis a tais denúncias, oferecendo representação, quando necessário, ao Ministério Público (CFESS, 2011). Entre as penalidades para os profissionais de Serviço Social que desrespeitarem estes princípios conforme o artigo 7° da resolução se faz necessária a aplicação dos artigos 23 e 24 do Código de Ética Profissional de 1993, que pune os profissionais com multas, advertências reservadas, e públicas, suspensão e cassação do registro profissional (CFESS, 1993). Ao se retratar das diversas formas de discriminação que, muitas vezes, transitam em inúmeras violências relacionadas aos LGBT, o CFESS como órgão de maior instância profissional do Serviço Social mantém uma postura ética central na luta pela viabilização da garantia de direitos ao afirmar que: “no tempo presente, temos a responsabilidade de lutar por uma sociabilidade humana, onde a livre orientação e expressão sexual é um direito humano” (CFESS, 2008, p. 1). Dentre esta postura, o CFESS assumiu um compromisso em articulação com outros sujeitos coletivos na defesa da livre orientação ou expressão sexual em que, dentre outros, se comprometeu: pelo “[...] empenho em eliminação de todas as formas de preconceitos e violência expressas na reprodução da homofobia/lesbofobia/trasnfobia, racismo, do machismo e do sexismo” (CFESS, 2008, p. 2), visando a defesa e o respeito por todos os LGBT na busca por uma sociedade mais justa e igualitária. O Conjunto CFESS/CRESS, no dia 9 de setembro de 2011, publicou no Diário Oficial da União (DOU), a Resolução do CFESS nº. 615/2011, de 8 de setembro de 2011, que permite à assistente social travesti e ao/à transexual a utilização do nome social na carteira e na cédula de identidade profissional. A partir desta normativa, será permitida também a utilização do nome social nas assinaturas decorrentes do trabalho desenvolvido pelo assistente social, juntamente com o número do registro profissional dentre os artigos desta resolução. O Conjunto CFESS/CRESS ainda se faz presentes em várias mobilizações e marchas junto aos LGBT, a exemplo do dia mundial de combate à homofobia em todo o país, em que, na segunda marcha que aconteceu em Brasília – Distrito Federal, o Conselho posicionou-se a favor da luta contra toda e qualquer forma de discriminação relacionada à orientação sexual e identidade de gênero alegando que: No âmbito do Serviço Social brasileiro, por assumirmos a liberdade e a igualdade substantivas como princípios éticos fundamentais do Código de Ética Profissional, o CFESS tem manifestado posição de respeito a livre orientação sexual e a livre identidade de gênero, somando-se a resistência coletiva do movimento LGBT, feminista e de todos aqueles que se propõe a descontruir o patriarcado heterossexista (CFESS, 2011, p.2). Mediante este posicionamento, o conjunto CFESS/CRESS também apoia a aprovação da PLC 122/2006 e a união civil entre pessoas do mesmo sexo, reafirmando a importância em se trabalhar a homofobia de forma que o Estado junto a toda a sociedade civil possam unir forças para impedir o avanço do conservadorismo social e da imposição da heterossexualidade como modelo central de sexualidade a ser seguida, prezando pelo respeito à diversidade sexual, uma vez que as múltiplas formas de violências aos LGBT são constantes e costumeiras. Desta maneira, o conjunto CFESSCRESS (2008) alerta sobre a importância de se trabalhar esta temática de forma interligada entre Estado e sociedade civil, reconhecendo o grande aumento da violência para com os LGBT no país. Secretaria de Segurança Pública/SE e Homofobia: atuação e perspectivas O Estado de Sergipe, atualmente, conta com cinco Delegacias de Grupos Vulneráveis (DAGV), e um Centro de Atendimento a Grupos Vulneráveis, este último está presente na grande capital (Aracaju), as outras quatro DAVG, que estão localizadas nos municípios de Estância, Itabaiana, Lagarto e Nossa Senhora do Socorro, e o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) que se encontra na 3ª Delegacia Metropolitana também na cidade de Aracaju, conforme dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado de Sergipe. O Departamento de Atendimento a Grupos Vulneráveis (CAGV) da polícia Civil de Sergipe atende a um público específico, vítima de diversos tipos de violência, como idosos, homossexuais, mulheres, crianças e adolescentes, além de realizar atendimento às vítimas, a mesma centraliza os procedimentos abertos em outras delegacias, relativas a crimes contra o público vulnerável, abrindo inquéritos e realizando investigações de queixas advindas do disque denúncia, com o número 181 e o disque 100, como das entidades de defesa da pessoa humana e por meio da prestação de queixa direta das vítimas neste órgão. Conforme informações da Secretaria de Estado da Segurança Pública de Sergipe, a DAGV surgiu como delegacia especializada no Estado em setembro de 2004, compreendendo a Delegacia Especial de Proteção à Criança e ao Adolescente, a Delegacia Especial de Atendimento à Mulher e a Delegacia Especial de Atendimento a Grupos Vulneráveis, atendendo a estes grupos com a oferta de serviço psicossocial, onde se encontram inseridos psicólogos e assistentes sociais. Nesse contexto, aponta-se a necessidade de programas governamentais e políticas públicas eficazes, sistemáticas e permanentes que passem por um controle social e disponham de recursos e estruturas de gestão específicos para promover a agenda dos direitos humanos e da diversidade sexual e, assim, possibilitar o avanço no combate à homofobia (RODRIGUES, 2011). Ademais, salienta-se que a homofobia representa um problema público e precisa urgentemente ser reconhecida como tal, para que em consonância com outras ações interventivas (individuais, grupais e institucionais) sejam implementadas políticas para desconstruir esse sistema de exclusão, humilhação social que se instala e é reiterada cotidianamente, sobretudo em virtude dessa invisibilidade pública. Visto que, a diversidade sexual precisa usufruir dos direitos humanos e sexuais, para tanto, é necessário envidar esforços e ações para problematizar e contrapor a marginalização e os preconceitos que reforçam as relações de poder, normas e hierarquias em torno das sexualidades. (PRADO; JUNQUEIRA, 2011). Nesse sentido, o Serviço Social pode promover ações contínuas e sistemáticas que contribuam com o combate à homofobia. MÉTODO Para desenvolvimento da pesquisa em questão, foi realizada uma revisão bibliográfica sobre o tema analisando-se percepções de autores como Borrillo (2010) e Oliveira (2013), pesquisa documental através Boletins de Ocorrência (BO) dos casos analisados relacionados a defesa dos direitos LGBT do Estado de Sergipe. A pesquisa de campo aconteceu entre os dias 14 a 20 de agosto de 2013, com a aplicação de entrevista semiestruturada, direcionada a sete vítimas de crimes com indícios de homofobia e a quatro servidores da SSP/SE que trabalham no DHPP e DAGV. Todas as entrevistas foram gravadas e transcritas na íntegra e fixadas aos termos de concessão de entrevistas livre e esclarecido devidamente assinados pelos/as entrevistados/as, bem como o termo de utilização de Boletins de Ocorrência. É importante ressaltar que respeitando a autonomia e identidade dos homossexuais entrevistados foi facultativa a utilização do nome social na assinatura do termo de concessão de entrevistas. Toda a pesquisa de campo foi realizada na cidade de Aracaju-Sergipe, pela existência de notificação de casos oficiais com indícios de homofobia. Já nos municípios do interior sergipano ainda são raros os registros de queixas de crimes com indícios de homofobia, situação que contribui para a subnotificação dos casos existentes no Estado. RESULTADOS E DISCUSSÕES Atendimento e encaminhamentos dos casos de Homofobia Foi questionado aos servidores da DAGV de Aracaju como são realizados os atendimentos e acompanhamentos aos homossexuais que chegam com denúncias referentes a violências homofóbicas neste órgão de segurança pública, os mesmos responderam que o atendimento inicia com o registro da ocorrência ou através do recebimento de denúncias, existindo lesões nas vítimas, são encaminhadas para o Instituto Medico Legal - IML, e, havendo necessidade de atendimento médico, as encaminham para o hospital, (estes procedimentos acontecem em casos onde a vítima necessita de um atendimento médico, sendo esta uma necessidade emergencial, nestes procedimentos o B.O não se torna a primeira medida a ser tomada, mas sim as questões de saúde da vítima) logo mais é registrado o B.O e, conforme o posicionamento da vítima dá-se entrada no processo de instauração ou não de inquérito policial. No caso de crimes em que há indisponibilidade do direito, a vítima decide se deseja a mediação. Caso opte pelo serviço, as partes são reunidas e dialogam na presença do mediador com o objetivo de encontrar uma solução em comum acordo para a questão. Com o direito disponível ou mesmo com o direito indisponível, a vítima desejando um encaminhamento para o âmbito judicial, é feito um inquérito policial ou um termo de ocorrência circunstancial, dependendo do crime, pois estes podem ser crimes de menor potencial ofensivo (penas que não ultrapassam dois anos, este tipo de crime pode ser encaminhado para o juizado especial criminal) ou de maior potencial ofensivo (com penas maiores que 24 meses, esses crimes são encaminhados para vara criminal comum). Para os crimes de menor potencial ofensivo faz-se o registro de termo de ocorrência circunstancial, ou instaurados inquéritos policiais, para os casos mais complexos. Além do procedimento de encaminhamento para o registro das ocorrências e possíveis encaminhamentos investigativos, como também em relação à saúde, a depender do tipo de violência sofrida pela vítima, a DAGV oferece o serviço de atendimento psicossocial, ofertado por equipe interdisciplinar de assistente sociais e psicólogos. A servidora entrevistada retrata sobre estes procedimentos quando alega que: Eles chegam aqui na recepção e ai agente pergunta, o que e que ele esta precisando, ele fala o que, que esta acontecendo, se for pra encaminhar pra B.O. agente encaminha pro B.O. se for um caso assim de problema psicológico agente encaminha pra assistente social ou pra psicóloga entendeu? Se for um fato grave agente encaminha pra delegada pra tomar as providências. Geralmente tá com lesão corporal, geralmente tá bem machucado. Geralmente quando agente faz o B.O é encaminhado, tem um encaminhamento (SILVA, M.A., Escrivã de Policia, 21 de agosto de 2013). Conforme dados das entrevistas com os servidores da DAGV e DHPP, os casos de violência contra homossexuais são constantes, existindo registros de ocorrências semanalmente. Em casos de assassinatos e suicídios os procedimentos são dirigidos a DHPP3, em que são tomadas as seguintes providencias: assim que acontece um crime uma equipe de plantão é acionada para que se direcione ao local do ocorrido onde realiza o isolamento do mesmo, acompanhando o trabalho da perícia e realiza diversas outras funções, também são acionadas uma equipe de investigação e um delegado responsável com o objetivo de colher dados e informações distintas que subsidiem todo processo de investigação criminal. Quanto à constatação dos motivos ou razões daqueles crimes serem considerados homofóbicos ou não, isto se dará através da investigação criminal, conforme Silva Júnior (2012, p.120) “somente uma investigação psíquica depurada poderia conduzir a uma segurança na afirmação, em face da causa Criminis e do modus operandi de cada delito objeto de estudo”. Este tipo de investigação se inicia com a abertura do B.O e conta quando por meio de convocação do/a delegado/o do caso com o suporte técnico do Serviço Social. 3 Na DHPP, não existe a oferta do atendimento psicossocial, inserimos este órgão na pesquisa pelo mesmo fazer parte da SSP/SE e estar atuando com situações de assassinatos e suicídios de LGBT no Estado de Sergipe, sendo estas situações notificadas e por entendermos que a ausência destes profissionais podem causar várias implicações na vida dos familiares dos homossexuais encaminhados para este órgão. Acompanhamento Psicossocial no enfrentamento da problemática A SSP/SE, no que tange a DAGV, disponibilizando o serviço de acompanhamento psicossocial4, oferece as vítimas o direito a um acompanhamento psicológico e social. Para que este serviço seja acessado segundo dados das entrevistas com os servidores de segurança pública, é preciso que as vítimas solicitem ou que o delegado responsável pelo caso os encaminhem. O registro do B.O não se configura como condicionalidade necessária para que as vítimas de crimes homofóbicos possam contar com o acompanhamento psicossocial da equipe interdisciplinar da DAGV. Conforme dados da entrevista, as necessidades destes vitimados é que irão discernir se é preciso este tipo de intervenção profissional ou não, e isso pode ser percebido na abordagem dos casos. Eles têm que pedir, a não ser que seja um caso que agente veja que a vítima esteja necessitando de atendimento psicológico, seja algo que a vítima esteja necessitando, chega muito nervosa chega aqui uma situação, mais é não necessariamente, chegou é crime homofóbico a gente vai encaminhar pra psicólogo ou assistente social, às vezes não há necessidade né? A pessoa tá bem não há necessidade. A casos que a vítima solicite diz não eu queria pro atendimento psicológico ela e encaminhada ou a caso que a vítima chega ela tá muito nervosa com um estado emocional muito abalado ou algo do tipo e então agente faz o encaminhamento, mas não necessariamente assim como nos fazemos com criança e mulheres também não todas que chegam aqui são encaminhados para estes setores depende da necessidade (FERNANDES, S.L.S., Delegada de Polícia, 21 de agosto de 2013). Dentre as vítimas de crimes de homofobia entrevistadas, que registraram o B.O na DAGV em Aracaju-Sergipe, seis afirmaram não ter nenhum tipo de acompanhamento psicossocial desta equipe, uma informou não querer este atendimento, embora o considere muito importante. Dentre estas vítimas, uma criticou a forma como a DAGV oferece este serviço, quando afirma que: É muito escasso, é muito vazio, pra você ter o acompanhamento você tem que buscar o acompanhamento porque se você for prestar uma queixa e você ficar esperando que se tenha um acompanhamento você não vai ter [...] (CRUZ, A.N.R., Vítima de Homofobia, 16 de agosto de 2013). Esta forma de intervenção profissional condicionada aos seus usuários a partir da prévia solicitação uma vez que os mesmos às vezes nem tem ciência da oferta deste serviço pela instituição, ou através da convocação do profissional responsável pelo caso 4 Mesmo havendo um acompanhamento psicossocial nas DAGV, nos deteremos apenas ao que tange ao Serviço Social como profissão de acordo com o objetivo deste trabalho. (delegado/a), de certa forma, tende a ir de contra ao que temos como um dos direitos dos assistentes sociais perante suas atribuições com seus usuários elencados no capítulo II do Código de Ética Profissional da categoria, onde em seu artigo 7° que trata dos direitos do assistente social nas relações com as instituições empregadoras e outras, afirma que um de seus direitos é “ter livre acesso á população usuária” (CFESS, 1993). Neste processo de acompanhamento psicossocial, o psicólogo é responsável por trabalhar a parte psicológica da vítima e seus familiares e amigos envolvidos no caso, bem como dos agressores ou núcleo familiar dos mesmos, e o assistente social é o responsável em fazer o estudo social dos sujeitos envolvidos em cada caso, bem como encaminhamentos e possíveis intervenções profissionais. Conforme esclarecimentos da assistente social que atua na DAGV, esse processo de investigação social é feito da seguinte forma: Quando o assistente social vai, que ele é ordenado a fazer essas investigações, ele vai colher as informações e passar para o delegado. A delegada vai colher outros tipos de informação com outros tipos de profissionais e aí ela vai ver o que é que ela vai.... isso aí quem pode te falar é a delegada tá entendendo? Que não cabe agente assistente social agente só cria as estratégias pra reflexão e esclarecimentos dos fatos, não, agente a ponta se é ou não é a pessoa é homofóbica (SOUZA, E.L.C., Assistente Social, 15 de agosto de 2013). A atuação profissional do Serviço Social, nestes casos, além de auxiliar a esclarecer os fatos ocorridos em relação ao crime com os dados recolhidos em todo processo de investigação social, em conjunto a outras visões profissionais, subsidia o parecer profissional do delegado responsável pelo caso, buscando viabilizar a garantia de direitos a todos os envolvidos, uma vez que a inserção do assistente social nestes casos não se resume apenas a um olhar investigativo da profissão em relação a determinado crime, mas, junto aos encaminhamentos e às intervenções profissionais que cada caso venha a exigir, completando e solidificando os objetivos profissionais do Serviço Social. O acompanhamento profissional da equipe psicossocial (destacando aqui o Serviço Social) para este público é de extrema importância, pois além de viabilizar a garantia de direitos serve como um suporte necessário para orientar os sujeitos na busca pelo respeito à diversidade sexual, bem como produz um trabalho de prevenção e combate à homofobia. A atuação do Serviço Social nestes casos certamente visa combater diversas posturas preconceituosas e discriminatórias voltadas à orientação sexual e/ou identidade de gênero das vítimas de homofobia. Isto reafirma o compromisso ético e ativo da categoria profissional ao afirmar uma postura voltada à luta cotidiana para viabilizar o acesso de todos e todas, a direitos sociais, somando-se ao movimento em defesa dos direitos humanos e de toda população LGBT na busca por um Estado em favor da criminalização da homofobia, e aprovação do Projeto de Lei 122/06! (CFESS, 2013). Uma delegada da DAGV, responsável em receber as denúncias de casos de homofobia, alega ser muito importante este atendimento psicossocial dentro deste órgão de segurança pública, informando que este serviço deveria estar disponível em todas as delegacias especializadas para grupos vulneráveis. Esta assegura que o acompanhamento da equipe psicossocial é: Muito importante, deveria em todas as delegacias especializadas deveria ter este tipo de atendimento até porque é esta equipe multidisciplinar ajuda na investigação é elas vão ao local elas vão ao endereço das vítimas elas apuram realmente, a equipe de agente de policia judiciário investigam o crime esta equipe multidisciplinar investigam o fato social né? A vida, como é a vizinhança, quem conhece, como é esta pessoa, como é que é o agressor como que se porta então essa parte é feita pela equipe multidisciplinar né? Quem tem, quem tem competência pra isso quem estudou pra isso a equipe de polícia judiciaria investiga o crime esta equipe multidisciplinar a psicóloga vai atuar nessa esfera o psicológico as vezes chama que a vítima vai precisar de um acompanhamento a vítima ou o agressor ou uma testemunha ou alguém pra que... e a psicóloga de a impressão dela naquele testemunho ou naquela oitiva , olhe a pessoa estava assim, e a equipe de assistentes sociais e de estagiários é fazem esta investigação social né? O lado social daquele conflito, importantíssimo (FERNANDES, S.L.S., Delegada de Polícia, 21 de agosto de 2013). De maneira prática, a assistente social da DAGV informou que seu trabalho profissional dentro da dinâmica institucional o qual se encontra inserida frente aos casos de homofobia, parte desde a averiguação dos fatos, às providências necessárias que devem ser tomadas, sejam estas emergenciais ou comuns, de acordo com a realidade de cada caso, como os encaminhamentos e acompanhamentos que estes exigem. A mesma relata que o agir profissional acontece com: Averiguações mesmo, averiguações da veracidade, mediação, e providências, essas providências vão ser de acordo com as necessidades, as providências cabíveis para cada caso, as cabíveis se precisar ir pra delegacia agente encaminha, se precisar ir pro hospital agente encaminha tá entendendo? Como foi o caso do rapaz aqui que chegou com uma facada, outro chegou com uma paulada nas costas, estava enxado, outro chegou com uma pedrada na cabeça, então ali não cabe no momento agente fazer entrevista, não, tomar as providências, chamar a SAMU, encaminhar pra o hospital, isso depende de cada caso (SOUZA, E.L.C., Assistente Social, 15 de agosto de 2013). De acordo com o exposto, é importante destacar que a inserção do Serviço Social como profissão, frente aos casos de homofobia, busca, além de viabilizar direitos a esta categoria social, proteger o sujeito de posteriores agressões e prevenir diversas formas de violências homofóbicas, em um serviço de prevenção e combate constante a este tipo de violência. De acordo com Silva Júnior (2012), no que tange às cidadãs e aos cidadãos LGBT, que distanciam das concepções de papéis e performances de gênero/ sexualidade/orientação sexual, estabelecidos como “convencionais”, “normais”, “saudáveis” ou “unicamente aceitáveis” para determinado sexo, em nosso país paira uma insegurança pública enorme, uma vez que estes sujeitos tidos como de segunda ou de categoria inferior pelos seus modos de viver, representam como se uma “ameaça” à suposta ordem social estabelecida. Desta forma enquanto o sistema Judiciário, de Segurança Pública e o Estado brasileiro não estiverem devidamente capacitados (o seu quadro de pessoal) para compreenderem as diversas e flutuantes nuances de gêneros e de sexualidades, presente na vida de milhares de brasileiros/as esses (as), permaneceram com a sensação de não inserção no espectro de proteção estatal da ordem, sentindo-se a ausência do direito fundamental de viver condignamente, permanecendo sendo vítimas do preconceito e da discriminação. CONSIDERAÇÕES FINAIS O Brasil ainda se configura como um dos países campeões em assassinatos de homossexuais, em que, mesmo com o surgimento dos movimentos LGBT que lutam pela eliminação de todas as formas de preconceitos e/ou discriminações, ainda não são suficientes para inibir o grande quantitativo de crimes homofóbicos que acontecem no país, demonstrando que esta luta precisa ser de todos e não apenas de uma minoria vulnerável a estas violências. O Serviço Social, como profissão inserida neste contexto, possui o papel de trabalhar com a família dos homossexuais na busca pela aceitação da diversidade sexual dos sujeitos, atuar na viabilização da garantia de direitos sociais dos homossexuais e com a conscientização dos autores de violência homofóbica sobre a necessidade de respeito mútuo. Nessa direção, o acompanhamento psicossocial das vítimas e dos autores de violência nos casos de homofobia, ajudaria a sociedade e principalmente as famílias de pessoas homossexuais a entenderem melhor esta identidade sexual e/ou de gênero, contribuindo com a desconstrução das práticas homofóbicas. Contudo, a atuação da equipe psicossocial da DAGV, especificamente do Serviço Social como profissão ainda se encontra bastante limitada e fragmentada, sendo possível pontuar algumas situações que comprovem claramente esta afirmação, como por exemplo: a restritiva equipe de profissionais, (no decorrer da pesquisa constavam apenas 03 assistentes sociais para atender em um órgão plantonista), sem contar com a ausência destes profissionais nas DAGV nos quatro outros municípios do Estado de Sergipe que contam com esse órgão e na DHPP. A ausência de atendimento ou de oferta deste serviço a todas as vítimas entrevistadas é mais uma forma de detectar como este atendimento ainda está sendo ofertado de forma precária e limitada. Outro ponto a ser ressaltado é justamente as condicionalidades para a oferta do acompanhamento psicossocial para com as vítimas e os autores de agressões de LGBT, há certa contradição ao julgarmos, necessário, “muito importante” e fundamental no processo de investigação social e ao mesmo tempo condicioná-los a pedidos prévios das vítimas, (sem citar- o autor de violência, tido aqui como sujeito que não demanda este tipo de serviço), ou do/a delegado/a responsável pelo caso. Entende-se que o papel do Serviço Social vai além das suas contribuições no processo de investigação social, suas capacidades técnicas e interventivas buscam viabilizar a garantia de direitos e ao mesmo tempo trabalhar com vítimas e autores de violências de forma a desconstruir estes papéis e desenvolver novas posturas e condutas. A subordinação profissional do Serviço Social baseada apenas no que tange a contribuição de informações sociais referentes à resolutividade do conflito não atinge com êxito ao que possuímos como competências teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativas. Faz-se necessário trabalhar autores e vítimas de violência em uma perspectiva de transformação social e respeito pelas diferenças. REFERÊNCIAS5 BORRILLO, D. A homofobia. In: LIONÇO; DINIZ, D (Orgs.). Homofobia & Educação: um desafio ao silêncio. Brasília: LetrasLivres: EdUnB, 2009, p.15-46. BORRILLO, D. HOMOFOBIA: História e Crítica de Um Preconceito. Belo Horizonte. Autêntica ed. 2010. 5 De acordo com Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 6023. CFESS/Conselho Federal de Serviço Social. Campanha pela Liberdade de Orientação Sexual: O Amor Fala Todas as Línguas. Disponível em: <http://www.cfess.org.br/noticias_res.php?id=688>. Acesso em: 08 de out. 2013. _____________. 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