Tribunal de Justiça de Minas Gerais Número do 1.0342.08.111431-2/001 Relator: Des.(a) Afrânio Vilela Relator do Acordão: Des.(a) Afrânio Vilela Númeração 1114312- Data do Julgamento: 26/08/2014 Data da Publicação: 09/09/2014 EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL- DIREITO ADMINISTRATIVO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA -TRANSPORTE COLETIVO MUNICIPAL - LICITAÇÃO NULIDADE- OCORRÊNCIA DE ILEGALIDADES- COMPROVAÇÃOSENTENÇA REFORMADA. Quando se fala em licitação pública, deve-se ter em mente a necessidade de formalização de um edital que obrigatoriamente observe os pré-requisitos estabelecidos no art. 40, incisos e parágrafos, da Lei 8.666/93, sob pena de nulidade. Ficando devidamente comprovada a ocorrência de ilegalidades, deve ser anulado o processo licitatório, por ter havido flagrante violação ao princípio da legalidade estrita,cuja observância constitui obrigação da Administração Pública. APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0342.08.111431-2/001 - COMARCA DE ITUIUTABA - APELANTE(S): MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS APELADO(A)(S): MUNICÍPIO ITUIUTABA - LITISCONSORTE: PARANAÍBA TRANSPORTE LTDA ACÓRDÃO Vistos etc., acorda, em Turma, a 2ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, EM DAR PROVIMENTO AO RECURSO. DES. AFRÂNIO VILELA RELATOR. 1 Tribunal de Justiça de Minas Gerais DES. AFRÂNIO VILELA (RELATOR) VOTO Em exame, apelação cível aviada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MINAS GERAIS contra a r. sentença de f. 830/834, que nos autos da AÇÃO CIVIL PÚBLICA ajuizada em face do MUNICÍPIO DE ITUIUTABA E PARANAÍBA TRANSPORTES LTDA, julgou improcedente o pedido inicial, nos termos do art.269, I do CPC. Deixou de condenar o autor, ora apelante ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, por entender serem incabíveis na espécie. Nas razões recursais de f.837/86, aduz o apelante, em síntese, que não foram formulados pedidos de improbidade administrativa, razão pela qual estava dispensado de demonstrar a má-fé do agente. Afirma que existiram várias ilegalidades no procedimento licitatório como inobservância da devida publicidade, bem como do prazo previsto no art.21, § 2º, I, b da Lei 8.666/91, nulidade dos atos de adiamento do certame e ausência de vinculação ao edital. Sustenta que não houve concorrência que permitisse a escolha da proposta mais vantajosa para a comunidade, sendo ilegais e abusivos os atos impugnados. Requer a reforma da sentença. Contrarrazões às f. 876/881. Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do 2 Tribunal de Justiça de Minas Gerais recurso. Cinge a controvérsia em verificar se existiram ilegalidades no Procedimento Licitatório nº 69/2006, instaurado com a finalidade de conceder o serviço público de transporte coletivo urbano no Município de Ituiutaba, que justifiquem a declaração de sua nulidade e a realização de nova licitação. A Ação Civil Pública tem por finalidade anular ato administrativo prejudicial ao erário, ou à moralidade da Administração Pública, impondo ao seu agente a responsabilidade dentre outras, de ressarcimento, porque ímproba a ação. Nesse norte, o pressuposto essencial da ação civil pública é a existência de ato ilegal e lesivo ao patrimônio público, ou à moralidade da Administração. Por sua vez, a licitação é um procedimento administrativo vinculado que antecede a formalização de contratos realizados pelos entes públicos da administração direta e indireta e tem por escopo a seleção, dentre os interessados, daquele que oferece a melhor proposta, considerando as peculiaridades de cada caso. Segundo o art. 37, XXI, da Constituição Federal é obrigatória a realização do procedimento licitatório para União, Estados, Municípios, Distrito Federal e para as entidades da Administração Indireta, salvo nos casos especificados na legislação, que seriam as hipóteses de inexigibilidade e dispensa expressamente previstas na Lei 8.666/93. "XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, 3 Tribunal de Justiça de Minas Gerais serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações." Ora, a discussão nos autos é se houve nulidade do procedimento licitatório que culminou na contratação da PARANAÍBA TRANSPORTE LTDA para prestar serviços públicos de transporte coletivo urbano na cidade de Ituiutaba/MG pelo prazo de dez anos, podendo ser prorrogável por mais cinco, conforme consta da cláusula 6.1. Infere-se dos autos que nas publicações dos avisos de licitação, f.55/59 constou que o procedimento se desenvolveria sob a modalidade tomada de preços, tipo menor preço global. Todavia, se desenvolveu na modalidade Concorrência, do tipo melhor técnica com preço fixado, não tendo sido dada a devida publicidade aos eventuais interessados. É sabido que a publicidade é um dos pressupostos de validade do certame para que os interessados concorram em igualdade de condições, sem a qual não será possível obter a melhor proposta. A Lei n. 8.666, de 21 de junho de 1993, foi promulgada para regulamentar o art. 37, inciso XXI, da Constituição da República, e reza que: 4 Tribunal de Justiça de Minas Gerais "Ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações." Por outro lado, no que tange a afirmação de que não fora observado o prazo de 45 dias previsto no art.21, §2º, I, b para procedimentos licitatórios realizados na modalidade concorrência melhor técnica ou técnica e preço, já que entre a publicação e abertura dos envelopes transcorreu apenas 30 dias. No presente caso, não foram atendidos os princípios e requisitos previstos na Lei 8.666/93, especificamente, os ditames dos artigos 3º e 21 da Lei 8.666/93, que estabelecem, in verbis: "Art. 3º A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável e será processada e julgada em estrita conformidade com os princípios básicos da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da igualdade, da publicidade, da probidade administrativa, da vinculação ao instrumento convocatório, do julgamento objetivo e dos que lhes são correlatos." 5 Tribunal de Justiça de Minas Gerais (...) "Art. 21. Os avisos contendo os resumos dos editais das concorrências, das tomadas de preços, dos concursos e dos leilões, embora realizados no local da repartição interessada, deverão ser publicados com antecedência, no mínimo, por uma vez: (grifei). I - no Diário Oficial da União, quando se tratar de licitação feita por órgão ou entidade da Administração Pública Federal e, ainda, quando se tratar de obras financiadas parcial ou totalmente com recursos federais ou garantidas por instituições federais; II - no Diário Oficial do Estado, ou do Distrito Federal quando se tratar, respectivamente, de licitação feita por órgão ou entidade da Administração Pública Estadual ou Municipal, ou do Distrito Federal; III - em jornal diário de grande circulação no Estado e também, se houver, em jornal de circulação no Município ou na região onde será realizada a obra, prestado o serviço, fornecido, alienado ou alugado o bem, podendo ainda a Administração, conforme o vulto da licitação, utilizar-se de outros meios de divulgação para ampliar a área de competição. § 1º O aviso publicado conterá a indicação do local em que os interessados poderão ler e obter o texto integral do edital e todas as informações sobre a licitação. § 2º O prazo mínimo até o recebimento das propostas ou da realização do evento será: I - quarenta e cinco dias para: a) concurso; 6 Tribunal de Justiça de Minas Gerais b) concorrência, quando o contrato a ser celebrado contemplar o regime de empreitada integral ou quando a licitação for do tipo "melhor técnica" ou "técnica e preço"; Na espécie, ao que infere houve publicação do processo licitatório em 06/06/2006 tendo ocorrido três publicações posteriores para correção, a última foi feita em 27/11/2006. Contudo, dispondo a lei o prazo mínimo de 45 dias para recebimento das propostas ou realização do evento, e sendo certo que entre a última publicação e a abertura dos envelopes, fica evidente que a previsão para apresentação das propostas para o dia 27/12/2006, não atende o prazo de 45 (quarenta e cinco dias previsto no item I, § 2º, do artigo 21 da Lei 8.666/93. Por outro lado razão assiste ao apelante quando afirma que o falso motivo vicia o ato, uma vez que não houve alteração do projeto básico que serviu de fundamento para que ocorressem os adiamentos das datas da visita técnica e da abertura dos envelopes, conforme prevê o art.2º da Lei 4717/65, in verbis: Art. 2º São nulos os atos lesivos ao patrimônio das entidades mencionadas no artigo anterior, nos casos de: a) incompetência; 7 Tribunal de Justiça de Minas Gerais b) vício de forma; c) ilegalidade do objeto; d) inexistência dos motivos; e) desvio de finalidade. Ademais, ao se falar em licitação pública, haverá sempre necessidade de formalização do edital que obrigatoriamente observe os pré-requisitos estabelecidos no art. 40, incisos e parágrafos, da Lei 8.666/93. Ocorre que, em análise ao caso concreto, de fato, o certame realizado pelo requerido, ora apelado, se apresenta inquinado de vícios insanáveis, ensejadores de legitimar a decretação de sua nulidade. As regras deverão ser fielmente observadas, nos termos do art.41 da Lei 8.666/91, portanto o Presidente da Comissão Permanente ao suprimir exigências contidas no edital- como a obrigatoriedade de adaptação de 20% da frota de ônibus para que fosse dado acesso aos portadores de necessidades especiais, bem como a exclusão da taxa de 3,5% do faturamento que tinha por finalidade financiar o poder de polícia municipalnão observou a regra contida no art. 21,§ 4º da Lei 8666/91 que prevê que qualquer modificação no edital exige divulgação pela mesma forma que se deu o texto original, reabrindo-se o prazo inicialmente estabelecido, já que as referidas alterações afetaram a formulação das propostas. 8 Tribunal de Justiça de Minas Gerais Logo, pode afirmar que houve violação ao princípio da legalidade estrita que deve ser obrigatoriamente observado pela Administração Pública. E, tal fato, isoladamente, já se mostraria suficiente a reconhecer a nulidade absoluta do edital. Destarte, é vedado à Administração Pública inserir cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o caráter competitivo dos atos de convocação, segundo preceitua art.3º, I da Lei 8.666/91. Razão pela qual não são válidas as cláusulas 9.3.2.1 e 9.3.4.1 por restringirem indevidamente a competitividade do procedimento licitatório, fazendo com que apenas a empresa vencedora pudesse concorrer. Sendo assim, declaro nula a licitação adjudicada à apelada, bem como o contrato administrativo e os respectivos atos decorrentes. Isso posto, DOU PROVIMENTO AO RECURSO para reformar a sentença e declarar nulo o processo licitatório 69/2006 da Prefeitura de Ituitaba/MG e, consequentemente, anular o respectivo contrato de concessão nº 30/2007 firmado com a empresa Paranaíba Transportes, condenando o apelado em promover a abertura de novo processo licitatório para contratação dos serviços públicos de transportes, o qual deverá ser realizado dentro do prazo de 120 dias a partir do trânsito em julgado desta decisão. Custas, ex lege. 9 Tribunal de Justiça de Minas Gerais DES. MARCELO RODRIGUES (REVISOR) - De acordo com o(a) Relator(a). DES. RAIMUNDO MESSIAS JÚNIOR - De acordo com o(a) Relator(a). SÚMULA: "DERAM PROVIMENTO AO RECURSO." 10