A INTERAÇÃO UNIVERSIDADE E ENSINO MÉDIO: O PROGRAMA DE INICIAÇÃO CIENTÍFICA JÚNIOR NO MUSEU NACIONAL/UFRJ Maria José Veloso da Costa Santos1 Célia Maria Gomes Maia2 1 Mestre em Ciência da Informação, UFRJ, Rio de Janeiro, RJ 2 Especialista em Ciência da Informação, UFRJ, Rio de Janeiro, RJ RESUMO: O Museu Nacional, unidade da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) por meio do Programa de Iniciação Científica Júnior (PIC Jr) em convênio com o Colégio Pedro II, abre espaço em seus departamentos e serviços para treinamento de alunos do ensino médio com o objetivo de interagir profissionais da instituição e jovens adolescentes em fase de buscar uma definição de carreira. Um dos serviços que servem de laboratório é a Seção de Memória e Arquivo (SEMEAR) do Museu que se destaca com sua contribuição para a educação continuada, parte das atividades de extensão universitária. Aí é realizado o treinamento de alunos estagiários do Colégio Pedro II em áreas diversas como: conservação preventiva, recuperação, transmissão e uso da informação e informatização de catálogos. Palavras-chave: Educação permanente; Extensão universitária. ABSTRACT: The National Museum, part of Rio de Janeiro Federal University (UFRJ), established an agreement with Pedro II high school, as part of The Junior Scientific Iniciation Program (PICJr), conducted by the same University, with the objective of opening its departments and services to high school students that are searching a career to follow. The National Museum, throughout its Memory and Archive sector (SEMEAR), offers a very important contribution in terms of continuing education. It provides student training in different areas as conservation and preservation, information retrieval, information transmission, information use and catalog automation. Keywords: Continuing education; University extension. 1 INTRODUÇÃO “A Interação Universidade e Ensino Médio” consiste em um relato de experiência sobre o trabalho desenvolvido na Seção de Memória e Arquivo (SEMEAR) do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) que mostra como unidades de informação podem contribuir com a extensão universitária praticada na Universidade. Muitos autores abordam o tema sobre o papel social das universidades com seus projetos de extensão e sua colaboração para com a sociedade em geral por meio de atividades que promovam a inclusão social, digital, racial etc. O Programa de Iniciação Científica Júnior (PIC-Jr) serve como exemplo de um novo modelo educacional por ser um convênio do Colégio Pedro II (CPII) com instituições de ensino e/ou pesquisa que têm o propósito de implementar e formar cidadãos a partir do ensino médio. Os alunos saem do seu cotidiano ambiente escolar, entram no ambiente institucional, no caso desse relato, o Museu Nacional/UFRJ, com seus laboratórios científicos e serviços técnicos, entre eles a Seção de Memória e Arquivo (SEMEAR) que, por meio de estágios orientados, levam os alunos a práticas especializadas. O trabalho ora apresentado consiste em divulgar o Programa de Iniciação Científica Júnior (PIC-Jr) como atividade de extensão no Museu Nacional/UFRJ; apresentar as atividades desenvolvidas pelos alunos envolvidos no Programa na SEMEAR e propiciar a educação continuada pelo desenvolvimento de atividades profissionais, contribuindo, assim, para a estratégia ensino-aplicação (prática) e na escolha de possíveis carreiras. 2 BREVE HISTÓRICO DAS INSTITUIÇÕES ENVOLVIDAS O Museu Nacional criado por D. João VI em 6 de junho de 1818, tem a finalidade de coligir, classificar e conservar material de interesse ao estudo das ciências naturais e antropológicas, organizando coleções e exposições públicas (Cunha, 1966). As exposições públicas do Museu foram abertas em 1821 e funcionam como instrumento de educação da sociedade. Essa atividade é de importância estratégica fundamental porque integra o indivíduo à sociedade e une o caráter científico ao pedagógico, difundindo e popularizando a ciência (SANTOS; NINITA, 2005). A partir de 1946, O Museu Nacional foi incorporado à Universidade do Brasil, hoje, Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É uma das mais antigas instituições científicas brasileiras e seu acervo científico é considerado um dos maiores e mais significativos na América do Sul. Sua função acadêmica é exercida por seus seis departamentos científicos, (Antropologia, Botânica, Entomologia, Geologia/Paleontologia, Invertebrados e Vertebrados) e pelas Coordenações dos Programas de pós-graduação stritcto sensu (mestrado e doutorado) em Antropologia Social, Botânica e Zoologia e lato sensu na área de Lingüística e de Geologia. A Seção de Memória e Arquivo (SEMEAR) do Museu Nacional/UFRJ é uma unidade de informação ligada ao Sistema de Bibliotecas e Informação da UFRJ (SIBI/UFRJ), sendo conceituada como arquivo histórico por ser responsável pela custódia de documentos que retratam o cotidiano do Museu Nacional, desde sua criação em 1818, no contexto político, econômico e social, bem como revelam as suas relações com outras instituições congêneres em nível nacional e internacional. São documentos que registram os primórdios do trabalho científico no Brasil e as alterações que se processaram no cenário internacional das ciências, além do trabalho de cientistas de renome, portanto, de valor histórico inestimável não só para o resgate da memória da instituição e do Palácio Imperial que a abriga, como também, para o resgate da história das ciências no Brasil, que têm, no Museu Nacional, o embrião das raízes científicas nacionais (SANTOS; NINITA, 2005) A SEMEAR é responsável pela atividade de conservação e preservação desses documentos bem como pelo tratamento técnico visando à recuperação e uso da informação para o resgate e preservação da memória da Instituição, parte da memória científica da UFRJ e do Brasil. Esse acervo está estimado em cerca de 500 metros de documentos textuais e aproximadamente 15.000 documentos iconográficos, que vêm sendo processados tecnicamente de modo a recuperar as informações neles contidas. O Colégio Pedro II (CPII), fundado em 2 de dezembro de 1837, é uma instituição federal de ensino fundamental e médio, considerada a mais tradicional da cidade do Rio de Janeiro. Atualmente funciona com doze unidades escolares que estão distribuídas tanto pelos bairros do Rio de Janeiro, como nos municípios de Niterói e Duque de Caxias. Com o lema “educar para a cidadania”, o CPII, por meio de um projeto político-pedagógico com a participação de toda a comunidade escolar, educa crianças e adolescentes, tornando-os capazes de responder às transformações técnicas, culturais, emocionais e sociais do mundo de hoje (CPII, 2010). O CPII, conforme já relatado na introdução, faz a seleção de alunos cursando o segundo ano do ensino médio para realizarem estágios profissionais em instituições de ensino e/ou pesquisa por meio do estabelecimento de convênios. Esse estágio, no Museu Nacional/UFRJ, é desenvolvido em duas modalidades: a) Estágio Científico - compreendendo as áreas dos departamentos científicos do Museu Nacional: Antropologia, Botânica, Geologia, Paleontologia e Zoologia (Vertebrados e Invertebrados) e b) Estágio Profissional - compreende as áreas técnicas do Museu Nacional que podem ser: Biblioteconomia, Arquivologia, Conservação e Preservação, Museologia, Informática, Assistência ao Ensino etc. Dentre essas modalidades, para os objetivos desse trabalho, destaca-se o estágio técnico de alunos na Seção de Memória e Arquivo (SEMEAR) do Museu Nacional/UFRJ que, ao lado da Biblioteca do Museu Nacional e do Centro de Documentação de Línguas Indígenas Brasileiras (CELIN), são unidades de informação do Museu Nacional que recebem alunos para estágio profissional em Biblioteconomia, Arquivologia, Conservação e Preservação de documentos. A duração do estágio é de quatro horas semanais. Os alunos chegam inexperientes e em pouco tempo de atuação adquirem, com os saberes e as práticas oferecidas, experiências não só para definir suas escolhas profissionais, como também exercitar e aprender princípios éticos de convivência profissional, ensinamentos que irão permear toda a sua vida profissional futura. O PIC-Jr apresenta como objetivos: • Propiciar educação continuada pelo desenvolvimento dos alunos do ensino médio em atividades profissionais; • Despertar e possibilitar aos estudantes o desenvolvimento e o interesse pela pesquisa técnica e científica; • Permitir a vivência teórica-prática dos estudantes em laboratórios/serviços; • Oferecer oportunidade em desenvolver novas experiências no processo ensino aprendizagem; • Contribuir para que os estudantes se orientem para futuras escolhas profissionais; e, • Promover a familiarização de alunos do ensino médio com as características das carreiras de técnicos de nível superior e de pesquisadores. O PIC-JR começa desde o primeiro ano do Ensino Médio quando os alunos se inscrevem, mas só a partir do segundo ano eles efetivamente ingressam no Museu Nacional em duas modalidades de estágio: Estágio inicial – alunos do segundo ano que se inscreveram e foram selecionados pelo CPII, levando em conta o seu desempenho escolar; Estágio avançado – oferecido aos alunos do último ano do ensino médio que têm interesse em continuar no estágio. 3 ESCOLHA PROFISSIONAL Segundo Soares (2002), a profissão é parte integrante da vida das pessoas e geralmente, em nossa sociedade, a escolha deve ser feita na juventude no momento em que se encerra o ensino médio e se busca o ensino universitário. A conseqüência dessa escolha apresenta inúmeras implicações sociais. Na visão de Boholavsky, citado por Soares (2002), a identidade profissional mostra o produto da ação de determinado contexto social sobre a identidade vocacional do aluno. A legislação federal para educação no Brasil estabelece, entre outras coisas, “... a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática de cada disciplina” e “... a formação do aluno deve ter como alvo principal a aquisição de conhecimentos básicos, a preparação científica e a capacidade de utilizar as diferentes tecnologias relativas às áreas de atuação”, (Brasil. Leis, etc., 1996). Com base nessa legislação, o Colégio Pedro II em parceria desde o ano de 2000,com o Museu Nacional/UFRJ, implementaram o PIC-Jr para treinar alunos cursando a partir da 2ª série do ensino médio, selecionados sob critérios do próprio Colégio de forma a atuarem como estagiários sem remuneração, nos laboratórios, seções e serviços do Museu Nacional, onde seus profissionais funcionam como orientadores e facilitadores na escolha profissional desses alunos. 4 MATERIAL E MÉTODO Na SEMEAR o PIC-Jr se desenvolve basicamente em 3 (três) etapas distintas: Primeira etapa – Conhecimento da história do Museu Nacional por meio de leituras realizadas de modo a contextualizar o ambiente onde as atividades serão desenvolvidas e palestras sobre o funcionamento da Seção; Segunda etapa – Treinamento dos estagiários a respeito de conservação preventiva, e de descrição de documentos arquivísticos assim como sobre a alimentação de base de dados; Terceira etapa – Desenvolvimento das atividades em fundos arquivísticos distintos, de acordo com plano de trabalho pré-estabelecido. A abordagem metodológica do presente trabalho é a pesquisa-ação porque combina resultados práticos da resolução de um problema a resultados testados no mundo real. Assim, a metodologia foi composta de duas etapas: 1ª Etapa – Coleta de dados – constou de levantamento nos arquivos do PIC-Jr no CPII e nos arquivos da SEMEAR sobre o número de alunos atendidos pelo Projeto no Museu Nacional/UFRJ e na SEMEAR respectivamente, no período de 2000-2010 bem como, sobre a modalidade de estágio oferecido (inicial ou avançado); 2ª Etapa – Consolidação e Análise dos dados – os dados foram computados e consolidados em quadros que geraram gráficos e, a partir daí, foi realizada a análise dos resultados que constam da sessão a seguir. Cabe enfatizar que, foi primeiramente realizada uma análise quantitativa, para num segundo momento, ser realizado o levantamento de dados qualitativos por meio de entrevistas com os alunos sobre o papel do estágio na escolha de suas carreiras. 5 RESULTADOS Os resultados foram analisados a partir dos quadros gerados pela coleta de dados quantitativos. O quadro 1, a seguir, mostra o número de estagiários nas duas modalidades, em todos os departamentos, serviços e seções do Museu Nacional/ UFRJ desde o início do projeto, com ingresso dos alunos no ano 2000. Quadro 1 Estágios no Museu Nacional 2000-2010 ANOS 2002 2003 2004 2005 2006 2007 ESTAGIOS 2000 Inicial Avançado TOTAL 2001 TOTAL 2008 2009 14 48 30 46 31 53 41 51 52 48 --14 9 57 6 36 7 53 11 42 17 70 12 53 16 67 22 74 11 59 2010 65 22 87 479 133 612 Observa-se que no Museu Nacional no período de 2000 a 2010 havia 479 alunos do CPII selecionados para começar no módulo inicial e 133 alunos no módulo avançado, o que significa que 27,8% dos alunos optaram para continuar no estágio avançado. O gráfico 1, a seguir, ilustra o número de estagiários selecionados nas duas modalidades, em todos os departamentos, serviços e seções do Museu Nacional/ UFRJ desde o início do projeto em 2000. Gráfico 1 ESTÁGIOS 479 600 133 400 200 0 1 Inicial Avançado O quadro 2, a seguir, evidencia o número de estagiários nas duas modalidades, exclusivos SEMEAR no período de 2000-2010. Quadro 2 Estágios na SEMEAR 2010 ESTAGIOS 2000 Inicial Avançado TOTAL 2001 2002 2003 2004 ANOS 2005 TOTAL 2006 2007 2008 2009 1 1 3 5 3 4 4 4 6 5 --1 -1 -3 1 6 1 4 1 5 1 5 1 5 -6 1 6 2010 5 3 8 42 9 51 Em que pese à limitação do número de estagiários imposta pela falta de espaço na SEMEAR, verifica-se que, com o passar dos anos, o número de estágiários foi aumentando e que 21,4% dos alunos que completaram o estágio inicial optaram por continuar no avançado. Cabe enfatizar que três (3) alunos que concluíram o ensino médio voltaram para estagiar na SEMEAR como estagiários universitários, bolsistas de extensão da PróReitoria de Extensão (PR-5) da UFRJ (bolsa PIBEX), fato este que vem ocorrendo com frequência em outros setores do museu. Pode-se constatar o resultado positivo desse Programa na SEMEAR do Museu Nacional/UFRJ, pela apresentação de trabalhos desses alunos em eventos: um (1) trabalho apresentado na Jornada de Iniciação à Pesquisa do Colégio Pedro II em 2006 e quatro (4) trabalhos apresentados nas edições de 2006, 2007 e 2008, respectivamente, da Jornada Giulio Massarani de Iniciação Científica, Artística e Cultural da UFRJ, além de dois trabalhos apresentados em congresso específicos da profissão de bibliotecários, tais como XIV Seminário Nacional de Bibliotecas Universitárias em 2006, em Natal (RN) e XXII Congresso Brasileiro de Biblioteconomia, Documentação e Ciência da Informação, edição 2007 em Brasília (DF), conforme pode ser observado nos anais e livros de resumos desses eventos. 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS A implementação do PIC-Jr pela SEMEAR possibilita o entendimento sobre as atividades em unidades de informação como bibliotecas e arquivo histórico, colaborando nas escolhas profissionais dos alunos, ao mesmo tempo em que desenvolve noções de cooperativismo e ética profissional a partir do convívio não só com os profissionais, bolsistas de graduação e auxiliares da Seção, como também com pesquisadores usuários e os próprios colegas, noções que irão acompanhar o aluno em toda a sua vida profissional e em quaisquer carreiras que venham a escolher. Com isso, pode-se afirmar que a extensão universitária em unidades de informação pode ir muito além do que as atividades tradicionalmente realizadas em bibliotecas, arquivos ou centros de documentação/informação porque auxilia na promoção da interação universidade e comunidade, formando cidadãos mais capazes para enfrentar a vida profissional. Entende-se que o PIC-Jr, convênio entre o Colégio Pedro II e o Museu Nacional/UFRJ poderá servir de novo modelo de extensão universitária. REFERÊNCIAS BRASIL. Leis, etc. Lei de Diretrizes e Bases da Educação 9.394/96, seção IV art.35, al. II e IV, 1996. Disponível em: www.mec.br. Acesso em: maio 2008. BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Bases legais dos parâmetros curriculares nacionais para o ensino médio: 1998. Disponível em: www..mec.br. Acesso em: maio 2008. COLÉGIO PEDRO II. Disponível em: http://www.cp2.g12.br/#. Acesso: setembro, 2010. CUNHA, Dulce. História da Biblioteca do Museu Nacional. Rio de Janeiro : Museu Nacional, 1966. 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