CAPÍTULO 1 O QUE PRECISAMOS DE APRENDER E mbora às vezes nos angustiemos, a realidade é que ainda estamos a tempo de nos conhecermos melhor, de nos relacionarmos melhor, de nos organizarmos melhor… mas, sobretudo, estamos a tempo de ser donos dos nossos sentimentos, das nossas emoções, do que fazemos, do que decidimos não fazer, ou seja, ainda estamos a tempo de desenvolver as ferramentas que nos permitirão ser nós próprios e governar a nossa vida. Sei que pode parecer uma espécie de anúncio publicitário, algo como: «Não se preocupe, não importa o quanto é infeliz, siga o nosso método e garantimos-lhe que os seus problemas desaparecerão.» Lamento a comparação, mas entendo-a porque estamos imersos num sistema de vida onde tudo parece passível de ser comprado, inclusive a própria felicidade. Mas... até quando estamos a tempo? Existe um momento ou uma idade limite? Quando será considerado demasiado tarde? A resposta é sempre e nunca. Estamos sempre a tempo e nunca é tarde para começarmos a ser donos da nossa vida. Indubitavelmente vale a pena começar a caminhar nesta direcção, mas já que deixámos passar alguns anos até deitar «mãos à obra», vamos tentar ordenar o que precisamos de aprender. Uma vez que decidimos aprender realmente a viver, por onde começaríamos? Talvez algumas pessoas hesitem na hora de determinar quais as prioridades da nossa aprendizagem, mas se as analisarmos de forma objectiva, a resposta é bastante evidente: temos de começar por nos conhecer bem a nós próprios, o que, por outro lado, não é tão complicado como pode parecer à primeira vista. Não faz falta uma vida inteira para nos conhecermos, o que necessitamos é de um método que nos ajude, de modo a não dispersarmos os nossos esforços. Seguidamente, é importante, uma vez que já nos conhecemos, que aprendamos a relacionar-nos melhor, e isto, sim, pode afigurar-se mais complexo, mas trabalhá-lo-emos a fundo nos próximos capítulos. Ser-nos-á de grande utilidade aprender a controlar-nos, a conservar a calma nos momentos de tensão, quando a ansiedade parece estalar, ou o stresse, a raiva, a tristeza, a apatia, o desespero, a fim de comunicarmos melhor e sentirmo-nos bem connosco. Por fim, tudo o que referi anteriormente ficaria incompleto se não puséssemos as nossas aptidões ao nosso serviço, ou seja, se não as utilizássemos para tentar atingir as nossas metas e alcançar a esperança e os projectos que nos motivam. Começaremos pelo princípio: o autoconhecimento é importante? Aprofundar o autoconhecimento para descobrir como somos realmente Há uns meses, alguém me disse que não tinha muito interesse em conhecer-se porque tinha a certeza de que, quanto mais se conhecesse, menos iria gostar. Certamente muitas pessoas podem pensar algo parecido; têm medo de se conhecer em profundidade porque acreditam que virão à tona as suas misérias e limitações, as suas próprias contradições. A verdade é que quando nos conhecemos, fazendo-o através de uma análise rigorosa, apercebemo-nos de que, ao contrário do que pensamos, somos pouco contraditórios; quase todas as nossas condutas têm explicações muito lógicas, ainda que à primeira vista não as encontremos. Todos tivemos as nossas próprias experiências e vivências e, sem termos muita consciência disso, fomos aprendendo a responder de forma muito programada às diferentes situações da nossa vida. Isso explica porque somos mais previsíveis do que na realidade pensamos; de facto, em muitas ocasiões, as pessoas mais próximas sabem de antemão como vamos reagir em cada momento. O paradoxo é que, quase sem darmos conta, aqueles que nos rodeiam podem chegar a conhecer-nos melhor do que nós próprios. Esta situação, em princípio simplesmente chocante, pode ser bastante perigosa. Na maior parte dos casos estamos a colocar nas mãos dos outros determinada informação sobre nós e, dessa forma, expomo-nos ao que algumas pessoas podem fazer desses conhecimentos. Os amigos certamente utilizá-los-ão para nos ajudarem, mas os que não tiverem uma relação de amizade connosco podem descobrir pontos fracos que, bem usados, permitir-lhes-ão manipular-nos. Somente quando aprendemos a conhecer-nos temos a possibilidade de começar a mudar o que não nos agrada. Conhecer-se para mudar? • Não, conhecer-se para ser mais livre e decidir então o que há a modificar. • Conhecer-se para aprofundar a sua vida, para aumentar o controlo sobre as emoções, as reacções, inclusive os sentimentos. • Conhecer-se para identificar-se mais, para conseguir ser a pessoa que realmente ambiciona. • Conhecer-se, em suma, para viver a própria singularidade, para sentir a autonomia e alcançar a liberdade. Não obstante, se persistimos em ordenar o que precisamos de aprender, certamente acharemos conveniente aprender a relacionar-nos, a comunicar de verdade. Aprender a dominar a comunicação e as relações pessoais Se não aprendermos a comunicar bem, é impossível que sejamos minimamente felizes. É paradoxal já que nascemos a saber comunicar e, à medida que vamos crescendo, cada vez nos tornamos mais desajeitados na comunicação. Referimos já que comunicar não é falar; às vezes a linguagem só consegue mesmo confundir, mais do que esclarecer ou transmitir. Comunicamos com todo o corpo, mas parece que só estamos atentos ao que dizemos com palavras. Sem pretendê-lo, como empobrecemos a comunicação! Muitas pessoas mal se atrevem a olhar de frente ou fazem-no de forma impertinente; não tocam nos outros ou tocam-nos de mais; gritam em vez de conversar; utilizam um tom monocórdico e aborrecido, sem enfatizar, ressaltar ou motivar… No final, não conseguem comunicar, mas frequentemente confundem a sua incapacidade de transmitir com a insatisfação que as respostas dos outros lhes produzem; não têm consciência de que se eles não comunicaram, dificilmente os outros podem responder ao que não entenderam. Famílias inteiras são exemplos permanentes de comunicações incorrectas, casais que se amam, pessoas que se agradam, amigos que tentam ajudar-se. Todos sentem as dificuldades de comunicação, a impotência perante essas barreiras que se erguem e acabam por separar e distanciar o que devia estar unido. Quantas vezes assistimos à nossa volta a discussões absurdas? Pessoas antagonizadas sem perceberem que querem dizer o mesmo, incapazes de se ouvirem e entenderem. Quando somos observadores, é mais simples detectar os erros cometidos pelos que nos ro- deiam, mas que incapacidade mostramos quando somos nós a agir, quando somos nós os actores! Por muito claras que tenhamos as ideias, por muito maduras que sejam as nossas decisões, por muita objectividade que alcancem os nossos argumentos, se não somos capazes de transmitir o que pensamos, o que sentimos, o que elaboramos, então não comunicamos. De nada nos servirão os processos prévios se fracassarmos na recta final. Podemos amar imensamente uma pessoa mas se não somos capazes de lho transmitir de forma clara e inequívoca, se não sabemos ouvir, observar e analisar objectivamente o que a outra pessoa nos quer comunicar, a relação fracassará, apesar de os sentimentos serem positivos, apesar da nossa firme determinação em seguir em frente aconteça o que acontecer, apesar de tudo isso não o conseguiremos! Da mesma forma, não nos sentiremos bem no trabalho ou na escola, ainda que os colegas nos valorizem e respeitem; se não soubermos interpretar as suas mensagens e transmitir adequadamente as nossas, fracassaremos de novo e confundir-nos-emos com argumentos absurdos e problemas que vêm da nossa cabeça, não do nosso coração. Qualquer relação importante na nossa vida poderá desmoronar-se se previamente não tivermos avançado nessa maravilhosa e difícil arte que é comunicar bem. É conveniente que aprendamos a comunicar, a relacionar-nos? Não é conveniente, é imprescindível e cometeríamos um erro imperdoável se não fôssemos capazes de atribuir ao assunto a importância que detém. Muitas pessoas concordarão com esta premissa, mas sentirão que não conseguem uma boa comunicação porque não atingem um requisito prévio: não se sabem controlar em determinadas circunstâncias. Vencer a apatia, a tristeza, o medo, a insegurança, a baixa auto-estima, o cansaço, a falta de esperança… Certamente, sermos capazes de autocontrolar-nos é o que marca a diferença entre o ser humano e as restantes espécies. Nascemos descontrolados e devemos aprender a controlar-nos ao longo da vida? A verdade é que, muitas vezes, parece que o processo se desenvolveu de forma inversa. Centremo-nos de novo nas primeiras idades. Imaginemos uma aula de crianças de três anos. Facilmente observaremos como cumprem as indicações da professora. Apesar da tenra idade, a maior parte delas é capaz de ouvir e obedecer quando a professora lhes explica algo ou lhes conta uma história. Têm três anos e, no entanto, seguem uma série de regras, padrões e normas de forma bastante razoável. Se pisam o risco, não demoram a voltar a respeitar esses limites definidos. Cada vez as lutas são menos frequentes entre elas, tentam argumentar o que pensam e, ainda que lhes custe, vão aprendendo a respeitar a vez dos outros. Além disso, são umas observadoras excelentes que, com frequência, dizem à professora tudo o que está a acontecer na sala de aula e inclusive, frequentemente para vergonha dos pais, tudo o que se passa em suas casas. Parece razoável pensar que as crianças com três anos vão aprender a controlar-se cada vez melhor; essa aprendizagem continua aos quatro, cinco, seis… sempre em ordem ascendente, cada vez custa menos mas… o que começa a ocorrer quando chega a pré-adolescência, a adolescência, os primeiros anos da juventude, inclusive etapas posteriores? De novo aqui a curva parece inverter-se e, de forma dramática, começamos a desaprender. O adolescente controla-se pior aos catorze anos do que quando tinha oito. Muitas pessoas com vinte, trinta, quarenta, cinquenta anos parecem ser escravas das suas próprias pulsões, dos seus impulsos, das emoções descontroladas e dos pensamentos cheios de subjectividade. Quantas vezes ouvimos «É uma pessoa estupenda mas tem um feitio tremendo, ou uns “repentes” que a perdem!» E quantas vezes sem ouvi-lo o estamos a pensar de muitos dos que nos rodeiam, inclusive de nós próprios. A diferença entre uma pessoa que triunfa na vida e uma que fracassa não reside tanto no seu potencial intelectual, mas na capacidade para controlar as próprias emoções e as das pessoas que as rodeiam. Quando observamos pessoas envelhecidas prematuramente, à margem de possíveis doenças físicas, em muitos casos o seu desgaste deve-se à falta de autocontrolo. São pessoas que vivem permanentemente em tensão, que sofrem de ansiedade por qualquer coisa, que se preocupam com tudo, que só parecem estar atentas ao negativo… De novo aqui temos inúmeros exemplos de famílias desfeitas, de casais desavindos, de amizades acabadas… pela falta de controlo de algum ou alguns dos seus elementos. Muitas pessoas prenderam-se a uma existência que não queriam, por não possuírem ou não terem possuído o autocontrolo suficiente em momentos-chave das suas vidas. Não é necessário recorrer a exemplos dramáticos de agressividade e mau trato, isso já é patológico; estou a referir-me a essa falta de controlo que nos pode amargar a existência. Há situações extremas, sem dúvida, mas mesmo nessas circunstâncias as reacções são muito diferentes e as pessoas viverão melhor ou pior em função do controlo que sejam capazes de exercer sobre as suas emoções. É útil saber controlar-se? De novo a resposta é: torna-se imprescindível se queremos ser donos das nossas vidas! Ensinaram-nos a controlar-nos? Com certeza que não. Em qualquer caso, ensinaram-nos a calar-nos ou aguentar, mas ainda estamos a tempo. Pouco a pouco iremos aprofundando os recursos, os mecanismos e as aptidões que nos permitirão alcançar o nível de controlo emocional que todos desejamos. Chegados a este ponto, a próxima pergunta seria: podemos ser donos da nossa vida? Ser donos da nossa vida Sem entrar em questões de ordem religiosa, a maior parte das pessoas sabe que pode e tem direito, quase obrigação, de ser dona da própria vida. O que significa governar a nossa vida? Precisaríamos de livros inteiros para responder a essa pergunta mas, de forma muito resumida, governar a nossa vida significa deixar de gastar energias reagindo sempre perante o que nos acontece, indo atrás dos acontecimentos, em vez de nos anteciparmos e caminharmos directamente para os nossos objectivos e metas. Governar a nossa vida é ser consciente das questões e problemas que podemos controlar directamente e daqueles sobre os quais podemos influir indirectamente. Governar a nossa vida é convencer-nos de que somos os donos das nossas emoções; que podemos utilizar sempre a imaginação e criatividade que possuímos; que podemos vencer os temores; que podemos aprender a viver pela positiva… Em suma, que podemos deixar de ser pessoas encurraladas para nos convertermos em pessoas que dirigem as próprias vidas. Como consegui-lo? Utilizando todos os recursos que nos fornece a inteligência emocional; desenvolvendo a capacidade de autoconhecimento, de conhecer os outros; de hetero e autoavaliação; de controlar as nossas emoções, preocupações; de empregar a comunicação como forma de proximidade e controlo sobre os acontecimentos…; em definitivo, passando de reactivos a proactivos, concentrando mais as nossas energias no modo como agimos do que gastando-as todas no modo como reagimos.