MODELAGEM NUMÉRICA DA IMPEDÂNCIA
ELÉTRICA DA PELE
A. Ramos, P. Bertemes-Filho
Grupo de Engenharia Biomédica / Departamento de Engenharia Elétrica
Universidade do Estado de Santa Catarina, Joinville, Brasil
e-mail: [email protected]
Abstract: This paper presents an approach for the
numerical calculation of the skin impedance by using
the equivalent circuit method (ECM). This method is
used for numerical modeling of electrical properties
of biological tissues. For tissues of large volumes, the
analysis is made in the frequency domain by using
experimental dielectric dispersion data or analytical
models for the dispersion in the tissue. The effects of
the finite volume of the sample and the distance
between electrodes were analyzed based on the
analytical model used in the four electrode method
for conductivity measurements. It is shown that
ECM applied to the impedance calculation of human
skin may result in errors lower than 1%.
Palavras-chave:
impedância
eletromagnética,
modelagem numérica, cálculo de campo, impedância
da pele.
Introdução
O método dos quatro eletrodos é uma importante
técnica experimental usada na determinação de
propriedades elétricas de amostras de materiais sólidos
[1]. Consiste em injetar uma corrente conhecida entre
dois eletrodos e medir a diferença de potencial entre
outros dois. A impedância obtida do quociente entre a
tensão medida e a corrente injetada (conhecida como
impedância de transferência) se relaciona com a
condutividade e permissividade do material na
frequência da fonte de corrente e depende também das
dimensões da amostra e do espaçamento entre os
eletrodos.
Predizer a mudança na impedância medida entre
dois eletrodos na superfície de um volume condutor
devido a uma mudança na condutividade ou
permissividade no interior deste volume é importante
para estudar, por exemplo, a detecção de anomalias nos
tecidos e, também, para o aperfeiçoamento de pontas de
prova no cálculo do espectro da impedância elétrica em
tecidos subcutâneos. Desde a década de 50, estudos vêm
sendo feitos nesta área no sentido de encontrar uma
solução analítica para o cálculo da distribuição da
corrente elétrica em um volume condutor de tamanho
finito, onde os eletrodos de medição também são de
tamanho finito. Para tanto, soluções numéricas
complexas por meio da técnica dos elementos finitos
XX CBEB 2006
vêm sendo bastante usadas [2,3]. Mesmo utilizando-se
desta técnica, tem-se mostrado que há divergências
entre resultados práticos e teóricos quando o volume
condutor é considerado heterogêneo, como é o caso do
tecido biológico [4]. No entanto, soluções analíticas
também podem ser usadas, assumindo que os eletrodos
são pontuais e que o volume condutor sob estudo é
Semi-infinito, Homogêneo e Isotrópico (SHI) [5].
O Método do Circuito Equivalente (MCE) [6] é um
método numérico para cálculo de campo que se baseia
na modelagem do transporte elétrico do material por
meio de elementos discretos de circuito elétrico como
condutâncias e capacitâncias. O MCE tem duas escalas
de análise: a escala celular e a escala de tecido. Elas se
diferenciam pela resolução espacial da malha de
elementos discretos e pela modelagem elétrica do
material. Este artigo trata da utilização da análise em
escala de tecido para calcular a impedância da pele.
Neste tipo de análise, os elementos do circuito
equivalente do meio são obtidos a partir das curvas de
dispersão dielétrica experimentais do material ou a
partir de modelos analíticos da dispersão (Modelo de
Debye e Modelo Cole-Cole [7]).
O objetivo principal no estudo apresentado neste
artigo é mostrar a viabilidade do MCE na estimação da
impedância da pele e verificar as condições de
simulação para máxima precisão do cálculo. Tal estudo
servirá de base para a futura utilização do MCE no
estudo da sensibilidade de medição da impedância,
baseada no método dos quatro eletrodos no que se refere
à detecção de nódulos cancerígenos em tecidos.
Métodos
No MCE, o volume a ser analisado é dividido em
pequenos blocos que formam uma malha de
discretização tridimensional. A Figura 1 mostra um
bloco central envolvido por seis blocos vizinhos na
malha. Cada bloco é designado como sendo um nó de
um circuito elétrico. No modelo em escala de tecido no
domínio da freqüência, a conexão elétrica entre blocos
adjacentes é descrita por meio de uma condutância (g) e
de uma capacitância (c) equivalentes, cujos valores são
calculados através das seguintes equações [6]:
Página 1135 de 1517
Vd
Hd
Figura 1 – Estrutura da malha de discretização espacial
utilizada no MCE. Cada Bloco é considerado um nó de
um circuito elétrico equivalente do meio.
g
c
A
L
A
Hr Ho
L
V
(1)
(2)
H
Hf H0 Hf
1 ( jZW )1D
(3)
Onde Z é a freqüência angular, W é uma constante de
tempo generalizada e H0 e Hf são as constantes
dielétricas em baixa e em alta freqüência,
respectivamente. O parâmetro D pode assumir valores
entre 0 e 1. Com D = 0, a equação (3) resulta na equação
de Debye para dielétricos polares. Baseados neste
modelo e após uma longa manipulação algébrica,
obtêm-se expressões para a condutividade e constante
dielétrica do material nas formas:
V d ( ZH d )2
V V0 2
V d ( ZH d )2
H V2
Hr Hf 2 d d 2
V d ( ZH d )
(4)
(5)
Onde V0 é a condutividade em baixa freqüência e os
parâmetros Vd e Hd são dados por:
XX CBEB 2006
(6)
(7)
O MCE consiste na discretização do volume em uma
malha de blocos como aqueles mostrados na Figura 1 e
na obtenção e análise do circuito equivalente da amostra
através da conexão de todos os blocos vizinhos por
meio dos elementos de circuito descritos nas equações
de (1) a (7). Para cada bloco na malha escreve-se uma
equação relacionando o seu potencial elétrico com os
potenciais dos blocos vizinhos de acordo com a segunda
lei de Kirchhoff. Para o bloco de número n na malha,
temos [6]:
¦( g
x
nx
>( V
jZ c n x ) ˜
nr
Onde A é a área e L é o comprimento da conexão. V é a
condutividade e Hr é a constante dielétrica do material
analisado e Ho é a permissividade elétrica do vácuo. Os
valores adequados da condutividade e da permissividade
para o tecido em questão podem ser obtidos diretamente
das curvas de dispersão dielétrica experimentais,
quando disponíveis, ou a partir de modelos analíticos.
Um dos modelos mais conhecidos e utilizados é o
modelo Cole-Cole. Segundo este modelo, a constante
dielétrica complexa de um número considerável de
líquidos e sólidos dielétricos pode ser descrita como
função da freqüência pela fórmula empírica [7]:
( H 0 H f )( ZW )D
W cos( D S 2 )
( H0 Hf )
1 ( ZW )1D sen( D S 2 )
@
jVn i ) ( Vx r jVx i )
(8)
0
onde o indexador x no somatório identifica cada um dos
blocos adjacentes ao bloco n. Os termos de potencial Vr
e Vi designam, respectivamente, as partes real e
imaginária dos potenciais dos blocos. Esta equação deve
ser separada nas partes real e imaginária e o conjunto
dessas equações para os N blocos da malha forma um
sistema de 2N equações lineares. A solução desse
sistema de equações para cada frequência de interesse
fornece a distribuição espacial do potencial elétrico na
amostra.
As condições de contorno são definidas dependendo
do tipo de excitação, se em tensão ou corrente, e da
geometria dos eletrodos. Para o caso que trataremos
neste artigo, o sistema analisado é mostrado
esquematicamente na Figura 2. Nas paredes do
paralelepípedo de lados Lx, Ly, Lz a condição de contorno
utilizada é de campo perpendicular nulo. Os dois
eletrodos externos na superfície são conectados a uma
fonte de corrente de amplitude e frequência
arbitrariamente definidas. Os valores de condutividade e
constante dielétrica para a pele nessa frequência foram
obtidos das curvas de dispersão fornecidas por Sunaga
et al [8] para o tecido do antebraço de seres humanos
sadios. Os eletrodos internos na superfície da amostra
indicam as posições onde o potencial elétrico é obtido
visando o cálculo da impedância de acordo com o
método dos quatro eletrodos.
Um método analítico simples baseado na solução da
equação de Laplace pode ser aplicado no cálculo da
relação V/I de um volume homogêneo semi infinito com
o uso de quatro eletrodos pontuais em linha. A relação
bem conhecida e utilizada nas técnicas de medição de
condutividade de materiais sólidos é a seguinte:
Z
V
I
F
2SV
Página 1136 de 1517
(9)
onde F é uma quantidade que depende apenas do
espaçamento entre os eletrodos. Para a geometria
definida na Figura 2, esta constante assume o valor:
F
1 1
1
1
s1 s 3 s 1 s 2 s 2 s 3
(10)
MCE calculou a distribuição de potencial em cada nó da
malha. Posteriormente, calculamos a impedância da
amostra usando quatro posições diferentes dos eletrodos
de potencial em relação aos eletrodos de corrente a fim
de experimentar diferentes relações entre s1 e s2 mas
mantendo s1 = s3 .
Resultados
I
A Figura 3 apresenta as distribuições de potencial
no plano z = 0 (superfície da amostra) e no plano y = 0
(plano dos eletrodos) na forma de linhas equipotenciais
obtidas a partir do potencial calculado nas condições de
simulação descritas anteriormente. A Figura 4 apresenta
as curvas de erro numérico no cálculo da resistência em
relação à equação (11) para quatro valores diferentes da
razão s1/s2. Cada curva é parametrizada pelos quocientes
( d/Lx, d/Ly , d/Lz ) onde d é a distância entre os eletrodos
de corrente (d=s1+s2+s3). O erro numérico no cálculo
da reatância em relação à equação (12) é praticamente
idêntico ao erro da resistência a não será apresentado.
+ V_
s1 s2 s3
Lz
Ly
Lx
Figura 2 – Amostra de tecido analisado com a
representação da malha de discretização utilizada e a
configuração de eletrodos para comparação com o
método dos quatro eletrodos.
1
X
ZH r H o
F
2
2S V ( ZH r H o )2
0.4
0.05
0.3
0.2 0.1 0.075
-1
-1
(11)
(12)
-0.5
0
y ( cm )
(b)
0.5
1
-0.3
-0.2
-0.1
-0.075
-0.050
0.6
0.3
0.2
0.1
0.075
0.8
0.050
0.2
0.4
As equações (11) e (12) foram utilizadas para
obtermos valores de referência na avaliação do erro
numérico no cálculo com o MCE. Nas análises
realizadas a amostra de tecido foi discretizada com 28 e
36 divisões no eixo x (Nx), 21 e 27 divisões no eixo y
(Ny) e 15 e 18 divisões no eixo z (Nz). Os parâmetros de
malha, dx, dy e dz, foram mantidos iguais no valor
1 mm. A corrente injetada na amostra tinha amplitude
de 1 mA e frequência 30 MHz. Os valores de
condutividade e constante dielétrica usados neste
trabalho foram V = 60 mS/m e Hr = 80. Para cada
combinação de valores (Nx , Ny , Nz), o simulador do
XX CBEB 2006
0
0
0.025
z ( cm )
R
-0.025
-0.5
as partes real e imaginária desta equação. Obtemos com
isso, a resistência e a reatância da amostra,
respectivamente pelas expressões:
F
V
2
2S V ( ZH r H o )2
-0.1-0.075 -0.05
-0.2
-0.3
-0.4
0.5
x ( cm )
Se a amostra tem dimensões finitas como o
paralelepípedo na Figura 2, alguns fatores de correção
apropriados devem ser aplicados na constante F a fim
de manter a equação (9) válida. No caso em estudo
neste artigo, como queremos calcular a impedância de
um material com alta constante dielétrica, podemos
substituir a condutividade da amostra na equação (9),
pela admitância específica y V jZH r H o e separar
(a)
1
-0.025
0.025
1.2
0
1.4
-1
-0.5
0
x ( cm )
0.5
1
Figura 3 – Distribuição da parte real do potencial
elétrico na amostra com Lx = 28 mm, Ly = 27 mm e
Lz = 15 mm e d = 11 mm. (a) Equipotenciais na
superfície da amostra (plano z = 0). (b) Equipotenciais
no plano dos eletrodos (plano y = 0).
Discussão
As equipotenciais mostradas na Figura 3 apresentam
grande concentração em torno dos eletrodos indicando
que o campo elétrico deve ser muito mais intenso nessas
regiões do que na periferia da amostra ou mesmo na
região intermediária entre os eletrodos. Como o campo
Página 1137 de 1517
elétrico é perpendicular a cada linha equipotencial e a
densidade de corrente é paralela ao campo, podemos
concluir que a corrente circula paralelamente às arestas
y em grande parte do volume da amostra. Por outro
lado, a corrente tende se concentrar fortemente na
região central do plano xy e na região superior do plano
xz, o que nos permite concluir que as dimensões Lx e Lz
terão menor influência na distribuição de potencial na
superfície da amostra do que a dimensão Ly. Esta
observação se aplica para as dimensões mostradas na
Figura 3 ou para dimensões maiores.
12
10
1
2
3
erro %
8
uma grande redução no erro, cujo valor mínimo ficou
abaixo de 1%.
Conclusão
Este artigo mostra que o MCE é adequado para obter
estimativas precisas da impedância da pele. Na
comparação com o modelo utilizado no método
experimental dos quatro eletrodos, observamos que
existe uma grande influência das dimensões do volume
analisado e do espaçamento entre eletrodos na precisão
do cálculo, mas que é possível obter resultados
numéricos com erro menor do que 1%. Podemos avaliar
ainda que uma solução alternativa de melhor precisão à
malha regular usada neste estudo, seria uma malha com
elementos menores em torno dos eletrodos e no espaço
entre os eletrodos, pois o campo elétrico e a corrente se
concentram fortemente nessas regiões.
4
6
5
4
6
2
0
0
0.2
0.4
0.6
0.8
1
1.2
1.4
s1 s2
Figura 4 – Erro numérico no cálculo da resistência em
relação à equação (11) como função da razão s1/s2. Cada
curva é parametrizada pelos quocientes (d/Lx,d/Ly,d/Lz).
Curva 1 (0.39, 0.52, 0.73); Curva 2 (0.31, 0.52, 0.73);
Curva 3 (0.39, 0.52, 0.61); Curva 4 (0.39, 0.41, 0.73);
Curva 5 (0.39, 0.41, 0.61); Curva 6 (0.32, 0.33, 0.50).
Na Figura 4 podemos avaliar a influência das
dimensões da amostra e do espaçamento entre eletrodos
no erro cometido no cálculo numérico da resistência. A
primeira observação importante é a existência de uma
razão s1/s2 para a qual o erro é mínimo. Na curva 6, por
exemplo, o erro mínimo é menor que 1%. Tomando a
curva 1 como referência, podemos avaliar nas curvas 2,
3 e 4, a influência de variações no comprimento das
arestas no erro numérico. A curva 2 corresponde a uma
variação de 0.39 para 0.31 no quociente d/Lx (variação
de 29% em Lx). A curva 3 corresponde a uma variação
de 0.73 para 0.61 no quociente d/Lz (variação de 20%
em Lz). A curva 4 corresponde a uma variação de 0.52
para 0.41 no quociente d/Ly (variação de 29% em Ly).
Considerando que a o espaçamento entre os eletrodos de
corrente foi o mesmo para todas essas quatro curvas,
podemos concluir que o cálculo numérico da resistência
de transferência é pouco sensível ao comprimento da
aresta x para d/Lx maior que 0.31. Por outro lado, as
arestas z e y afetam de maneira muito mais significativa
o cálculo. A curva 5 combina as mesmas variações das
curvas 3 e 4 em uma mesma simulação levando a um
resultado mais preciso. Todas as curvas de 1 a 5
correspondem a d = 11mm. Finalmente a melhor
resposta foi obtida na curva 6, para a qual usamos
d = 9mm na simulação. Isto levou a uma redução
acentuada nos valores de c/Ly e c/Lz, e proporcionou
XX CBEB 2006
Referências
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IEEE
isotropic
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[7] Cole, K.S., Cole, R.H., “Dispersion and Absorption
in Dielectrics”, Journal of Chemical Physics, v. 9, p.
341-351.
[8] Sunaga, T. et al , “Measurement of the electrical
properties of human skin and the variation among
subjects with certain skin conditions”, Phys. Med.
Biol., v. 47, p. N11-N15
Página 1138 de 1517
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