2009 ano 2 2 Do antigo ao contemporâneo na cultura musical de Mogi das Cruzes Educação Secretaria Municipal O caderno tocando e Cantando é um projeto da Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes por meio da Secretaria de Educação Expediente Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Coordenação e Supervisão do Cadernos Tocando e Cantando N.2 Iveta Maria B. A. Fernandes Secretaria Municipal de Educação Coordenadoria de Comunicação Social Comissão Editorial Av. Ver. Narciso Yague Guimarães, 277 Bernadete Tedeschi Vitta Ribeiro / Secretaria Municipal de Educação Centro Cívico – Mogi das Cruzes – SP Carlos Roberto Prestes Lopes / Pesquisador Estagiário - Fundunesp CEP 08790-900 Cassiano Santos de Freitas / Pesquisador Estagiário - Fundunesp Tel.: (11) 4798-5085 Darly Aparecida de Carvalho / EM Profª Cynira Oliveira de Castro e (R) Ana Maria de Azevedo Vine Carrare Fax: (11) 4726-5304 Geraldo Monteiro Neto / Secretaria Municipal de Educação www.mogidascruzes.sp.gov.br Leni Gomes Magi / Secretaria Municipal de Educação Luiza Conceição Silva / Secretaria Municipal de Educação Maria Inês de Mello Faria Peixoto de Miranda / CCII Sebastião da Silva Marinice Regina Alvim / EM Prof. Antonio Paschoal Gomes de Oliveira Marta Keiko Kaku / EM Prof. João Gualberto Mafra Machado Patrícia Marins Aguiar Conde / EM Fujitaro Nagao e (R)"Bairro São João" Rosana Aparecida Martins de Miranda / EM Prof. Antonio Paschoal Jornalista responsável Editorial Kelli Correa Brito – MTB 40010 CADERNOS TOCANDO E CANTANDO que têm como mis- Colaboradores nesta edição Fotos são ser um instrumento de formação de educadores, difusor Adherbal Ferreira Junior Josette Silveira Mello Feres Adriana Viza Sedano Lorca Leandra E. L. Santos Alessandra Maria Zanchetta Luciana Monteiro Amália M. O. Rodrigues Luciana Rosa Fernandes Abib Ana Karina de Miranda Nepomuceno Maria Inês de Mello Faria Peixoto de Miranda Ana Lúcia Fernandes Gonçalves Maria Lusimar da Silva Ana Maria de Souza Marinice Regina Alvim André J. Rodrigues Júnior Marta Keiko Kaku Arthur Iraçu Amaral Fuscaldo Miriam Matsuda Bruna Rocha de Siqueira Nádia Espíndola Fernandes Rettec Artes Gráficas que nela convivem, pelas mãos dos profissionais que conosco Carlos Roberto Prestes Lopes Otília de Camargo Pinto Rua Xavier Curado, 388 – Ipiranga têm alargado os horizontes do projeto “Tocando, cantando... Cassiano Santos de Freitas Patrícia de Cássia Barba Macedo São Paulo – SP/ CEP 04210-100 fazendo música com crianças”. Claudinéia Cristina Ignácio Galocha Patrícia Costa de Barros Tel.: (11) 2063-7000 – www.rettec.com.br Cleide Negrão de Almeida Patrícia Marins Aguiar Conde Cristiane Kátia Domingos de Barros Rosana Aparecida Martins de Miranda CADERNOS TOCANDO E CANTANDO Entrevistas e artigos de especialistas; Desafinando - experiên- Darly Aparecida de Carvalho Sidney Pontes é uma publicação da Secretaria Municipal cias e suas reformulações; Músicos da região; Com a mão na Elaine Cristina Raimundo Tatiane Mendes Carvalho de Educação de Mogi das Cruzes/SP, por massa: Projetos - Relatos; Hã? Heim? Traduzindo o musiquês; Eulália Anjos Siqueira Thiago G. Chiarantano meio da Coordenadoria de Comunicação Batuta: curiosidades relacionadas à música, músicos e instru- Fernando Sardo Vanessa Gerlinger Romero Social, e não se responsabiliza por con- mentos; Indicações de livros, CDs, DVDs, Sites; Brincadeiras Geraldo Monteiro Neto Wasti Silvério Ciszevski ceitos emitidos em artigos assinados. cantadas - Jogos Musicais; Conhecendo práticas e teorias. Giovana da Silva Arquivos das Escolas Municipais de Mogi das Cruzes Jonny Ueda – O Diário (foto pág. 26) e fertilizador do dia a dia na escola, seus projetos, práticas e produções apresenta seu Número 2 tendo como capa as partituras musicais mais antigas encontradas no Brasil, levando-nos a voltar nosso olhar para aspectos da música erudita em Mogi Projeto Gráfico e Diagramação Jorge Ricardo – Coordenadoria de Comunicação Social das Cruzes na primeira metade do século XVIII. Iluminados por essa trajetória musical que percorre os séculos e está sempre presente na vida desta cidade, agora às vésperas da comemoração de seus 450 anos; aspectos dessa Impressão e Acabamento musicalidade despontam em várias escolas pelas mãos dos Assim, vamos encontrar hoje no século XXI, a diversidade de abordagens presentes nas várias seções desta publicação: É com muita alegria que trazemos ao leitor alguns frutos Helaine Cristina Bio Margarido desta nossa safra, que é produto dos que se aglutinam em Heliana Pereira Pimentel Fernandes torno da música e seu ensino, tendo como meta a educação musical e a valorização de sua prática profissional! Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 3 Hã? Hein? Traduzindo o "musiquês" 65 Traduzindo o "musiquês" Batuta - Curiosidades sobre músicas, músicos, instrumentos, sites, CDs, DVDs Com a mão na massa - Relatos de projeto Entrevistas e artigos com especialistas Índice 6 12 Entrevista Berenice de Almeida A importância de ouvir e fazer música 15 33 A cidade ideal 36 Fazendo música com os pais 40 Criando e sonorizando histórias 44 Musicalização de bebês Músicos da Região 25 A cadência musical de Mogi das Cruzes: dos documentos históricos aos músicos mogianos 47 50 53 Desafinando: Experiências e suas reformulações 18R epresentação gráfica da forma visual 20 Composição na educação infantil 4 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes 57 61 Apreciar, brincar e cantar... é só começar! Vamos tentar com as mamães? Uma experiência de creche 70 Indicação de livros, sites, CDs, DVDs 72 Enfrentar desafios... sempre vale a pena Saita, saíta... floriu a cultura japonesa pela música Ensinando música com as cores e sons... uma experiência surpreendente! Livros, CDs, Sites, DVDs Brincadeiras Cantadas 78 Uma visão sobre o cotidiano musical Um concerto na Sala São Paulo Batuta – o nosso quiz Tampas sonoras - jogos musicais Conhecendo práticas e teorias 81 Por dentro da lei 88 A experiência musical em um contexto de inclusão social 92 94 Histórias musicadas, sonorizadas e dramatizadas Construindo pontes lidando com as adversidades na aula de música Caderno Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 5 Entrevistas e artigos com especialistas Entrevistas e artigos com especialistas ENTREVISTA BERENICE DE ALMEIDA Maria Inês de Mello Faria Peixoto de Miranda Marta Keiko Kaku Berenice de Almeida é educadora musical, pianista e autora com Magda Pucci (grupo Mawaca) do livro “Outras Terras, Outros Sons”. As duas especialistas desenvolveram também um trabalho sobre música japonesa e imigração a partir do Centenário da Imigração Japonesa, festejado em 2008. Professora da Escola Municipal de Iniciação Artística na capital paulista há 20 anos, onde é coordenadora da área de música, Berenice atua na ONG Ação Comunitária e trabalha com formação de educadores. Em 2008, a educadora ministrou capacitações para as equipes escolares e pesquisadores estagiários da Fundunesp que atuam no projeto “Tocando, cantando...fazendo música com crianças”. É um prazer falar com você. Conhecemos seu trabalho e ele nos ajuda bastante com a prática em sala de aula. Eu também estou feliz porque acho o projeto “Tocando, cantando... fazendo música com crianças” muito bonito. E o que me chama mais a atenção é que ele foi se estruturando aos poucos, a partir da realidade local com muito cuidado, tendo monitores para orientar os professores em um crescimento conjunto. Onde você busca elementos para desenvolver seu trabalho com a formação de professores, com atividades que vão ao encontro das necessidades na sala de aula? Basicamente na minha prática em sala de aula da escola regular, das aulas individuais e em grupo... Em meus 20 anos na EMIA (Escola Municipal de Iniciação Artistica do Município de São Paulo). Eu trabalho há vinte anos na Escola Municipal de Iniciação Artística e, atualmente, coordeno a área de música. Lá trabalhamos também com teatro, artes plásticas e dança e nesse trabalho conjunto com artistas plásticos, atores e dançarinos foi importante observar como a criança transita nessas outras linguagens e na própria música. Então, eu fui buscando referencial teórico a partir das minhas necessidades, construindo um pensamento que dialogava o tempo todo com a minha prática, dialogando com o que outros educadores musicais já pensaram, já estudaram e a que já se dedicaram; assim você vai usando esses conceitos e identificando-se com o uso. Portanto, a partir desse mundo que venho estudando, das várias linhas, dos vários pensadores do começo do século XX e dessa nova geração... tudo isso junto à minha prática determina a forma como penso a musicalização hoje. 6 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 7 Entrevistas e artigos com especialistas Entrevistas e artigos com especialistas E em que consiste o trabalho de musicalização com a criança? O primeiro momento consiste em sensibilizar a criança para o mundo sonoro em que ela está imersa. Vivemos em um mundo muito visual e é um mundo muito sonoro também, mas muito barulhento! E aí deixamos de ouvir por uma própria defesa, por perceber o que está acontecendo; então apesar de termos tantos estímulos sonoros, ouvimos menos. Não é à toa que os trabalhos de John Paynter, de Schafer como educadores musicais, estejam pautados na questão da paisagem sonora e da percepção auditiva; isso aconteceu no fim do século XX e começo do século XXI, quando os grandes centros urbanos foram tirando essa possibilidade de contato com o silêncio. O silêncio realça o som: você percebe o som se tiver o silêncio. Então por isso que eu acho que um dos princípios básicos é ir na matériaprima em que se articula música, que é o som e o silêncio e trabalhar com a percepção auditiva, com o fenômeno sonoro. E de que forma trabalhar com esta matéria prima... como iniciar esta sensibilização? Num primeiro momento esse trabalho não é só musical, ele é anterior. Tomando como exemplo as artes plásticas, é aquele momento da exploração da tinta, da exploração da argila e dos diversos materiais. É trabalhar com a percepção sensorial. Na questão do som, a criança pega o objeto e ex- que você não tenha que cantar entoando ... porque é importante isso pra bagagem musical dela...ela do som como matéria-prima e daí vêm minhas ideias dos plora suas possibilidades: "chocalha", batuca com os dedos, tem que ouvir gente cantando afinada, caso contrário ela vai ter um modelo só, o do desafinar. Agora, vários exercícios e brincadeiras com o som, mas ainda sem a pega uma outra coisa e bate, esfrega. E na medida em que quando ela vai fazer música, não está preocupada com a altura do som. preocupação de ordenar isso. Lógico que música é um todo, vai conhecendo o objeto sonoramente, vai arquivando as então você não vai ficar a aula toda só explorando o som. informações, os resultados que obtiver. Vai tirar sons graves e agudos, mesmo que não saiba que Percebe, mas se está cantando “atirei o pau no gato to”, ela não está pensando: nossa estou can- Esta seria a base do trabalho? isso em música chama grave e agudo, tem a experiência, a sen- tando “sol fa mi ré mi fá sol”. Por isso que crianças até com 4 ou 5 anos chegam em um instrumento, sação de produzir e ouvir estes sons. Num primeiro momento tocam aleatoriamente e falam que estão tocando tal música. Para ela, algum elemento da música cio, existem os três pilares da musicalização: o cantar, o é isso: é o som, o silêncio, os parâmetros e o que eu faço está sendo feito e esse elemento já é um todo. Nessa idade ela é capaz de manter o pulso, que é tocar e o ouvir. Você faz música e interage com ela destas com isso. Você tem que ter em mente a exploração e o fazer um elemento ordenador do tempo na grande maioria da nossa música ocidental. É capaz, mas pode três formas, e a partir daí dá para inventar tudo o que se musical. Pensando no princípio da linguagem musical que é a não se interessar... começa seguindo a pulsação, mas de repente se perde porque para ela aquilo não quiser. Ou seja,... quando se pensa em dançar, primeiro ordenação de som e silêncio sem ainda pensar que música é só é prioridade, por não perceber que aquilo é um elemento ordenador que começou e vai acabar. Já tem que ouvir para reagir corporalmente; a apreciação mu- aquilo que eu consigo cantar. E é isso que você falou, a percep- por volta de 6 para 7 anos... e claro que isto é variável e existem exceções ... a criança percebe que sical, os trabalhos com percepção auditiva... são vertentes ção do som, os parâmetros do som... porque se está trabalhan- aquilo é um elemento ordenador mesmo sem nomear que isso seja pulsação, que seja pulso. Se você do ouvir. Depois tem o tocar e o cantar... com um quarto do com isso. Como no trabalho com argila: como ela é, qual a quiser que ela perceba e se chamar a atenção para aquilo, ela vai perceber e vai realizar. Então eu elemento que permeia os três, que é a reflexão: pratico, textura, quais os elementos da argila; e paralelamente, quais acho que existem dois trabalhos com a criança na musicalização: um é o trabalho do fazer musical da vivencio, nomeio o que eu faço, entendo o que eu faço, são os elementos do som . E depois do trabalho de manuseio e criança, que é a música da criança, é você fazer música com aquilo que ela tem. penso sobre o que eu faço. O equilíbrio das diversas ativi- de exploração, pensar em como fazer música com isso. Então... paralelamente a este trabalho com som e silên- E com isso, estar estimulando... dades desses quatro eixos, podemos dizer assim, é que faz um bom trabalho de musicalização. Partindo da sensibilização, englobar a exploração dos parâmetros sonoros, a reflexão... E estes processos estão relacionados à idade? Estar estimulando, familiarizando, colocando dentro de um contexto expressivo. O outro é o Pensando nos grandes blocos, um bebê com até um trabalho com a música que ela não cria, mas da qual participa... cantando, ouvindo. Enfim a criança ano e uma criança de três anos são muito diferentes, mas pode ouvir uma música de orquestra totalmente ocidental ou uma música brasileira, e ela também ao mesmo tempo estão inseridas em um grupo em que o vai estar nesse mundo. Então acho que a musicalização tem que abarcar a música das crianças e as sensorial é muito forte... então nesta fase não se tem ne- várias outras, como a música popular brasileira, a música de raiz, a música tradicional. Inserir isto e vai conhecê-lo com os seus sentidos: vai tatear, balançar, cessidade de ficar nomeando tudo porque se está num mo- em nossa formação, porque pensando nas crianças mais velhas - não que seja ruim tocar violino por ... pôr na boca. Não só a criança, mas também o adulto de mento estritamente sensorial. Aos três anos, a criança não exemplo, na verdade é maravilhoso,...- mas ela não sabe tocar pandeiro, e grande parte da nossa uma forma mais complexa, têm que ser chamado pela parte canta entoando verdadeiramente, mas isso não quer dizer música brasileira tem pandeiro: chorinho, samba... A criança de um ano, por exemplo, pega qualquer objeto 8 Mas ela percebe? Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 9 Entrevistas e artigos com especialistas Pelo menos ela deve ter o conhecimento disso. Entrevistas e artigos com especialistas demorando ...com certeza falta pó...” que é semínima, colcheia, uma terça, duas tem alguém que resolve ser muito generoso: o mundo tem que ouvir o que ele notas...ela pode tocar isso lendo já nesse momento porque são coisas que ela já ouve... ele põe aquela música, que para você é de péssima qualidade, no último não quer dizer que ela não possa ouvir Bach, que é um conhece. E aí no “Brasil...dois mil...quem mexer saiu!” ...ela já brincou com isso, volume. Estamos rodeados disso e temos que preservar as crianças quando elas legado histórico. Aí vem a pergunta... Como nós vamos já fez corporalmente... aí sua parte é conseguir fazer essa salada de fruta. são menores, como as preservamos de imagens... não acho que uma criança Pelo menos ela ter visto isso na vida dela. Agora, isso fazer isso? Porque é um repertório muito vasto e ao mesmo tempo também temos que dar oportunidades e estímulos para a criança criar... Então falando da forma mais simples possível: eu acredito que o professor que desenvolve um pequena tenha que assistir tudo o que passa na televisão. Certas coisas devem Na questão do repertório... o que é importante apresentar, existe alguma restrição? Temos que eleger e selecionar a cada momento. Eu acho que a nossa cultura ser trabalhadas de outras formas, deixa para a adolescência. Então a restrição para mim está ligada à qualidade musical, às letras que podem ser trazidas para sala de aula... e sempre com um significado. trabalho musical com as crianças tem que ter uma grande tradicional é necessária para dar uma referência do que ela é no meio de toda disponibilidade para se autoavaliar e sempre se perguntar: essa globalização. Mas também é importante ver o outro, a cultura de outros po- Não existe restrição, desde que seja significativo para a criança. “Será que faz tempo que não canto com esta turma?", vos, ter diferentes parâmetros. Tem que saber os momentos e pinçar esse mun- Aquela história da "Casinha da vovó", se isso entrou como uma brincadeira de roda, “Agora é melhor eu fazer um trabalho de apreciação mu- do musical que é feito de várias músicas. A restrição seria a qualidade, pensando então é interessante trabalhar com ela no xilofone, é interessante trabalhar o ritmo sical”; “Preciso tocar mais com esta turma, pois este se- na péssima qualidade de muitas coisas que são veiculadas. Agora, quando se porque isso teve um significado. Mesmo que a criança seja da segunda ou terceira mestre cantaram mais e tocaram pouco?”, “Como será que trabalha com adolescentes, por exemplo, em certos momentos é preciso abrir série, ela brincou com isso aos três anos...e aos oito aquilo pode não ser mais interes- está a percepção auditiva dos meus alunos?”. Ou seja, tem para isso entrar em sala de aula e poder lidar com esse dado... para conseguir sante, mas pode ser resgatado dependendo do contexto, num arranjo com cânones que mesclar esses módulos...o cantar, o ouvir, o tocar... e chegar até eles.. Eu fiz um trabalho em uma ONG que se chama “Ação Comuni- por exemplo. Quer dizer, vai entrar de uma outra forma dependendo do grau de ela- nas próprias atividades tem que aos poucos ir nomeando. tária”, e em um grupo de adolescentes de quinze ou dezesseis anos que estava boração dela naquele momento... de acordo com o seu processo de trabalho. Calcar Porque a criança não tem que ficar a vida inteira falando muito forte a música do “Créu”... que é musicalmente muito ruim e com uma le- a escolha do repertório na sensibilização, e o seu trabalho de alguma forma tem que “som fino” ou “som grosso” se existe um nome para isso. tra questionável. ... Mas há momentos em que é preciso utilizar isso, com muito estar rodeado de significados. Por isso eu acho que o trabalho do professor de sala de É importante nomear, conscientizar sobre os conceitos. A cuidado, sabendo o que está fazendo e onde se quer chegar. Foi o que fizemos aula, linkado com o professor especialista... tem mais condições de atingir a criança reflexão sobre os conceitos e sobre a própria música tam- lá na ONG e conseguimos, mas porque tínhamos um trabalho conjunto com os porque pode estar abordando isso por várias facetas, em vários momentos. E não o bém tem que ter um espaço na aula para acontecer. São educadores sociais que era muito importante. A mídia veicula uma produção professor de música vir só com o repertório... por isso que talvez essa dobradinha muitas coisas a serem pensadas e trabalhadas! de baixa qualidade que já massacra nossos ouvidos...você está no semáforo e pode ser muito interessante... por enriquecer, criar significados para todo trabalho. ■ Esse processo tem uma evolução cronológica Ele tem uma evolução cronológica... a criança tem que chegar. E partir então da percepção. Partir do sensorial e ir para a vivência, ir nomeando e conscientizando. E voltar para a prática: vai para a teoria, e volta para a prática. Sem esquecer o trabalho de reflexão junto às outras vertentes que é o fazer música, todo o trabalho de criação, de interpretação. E a interpretação é eu cantar ou tocar, fazer a música do outro, algo que já esteja ali. E aí entra desde tocar com a escrita tradicional, dentro de uma evolução partindo da escrita que não seja a tradicional, ou o tocar por imitação. Porque eu posso tocar algo que eu vejo alguém tocar, mas que eu não sei escrever: eu vejo tocar e toco... mas se eu pegar a partitura, não consigo. Então, tem coisas que podem ser trabalhadas por imitação, por notação tradicional ou não tradicional. Se a criança já passou por um processo, ela sabe que existe clave de sol, clave de fá, sabe que isso é nota, que isso é música, vive num mundo em que esses códigos já chegaram para ela... ela vai querer saber o que significa isso. Agora, se essa criança já está começando a ler... bem pouquinho... Maria Inês de Mello Faria Peixoto de Miranda – Pedagoga e professo- semínima e colcheia...e de repente criou uma música cheia ra de Educação Infantil no Centro de Convivência Infantil Integrado de síncopas, não precisa fazer escrever coisas que ela ainda (CCII) Sebastião da Silva - [email protected] não domine... trabalhe com aquilo que esteja ao alcance... peça para registrar o que sabe e tocar de cabeça aquilo Marta Keiko Kaku – Licenciada e Bacharel em Letras. Professora que tem uma notação mais complexa. Ela pode tocar por de Educação Infantil da Escola Municipal Professor João Gualber- exemplo “ a casinha da vovó...toda cheia de cipó...o café tá to Mafra Machado - [email protected] 10 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 11 Entrevistas e artigos com especialistas Entrevistas e artigos com especialistas A IMPORTÂNCIA DE FAZER OUVIR E MÚSICA Fernando Sardo e Miriam Matsuda A música, entre outras linguagens artísticas, é uma forma de expressão que acompanha a humanidade no curso de sua história. Por meio dela é possível perceber como cada povo organiza idéias, elabora pensamentos, expressa sentimentos. Demonstra também como cada povo se reconhece no seu contexto histórico e social. Podemos verificar na música características e identidades culturais naturalmente expressadas em ritmos, melodias, harmonias, na forma específica de cantar, de desenvolver, de fabricar instrumentos musicais e nos seus timbres característicos. Entrar em contato com esta linguagem, ouvir música de diversas épocas, é entrar em contato com as vozes de nossa história e então, poder estar atento para o que estas nos contam. Ouvir a música de outros povos é uma forma de se aproximar, compartilhar das suas impressões por meio de vibrações sonoras, melodias, emoções, pensamentos e sentimentos. Desta forma, um ritmo de tambores, a melodia alegre e espontânea de uma Kalimba vinda da África, um som hipnótico e pacificador da Índia, a música contemplativa do Japão, a festa de cores e timbres da China, os sons sóbrios vindo dos fortes ventos das montanhas dos Andes, ou elaboradas arquiteturas, sofisticadas combinações sonoras vindas das composições do velho continente Europeu, revelam climas, cores, estados de espírito. Os rituais dos índios da Amazônia, as diversas festas de todos os cantos do Brasil, a alma do sertanejo em uma viola, o elétrico mundo urbano, gritos da modernidade, a busca dos artistas contemporâneos em recriar o mundo e encontrar suas atuais formas de expressão, tudo isto podemos perceber ouvindo música. Conhecer a expressão musical de outras culturas nos faz também conhecer e entender as formas inerentes de organização de pensamento. Faz-nos perceber que apesar de todos pertencemos à mesma espécie, somos diferentes nos fazeres, perspectivas e expressões. Cada povo tem uma forma própria de elaborar, criar, fazer, organizar e pensar. Vemos então, que não existe uma única e correta forma, mas várias perspectivas, olhares, possibilidades e ações. Workshop com o músico Fernando Sardo na EM Dr. Álvaro de Campos Carneiro 12 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Na minha formação e pesquisa como músico e luthier, pude entrar em contato com diferentes sonoridades e estéticas de várias etnias. Este exercício foi fundamental Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 13 Entrevistas e artigos com especialistas Entrevistas e artigos com especialistas para o desenvolvimento da pesquisa da construção de instrumentos musicais experimentais e composições musicais, não só pelas inúmeras referências artísticas e técnicas que obtive, mas também por ampliar as minhas possibilidades de criação. Este conjunto de experiências foi fundamental para minha formação como artista-educador e na minha prática artística, pois estas referências influenciaram e delinearam minhas escolhas estéticas. Mas de que forma ouvir e entender a música pode contribuir para a formação dos indivíduos e por que a música como linguagem artística deve integrar o currículo escolar? Penso que uma das inúmeras contribuições que as linguagens artísticas podem oferecer integradas ao processo educacional, é que o contato com as artes sensibiliza e promove a reflexão. Desta forma, este conhecimento amplia a possibilidade de se conhecer melhor e compreender o outro. Isto promove e colabora para a construção de um olhar embuído de respeito, generosidade e ética. Outro importante aspecto da presença da música no contexto educacional, é que esta pode colaborar para a elaboração do imaginário e incentivar a prática criativa. Estimular o imaginário nos faz desenvolver a sensibilidade e a subjetividade, demonstrar o que é inerente ao olhar de cada indivíduo. Incentivar a composição, novas formas de organizar a expressão musical, buscar recursos, conhecer novos timbres, estruturas, ritmos é facilitar o ato criativo, assim como reutilizar materiais para fazer instrumentos musicais e enxergar materiais descartados na nossa sociedade como novas possibilidades de elaboração criativa. Seguindo este raciocínio, o fazer criativo deve ser uma prática até se tornar um hábito, a ponto de fazer parte da nossa forma de ser e agir. Este fazer, juntamente ao conhecimento e à compreensão de variadas estéticas artísticas, promove e colabora para o desenvolvimento do pensamento crítico, Musicalização o que nos possibilita estar numa situação menos passiva, diante do bombardeio massificador a que somos submetidos pela mídia. de Brincar de fazer música, de buscar diferentes materiais e sonoridades, de buscar recursos próprios, me faz estender esta práxis como educador, como artista, como pessoa. O artista – educador que desenvolve a linguagem musi- Fernando Sardo – Músico, compositor, luthier, artista plástico e arte–educador. Pesquisa e bebês Josette Silveira Mello Feres cal, pode contribuir para uma ação formadora de pessoas constrói instrumentos musicais de diversas culturas e épocas. Em seu trabalho com Música sensíveis às artes, reflexivas e capazes de elaborar estra- e Lutheria Experimental utiliza matérias-primas orgânicas (cabaça, bambu, madeira, pe- tégias inteligentes e criativas para as soluções que tanto dra e argila) e sintéticas (metal, vidro, papel, borracha, plástico e sucata). Com seus instru- em uma reportagem da “Folha de São Paulo” sobre o trabalho da professora precisamos na nossa sociedade. mentos e esculturas sonoras faz composições e trabalhos musicais. Integra a música às artes Walkyria dos Passos Claro. Até então nunca havia pensado nesse assunto. Apren- visuais e cria instrumentos musicais de cordas, sopros e percussão, esculturas, instalações di no curso que fiz na Escola Nacional de Música, com o professor Antonio Sá e parques sonoros . [email protected] Pereira, em 1953, que a melhor época para as crianças frequentarem música seria Criativos e éticos podemos compreender nosso contexto sócio–político-econômico, criar estratégias para delinear A primeira vez que ouvi a respeito de aulas de música de bebês foi em 1976, aos 5 anos e era a partir daí que os alunos começavam a participar do Curso de novas formas de constituir e interferir na nossa sociedade e somente desta forma, podemos nos referir e caminhar Miriam Matsuda - Especialista em dança contemporânea pela UFBa, professora de Anatomia Iniciação Musical da minha escola. Mal sabia que o que eu fazia em casa com os em direção à formação de um indivíduo com autonomia, para o Movimento, Dança Contemporânea, criadora e pesquisadora em dança. Foi coordenado- meus filhos já era um curso de musicalização. As canções, brincadeiras musicais, liberdade e cidadania. E por consequência, construir um ra artística e pedagógica do Centro de Dança de Santo André entre 2005 e 2008, período em que os instrumentos de percussão, as dancinhas eram na verdade os elementos que mundo mais próspero. ■ este projeto foi reconhecido pelo Ministério da Cultura na 2ª edição do Prêmio Cultura Viva. mais tarde eu usaria nas aulas com os bebês. 14 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 15 Entrevistas e artigos com especialistas Entrevistas e artigos com especialistas Em outubro de 1987, frequentei um curso para professores ministrado por Walkyria e, logo em seguida, formei uma classe de bebês na Escola de Música de Vinte e um anos depois Sempre que falo sobre o curso de bebês vem logo a não continuaram seus estudos musicais. Ano passado, um estudante de Geologia, que pertenceu à primeira turma Jundiaí junto à minha filha Luciana. Eu fazia os planos de aula, ela acompanhava pergunta: “Bebês com aula de música? O que eles apren- de bebês em 1987, foi o solista de um Concerto de Vivaldi ao piano e me auxiliava na distribuição dos materiais. Depois de terminada a aula, dem?” É claro que não é uma turma de pequenos Mozarts para violão com a Orquestra de Câmara de Repertório em nós fazíamos uma avaliação do trabalho realizado. Na anotação sobre a primeira tocando violino, mas crianças com mães, pais, babás e até uma apresentação da Escola de Música de Jundiaí. 80% aula está escrito: “Decepção! Só veio um bebê! A Marina. Ela estava tímida, com bisavós que se divertem juntos fazendo música. Tocam dos alunos que tocam no Conjunto de Música Popular da medo que a mãe saísse de perto dela...”(21-10-1987). Na aula seguinte, entretan- pequenos instrumentos de brinquedo, cantam, dançam, EMJ, formado por crianças e adolescentes de 10 a 16 anos, to o relatório foi bem mais animador: “Surpresa! Hoje vieram muitos bebês! Foi participam de brincadeiras musicais e recebem muito foram alunos da classe de bebês. Não tenho notícia da ótimo!As crianças são animadas e as mães mais ainda...” (28-10-1987). carinho na presença de alguém que muito ama. Além da grande maioria deles, mas de uma coisa tenho quase cer- grande ligação afetiva, aprendem velhas canções do folclore teza: o resultado foi muito acima das minhas expectativas. infantil e canções adequadas ao seu desenvolvimento. Não sei até hoje se essas aulas são mais benéficas para os Durante muito tempo eu e Luciana trabalhamos juntas. Eu fazia os planos de aula e ficava com as crianças e ela tocava piano e ajudava na distribuição dos materiais. Depois nós invertemos os papéis. Eu tocava enquanto ela ficava E, onde estarão todos esses alunos que frequentaram bebês ou para as mães. Na verdade, não há palavras para com as crianças. Mais tarde ainda ela passou a fazer também o planejamento o curso de bebês? É difícil dizer. Alguns continuaram a explicar o prazer, a alegria e a cumplicidade compartilhados e eu fiquei só no piano e em 2000 me retirei das aulas de bebês e somente estudar e são profissionais na área de música. Outros, naqueles 30 minutos de aula. ■ voltei em 2003, quando Luciana mudou-se para a França. embora tenham uma outra carreira, estudaram um instrumento e tocam nas horas de lazer. Alguns participam de Josette Silveira Mello Feres - Professora de Musicalização Infantil e conjuntos e orquestras amadores. Há ainda aqueles que diretora da Escola de Música de Jundiaí. [email protected] Planos de aula No início o plano de aula era mais tímido. Os elementos não eram bem definidos e o relaxamento era no meio da sem reclamar ou chorar; o brinquedo projetivo, que a criança, aula. Nessa época eu achava que deveria haver um peque- após fazer o exercício com o adulto, o reproduz com um boneco no intervalo para descanso das atividades antes de fazer o como se ela fosse o adulto e o relaxamento passou para o pe- restante dos exercícios. O plano se resumia em: núltimo item da aula, antes do canto de despedida. Dessa for- ■ Canto de entrada; ■ Pulsação: acompanhar as músicas com instrumentos de percussão: martelinhos, pequenos potes de plástico, colheres de pau, tubos de filmes de fotografia; ■ Marchas e danças: imitação de maneiras de andar de animais, soldadinhos, palhaços; ■ Relaxamento; ■ Banda rítmica; ■ Canto de despedida. ma, crianças sairiam da aula mais calmas e os acompanhantes mais descansados. Atualmente o plano de aula é o seguinte: ■ Brinquedo livre; ■ Canto de entrada; ■ Hora do canto: ■ Expressão corporal ■ Percussão corporal livros, cursos e congressos sobre o assunto, passei a ter uma ■ Brinquedo projetivo ■ Exercícios de psicomotricidade ■ Exercícios de socialização visão mais ampla sobre as aulas com bebês. Sempre pensando ■ Parlendas, rimas e brincadeiras musicais; nas fases do desenvolvimento infantil, achei que poderia explo- ■ Marchas, danças e cirandas; rar um pouco mais o potencial de cada criança e partindo disso ■ Conjunto de percussão; elaborei novos projetos de planos de aula. Foram acrescenta- ■ Relaxamento e alongamento; dos os exercícios de socialização, onde as crianças aprendem ■ Canto de despedida; Com o passar do tempo, através de leituras de periódicos, 16 a compartilhar um brinquedo e entregá-lo espontaneamente, Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 17 Desafinando: Experiências e suas reformulações Desafinando: Experiências e suas reformulações próprio de cada uma delas, utilizando este sistema de notação. A última versão deste código é quando adicionamos cores designando cada entre eles VIVANCO (1986) e SAITTA (1978), que têm elaborações mais complexas sobre este assunto, ampliando os sinais grupo, novamente facilitando para que a criança siga sua linha. Feito com tiras utilizados visando representar o som propriamente dito, seu de papel crepom e fita adesiva colorida, este formato aliado às cores se mostrou timbre e características. A importância dos registros musicais com as crianças é muito mais fácil para as crianças acompanharem. inegável, sendo seu valor diretamente ligado ao processo Uma representação do resultado final: de entender e transformar o som em algo diferente, uma Observe a figura 3, após a experimentação deste código colorido com a música outra linguagem, resultado de um trabalho cognitivo que (como havíamos feito com as duas primeiras versões), utilizamos de outras maneiras: fará com que a música se torne mais significativa para a ■ Somente tocando a sequência, sem cantar ou acompanhar a música; ■ Colocávamos o cabo de vassoura em diferentes lugares e os grupos que tinham a linha grossa tocavam; ■ Algumas crianças fizeram o seu próprio arranjo, através de um desenho sobre criança e para o adulto que será. ■ Carlos Roberto Prestes Lopes - Aluno do 4º ano de Licenciatura em Educação Musical no Instituto de Artes da UNESP e pesquisador linhas coloridas em um papel, definindo quando e quais grupos iriam tocar. Em estagiário da Fundunesp no projeto "Tocando,cantando...fazendo seguida executamos alguns destes desenhos. música com crianças" da Secretaria Municipal de Educação de Mogi das Cruzes. [email protected] Materiais Utilizados: 1ª versão: Fita crepe. 2ª versão: Fita crepe e barbante. 3ª versão: Fita adesiva colorida e tiras de papel crepom. Esta maneira de grafar a forma da música é interessante, pois através dela é possível facilitar a análise, transformando um fenômeno temporal em atemporal. musical acontecendo ao nosso redor, e com um registro gráfico podemos observar que há momentos em que tocamos juntos ou que tocamos sozinhos, além de observar a dimensão e a proporção temporais representadas ali. Há também a possibilidade de utilização deste esquema gráfico como notação de atividades para o professor, ou arranjos feitos com as crianças durante a aula, facilitando o registro e avaliação das produções dos alunos. Este sistema pode ser considerado como uma simplificação da linguagem utilizada por diversas composições contemporâneas e de vários pedagogos musicais, cabo de vassoura da forma Representação gráfica Quando estamos tocando, nem sempre conseguimos perceber tudo que está REFERÊNCIAS BRITO, T. A. Música na educação infantil - propostas para a formação integral da criança. Peirópolis: São Paulo, 2003. SAITTA, Carmelo. Creacion e iniciacion musical: hacia um nuevo enfoque metodológico. Ricordi: Buenos Aires, 1978. SALLES, P. P. Gênese da notação musical na criança - Os signos gráficos e os parâmetros do som. In: Revista Música, V.7, nº12. São Paulo: ECA/USP, 1996. VIVANCO, Pepa. Exploremos El sonido. Ricordi: Buenos Aires, 1986. AKOSCHKY, Judith. Con mi martillo. In: Coleção Ruidos y ruiditos - Música para los más chiquitos, vol.1. Buenos Aires: Tarka, 1976. Figura 1 Carlos Roberto Prestes Lopes linha simbolizada com o respectivo instrumento (o qual já havia sido escolhido pe- so de construção do conhecimento musical, notações de los alunos após exploração), como mostra a figura 1. A leitura foi feita da esquerda diversas naturezas acompanham essa gênese em complexi- para a direita e representando a passagem do tempo, um cabo de vassoura (ou dade crescente,..." (SALLES, 1996, p.149-150) objeto semelhante) ia acompanhando por cima do esquema; assim, quando a linha entre 4 e 6 anos (Infantil IV e Infantil V), e consiste na grafia da forma da música, representando em cada linha um instrumento ou grupo de instrumentos, registrados em sequência. Uma das músicas utilizadas foi a gravação traduzida da música “Con mi martillo”, de Judith Akoschky, (em portu- de cada grupo começasse ou terminasse, este começaria ou pararia de tocar. Após algumas tentativas, vimos a dificuldade das crianças entenderem o gráfi- 2. os alunos não conseguiam reconhecer a continuação de cada linha. Portanto, fizemos as mudanças retirando a ligação entre as linhas e fazendo uma linha contínua, somente mais grossa nas áreas a tocar; como está repre- nidas pelo acompanhamento e pela letra, respectivamente: sentado na figura 2: havia sido trabalhada com as crianças. O esquema foi montado no chão com fita adesiva e cada 18 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes tempo 1. a ligação das linhas de cada instrumento confundia os alunos; guês, “Com meu martelo”), que tem três partes bem defimartelo, serrote e lixa (daí a música ter três linhas), e que já Figura 2 co e percebemos dois problemas: cabo de vassoura Esta atividade foi inicialmente feita com crianças de idades cabo de vassoura tempo "...na gênese da própria música na criança e no proces- Figura 3 Utilizando esta nova organização, as crianças conseguiram seguir a sua linha, pois não havia mais a necessidade de imaginar a sequência desta, facilitando a tempo compreensão e execução da proposta. Executamos com cada turma o arranjo Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 19 Desafinando: Experiências e suas reformulações Desafinando: Experiências e suas reformulações Composição na Rosana Aparecida Martins de Miranda Na Escola Municipal Prof. Antônio Paschoal Gomes de Oliveira iniciamos o projeto "Tocando, cantando...fazendo música com crianças" no ano de 2005, com a assessoria pessoal da professora Iveta participando de reuniões, enviando material escrito e CDs para que pudéssemos dar início ao projeto. Trabalho com Infantil IV e iniciei o projeto com as cantigas de rodas e com as brincadeiras do CD "Abre a roda Tindo-lê-lê", sugerido por ela. Depois de explorá-lo bastante, propus uma atividade onde cada um cantaria a música que mais havia gostado, foi quando Bruno cantou: Amiguinhos vocês são bonitinhos Professora você, é muito bonita Agora vocês se abaixam E mandam muitos beijos para mim infantil educação ? A letra ele inventou na hora e todos os colegas começaram a rir, o que o deixou bastante chateado. Então eu disse que muitas pessoas criavam as músicas a partir de idéias que surgiam em suas cabeças e elas as transformavam em lindas canções. A Joseane resolveu criar uma letra e não cantou, mas falou: “A rodinha da professora Rosana, quem não girar ela vai ficar brava”. Eu disse: “Gostei, mas o que você acha de todos ajudarem a melhorar a sua letra?” Ela concordou, cada um deu uma idéia e ficou assim: A rodinha da professora Rosana Se não girar uma prenda vai pagar Como a roda girou bem bonito Um abraço e um beijo todos vão ganhar Achei que cantaram muito devagar e tentei acelerar. Foi aí que “desafinei” (palavra que passou a ser utilizada no contexto desta seção do Cadernos Tocando e Cantando para se referir a algo que não deu certo). 20 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 21 Desafinando: Experiências e suas reformulações Desafinando: Experiências e suas reformulações ■ No quarto momento, criaram a partir de paródias. Aprendiam uma música e logo inventavam uma letra na melodia conhecida. Depois de observarem imagens de orquídeas, criaram a letra "Orquídea", parodiando a primeira estrofe da música “O cravo e a rosa”. E em artes visuais o painel coletivo denominado "Orquídea". ■ No quinto momento, voltamos a usar a obra do Nerival Rodrigues, "Sem titulo - 2006". Eles observaram, criaram uma história coletiva, e a partir dela parodiaram a música: “Desfile da primavera”, do CD Canções na Pré-escola, criando Pintores de Mogi Em Mogi tem muitos pintores Que usam tinta de todas as cores Pra pintar a beleza de Mogi Entre eles nós vimos o Volpi Vimos Wilma Ramos e o Nerival Que é especial e muito legal a letra "Uma linda flor". Montamos, também, um arranjo musical, iniciando a música com a paisagem sonora criada no segundo momento desse processo que estou descrevendo. Essa música apresentamos para o artista plástico Nerival, Pinta, pinta, pinta Mogi Deixe tudo bonito por aqui quando ele visitou nossa escola. As músicas não ficaram boas e não conseguia orientar os dois alunos para que Quando a criança cria, ela utiliza os conhecimentos Uma linda flor Uma linda flor Lá no tronco da árvore Encantou o beija-flor E também o João-de-barro Que fez sua casa perto da linda flor E os passarinhos cantavam Sentindo o cheiro da flor Esta história nós vimos na obra do Nerival Que alegria nós sentimos Com a presença no Nerival ■ Para finalizar, fizemos uma composição coletiva com letra e melodia pudessem melhorá-las. Sugeri que tentássemos num outro dia e gravamos do aprendidos e interiorizados. Por vivenciarem atividades jeito que haviam cantado para não nos esquecermos. Posteriormente, tentamos com ritmos variados, quando pedi que criassem a melodia englobando tudo o que haviam visto em artes visuais, no decorrer do ano de montar arranjos com elas. Tive muita dificuldade... As crianças gostaram, mas tinham recursos para externar o que pedi. Fiquei contente 2007. Como haviam conhecido as obras de Alfredo Volpi, Wilma Ramos e Nerival eu não fiquei satisfeita. com o trabalho e apresentamos para todos da escola. Rodrigues, tendo com este último um contato pessoal, e consequentemente um O que eu não percebi naquele momento é que eu poderia ter valorizado o que No ano de 2007, o projeto de minha escola era o "Co- eles tinham feito, sem querer fazer a música ficar do jeito que eu achava certo, já nhecendo Mogi". Cada professora se incumbiu de criar com que, como diz Brito: sua turma uma música com os temas: artes visuais, Mogi, “Inventar canções pode ser interessante e divertido. A partir dos três anos as crianças música e valores. Minha turma ficou com artes visuais. costumam inventar canções. Na maior parte dos casos elas improvisam, cantando e con- Comecei a criação no início do ano. Com um pouco mais de tando história, casos etc. É preferível deixar que a criança invente letra e melodia - sem conhecimento na área de música, percebi a importância de interferência do adulto” (BRITO, 2003, p. 135). organizar as atividades de forma que as crianças pudes- carinho especial, a letra ficou assim, como está apresentada ao lado. Nas obras do Volpi se destacam bandeirinhas inspiradas nas festas de Mogi Já a Wilma Ramos Pintou as plantações de caqui que é fruta de Mogi Pinta, pinta, pinta Mogi Deixe tudo bonito por aqui O Nerival pinta a natureza e os animais, põe amor no que faz Pintou nossa escola . deixou ela mais bonita Ele pintava e me ensinava a pintar Por isso o Nerival é especial e muito legal Pinta, pinta..... sem, através de diversas experiências, ir ultrapassando as Naquela época eu não conhecia o livro "Música na Educação Infantil", da Teca etapas até chegarem à composição. Elaborei meu trabalho Alencar de Brito, e fiquei frustrada. Fizemos muitas outras atividades, o projeto contemplando diversas atividades que pudessem possibili- alcançou excelentes resultados, mas eu queria encontrar uma forma de fazer tar a vivência necessária à produção musical, que conforme com que as crianças passassem da improvisação para a composição, já que escreve BRITO (2003, p.57) “ocorre por meio de dois eixos conforme consta no RECNEI: “improvisar é criar instantaneamente e compor é – criação e reprodução – que garantem três possibilidades criar a partir de estruturas determinadas” (RECNEI, 1998, p.57) de ação: interpretação, improvisação e composição” No caso do Bruno, ele fez uma improvisação e a letra estava estruturada em ■ No primeiro momento, trabalhei com jogos, brincadei- forma de quadrinha. Já a Joseane fez uma frase improvisada e, coletivamente, a ras rítmicas e cantadas para que as crianças desenvolves- transformamos em quadrinha. Porém, a melodia não alcançou o que eu esperava. sem a percepção rítmica e musical. No ano de 2006, com turma de Infantil IV tentei trabalhar de outra forma. Peguei ■ No segundo momento, passamos para a improvisação uma letra já existente no CD “Criança vive cantando”, trabalhei a faixa nº 1 "A paz é usando os sons dos instrumentos e do corpo. A partir daí, demais". Pedi que criassem uma melodia para a letra. Como já conheciam vários comecei a integrar artes visuais e música. Observando a ritmos diferentes conseguiram fazer criações variadas. obra 'Sem titulo - 2006", de Nerival Rodrigues, artista plástico “As pesquisas sobre o ensino e aprendizagem da composição musical estão situadas no mogiano, pedi que imaginassem sons sugeridos pela obra e campo dos estudos da criatividade, sendo a composição entendida como uma manifestação os produzissem usando instrumentos, criando uma paisagem criativa” (BEINEKE, 2007, p.3) sonora. ■ No terceiro momento, estimulei as crianças a improvi- sarem letras e melodias, sem minha interferência. 22 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Sem título - 2006/ Nerival Rodrigues Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 23 Músicos da Região Desafinando: Experiências e suas reformulações A melodia também foi criada por eles com ajuda da monitora Luciana Massa- Rosana Ap. Martins de Miranda - Pedagoga ro, que trabalhava conosco na época. Ela mostrou vários ritmos no teclado e na e professora da Escola Municipal Profes- percussão, e escolhemos um. Colocamos a letra e no final do ano apresentamos a sor Antônio Paschoal Gomes de Oliveira. música "Pintores de Mogi" para os pais e a comunidade na festa de encerramento! [email protected] Consegui assim trabalhar com criação musical de forma prazerosa, respeitando cada fase das crianças. Pude perceber a evolução delas em cada momento. No final do ano elas se lembravam de todas as músicas que haviam criado e mesmo depois de muito tempo não se esqueciam das letras. Isso porque, conforme afirmam CERNEV e JARDIM em seu texto: " Para Piaget (1983), o afeto é o principal impulso motivador do processo de desenvolvimento mental da criança, e assim ocorreu nesse processo criativo. Através da música e de seu processo de criação, as crianças formaram um vínculo com sua produção ou autoria." ( CERNEV& JARDIM, 2008, p. 5) Os alunos se sentiram parte integrante das músicas, atuando sobre elas de diversas formas: interpretando, improvisando, transformando e criando, desenvolvendo assim um afeto maior por elas. É claro que o que deve ser considerado é o prazer, a afetividade, a vivência, o processo, e a criação/produção resultante disso tudo. Trabalhei buscando integrar música, linguagem oral e escrita e artes visuais. Percebi com essa experiência que o professor não pode desistir, mas sim buscar outros caminhos para realizar aquilo em que acredita. E, às vezes, pode levar mais tempo do que imagina. Daí a importância de pesquisar, se aprimorar e não desistir nunca. Pois é possível criar canções com alunos da educação infantil! ■ REFERÊNCIAS BEINEKE, Viviane. Atividade de Composição Musical na Educação Musical Escolar: Projeto de Pesquisa. ANAIS XVI Encontro Anual da Abem e Congresso Regional da ISME na América Latina. Campo Grande: Editora UFMS, 2007. 1 CD-ROM. BRITO, T. A. Música na educação infantil - propostas para a formação integral da criança. Peirópolis: São Paulo, 2003. BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. (vol.3) Brasília: Secretaria de Ensino Fundamental, 1998. BRITO, Teca Alencar de. Atividade de composição musical escolar: projeto de pesquisa. ANAIS XVI Encontro Anual da ABEM e Congresso Regional da ISME na América Latina. Campo Grande: Editora UFMS, 2007. 1 CD-ROM. CERNEV, Francine Kemmer & JARDIM, Tatiana Mota Santos. Composição Musical na Educação Infantil: Uma Proposta Possível. ANAIS XVII Encontro Nacional da Abem. São Paulo: Editora da UNESP, 2008. 1 CD-ROM. HORTÉLIO, Lydia. Abra a roda tin do lê lê. São Paulo: Brincante Produções Artísticas Ltda, s/d. 1 CD. POCHAT, Alex. Criança vive cantando / Vivendo valores um programa educacional. São Paulo: Editora Confluência, s/d. 1 CD. SANTANA, Celina. Canções na pré-escola - Série Amarelinha, N. 1. São Paulo: Editora Paulinas - Comep, 1985. 1CD TESTONI Jr, Mário (Arranjos e instrumentação). Meu limão, meu limoeiro. São Paulo: Sonopress - Rimo Ind. e Com. Fonográfica Ltda, s/d. 1 CD. 24 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes A cadência musical Mogi das Cruzes: de dos documentos históricos aos músicos mogianos Cassiano Santos de Freitas Darly Aparecida de Carvalho Nesta edição Tocando e Cantando conversou com Paulo Castagna, docente e pesquisador da Universidade Estadual Paulista, e com o maestro e tenor mogiano Sérgio Wernec Júnior. Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 25 Músicos da Região Músicos da Região Jonny Ueda - O Diário O tipo de música composta ou utilizada no Brasil, entre os séculos XVI e meados do XVIII era praticamente desconhecida, até a cidade de Mogi das Cruzes assumir um importante papel na história da música brasileira, quando Como acabamos falando dos copistas, qual a interferência deles nas obras musicais? P.C.: Várias das obras que estão no Grupo de Mogi das Cruzes já eram conhecidas de outras cópias dos séculos foi aqui encontrado, em 1984, um conjunto de 29 folhas XVIII e XIX, mas algumas obras são conhecidas somente manuscritas contendo 16 obras musicais, consideradas desta documentação mogiana. Oito destas peças são hoje como as mais antigas copiadas no Brasil. conhecidas somente nestes manuscritos, não havendo ne- Ninguém melhor do que o Prof. Dr. Paulo Castagna, do- nhuma outra fonte delas nem no Brasil e nem em Portugal, cente há 15 anos do Instituto de Artes da UNESP (Universi- enquanto outras são conhecidas em várias cópias paulistas, dade Estadual Paulista), especialista na pesquisa histórica mineiras, fluminenses e mesmo portuguesas. Os dezesseis da música brasileira, para nos dar detalhes sobre este copistas musicais e dez copistas do texto cantado que figu- importante achado. ram no Grupo de Mogi das Cruzes deixaram várias interfe- Ainda na trilha musical de Mogi das Cruzes, não pode- rências nas obras, produzindo alterações rítmicas e melódi- ríamos deixar de incluir nesta seção uma entrevista com cas. Em uma obra, por exemplo, o copista transformou dois o mogiano Sérgio Wernec Júnior, regente e fundador do compassos em um só, em outras foram modificadas claves Coral Musicativa de Mogi das Cruzes, atualmente canta no e alturas das notas. Mas o caso mais interessante é o do Coral Paulistano do Teatro Municipal de São Paulo e atua Ex Tratactu Sancti Augustini - uma composição do autor profissionalmente com a música erudita vocal. português Manuel Cardoso - na qual o copista transcreveu Apresentamos nossa entrevista com o Prof. Paulo Castag- apenas dois terços da obra, provavelmente porque ele não teve acesso ao restante da peça. na e, a seguir, com o regente e tenor Sérgio Wernec Júnior. Para qual tipo de conjunto musical essas peças foram escritas? P.C.: Todas as peças são corais com acompanhamento instrumental. Por se tratar de música sacra, cantavam apenas homens, às vezes meninos e adultos, e às vezes apenas adultos. Mas não existiam Prof. Dr. Paulo Castagna coros ou corais como os entendemos atualmente, pois nesse tipo de música normalmente atuava apenas uma pessoa por parte. O coro era, portanto, um conjunto de apenas quatro pessoas. E com Quando e como se deu a descoberta dos manuscritos musicais de Mogi das Cruzes? P.C.: Esses manuscritos foram localizados em 1984 por Qual o estado de conservação destes manuscritos? P.C.: Muito ruim, devido à antiguidade dos documentos. Quando foram parar na encadernação do Livro de Foral eles o acompanhamento instrumental não era diferente, somente uma ou duas pessoas tocavam essas obras na época em que foram copiadas. A maioria das peças requer apenas o acompanhamento de um baixo genérico, que é qualquer instru- Jaelson Bitran Trindade, pesquisador do IPHAN (Instituto do já estavam muito danificados e somente foram salvos por mento grave, melódico ou harmônico, podendo ser o fagote, o violoncelo, o contrabaixo, o órgão, etc. Patrimônio Histórico Artístico Nacional), na época chamado estarem na capa do códice, caso contrário teriam se perdido. Em alguns casos o cravo e a guitarra barroca também podem ter sido utilizados. Em somente uma das SPHAN (Serviço do Patrimônio Histórico Artístico Nacional). As folhas foram copiadas por muitas pessoas (pelo menos de- obras está especificado o acompanhamento de uma rabeca (nome português do violino), que já era pra- Foram encontrados como preenchimento da capa de um zesseis) em épocas diferentes, porém certamente na primeira ticado na música portuguesa do século XVII. No Matais de incêndios, a única música em português do códice mogiano do século XVIII, o Livro de Foral da Vila de metade do século XVIII e talvez ao redor da década de 1730. Grupo de Mogi das Cruzes, existe uma gravação na qual o acompanhamento foi feito com um tambor e Mogi das Cruzes, aberto em 1748, e que ainda estava com a uma guitarra barroca (versão antiga da atual viola caipira), cuja utilização deduzimos de sua análise e de 1, encadernação original. Na capa desse códice Jaelson Trindade seu contexto, embora tais instrumentos não estejam mencionados nos manuscritos. encontrou os manuscritos musicais, hoje conhecidos como o Grupo de Mogi das Cruzes. Qual é o estilo musical de tais peças? P.C.: As obras são sacras, quase todas em latim e, com apenas duas exce- E porque foram usados para preenchimento da capa do Livro de Foral? ções, foram escritas no assim denominado estilo antigo, às vezes conhecido P.C.: Provavelmente porque utilizavam um sistema de notação musical arcaico como maneirista, um estilo musical português do século XVII. Trata-se de um e também porque algumas das músicas já estavam fora de moda. O repertório estilo intermediário entre o renascentista e o barroco, geralmente homofônico2, representado no Grupo de Mogi das Cruzes é típico do século XVII, embora a quatro vozes e acompanhado por um ou mais instrumentos graves que dobram algumas peças tenham continuado a ser usadas nos séculos XVIII e XIX, mas o baixo vocal, mas sem o acompanhamento de orquestra de cordas, que surgiu com uma nova notação musical. Por isso, os manuscritos copiados em notação na fase barroca. O Matais de incêndios é um caso singular, pois não fica claro se arcaica foram sendo descartados, na medida em que a notação musical foi se o poema é sacro ou profano. Jaelson Trindade e eu debatemos muito sobre isso: renovando. Após serem descartadas de seu arquivo de origem e transformadas ele acha que é profano e eu acho que é sacro. A poesia, a única do Grupo de em papel velho, os manuscritos foram usados como preenchimento da capa Mogi das Cruzes escrita em português, tem uma forma muito arcaica, porém o do códice, uma prática habitual em períodos anteriores ao século XIX. Existem conteúdo parece ser da segunda metade do século XVII e neste momento creio outros casos, no Brasil e no exterior, de manuscritos musicais encontrados em ter sido composta em Portugal, mas ainda há muito a ser investigado sobre isso. capas de livros, mas o de Mogi das Cruzes é certamente o mais extraordinário Parece-me, juntamente com a Ladainha de Nossa Senhora, um representante do no Brasil, pela quantidade e pelo valor histórico dos documentos revelados. estilo barroco, embora da fase inicial do barroco. 1 - Códice - livro manuscrito. 26 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes 2 - Homofônico – um tipo de canto a várias vozes, no qual todas pronunciam as mesmas sílabas ao mesmo tempo. Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 27 Músicos da Região Músicos da Região Quais são os compositores e os copistas das obras do Grupo de Mogi das Cruzes? P.C.: Um único compositor foi identificado com segurança. Temos o nome de outro possível autor, porém os demais compositores ainda são desconhecidos. A atribuição mais segura de todas é a do Ex Tratactu Sancti Augustini, composta em Portugal pelo frei Manuel Cardoso (1566-1650), um carmelita que nunca veio ao Brasil, mas do qual chegaram aqui algumas obras. O português Pedro de Cristo (?-1618), que igualmente nunca esteve por aqui, parece ter sido o autor do Non in die festo que figura na documentação mogiana e em muitas outras cópias brasileiras da mesma obra. As análises e comparações das obras apontam para o fato de que esse repertório é predominantemente originário de Portugal, não tendo sido composto no Brasil, mas aqui utilizado em igrejas e capelas. Parece ter sido um conjunto de obras bastante antigas, que passaram por sucessivas mudanças e adaptações, até terem sido copiadas nos papéis encontrados no interior do Livro de Foral. Além disso, os três músicos que assinaram as cópias (apesar de existirem dezesseis copistas musicais diferentes no Grupo de Mogi das Cruzes), cujos nomes são Faustino Xavier do Prado, seu irmão Ângelo Xavier do Prado e o músico Timóteo Leme do Prado, outro possível parente, não parecem ter sido autores de nenhuma das peças, mas apenas seus copistas. Faustino Xavier do Prado viveu na Vila de Mogi das Cruzes, aqui sendo mestre da capela da Matriz e da Ordem Terceira do Carmo entre 1729-1734, tornando-se posteriormente Cônego da Catedral de São Paulo, onde morreu em 1800. Ângelo e Timóteo podem ter sido discípulos de Faustino; Timóteo tornouse mestre da capela da Vila de Sorocaba, desde pelo menos 1731, lá atuando seguramente até 1744, mas Ângelo não seguiu o ofício de músico, tornando-se comerciante de mulas. As partituras estão completas ou ainda existem partes delas que precisam ser encontradas? P.C.: Algumas obras do Grupo de Mogi das Cruzes estão completas, outras Na sua opinião, como os profissionais da educação podem tirar proveito de um achado como este? P.C.: Lembremos que estes são os manuscritos musicais estão incompletas mas podem ser facilmente reconstituídas, enquanto algu- mais antigos que já foram encontrados no Brasil. Em pri- mas estão incompletas e não permitem reconstituição, a não ser que surjam meiro lugar, trata-se de valorizar a história da música local, outras cópias em acervos de outras localidades. Mas de acordo com uma levando a conhecimento público um repertório aqui copiado notícia publicada no Jornal da Tarde em 19903, o historiador Isaac Grinberg, há quase trezentos anos. Não existe outro caso conhecido que foi o dono da Universidade Brás Cubas até seu falecimento em 2000, teria no Brasil, nem em muitos outros países. Quem deveria localizado, na própria cidade, sete folhas de música diretamente relaciona- se importar mais com essa música além dos próprios P.C.: das aos papéis localizados por Jaelson Trindade em 1984, a saber: a parte de mogianos? Também existem muitos registros históricos na 1-A. [PEDRO DE CRISTO?] - Non in die festo (Fragmento dos Bradados da Paixão de Domingo de Ramos) Tenor ausente nos Tractos (Domine audivi) e nos Bradados (Non in die festo) cidade referentes às atividades de mestres da capela, ao 1-B. [ANÔNIMO] - Jesum Nazarenum (Bradados da Paixão de Sexta-feira Santa) da Paixão de Sexta-feira Santa, a parte de Altus ausente na Antífona de Nossa pagamentos de músicos na matriz e na Ordem Terceira do 2-A. [ANÔNIMO] - Zelus Domus tuæ (Primeira Antífona das Matinas de Quinta-feira Santa) Senhora (Regina cæli lætare), as quatro partes vocais ausentes na Ladainha Carmo, e muitos outros, que ainda não foram totalmente 2-B. [ANÔNIMO] - Incipit Lamentatio Jeremiæ Prophetæ (Primeira Lição das Matinas de Quinta-feira Santa) (Kyrie, eleison) e uma outra cópia da parte de Altus do Matais de incêndios. estudados. Há muita coisa a ser compreendida na rica 2-C. [ANÔNIMO] - In Monte Oliveti (Responsórios das Matinas de Quinta-feira Santa) Esses manuscritos não estão mais na biblioteca de Isaac Grinberg, atualmente história musical desta cidade e o Grupo de Mogi das Cruzes 3. [MANUEL CARDOSO] - Ex tractatu Sancti Augustini... Exaudi, Deus (Quarta Lição das Matinas de Quinta-feira Santa) recolhida ao Arquivo Histórico Municipal de Mogi das Cruzes, ignorando-se o pode ser encarado como apenas um ponto de partida para 4-A. [ANÔNIMO] - Domine, audivi / Eripe me Domine (Primeiro e segundo Tractos da Missa de Sexta-feira Santa) seu paradeiro. Mas Diósnio Machado Netto, que teve acesso a esses papéis se pesquisar mais sobre o assunto. Mas já é possível, por 4-B. [ANÔNIMO] - Passio... secundum Joannem (Proêmio da Paixão de Sexta-feira Santa) encontrados por Isaac Grinberg, publicou uma edição da Ladainha pela editora exemplo, cantar, gravar, editar, dar aulas, abrir discussões, 4-C. [ANÔNIMO] - Quem quæritis? (Ditos de Cristo e Turbas da Paixão de Sexta-feira Santa) Criadores do Brasil (São Paulo: Osesp). Há também uma edição do Ex tractatu reflexões e mesmo brincadeiras sobre essas músicas em 4-D. [ANÔNIMO] - Heu! Heu! Domine! (Estribilho da primeira parte da Procissão do Enterro de Sexta-feira Santa) Sancti Augustini, do Non in die festo, do Domine audivi e do Regina cæli lætare escolas de Mogi. Se isso for feito com um interesse princi- 4-E. [ANÔNIMO] - Pupilli facti sumus (Versículos da primeira parte da Procissão do Enterro de Sexta-feira Santa) por Régis Duprat, em "Música sacra paulista" (São Paulo: Arte & Ciência, 1999). palmente humano, além de institucional, o Grupo de Mogi Quais os nomes dessas músicas? 4-F. [ANÔNIMO] - Sepulto Domino (Segunda parte da Procissão do Enterro de Sexta-feira Santa) das Cruzes será de enorme utilidade. 5. [ANÔNIMO] - Jesum Nazarenum (Bradados da Paixão de Sexta-feira Santa) 6. [ANÔNIMO] - Regina Cæli lætare (Antífona de Nossa Senhora do Tempo Pascal) 7. [ANÔNIMO] - Kyrie, eleison (Ladainha de Nossa Senhora) 8. [ANÔNIMO] - Matais de incêndios (Cantiga ou vilancico para o Natal?) 3 - CAMARGO, Oswaldo de. A redescoberta do barroco. Jornal da Tarde, São Paulo, 03 mar. 1990. 28 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 29 Músicos da Região Músicos da Região Sergio Wernec Júnior participou da gravação de uma das peças da série de 10 programas para televisão Quais os principais espetáculos, nos quais você tem participado?Que obras você tem apresentado? S.W.: São várias. Como solista tenho participado de intitulada História da música brasilei- grandes montagens, a mais recente foi o Macbet, de Verdi ra, da qual, coincidentemente, Paulo no Teatro São Pedro; La Traviata, de Verdi; Orfeu, de Monte- Castagna foi um dos autores. Sérgio verdi, entre outras óperas. Mas tem também música sacra: Wernec relata que foi tenor solista Réquiem de Mozart, missas de Mozart, cantatas e paixões de uma das peças mais antigas do de Bach, todos apresentados em São Paulo. Brasil, um provável vilancico4 de natal, intitulado Matais de incêndios. A minha atuação como cantor em Mogi começou mais depois que a orquestra foi formada. Já fiz, por exemplo, o Réquiem de Mozart. Minha atuação em Mogi é mais como regente dos Coral Musicativa e do Coral da UNAI. O professor Paulo Castagna comentou que você participou da gravação de uma das peças da história da música brasileira. Quando e como foi isto, e que peça foi cantada? S.W.: Este foi um projeto de história da música brasileira. Eu fiz parte do trabalho que foi coordenado pelo Ricardo Kanji, que contou com a participação do Paulo Castagna. Uma das peças mais antigas do Brasil é o vilancico Matais de incêndios, uma das peças do Grupo de Mogi das Cruzes. Coincidentemente, no CD História da Música Brasileira5, sou eu quem faz a parte do tenor solista. Mas foi coincidência mesmo, é uma peça de natal com um texto bem arcaico, inclusive o poema tem um sentido duplo. No CD há uma outra peça do Grupo de Mogi das Cruzes, o Ex tractatu Sancti Augustini. Sergio Wernec Júnior Você nasceu em Mogi das Cruzes? Trabalha com música há quanto tempo? Como você vê a questão da apreciação da música erudita na cidade de Mogi das Cruzes? S.W.: Sou mogiano, e trabalho com música profissional- S.W.: As pessoas geralmente vão assistir o concerto mente desde os 18 anos, quando entrei no Coro Sinfônico do porque alguém toca na orquestra, um parente que canta Estado de São Paulo, em 1994, mas estudo música desde os no coro e, geralmente, poucas pessoas vão mesmo porque 8 anos. Comecei com professores daqui de Mogi das Cruzes. querem ouvir música erudita. Sua formação? formei no curso de Bacharelado em Composição e Regência pela Universidade O que você acha que pode ser feito para que isto seja mais ampliado ou atingido? Estadual Paulista (Unesp). Minha maior atuação tem sido como cantor. Trabalhei S.W.: Acho que basicamente é pela educação, o que no Coro Sinfônico do Estado de São Paulo de 1996 a 2002, depois ingressei no vocês estão fazendo, que é começar desde criança, o indi- Coro do Teatro Municipal (Coral Paulistano) e nele continuo desde então. víduo apreciar diversos tipos de culturas, músicas não só S.W.: Estudei Canto e Piano com professores daqui de Mogi das Cruzes e me populares, mas também eruditas, músicas de raiz. Aqui em Mogi tem bastante esta coisa da Festa do Divino, músicas Seu trabalho como regente é voltado para o erudito ou o popular? Fale um pouco sobre isso. folclóricas fortes, congadas, manifestações culturais diver- S.W.: Eu trabalho basicamente com coro. Aqui em Mogi eu tenho dois coros: o Coral Musicativa que está em atividade sas. A Prefeitura deve continuar a apoiar mais o erudito. desde 1993 e que eu mesmo fundei, é um coro independente que vem de diversas formações; e o outro coro no qual eu trabalho é o coral da UNAI (Universidade Aberta a Integração), destinado à terceira idade. Neste é um outro enfoque musical, não mais a questão da formação, mas de saúde da voz. Fora isso, trabalho em um coro em São José dos Campos, na Fundação Cultural Cassiano Ricardo, chamado Coro Jovem Sinfônico de São José dos Campos, que tem um trabalho totalmente voltado pra formação e trabalho social, onde os integrantes recebem uma bolsa-auxílio para participar do coro. Vocês fazem muitos concertos com a orquestra Sinfônica de Mogi das Cruzes? S.W.: Pelo menos dois por ano de grandes obras. O último que a gente fez eu mesmo regi, que foi o Oratório do Divino, 4 - Vilancicos - Composições sacras ibero-americanas dos séculos XVII e XVIII que exploravam o gosto popular, sempre utilizando idiomas locais. Cantados nas igrejas e capelas, nos intervalos de Missas e Matinas, seus assuntos são sacros, mas de uso paralitúrgico. 30 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes peças folclóricas em atividade dentro da Festa do Divino. 5 ANÔNIMO. Matais de incêndios. In: HISTÓRIA da Música Brasileira: Período Colonial I; Vox Brasiliensis; regência de Ricardo Kanji. São Paulo: Eldorado, [1998], CD 946137. Faixa 36. Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 31 Com a mão na massa - Relatos de projeto Músicos da Região Que repertório dos mais conhecidos compositores você tem trabalhado no coro Musicativa? S.W.: Com a orquestra a gente fez Carmina Burana, de Orff, Réquiem de Mozart, Réquiem de Fauré, entre outras. Com peças avulsas a gente fez um concerto só de Legião Urbana com conjunto de rock e solista lírico, o que já vai pro lado mais popular, além de várias peças avulsas de diversos compositores. Fizemos um concerto só de Bach: foram duas cantatas. Concertos para escolas: é possível? S.W.: É possível sim, já fizemos em outras épocas. O coral Musicativa tem 15 anos. Já fizemos muitos trabalhos aqui. Está em andamento a negociação de uma parceria com a Banda Sinfônica Jovem Mario Portes. Eles têm a música instrumental e o coral no caso vai propor uma convivência com a música vocal. O que você pensa do projeto Tocando e Cantando? S.W.: Eu acho ótimo todo projeto que fale de música, a atividade musical para crianças é importante. É o começo... ■ Darly Aparecida de Carvalho - Diretora das escolas municipais Profª Cynira Oliveira de Castro e (R) Ana Maria A. V. Carrare. Graduada em Letras, Pedagogia e Direito, pós-graduada em Formação de Gestores da Educação Básica e Mestranda em Linguagens, Tecnologia da Informação e Educação. Professora da Universidade de Mogi das Cruzes. [email protected] Cassiano Santos de Freitas – Graduando em Licenciatura Educação Musical pelo Ins- A tituto de Artes da Universidade Estadual Paulista – Unesp e pesquisador estagiário da Fundunesp no projeto "Tocando, cantando... fazendo música com crianças" da Secretaria Municipal de Educação de Mogi das Cruzes. [email protected] PARA SABER MAIS Renascentista: música composta durante o Renascimento, situado aproximadamente entre 1450 e 1600, na qual valorizou-se o prazer auditivo das obras e a ciência da polifonia, ou seja, da composição pela superposição de diferentes melodias, porém engenhosamente relacionadas entre si. Barroco: palavra de provável origem portuguesa, cujo significado tanto pode ser pérola ou jóia irregular, é utilizada para definir um período da história da arte, que tinha por característica o excesso de ornamentos. Esta característica também ocorre na música, que adota o mesmo nome, aproximadamente entre 1600 e 1750, período demarcado entre o surgimento da ópera e a morte de Johann Sebastian Bach. Estilo antigo ou maneirista: é um estilo intermediário entre a música renascentista e a barroca. É geralmente homofônico, a quatro vozes e acompanhado por um ou mais instrumentos graves que dobram o baixo vocal, mas sem o acompanhamento de orquestra de cordas, que surgiu na fase barroca. Livro de Foral: Livro de Foral é um livro para registrar as decisões de foro jurídico próprio (direitos, deveres, liberdades e garantias) referentes a uma vila e seu termo (conselho, município). Cantatas: Palavra originada do substantivo italiano “cantare”, usada para designar um tipo de composição musical cantada por uma ou mais vozes com acompanhamento instrumental. A cantata pode ser religiosa ou profana. O texto - ao contrário da ópera que descreve um fato dramático - é lírico e descreve uma situação psicológica. Exemplo de grande compositor de cantatas foi Johann Sebastian Bach. 32 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes ideal cidade ... Ana Maria de Souza Heliana Pereira Pimentel Fernandes Tatiane Mendes Carvalho Foi a partir deste pensamento que pudemos desenvolver esse nosso trabalho A cidade ideal. Seguindo as atividades cotidianas do projeto "Tocando, cantando...fazendo música com crianças", notamos a dificuldade que nossos alunos tinham em prestar atenção na letra e apreender o que cada música queria dizer. O déficit de atenção era grande e precisávamos trabalhar esse elemento! Partimos então da música "A cidade Ideal', retirada do A linguagem musical tem um potencial transformador enorme, pois é musical “Os Saltimbancos”, com tradução e adaptação de um conhecimento que valoriza o que há de mais humano nas pessoas: Chico Buarque de Hollanda, música de Luiz Enriquez e a emoção, o transcendental e a paixão (GRANJA, 2006, p. 106). texto original de Sérgio Bardotti para um conto dos Irmãos Grimm, “Os músicos de Bremen”. Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 33 Com a mão na massa - Relatos de projeto Com a mão na massa - Relatos de projeto Iniciamos com uma pequena contextualização, contando Muitos desenharam corações simbolizando o amor, cidades “A cidade ideal” para cada um deles e se esse trabalho foi interiorizado pelo grupo. Ana Maria de Souza - Bacharel em Música com habilitação em sucintamente parte da história para os alunos, afim de que sem carros, somente com bicicletas e pipas; outros dese- É preciso pensar que o educador competente é um educador comprometido com a cons- Violão Erudito, Professora de violão erudito no Conservatório eles compreendessem a letra da música. nharam carros de vários tipos e cores, cidades sinalizadas, trução de uma sociedade justa, democrática, no qual saber e poder tenham equivalência Dramático e Musical Dr. Carlos de Campos de Tatuí e pesquisa- máquina do tempo para não crescerem, aviões que não enquanto elementos de interferência no real e organizações de relações de solidariedade, dora estagiária da Fundunesp no projeto "Tocando, cantando... o que conseguiram ouvir da música, e quando a sala não Depois partimos para um debate, onde eles respondiam soltavam fumaça e, sim, balas e doces, personagens de de- e não de dominação, entre os homens. (RIOS, 1997, p. 65). fazendo música com crianças" da Secretaria Municipal de Educa- respondia, colocávamos mais uma vez perguntando qual era senhos animados, chuva de dinheiro, parque de diversões e, a idéia dos animais sobre o que seria uma cidade ideal. Eles é claro, muitos doces... (em árvores, piscinas de chocolates, conseguiram apreender mais sobre a pequena história conta- sorvetes, chuvas de balas e guloseimas). da e explicamos então o todo, ainda fazendo perguntas bem simples e de fácil associação com a letra da música. Pedimos que cada um desenhasse elementos que fariam parte da sua cidade ideal. Ao término do desenho tínhamos a cidade ideal daquele grupo, fortalecendo a ideia de como Para continuar, na aula seguinte colocamos o DVD para assistirem ao musical, visto que já estavam envolvidos na ção de Mogi das Cruzes. [email protected] Juntando o tema trazido na música “Todos Juntos” do mesmo musical com o projeto de valores, na Semana do Idoso demonstramos através dos debates e falas Heliana Pereira Pimentel Fernandes- Cursou o Normal Superior vindas do grupo a importância do respeito, do carinho e da sabedoria do idoso. pela Unesp, Professora de Ensino Fundamental 1 da rede munici- Quando falamos em ciência do viver bem, já nos reportamos à idéia de que viver, para os pal de ensino de Mogi das Cruzes, na Escola Municipal Professora história e teriam mais interesse e atenção. Na sequência seres humanos, não é natural, não é apenas biológico: que a vida não mostramos o livro "Os Saltimbancos". nos é dada, mas precisa ser construída e significada. Portanto não é Em um terceiro momento, pedimos para ilustrarem no- seria criada uma cidade e o valor da contribuição de cada um vamente sua “cidade ideal”, agora em papel separado, visto naquele trabalho. O resultado visual trouxe cidades lindas! O que já conheciam o musical e as ideias do grupo, fascínio das crianças em poder ilustrar suas ideias foi encan- podendo assim rever o que seria Noêmia Real Fidalgo. [email protected] uma vida qualquer, mas uma vida que se quer digna, uma vida boa. Tatiane Mendes Carvalho – Bacharel em Música com habilitação (LORIERI / RIOS p.48). em Piano Erudito, aluna do 3º ano de Licenciatura em Educação Musical – Instituto de Artes / UNESP e pesquisadora estagiária da Esse processo foi bastante rico, terminando com uma visi- Fundunesp no projeto "Tocando,cantando...fazendo música com tador. Percebemos que a maioria das crianças desenhou em ta a um asilo, levando produtos de higiene arrecadados pelos crianças" da Secretaria Municipal de Educação de Mogi das Cru- sua cidade ideal árvores, riachos, flores, pássaros, borboletas alunos. Dessa forma procuramos integrar a música com o zes. [email protected] e animais, ilustrando a importância da natureza. projeto da escola, mostrando a possibilidade de trabalhos envolvendo a música no ensino fundamental da E.M. Profª Noêmia Real Fidalgo. ■ REFERÊNCIAS BARDOTTI, Sergio. Os Saltimbancos. 3 ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2007. GRANJA, Carlos Eduardo de Souza Campos. Musicalizando a escola: música, conhecimento e educação. São Paulo: Escrituras, 2006. LORIERI, Marco Antônio; RIOS, Terezinha Azeredo. Filosofia na escola: O prazer da reflexão. São Paulo: Moderna, 2004. RIOS, Terezinha Azerêdo. Ética e competência. 6ª ed. São Paulo: Cortez, 1997. ENRIQUEZ, Luiz (compositor); BARDOTTI, Sérgio (texto original). Os Saltimbancos. Tradução e adaptação de Chico Buarque. Fábula musical inspirada no conto dos Irmãos Grimm “Os músicos de Bremen”. Manaus: Microservice, 1977. 1CD. MUNDO ANIMADO. Os Saltimbancos. Manaus: Microservice Tecnologia Digital da Amazônia Ltda, sob encomenda de Works Editores Associados Ltda / Jundiaí-SP, s/d. 1 DVD. 34 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 35 Com a mão na massa - Relatos de projeto Com a mão na massa - Relatos de projeto Fazendo os com Giovana da Silva Marta Keiko Kaku Wasti Silvério Ciszevski Em comemoração ao Dia das Mães, a equipe da E.M. Profº João Gualberto Mafra Machado decidiu fazer uma semana especial na escola: "Semana Cuidando de quem cuida de mim". Isso visando orientar as famílias com relação aos cuidados básicos de sua saúde, a fim de alcançarem uma qualidade de vida melhor, para continuarem a desempenhar este papel de extrema importância na vida de nossas crianças, que é o de cuidar e educar com qualidade. A equipe da João Gualberto acredita que nesta atual sociedade, onde o tempo é o inimigo de muitas famílias, deve-se investir na qualidade deste tempo, a fim de suprir os momentos em que não estamos presentes na vida de nossos pequenos. A programação "Cuidando de quem cuida de mim" também visou à parceria entre pais e escola buscando, além de um momento de lazer à família, um maior comprometimento dos pais com a escola, o que é essencial e constitui um trabalho pedagógico interessante, conforme afirma o RECNEI: A presença dos familiares como elementos integrados ao trabalho pedagógico constitui-se em outro recurso interessante. O convite aos familiares para irem à instituição pode ser feito sob diversos pretextos, desde o simples relato ao vivo de um caso já mencionado pela criança, até a participação em alguma atividade para a qual possa ter uma contribuição especial. [...] Dessa forma, são aproveitadas as habilidades dos familiares para enriquecer o conhecimento e a vivência na instituição. (1998, p. 42) 36 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 37 Com a mão na massa - Relatos de projeto Com a mão na massa - Relatos de projeto Dentro da programação que englobou corte de cabelo, palestras sobre saúde, massagem orientada e atividades musicais, havia o dia “Quem canta seus males espanta”, em que seriam realizadas vivências musicais com os pais e depois haveria um momento de apresentações. A expectativa era geral até chegar o grande dia, pois não poderíamos prever quantos pais viriam e nem qual seria a reação deles. Foi preparada uma programação que englobasse atividades musicais que proporcionassem prazer, que agregassem valor cultural e formativo aos que participassem. Procuramos usar atividades já conhecidas das crianças para representar um pouquinho do trabalho feito com elas, com atividades que contemplassem: a expressividade, o canto, ritmos populares brasileiros, a escuta, o movimento, a exe- Dessa forma, acreditamos que este envolvimento dos pais criou mais respon- cução instrumental, dentre outros. Optou-se pela utilização sabilidade para eles mesmos e propiciou a valorização da educação, conforme de brincadeiras cantadas e ritmos de cultura popular brasi- explica Delors (2001): leira, pois estes são fundamentais para o desenvolvimento Quando as comunidades assumem maior responsabilidade no seu próprio desenvolvimento, humano, conforme afirma Lydia Hortélio (2004). aprendem a apreciar o papel da educação, quer como meio de atingir os objetivos sociais, Brincar é, para mim, o último reduto da espontaneidade que a quer como uma desejável melhora da qualidade de vida. (p.26) humanidade tem. [...] Acho que a música tradicional da infância é o que de mais sensível e mais essencial existe na cultura de um O ponto culminante deste dia foi a troca de apresentações, um momento mágico. povo. É o nascedouro da cultura brasileira. [...] Não sei o que a Fizemos uma brincadeira cantada em conjunto, o “Ip-Op” e, em seguida, foram escola está fazendo que não se inspira na cultura popular, em que feitas as apresentações dos filhos para os pais e dos pais para os filhos. Foi uma tudo é elementar. (p. 23,24) troca intensa e maravilhosa! As crianças ficaram fascinadas ao verem seus pais fazendo as mesmas atividades que elas fazem: cantando, tocando instrumentos, se Dessa forma, também seria demonstrado um pouco do trabalho realizado com as crianças por meio do projeto de música e seriam apresentadas brincadeiras e atividades movimentando,... As crianças estavam “rindo à toa”, e ver o sorriso no rosto deles foi gratificante, uma experiência inspiradora. E para completar a satisfação da equipe houve mais surpresas: alguns pais musicais que pudessem ser realizadas entre responsáveis e vieram nos procurar para poder dar continuidade ao trabalho musical em suas crianças em suas casas. casas, pedindo orientações e sugestões de CDs para as crianças ouvirem em Enfim, chegou o dia. Ao entrar na sala de música, os pais casa. Spodek e Saracho (1998) afirmam: recebiam uma folhinha com as atividades que seriam ali O envolvimento dos pais na educação das crianças tem uma justificativa pedagógica e mo- desenvolvidas. ral, legal. Quando os pais iniciam uma parceira com a escola, o trabalho com as crianças Alguns pais, ao verem que eles teriam “aula de música” ficaram muito apreensivos, alguns com medo, descon- pode ir além da sala de aula e a aprendizagem na escola e em casa possa se complementar Giovana da Silva - Pedagoga com pós-graduação em Educação Espe- mutuamente. (p.167) cial. Atualmente é diretora da Escola Municipal Professor João Gual- fiados e outros até revoltados. Nos corredores da escola podia-se ouvir “Vim até aqui achando que ia ouvir meu filho berto Mafra Machado. [email protected] Segundo o senhor James, pai do aluno Jhonatan do Infantil V - B, o trabalho de- cantar para mim e agora eu vou ter que fazer isso?”. Vendo senvolvido foi “...bem recreativo, foi legal para os alunos e interativo, foi importante Marta Keiko Kaku – Licenciada e Bacharel em Letras. Professora este receio inicial da parte dos pais, procuramos usar uma a escola demonstrar aos pais o trabalho que é feito com as crianças, nos fez sentir de Educação Infantil da Escola Municipal Professor João Gualberto dinâmica bem descontraída, mostrando que além dos diver- crianças novamente. Deveria acontecer mais vezes”. Mafra Machado. [email protected] sos benefícios que a música proporciona, ela pode ser uma atividade extremamente prazerosa. A experiência desta semana foi fundamental para que a escola refletisse sobre a importância da integração entre família e escola, e o dia “Quem canta seus males Wasti Silvério Ciszevski - Mestranda em Música pela UNESP, li- espanta” foi especialmente significativo nesta questão. A música é uma linguagem cenciada em Educação Musical pela mesma Instituição e formada tar” e a “curtir” aquele momento. O envolvimento deles foi impressionante e sua eficácia pôde ser comprovada a neste dia, integrando e for- em piano erudito pela EMESP (ULM). Atuou de 2006 a 2008 como impressionante. E devemos dizer: que afinação e que ritmo mando a nossa comunidade. Agora, além de nossos pais valorizarem e se interes- pesquisadora estagiária da Fundunesp no projeto "Tocando, can- eles têm!!! Foi realmente muito gratificante ver os pais sarem mais pelo trabalho musical desenvolvido na escola, podem estimular o gosto tando...fazendo música com crianças" da Secretaria Municipal de cantando, tocando e participando com entusiasmo. pela música em seus próprios lares. ■ Educação de Mogi das Cruzes. [email protected] No decorrer das vivências os pais começaram a “se sol- 38 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes REFERÊNCIAS ANDRADE, Mário. Pequena História da Música. São Paulo: Livraria Martins Editora, 1980. BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: Secretaria de Ensino Fundamental, 1998. (3 vol.) DELORLS, Jacques. Educação: um tesouro a descobrir. 6.ed. São Paulo: Cortez; Brasília: MEC: UNESCO, 2001. HORTÉLIO, L. Entrevista. Revista Pátio Educação Infantil. Porto Alegre, Ano I, Nº3, 21-24, dez 2003/ mar 2004. SPODEN, Bernard; SARACHO, Olívia N. Ensinando crianças de 3 a 8 anos. Porto Alegre: Artmed, 1998. Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 39 Com a mão na massa - Relatos de projeto Com a mão na massa - Relatos de projeto Criando esonorizando histórias Adriana Viza Sedano Lorca Reconhecendo essa importância e desejando torná-la realidade constante em “A importância da história no cotidiano das nossa prática docente, é que realizamos na Escola Municipal Professor Adolfo crianças é inquestionável. Ouvindo e, de- Cardoso no distrito de Quatinga, com a turma do Infantil V, um trabalho de criação pois, criando histórias, elas estimulam sua e sonorização de história. Sabemos que nessa fase a criança necessita expor suas capacidade inventiva, desenvolvem o conta- ideias, questioná-las e melhorá-las conforme seu conhecimento vai sendo cons- to e a vivência com a linguagem oral e am- truído e aprimorado e, que ainda, é de fundamental importância para ela, que sua pliam recursos que incluem o vocabulário, fantasia seja alimentada e estimulada. as entonações expressivas, as articulações, Tudo surgiu de uma prazerosa conversa que costumávamos ter todos os dias enfim, a musicalidade própria da fala.” a respeito de situações corriqueiras do nosso dia-a-dia, de lugares que fomos às (BRITO, 2003,p 161) coisas que fizemos. Um aluno havia citado que tinha lido um livro bem legal em casa. Depois de conversarmos sobre este livro, perguntei-lhes o que achariam de 40 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 41 Com a mão na massa - Relatos de projeto Com a mão na massa - Relatos de projeto inventarmos a nossa história. Com muita empolgação todos Devido à capacidade adquirida pelas crianças, por meio de atividades já de- tudo aquilo que havíamos pensado e planejado com grande entusiasmo. Como Apesar das crianças ainda não saberem ler, tiveram a concordaram e começaram as primeiras ideias: que tipo de senvolvidas ao longo do tempo em que estão inseridas no projeto de música, as crianças ainda não possuíam o domínio da língua escrita, fiquei responsável oportunidade de relacionar a escrita com a leitura ao narra- história seria, quantos e quais seriam os nomes dos persona- ficou mais fácil contar com a participação ativa delas. Como a história foi por elas por verbalizar a história que eu havia escrito enquanto escriba, para que pudes- rem a historia. No momento antes da gravação eu chamava gens, e assim por diante. criada, portanto, significativa e atual, facilitou a percepção dos momentos mais sem movimentar os dedoches de acordo com o momento adequado, e para que, cada criança e acompanhava com o dedo o trecho que seria importantes do texto aos quais a Teca faz menção. paralelamente, os instrumentos musicais fossem incluídos na dramatização. gravado, possibilitando a relação da fala com a escrita. Coube-me organizar e servir de escriba das idéias das crianças. Cuidei para que todos, até os mais tímidos falassem Para a sonorização, que também conhecia como sonoplastia, elencamos todos Alguns dias depois, quando pretendia já finalizar o projeto com uma apresentação Ao fim de todo esse trabalho as crianças puderam ver o um pouco, expressando também suas opiniões.Orientei-os os possíveis instrumentos que poderíamos utilizar nos momentos destacados, para os demais amigos da escola, bem como sua exposição, recebi sugestão por resultado em apresentação Power Point na sala de informá- quanto à organização temporal da história, auxiliando-os para que fariam tornar mais real toda aquela fantasia. Feito isto, fizemos comparações parte da orientadora de informática, para que informatizássemos o livro, transfor- tica. Em seus olhos brilhantes podia-se notar a satisfação e que compreendessem que toda história necessita de começo, dos sons e suas propriedades (altura, intensidade, duração e timbre), que faziam mando-o em slide show e, posteriormente, em vídeo, de maneira que as crianças o orgulho de terem sido eles os autores e co-produtores. meio e fim. E assim a nossa conversa foi fluindo com muito parte do nosso dia-a-dia, ou da nossa imaginação, tais como: sons da chuva, gravassem a leitura das páginas junto a seus respectivos sons, ou seja, utilizan- entusiasmo. Todos queriam falar ao mesmo tempo, expor suas do cavalo, de uma situação de medo, de encanto, etc, tentando assim imitar o do os instrumentos incluídos na sonorização. vontades. Aproveitei a oportunidade para trabalhar o respeito efeito sonoro real ou o que mais se aproximava do pretendido. Cada criança participante levou para casa um exemplar do livro em DVD, para que desta forma pudessem compartilhar Em sala de aula perguntei às crianças o que achavam da idéia. Todos adora- com familiares e amigos a felicidade de um trabalho construí- ram e quiseram logo participar. Então iniciamos esta nova etapa, utilizando o do em sala de aula. Todos os alunos e profissionais da escola que desta forma pudessem perceber as multiplicidades de sons e as várias formas de gravador de som do programa Windows na sala de informática. Foi necessária a assistiram a esta produção tão rica e, por consequência, tocar. Este exercício proporciona a percepção e a discriminação auditiva, apurando a divisão do grupo para que as gravações saíssem conforme o esperado e, poste- sentiram-se estimulados e capazes de produzirem também. respeito da estrutura física de um livro: capa, contracapa, sensibilidade e a escuta, além de estimular a imaginação e a criatividade, segundo a riormente fossem inseridas as ilustrações que foram “escaneadas” e incluídas dedicatória, agradecimento, autor, editora e tudo mais que autora Teca. Depois que fizemos tudo isto, deixei a critério das crianças escolherem o em uma apresentação em PowerPoint pela orientadora de informática. Todas as seguimos utilizar vários ambientes da escola: sala de aula, caracteriza um livro, para que percebessem que faltava que gostariam de fazer, quem tocaria e quem encenaria com os dedoches. crianças participaram também desta fase ora falando, ora tocando, sendo notória sala de música, CEDIC, Sala de Informática, e seus profis- a capacidade de concentração adquirida ao longo do projeto. sionais; várias mídias, como por exemplo os livros, computa- para com os colegas e a importância de esperar a sua vez para falar, como forma de valorização da opinião alheia. Em outro momento, conversei com as crianças a algo em nosso livro e assim o completar. Foi quando juntos pudemos finalizar a parte escrita de nosso livro. Organizadas as idéias, li para eles o produto final de Todas as crianças tiveram a oportunidade de explorar os instrumentos musicais para Escolhido o que cada um iria fazer, era chegada a hora de colocar em prática É importante enfatizar a diversidade deste trabalho. Con- dores e TV, diferentes linguagens entrelaçadas, a música, artes cênicas, escrita e oralidade, abrindo assim um leque de nossa história. Todos ficaram muito empolgados, então opções para oferecer à criança diversidade de oportunidades sugeri que fizéssemos daquela interessante história um para seu desenvolvimento, levando em conta as diferenças livro bem bonito e cheio de cores. Prometi que traria no dia individuais e valorização do trabalho em equipe. seguinte a história digitada e dividida em várias páginas, as Educar significa, portanto, propiciar situações de cuidados, quais eles poderiam ilustrar. Mais uma vez a empolgação brincadeiras e aprendizagens orientadas de forma integrada e foi nítida, eles se olharam felizes e tamanha foi a ansiedade que possam contribuir para o desenvolvimento das capacidades que na hora de ir embora fui cobrada por várias crianças infantis de relação interpessoal, de ser e estar com os outros em para não esquecer do que havia prometido. uma atitude básica de aceitação, respeito e confiança e o aces- Toda esta euforia é consequência da valorização da so, pelas crianças, aos conhecimentos mais amplos da realidade produção das crianças, que quando estimuladas sentem-se social e cultural. Neste processo, a educação poderá auxiliar o capazes de produzir e expor ideias. desenvolvimento das capacidades de apropriação e conhecimento Como previsto, trouxe as páginas digitadas. Um lugar das potencialidades corporais,afetivas,emocionais,estéticas e éti- com muitos livros e espaço adequado faria com que as cas, na perspectiva de contribuir par formação de crianças felizes crianças se sentissem inspiradas para criarem as imagens e saudáveis. (RECNEI, 1998, Vol. 1 p. 23) ■ de acordo com a história. Para essa atividade utilizamos a sala do CEDIC (Centro de Divulgação e Construção do Conhecimento). Mas havia um problema, as páginas do livro eram inferiores ao número total de crianças, dificultando assim a participação efetiva de todos. Foi quando lancei esta questão para as crianças, para que me ajudassem a resolvê-la. Depois de muita discussão, todos opinando inclusive eu, decidimos em comum acordo que faríamos outras atividades. Por exemplo: sonorização e dedoches para a encenação da historia, assim as crianças que não Adriana Viza Sedano Lorca - Pedagoga e professora na EM Profº ilustrassem o livro ficariam responsáveis por outras ações. Adolfo Cardoso. [email protected] E assim foi feito, todos trabalhando com esmero para que os nossos planos fossem concretizados. O educador ou educadora pode contar e sonorizar sua história ou realizar a atividade com a ajuda das crianças, quando é possível. Convém analisar previamente a história e destacar os momentos mais importantes, sendo preferível trabalhar com histórias não muito longas, que permitam que se dê atenção à sonorização. (BRITO, 2003, p. 163) 42 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes REFERÊNCIAS BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: Secretaria de Ensino Fundamental, 1998. (3 vol.) BRITO, Teca Alencar de. Música na educação infantil: propostas para a formação integral da criança. S. Paulo: Peirópolis, 2003. Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 43 ! Com a mão na massa - Relatos de projeto Com a mão na massa - Relatos de projeto Apreciar, Brincar e Cantar ... começar É só Vamos tentar com as mamães? Uma experiência de creche “Onde há música não pode haver coisa má.” Miguel de Cervantes Saavedra Helaine Cristina Bio Margarido Ao propor-se a desenvolver um projeto de música na primeira infância, mais precisamente com bebês de 3 meses a 3 anos, deve-se a todo momento resguardar o que de mais precioso a música nos traz – prazer e alegria. A "Vivência Musical" deve ser rica em oportunidades para as crianças escutarem o mundo à sua volta, escutarem música, aprenderem a entender seus elementos, reproduzirem cantando e tocando instrumentos e relacionando movimentos corporais à expressão musical. As oportunidades em uma aula e ao longo de um ano letivo de integrar a educação musical na aprendizagem das crianças são inúmeras. Elas não podem passar despercebidas desde momentos individuais como um ninar acompanhado de canção, o banho enriquecido pela estimulação, até as atividades coletivas propriamente planejadas para este fim, como a escuta do ambiente, do som do corpo, de uma história ou canção. É o que afirma Violeta Hemsy de Gainza, em "La Iniciacion Musical Del Nino": “os momentos mais característicos e importantes desta época de vida da criança podem acompanhar-se de canções. Assim, o banho, o passeio, a comida, o sono, o despertar...” (1986, p.55) 44 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 45 Com a mão na massa - Relatos de projeto O sentimento nesta fase precede à compreensão inte- É como diz Lydia Hortelio: “Brincar é o último reduto de es- lectual e o foco no ritmo por meio do canto, do movimento, pontaneidade que a humanidade tem”. Muitos dos depoimen- da poesia, da rima e da própria fala é o que estimula as tos das mães vieram de encontro à proposta: “agora entendi crianças a explorarem a música. o que é o projeto de música da escola de minhas filhas, estou Tendo incorporado estes fundamentos básicos, o pla- muito feliz por elas”, “é um projeto exemplar, onde desenvolve nejamento das atividades de momentos musicais flui de todos os interesses de uma criança para o convívio em grupo” maneira prazerosa e produtiva ao educador e à criança. É e “muito importante, pois vi o progresso e a independência como um encantamento: educadores desabrocham desejos que minha filha desenvolveu”. antes camuflados, como tocar instrumentos e cantar e Como já consta em nosso projeto, a finalidade do tra- as crianças acompanham naturalmente seus mestres nas balho com música não é a de tornar os alunos “músicos” propostas de brincar com a música. ou “compositores” ou “poetas” ou “escritores”, e sim O que com estes desafios se busca não é apenas descobrir em cada abrir a janela de sua inteligência musical e lingüística para aprendiz uma nova criatura, como abrir a cada mediador as pers- descobrir e para instrumentalizar a magia, a ludicidade e o pectivas para que, atuando de forma mais ampla, possa construir encantamento da linguagem sonora. Conceito este respal- e sentir a amplidão significativa de seu ilimitado papel. (ANTU- dado em Celso Antunes, “...uma coisa é “aprender música” NES, 2006, p. 16) e outra diferente é “utilizar-se da música” como estímulo à aprendizagem.” (2006, p. 65) ■ Mas e a comunidade – mães, família – tem realmente claro o que se desenvolve em um projeto de música com sobre o crianças tão pequenas? cotidiano Partindo do princípio de “vivência musical”, por que não oportunizar às mães “viver uma aula de música” com seu MUSICAL filho? Josette S. M. Feres, em seu livro “Bebê – Música e Movimento”, coloca ... é importante que mãe e filho tenham um tempo especial juntos, um tempo só deles e, então, o entendimento, a cumplicidade e a amizade entre eles será muito maior. (FERES, 1998. p.8-9) Esta foi a proposta da equipe escolar do CCII Sebastião da Silva em 2007 como homenagem ao Dia das Mães, e que devido ao grau de satisfação por parte da comunidade, repetiu-se em 2008. Cada turma, desde Berçário ao Infantil II, planejou para as mães uma aula como acontece normalmente com as crianças, com canto de entrada envolvendo o nome de cada criança, a hora do canto e exploração dos instrumentos, a expressão corporal, o relaxamento e o canto de despedida - adaptação do roteiro sugerido por Josette S. M. Feres em seu livro "Bebê – Música e Movimento'. Tudo foi carinhosamente preparado: Helaine Cristina Bio Margarido - Pedagoga, licenciada em Letras convite, mensagem a ser entregue, ambiente com decoração e pós-graduada em Educação e Gestão Escolar. Atualmente é dire- alusiva à data, a aula e um delicioso chá da tarde. Esse foi o tora do Centro de Convivência Infantil Integrado (CCII) Sebastião nosso presente às mães que todos os dias saem para traba- da Silva. [email protected] lhar e confiam a nós, educadoras deste CCII, dez horas do dia com seu filho. Não precisou de ensaios exaustivos, pois se tratou de vivência e não de apresentação. A experiência foi por demais gratificante, oportunizou às mães um momento único de deliciar-se com seu filho, no ambiente que ele passa o dia todo longe dela; e para a escola foi a maneira mais verdadeira de mostrar à comunidade o trabalho maravilhoso que desenvolvemos por meio do projeto de música. Pura emoção, como sugere a música em si, as mamães cantando, tocando, brincando de roda com seus filhos, como talvez jamais tivessem feito até aquele momento. 46 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes UMA NOVA VISÃO Com a mão na massa - Relatos de projeto REFERÊNCIAS ANTUNES, Celso. Inteligências Múltiplas e seus jogos: Inteligência sonora, vol. 8. Petrópolis: Vozes, 2006. FERES, Josette S. M. Bebê: Música e movimento – orientação para musicalização infantil. Jundiaí: Josette S. M. Ferez, 1998. GAINZA, Violeta H. de. La Iniciacion Musical del Nino. Buenos Aires: Ricordi, 1986. ROSA, Maria Alice. Lydia Hortélio. Revista Pátio, Educação Infantil, Ano I, Nº 3, Dez 2003/Março 2004. (p.21-24) Amália M. O. Rodrigues Leandra E. L. Santos O desenvolvimento de projetos junto aos alunos de creche é muito complexo, pois além de cumprirmos o horário das refeições, banho e solário, temos ainda as trocas de fraldas, roupas e o choro que pode acontecer a qualquer momento. Independente de tudo isso estamos no projeto de música desde 2006, quando nossa escola se uniu a outras escolas para ampliar as relações com a educação musical. Somente no ano de 2007, com a chegada da pesquisadora estagiária Camila Valiengo foi que conseguimos iniciar, de fato, nossas atividades e entender o verdadeiro significado do nome do projeto "Tocando, cantando...fazendo música com crianças". Com a nova visão de creche onde as salas não são somente depósitos de crianças e, sim, um lugar onde elas podem aprender e passar um dia agradável, conseguimos, com o apoio da Secretaria da Educação, participar das OTEs (Organização do Trabalho Escolar), cursos e palestras que nos trazem um riquíssimo conhecimento do qual não tínhamos acesso anteriormente. Uma de nossas OTEs foi em Jundiaí, conhecendo o trabalho desenvolvido pela professora Josette S. M. Feres na Escola de Música de Jundiaí, com bebês e crianças até sete anos. É sempre muito bom conhecer lugares novos e métodos de ensino diferentes. Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 47 Com a mão na massa - Relatos de projeto Com a mão na massa - Relatos de projeto Ainda que as realidades da Escola de Música de Jundiaí, a hora do Brinquedo Livre, sugerido pela professora Josette Feres em seu livro e do CCII tenham naturezas muito distintas com relação aos "Bebê: Música e Movimento", que é de grande importância, pois temos notado desenvolvidas que passou a ser mais uma ferramenta para objetivos, número de crianças e educadores, materiais diferen- que muitas vezes as crianças brincam imitando com bonecos ou brinquedos, o avaliar o processo em questão. Segundo o RECNEI ciados,... percebemos com felicidade que é possível realizar que foi visto durante o dia. “A avaliação na área de música deve ser contínua, levando em con- um trabalho de educação musical que seja representativo para Outro aspecto que era difícil a ser trabalhado no início é a coordenação motora Elaboramos um caderno de registros das atividades sideração os processos vivenciados pelas crianças, resultado de um o bom desenvolvimento das crianças. E mesmo em relação das crianças. Muitas delas ainda nem andam e torna-se difícil fazer os movi- trabalho intencional do professor.Deverá constituir-se em instrumento ao contato com essa linguagem e às habilidades necessárias mentos, principalmente com locomoção, pois não há a possibilidade de ter a para a reorganização de objetivos, conteúdos, procedimentos, ativida- para o amadurecimento de cada uma delas e do grupo. presença de um adulto por criança. des, e como forma de acompanhar e conhecer cada criança e grupo.” Ainda assim, com perseverança e paciência, continuamos incentivando que Música e Educação Um novo desafio, um novo conhecimento: Será que vai (RECNEI, 1998, p.77) participassem durante meses até obtermos resultados muito interessantes quanto ao envolvimento da criança no grupo. É o espetáculo mais lindo da Outro ponto interessante em nossa escola é que toda dar certo ensinar crianças de 0 a 3 anos através da música? natureza! Se no início questionávamos a compreensão dos bebês, hoje, com semana cada sala apresenta para as crianças suas vivên- Essa é a pergunta mais frequente em nossa realidade: traba- satisfação, percebemos que eles estão sentindo e interagindo com a música. cias do dia-a-dia. Em nossa escola há a interação entre a lhar concentração, coordenação, fala, respeito e organização. Com nossa prática temos obtido uma resposta positiva a Podemos notar também com o trabalho musical estruturado e organizado, que Educação Infantil e a Creche, onde uma pode se apresentar tem sido mais fácil para as crianças compreenderem e respeitarem as regras e à outra e vice-versa. Aprendemos que temos que dar opor- esse questionamento, pois nossas crianças de 0 a 3 anos, limites do grupo, ampliando inclusive para o respeito ao próximo e aos materiais tunidade à criança de ter contato com outras pessoas numa hoje com esse respeitado projeto, são crianças diferentes utilizados por eles. Considerando a citação abaixo: atmosfera expressiva e agradável. Neste dia, elas mostram e felizes. Gostam de estar na escola onde podem brincar, “O registro de suas observações sobre cada criança e sobre cada grupo será um valioso instru- que aprenderam a desenvolver a musicalidade, sensibilida- aprender música, sorrir e o que é muito importante: são mento de avaliação. {...} É recomendável que o professor atualize, sistematicamente, suas ob- de, percepção auditiva, senso rítmico e o principal, a sociali- bem queridas pela equipe escolar. servações, documentando mudanças e conquistas. Deve-se levar em conta que, por um lado, há zação de todos, desde os bebês até a equipe escolar. No início era difícil conseguir que os menores tivessem uma diversidade de respostas possíveis a serem apresentadas pelas crianças, e, por outro, essas mais concentração durante as aulas: era o nosso maior respostas estão frequentemente sujeitas a alterações, tendo em vista não só a forma como as desafio! Fomos orientadas pela nossa pesquisadora a mesclar crianças pensam e sentem, mas a natureza do conhecimento musical. Nesse sentido, a avaliação atividades que incluíssem apreciação de um repertório dife- tem um caráter instrumental para o adulto e incide sobre os progressos apresentados pelas crian- renciado, movimentos com ou sem locomoção, utilização dos ças.” (RCNEI, 1998, p. 77) Agora sim, podemos dizer: É possível tocar e cantar, fazer música com crianças de zero a três anos! ■ instrumentos musicais e outros objetos relacionados ao tema e organizar essas atividades em momentos específicos na A prática constante da observação e da avaliação e seu consequente registro permitem rotina escolar, favorecendo assim a almejada concentração. que, ao final do processo, o professor possa elaborar uma síntese, contando com dados Atualmente podemos dizer que é uma vitória ver todos importantes sobre o aluno durante todo o processo. (BRITO, 2003, p.197). os alunos atentos ao brincarem com a música “Abre a roda”, pois a partir daí começam nossas atividades diárias divididas entre manhã e tarde. No período da manhã priorizamos o canto e as músicas mais calmas. Logo após o café da manhã abrimos a roda, fazemos o canto de entrada e saudamos uns aos outros, pedimos paz e harmonia para o “Papai do Céu”. Sentados Amália M. O. Rodrigues - Fez Magistério e cursa Pedagogia, sendo em círculo e os bebês no colo ou no carrinho, utilizamos o Auxiliar de Desenvolvimento Infantil responsável pelo Infantil I no repertório que vem sendo desenvolvido e este é o momen- Centro de Convivência Infantil Integrado (CCII) Dr. Argêu Bata- to que eles mais gostam, pois escolhem as músicas que lha. [email protected] querem cantar, como "Dona Aranha', "Pintinho Amarelinho",... muitas de nossa infância e outras do folclore brasi- Leandra E. L. Santos – Cursou Ensino Médio, é auxiliar de Desen- leiro.Tudo dentro de um planejamento feito pela equipe. volvimento Infantil responsável pelo Berçário no Centro de Con- Incluímos nessa hora os movimentos sem locomoção e a expressão corporal, o que é muito importante nesta idade vivência Infantil Integrado (CCII) Dr. Argêu Batalha. leandra. [email protected] em que a exploração do próprio corpo e suas relações serão suportes para habilidades e competências que estão sendo adquiridas, como a própria fala. Para finalizar este primeiro período fazemos a hora do Relaxamento e Alongamento com uma música bem suave e calma, onde eles esticam todo o seu corpinho. As crianças ficam calmas e tranquilas. No período da tarde, as atividades são ministradas com movimentos com locomoção onde são usadas parlendas, marchas, rimas e cirandas. No final da atividade é chegada 48 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes REFERÊNCIAS BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Vol.3. Brasília: MEC/SEF, 1998. BRITO, Teça Alencar. Música na Educação Infantil: Propostas para Formação Integral da Criança. São Paulo: Peirópolis, 2003. FERES, Josette S. M. Bebê: música e movimento. Jundiaí / SP: Editora da autora., 1998. Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 49 Com a mão na massa - Relatos de projeto Com a mão na massa - Relatos de projeto Concerto na São Paulo, Sala a música erudita ao alcance das crianças “Aprender a escutar, com concentração e disponibilidade para tal, faz parte do processo de formação dos seres humanos sensíveis e reflexivos, capazes de perceber, sentir, relacionar, pensar, comunicar-se.” (BRITO,2003, p.187) Marinice Regina Alvim Tudo começou quando as professo- Osesp (Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo), aonde pavam do projeto “Tocando, cantando... teríamos a oportunidade de levar as crianças para assistir a um fazendo música com crianças” foram concerto didático na tão sonhada Sala São Paulo. assistir junto à professora Iveta Maria Ao iniciar o curso recebi o repertório que seria tocado Borges Ávila Fernandes o concerto no dia do nosso evento didático e com ele veio o nosso “Aprendiz de maestro - Mozart criança”, primeiro desafio. Nossas crianças iriam assistir no concerto em 2004, na Sala São Paulo. da série Aprendiz de Maestro, o episódio “Aprendiz brasilei- Ao chegarmos lá fiquei maravilhada 50 ma descubra a orquestra”, do Núcleo de Educação Musical da ras e diretoras das escolas que partici- rinho” do grupo Tucca. Quando vi o repertório, logo veio a com a beleza daquele local, amei a for- pergunta: “Onde estavam as músicas de Beethoven, Mo- ma lúdica com que o grupo Tucca apre- zart, Vilvaldi?” Naquela lista só aparecia Ernesto Nazareth, sentou as obras e a vida de Mozart, Chiquinha Gonzaga, Camargo Guarnieri. E agora? para seu público infantil. Mas o que Com auxílio da nossa pesquisadora estagiária Tatiane Men- mais me chamou a atenção foi ver o des Carvalho e também da professora Lídia Pereira dos Santos, enorme número de crianças tão con- conseguimos algumas das músicas que seriam executadas no centradas assistindo a um concerto! dia do concerto. No inicio achamos seria muito difícil, acreditá- Como pode crianças de todas idades, vamos que as crianças não iriam se interessar por aquele reper- sentadas apreciando uma orquestra tório, mas para a nossa surpresa, as crianças não só gostaram sinfônica tocando músicas eruditas? como também passaram a apreciar cada uma delas. Era lindo Logo veio aquela vontade enorme de ver as crianças de olhos fechados ouvindo cada composição e, proporcionar esse momento tão mágico em seguida, discutindo o que cada uma delas transmitia, quais aos nossos alunos que adoravam o instrumentos elas percebiam, as variações que as músicas projeto de música da escola. Mas este apresentavam. Eram crianças conversando como adultos. sonho ficou guardado por um bom tem- “A escuta tem grande importância na educação infantil, pois todos po, até que no 1º semestre de 2008 tive os demais conteúdos se alinhavam por meio da audição e da percep- a oportunidade de participar do “Progra- ção.” (AKOSCHKY, 1996, p. 202 apud BRITO, 2003, p.187) Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 51 Com a mão na massa - Relatos de projeto Com a mão na massa - Relatos de projeto “O prazer de ouvir e apreciar música pode ser desenvolvido ao E assim fomos seguindo, até que chegou o dia tão esperado longo da vida. Aprender a escutar a música é fundamental para pelas crianças. Todos chegaram animadíssimos, bonitos, unifor- apreciar sua forma, estilo, gênero, a interpretação vocal e instru- mizados, falando sem parar. Assim que chegamos na Estação mental, enfim, conseguir uma relação mais profunda com ela” da Luz e as crianças avistaram o relógio da torre da Sala São (COLL & TEBEROSKY,1999, p.138) Paulo foi um alvoroço dentro do ônibus e ao descermos, o deslumbramento foi intenso, eles diziam: “Olha prô, é igualzinho a Utilizamos as composições do concerto em diversas brinca- foto!!!”, “Como aqui é grande!!!”. deiras, dramatizações, expressões corporais, danças. E também Entramos na sala de concerto e eu estava um pouco fizemos muitas brincadeiras para trabalharmos as qualidades do apreensiva, pois o repertório que havíamos preparado as som, as pausas, as frases musicais, notação musical... crianças para ouvirem durante três meses, havia sido altera- Enfrentar Sempre Desafios... vale a pena Ana Lúcia Fernandes Gonçalves do! Então fiquei com medo que eles perdessem o interes- Algumas das atividades desenvolvidas ■ Dramatização: Após apreciação da música "Batuque" de Lorenzo Fernandez os alunos relataram oralmente e através do desenho o que eles imaginaram. (Surgiram muitas se, mas para minha felicidade eles assistiram ao espetáculo com tamanha maturidade, interesse e envolvimento que fiquei super orgulhosa deles. Na segunda-freira na escola sentamos para fazer idéias: perseguições, dragões, o bem vencendo o mau...). uma roda de conversa sobre o concerto assistido e eles Lancei então um desafio: vestindo fantasias eles deveriam trouxeram tantos detalhes como: as falas dos atores, as dramatizar o que imaginaram. Foi genial, eles adoraram e composições, os instrumentos, o prédio, a decoração do eu também! palco, a história da música brasileira; ou seja, eles perce- ■ Boneco de Argila (variação de atividade apresentada por beram tudo nos mínimos detalhes. Tudo isto me fez ver o Berenice S. de Almeida em wokshop organizado pela Secre- quanto todo o trabalho valeu a pena. Enriquecemos o nosso taria Municipal de Educação de Mogi / 2008): após a apre- repertório, conhecemos mais profundamente a orquestra ciação da música "Valsa de Esquina", de Francisco Mignone, e aprimoramos o nosso gosto musical. Com toda certeza uma criança era a argila e a outra era o escultor. Pedimos que estes compositores brasileiros já fazem parte da nossa lista a criança escultora esculpisse a argila criando um boneco de composições a serem trabalhadas no decorrer do ano, durante a execução da música. (Durante a atividade a criança assim como Beethoven, Mozart, Vivaldi.... só poderia esculpir enquanto a música estivesse sendo Conheça vocês também estas preciosidades: “Odeon” executada. Durante as pausas eles deveriam apenas apreciar de Ernesto Nazareth, “Batuque” de Lorenzo Fernández, a sua obra). Esta atividade foi elaborada e desenvolvida pela “Valsa de esquina” de Francisco Mignone, “Atraente” e nossa pesquisadora estagiáriaTatiane Mendes Carvalho. “Abre alas”, de Chiquinha Gonzaga, “Dança brasileira”, de ■ Dançando com tecido: após apreciar a música "Dança Camargo Guarnieri e “Quem sabe”, de Carlos Gomes. Brasileira", de Camargo Guarnieri, pedi que os alunos fizes- “Ouvir música é uma experiência da qual todos podem desfrutar: sem a dança com o tecido movimentando-o de acordo com Quanto mais escutamos, melhor será, pois passamos a compreen- as variações que música apresentasse. dê-la melhor.” (COLL & TEBEROSSKY, 1999, p.138) ■ Durante todo projeto utilizei como base o livro "A Orquestra Tintim por Tintim" para mostrar às crianças os instrumentos que faziam parte da orquestra. A todo momento que sobrava, colocava o cd com os sons dos instrumentos para que eles identificassem qual instrumento era aquele. Além dos instrumentos, trabalhamos também a função do regente, a distribuição dos instrumentos na orquestra, e Marinice Regina Alvim - Pedagoga e graduada em Educação Fí- como se portar em uma sala de concerto. sica com pós-graduação em Treinamento Desportivo. Atualmente Para aguçar ainda mais a vontade dos alunos e para avaliar o que eles tinham assimilado até o presente momento, levamos é professora da Escola Municipal Professor Antonio Paschoal Gomes de Oliveira. [email protected] as crianças à E.M Profª Florisa Faustino Pinto para assistirem a apresentação da fanfarra da escola. Após a apresentação, o professor da fanfarra foi muito gentil e conversou com as crianças sobre os instrumentos que faziam parte da fanfarra e elas puderam classificar quais faziam parte da orquestra sinfônica também e quais não faziam. Em seguida, as crianças “regeram a fanfarra” (aliás neste dia elas perceberam com clareza qual era a função da regência) e puderam manipular alguns instrumentos. Foi uma tarde muito proveitosa! 52 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes REFERÊNCIAS BRITO, Teca Alencar de. Música na Educação Infantil. São Paulo: Peirópolis, 2003. COLL, César & TEBEROSKY, Ana. Aprendendo Arte. São Paulo: Ática, 1999. HENTSCHKE, Liane, et al. A orquestra Tintim por Tintim. São Paulo: Moderna, 2005. Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 53 Com a mão na massa - Relatos de projeto Com a mão na massa - Relatos de projeto E assim, por vontade de acreditar no possível, a escola aderiu ao projeto. Iniciamos o ano letivo de 2006 e com passos muito “A dificuldade da mudança não pode apagar nosso sonho e nem pequenos, iniciamos dentro das nossas possibilidades. intimidar nossa curiosidade. É ela que nos faz perguntar, conhecer, As atividades referentes ao projeto eram então realizadas atuar, reconhecer. A curiosidade convoca a imaginação, a intuição, conforme a orientação da profa. Iveta. A participação nos as emoções, a capacidade de conjeturar, de comparar, de buscar cursos, palestras e reuniões com as escolas já envolvidas conhecer o que precisamos para constatar que a nossa prática em no projeto, também foram de muita valia para o enriqueci- sala de aula vale a pena.” (PAULO FREIRE: 2005, p 84-90) mento do trabalho que estava sendo iniciado. Aos poucos as atividades iam se espalhando por toda a Estávamos no ano letivo de 2005 e tínhamos na escola escola e havia momentos em que surgiam de forma muito uma diversidade de professores com ideias diferentes e espontânea. vontades diferentes. Professores que socializavam expe- Com a chegada do Everton, contratado como pesquisador riências e informações de atividades realizadas em outras estagiário para nossa escola, o projeto fluiu um pouco mais, escolas onde substituíam e desenvolviam essas atividades porém ainda não estávamos muito bem entrosadas na lingua- com nossos alunos em sala de aula, de forma lúdica. gem musical. Neste momento começamos a sentir a maior di- Observava sempre que os professores eram muito ficuldade que era ter um espaço adequado onde pudéssemos animados e sempre estavam dispostos a novas ideias. realizar as aulas que aconteciam no pátio, algumas vezes no Realizavam muitas atividades com excelentes resultados e espaço livre que possuímos (que por sinal é muito agradável). em minha opinião já passava o momento para que estas ati- Mas, especificamente para algumas atividades em que eram vidades deixassem de acontecer somente de forma interna necessárias uma atenção e concentração maiores por parte e quebrar aquele pré-conceito de que “só lembram da es- dos alunos, muitas vezes tínhamos que fazer um revezamento cola quando acontece alguma coisa errada”. Era necessário dos professores em sala de aula, para podermos dispor de um mudar nosso próprio olhar em relação à nossa escola. espaço um pouco mais adequado. O grupo de professores já estava quase que homogêneo. As aulas foram acontecendo, as adesões aumentando, Digo quase por que cada ser humano tem sua historicidade a animação dos alunos ficava cada vez mais evidente e e seus valores que necessitam ser respeitados, mas existe aprendíamos uns com os outros. também o respeito ao aluno e à comunidade, onde muitas A partir daí iniciamos a elaboração das atividades para vezes esse confronto de valores gera conflitos. Festa da Primavera, com apresentações que nos davam Esta inicial homogeneidade da equipe fazia com que numa forma dialógica, de maneira que todos pudessem expor suas opiniões, envolveria toda a comunidade escolar e seria importante a participação de todos, sinais de pequenos resultados. Foi uma boa festa! Apresen- muitos professores aceitassem as ideias “vindas de fora”, seus desejos e suas emoções. Foi um grande aprendizado! Percebi que valeu até porque era uma comunidade onde muitas crianças já estavam envolvidas com tamos oficialmente o projeto à comunidade, e tivemos uma exemplos de experiências que eram desenvolvidas com muito a pena ter-me utilizado desse método para discutir todos os assuntos o projeto "Canarinhos do Itapety”. boa resposta por parte dos pais. Ainda assim, achava que os alunos. E tudo acabou virando uma “grande brincadei- cotidianos da escola e sem que as professoras percebessem, pouco a pouco ra”, que muitas vezes acontecia em horário de intervalo ou amadurecemos juntas nas discussões. em atividades de recreação como, por exemplo, o "Ip Op" Foi na reunião de final de ano para avaliação do ano letivo, que ao preenchermos A discussão foi acalorada, porque envolveu a emoção de cada um e tivemos precisaríamos de algo mais, mas sem saber definir o que opiniões das mais diversas, indo das mais resistentes às mais empolgadas, seria. A festa passou e iniciamos os preparativos para as frases como por exemplo: apresentações de todas as escolas do projeto, que ocorre- e a "Tumbalacatumba" (Brinquedos cantados que fazem as planilhas solicitadas pela Secretaria Municipal de Educação quanto aos Projetos "- Ah! Vai ser legal, já trabalhamos com algumas músicas não é tão difícil." parte de "Pandalelê", livro, CD áudio e CD ROM). Eram ati- da escola, foi colocado em pauta participar ou não do projeto, até então chamado "- A escola vai receber uns instrumentos legais. Os alunos vão adorar." vidades que surgiam espontaneamente com um ou outro por todos como “Projeto de Música.” riam em outubro no Clube Náutico. Foi um trabalho difícil, optamos por apresentações simples, "- É, mas e a apresentação? Como que vamos fazer? Sempre tem cobrança no final!" mas com o máximo de conteúdo possível, sem nos preocupar Lembro-me bem que neste dia, como de costume nosso, reunimos-nos na E, assim, decorreu por um bom tempo o debate entre o sim e o não e o com figurinos e demais alegorias que pudessem atrapalhar os mesa de café da manhã e iniciamos nossa conversa sobre o que queríamos para interessante foi perceber que muitas vezes esse “não” não era sectário, era alunos, pois afinal era uma estreia para eles e naquele momen- nossos alunos; o que seria desenvolvido no próximo ano e que já era chegada a apenas duvidoso, era um querer embutido em uma timidez e emoção reprimida. to não dispúnhamos de muitos recursos para tais despesas. conversas paralelas que aconteciam entre as professoras em hora de mudar nosso paradigma em relação aos projetos propostos e em relação Partindo desta observação achei que o mais prudente naquele momento seria relação à participação de projetos, às ideias e informações que à própria Secretaria de Educação. que cada um votasse a favor ou contra argumentando seu voto. Qual não foi a iniciado o trabalho com os instrumentos musicais havia ape- surpresa quando na hora do voto o acalorado não, tornou-se um nas dois meses. Neste momento ninguém mais se lembrava professor e que por fim acabou contagiando os demais professores e todos os alunos. Assim, no decorrer daquele ano passei a observar as muitas vezes, como já disse, eram trazidas de outras escolas. Seguindo item por item a avaliação que nos foi encaminhada, chegamos ao que Neste tempo eu já fazia parte do Círculo Mogiano de Cul- dizia respeito aos projetos propostos para o ano letivo de 2006 e entre eles estava O resultado da apresentação foi muito bom, pois tínhamos “- Ah! Pra mim, tudo bem, mas eu acho que não tenho muito jeito para isso”. “daquele pré-conceito inicial”, pois a satisfação do resultado tura – Cátedra Paulo Freire e passei a ter o como costume o “Tocando, cantando... fazendo música com crianças”. Nesse momento fiz a pro- Surgiu uma resposta imediata: positivo foi tão grande que motivou mais ainda a equipe, e as fazer nossas reuniões de organização de trabalho escolar posta e achei que seria pertinente ouvir todos os professores porque esse projeto "- Não tem problema, vamos junto nisso." crianças sentiram-se muito felizes pelo resultado. 54 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 55 Com a mão na massa - Relatos de projeto Com a mão na massa - Relatos de projeto SAITA ,SAITA... Nesta apresentação realizada no Clube Náutico, não nos era possível levar todos os alunos, portanto tivemos que nos deparar com cobranças dos alunos e dos pais que também queriam participar. Esta cobrança foi vista como um entusiasmo, onde todos estavam querendo participar e mostrar o trabalho que estava sendo realizado. Partindo deste entusiasmo, mudamos o foco da Festa do Livro que era realizada todo ano com as 1as séries e decidimos que faríamos uma festa de encerramento do ano letivo com apresentações de todas as salas para que então pudéssemos atender a todos. Mais do que palavras, o que aconteceu naquele dia as imagens revelam por si só! A satisfação dos alunos e professores estava estampada em cada sorriso e a emoção dos presentes FLORIU A CULTURA JAPONESA PELA MÚSICA muitas vezes era constatada em discretas lágrimas. Encerramos o ano letivo e na reunião final de avaliação tivemos a participação dos pais membros do Conselho de Escola, que fizeram uma avaliação positiva do ano. E na elaboração do calendário para o ano seguinte surgiu dos pais junto aos professores, a ideia de resgatar um pouco de “danças antigas”, assim denominadas pelos pais naquele momento. A ideia amadureceu e no ano seguinte a festa foi totalmente elaborada visando o resgate da cultura popular, indo ao encontro das sugestões dos pais e dentro de todo o contexto dos cursos de formação que ocorreram. Apesar de não podermos ter todos os professores participando, todo conteúdo destes cursos foram socializados. Um momento marcante dessa socialização foi em um dos Horários de Organização do Trabalho Escolar (OTE) realizado com o pesquisador estagiário, no qual os professores experimentaram várias danças, e identificaram de imediato o texto da Lydia Hortélio, lido em uma das primeiras reuniões de formação com a profa. Iveta realizada na EM Profª Guiomar Pinheiro Franco. “Brincar é o ultimo reduto de espontaneidade que a humanidade tem” Lydia Hortélio (2004, p. 21-24) Naquele momento dançar a “ciranda do profº Ikeda” foi mais que um experimento, foi uma grande diversão, um brincar. Com um novo olhar para a “Festa Junina”, tivemos uma participação realmente surpreendente de todos os alunos e muito prestigio e apoio dos pais e responsáveis. Sonhar e acreditar que os sonhos sempre se tornam realidade Ana Lúcia Fernandes Gonçalves - Diretora da Escola Municipal Profa. Marlene Muniz quando temos ao nosso lado pessoas que acreditam e sonham Schmidt e pesquisadora do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação Cátedra Paulo conosco. Esse acreditar não para e naquele momento caminha- Freire (Círculo Mogiano de Cultura). [email protected] mos para desenvolver um bom trabalho no Fórum Mundial de Educação, sediado no ano de 2007 em Mogi das Cruzes. ■ REFERÊNCIAS TADEU, Eugenio. Pandalelê – Brinquedos Cantados. São Paulo: Palavra Cantada s/d 1 livro, 1 CD áudio, 1 CD ROM. ROSA, Maria Alice. Lydia Hortélio. Revista Pátio, Educação Infantil, Ano I N. 3, Dez 2003/Março 2004. (p. 21-24) FREIRE, Paulo. Saberes necessários à pratica educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996. (Coleção Leitura) 56 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Bruna Rocha de Siqueira Colaboradores: André José Rodrigues Junior Claudinéia Cristina Ignácio Galocha Cristiane Kátia Domingos de Barros Eulália Anjos Siqueira Luciana Rosa Fernandes Abib Luciana Monteiro Nádia Espíndola Fernandes Vanessa Gerlinger Romero Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 57 Com a mão na massa - Relatos de projeto Com a mão na massa - Relatos de projeto TYURIPPU (Música infantil) O enfoque de todas as atividades do CCII Ignêz Maria de Moraes Pettená durante o primeiro semestre de 2008 foi a comemoração do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil. Entre as diversas abordagens pensadas e realizadas pela equipe escolar, uma delas envolveu e contagiou as crianças de Saita, saita tyurippu no hana ga Naranda, naranda aka, shiro kiro Dono hana mite mo kireidana Saita, saita tyurippu no hana ga Naranda, naranda aka, shiro kiro Dono hana mite mo kireidana forma avassaladora: a música. O primeiro passo foi dado pelo nosso pesquisador estagiário do projeto "Tocando,cantando... fazendo música com crianças", André José Rodrigues Junior, que apresentou aos alunos, aos professores e ADIs, uma música japonesa chamada "Ookina Kuri No", que, segundo o pesquisador André, é uma música infantil de crianças brincando em volta de uma castanheira. No início pensei que nós professores, crianças e ADIs (Auxiliar de Desenvolvimento Infantil) não íamos conseguir pronunciar a letra da música, mas o que era apenas um dos enfoques Tradução: TULIPAS Floriu, floriu as flores de tulipa Todas juntas, vermelha, branca e amarela Olho para todas elas Todas são lindas. Floriu, floriu as flores de tulipa Todas juntas, vermelha, branca e amarela Olho para todas elas Todas são lindas. das comemorações do Centenário da Imigração Japonesa, tornou-se algo muito mais significativo para as crianças. INU NO OMAWARISAN (Música Infantil) Ao longo das aulas percebemos o interesse das crianças pela música japonesa. Apesar das crianças da nossa escola terem no máximo quatro anos, elas pronunciavam sem dificuldades as frases da música, o que até então parecia uma dificuldade. Nos Maigo no, Maigo no, konekotian Anata o ouchi wa dakodessuka Ouchi o kiitemo wakaranai Nanai o kiitemo wakaranai momentos mais diversos da rotina escolar, seja na hora de brincar, de se alimentar e até mesmo em casa (segundo relatos dos pais das crianças) elas tinham na ponta da língua a letra da música "Ookina kuri no". Esse súbito Nia nia nia nia Nia nia nia nia interesse das crianças, instigado pelo pesquisador, fez com Naite bakari iru konekotian Inuno omawanisan Komati shinate que nós da equipe escolar repensássemos a prática abordada com as crianças e a OOKI NA KURI NO (Música Infantil) partir do interesse delas plane- Wan wan wan wan Wan wan wan wan jamos as nossas próximas práticas. Decidimos, então, pesquisar mais músicas Ookina kuri no ki no shitade Anata to watashi Nakayoku asobimashoo Ookina kuri no ki no shitade infantis japonesas e organizamos duas apresentações para o dia do Centenário da Imigração Japonesa no Brasil, 18 de junho de 2008, que envolveram turmas do Infantil II e III. Nessas apresentações seriam trabalhadas não só a música, mas também a dança, assim como preconiza o Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil: Chiisana kuri no ki no shitade Anata to watashi Nakayoku asobimashoo Chiisana kuri no ki no shitade Ookina kuri no ki no shitade Anata to watashi Nakayoku asobimashoo Ookina kuri no ki no shitade Deve ser considerado o aspecto da integração do trabalho musical às outras áreas, já que por um lado, a música mantém contato estreito e direto com as demais linguagens expressivas (movimento, expressão cênica, artes visuais etc), e, por outro lado torna possível a realização de projetos integrados. (RECNEI, 1998, p.48) Após uma pesquisa das professoras Luciana Abib, Luciana Monteiro, Nádia, Vanessa e eu, Bruna, optamos pelas músicas "Tyurippu" e "Inu no Omawarisan", além da música já proposta pelo pesquisador André. Inicialmente pesqui- ■ As crianças ouviram as músicas. ■ Identificaram a diferença da língua materna com a japonesa. ■ Discriminaram os sons dos animais presentes na música "Inu no Omawarisan" (cachorro, gato). ■ Perceberam ritmos diferentes entre as músicas. ■ As professoras contaram sobre o que falavam as músicas. ■ Elaboramos junto às crianças a encenação da música. ■ Visitamos a igreja japonesa “Terienko” próxima à escola, Tradução: CÃO DE GUARDA O gatinho está perdido Onde é a casa deste gatinho? Perguntei para o pardal e ele não sabe Perguntei para a rolinha e ela não sabe Nia nia nia nia Nia nia nia nia que continha diversos instrumentos musicais japoneses. Só sabe ficar chorando O cão policial ficou preocupado samos o significado de cada uma das músicas para contextualizar para as crianças. Buscamos temas que se aproximassem do universo das crianças e que também Tradução: Debaixo da Castanheira O trabalho seguiu os seguintes passos: transmitissem uma mensagem, um significado a quem assistisse a apresentação. Wan wan wan wan Wan wan wan wan As músicas escolhidas para a apresentação encenada foram "Tyurippu" (tulipas) e Vamos brincar, você e eu, alegremente, Debaixo da grande castanheira.” Inu no "Omawarisan" (cão de guarda), que expressam em seus versos, de forma figurada, o sentido de cooperação, a importância do fazer coletivo em busca de um objetivo, e a amizade. Essas virtudes vão ao encontro da proposta da escola e fortaleceu Tradução e revisão do japonês: Áurea Tamae Inumaru (BEINEKE, 2001, p.21) 58 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes o trabalho pedagógico por meio do sentido da música. Esse sentido foi estabelecido pelas crianças, pois nós professoras tivemos o cuidado de apresentar a música, contar sobre o que elas falavam, para depois construir uma encenação com as crianças. Este instrumento é o KOTO. Conheça mais sobre sua história na página seguinte. Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 59 Com a mão na massa - Relatos de projeto Com a mão na massa - Relatos de projeto O D AN A S C I E ... S R Ú Oe ] “três cordas de sabor” é um instrumento musical de três cordas, geralmente fabricado com cou- N ro de cobra ou gato. Fazendo uma comparação com o ocidente, este objeto se assemelha ao banjo, composto por caixa de I ENS ressonância, braço e cravelhas. Contudo, o sangen (outro nome dado ao instrumento) não possui casas nem trastes e seu corpo (dô) possui um formato retangular ovalado o qual amplifica o som das cordas. A partir da popularização do sanshin, um instrumento originário de Okinawa, no século XVI, surgiu o shamisen. Devido à semelhança de forma e nome, e principalmente das boas relações entre Ryukyu (atual Okinawa) e a China, deduz-se que tudo se originou do sanxian.O shamisen M é tocado com uma espátula chamada bachi. Tradicionalmente fabricada de marfim ou casco de tartaruga, hoje em dia a principal matéria-prima utilizada é a madeira. O bachi é utilizado tanto para tocar as cordas como também para pequenas batidas no dô, trazendo para este instrumento uma segunda característica, a percussão." Fonte: www.nipocultura.com.br CIA IÊN E! R E NT XP A E ENDE UM E PR SUR "Koto [ ] - é um instrumento musical de cordas dedilhadas, composto de uma caixa de ressonância com diversas cordas, m co “O SHAMISEN [ C SONS semelhante a uma grande cítara. Atualmente é o mais popular dentre os instrumentos musicais tradicionais japoneses. Geraldo Monteiro Neto Cassiano Santos de Freitas Tanto quanto piano ou violino, meninas em idade escolar aprendem o koto. A história do koto é longa. O instrumento já com as suas principais características atuais foi introduzido no século VI (época do imperador Kinmei) vindo da China (dinastia T’ang). Ele já possuía o corpo feito com a madeira tradicional do Japão o Kiri (Paulownia), sendo todo laqueado. Ele era chamado de Kin-no-Koto. Data desta época a partitura mais antiga para o Koto (Yuran-fu que se encontra guardada no Templo Shinhoin)”. Fonte: www.nipocultura.com.br Após todo esse processo de elaboração, apresentamos as músicas para a equipe escolar no dia em que comemoramos o Centenário da Imigração Japonesa no Brasil. O sucesso foi tão grande que tivemos retorno dos pais, da equipe escolar e até das empresas parceiras da nossa escola. Todos já sabiam, por intermédio das crianças e dos funcionários da escola, sobre a apresentação das músicas japonesas. Depois da nossa estreia nos apresentamos no Grupo Julio Simões (uma das empresas parceiras da escola) e Música tradicional na Secretaria Municipal de Educação de Mogi das Cruzes, japonesa tocada onde quem assistiu a apresentação admirou-se diante de com o SHAMISEN crianças tão pequenas cantando em japonês. Todo esse trabalho aparentemente corriqueiro na vivência da educação infantil, contribuiu de forma muito incisiva para a Bruna Rocha de Siqueira - Cursou Magistério, é licenciada em Lín- formação das crianças e de toda a equipe escolar. Por meio da gua Portuguesa, Língua Inglesa e Respectivas Literaturas, cursa música pesquisamos, conhecemos e criamos a partir da cultura Pedagogia e é professora de Educação Infantil no Centro de Con- japonesa. A música foi o início de um grande envolvimento de vivência Infantil Integrado (CCII) Profª Ignez Maria de Moraes todos do CCII com a história dos japoneses no nosso país! ■ Pettená [email protected] REFERÊNCIAS BEINEKE, Viviane. Canções do mundo para tocar. Florianópolis: Cidade Futura, 2001. BRASIL. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília: Secretaria de Ensino Fundamental, 1998. (3 vol.) http://www.musicajaponesa.net – Acesso em: 13/03/2008 http://www.nipocultura.com.br - Acesso em: 13/03/2008 tica. antás ncia f iê r udo e nge. T a exp tão lo o um id ir s e tem dess m Esta to pu ola co proje e t s a esc e n e o u it os q a fe cores ue er ginam com alho q a ima s b c a a n ç r u t e N a do p rvar o o um usan obse cend ores s le u ao s e o e ç b f a e pro incom e est as: os muito ões, autist ação , cart s s ic a o n r n u u alu uma com e fig uma rando e e g a i o f rotin . Isto sante de. teres a riosid lho, u c a t traba cer a de in t o enr Essa ndam , é fu e , d a alid ACCH na re do TE o t é a no M ido n tada nvolv dese i o f nta que sesse da de a c é to de d amen epart D ulo n a Fac tria d ia u iq Ps dicina e Me d e d da ade iversid na Un do rolina da Ca Es, nos Norte s. Unido tados http://pt.wikipedia.org Acesso em 13/03/2008 60 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 61 Com a mão na massa - Relatos de projeto Com a mão na massa - Relatos de projeto No segundo metalofones que permitissem a retirada de notas da escala, Foram feitos cartões com círculos coloridos, que conforme o método Teacch, semestre do restando somente as que de fato seriam tocadas. Este re- devem ser apresentados ao aluno com o objetivo de fazer o emparelhamento de ano de 2007, a Secretaria Municipal de curso se torna muito útil quando trabalhamos com crianças cores. Assim, ao mostrar o cartão vermelho, o aluno tocaria a barra que estivesse Educação de Mogi das Cruzes, através e jovens, pois possibilita aumentar a chance de “acerto” do com a cor vermelha, e assim por diante. Começamos então a experimentação. do projeto “Tocando,cantando...fazendo aluno, na medida em que ele pode lidar com um número música com Crianças” estabeleceu menor de notas. Progressivamente, vão-se acrescentando uma parceria com a Fundunesp, tendo as demais barras do instrumento, até que a criança possa como objetivo nos anos de 2007 e 2008, executar a música sem precisar retirar nenhuma delas. cutando sequências melódicas cada vez maiores e mais complexas. A cor como sinaliza- desenvolver um material didático para Pareceu-nos, portanto, o instrumento ideal. Mas surgiu ção é muito presente na nossa cultura, como por exemplo, na sinalização de trânsito. o ensino de música. Como parte deste uma preocupação de como sinalizar a barra com a cor, sem Com estes alunos fomos avançando e elaborando novas fases deste processo. processo foi realizada uma pesquisa alterar a afinação do instrumento. Vários materiais foram diagnóstica, por meio de um questionário testados, até encontrarmos a solução utilizando círculos de nosticada síndrome de Down, Paralisia Cerebral, Psicose, entre outros tipos para os professores responderem. Como papel colorido, encapados com contact, no centro de cada de necessidades especiais. E os resultados foram mais surpreendentes. A resultado surgiu a solicitação de algo que barra do xilofone e do metalofone. Foi um improviso, mas a cada alteração feita na partitura, os alunos correspondiam imediatamente. No tivesse apelo à linguagem visual, porque afinação do xilofone foi preservada... entanto, tivemos o cuidado de respeitar o tempo de concentração de cada muitos alunos não verbalizam, e existe Esta fase foi muito interessante. Para as experimentações, as atividades propostas foram desenvolvidas com quatro alunos autistas que participaram dos testes. Todos respondiam imediatamente à sinalização com as cores e logo estavam exe- As atividades também foram desenvolvidas com alunos nos quais foi diag- O Xilofone e o Metalofone possuem 3 barras adicionais a necessidade de se estabelecer uma um, que normalmente é muito curto. com as seguintes notas Fá#, Lá# e Fá#. As comunicação com eles. Começamos então a buscar esta comunicação e como sinalização mais Para este sucesso todo, a presença do professor é de fundamental importância. Notas Fá# foram etiquetadas com a mesma Todos, especialmente os autistas, estabelecem vínculos afetivos com os profes- cor da Nota Fá, levando em consideração o sores que estão com eles em um período muito maior, depositando neles a sua tamanho da Barra. A nota Lá# foi etique- confiança, podendo se sentir inseguros longe da figura familiar do educador. direta achamos que a cor seria uma tada com a mesma cor da nota Com o passar do tempo foi possível observar que as dificuldades de aprendizado ótima opção. Muitos livros e métodos Si. A mesma exercerá a função eram iguais às de qualquer aluno de música. Um cronograma de atividades foi elabo- usam cores como leitura relativa, mas da nota Sib, enarmônica de Lá#. rado, ainda trabalhando apenas com a cor e o tamanho da figura. E, como o método como neste caso a intenção era ir Conforme exemplo abaixo. Teacch recomenda, o código relativo foi gradativamente substituído pelo convencional. substituindo pela notação musical, a Como é possível observar idéia foi buscar uma organização que na foto da página 64, o ta- alcançados. A cada dia que passa novas ideias vão surgindo e, por isto, a primeira manho do círculo tem uma parte desta pesquisa ganhou o nome de “Notação Musical”. Grande é o otimismo fosse também um reinício. A partir daí, para cada relação com o tamanho da do quanto é possível continuar e crescer. “Ensinando Música com Cores e Sons” foi cor foi relacionada uma nota musical: barra do instrumento. e ainda tem sido, uma experiência surpreendente! ■ tivesse fundamento e não inventar ção de continuidade, como se o final da escala uma nova notação. A TV Cultura exibia, há algum tempo atrás, um programa que se chamava “O Mundo de Beakman”, onde lições de ciências eram apresentadas por personagens Dó - Vermelho, Ré - Laranja, Mi - Amarelo, Fá Verde, Sol - Azul, Lá - Anil, e Si - Violeta. Ainda é possível encontrar outras cores inter- muito atrapalhados, mas que explicavam mediárias, mas a princípio trabalhamos apenas muitas coisas. Um dos personagens do com estas sete. Atribuindo a cada uma destas programa se chamava VLAVAAV, que cores uma nota musical, teremos a escala nada mais é do que as iniciais das sete diatônica de "Dó maior". cores do arco-íris: Vermelho, Laranja, Amarelo, Verde, Azul, Anil e Violeta. Sete cores, sete notas musicais... Aí estava a nossa organização! Estas lem a e r o l c l o c Poc (F Sol do em consideração que lidamos com a impressão a jato de tinta (ou seja, ão) Mi Fá Sol Mi Dó esta cor não é obtida pela refração da luz e sim pela pigmentação), foi escolhida uma tonalidade de azul mais clara do que a indicada no disco de Newton. O educador musical Zoltán Kodaly propõe uma técnica interessante, que ficou conhecida como "Dó luz solar. Ao passar por gotículas de Móvel". Consiste em “transportar” os nomes das notas (Dó, Ré, Mi etc.) para qualquer escala que se água presentes na atmosfera, que deseje executar. Desse modo, a pessoa memoriza a relação intervalar entre as notas, independente- funcionam como um prisma, a luz mente da tonalidade. No caso do "Ensinado Música com Cores e Sons", como a sinalização é feita com branca se “divide” em sete matizes, a cor, a adaptação à técnica do "Dó Móvel" é feita no próprio instrumento: a ordem das cores deverá compondo uma escala que vai do ver- ser ajustada à afinação que se pretende utilizar. No caso de uma música em Sol Maior, por exemplo, melho ao violeta. A fundamentação as cores deverão ser posicionadas de maneira que o vermelho corresponda ao Sol, o laranja ao Lá e teórica desta escolha pode ser vista assim sucessivamente, compondo a escala maior do vermelho ao violeta. Se, por outro lado, a afinação no livro “Da cor à cor inexistente”, escolhida for outra, como Fá Maior, a escala de cores, sempre se iniciando pelo vermelho, deverá ser de Israel Pedrosa, que apresenta um posicionada para começar pela nota Fá. (WIKIPEDIA, Dó Móvel, disponível em <http://pt.wikipedia.org/ disco com as sete cores do arco-íris, wiki/Técnica_do_dó_móvel> Acesso em 15/03/2009.) elaborado por Isaac Newton por volta O próximo passo foi preparar um instrumento musical para este fim. E como isto aconteceu? de 1665. Este disco traz uma sensa- O compositor e educador musical Carl Orff propôs a utilização, para fins didáticos, de xilofones e Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Poc Po Para facilitar a distinção entre o Azul (Sol) e o Anil (Lá), também levan- cores são o resultado da refração da 62 Muitos acertos ainda deverão ser feitos, mas os grandes resultados já foram Ré Dó Dó Ré Sol Mi Sol Mi Dó Ré Sol Ré Ré Mi Sol Mi Sol Dó Fá Mi Ré Dó Sol Mi Ré Dó Fá Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 63 Hã? Hein? Traduzindo o "musiquês" Com a mão na massa - Relatos de projeto Cassiano Santos de Freitas – Graduando em Licenciatura Educação Musical pelo Instituto de Artes da Universidade Estadual Paulista - Unesp. pesquisador-estagiário da Fundunesp no projeto Tocando e Cantando... Fazendo Música com Crianças da Secretaria Municipal de Educação de Mogi das Cruzes. [email protected] Geraldo Monteiro Neto - Graduado em Educação Artística com Habilitação em Música pelo Instituto de Artes da Unesp. Pós-Graduando em Educação Especial e Inclusiva pela Faculdade Internacional de Curitiba. [email protected] Traduzindo o s " " ê Mu iqU S REFERÊNCIAS ANTUNES, Jorge. A Correspondência entre os Sons e as Cores. Brasília: Thesaurus Ed, 1982. Marinice Regina Alvim Rosana Ap. Martins de Miranda Tatiane Mendes Carvalho LOURO, Viviane dos Santos. Educação Musical e Deficiência: Propostas Pedagógicas. São José dos Campos: Ed. do Autor, 2006. MAHLE, Maria Aparecida. 16 Peças Para Banda Rítmica: Melodias Folclóricas. São Paulo: Irmãos Vitale Editores, 1969. PEDROSA, Israel. Da cor à cor inexistente. 8° edição. Rio de Janeiro: EDUFF, 2002. MULTIMÍDIA BASS, Ron, Produção Robert Lawrence, Ron Bass, Frank Demartini, James Acheson; Co-Produção Lati Grobman, Direção Petter Naess, Direção de Fotografia Svein Kroevel, Gênero Comédia Romântica, Mozart and the Whale. Versão em Português, Loucos de Amor. EUA Califórnia Filmes, 2005. 1 DVD. WEB SITES AMA, Associação de Amigos do Autista; Autismo, Disponível em < www.ama.org.br> Acesso em 23/01/2008. GIKOVATE,Carla; Método Teacch para Pais, Disponível em <http://www.carlagikovate.com.br/index_arquivos/Page790.htm > Acesso em 15/03/2009. GOULART, Diana; Dalcroze, Orff, Suzuki e Kodaly, Quatro educadores e suas metodologias; semelhanças, diferenças e especifidades, Disponível em < http://www.dianagoulart.pro.br/bibliot/dkos.htm > Acesso em 17/01/2009. OPERA PRIMA; Método Kodaly, Disponível em <http://operaprima.mus.br/pam/metodo.htm> Acesso em 15/03/2009. WIKIPEDIA, Dó Móvel, disponível em <http://pt.wikipedia.org/wiki/Técnica_do_dó_móvel> Acesso em 15/03/2009. 64 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 65 Hã? Hein? Traduzindo o "musiquês" Hã? Hein? Traduzindo o "musiquês" Orquestra Conjunto grande de instrumentos, podendo ter várias formações. É constituída por quatro grupos de instrumentos chamados naipes ou famílias de instrumentos que são: cordas, madeiras, metais e percussão. Percussão Percussão Madeiras Madeiras Metais Metais Cordas Cordas (1) Percussão Madeiras Metais Cordas Naipes Metais Ficam dispostos atrás das madeiras e são compostos por: trompa, trompete, trombone e tuba. Cordas São colocados na frente e nas laterais próximas ao regente da orquestra e constituem mais da metade dos instrumentos. São eles: violino, viola, violoncelo, contrabaixo. Dependendo da música, a harpa pode ou não integrar a orquestra. 1 - Gráfico apresentado no livro “Desvendando a Orquestra: formando platéias do futuro” de Clarice Miranda e Liana Justus. 66 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 67 Hã? Hein? Traduzindo o "musiquês" Hã? Hein? Traduzindo o "musiquês" As crianças e os instrumentos da orquestra Percussões Ficam atrás dos demais instrumentos. A percussão é composta por: tímpanos, bombo, caixa clara, pratos, triângulo, marimba, vibrafone, carrilhão, gongo, pandeiro, bloco de madeira, castanholas, maracas, clavas, As fotos foram tiradas no dia em agogô, cuíca e tudo que pode ser que os alunos da E.M. Prof. Antonio agitado ou percutido com as mãos ou Paschoal Gomes de Oliveira foram através de baquetas. assistir ao "Concerto Didático" da Banda Sinfônica Jovem Mário Portes, em Jundiapeba, com a intenção de mostrar a proporção do instrumento em relação à criança. ■ Alguns autores colocam o piano como instrumento de percussão e outros como instrumento de cordas, por ser um instrumento de teclado com cordas percutidas. Madeiras São colocados no centro da orquestra e compostas por: REFERÊNCIAS HENTSCHKE, Liane, et al. A orquestra Tintim por Tintim. São Paulo: Moderna, 2005. flauta transversal, flautim, oboé, corne inglês, clarinete, clarone, fagote e contrafagote. Marinice Regina Alvim - Professora da Escola Municipal Professor Antonio Paschoal Gomes de Oliveira, formada em Pedagogia e Educação Física e pós-graduada em Treinamento Desportivo. [email protected] Rosana Ap. Martins de Miranda - Pedagoga e professora da Escola Municipal Professor Antônio Paschoal Gomes de Oliveira. [email protected] O número de instrumentos e os 68 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes tipos podem variar de acordo com a Tatiane Mendes Carvalho - Bacharel em Música com habilitação em Piano Erudito pela UNICSUL (Universidade sonoridade especificada pelo compo- Cruzeiro do Sul). Aluna do 3º ano de Licenciatura em Educação Musical – Instituto de Artes / UNESP e pesqui- sitor e período histórico ou pelo arran- sadora estagiária da Fundunesp no projeto "Tocando, cantando...fazendo música com crianças" da Secretaria jador da música que será executada. Municipal de Educação de Mogi das Cruzes. [email protected] KOSCIELNIAK, Bruce. A incrível história da orquestra. São Paulo: Cosac & Naify, 2002. MIRANDA, Clarice, JUSTUS, Liana. Desvendando a orquestra: formando platéias do futuro. Curitiba: Expoente, 2007. ROY, Bennett. Instrumentos da orquestra. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985. SADIE, Stanley. Dicionário Grove de música: edição concisa. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1994. Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 69 Adherbal Ferreira Junior Carlos Roberto Prestes Lopes Eulália Anjos Siqueira (Você encontrará ajuda nos artigos indicados.) Sonoplastia Encontre no artigo “Criando e sonorizando histórias” Tuba Encontre no artigo “Orquestra” 1. ******fone - prefixo utilizado para o instrumento de metal 14. Fernando *****, músico,arte-educador e construtor de instrumentos mu- sicais com materiais alternativos Refere-se à quantidade de sons simultâneos Looooongoooo ou curto 9. 10. 12. partituras mais antigas encontradas no Brasil Família dos instrumentos da Orquestra na qual está a Trompa Família dos instrumentos da Orquestra na qual está a Viola Professora Entrevistada nesta edição do Cadernos Tocando e Cantando “Forte” ou “Fraco” “Agudo” ou “Grave” Família dos instrumentos da Orquestra na qual está a Flauta Transversal Cidade onde foram encontradas as partituras mais antigas do Brasil Instrumento musical de sopro onde a altura do som é defini- Técnica de sonorização de uma história, onde procura- 3. Ópera de Giuseppe Verdi da qual nosso entrevistado se imitar a sonoridade de variados elementos da cena. Sérgio Wernec Júnior já participou como solista. Nesta obra musical, o romance entre a prometida Violetta e o apaixonado Alfredo sofre diversos percalços, culminan- Encontre no artigo “Fazendo música com os pais” "Pintores de Mogi" da através da movimentação do pistão interno (o êmbolo). 2. Ip-Op do ao término da ópera no reencontro do casal já nos últimos momentos da vida de Violetta. 4. 5. Instrumento mais grave da família dos metais. Brincadeira cumulativa gestual cantada, onde cada novo achado durante a letra recebe um gesto que o repre- Encontre no artigo “Concerto na Sala São Paulo, a senta, terminando assim com uma grande sequência música erudita ao alcance das crianças”. de gestos. Foi executada com grande prazer por pais e Encontre no artigo “Por dentro da Lei”. Flauta de Êmbolo Encontre no artigo “Boneco de Ar”. alunos, na EM Profº João Gualberto Mafra Machado 6. Composição muito conhecida do brasileiro Ernesto Nazareth. 7. Música composta pelos alunos e equipe escolar da E. M. Prof. Antônio Paschoal Gomes de Oliveira, em processo "La traviata" Encontre no artigo “A cadência musical de Mogi das Cruzes”. Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Livro ou volume antigo manuscrito pouco mais seu conhecimento... Canto Orfeônico 70 Família dos instrumentos da Orquestra na qual está o Tímpano edição do Tocando e Cantando. Há palavras que destacamos de alguns artigos, às quais você deve Odeon página 99. Característica que permite identificar de qual instrumento é o som ligar a estas respostas e ampliar um Educação Infantil?” da seção Batuta na Horizontais 2. 4. 7. 8. 11. 13. 15. 16. 17. 18. c r u z Palavras d a s Apresentamos aqui algumas informações adicionais sobre nomes/objetos citados nos artigos desta Encontre no artigo “Composição na Respostas dos jogos ***** Castagna: pesquisador da história musical brasileira, que estudou as Ligue as palavras Grande divulgadora do ensino musical para bebês QUIZ Quem constrói instrumentos musicais manualmente O NOSSO ****fone - prefixo utilizado para o instrumento de madeira Batuta - Curiosidades sobre músicas, músicos, instrumentos... Verticais 1. 3. 5. 6. BATUTA Batuta - Curiosidades sobre músicas, músicos, instrumentos... que integrou música, linguagem verbal e artes visuais. 8. Nome da disciplina através da qual a música se fazia presente nas escolas antes de 1961. Carlos Roberto Prestes Lopes - Aluno do 4º ano de Licenciatura em Eulália Anjos Siqueira - Pedagoga, pós- Educação Musical no Instituto de Artes da UNESP e pesquisador graduada em Gestão de Processos Ensino/ Adherbal Ferreira Junior - Professor estagiário da Fundunesp no projeto “Tocando, cantando...fazen- Educação e Gestão da Educação Básica. de Ensino Fundamental na EM Prof. do música com crianças” da Secretaria Municipal de Educação de Professora de Educação Física e diretora.do Primo Villar Mogi das Cruzes. [email protected] CCII Profª Ignez Maria de Moraes Pettená Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 71 Indicação de livros, sites, CDs, DVDs Indicação de livros, sites, CDs, DVDs Bebê Música e Movimento Josette M. Feres Jundiaí / SP: J. S. M. Feres Nesse livro a autora Josette Feres nos 72 Educação Musical e Deficiência Música em Diálogo Ações Disciplinares na Educação Infantil - Propostas Pedagógicas Caroline Cao Ponso Porto Alegre: Editora Sulina Viviane dos Santos Louro, Alex Ferreira de Andrade e Luís Garcia Alonso. São José dos Campos / SP: Ed. do Autor Este livro apresenta o diálogo da música com as demais áreas do conheci- Escrito por dois professores de música mento e apresenta sete capítulos: Ações e um médico geneticista, "Educação Interdisciplinares em Música / Música e Musical e Deficiência" é um texto raro na Literatura Infantil / Lendo, escrevendo, tráz um pouco sobre sua experiência compondo e alfabetizando com música com bebês nas aulas ministradas na / Música e Desenho / Música e Mate- Escola de Música de Jundiaí. Ela fala, mática / Música e Mídia / Diálogos e Para fazer música Cecília Cavalieri França Belo Horizonte: Editora UFMG de forma simples e direta, sobre o que Perspectivas. A autora apresenta suges- devemos saber antes de começar a tões de materiais pedagógico-musicais atuar com os bebês. Para alcançar seu e relatos de experiência. Este livro é um objetivo ela ainda coloca várias opções ótimo subsídio para ações interdisciplina- pelo professor, este livro didático propõe de canções folclóricas e infantis que res envolvendo música na escola, bem as crianças adoram, o que nos ajuda a como um referencial que impulsiona aproximá-las da nossa cultura. É uma ótima opção para quem pretende de- bibliografia nacional. Fruto de extensa pesquisa realizada junto à AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente) em São Paulo, a obra pode ser dividida em duas partes. Na primeira, encontramos um INFANTIL E FUNDAMENTAL FORMAÇÃO LivrosCDsSites DVDs Coleção Toc Toc Liliana Iacocca São Paulo: Editora Ática Os sons estão presentes em todos os espaços que vivemos. A Orquestra Tintim por Tintim Liane Hentschke; Susana Kruger; Luciana Del Ben; Elisa Cunha São Paulo: Editora Moderna texto mais denso, voltado para questões Dando um breve contexto histórico e teóricas. Para auxiliar a leitura, há explica- falando sobre cada família de instrumen- ções sobre o conceito de motricidade e tos, esse livro leva o leitor ao mundo a cada página novos desafios e ativida- uma introdução a diversos tipos de defici- da orquestra sinfônica, trazendo várias des, utilizando o CD que o acompanha. ências: motora, visual, auditiva, mental e curiosidades e também dicas importan- novas ideias e diálogos que a música Traz conceitos, fundamentos, metodo- distúrbios de ordem psiquiátrica. tes para preparar a ida a um concerto. poderá fazer. logia e modalidades para o trabalho em Planejado para utilização pela criança e Na segunda metade do livro, encon- e nos permite atribuir-lhes significado e sentido, pois podemos estabelecer diversas relações de comunicação. A "Coleção Toc Toc" traz à tona a percepção de alguns sons como os emitidos pelo nosso corpo. Mostra também sons da natureza, sons dos objetos que nos cercam e sons dos ambientes natural e urbano. Além disso, o livro vem acompanha- senvolver um trabalho com bebês, seja sala de aula. Ele explora várias ideias tramos um compêndio de propostas do de um CD com os sons de cada como profissional ou apenas como meio sobre o som e a música de uma maneira educativas bastante práticas, incluindo instrumento, que nos ajuda a conhecer para criar um maior vinculo afetivo, que divertida e criativa. O grande diferencial diversos materiais didáticos de con- melhor os timbres diferenciados de cada também é um dos objetivos da autora, desta publicação está na abordagem fecção simples e jogos que trabalham instrumento dos naipes da orquestra. De mencionados no livro. leve e fluente, que envolve adultos e vários conceitos do saber musical. Mais linguagem fácil e criativa envolve a crian- crianças através de uma linguagem do que uma obra elaborada por teóricos, ça (e o adulto) no universo da orquestra gráfico-musical contemporânea, espe- é um retrato vivo do trabalho de pessoas sinfônica, aproximando a criança da cialmente escolhida para envolver o engajadas na democratização do acesso música erudita. universo infantil. à educação e ao prazer da música. Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Percebê-lo aguça a acuidade auditiva Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 73 Indicação de livros, sites, CDs, DVDs Poemas musicais Desvendando a Orquestra Cecília Cavalieri França Poemas Musicais CD Indicação de livros, sites, CDs, DVDs A brincadeira do palhaço, a delicadeza Clarice Miranda e Liana Justus Curitiba: Expoente Editora da bailarina, um passeio na Maria Fumaça, uma história de menina! "Poemas Duas personagens apresentam a orques- Clave de lua tra e seus naipes. Um livro que encanta pela qualidade das imagens dos instrumentos da orquestra. Acompanha um CD-Rom com a história, atividades e jogos. Histórias da Música Popular Brasileira para Crianças Simone Cit: texto e direção geral Iara Teixeira: ilustrações Roberto Gnattali: direção musical e arranjos Natura / Lei de Incentivo à Cultura - MINC Com ilustrações alegres e coloridas, Poemas de Léo Cunha Pinturas de Eliardo França São Paulo: Editora Paulinas É um CD que reúne cantigas de rodas temática: "Suíte das Estrelas", "Suíte das tradicionais e algumas novas compostas por Hélio Ziskind, com arranjos vivos e diferenciados que procuram atrair a poemas de Leo Cunha que falam sobre mentais e não instrumentais, trazendo atenção da criança para os instrumentos. o universo musical e, em especial, sobre letras singelas e variedade de ritmos. Contém diversos recursos musicais. Bom os instrumentos musicais. Acompanha humor e suavidade definem este CD. um CD com esses poemas musicados de forma muito criativa, que conta com a participação de André Abujamra, Reny Ferreira, Graça Cunha,... Esse belo trabalho integrado entre pintura, poesia e música possibilita apresentar aos alunos diversos instrumentos musicais e suas características de forma lúdica e divertida. As ilustrações são detalhes de ainda mais os leitores-ouvintes. Leitura nomes da nossa música para as crian- imperdível para crianças e adultos. cativantes histórias. conjuntos de músicas com uma mesma Bichos". São explorados timbres instru- obras de Eliardo França, para encantar Valente são personagens de curiosas e são tiradas de quatro suítes, ou seja, Hélio Ziskind Gravadora MCD Ondas", "Suíte das Meninas" e "Suíte dos livro apresenta alguns dos maiores Barbosa, Chiquinha Gonzaga e Assis criança que há em nós. Suas músicas O livro "Clave de lua" apresenta 23 aliadas a um texto leve e divertido, este ças. Noel Rosa, Pixinguinha, Adoniran musicais" é um convite a perceber a Trem Maluco e Outras Cantigas de Roda Coleção Siricutico - Canções ilustradas/ Acompanha CD Pindorama - Sandra Peres & Luiz Tatit / Ilustração Alex Cerveny. Rato - Paulo Tatit & Edith Derdyk / Ilustração Edith Derdyk e Elaine Ramos. Ora Bolas - Paulo Tatit & Edith Derdyk / Ilustrações Andrés Sandoval. Antigamente / Tente entender - Sandra Peres & Zé Tatit / Ilustrações Zé Tatit. São Paulo: Cosac & Naify e Palavra Cantada Outro destaque é o CD com gravações de clássicos como "Pelo Telefone" 74 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Como será que essa música foi feita? Esta bela coleção produzida pela Cosac & Naify principais sendo: a música, é muito enriquecedor e e "Ó Abre Alas", todas cantadas por e Palavra Cantada, traz de forma simples e divertida como foram feitas as escolhas ins- um playback e uma explica- através desta coleção, o crianças (afinadíssimas!) e arranjos ca- trumentais das músicas "Antigamente/Tente entender", "Ora Bolas", "Rato" e "Pindorama". ção de por que o arranjo foi professor pode ter novas prichados. Acompanha ainda sugestões Cada música conta uma história que está escrita e ilustrada em um livro da coleção, pensado daquela forma. idéias para fazer diferen- de atividades e informações adicionais convidando o ouvinte a conhecer um pouco mais, não apenas da criação do arranjo ins- sobre as canções e seus autores. trumental, mas também das letras. Junto ao livro vem também um CD com três faixas Entender o processo de uma composição musical tes arranjos musicais. É só dar asas à imaginação! Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 75 DVDs Teca Oficina de Música Canto do povo daqui/ Canto de vários cantos/ Nós que fizemos/ Música pra todo lado/ Bolo musical Adriana Partimpim O Show Teca Alencar de Brito e alunos São Paulo Adriana Calcanhoto Sony & BMG A renomada educadora musical Teca Alencar de Brito produziu em sua Oficina O grande destaque do show são Operilda na Ciranda de Villa-Lobos Sites Indicação de livros, sites, CDs, DVDs Indicação de livros, sites, CDs, DVDs de Música cinco CDs, a fim de registrar os arranjos. A banda, afiadíssima, faz o trabalho ali realizado, a saber: "Canto uma inovadora mistura de instrumentos do povo daqui" - "Canto de vários cantos" musicais convencionais e cotidiáfonos de - "Nós que fizemos" - "Música pra todo toda sorte: panelas, canudos de plástico, lado" - "Bolo musical". O diferencial caixinhas de música, mangueiras, lixas e deste material é deixar claro, tanto pelas outros inusitados objetos são tão impor- realizado pela TUCCA na Sala São Paulo gação da música e cultura portuguesas, músicas como pelas indicações nos en- tantes quanto guitarras, baterias e violões. com a Sinfonieta Fortíssima. Através de além de ter referências sobre a música cartes dos CDs, processos de criação e Nos extras do DVD, não perca a ses- cirandas e cantigas populares, a divertida de todo o mundo. produção musicais. Esses CDs ilustram são "Tudo é Música", onde os músicos Mademoiselle Operilda, vivida pela atriz bem um trabalho de Educação Musical mostram seus instrumentos e explicam Andréa Bassit e o Maestro João, pelo que privilegia a expressividade e criação, como foram utilizados. regente João Maurício Galindo, vivenciam Andréa Bassitt / Maestro João Maurício Galindo / Sinfonieta Fortíssima TUCCA e Fundação Vale do Rio Doce O DVD apresenta um concerto didático tornando-se um ótimo referencial e ma- “conceitos musicais”, e aproximam o terial de apoio para o professor. espectador do universo do compositor Heitor Villa-Lobos. A obra faz parte do CD e DVD projeto “O Aprendiz de Maestro”. MAWACA Pra todo canto Grupo Mawaca Azul Music Produzido pelo Grupo Mawaca, com de vários lugares do mundo, com suas rados timbres, instrumentos musicais, características e peculiaridades. É um pluralidade cultural, etc. jogos online que envolvem música. Interessante, pois além das informações sobre o grupo, contém uma seção onde os Embalagem dupla contendo DVD com pela turma do Cocoricó, onde são explo- Site que coloca à disposição vários Vídeos do grupo, informações gerais so- educadores postam relatos de experiências utilizando as músicas do Palavra Cantada. ■ os clipes musicais e CD de áudio com canções divertidíssimas interpretadas http://www.clickjogos.com/ jogos/jogos_musicais/jogos_ musicais.html bre shows, link para o Programa Siricutico. Hélio Ziskind Cultura Marcas estes CD e DVD apresentam canções Site Português que objetiva a divul- http://www.palavracantada.com.br COCORICÓ pesquisa e arranjos de Magda Pucci, http://www.meloteca.com/ material riquíssimo para trabalhar ritmos, sonoridades e pluralidade cultural. AUTORES: Alessandra Maria Zanchetta - Aluna do 3º ano de licenciatura em Educação Musical na Unesp e pesquisadora estagiária da Fundunesp no projeto "Tocando, cantando... fazendo música com crianças" da Secretaria Municipal de Educação de Mogi das Cruzes. [email protected] André J. Rodrigues Jr. - Bacharel em Violão pela Universidade Cruzeiro do Sul e pesquisador estagiário da Fundunesp no projeto "Tocando, cantando...fazendo música com crianças" da Secretaria Municipal de Educação de Mogi das Cruzes. [email protected] Carlos Roberto Prestes Lopes - Aluno do 4º ano de Licenciatura em Educação Musical no Instituto de Artes da UNESP e pesqui- 76 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes sador estagiário da Fundunesp no projeto "Tocando, cantando...fazendo música com crianças" da Secretaria Municipal de Educação de Mogi das Cruzes. [email protected] Patrícia Marins Aguiar Conde - Pedagoga, pós-graduada em Alfabetização e Letramento e diretora das escolas municipais Fujitaro Nagao e (R) "Bairro São João" [email protected] Geraldo Monteiro Neto - Graduado em Educação Artística com habilitação em Música pelo Instituto de Artes da Unesp e pós-graduando em Educação Especial e Inclusiva pela Faculdade Internacional de Curitiba. [email protected] Wasti Silvério Ciszevski - Mestranda em Música pela UNESP, licenciada em Educação Musical pela mesma Instituição e formada em piano erudito pela EMESP (ULM). Atuou de 2006 a 2008 como pesquisadora estagiária da Fundunesp no projeto "Tocando, cantando...fazendo música com crianças" da Secretaria Municipal de Educação de Mogi das Cruzes. [email protected] Luciana Rosa Fernandes Abib - Pedagoga, pós-graduada em Psicopedagogia e professora de Educação Infantil do Centro de Convivência Infantil Integrado (CCII) Profª Ignez Maria de Moraes Pettená. [email protected] Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 77 Brincadeiras Cantadas Brincadeiras Cantadas Jogos musicais TAMPAS SONORAS Equipe do Centro de Convivência Infantil Integrado (CCII) Profª Ignez Maria de Moraes Pettená. [email protected] Ana Karina de Miranda Nepomuceno - Graduada em Matemática e Auxiliar de Desenvolvimento Infantil (ADI) Cleide Negrão de Almeida - Graduada em História e professora de Educação Infantil Eulália Anjos Siqueira - Pedagoga, pós-graduada em Gestão de Processos Ensino/Educação e Gestão da Educação Básica, professora de Educação Física e diretora do CCII Profª Ignêz Maria de Moraes Pettená. Maria Lusimar da Silva - Cursou Ensino Médio, é Auxiliar de Desenvolvimento Infantil (ADI) Otilia de Camargo Pinto - Cursou Magistério, é Auxiliar de Desenvolvimento Infantil (ADI) Vanessa Gerlinger Romero - Pedagoga e professora de Educação Infantil do CCII Profª Ignêz Maria de Moraes Pettená. André J. Rodrigues Jr. - Bacharel em Violão pela Universidade Cruzeiro do Sul e pesquisador-estagiário da Fundunesp no projeto Tocando, cantando...fazendo música com crianças da Secretaria Municipal de Educação de Mogi das Cruzes Sidney Pontes – Aluno do 3º ano de Pedagogia do Instituto Educacional Carapicuiba, participou como spalla da Orquestra Didática de Bertioga. Foi pesquisador estagiário da Fundunesp no projeto Tocando, cantando...fazendo música com crianças da Secretaria Municipal de Educaçã[email protected] Ana Karina de Miranda Nepomuceno André J. Rodrigues Júnior Cleide Negrão de Almeida Eulália Anjos Siqueira Maria Lusimar da Silva Otilia de Camargo Pinto Sidney Pontes Vanessa Gerlinger Romero Objetivos do jogo: Expressar os sons dos animais e de objetos do cotidiano por meio da imitação e da memória. Faixa etária: 01 a 04 anos Como jogar: O jogo: Cada aluno deverá jogar o dado de uma vez. A cor que o dado indicar Organização: Acomodar as crianças sentadas em fila ou será a cor em que o jogador deverá pegar a TAMPA SONORA. Se contiver a em círculo. Escolher um aluno para iniciar o jogo e seguir figura de um animal ou de um objeto sonoro, a criança da vez deverá reproduzir Reconhecer e reproduzir os sons a partir da imagem. a ordem para que todos joguem. As tampas devem ficar o som. Se contiver a figura de um instrumento musical, a criança deverá procurar Explorar a sonoridade dos instrumentos a partir de intera- viradas para baixo. o instrumento e produzir o som. ção lúdica com os instrumentos musicais. Número de jogadores: Mínimo 02 jogadores – máximo 15 jogadores. Organização dos espaços: Conteúdos trabalhados do jogo: Ecologia Sonora Materiais do jogo: 12 Tampas circulares de plástico de três diferentes cores (vermelha, amarela e marrom), cada cor representando um grupo: Crianças Memorização Percepção auditiva e visual Amarela: figuras de objetos sonoros Linguagem verbal e não-verbal Marrom: figuras de animais Exploração de diferentes sons e movimentos vocais Um dado tricolor representando as cores das tampas, Reconhecimento e comparação de animais domésticos, Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes B) Socialização Vermelha: figuras de instrumentos musicais que pode ser confeccionado em EVA, em madeira, etc. 78 Atenção e Concentração A) Crianças Crianças sons de instrumentos musicais e objetos sonoros Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 79 Conhecendo práticas e teorias Brincadeiras Cantadas Carlos Roberto Prestes Lopes Por dentro da Objetivos - Desenvolver a percepção auditiva. Material Quem brincou Flauta de Êmbolo Turmas de Infantil 3, 4 e 5. - Possibilitar a vivência dos parâmetros Altura e Intensidade Procedimento A brincadeira consiste em imitar um boneco inflável que se enche de ar de acordo com o som. Para isso explicamos às crianças que a partir daquele instante todos somos “bonecos de ar” e que de acordo com o som este boneco pode se encher. Neste momento nos inflamos todos, nas pontas dos pés, com bochechas estufa- Resultado Através desta atividade as crianças puderam interpretar o som através do movimento e de uma forma lúdica vivenciar a mudança no som. Esta vivência é fundamental para o entendimento de como cada parâmetro do som é independente e pode ser variado. Observamos um bom aproveitamento por parte das crianças, pela diversão e pela demonstração de como entenderam estes parâmetros do som. das e braços curvos. Para se esvaziar, o boneco murcha, se retraindo, agachado e pequeno. O que irá comandar se o boneco deve ficar cheio ou vazio é a variação no parâmetro do som, seja ele, a altura, através da flauta de êmbolo, ou a intensidade, através do som de “S” feito com a boca mais forte ou fraco. Primeiro, devemos fazer o som junto ao movimento, Elaine Cristina Raimundo mostrando às crianças a mudança do som. Depois que elas já tiverem entendido, podemos fazer somente o som (falando que não mais nos movimentaremos, agora só controlaremos os bonecos). É importante que haja variação de somente um parâme- Carlos Roberto Prestes Lopes - Aluno do 4º ano de Licenciatura em Educação Musical no Instituto de Artes da UNESP e pesquisador tro durante a atividade, já que a intenção é possibilitar o estagiário da Fundunesp no projeto "Tocando, cantando...fazen- entendimento e a separação entre estas características do do música com crianças" da Secretaria Municipal de Educação de som tão confundidas por muitas pessoas. Mogi das Cruzes. [email protected] 80 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Entrevistamos três especialistas em Educação Musical que ministraram workshops em nossas escolas do projeto "Tocando, cantando...fazendo música com crianças" no 1º semestre de 2008. Vejamos o que Berenice Almeida (EMIA), Ilza Joly (UFSCAR) e Josette Feres (Escola de Música de Jundiaí) têm a dizer sobre a obrigatoriedade da música na escola. Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 81 Conhecendo práticas e teorias Conhecendo práticas e teorias 37 anos sem música no currículo escolar Apesar dos problemas do Canto Orfeônico, depois transNo dia 15 de agosto de 2008, o Presidente da República em formado em Educação Musical, a polivalência da Educação exercício, José Alencar, sancionou o projeto de lei 2732/2008 A integração das artes, o enfoque no processo criativo e o espírito de contes- Artística não favoreceu a música porque o professor tinha que torna o ensino da música obrigatório na Educação Básica. tação se opunham ao modelo de ensino de música então vigente, marcado pelo pouco tempo para dominar a linguagem musical junto às Comemorando a aprovação da lei, o momento é de reflexão civismo, a exaltação da pátria através dos hinos, a disciplina e o rigor teórico do demais áreas artísticas, enquanto o antigo professor de sobre os caminhos a seguir para que a lei seja implementada conteúdo, pouco ou nada criativo, que envolvia leitura das notas musicais e um música tinha formação específica. E apesar de o objetivo da melhor forma. Neste contexto, especialistas da área já ensino tradicional da música. não ser mais o ensino tradicional da música, com leitura de apontam o projeto "Tocando, cantando...fazendo música com crianças" como modelo de Educação Musical. Sobre a implantação da Educação Artística, FONTERRADA disse que o movi- Por que a Educação Musical saiu do currículo das escolas? partitura, o ensino musical nas escolas tornou-se quase nulo, mento da criatividade do qual participaram esses professores enfatizava pois o enfoque no processo tornou-se desculpa para o pouco Desde 1971, quando a disciplina Educação Musical e a Josette: O antigo Canto Orfeônico tinha um programa muito acima do que ...o processo sobre o produto, numa evidente postura crítica aos sistemas anteriores (1942- conhecimento na área musical. disciplina Artes Plásticas foram substituídas pela Educação o aluno podia fazer e os professores eram grandes músicos, mas não tinham a Canto Orfeônico e 1961-Educação Musical), que priorizavam os eventos comemorativos e Através da criatividade, um grande contingente destes professores se Artística, através da Lei nº 5692/71, a música foi gradativa- didática. Era muito difícil para os alunos... muitos chegavam a se matricular em as apresentações, subordinando-se ao calendário cívico e escolar. (1991, p. 38) aproveitaria desta liberdade para camuflar a falta de conhecimentos mente perdendo o seu espaço na escola. escolas de música para poder ter nota na escola. Ao negar-lhe a condição de disciplina e colocá-la com outras áreas Ilza: A aula de Canto Orfeônico era totalmente diferente da concepção de específicos, e para afastar-se finalmente da situação incômoda na qual Em 1971, a Educação Musical foi substituída pela Educação Artística, que se de expressão, o governo estava contribuindo para o enfraqueci- música que nós temos hoje. Era um modelo fechado que engessava o professor caracterizava pela polivalência. Além do Canto Orfeônico ser inadequado às novas mento e quase total aniquilamento do ensino de música. (FON- e isso nós não podemos ter. A aula consistia em conhecimentos teóricos de propostas, um fato que contribuiu decisivamente para a saída da música do currículo TERRADA, 2005, p. 201) música que muitas vezes substituía a prática e que eles nunca mais usariam na escolar foi a tendência tecnicista que ocorreu nos anos 60 e 70. Neste contexto, dis- se encontravam: desenvolver um trabalho essencialmente musical com um mínimo de conhecimentos específicos. (FUKS, 1991, p. 141) O curso de Educação Artística oferecia uma visão su- vida. Os alunos tinham que solfejar e aprender a ler partitura, o que era muito ciplinas artísticas de cunho específico como Desenho, Música, Trabalhos Manuais, perficial de todas as linguagens e não se aprofundava em Profª Josette assim se manifesta sobre esse período: difícil e distante da realidade dos alunos. Hoje a concepção que temos é de Canto Coral e Artes Plásticas, que figuravam no currículo escolar, foram conside- nenhuma delas. O resultado disso foi que os professores Quando entrou a Educação Artística, eu fui afastada da uma educação musical que vai formar o aluno integralmente como ser humano. radas não importantes para a formação do aluno e, por isso, foram agrupadas em de Educação Artística acabaram trabalhando somente os sala de aula porque eu não tinha o diploma, mas como O objetivo da educação musical na escola é sensibilizar as crianças, educar os uma única disciplina: Educação Artística. Nesta nova disciplina, as artes nem eram conteúdos com os quais tinham mais afinidade e os que os eu era professora de Canto Orfeônico, concursada pelo sentidos, fazê-las ouvir e apreciar, além de ter uma prática musical. consideradas como áreas de conhecimento, mas meras atividades artísticas. recursos da escola permitiam trabalhar com facilidade. Não é uma matéria, mas uma área bastante generosa e sem contornos fixos, flutuando ao Por outro lado, a institucionalização pelo governo de um inadequado sabor das tendências e dos interesses. (FUSARI, 1992, p.38) curso de graduação em Educação Artística (1973), com o fim de pre- estado, continuei recebendo normalmente. Aí eles queriam que eu fizesse o curso de Educação Artística, mas eu disse Nos anos 60, principalmente após o golpe militar em 1964, as artes passaram a que só faria se eles pagassem o curso e a viagem que eu ser usadas como ferramenta política contra o governo ditatorial. Na arte-educação teria que fazer. Ou seja, o meu ordenado não ia aumentar, isso se refletiu em propostas de se educar ao mesmo tempo estética e politi- eu ia ter que deixar meus cinco filhos em casa e viajar prá camente as massas. O enfoque deixou de estar no produto final e passou-se a podendo perpassar pelas diversas linguagens e também variar de acordo com os outra cidade e ainda pagar uma escola. Então eu não fiz valorizar o processo e a criatividade envolvida no fazer artístico. Numa época em interesses da classe. Não mais se cobrava do professor um currículo fechado a ser o curso e fiquei na escola fazendo alguns serviços como que a comunicação verbal era muito reprimida, principalmente devido à censura, cumprido como acontecia no Canto Orfeônico, nem mesmo um planejamento das aquela idéia primeira do professor dar conta de todas as ensinar cantos no primário. Depois eles permitiram que eu estimulou-se muito a comunicação não verbal. O importante era fazer as pessoas aulas. Contudo, se o Canto Orfeônico engessava o professor, a liberdade conferi- linguagens é utópica. Eu acho que o que aconteceu, pela desse aulas de música na aula de Educação Artística, mas o se expressarem, era o fazer criativo e não necessariamente o que se criava. da a ele na Educação Artística aliada à uma formação incipiente, fez imperar um minha experiência e pelo meu contato com as pessoas que governo tratava a música com muito descaso. Na verdade, parar professores está reforçando a marcha que leva o ensino da arte à O conteúdo das “atividades” artísticas, portanto, eram bastante variáveis, mediocridade. (BARBOSA, 1982, p.22) Berenice: Eu acho que essa questão da educação artística, Nos anos 70, o governo promoveu cursos que tinham como objetivo sensi- vale-tudismo nessas aulas. Podia-se fazer qualquer coisa desde que o aluno se ex- continuaram na escola regular, é que muitas delas optaram eles preferiam que eu não desse aula de música, porque bilizar professores das escolas públicas para uma forma criativa de ensino de pressasse. O fim do modelo de ensino de música instituído pelo Canto Orfeônico por trabalhar só com as artes plásticas, até por uma questão não tinha sala apropriada e atrapalhava as outras matérias artes. Estes encontros reuniam especialistas das diferentes áreas artísticas que e as implicações da criatividade podem ser percebidas na fala de um professor de de espaço físico, de materiais, recursos. Então o professor por causa do barulho. Mas logo eu me aposentei e, em propunham diluir os limites entre essas áreas em um trabalho integrado. música num encontro de educação musical ocorrido nos anos 60: não tinha material para trabalhar com música e as salas não 1983, eu já estava começando a minha escola de música e ...os anos 60 se caracterizariam por uma diluição de barreiras que, até então, separavam Não é mais preciso o conhecimento das notas musicais, agora é a época da criatividade e eram adequadas. Com isso a gente tem um buraco de muitos o meu foco estava mais voltado para ela. as diferentes formas de criação artística. (FUKS, 1991, p. 149) não é necessário saber mais nada. (FUKS, 1991, p.126) anos sem essa formação de música. 82 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 83 Conhecendo práticas e teorias Conhecendo práticas e teorias A formação musical Na realidade, apesar de não aparecer na justificativa do veto a exigência de professores especialistas, o que o pro- Quem vai dar a aula de música? jeto de lei propunha era uma meta impossível de cumprir É importante ressaltar que a música está voltando a no prazo de três anos, pois não existem professores espe- ser obrigatória nas escolas, mas que a lei não institui uma cialistas formados para atender à demanda da Educação nova disciplina “Música” separada das outras artes, como Básica em nível nacional (FONTERRADA, 2005). Josette: O problema do professor de Educação Artística, que é um polivalen- aconteceu anteriormente no Canto Orfeônico e na Educação Sobre a falta de professores especialistas: te, é que o professor não trabalha as quatro linguagens, ele trabalha a matéria na Musical. A lei nº 11.769/2008 altera o artigo nº 26 da LDB nº Josette: Bem começaram a abrir faculdades de Educa- qual ele tem mais facilidade. Por exemplo, eu tinha uma amiga que era excelente 9.394 / 96 sobre o ensino das artes, tornando a música con- musicista, mas como ela tinha problema no coração dizia que dar aula de música teúdo obrigatório, mas não exclusivo das aulas de Arte. Se a deixava muito cansada, então ela só dava aula de desenho. a música fará parte das aulas de Arte, levantamos a questão o professor polivalente é responsável pelas aulas de música, mas, no caso deste em Engenheiro Coelho, uma cidade perto de Campinas... e de quem ministrará esta aula. No projeto de lei há um artigo país, ele tem aulas de música na educação básica e no curso de Pedagogia. eu tenho a impressão que se continuarem esse trabalho vai Hoje, sabendo da impossibilidade de um único professor dominar bem todas que diz que as aulas serão ministradas por especialistas na ção Musical, tem em São Carlos, aqui em São Paulo já tem Na entrevista, a professora Berenice citou como exemplo o sistema suíço, no qual Berenice: O meu filho, por exemplo, estuda em uma escola suíço-brasileira. várias, parece que abriram uma muito interessante agora chegar uma hora que vai normalizar. Mas esse problema é as áreas artísticas, indica-se o trabalho por projetos interdisciplinares no qual área. Este artigo, porém, foi vetado pelo presidente Lula Nessa escola desde o primeiro ano a criança tem dois professores, um brasileiro e muito mais antigo, o Brasil foi colonizado por jesuítas e eles existe um diálogo entre as diferentes áreas das artes, mas em que nenhuma no dia 19/08/2008 ao transformar o projeto em lei. Ora, em um suíço que é responsável, entre outras matérias, pela aula de música. Quando ministravam as aulas de música. Depois os jesuítas foram apareça em detrimento da outra, como aconteceu com a música que foi ficando muitas escolas, senão a maioria do país, as aulas de Arte em uma reunião eu demonstrei preocupação pelo fato de ele ser um professor poli- expulsos e o Brasil ficou cem anos sem professor de música, de lado nas aulas de Educação Artística. até o 5º ano do Ensino Fundamental I são ministradas pelas valente dando aula de música, ele me respondeu que não era especialista em artes vai ficar sempre cem anos de atraso. Então o que vai salvar A chamada polivalência é na verdade uma versão reduzida e incorreta do princípio da professoras de classe e não por especialistas. Isso significa plásticas, nem em trabalhos manuais, mas também ensinava essas matérias. E que, isso são as faculdades que vão preparar o professor de mú- interdisciplinaridade, ou artes relacionadas, muito popular nas escolas americanas nos que possivelmente quem vai dar as aulas de música são os por outro lado, ele se sentia preparado para dar aula de música porque ele tinha tido sica. Agora é necessário um tempo para essa gente estudar, últimos dez anos. (BARBOSA, 1982, p.22) professores responsáveis pelas aulas de artes, sejam eles música durante todos os anos da faculdade. Isso sem contar que, sendo suíço, ele se formar, para o governo preparar concursos sérios. professores generalistas ou especialistas em Arte, indepen- tinha tido formação em música desde a escola básica. Em 1996, com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases Nº 9394/96 a nomenclatura Educação Artística foi substituída por Arte, embora algumas escolas dente da sua habilitação ser em música ou não. Ilza: A falta de professores especialistas é uma realidade e o governo terá que investir na formação destes professo- Sabendo que a lei abrange toda a Educação Básica, isto é, através dela a mú- res. Mas eu concordo que se dê um prazo curto porque já ainda utilizem o nome antigo. Tivemos um ganho com esta lei, pois através especialistas dariam as aulas de música impediria que profis- sica torna-se conteúdo obrigatório desde a Educação Infantil até o Ensino Médio, esperamos tempo demais pela volta da música na escola e delas a arte passou a ser considerada como campo de conhecimento, tendo sionais da área, reconhecidos nacionalmente, ministrassem levanta-se a necessidade de formar estes professores de Arte, que não têm esse prazo não pode ser postergado mais ainda. Com essa novamente importância no currículo escolar, com direito a notas. Esses anos em essas aulas, por não terem formação acadêmica. E ainda diz formação em música e também pedagogos para trabalhar os conceitos musicais. exigência o governo e as escolas terão que se mexer para que a arte não tinha peso no currículo escolar refletem até hoje o pouco valor que essa exigência vai além de uma diretriz curricular, já que Lembrando que as escolas terão somente três anos para se adaptar à lei. atender a esta demanda. que se dava ao ensino de artes na escola. não existe qualquer exigência de formação específica para Foi em decorrência do entendimento da arte (da música) como atividade de lazer que outras disciplinas como Matemática, Biologia, etc. ocorreu, no Brasil, sua desvalorização na escola, transformada que foi em pretexto para Segundo a justificativa do veto, a determinação de que só O problema é que os professores generalistas raramente Sobre quem vai dar a aula de música: Ilza: Eu acho que nós precisamos do professor especialista na escola, porque Com a falta de professores especialistas formados em é preciso conhecimentos específicos para se trabalhar música. O que a profes- quantidade suficiente para atender às escolas, as entrevis- entretenimento ou passatempo, sem que fosse considerada capaz de contribuir para o cres- recebem formação de música em sua formação escolar ou sora de classe pode fazer e que é desejável que faça, é participar desta aula. Por- tadas afirmam que as professoras de classe podem realizar cimento individual e coletivo, tanto no que se refere ao conhecimento em si quanto ao fazer nos cursos Normal, Magistério e Pedagogia como recebem de que ela está em contato com o aluno durante muito mais tempo que o professor um trabalho musical com as crianças: artístico, à capacidade de trabalhar em grupo e à valorização estética, o que se refletiria outras disciplinas como Matemática, Biologia, etc. E, quando especialista que vai ali uma vez por semana e é ela que pode dar continuidade na melhoria da qualidade de vida. (FONTERRADA, 2005, p. 214) tiveram formação em Arte, poucos aprenderam música. ao trabalho dele, cantando com as crianças e estabelecendo parcerias, trabalhan- Educação Infantil pode fazer e melhor do que o especialis- Berenice: tem muita coisa musical que o professor de do junto os mesmos projetos. Se a professora de classe se sentir necessária, ta que só vem uma vez por semana. Elas têm muito mais Outro ganho que tivemos foi a mudança na formação dos professores com a Português que ele não precisa ler, nem escrever ou para se perceber que o trabalho dela faz diferença também na aula de música ela vai possibilidades de fazer trabalhos integrados, por projeto criação das licenciaturas com habilitação específica em uma das áreas artísticas já o professor de Matemática que ele não precisa saber as querer participar e o especialista deve buscar isso. e atividades espontâneas. Porque com a criança peque- mencionadas. O professor de Arte passou a ter contato com todas as áreas, mas se quatro operações. Como você pode ser professor de músi- Berenice: E se for o caso de o professor polivalente estar trabalhando música na a educação musical consiste em sensibilizar o ouvir, especializando em uma delas. Esta tendência de tratar cada área artística especi- ca sem saber música? Vai ensinar para um aluno que sabe com as crianças da Educação Infantil e Ensino Fundamental, é necessário que o trabalhar um repertório interessante e adequado, o tra- ficamente também aparece nos Parâmetros Curriculares Nacionais, no qual cada mais que você? Eu acho que o professor de música tem governo pense numa forma de formar esses professores. Os cursos de Pedagogia balho do cantar e não só em momentos específicos, um uma delas apresenta-se separadamente como conhecimento específico, embora a que ser muito bem formado. Não só como professor, além teriam que se preparar para formar esse profissional musicalmente, e a médio/curto trabalho de percepção sonora, utilizando o corpo, objetos, disciplina continue sendo chamada pelo nome genérico: Arte (FONTERRADA, 2005). da didática ele tem que saber música. prazo esses professores teriam que receber a assessoria de especialistas na área. instrumentos e a voz da criança. Se a professora tem um Josette: Isso é o mesmo que dizer para o professor de 84 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 85 Conhecendo práticas e teorias Conhecendo práticas e teorias repertório de atividades e está sensibilizada sobre o que é Educação Musica,l ela pode encaixar o trabalho musical em vários momentos do dia. Porque é assim que a criança vê o mundo, ela não separa a arte do brincar, nem uma arte da outra. Eu acho que esse trabalho integrado é mais interessante para as crianças pequenas. Por outro lado, para que não se corra o risco de a prática musical na escola se reduzir à qualquer coisa, como aconteceu nos anos 70, para que o ensino de música se baseie nos Referenciais Curriculares Nacionais é necessário investir na formação destes professores: Josette: O problema é que não adianta simplesmente tornar a música obrigatória e definir os conteúdos que devem ser trabalhados, o professor muitas vezes não entende o que está escrito. Eu fui convidada pela prefeitura de uma cidade para traduzir o que estava escrito no PCN. Aí eu perguntava “O que é paisagem sonora?” e elas respondiam “Ah, paisagem sonora é assim: você pega uma folha de papel e fica desenhando enquanto escuta a música”. Eu fiquei um ano lá trabalhando com as professoras, não foi uma aula. Eu tinha momentos só com elas e outros em que eu dava aula para as crianças para elas terem uma noção prática. Depois eles contrataram uma professora especialista, que dava a aula com a ajuda das pedagogas. Projetos de formação Para a questão da falta de professores especialistas, uma solução recente é o curso de Educação Musical à distância que a Universidade Federal de São Carlos começou a oferecer no ano passado. Ilza: Os cursos à distância são uma tendência atual. Foi Por outro lado, diante do prazo de três anos que a lei institui para que as escolas se adaptem à obrigatoriedade da música, os cursos à distância figuram como uma uma iniciativa do MEC abrir cursos à distância com a Universi- solução a longo prazo, não resolvendo o problema de falta de professores com dade Federal de São Carlos em diversas disciplinas, inclusive a conhecimentos musicais de imediato. Uma outra possibilidade, que já vem sendo música. A Universidade faz parcerias com diversas prefeituras colocada em prática em algumas redes de ensino, é a formação contínua dos pro- que se comprometem a manter um pólo da universidade na fessores que já estão trabalhando na rede e que responsáveis pelas aulas de Arte, sua cidade. Neste pólo acontecem as aulas presenciais e nela estarão trabalhando os conteúdos musicais mesmo que preparando a chegada do ficam os tutores que acompanham o desenvolvimento dos especialista. Neste formato, o projeto de música de Mogi já é referência: alunos, conferem notas a eles e dão assessoria. O curso à distância dura de 4 a 5 anos, da mesma Josette: É preciso reunir especialistas da área para fazer um projeto. Um trabalho a ser tomado como exemplo que eu acho muito bonito, muito bem feito é o de forma que o curso presencial da UFSCAR. Nós começa- Mogi das Cruzes, onde o especialista orienta o trabalho das professoras uma vez mos com este projeto no ano passado, mas já estamos por semana e elas, que tem mais contato com as crianças, trabalham música com tendo resultados muito positivos desta experiência. A as crianças durante a semana. DATAS E LOCAIS DAS ENTREVISTAS: Berenice: 17 de maio de 2008 – Escola Municipal Profª Noêmia Real Fidalgo, Mogi das Cruzes/SP Josette: 27 de junho de 2006 – Instituto de Artes da UNESP, São Paulo/SP Ilza: 30 de julho de 2008 – EMESP Jovita Franco Arouche, Mogi das Cruzes/SP maioria dos alunos do curso à distância são professores O projeto de Música de Mogi é único no país, por oferecer uma formação continu- de música que já estão atuando na área há muito tempo ada para as professoras, com a orientação de especialistas em reuniões e na prática e que agora estão buscando o diploma. A proposta é da sala de aula; por contar com uma gama variada de instrumentos que enriquece Elaine Cristina Raimundo - Licenciada muito interessante para essas pessoas que já trabalham o trabalho musical e que é um dos grandes diferenciais do projeto; e por oferecer em Educação Musical pela UNESP e mes- na área ou que fizeram um bacharelado em música e que cursos e idas a salas de concertos e escolas de música que enriquecem a formação tranda em música pela mesma instituição. estão buscando a licenciatura, mas que não tem tempo desses professores. O que conseguimos no projeto não é visto em nenhum outro Atuou como pesquisadora estagiária da de cursar presencialmente a faculdade. O fato de exis- lugar do país e a nossa esperança, depois de anos de luta pela obrigatoriedade do Fundunesp no projeto Tocando, cantan- tirem pólos em diversas cidades ainda expande o curso ensino musical, é que este projeto seja tomado como exemplo. Que esta ideia se do...fazendo música com crianças da Se- para várias regiões do Brasil, o que com a aprovação da expanda para outras regiões do país fazendo a música ser verdadeiramente incluída cretaria Municipal de Educação. nanny_ lei se tornará ainda mais importante. no currículo escolar e nos projetos político pedagógicos das escolas. ■ [email protected] 86 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes REFERÊNCIAS BARBOSA, A. M. Recorte e Colagem: a influência de John Dewey no ensino das artes no Brasil. São Paulo: Cortez, 1982. FONTERRADA, Marisa. De Tramas e Fios – Um Ensaio Sobre Música e Educação. São Paulo: UNESP, 2005 FONTERRADA, Marisa. Educação Musical: investigação em quatro movimentos: prelúdio, coral, fuga e final. São Paulo, 1991. Dissertação de Mestrado – Pontifícia Universidade Católica / SP. FUKS, Rosa. O discurso do silêncio. Rio de Janeiro: Enelivros, 1991. FUSARI, Maria Felisminda de Rezende, FERRAZ, Maria Heloísa. Arte na Educação Escolar. São Paulo: Cortez, 1992. FUSARI, Maria Felisminda de Rezende e. Mídias e Formação de Professores: Em Busca de Caminhos de Pesquisa Vinculada à Docência. In: Novos Enfoques da Pesquisa Educacional. São Paulo: Cortez, 1999. LISBOA, Alessandra Coutinho. Villa Lobos e o canto orfeônico: música, nacionalismo e ideal civilizador. São Paulo: Unesp, 2005. PAZ, Ermelinda A. Pedagogia musical brasileira no século XX: Metodologias e tendências. Brasília: Musimed, 2000. Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 87 Conhecendo práticas e teorias Conhecendo práticas e teorias A experiência musical em um contexto de Inclusão Social ...toda experiência é um arco por onde entreluz esse mundo não viajado, cuja margem se perde sempre e sempre quando ando e caminho. ...toda experiência é um arco por onde entreluz esse 1976, p. 26 mundo nãoG.viajado, cuja margem se perde sempre(DEWEY, e Thiago Chiarantano sempre quando ando e caminho. (DEWEY, 1976, p. 26) 88 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 89 Conhecendo práticas e teorias Conhecendo práticas e teorias No início de todo trabalho pedagógico sempre temos ...valorizar as experiências cotidianas das crianças, sua vida no partir deles desenvolver conteúdos relacionados à música esperanças, anseios, dúvidas, mas acima de tudo muita bairro e seus consumos musicais, questionando o que os alunos erudita ou à teoria musical. Esse medo tem duas razões Son las únicas actividades en las que el dominio, la imitación y lá imaginación se pueden vontade de experimentar. Esse texto tem como objetivo aprendem dentro da escola e, não menos importante, fora da escola. básicas: primeiro a falta de intimidade com o repertório mu- fomentar y ampliar deliberadamente en la infância y después de ella, a diferencia del falar um pouco sobre minhas primeiras experiências com (SOUZA, 2004, p.9). sical dos alunos, segundo com o preconceito de misturar juego propriamente dicho, que tiende a desaparecer. (SWANWICK, 2000, p.57) os alunos e professores da E.M. Dr. Álvaro de Campos Carneiro, onde pude vivenciar diversas sensações, prazeres conteúdos tão enaltecidos com linguagens cotidianas que É nessa relação, da vivência dos alunos fora da escola e dúvidas, que com o passar dos dias se transformam em com o que experimentam de novo dentro da sala de aula, pesquisa e aprimoramento do meu trabalho. que se constrói o aprendizado. são na maioria das vezes subjugadas. Para Carlos Kater entre as funções da educação musical está a de: Utilizar a experiência do educando no processo de ensino- ... favorecer modalidades de compreensão e consciência de dimensões superiores de si e aprendizagem tem um objetivo muito maior do que conquistar do mundo, de aspectos muitas vezes pouco acessíveis do cotidiano, estimulando uma visão Quando se discute a necessidade de relacionar a expe- a simpatia do aluno ou esperar por uma maçã lustrada em mais autêntica e criativa da realidade. (KATER, 2004, pg. 44) Campos Carneiro no final de 2007, que contou com a partici- riência dos alunos com os conteúdos musicais, podemos cima da mesa. Tem como objetivo a realização do trabalho pação de mais da metade dos responsáveis pelos estudantes, pensar que a aula se limitará a repetir as experiências audi- como professor, é a maneira de aproximar a música do cotidia- indicou que cerca de 56% dos estudantes possuem renda fa- tivas que já têm, retomando a cultura musical que adquirem no do aluno na tentativa de tornar aquilo que ele muitas vezes A arte, e a música em particular, deverão ser meios de preservação e fortalecimento da miliar menor ou igual a um salário mínimo, cerca de 25% dos com os pais, familiares e amigos, mas sem a possibilidade apenas “vê” em algo que ele realmente “sinta”. comunicação pessoa, pessoa; (...) a educação musical deve transformar-se num instru- responsáveis pelos alunos não possuem a 4ªsérie completa e de sua expansão, pois qualquer expansão estaria fora da cerca de 65% desses responsáveis não completou a 8ªsérie. sua experiência e logo, desconexa com sua realidade. Isso Cruzes, onde se localiza a E.M. Dr. Álvaro de Campos Car- Para citar apenas alguns dados da pesquisa. não seria experiência educativa, seria mera repetição do neiro), como em diversas comunidades no Brasil, a escola cotidiano. A escola não precisa, nem deve, principalmente é muito mais do que um lugar aonde os alunos vão para rias questões: Como levar a música, uma arte que parece tão em contextos com tantos problemas socioeconômicos, ser adquirir conteúdos. A escola, para grande parte dos alunos, da música vão muito além dos próprios conteúdos musicais. Não fazemos educação distante da vida dos alunos, para perto deles, para que eles o espaço onde a realidade fora dela se repete, mas deve supre carências nutricionais, materiais e, principalmente, musical, mas sim “educação através de atividades musicais” (KOELLREUTTER, tenham uma “experiência musical”? Qual o papel da música ser o lugar onde essa realidade é tomada como base para afetivas, carências que não são resultado somente da 1990, p.6), educamos com as ferramentas da música. e da educação musical em uma comunidade onde problemas o desenvolvimento de conteúdos que, dessa forma, serão negligência dos pais ou do poder público, mas de uma série sócioeconômicos estão tão presentes na sala de aula? verdadeiramente úteis à vida do educando. de fatores que estão presentes na sociedade brasileira. O seu papel como educador, onde todas as ações servirão de modelo para os alunos conhecimento e familiarização com as condições físicas, em formação. Ao profissional que pretenda ser professor de música tem de estar A pesquisa sócioeconômica realizada na E.M. Dr. Álvaro de Deparando-me com essa realidade me vi diante de duas sé- Em um contexto assim, a educação musical é muito Um grande erro que podemos cometer nesse trabalho é ten- Na comunidade de Jundiapeba, (periferia de Mogi das Para Hans-Joachim Koellreutter: mento de progresso, de soerguimento da personalidade e do estímulo à criatividade. (KOELLREUTTER, 1990, p.6 e 7) Esses foram apenas alguns exemplos de autores que mostram que as funções Cada vez mais se torna importante a conscientização do professor de música do mais do que ensinar notas, montar um coro afinado ou tar propiciar experiências agradáveis e que tragam momentos históricas e sociais da sociedade onde a escola se insere claro o seu papel formador, não podemos a ele nos distanciar. É enfrentando as organizar uma bandinha rítmica que não atravesse os de prazer aos pequenos e não produzir experiências realmente são necessários a toda prática educativa. Esse conhecimen- dificuldades que crescemos, foi enfrentando minhas dificuldades que cresci e é compassos. O ensino da linguagem musical, assim como educativas. Experiências agradáveis são produtoras de conhe- to se torna imprescindível quando a aula de música é muito crescendo que me vejo no papel de valorizar as experiências dos educandos e a o ensino de outras matérias, tem que ter como base as cimento, mas devem ser encaminhadas de tal forma que não mais do que uma aula de conteúdos musicais, quando ela partir daí mostrar-lhes “as margens ainda não viajadas”. ■ experiências dos alunos, experiências essas tão ricas, sejam apenas momentos de brincadeira. Segundo Dewey: se insere no processo de formação do aluno. mas que muitas vezes são desprezadas. Certa vez, ao A crença de que toda a educação genuína se consuma através de mostrar uma nova canção para uma turma de 1ª série, experiência não quer dizer que todas as experiências são genuínas e pretende trabalhar com música em contextos assim é que sical na UNESP e pesquisador estagiário da Fundunesp no projeto "Tocando,cantando... tive uma grande surpresa ao perceber a dificuldade das igualmente educativas. (Dewey, 1976, p. 14) nunca ensinamos apenas música, nunca ensinamos apenas fazendo música com crianças" da Secretaria Municipal de Educação de Mogi das Cruzes. conceitos, ensinamos principalmente atitudes, valores. [email protected] crianças tocarem no pulso da música e a facilidade dos pequenos de acompanhar uma ciranda com uma célula Um pensamento obrigatório para o educador que Thiago Gabriolli Chiarantano - Aluno do 3ºano do curso de Licenciatura em Educação Mu- Uma experiência educativa de fato deve levar em conta dois A formação da maioria dos educadores musicais foi feita rítmica muito mais “quebrada” e difícil, mas, ao mesmo fatores primordiais: a interação com as situações cotidianas do primeiramente em um instrumento, analisando a música REFERÊNCIAS tempo, muito mais natural para eles. sujeito e a continuidade daquela experiência como situação de como linguagem pura, que transmite suas idéias através DEWEY, John. Experiência e Educação. 2ªed. São Paulo: Ed. Nacional, 1976. aprendizado e crescimento. Devemos utilizar os conhecimentos dos seus códigos peculiares e depois baseando o ensino da John Dewey sobre a educação relacionada com a experiên- que possuem como ponto de partida para o aprofundamento linguagem no ensino dos códigos musicais. cia do aluno, pude entender quão mais fácil e mais eficaz se de conteúdos. Nesse momento entra o trabalho do professor Vivemos no dia-a-dia tentando quebrar esse conceito tecni- torna o processo de ensino-aprendizagem quando levamos ampliando os horizontes, alargando as barreiras, mas sempre cista do ensino musical, tentando desenvolver musicalmente em conta o contexto de experiências do estudante. Para de olho no que acontece além dos muros da escola. o indivíduo para que possa interagir com sons, para que possa Essa experiência me chamou atenção e ao ler os textos de Dewey, não ensinamos verdadeiramente quando não conhe- 90 Segundo Keith Swanwick, as atividades artísticas tem grande importância, pois: Em realidades tão diferentes das encontradas nos livros perceber melhor os estímulos auditivos que o cercam. Então cemos o educando e não levamos os conteúdos de encontro de educação musical, certo medo nos aprisiona quando nos deparamos com uma realidade em que a educação musical com a vivência dos mesmos. Sem conhecer os alunos, saber pensamos em utilizar as vivências musicais dos alunos na deve ser usada para desenvolvimento de valores mais essen- seus anseios, descobrir o que lhes dá brilho nos olhos, não sala de aula. Temos medo de, se deparando com nossa ciais, como a capacidade expressiva do gesto, o sentimento do ensinamos. Como educadores musicais, devemos: formação clássica, colocar um rock ou um funk na sala e a indivíduo dentro do grupo, a motricidade, dicção, etc. Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes KATER, Carlos. O que podemos esperar da educação musical em projetos de ação social. In: Revista da ABEM, n.10. Porto Alegre: Associação Brasileira de Educação Musical, março 2004. KOELLREUTTER, Hans-Joachim Educação musical no terceiro mundo: funções problemas e possibilidades. In: Cadernos de Estudo: Educação Musical nº1. São Paulo: Atravez, 1990. SOUZA, Jusamara. Educação musical e práticas sociais. In: Revista da ABEM, n.10. Porto Alegre: Associação Brasileira de Educação Musical, março 2004. SWANWICK, Keith. Música, pensamiento y educación. 2ª ed. Madrid: Ediciones Morata, S. L., 2000. Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 91 Conhecendo práticas e teorias Conhecendo práticas e teorias Histórias de todos os tempos Para que o homem pudesse expressar seus pensamentos, também desenvolvem seu modo de se expressar. Além da voz, o corpo e os sons que ele produz enriquecem as histórias, possibilitando assim uma aproximação do sentimentos, suas tradições e valores, a comunicação verbal mundo real e aguçando o imaginário infantil, utilizando, por exemplo, o trotar de e sonora foi fundamental para que seu desenvolvimento fos- um cavalo com palmas, o estalar da língua no céu da boca, ou ainda o som do cair se pleno e amplamente divulgado. A memória oral histórica de uma gota de chuva batendo com os dedos na palma da mão. é a base de toda a civilização, sua transmissão de geração Sonorizar com objetos é outra alternativa bastante rica, pois pode-se aprovei- em geração sempre ocorreu das pessoas mais velhas para tar diversos materiais existentes na própria sala de aula e assim transformá-los as mais novas, formando uma cadeia de conhecimentos em materiais sonoros. Cabe ressaltar que os instrumentos musicais também são históricos que se perpetuaram por milhares de anos e com o muito importantes para a sonorização podendo ser usados para a sonoplastia advento da escrita pôde se preservar todo esse patrimônio. em diversos temas. As crianças são bastante criativas e utilizam-se dos diversos As histórias, mitos e lendas são contextualizadas de acordo instrumentos para musicar uma história. Neste contexto, a história pode ser com sua época e as gerações posteriores retiram ou acrescen- trabalhada musicalmente, escolhem-se temas musicais para representar cada tam novos valores a esses fatos verdadeiros ou não. Para de- personagem da mesma, por exemplo, ao representar uma princesa é possível monstrar a importância das tradições orais, Benjamin escreveu: utilizar o címbalo como instrumento para identificar sua entrada. A narrativa, que durante tanto tempo floresceu num meio de artesão – A história pode, também, ser representada pela dramatização, quando a crian- no campo, no mar e na cidade – é ela própria, num certo sentido , uma ça deixa sua imaginação tomar conta da situação e vive realmente a personagem forma artesanal de comunicação. Ela não está interessada em trans- expressando-se oralmente por meio dos sons do corpo e do movimento. mitir (...) a coisa narrada, como uma informação ou um relatório. Ela Para todas essas situações faz-se necessário um professor que proporcione opor- mergulha a coisa na vida do narrador para em seguida retirá-la dele. tunidades para as crianças vivenciarem a história, e segundo Teca de Alencar Brito: Assim se imprime na narrativa a marca do narrador, como a mão do O professor ou professora de classe, responsável pelo trabalho em todas as áreas, terá muitas oleiro na argila do vaso.(1987 pp.197 -221) oportunidades para desenvolver projetos integrados, tornando assim mais rica e abrangente a experiência das crianças rumo à construção do conhecimento. (2003, p.172) Qual seria então o papel das histórias para as crianças? Sendo a criança um ser em formação física e intelectual, portadora de expectativas e interesses, o ouvir histórias As escolas com uma equipe escolar engajada com projetos que usam a música, incentivam a criatividade das crianças e as estimulam a desenvolver e expressar sentimentos, valores, culturas, facilitando assim o processo ensino-aprendizagem. ■ pode estimular o imaginar, a capacidade inventiva, o desenhar, o brincar, o pensar. Além do que a criança também pode sentir e expressar suas emoções como tristeza, raiva, Patrícia Costa de Barros - Licenciada em Letras, Bacharel em bem-estar, medo, alegria, prazer e tantas outras. Comunicação Social, pós-graduada em Psicopedagogia e Coorde- Segundo ABRAMOVICH, para contar uma história seja nação e Supervisão para a Educação Infantil, Professora de Edu- qual for, devemos: cação Infantil na Escola Municipal Professora Maria Colomba ...saber como se faz. Afinal nela se descobrem palavras, se entra Colella Rodrigues. [email protected] em contato com a música e com a sonoridade das frases, dos no- , SONORIZADAS DRAMATIZADAS HISTÓRIAS MUSICADAS E Patrícia Costa de Barros Patrícia de Cássia Barba Macedo A história é um importante recurso no processo de educação musical. O faz mes...ou se brinca com a melodia dos versos, com o acerto das ri- Patrícia de Cássia Barba Macedo - Pedagoga, Bacharel em Direi- mas, com o jogo das palavras...Contar uma história é uma arte...É to, pós-graduada em Coordenação e Supervisão para a Educação ela que equilibra o que é ouvido com o que é sentido, e por isso não Infantil, vice-diretora na Escola Municipal Desembargador Ar- é nem remotamente declamação ou teatro.... (1989, p.18). mindo Freire Mármora. [email protected] Aliada à ação de contar histórias podemos, também, sonorizá-las. A sonorização de histórias ou o trabalho com histórias sonorizadas é um trabalho muito interessante para se fazer com as crianças. Primeiramente, é necessário organizar de forma expressiva o material sonoro, trabalhando a percepção auditiva, a discriminação e a classificação de sons. Pode-se também utilizar livros de imagens e para o desenvolvimento desta atividade os sons vocais e corporais, os cotidiáfonos, (instrumentos sonoros realizados com objetos cotidianos), os brinquedos sonoros e os instrumentos musicais. de conta está sempre presente na vida da criança, possibilitando a ampliação do Ao narrar a história, a mudança de entonação de voz é universo discursivo e para transformar as histórias em atividade musical, precisa- um fator extremamente importante, usando a voz em seu mos torná-las mais expressivas e sonoras. registro mais grave ou mais agudo, dependendo da situação. Ao ouvir histórias contadas com expressividade, as crianças 92 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes REFERÊNCIAS AKOSCHKY, Judith. Cotidiáfonos - Instrumentos sonoros realizados com objetos do cotidiano. Buenos Aires: Ricordi,1996. ABRAMOVICH, Fanny. Literatura Infantil: gostosuras e bobices. São Paulo: Scipione,1989. (Série Pensamento e ação no Magistério). BENJAMIN, Walter. O narrador. In: Magia e técnica, arte e política. Tradução de Sérgio Rouanet. 3.ed. São Paulo: Brasiliense, 1987, pp. 197-221. BRASIL, Ministério da Educação e do Desporto. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília MEC/SEF,1998. BRITO, Teca Alencar de. Música na Educação Infantil. Propostas para a formação integral da criança. São Paulo: Peirópolis, 2003. Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 93 Conhecendo práticas e teorias Construindo Conhecendo práticas e teorias lidando com diversidades na aula de música Arthur Iraçu Amaral Fuscaldo Índios, japoneses, portugueses, africanos, italianos, alemães, árabes, chineses, argentinos... punks, roqueiros, funkeiros, sambistas, pagodeiros, “ecléticos”, rappers, capoeiristas, forrozeiros, eruditos, eletrônicos... iaôs, beatas, evangélicos, umbandistas, católicos, ateus, espíritas... Todos convivem no mosaico cultural da grande urbe paulista. E mais do que isso _pensando não apenas na nossa metrópole, mas no país como um todo_ dizer que os brasileiros compõem um povo híbrido, essencialmente mestiço, já é lugar comum. Diante disso, seria uma falha grave ir para a sala de aula da rede pública, com 40 alunos diferentes em suas origens, referências e práticas culturais, sem considerar tal fato, e querer que uma única “noção de pessoa”1 , uma concepção de criança e de adolescente, um método de ensino musical, encaixem como uma luva em todos os micro-universos que são cada um desses alunos. Alguma inalcançável receita que sirva para a humanidade inteira, que se alie com o conceito atualmente idealizado de globalização, será isso o que devemos buscar? Obviamente não. Sabemos que esse conceito de globalização é, na realidade prática, multifacetado e contraditório; por um lado, traz possibilidades de trocas e interações nunca vivenciados antes, por outro, se vê estreitado à massificação e disseminação de conceitos, valores e poder de uma cultura hegemônica. Divergências entre grupos humanos sempre existiram, o conflito faz parte do contato entre diferentes; acreditar nalguma receita redentora de toda e qualquer forma de conflito é uma forma de alienar-se, é fechar os olhos à multiplicidade de relações que o ser humano pode estabelecer com o mundo. Da mesma forma, o conflito também faz parte e tem seu papel transformador na realidade da sala de aula. Estabelecer diálogos construtivos; conviver, compartilhar 1 - Termo usado por Marcel Mauss na busca de “explicar como uma das categorias respeitando diferenças; acolher e aprender com o outro sem do espírito humano _ uma dessas idéias que acreditamos inatas_ lentamente perder a própria identidade; são alguns de nossos desafios, e surgiu e cresceu ao longo dos séculos e através de numerosas vicissitudes, de tal modo que ela ainda é, mesmo hoje, flutuante, delicada, preciosa e passível de abrangem dimensões sociais, econômicas, políticas, territo- maior elaboração. É a idéia de “pessoa”, a idéia do “Eu”. ( MAUSS, 2003, 369) 94 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 95 Conhecendo práticas e teorias Conhecendo práticas e teorias riais, culturais e, como não poderia deixar de ser, abrangem o campo das questões educacionais. Sendo assim, ligam-se intimamente à aula de música. Identidade A maioria dos estudantes de EJA com os quais venho trabalhando, está numa assuntos para um aprendizado que não se limite às paredes da Intimamente entrelaçados às questões discutidas acima faixa etária que vai dos 18 aos 60 anos. São pessoas que, na maioria dos casos, sala de aula, mas se proponha a dialogar com a vida, aliada à Vale aqui elucidarmos que quando pensamos em diversidades relacionadas e muito comumente presentes em planejamentos de aulas têm opiniões formadas sobre diversos assuntos que permeiam a vida cotidiana, intima relação que há entre as opniões formadas e a consci- ao campo da educação e da música, não nos referimos apenas às diferenças de e projetos de professores de jovens e adultos são os temas como política; religião; esportes; artes; casamento; valores morais; diferenças ência que cada um tem sobre si mesmo dentro do complexo etnia ou raça dos alunos. Estão envolvidas aí também as diferentes formas de se que se vinculam diretamente à investigação, construção e/ étnicas; questões de gênero, e outros. Opiniões estas que fazem parte da constru- sócio-cultural no qual se vê inserido_ seja ele a comunidade ensinar e aprender música; ligadas ou não ao ambiente acadêmico; formatadas ou conscientização de “Identidades”: histórias pessoais; ção racional inserida no que podemos chamar de “identidade”; identidade cultural, escolar, o bairro, o país ou o mundo_ e também ao fato de ou não como pensamento científico; reconhecidas e valorizadas ou escamotea- significados dos nomes; origens étnicas e familiares; locais identidade racial, identidade pessoal. Os mesmos assuntos fazem parte dos temas cada indivíduo ser, potencialmente, interferidor e construtor da das e até mesmo ignoradas. Da mesma forma que se constroem diferentes no- de nascimento; história do bairro; estudo da arte local; cultu- que emergem num processo de aprendizado quando os educadores se propõem a realidade que o cerca, é que concedem um lugar primordial ções de pessoa nas diversas culturas, se constroem também formas de ouvir o ra popular; entre outros. Obviamente isto não é à toa, esta dialogar com o dia-a-dia dos estudantes e com questões da atualidade, de forma que ao tema Identidade no trabalho com jovens e adultos. mundo2 e de se relacionar com o ambiente sonoro. Podemos citar alguns exem- escolha nasce da observação do que é realmente relevante e se torna impossível abordá-los construtivamente sem dialogar com os sentidos que significativo aos indivíduos que compõem tais turmas. lhes são atribuídos a partir das concepções de cada individuo. A importância desses 3 plos: a composição musical do povo indígena Xavante , que está sempre ligada A partir deste tema central pode-se facilmente derivar conteúdos de qualquer disciplina, o que não é diferente no caso á material sonoro proveniente de sonhos; as músicas de Maracatu, Marujada, da educação musical. Em turmas com que trabalhei durante Capoeira Angola, ou dos Negro Spirituals norte-americanos, sempre imbuídas de o ano de 2005, por exemplo, a grande maioria dos estudan- um caráter ritualístico e/ou sagrado. Vale refletir sobre como e quanto estas di- tes compunha-se de nordestinos. Nas investigações sobre versificadas formas de se relacionar com o universo musical ressoam nas formas repertório e referências artísticas de cada um, surgiu muito de aprender e ensinar música, mesmo que de forma inconsciente. material referente ao que chamamos de cultura popular de Acrescentemos também a essa ideia de diversidade os variados direcionamen- tradição ou folclore. A partir disso, a obra do compositor Luiz tos que se pode dar ao que chamamos de educação e as questões ideológicas Gonzaga _fortemente ligada à cultura popular nordestina e aí envolvidas. Educar para quê? Que mundo se está construindo? Que relações que fomentou a valorização da mesma em estados do sul e sociais e econômicas estão sendo firmadas ou contestadas? Em nome de que ins- sudeste do país_ mostrou-se como ponto chave para o início tituições e interesses o educador está realizando seu trabalho? O que está sendo do trabalho e familiarização com o universo musical. trazido ao esclarecimento e o que está sendo ocultado?4 É necessário que cada Numa realidade cultural como a de São Paulo, onde múlti- educador tenha clareza acerca de sua situação e posicionamento em relação a tais plas origens, referências e modelos culturais e comporta- questões. Suas respostas a elas podem interferir decisivamente na definição dos mentais convivem, se chocam e se interinfluenciam de va- conteúdos musicais a serem abordados nas aulas e nas suas opções pedagógicas. riadas maneiras, a noção de “identidade” tende a tornar-se Em meio a tudo isso está o artista-educador, que assume a função de liderança algo instável: “O homem urbano, diante de uma realidade no processo de educação musical junto a um coletivo de estudantes, mas que social cujo sentido lhe escapa sente dificuldade em definir também tem suas relações pessoais, objetivas e subjetivas, com o universo sono- seu lugar no mundo; não consegue apreender a sociedade ro. No processo de ensinar-aprender tais particularidades desse educador também como um todo; falta-lhe uma visão global que lhe permita não podem_ e não tem como_ ser anuladas ou simplesmente substituídas por teo- inserir-se e perceber-se como parte de um todo” (LEPINE, rias e fórmulas. Tenho percebido que no momento de ensinar algo a outra pessoa, 1978). Diante disso, voltar-se às origens étnicas e familiares mais do que os métodos sobre os quais li ou ouvi, o que tem papel primordial, mostrou-se em nossa prática uma espécie de alicerce, de decisivo, são as formas pelas quais aprendi. Se nos identificamos com as propos- porto seguro a partir do qual pôde-se estabelecer diálogos tas de algum método e pretendemos utilizá-lo para ensinar, é fundamental então com a teia de informações e influências culturais na qual que experienciemos aprender por ele. Ser educadores musicais pede, portanto, nos vemos inseridos hoje, de forma mais consistente. que estejamos sempre nos analisando enquanto constantes aprendizes musicais. Pudemos perceber o quanto o trabalho pautado na Sinto que mais aprendemos a ensinar quanto mais aprendemos a aprender. afirmação e valorização de origens culturais era profícuo e No dia a dia da sala de aula é fundamental que se estabeleça e se firme o muito positivo, por exemplo, no que se refere à autoestima diálogo entre diversidades: o saber dos alunos; o saber do educador; os desejos; inquietações; referências culturais; repertórios musicais. É um momento de contato entre diferentes, momento de começar a construir pontes entre e consciência de si. Porém, sentimos também que apenas 2 - Em relação à forma como as pessoas ouvem o mundo vale consultar O Ouvido Pensante de Murray Schafer (1991), e “O Fetichismo na Música e a Regressão da Audição” de Theodor Adorno (1997). isso era pouco. Era importante pôr aquela identidade cultural, agora mais fortalecida, em diálogo e mesmo em conflito diferentes concepções de mundo, vida, educação, arte, música. Essas pontes 3 - O povo Xavante foi um dos últimos povos brasileiros a estabelecer contato com diferentes referências. Foi quando procuramos, junto nortearão o desenvolvimento das aulas, darão as bases para seu planejamento, pacífico com os não-índios e vive atualmente na região do Mato Grosso. Durante aos alunos, identificar e diferenciar nas manifestações liga- no que se refere à escolha dos conteúdos e à metodologia. Essa postura de diálogo e investigação obviamente não se limita aos primeiros dias, se estende no estabelecimento de uma contínua relação dialética entre ação e reflexão. o segundo semestre de 2006, tive a oportunidade de realizar estudo sobre rituais de educação em duas de suas aldeias, com bolsa da Fundação de Amparo à Pes- das à cultura popular aspectos oriundos dos três principais quisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e orientação da professora Luíza Christov. povos formadores da cultura brasileira: indígenas, africanos 4 - Para aprofundamento nestas questões vale consultar os livros “O Que é Educação” de Carlos Rodrigues Brandão(1987), e “Escola e Conhecimento” e europeus. A partir daí, chamando a atenção aos aspectos de Mario Cortella (1998). 96 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes Cadernos Tocando e Cantando ▪ 2009 ▪ nº 2 97 Conhecendo práticas e teorias visuais, iconográficos _como por exemplo os bordados das O que queremos destacar é a importância de o educador estar atento, em sua roupas de Bumba-meu-boi_ estabelecemos comparações prática, ao desenvolvimento da capacidade de articular saberes, valores e inte- com obras visuais de artistas europeus. Foi uma surpresa resses; ou seja, o seu papel enquanto mediador. E de, diante de uma realidade para alguns alunos compreenderem que um festejo popular na qual a ação da arte-educação muitas vezes parece pingo d’água num oceano, que lembravam da infância tinha fortes relações com a grão de areia num deserto, saber alimentar a paixão pelo ensinar e aprender; cultura européia, que lhes parecia tão distante. Uma outra estar pronto para lidar com questões sociais, econômicas e políticas das quais opção para o mesmo tipo de ampliação da consciência da depende a otimização de sua atuação e atentar-se à vastidão de possibilidades dimensão da nossa própria cultura seria estabelecer relações do ser humano enquanto ser que se manifesta e se expressa esteticamente. ■ entre as músicas que cantamos com outros estilos musicais e observar, por exemplo, o quanto a música chamada popular influencia e é influenciada pela música chamada erudita. A confrontação com realidades culturais diferentes e até mesmo avessas à dos indivíduos envolvidos no processo de aprendizagem, além de ampliar o repertório cultural e as possibilidades de relação com o mundo que nos cerca, otimizam o fortalecimento da consciência sobre si mesmo, afinal “A identidade pessoal é inseparável da identidade social e étnica. Edifica-se progressivamente através do jogo de dois processos complementares: de um lado, a identificação com o outro, pai, antepas- Arthur Iraçu A. Fuscaldo _ Mestrando do Instituto de Artes da Unesp na linha de pesquisa sado; do outro, a percepção das diferenças e das oposições. A identi- Ensino e Aprendizagem da Arte. Licenciado em Ed. Artística com Habilitação em Música dade pessoal resulta tanto da identificação com o grupo social e da na mesma instituição. Atuou como pesquisador estagiário da Fundunesp no projeto "To- interiorização dos seus modelos culturais, como da consciência do cando, cantando...fazendo música com crianças" da Secretaria Municipal de Educação que nós não somos e do que nós não temos.” (LÉPINE: 1978) de Mogi das Cruzes. [email protected] REFERÊNCIAS ADORNO, Theodor. O Fetichismo na música e a regressão na audição. In: Os Pensadores. São Paulo: Ed. Abril, 1996. ADORNO, Theodor. Educação e Emancipação. Rio de Janeiro: Paes e Terra, 1995. 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Respostas da seção Batuta: Ligue as palavras KROBOT, Liara Roseli. Música na Formação de Professores Generalistas: professor reflexivo e competências para uma prática de educação rizomática. In XIV Encontro Anual da ABEM. Belo Horizonte. 2005. LÉPINE, Claude. Contribuição ao Estudo da Classificação dos Tipos Psicológicos no Candomblé Ketu de Salvador. São Paulo:USP (Tese de Doutorado). 1978. 1)Flauta de êmbolo 2)Sonoplastia 3)La traviata 4)Tuba 5)Ip-Op 6)Odeon 7)Pintores de Mogi 8)Canto Orfeônico Palavras cruzadas Horizontais Verticais 2 - Timbre 1 - Xilo MAUSS, Marcel. Sociologia e Antropologia. São Paulo: Cosac & Naify, 2003. 4 - Percurssão 3 - Luthier 6 - Códice 5 - JosetteFeres NEVES, Iara Conceição B. [et al.]. Ler e escrever: compromisso de todas as áreas. Porto Alegre: UFRGS, 2003. 8 - Metais 6 - Paulo 11 - Cordas 9 - Duração 13 - Berenice 10 - Densidade 15 - Intensidade 12 - Sardo 16 - Altura 14 - Metalo MC LAREN, Peter. Rituais na escola: em direção a uma economia política de símbolos e gestos na educação. Petrópolis/RJ: Vozes, 1992. RANCIÈRE, Jacques. O mestre ignorante – cinco lições sobre a emancipação intelectual. Trad. Lílian do Valle. 2ª ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. SCHAFER, R. Murray. O Ouvido Pensante. São Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1991. VIGOTSKI. Psicologia Pedagógica. São Paulo: Martins Fontes, 2004. 98 Prefeitura Municipal de Mogi das Cruzes 17 - Madeiras 18 - MogidasCruzes