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REPORTAGEM
EXPANSÃO
Por Ricardo Vieira
Novos caminhos
Lin Lima
Campus Fiocruz da Mata Atlântica, com cinco milhões de metros
quadrados, se torna diferencial atrativo na recepção de indústrias na área
de ciência e tecnologia; grande empresa de biofármacos começa a operar
no local em 2015
Parceria da Fiocruz com a empresa Bionovis fará nascer dentro de um ano uma grande indústria farmacêutica
de biofármacos para o tratamento de artrite reumatoide e câncer; será a primeira do tipo no país.
Q
uem passa pela Avenida Brasil, principal porta de
entrada e saída do Rio de Janeiro, pode se surpreender com um imponente castelo de arquitetura
destacada em meio à degradada paisagem da
maior avenida em extensão do país. É o Castelo
Mourisco, o grande símbolo da Fiocruz, com cinco andares,
decorado com afrescos e mandalas por toda a construção,
feita com inspiração nos palácios mouriscos espanhóis. Aqueles que têm a oportunidade de visitá-lo também acabam
impressionados com o tamanho da sede da Fundação. O
visitante pode encontrar exposições, peças teatrais e outras
tantas atrações, além de um trenzinho que percorre parte dos
800 mil metros quadrados do local. Mas esse tamanho se
apequena quando comparado ao do “irmão” mais novo do
campus principal da Fundação.
Há mais de quatro anos a instituição também conta com
o Campus Fiocruz da Mata Atlântica (CFMA), situado em
Curicica, na região de Jacarepaguá, na Zona Oeste do Rio de
Janeiro. Ao todo, são nada menos que cinco milhões de
metros quadrados de uma área rara para a cidade, com cerca
de 90% do terreno composto pelo bioma Mata Atlântica. “É
uma excelente oportunidade para se estabelecer uma ocupação baseada nos princípios da sustentabilidade”, afirmou à
época do lançamento do CFMA, em 2010, o coordenador
do novo campus, Gilson Antunes. Porém a décima parte do
terreno também tem muita importância, com comprovação
atestada em julho deste ano, quando foi divulgada a parceria
da Fiocruz com a empresa Bionovis. Dessa junção vai nascer
dentro de um ano uma grande indústria farmacêutica de
biofármacos para o tratamento de artrite reumatoide e câncer. “A importância da Bionovis naquele terreno, para além
de garantir uma nova fronteira de biofármacos e a sustentabilidade do Sistema Único de Saúde (SUS), também significa
estar integrada a uma região com condições especiais de
beleza e patrimônio ecológico, mas que estava numa área de
risco e sem projeto de desenvolvimento”, comemora o
presidente da Fiocruz, Paulo Gadelha.
O Campus Fiocruz da Mata Atlântica apareceu como um
importante fator na disputa entre o Rio de Janeiro, São Paulo
e Santa Catarina para sediar a nova empresa, que deverá
investir R$ 500 milhões nos próximos cinco anos e que, em
contrapartida, vai receber incentivos fiscais do governo esta-
RUMOS – 38 – Julho/Agosto 2014
dual para sua instalação. A importância vital do novo empreendimento é evidenciada com o dado de que o Brasil hoje é
totalmente dependente de importações no setor. A indústria
de biológicos movimenta US$ 160 bilhões de dólares, sendo
US$ 6 bilhões apenas no Brasil.
Ás na manga do Rio, o terreno do CFMA tem uma relação
de mais de uma década com a Fiocruz. Começou em 2003,
quando a instituição recebeu o chamado Setor 1 do local (o
maior e mais bem preservado), com cessão precária. Em 2007,
a cessão foi consolidada por 50 anos e dois anos depois teve
início o processo de doação definitiva da área à Fiocruz. Os
outros setores do terreno são o 2, onde funcionava a extinta
Colônia Juliano Moreira – hospital psquiátrico que foi referência nacional durante grande parte do século passado; o 3, que
foi cedido à Secretaria de Habitação para assentar pessoas
desabrigadas; o 4, vendido pelo Exército; o 5, onde está instalado o Hospital Rafael Pedro Souza; e o 6, onde se encontra o
Centro Hélio Fraga. Um ano depois do início da cessão do
espaço, em 2004, a Fiocruz logo definiu três eixos de atuação
do então Campus Jacarepaguá 1: fitomedicamentos, patrimônio cultural da saúde e biodiversidade e saúde. Mais tarde, em
2005, foi criado o Programa de Implantação do Campus de
Mais sobre a indústria
de biofármacos
A parceria que colocou o CFMA nos noticiários
recentemente vai garantir a primeira indústria do tipo do
país. A Bionovis foi criada em 2012 em uma união das
gigantes EMS, Aché, Hypermarcas e União Química.
Cada uma delas terá 25% das ações da nova indústria.
O complexo processo de produção dos medicamentos biológicos acontece a partir de células vivas modificadas geneticamente. Eles são desenvolvidos para tornar
inativos mecanismos específicos de certas doenças, e são
adequados para diversas categorias de produtos, desde
terapia celular contra o câncer até terapias gênicas e vacinas. São muito mais precisos e seletivos do que a maioria
dos remédios convencionais. “Não tem nada no setor de
saúde que seja mais inovador e relevante do que o projeto
de se produzir no Brasil biofármacos”, afirma o presidente da Bionovis, Odnir Finotti.
Os remédios fabricados pela nova indústria devem
estar em três anos no mercado, pois esse é o prazo para
que as suas patentes sejam expiradas. Na lista de produtos estão os remédios Rituximabe (linfoma e artrite
reumatoide), Etanercepte (oncológico), Infliximabe
(artrite reumatoide), Cetuximabe (oncológico), Trastuzumabe (oncológico) e Bevacizumabe (oncológico).
Eles serão vendidos ao Ministério da Saúde para distribuição gratuita pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Com
isso, o governo deverá ser o principal comprador da
Bionovis. A ideia é reduzir o deficit da balança comercial
da saúde. A expectativa é de uma economia de pelo
menos R$ 460 milhões nos próximos cinco anos.
Jacarepaguá. Com ele, o Plano Diretor e o Plano de Regularização Fundiária também foram criados. Além disso, o programa articulou ações para conhecer o novo território. Projetos
de captação de recursos externos foram elaborados e alianças
com outras instituições para viabilizar a implantação do
CFMA começaram a ser costuradas.
Sustentabilidade – Desde o início, a Fiocruz buscou uma
ocupação exemplar para o terreno. De cara, implementou
três projetos para coleta seletiva solidária. Um deles, o da
Colônia Juliano Moreira, recebeu fomento de quase R$ 35
mil. Mais tarde, em 2013, o CFMA lançou um projeto ecológico com apoio do BNDES. O Projeto de Recuperação e
Restauração Ecológica foi orçado em R$ 2,5 milhões e teve
origem com a proposta de gerar modelos sustentáveis para a
restauração florestal e conservação dos serviços ambientais.
“Toda a região do CFMA, que no passado sediou fazendas de
cana de açúcar e café, passou por séculos de devastação. Em
geral, em 1 hectare de Mata Atlântica encontram-se cerca de
400 espécies de árvores. Aqui, no entanto, estamos encontrando uma média de apenas 50”, contou a bióloga Andrea
Vanini, uma das coordenadoras do projeto.
Nesse programa, outro problema observado pela bióloga
foi a expressiva quantidade de espécies exóticas – como pés
de jaqueira e jamelão – a serem retiradas e substituídas por
plantas nativas da Mata Atlântica. “Isso tem que ser feito de
maneira equilibrada, porque a fauna da região já está acostumada com essas árvores e delas extrai seus alimentos”, explicou Andrea, acrescentando que o enriquecimento ambiental
é uma das tarefas do projeto.
Riqueza histórica – A Casa de Oswaldo Cruz (COC) fez o
levantamento do patrimônio histórico e arquitetônico do
Campus e também fez os levantamentos arqueológicos. Da
lista de sítios arqueológicos constam ainda um cemitério,
uma senzala, uma igreja e a sede da antiga fazenda. O local
está tombado pelos órgãos de defesa do patrimônio histórico. A região de Jacarepaguá foi, desde o início da colonização
portuguesa, ocupada por engenhos de cana-de-açúcar. A
partir da década de 1830 transformou seus antigos engenhos
de açúcar em fazendas de lavoura de café.
Na área do Campus encontra-se o Maciço da Pedra Branca, que circunda os bairros de Guaratiba a oeste, Bangu e
Realengo ao norte, Jacarepaguá a leste, Barra da Tijuca a
sudoeste, Recreio dos Bandeirantes e Grumari ao sul e
Campo Grande a noroeste. No maciço está um dos maiores
parques urbanos do mundo, o Parque Estadual da Pedra
Branca, que tem cerca de 12,5 mil hectares de área coberta
por vegetação típica de Mata Atlântica. O parque tem uma
importante rede hidrográfica, já que parte dela contribui para
o abastecimento de água da região circunvizinha, destacando-se as represas do Pau da Fome e do Camorim, das Taxas e
do Engenho Novo. A área ainda conta com oito bacias principais e 53 microbacias. “É um território rico em termos da
história de ocupação humana. Já foram encontradas, por
exemplo, peças como machados e outros objetos produzidos
por indígenas que habitavam a região séculos atrás”, relata o
coordenador Gilson Antunes.
RUMOS – 39 – Julho/Agosto 2014
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