Felizes para sempre Swellen Pereira Corrêa Numa tarde cálida, eu meditava, com meu coração sereno, sobre a frase insólita dos contos de fada; “e eles foram felizes para sempre”. O que posso anunciar é que não existe essa estória de ‘Para sempre’, isso é incomum. Posso-lhe narrar como não creio mais em conto de fadas. Não mais. Ah, como eu ainda me recordo daquele funesto evento. Era uma linda manhã de primavera, o tão esperado dia. Os pássaros cantavam, as flores davam a mais airosa cor e perfume, o dourado da alvorada estava ao meu amparo. Seria naquele dia que eu ouviria o tão esperado “felizes para sempre”. Mas como eu disse – “não existe final feliz”. Eu ansiava por aquele momento. O homem que eu amava estaria comigo por toda a eternidade. Mas isso não se consumou. A manhã primaveril se tornou no mais gélido inverno de dezembro. Não imaginavam o amor que eu sentia por Robert. Era um rapaz de uma beleza rara e radiante, cobiçado por todas as donzelas da província. Robert meu amado, eu ‘Nunca mais ousarei pronunciar o teu belo nome. Eu observava a tarde serena que se apressava em chegar, do lado de fora via todos os preparativos e o meu vestido ali pendurado do meu lado me observando. Como eu podia imaginar que aquele contentamento que ocupava o meu peito se reverteria em imensa dor. Ouço um bater suave em minha porta. É a nossa criada, que foi me chamar para receber os pais de meu amado. Por hora a questionei o motivo da visita, mas de pronto os fui receber. Ao entrar na sala, deparo com Dª Eleonora aos prantos e seu esposo sentado de fronte baixa, chorava discretamente. Sem muitas delongas perguntei o que acontecera. –“Qual o motivo do pranto”. Tão direta quanta minha pergunta fora a tua resposta. – “Meu filho, meu único filho morreu!”. Naquele instante um vento frigido tocou minha espinha perfurando o meu coração. Não conseguia me mover, a dor era imensa, meu coração atenuava mais as batidas. Única coisa que perguntei aos prantos era. – “Onde ele está?”. “– Está no Belle Époque!” é um cabaret. Rapidamente corri o estábulo peguei meu cavalo e fui de encontro ao meu amado. Ele não podia ter feito àquilo comigo! Não ter ido a um cabaret, mas sim ter partido sem dizer Adeus. Quando adentrei naquele antro de perdição eu o vi caído ali no chão, como um mendigo, nu, coberto de plumas, marcas de batom e vômito. Não consegui pensar em mais nada. Vendo-o naquela situação. No mesmo instante um de seus amigos se aproximou de mim, pedindo desculpa por ter o forçado a vir neste local para uma despedida de solteiro. Estava tão louca de raiva e com uma imensa dor que não hesitei e o surrei, com o chicote que esta em minha mão. A polícia tentou me deter, mas não conseguiram. Era como se uma força maior tivesse tomado meu corpo frágil e franzino. Quando percebi o que tinha feito, sai correndo pelas ruas arrancando minhas roupas, ficando apenas com as roupas de baixo. Retornei para minha casa, adentrei em meu quarto, completamente tomada pela dor, pela vergonha, comecei a rasgar meu vestido de noiva. Minha pobre mãe já não sabendo o que fazer, apenas chorava por me ver naquele estado. Enquanto não acabei com todos os preparativos e com as minhas forças eu não parei. Cai na relva completamente nua. Fui resgatado por minha mãe e a criada. Prontamente me deram um banho quente com pétalas de rosas brancas para que pudesse ficar mais calma. Mas como eu podia ficar calma? Vestiram-me e me deixaram a sós com a dor. Sentada de frente a minha janela cai em plena loucura; – “horas antes eu deslumbrava a alvorada. Agora estou presa no desespero.” Já era madrugada, ainda acordada padecia em minha loucura silenciosa. O tão contínuo silencio é quebrado com uma leve batida na porta. De meus aposentos, digo: – “não quero falar com ninguém!”. Insistiram mais uma vez. Minha alma ganhou força e não hesitou – “Mamãe” eu disse – “ ou papai porque me chamas?”. Deixe-me padecer em meio a minha agonia. “Sussurrei, “abrindo a porta lentamente –” o silêncio era igual ao de meu coração”. Avistei apenas trevas e nada mais. Em meio à escuridão, lá permaneci, tremendo, ouvindo, sonhando com coisas jamais sonhadas por um reles mortal. O silêncio persistia, e a mansidão nada me dizia. Ouvia apenas minha profunda respiração e o nome dele entre os ecos de minha respiração. Apenas isto. Retornei para meu aposento. Minh’ alma queimava. E novamente ouvi baterem mais forte – “é alguém lá fora quem bate, implorando pela entrada” – pensei, e busquei vestígios “ Pobre coração que ainda sofre, acalma-te é apenas o vento balançando alguma galha e nada mais”. Tomei coragem e fui de encontro ao som, que me levou á porta da cozinha. Então abri a porta, eis que um forte vento traz em minhas mãos um lenço que eu dera a ele. Tremia, mas não sabia se era de medo ou de frio. Já do lado de fora uma densa neblina paira nos campos, – pergunto “Quem está ai?”. Isso não tem graça, brincar com a dor alheia. – repeti “Quem é?”. Ouço uma voz gélida e rouca – dizendo: “Nunca mais”. Atônita ouvindo aquilo que vira de dentro da névoa – brandamente eu disse: “É tudo o que sabes?”. Novamente a mesma voz gélida do meio da névoa diz “Nunca mais felizes para sempre!”. Naquele momento lembrei-me o que havia dito sobre o corpo de meu amado, meus olhos penumbrais e cuja dor exprimia as sílabas penumbrais que saíra de minha boca. Arrastei uma cadeira de balanço para o meio do campo coberto de neblina e em minha direção veio como uma sombra, que lembrava muito meu amor e lá fiquei absorta e muda. No mesmo instante senti meus cabelos serem acariciados pelo veludo da névoa. Veludo que Robert sempre trazia nas mãos ao me acariciar, que entre as luzes espectrais não me tocará nunca mais. O ar supostamente ficou mais rarefeito. Serafins estavam ao redor do espectro. E eles me disseram –“ lhe trouxe o teu amado para que o veja pela última vez, mando-te o teu esquecimento, e alivio-te as tuas dores brutais. Beba neste cálice e te esqueças de tuas dores” – disse o fantasma: “Nunca mais”. Diga a esta nobre alma que não hei de amar outro, e que ele há de me rever o mais puro ser que agora ele não vê mais, e Robert o ser mais puro e radiante que já não vejo mais. Disse o espectro de Robert – “nunca mais”. Que a cena deste nosso adeus fique marcada em minha mente. Vá em paz meu amado e me deixe aqui para conviver com meus devaneios, minha loucura. Vá embora como uma pluma, e deixe-me a lembrar do que disseste em meio ao meu tédio. E Robert não se foi: ficou lá, lá se demora ao meu lado segurando minha mão, com seu lindo rosto. E eu me coloquei a dormir no meio do campo com uma expressão tristonha, ouvindo agora sua doce voz, dizendo-me “Nunca mais”. Me desperto agora com minha mãe gritando e chorando, abraçando-me. “E eu lhe dizia – Nunca mais felizes para sempre”.