A ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO E DA POLÍCIA FEDERAL NO COMBATE AO TRÁFICO NACIONAL E INTERNACIONAL DE PESSOAS PARA EXPLORAÇÃO SEXUAL THE ROLE OF THE PUBLIC PROSECUTION OFFICE AND THE FEDERAL POLICE IN THE COMBAT OF NATIONAL AND INTERNATIONAL TRAFFICKING OF PEOPLE FOR SEXUAL EXPLOITATION Leonardo Simões Agapito Graduando do 3º ano de Direito, UNESP/Franca [email protected] http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4307442D4 Maiara Motta Graduanda do 3º ano de Direito, UNESP/Franca [email protected] http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4361795A4 1 Resumo: O objetivo do presente trabalho é abordar o tráfico de pessoas com o principal fim da exploração sexual. Após um panorama geral do contexto e a forma como se insere tal delito historicamente, bem como na sociedade atual, far-se-á um estudo de alguns dos principais institutos normativos, desde posicionamentos internacionais, apresentados por organismos supra-nacionais, até a legislação interna brasileira e suas mudanças. Discorre-se, já em um segundo momento, sobre a atuação do Ministério Público e da Polícia Federal, destacando seus projetos e suas atuações, exemplificados por jurisprudências e pelas apresentações de operações paradigmáticas. Palavras-chave: tráfico de pessoas. exploração sexual. ministério público. polícia federal. Abstract: The main goal of this work is to approach the trafficking of people with the main purpose of sexual exploitation. After a general context and the way the crime fits into history, as well as in the current society, a study will be made approaching some of the main legal institutes, since international positions, presented by supra-nationals organism, to internal Brazilian law and its changes. We learn about the actions of the prosecutors and the Federal Police, particularly, some of its operations, exemplified by court decisions and some important operations. Key-words: trafficking of people. sexual exploitation. public prosecution office. federal police. 2 Sumário 1. Introdução.......................................................................................................................3 2. Tratados Internacionais e a Legislação Interna...............................................................4 2.1. Tratados e protocolos internacionais........................................................................4 2.2. Legislação Interna e demais diplomas.....................................................................5 2.2.1. O artigo 231 do Código Penal..............................................................................5 2.2.2. Outros diplomas legais relevantes........................................................................7 3. A atuação do Ministério Público no combate ao Tráfico...............................................8 4. A atuação da Polícia Federal no combate ao Tráfico....................................................10 5. Julgados.........................................................................................................................13 6. Conclusão......................................................................................................................15 7. Bibliografia...................................................................................................................16 3 1. Introdução “E esta é uma nota comum entre proxenetas, rufiões e traficantes de mulheres: todos corvejam em tôrno da libertinagem de outrem, ora como mediadores, fomentadores ou auxiliares, ora como especuladores parasitários. São moscas da mesma cloaca, vermes da mesma podridão” Nelson Hungria1 O tráfico de pessoas é uma violação dos direitos humanos que se tornou uma preocupação cada vez maior, tanto no nível nacional quanto internacional. Por meio de legislações, programas, cooperações e incentivos à denúncia, busca-se desvendar as principais rotas e os sujeitos por trás dessas ações. Na concepção de Andrea Pacheco Pacífico e Junne Maria Duarte Barbosa Leite, “é considerado crime por impedir que o ser humano exerça seus direitos, como liberdade de escolha, direito ao próprio corpo e a uma vivência saudável da sexualidade e direito de ir e vir”2, além de violar o princípio constitucional brasileiro da dignidade da pessoa humana. Define o Protocolo da ONU (Decreto n.5.017, de 12 de março de 2004), em seu artigo 3º, alínea a: a expressão "tráfico de pessoas" significa o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força ou a outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha autoridade sobre outra para fins de exploração. A exploração incluirá, no mínimo, a exploração da prostituição de outrem ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou serviços forçados, escravatura ou práticas similares à escravatura, a servidão ou a remoção de órgãos3 Sendo utilizado qualquer meio referido na alínea acima, não importa o consentimento da vítima para a caracterização do crime. 1 “Comentários ao Código Penal”, Nélson Hungria e Romão Côrtes de Lacerda, 1947, p.253. Disponível em: http://www.csem.org.br/remhu/index.php/remhu/article/viewFile/280/255, em 24/05/2013, p. 127. 3 Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5017.htm, em 24/05/2013. 2 4 Segundo Cícero Rufino Pereira4, o Tráfico de Seres Humanos (TSH), é gênero, sendo a exploração sexual uma das espécies, tais como as finalidades de remoção de órgãos para venda, adoção ilegal e para realização de práticas de redução à condição análoga à de escravo. Entre os anos 2005 e 2010, 31 pessoas foram indiciadas pela Polícia Federal e 117 presas pelo crime de tráfico interno de pessoas para exploração sexual5. Contudo, considerado o tráfico de pessoas uns dos crimes mais lucrativos pela OIT6, é necessário um combate no plano internacional para a solução dessa violação da liberdade humana. Para tanto, nas principais figuras internas nesse combate destacam-se o Ministério Público e a Polícia Federal. Assim, o presente trabalho analisa o histórico do tráfico de pessoas, ressaltando os principais diplomas legais e internacionais, para então estudar a atuação do Ministério Público e da Polícia Federal, fazendo o uso de normas, notícias e doutrinas. Por último, encontram-se alguns julgados acerca do tema para compreender o atual entendimento dos tribunais e averiguar, na prática, o resultado das campanhas. 2. Tratados Internacionais e a Legislação Interna Após analisarmos o problema do tráfico de pessoas na atualidade, faremos aqui uma análise geral dos diplomas que tratam deste assunto, tanto em âmbito internacional, quanto no âmbito nacional. Não temos a pretensão de esgotarmos todos os diplomas aqui, mas de fazer um levantamento geral dos principais. 2.1.Tratados e protocolos internacionais Conforme destaca Luiza Nagib Eluf7, a criminalização do tráfico de pessoas teve início no século XIX, por diversas conferências realizadas na Europa com objetivo de repressão à prostituição. O primeiro desses congressos ocorreu em 1885, em Paris (Congresso Penitenciário de Paris). Interessante notar que a preocupação de tais congressos se dava com o tráfico de mulheres brancas, evidenciado em 1899, no congresso ocorrido em Londres (International Congress on The White Slave Traffic) e em 1904, novamente em Paris 4 Disponível em: http://www.prt24.mpt.gov.br/site/includes/docs/comunicacao/artigos/mp_trafico_seres_humanos.pdf, em 24/05/2013. 5 Disponível em: http://portal.mj.gov.br/main.asp?View={02FA3701-A87E-4435-BA6D1990C97194FE}&BrowserType=IE&LangID=pt-br¶ms=itemID%3D%7B972FBB58-F426-4450-A8D41F4264D8A039%7D%3B&UIPartUID=%7B2218FAF9-5230-431C-A9E3-E780D3E67DFE%7D, em 24/05/2013. 6 “Tratado de direito penal”, v.4. BITENCOURT, 2012, p. 439. 7 “Crimes contra os Costumes e Assédio Sexual: doutrina e jurisprudência”. ELUF, 2006. 5 (Arrangement International Pour la Traite de Blanches), o primeiro a ter a participação de uma delegação brasileira8. Além das já citadas conferências, poderíamos acrescentar a Comissão especial da Sociedade das Nações, em 1927, além de outras medidas tomadas pelo mesmo organismo internacional, bem como pela Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948, e a Lake Sucess, de 1950, da ONU. Mais recentes, ainda podemos citar a Convenção de Palermo (2000), que trata da criminalidade organizada, prevendo cooperação entre os Estadosmembros, proteção das vítimas e combate à lavagem de bens e dinheiro. A Convenção de Palermo ainda foi complementada pelo Protocolo para Prevenir, Suprimir e Punir o Tráfico de Pessoas, em especial o de mulheres e crianças, dando em seu texto a definição de tráfico (artigo 3º), reforçando a necessidade de proteção da vítima (artigo 6º), a troca de informações entre os Estados-membros (artigo 10). Em um âmbito mais restrito, latino-americano, podemos destacar ainda a Convenção Interamericana sobre Tráfico Internacional de Menores (1998), a Convenção de Belém do Pará (1994) e a Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas (1994), todas ratificadas pelo Brasil. 2.2.Legislação Interna e demais diplomas A primeira lei nacional a tratar do tráfico de pessoas foi a Criminal Law Amendment Act, de 1885, na Inglaterra. De acordo com Nélson Hungria, a partir deste exemplo inglês, tornou-se o delito de tráfico de pessoas um tipo presente em todos os diplomas nacionais. No Brasil, o primeiro marco legal quanto a este assunto foi a Lei Mello Franco, de 1915, que buscou atender às exigências da Convenção de Paris (1902), baseando-se também na lei francesa, de 19039. 2.2.1. O artigo 231 do Código Penal Tratando agora especificamente sobre a tipificação penal existente em nosso Código Penal, podemos dizer que o artigo 231, que trata do tráfico internacional de pessoas, que recebeu nova redação com a Lei n.11.106, de 200510, além do acréscimo do artigo 231-A, tiveram ainda sua redação alterada pela Lei n.12.015, de 2009. A principal alteração, trazida pela Lei n.11.106, está ligada ao polo passivo do tipo penal, antes restrito a mulheres, alterado 8 “Manual de Direito Penal brasileiro”, v.II, PIERANGELI, 2007. “Comentários ao Código Penal”, Nélson Hungria e Romão Côrtes de Lacerda, 1947. 10 De acordo com Pierangeli, tal reforma veio a atender às exigências feitas pela Associação Internacional de Direito Penal (AIDP). Ver: “Manual de Direito Penal brasileiro”, PIERANGELI, 2009. 9 6 o artigo passando a utilizar o termo “pessoas”, podendo ser esta vítima uma criança ou um homem. Uma questão importante ainda a ser tratada com relação a este artigo 231 está contido em sua abrangência territorial. O legislador, ao definir o tráfico enquanto “entrada” ou “saída” do território nacional com fim de exploração sexual, pode dar a entender que a simples passagem pelo território brasileiro não dá aos órgãos nacionais o direito de julgar e punir o tráfico. Essa é a posição defendida por Cezar Roberto Bitencourt, em seu manual de Direito Penal11. Contudo, tal posição se mostra absurda pelo simples fato de que, para que haja a simples passagem pelo território, vê-se a saída12. Ainda assim, se observado o artigo 7º, II, do mesmo Código Penal, veremos o dever assumido pelo legislador pátrio em punir delitos cometidos em outro país, quando por tratado internacional, se comprometeu o país a punir. Dessa forma, o artigo 231, enquanto exigência da cooperação internacional, coloca o Brasil no dever de punir o agente que favoreceu a saída de outrem com fim a prostituição13. Outro ponto importante a ser destacado com relação ao artigo 231, CP, é quanto ao comportamento da vítima. Já em 1947, Nélson Hungria destacava que independia o fato da mulher ser “honesta” ou não, fazendo, contudo, a ressalva (citando Ada Von Potenstein) que o combate ao tráfico seria muito mais fácil “se a vítima não se entregasse, quase sempre, de boa vontade”14. O consentimento da vítima, como explica Eluf, não tem importância. O único tipo subjetivo é com relação ao dolo do agente, que deve transportar ou favorecer de alguma forma, tendo consciência do fim a que se destina a viagem. O objetivo de lucro, embora normalmente o seja, apenas qualifica o crime, repercutindo em matéria de prova. Por ser um crime material, é consenso na doutrina admitir-se a tentativa, que seriam os preparativos da viagem. Por fim, Eluf ainda categoriza o tipo como sendo um delito de perigo e faz a observação de que, no tráfico, presume-se a violência, mas a agressão física, moral ou ainda a fraude são causas de aumento de pena. Além destes, também são causas de aumento de pena (tanto para o artigo 231, quanto para o artigo 231-A) o fato da vítima ser menor de 18 anos, possuir qualquer tipo de 11 “Tratado de Direito Penal”, v.4, BITENCOURT, 2012. “Manual de Direito Penal brasileiro”, PIERANGELI, 2009, com referência a Magalhães Noronha. 13 Sobre isso: “Crimes contra os Costumes e Assédio Sexual: doutrina e jurisprudência”. ELUF, 2006. Ver também: “Comentários ao Código Penal”, Nélson Hungria e Romão Côrtes de Lacerda, 1947. 14 “Comentários ao Código Penal”, Nélson Hungria e Romão Côrtes de Lacerda, 1947. 12 7 deficiência mental que a impeça de ter total discernimento de seus atos, ser o agente familiar ou por qualquer outra forma responsável pela vítima (curador, tutor, cônjuge, empregador)15. 2.2.2. Outros diplomas legais relevantes Ainda com relação aos diplomas nacionais, podemos destacar o Estatuto da Criança e do Adolescente. No artigo 82, temos a proibição de hospedagem de criança ou adolescente em estabelecimentos como hotéis, motéis, pensões ou similares, sem o acompanhamento de pais ou responsáveis. Nos artigos 83, 84 e 85, o Estatuto trata da permissão para viajar. Os artigos 240 a 244-A, por sua vez, tratam da exploração de imagens, bem como a venda de material pornográfico a menores e o assédio a menores. Os artigos 250 e 251 definem as penas aos atos que não observarem o disposto nos artigos 82 a 85. Basicamente, os institutos aqui apresentados não fazem referência direta ao tráfico, mas punem os atos que seriam praticados durante o tráfico (a viagem, a hospedagem e o assédio) de crianças, sem deixar de punir outras ações, que não o tráfico, que se utilizem dos mesmos atos. Nesse mesmo caminho, ainda poderíamos destacar a Lei n.9807/99, que trata da proteção às vítimas e a Lei de Lavagem (Lei n.9613/98), que teve seu texto alterado pela Lei n.12.683/2012. A Lei de Lavagem se faz aqui relevante por ser esta atividade essencial para que as organizações criminosas possam desempenhar suas demais funções (ainda que não sejam as únicas que utilizem deste artifício)16. Em uma versão um pouco mais “poética”, justificando a necessidade da lavagem de dinheiro, a Min. Carmen Lúcia, durante o julgamento da Ação penal n.470, chegou a dizer que "o dinheiro é, para o crime, o que o sangue é para a veia. Se não circular, não temos esquemas criminosos como esse. Há uma necessidade enorme de que existam instituições financeiras que se prestem para situações como essa"17. Por fim, podemos também destacar a Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, que busca atingir o disposto no supracitado Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em especial Mulheres e Crianças. Entre os princípios norteadores, o diploma ressalta os direitos fundamentais, já assegurados na carta constitucional, bem como o respeito aos tratados e convenções internacionais sobre a matéria. 15 Quanto a isso, é interessante o panorama histórico feito por Hungria, ao relatar que em Roma, o marido que se aproveitasse do adultério de sua esposa cometia crime, entendido como a própria exploração lucrativa da prostituição. Ver: “Comentários ao Código Penal”, Nélson Hungria e Romão Côrtes de Lacerda, 1947. 16 Ver: “Crime Organizado: aspectos gerais e mecanismos legais”, MENDRONI, 2009. 17 Ver: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/66155-stf-ve-lavagem-de-dinheiro-e-complica-situacao-depoliticos.shtml, disponível em 14 de setembro de 2012. 8 Ainda vale destacar a definição de competências de órgãos e entidades públicos, dentro de áreas específicas, como Justiça e Segurança Pública, Relações Exteriores, Educação, Saúde e Assistência Social. Dentro da primeira área (Justiça e Segurança Pública), interessante a decisão de “incluir o tema no debate sobre lavagem de dinheiro”. Ainda que o diploma não defina meios, ou, se quer, exemplifique, tal posição merece destaque pelos argumentos apresentados anteriormente. 3. A atuação do Ministério Público no combate ao Tráfico O trabalho do Ministério Público frente ao tráfico de pessoas não se dá somente na repressão de casos em andamento, pois age também na repressão, impedindo o aliciamento de potenciais vítimas. Assim, a Procuradoria-Geral de Justiça, órgão público que materializa o trabalho do Ministério Público18, criou Grupo de Trabalho pelo Ato PGJ n. 33/201119, a partir do qual monitora a política estadual no enfrentamento ao tráfico de pessoas20. Dentre essas políticas estaduais, no estado de São Paulo o Comitê Interinstitucional de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas21, criado em 2004, resulta da parceria entre Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania, Instituto Latino Americano de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos (ILADH), Consulado dos Estados Unidos da América, dentre outros. Reúne mais de 30 entidades cujos objetivos são a realização de políticas públicas preventivas e enfrentamento do tráfico de pessoas no Brasil, principalmente dentro do estado de São Paulo22. Juntamente, o Núcleo de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas de São Paulo (NETP/SP) é órgão da Secretaria de Justiça e da Defesa da Cidadania o qual exerce a secretaria executiva do CIPETP. Sendo o Ministério Público o titular da ação penal pública, meio pelo qual se processa o crime de tráfico de pessoas, justifica-se a criação de leis instituindo programas de atuação 18 Disponível em: http://www.mpam.mp.br/index.php/orgaos-da-adm-superior/procuradoria-geral, em 24/05/2013. 19 Em seu art. 3º, altera a redação do art. 3º do Ato 24/09-PGJ, de 10 de março de 2009, sobre as incumbências ao Grupo. Ver: http://biblioteca.mp.sp.gov.br/PHL_IMG/ATOS/033-2011.pdf, acessado em 24/05/2013. 20 Disponível em: http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/cao_civel/Trafico_de_Pessoas/AE691E5C94593206E040A8C0DE0 1042A, em 24/05/2013. 21 Fluxograma de trabalho do Comitê: http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/cao_civel/Trafico_de_Pessoas/Fluxgrama-v-1.1.gif. Mapa com área de atuação dos Comitês regionais: http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/cao_civel/Trafico_de_Pessoas/Mapa_Comites_Regionais.pdf. Relação de entidades no combate ao tráfico de pessoas: http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/cao_civel/Trafico_de_Pessoas/Entidades%20de%20combate%20ao %20Tr%C3%A1fico%20de%20Pessoas.doc. 22 Disponível em: http://www.justica.sp.gov.br/Modulo.asp?Modulo=590, em 24/05/2013. 9 especificando os órgãos e agentes que participam além das metas a serem alcançadas. Destacam-se alguns diplomas legais e programas acerca do combate ao crime: – Decreto nº 54.101, de 12 de Março de 2009, São Paulo, o qual “institui o Programa Estadual de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas – PEPETP, junto à Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania, e dá providências correlatas”23. Em seu artigo 2º, elenca como metas ações de prevenção, repressão e responsabilização, orientação e adequado atendimento às vítimas e servir como fonte de informações técnicas a profissionais e ativistas dos ramos de segurança pública e promoção dos direitos humanos; – Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (PNETP), o qual reforça a Política Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas (Decreto n. 5.948/06) e contou com a colaboração do Ministério Público em conjunto com a sociedade civil para sua produção24; – Projeto de Lei n. 2.845/0325, o qual “estabelece normas para a organização e a manutenção de políticas públicas específicas de prevenção e enfrentamento ao tráfico de seres humanos, especialmente mulheres e crianças”. O mesmo diploma legal instituiu o Sistema Nacional de Prevenção e Enfrentamento ao Tráfico de Seres Humanos além de “dispor sobre a regulamentação de seus aspectos civis e penais”. Dentre as rotas descobertas, há um relatório datado de 2010 com diferentes origens, destinos e nacionalidades de vitimas envolvidas26 além de mapas com as principais rotas no ano de 2011, no período entre os meses de janeiro e maio27. 4. A atuação da Polícia Federal no combate ao Tráfico Neste momento, faremos uma análise do trabalho da Polícia Federal no combate ao tráfico de pessoas. De acordo com Mendroni, o papel da polícia, frente às organizações criminosas é o de entender o “como”, “quem” e o “porquê”28. Por sua vez, o Ministério da Justiça determinou que é a Polícia Federal órgão responsável pela repressão e responsabilização dos 23 Disponível em: http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/cao_civel/Trafico_de_Pessoas/Decreto %205410109%20%20Decreto%20n%C2%BA%2054_101.htm, em 24/05/2013. 24 Disponível em: http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/cao_civel/Trafico_de_Pessoas/2008 PlanoNacionalTP.pdf, em 24/-5/2013. 25 Disponível em: http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/cao_civel/Trafico_de_Pessoas/projeto% 20lei%20trafico.pdf, em 24/05/2013. 26 Disponível em: http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/cao_civel/Trafico_de_Pessoas/Relatorio_ Casos_2010.xls, em 24/05/2013. 27 Rota internacional 1: http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/cao_civel/ Trafico_de_Pessoas/Mapa_de_Rotas_-_TP_Internacional.pdf, rota internacional 2: http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/cao_civel/Trafico_de_Pessoas/Mapa_de_Rotas__TP_Internacional_-_Origem_Brasil.pdf, rota internacional 3: http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/cao_civel/Trafico_de_Pessoas/Mapa_de_Rotas_-_TP_Nacional.pdf, em 24/05/2013. 28 “Crime Organizando: aspectos gerais e mecanismos legais”. Mendroni, 2009. 10 agentes envolvidos nos tráfico29. Dessa forma, passaremos agora a analise de algumas operações da Polícia Federal, procurando entender sua forma de atuação30. Sísifo: O nome da operação faz referência à mitologia grega, como referência ao trabalho cansativo e repetitivo31. Deflagrado em outubro de 2012, o bando aliciava paraguaias de 18 a 24 anos para servirem por cerca de seis meses em casas de prostituição nos municípios de Imbituba e Imaruí, estado de Santa Catarina32. As vítimas só eram dispensadas após “pagarem” por suas passagens de volta. Havia todo um esquema de aliciamento e na operação foram encontradas 21 paraguaias, sendo uma delas gestante (sexto mês de gravidez)33. Foram divulgados os nomes de três estabelecimentos envolvidos. Além de duas rufiãs, um policial foi preso em flagrante. No momento em que se realizou a Operação, a Polícia Federal acreditava ter o grupo atuado há pelo menos um ano. As vítimas viviam em condições de extrema pobreza no Paraguai e eram ludibriadas para viajarem ao Brasil. Não se sabia ao certo quantas mulheres já teriam vindo ao país. A ação que surpreendeu as 21 vítimas e seus intermediários ocorreu por meio de uma parceria entre Polícia Federal (que dirigia as investigações) e o Batalhão Especial da Polícia Militar do estado. Atenéia: Iniciada quase um ano antes, a investigação da Polícia Federal levou a 15 prisões em cinco cidades de três estados diferentes (Frutal/MG, Uberlândia/MG, Aparecida do Taboado/MS, Paranaíba/MS, Araguaína/TO). Os mandados de prisão e Busca e Apreensão foram expedidos em Araguaína. De acordo com as informações publicadas34, o bando aliciava adolescentes desde em portas de escolas, até em boates e bares. A alguns era oferecido um emprego digno e boas condições, enquanto para outros a proposta era explícita. Os aliciadores recebiam suas 29 “Mecanismos institucionais de prevenção e combate ao tráfico de pessoas no Brasil”. Andrea Pacheco Pacífico e Junne Maria Duarte Barbosa Leite. As autoras acrescem ainda a informação de que entre os anos de 2003 e 2010, o número de inquéritos policiais cresceu consideravelmente, nos dando a possibilidade de depreender que o trabalho da Polícia Federal tem se mostrado cada vez mais efetivo. 30 As informações foram retiradas do Portal eletrônico da Polícia Federal (http://www.dpf.gov.br/agencia/estatisticas), onde levantamos um total de 22 operações. Comentaremos aqui as que consideramos mais relevantes, somado a informações retiradas de outros portais eletrônicos de notícias. 31 Disponível em: http://www.noticiasdacidade.org/293641, em 20/05/2013. 32 Disponível em: http://bandsc.com.br/canais/policia/policia_federal_apreende_prostitutas_em_ operacao_de_combate_a_exploracao_sexual_.html, em 20/05/2013. 33 Disponível em: http://diariocatarinense.clicrbs.com.br/sc/policia/noticia/2012/10/paraguaias-libertadas-naoperacao-sisifo-em-sc-foram-vitimas-de-trafico-internacional-de-pessoas-3907538.html, em 20/05/2013. 34 Disponível em: http://www.msrecord.com.br/noticia/ver/33368/operacao-ateneia-da-pf-prende-mais-umapessoa-no-ms, em 20/05/2013. 11 remunerações proporcionalmente ao número de aliciados que conseguisse. Todas as vítimas tinham em comum o fato de serem muito pobres. Além do tráfico, o bando falsificava documentos, para reduzir as suspeitas. Ameaças e violências físicas eram constantes para manter as vítimas nos estabelecimentos. Os estabelecimentos faziam uma rotatividade dos traficados, sendo, normalmente localizados em locais afastados dos grandes centros (exemplo, rodovias). A vigilância era constante, caracterizando, por todas essas questões, um regime de trabalho análogo a escravo. Os trabalhos começaram a partir de suspeitas e pelo depoimento de um ex-integrante, que forneceu informações para a mãe de uma das vítimas, tendo deposto para a Polícia. O depoente foi encontrado morto quatro meses antes da Operação da Polícia Federal. Tarantela: De acordo com a base de dados disponível no site da Polícia Federal, tratava-se de uma organização criminosa sofisticada, que contava com a participação de brasileiros e italianos, donos de casas de prostituição na Itália, e aliciadores no Brasil, atuando em Goiás, Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Minas Gerais35. O “recrutamento” de travestis nesses estados da federação abastecia o mercado de prostituição na Itália. Caso as vítimas decidissem retornar, a documentação, que ficava em posse dos membros da organização, só era liberada mediante o pagamento das custas de viagem. A própria viagem ao estrangeiro era posta como “dívida” a ser paga pela vítima com seus lucros. Deflagrada em março 2006, a Operação Tarantela teve, ao todo, 5 pessoas presas e permitiu à Polícia Federal identificar uma das principais rotas do tráfico de seres humanos36. Tarô: A Operação Tarô, organizada pelo Ministério Público Federal e a Polícia Judiciária Suíça, contando com o apoio da Polícia Federal Brasileira, deflagrou em março de 2006, pela Operação Tarô, a organização criminosa responsável pelo tráfico de mulheres para estabelecimentos de prostituição em Zurique. Aliciadas em Belo Horizonte e região metropolitana, a maioria teria consciência do trabalho que exerceriam, sendo, contudo, vítimas de agressões físicas e psicológicas, tendo documentos retidos pelos membros da 35 Disponível em: http://www.prgo.mpf.gov.br/criminal-e-controle-externo-da-atividade-policial/noticias/1196operacao-tarantela-mpfgo-oferece-denuncia-por-trafico-internacional-de-seres-humanos.html, em 20/05/2013. Ver também: http://www.sonoticias.com.br/noticias/7/21587/operacao-tarantela-preso-em-mato-grosso-seguepara-goias e http://www.odocumento.com.br/materia.php?id=173935 e http://www.abin.gov.br/modules/articles/article.php?id=4104. 36 Disponível em: http://portal.mj.gov.br/main.asp?View=%7B02FA3701-A87E-4435-BA6D1990C97194FE%7D&BrowserType=NN&LangID=pt-br¶ms=itemID%3D%7B1DFAEA24-391D-45CD94E8-374815A0FFF4%7D%3B&UIPartUID=%7B2218FAF9-5230-431C-A9E3-E780D3E67DFE%7D, em 20/05/2013. 12 organização e mantidas a até 18 horas de trabalho contínuo. A investigação teve início no ano anterior e acredita-se que existam na Suíça pelo menos três mil estrangeiras trabalhando com prostituição. O número de brasileiras vinha aparentemente crescendo. Ao todo, 150 policiais foram mobilizados na Operação e doze pessoas foram presas, entre suíços e brasileiros. O dinheiro do tráfico era reinvestido em fazendas no estado de Goiás37. Afrodite e Afrodite II: No final de 2006, a Polícia Federal em São Paulo deflagrou em sua operação Afrodite uma quadrilha especializada em tráfico de pessoas e aliciamento para prostituição. As investigações teriam começado um ano antes. Nessa operação foram presas oito pessoas e executados quase 20 mandados de Busca e Apreensão. Entre os detidos, se encontrava Jiselda Oliveira, que se auto nomeava “a maior cafetina do Brasil”, acusada por comandar o que seria uma rede internacional de prostituição38. A partir dos trabalhos desenvolvidos pela Operação Afrodite, a Polícia Federal ainda executou a operação Afrodite II, na qual foram presas mais duas pessoas. Com dez dias de diferença da operação anterior, a Afrodite II identificou aliciadores responsáveis por enviar mulheres para programas em outras regiões do país, bem como nos Estados Unidos e Europa, tendo valores definidos de acordo com o destino final das vítimas. A Polícia Federal ainda encontrou “livros de registros”, com imagens de todas as garotas que o grupo aliciara39. Em ambas as operações, todos os envolvidos responderam por formação de quadrilha e tráfico internacional de pessoas. Mucuripe Em 25 de outubro, a Polícia Federal, através da operação Mucuripe, nome de uma praia do Ceará, prendeu preventivamente 11 pessoas envolvidas em um esquema de prostituição de mulheres brasileiras através de um site de turismo na Alemanha, onde constavam dados detalhados das jovens. A operação identificou ligações do grupo nas cidades de Fortaleza, Recife e Dortmund. As acusações foram de favorecimento à prostituição, formação de quadrilha, tráfico internacional de pessoas e rufianismo. Uma das rés ainda foi acusada por pornografia infantil, após encontrarem fotos de uma criança seminua, em poses sensuais. A criança era filha da ré40. 37 Disponível em: http://www.swissinfo.ch/por/arquivo/Desbaratada_quadrilha_da_prostituicao. html?cid=5095060, em 20/05/2013. 38 Disponível em: http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI1301016-EI5030,00PF+prende+marido+de+acusada+na+Operacao+Afrodite.html, em 20/05/2013. 39 Disponível em: http://www.estadao.com.br/arquivo/cidades/2006/not20061224p32823.htm, em 20/05/2013. 40 Disponível em: http://trf-05.jusbrasil.com.br/noticias/2650626/quadrilha-que-promovia-turismo-sexual-tempena-mantida, em 20/05/2013. 13 A Polícia Federal concluiu com as investigações que o faturamento do bando superava o valor de 1 milhão de reais por mês. O grupo era dirigido por um alemão, detido em sua residência, no Ceará. As aliciadoras foram detidas também41. 5. Julgados “PENAL E PROCESSO PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE SERES HUMANOS. ZXPLORAÇÃO SEXUAL DE MULHERES. ARTIGO 231 DO CÓDIGO PENAL. (ART. 239 DO ECA). CONSENTIMENTO DAS VÍTIMAS. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. 1. O consentimento da vítima em seguir viagem não exclui a culpabilidade do traficante ou do explorador, pois que o requisito central do tráfico é a presença do engano, da coerção, da dívida e do propósito de exploração. É comum que as mulheres, quando do deslocamento, tenham conhecimento de que irão exercer a prostituição, mas não têm elas consciência das condições em que, normalmente, se vêem coagidas a atuar ao chegar no local de destino. Nisso está a fraude. 2. O crime de tráfico de pessoas - foi a Lei 11.106, de 28.03.2005, que alterou a redação do art.231 do Código Penal, de tráfico de mulheres para tráfico internacional de pessoas - consuma-se com a entrada ou a saída da pessoa, homem ou mulher, seja ou não prostituída, do território nacional, independentemente do efetivo exercício da prostituição - basta o ir ou vir exercer a prostituição - , e ainda que conte com o consentimento da vítima. 3. O Protocolo para Prevenir, Suprimir e Punir o Tráfico de Pessoas, Especialmente Mulheres e Crianças, que suplementa a Convenção da ONU contra o Crime Organizado Transnacional, adotada em novembro de 2000, trouxe a primeira definição internacionalmente aceita de tráfico de seres humanos: (...). 4. "O tráfico pode envolver um indivíduo ou um grupo de indivíduos. O ilícito começa com o aliciamento e termina com a pessoa que explora a vítima (compra-a e a mantém em escravidão, ou submete a práticas similares à escravidão, ou ao trabalho forçado ou outras formas de servidão). O tráfico internacional não se refere apenas e tãosomente ao cruzamento das fronteiras entre países. Parte substancial do tráfico global reside em mover uma pessoa de uma região para outra, dentro dos limites de um único país, observando-se que o consentimento da vítima em seguir viagem não exclui a culpabilidade do traficante ou do explorador, nem limita o direito que ela tem à proteção oficial" (Damásio de Jesus, in Tráfico Internacional de Mulheres e Crianças - Brasil, São Paulo: Saraiva, 2003, p. XXIV). 5. O crime disposto no art. 239 do ECA configura-se quando se promove ou auxilia a efetivação de ato destinado ao envio de criança ou adolescente para o exterior com inobservância das formalidades legais ou com o fito de obter lucro. 6. Materialidade e autoria comprovadas pelo conjunto probatório contido nos autos.” (ACR 000118898.2011.4.01.3000/AC. Relator: Des. Fed. Tourinho Neto42. Julgamento em: 26/03/2013, publicado no e-DJF1 de 05/04/2013 p.291. Acessado em 24/05/2013. Disponível em: http://arquivo.trf1.gov.br/AGText/2011/0001100/00011889820114013000_3.doc) 41 Disponível em: http://www.aids.gov.br/noticia/pf-desarticula-rede-de-prostituicao-no-ceara, em 20/05/2013. Para mais sentenças do Desembargador Federal Tourinho Neto, em casos na Bahia, Acre, Mato Grosso e Goiás: http://trf-1.jusbrasil.com/jurisprudencia/23094595/apelacao-criminal-acr-451-ba-00004513520114013311-trf1, http://trf-1.jusbrasil.com/jurisprudencia/5268202/apelacao-criminal-acr-1602-ac20063000001602-7, http://trf-1.jusbrasil.com/jurisprudencia/4418602/apelacao-criminal-acr-8024-mt20073600008024-1, http://trf-1.jusbrasil.com/jurisprudencia/2380113/apelacao-criminal-acr-10690-go20033500010690-9. 42 14 “PENAL E PROCESSO PENAL. RUFIANISMO E TRÁFICO INTERNACIONAL DE MULHERES PARA PROSTITUIÇÃO. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. AUTOS APARTADOS. DEGRAVAÇÃO DO CONTEÚDO PERTINENTE. VALIDADE. PERÍCIA DESNECESSÁRIA. IDENTIFICAÇÃO DAS VOZES POR OUTROS MEIOS DE PROVA. MATERIALIDADE, DOLO E AUTORIA DEMOSNTRADOS. DOSIMETRIA. REDUÇÃO DA PENA-BASE DO TRÁFICO DE PESSOAS. DE OFÍCIO, ADEQUAÇÃO DA PENA DE MULTA DO TRÁFICO. ELIMINADA PENA DE MULTA DO RUFIANISMO. NOVATIO LEGIS IN MELLIUS. (...) 3. A materialidade foi comprovada através de prova documental (indicando a remessa de numerário ao corréu aliciador no Brasil e compra de passagens aéreas) e testemunhal (relatos das vítimas prostituídas). 4. A autoria do delito e o dolo do apelante restaram amplamente demonstrados através dos elementos de convicção trazidos aos autos. 5. Pena-base do crime do artigo 231 do Código Penal reduzida ao mínimo. Dizer que o tráfico internacional humano para fins de prostituição é conduta altamente reprovável não constitui embasamento suficiente para elevar a pena-base, pois caracteriza elemento do próprio tipo penal e não circunstância judicial aferida na análise casuística. 6. No que concerne ao rufianismo, a ocorrência da continuidade delitiva restou comprovada nos autos por cinco vezes, nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução. O réu defende-se dos fatos a ele imputados e não de sua capitulação legal, não havendo que se falar em sentença ultra ou extra petita. 7. Mediante mais de uma ação, o apelante praticou dois crimes distintos e autônomos, consistentes em tráfico internacional de pessoas para fim de exploração sexual (artigo 231 do Código Penal) e rufianismo, tirando proveito da prostituição alheia (artigo 230 do Código Penal), sendo de rigor a soma das penas, em concurso material.” (ACR 000074368.2008.4.03.6124/SP. Relator: Juíza Convocada Raquel Perrini. Julgamento em: 31/07/2012. Acessado em 24/05/2013. Disponível em: http://web.trf3.jus.br/acordaos/Acordao/BuscarDocumentoGedpro/2062784) “PENAL. PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. CRIMES DE FORMAÇÃO DE QUADRILHA (ART. 288 do CPB), TRÁFICO INTERNACIONAL DE PESSOAS (ART. 231 DO CPB) E DE RUFIANISMO (ART. 230 DO CPB). PRISÃO PREVENTIVA. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. EXCESSO DE PRAZO. NÃO CONFIGURAÇÃO. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. MANUTENÇÃO DA PRISÃO CAUTELAR. DECISÃO FUNDAMENTADA. 1. A prática da conduta delituosa de tráfico internacional de pessoa para fim de exploração sexual é de competência da Justiça Federal. O paciente está sendo processado pela prática do delito do artigo 231 do Código Penal, dentre outros delitos, matéria afeta à Justiça Federal. (...) 3. Não há que se falar em excesso de prazo da prisão preventiva quando há complexidade na instrução processual em razão do envolvimento de vários réus na prática delituosa. Além disso, oferecida e recebida a denúncia, resta superado o alegado excesso de prazo. 4. Não verte constrangimento ilegal prisão preventiva decretada com fundamentação consentânea (arts. 311 e 312 do Código de Processo Penal). 5. Ordem denegada.” (HC 2009.01.00.058236-7/BA. Relator: Des. Fed. Hilton Queiroz. Julgamento em: 09/11/2009, publicado no e-DJF1 de 27/11/2009 p.108. Acessado em 24/05/2013. Disponível em: http://arquivo.trf1.gov.br/AGText/2009/058200/200901000582367_3.doc) “PENAL. CRIMES DE EXPLORAÇÃO SEXUAL. CÁRCERE PRIVADO. MANUTENÇÃO DE CASA DE PROSTITUIÇÃO. RUFIANISMO. TRÁFICO INTERNACIONAL DE MULHERES. EXPLORAÇÃO SEXUAL DE MENORES. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. REDUÇÃO DA PENA. 15 IMPOSSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. 1. O depoimento das vítimas de crimes de exploração sexual possui valor fundamental por serem elas a melhor fonte de informações de como ocorria o iter criminis. 2. Demonstrado que as vítimas ficavam presas nas casas de prostituição de propriedade das apelantes sem poderem de lá sair livremente, afigura-se claro que sofreram privação de sua liberdade e, conseqüentemente, a prática do crime de cárcere privado ficou devidamente comprovada. 3. As provas colacionadas demonstram, claramente, a prática, pelas apelantes, das condutas típicas que lhes são imputadas.” (ACR 2003.32.00.0077007/AM. Relator: Des. Fed. Ítalo Fioravanti Sabo Mendes. Julgamento em: 09/11/2009, publicado no e-DJF1 de 25/09/2008 p.265. Acessado em 24/05/2013. Disponível em: http://arquivo.trf1.gov.br/AGText/2003/007700/200332000077007_3.doc) 6. Conclusão Embora sem a intenção de esgotar o assunto, atual e complexo, e que conta com muitas ações ainda não disponíveis ao público para proteger as investigações, constatou-se a evolução sobre o tema conforme a época, os locais e acontecimentos. Desde o início da criminalização do tráfico de pessoas a partir de conferências na Europa, no século XIX, apesar de se destinar originalmente à prática contra o tráfico de mulheres brancas. Com novos acordos, as situações abrangidas foram sendo ampliadas, além de prever cooperação entre os Estados, pois as ações não se limitam, muitas vezes, apenas no próprio território. Não apenas por iniciativas européias deu-se a tipificação, vale lembrar a Convenção Interamericana acerca do tema. Quanto ao caso brasileiro, além de participações internacionais, estudaram-se as normas internas – a quem era aplicada a norma, anteriormente restrita apenas às mulheres, e a importância do dolo do agente, independente do conhecimento da vítima, conforme o visto nos julgados. Além do código nacional, mencionou-se acordos internacionais incorporados às normas do país. Em esfera nacional, destacou-se também o papel do Ministério Público – legislações, campanhas e sua relação jurídica com o caso –, e algumas das principais operações da Polícia Federal, após breve análise de suas atribuições. Com os julgados, pode-se comprovar brevemente a atuação judicial de acordo com o exposto ao longo do trabalho – a continuidade do crime, a importância de seu tratamento penal, a questão do conhecimento da vítima e comprovação de autoria. Nesse sentido, a denúncia à prática do crime tem o seu papel, sendo incentivada pela Campanha Coração Azul43. Além disso, há Secretarias como a Semira44 de Goiás (Secretaria 43 O slogan da Campanha é "liberdade não se compra. Dignidade não se vende. Denuncie o tráfico de pessoas". Disponível em: http://portal.mpt.gov.br/wps/portal/portal_do_mpt/comunicacao/noticias/ 16 de Estado de Políticas para Mulheres e Promoção da Igualdade Racial), a qual engloba o Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, que sensibiliza a população no Dia Internacional Contra a Exploração Sexual e o Tráfico de Mulheres e Crianças. 7. Bibliografia BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal, v.4: parte especial: dos crimes contra a dignidade sexual até dos crimes contra a fé pública. 6ª ed, revista, ampliada e atualizada de acordo com a Lei. n.12.550, de 2011 São Paulo: Saraiva, 2012. BRASIL. Decreto n. 5.017, de 12 de março de 2004. Promulga o Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 15 de março de 2004. 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