#3 UMA PUBLICAÇÃO DO INSTITUTO ACENDE BRASIL jul / ago 2007 2ª edição em 2010 SUSTENTABILIDADE • ECONÔMICA • AMBIENTAL • SOCIAL • Controle dos impactos • Conservação da biodiversidade • Respeito às comunidades • Educação e saúde • Transparência e diálogo Energia E Meio Ambiente Idéias afins, sinônimo de crescimento com qualidade de vida. Parceria Iluminada Ganhos da natureza Uma corrida de obstáculos Legislação ambiental Matriz energética, legislação, o que precisa mudar. A palavra dos empreendedores. Pág. 3 O passo a passo para se construir uma usina, os obstáculos do caminho e as conseqüências. Pág. 5 Botos, quelônios, peixes, arara-azul. A contrapartida ambiental na prática. Pág.7 Os efeitos provocados pelo excesso e a sobreposição de leis federais, estaduais e municipais. Pág. 8 O Instituto Acende Brasil é um Centro de Estudos que desenvolve ações e projetos para aumentar o grau de Transparência e Sustentabilidade do Setor Elétrico Brasileiro. Para alcançar este objetivo, adotamos a abordagem de Observatório do Setor Elétrico Brasileiro. Atuar como um Observatório significa pensar e analisar o setor com lentes de longo prazo, buscando oferecer à sociedade um olhar que identifique os principais vetores e pressões econômicas, políticas e institucionais que moldam as seguintes dimensões do Setor Elétrico Brasileiro: AGÊNCIAS REGULADORAS GOVERNANÇA CORPORATIVA IMPOSTOS E ENCARGOS LEILÕES MEIO AMBIENTE E SOCIEDADE OFERTA DE ENERGIA RENTABILIDADE TARIFA E REGULAÇÃO Aquecimento global, redução da emissão de gases poluentes, mudança da matriz energética. Tudo tem a ver com meio ambiente, com qualidade de vida, com futuro. Bandeiras são desfraldadas, mas falta informação. Todos são responsáveis: sociedade, governo, empreendedores. E todos têm que definir o preço que querem pagar pelo custo e pelo benefício. Sustentabilidade é isso. E sustentabilidade, quando o tema é energia, pressupõe conciliar desenvolvimento e meio ambiente. Não é possível crescer sem um custo ambiental. Daí a necessidade de se trazer a questão ambiental para uma discussão séria e bem informada, sem paixões, sem ideologias e sem uso político. Cada cidadão tem de ser instrumentalizado em relação a tudo que pode ser feito para minimizar as agressões ao meio ambiente. Os empreendedores da área de energia têm caminhado nesta direção. Hoje, meio ambiente e geração de energia são idéias afins. Pensar em geração de energia significa conciliar desenvolvimento com proteção do meio ambiente. Há muito, ainda, a se fazer em termos de aplicação das leis, de atuação dos órgãos governamentais, de ações cidadãs. Os 25 anos de existência do licenciamento ambiental, entretanto, mostram que já se avançou muito. O momento agora é de mostrar o dia-a-dia dos empreendimentos e dar transparência à realidade ambiental para que a sociedade entenda o que representam as nossas riquezas naturais e como é possível gerar energia respeitando as pessoas e a natureza. Aumentam, a cada dia, as exigências ambientais para se implementar uma usina. O processo é dinâmico e só tem feito crescer os investimentos em programas ambientais. Na Usina de Lajeado, no Tocantins, por exemplo, 25% do custo total da obra, R$ 345 milhões, foram destinados a programas socioambientais. Na Usina de Machadinho, entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul, R$ 222 milhões, 29% do custo total do empreendimento, entraram na conta do meio ambiente. Números que, sem dúvida, demonstram o compromisso do negócio de energia com a natureza. Claudio J. D. Sales Presidente do Instituto Acende Brasil Presidente: Claudio J. D. Sales Diretor Executivo: Eduardo Müller Monteiro Assuntos Econômicos e Regulatórios: Richard Lee Hochstetler Desenvolvimento Sustentável: Alexandre Uhlig Análise Política: Cibele Perillo Staff: Eliana Marcon e Melissa Oliveira São Paulo: Rua Joaquim Floriano, 466 Edifício Corporate, conj. 501 CEP 04534-004, Itaim Bibi - São Paulo, SP, Brasil Telefone: +55 (11) 3704-7733 Brasília: SCN Quadra 5, Bloco A, sala 1210 Brasília Shopping and Towers CEP 70710-500 - Brasília, DF, Brasil Telefone: +55 (61) 3963-6007 Email Corporativo: [email protected] Assessoria de Imprensa: Tania Regina Pinto Telefone: +55 (11) 3704-7733 / (11) 8383-2347 Energia, uma publicação do Instituto Acende Brasil, aborda a sustentabilidade nas suas três dimensões: econômica, ambiental e social. Versão impressa e online: www.acendebrasil.com.br Jornalista Responsável: Tania Regina Pinto (Mtb 11.580) Projeto Gráfico e diagramação: Cacumbu Design Ilustrações: Rafael Cazes Tiragem da 1ª edição: 2.000 exemplares Crédito das fotos do Energia 2, “O Desafio das Agências Reguladoras” Pág. 3 - A foto da professora Virgínia Parente, da Universidade de São Paulo, é de João Claudio Cote Pág. 5 – A foto de Claudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil, é de José Cordeiro SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL - ENERGIA E MEIO AMBIENTE parceria Energia e Meio Ambiente. No passado, o relacionamento entre estes dois mundos foi pouco respeitoso. Mas os tempos mudaram. É unânime a defesa do crescimento sustentável. E é sobre isso que conversamos com alguns líderes de empresas privadas de geração de energia, José Eduardo Costanzo, vice-presidente de Engenharia da Rede Empresas de Energia Elétrica; Gil Maranhão Neto, diretor de Desenvolvimento de Negócios, da Suez Energy Brasil; e José Carlos Cauduro Minuzzo, diretor de Produção da Tractebel Energia. iluminada Fotos: divulgação Energia: Mudança da matriz energética. Qual a conseqüência para o meio ambiente? José Costanzo: O Brasil tem a grande chance de ser líder na configuração de uma matriz energética cada vez mais calcada em fontes renováveis. Os grandes motores desta opção são a hidroeletricidade e o etanol. Mas se a mudança for em sentido oposto, privilegiando o uso de combustíveis fósseis pesados, o meio ambiente será prejudicado. Gil Maranhão: Usinas hidrelétricas constituem uma vantagem competitiva, podem ser implementadas pelo parque industrial brasileiro com 100% dos bens e serviços sendo produzidos localmente. A priorização de outras fontes de energia tem que ser vista com ressalvas, pois são potencialmente mais danosas para o meio ambiente e mais caras para o consumidor. Energia: A legislação atual protege o meio ambiente? José Costanzo: No passado, não havia legislação ambiental. Hoje, a legislação evoluiu muito e vem sendo cumprida. O problema é a degradação de áreas declaradas de preservação ambiental, que são invadidas e exploradas devido à ausência de fiscalização adequada. José Minuzzo: A legislação disciplina a interação entre desenvolvimento, sociedade e meio ambiente, para garantir a utilização racional dos recursos naturais. Entretanto, ocorrem sobreposições nas diferentes instâncias do Poder Público que comprometem a prática da lei e confundem os papéis institucionais. Energia: Como conciliar crescimento econômico, geração de renda e preservação do meio ambiente? Gil Maranhão: Esse é um dos maiores desafios do século XXI. As exigências em termos de recursos naturais e energia para se manter o crescimento econômico nos padrões de consumo americanos, que são almejados por boa parte da humanidade, impõem um desafio na equação que equilibra energia e meio ambiente. José Minuzzo: A oferta de energia é um dos pilares do crescimento econômico e não pode ser equacionada de forma isolada. Por isso o Estado tem o papel de efetuar o planejamento estratégico da expansão da oferta e da composição da matriz energética, posicionando o benefício coletivo acima dos demais interesses. José Costanzo: Os empreendedores e os órgãos ambientais devem, em conjunto com as autoridades locais e com as populações afetadas, encontrar os caminhos para a mitigação e a compensação das interferências com o meio ambiente e com o meio social. A condição essencial é que esta sinergia vise a objetivos comuns, de forma equilibrada, e, principalmente, afaste os oportunistas de plantão, as pressões em defesa de interesses não legítimos e outras ações deste tipo que afloram toda vez que qualquer empreendedor inicia o processo de implantação de uma usina hidrelétrica. De cima para baixo: José Eduardo Costanzo, vice-presidente de Engenharia da Rede Empresas de Energia Elétrica; Gil Maranhão Neto, diretor de Desenvolvimento de Negócios, da Suez Energy Brasil; e José Carlos Cauduro Minuzzo, diretor de Produção da Tractebel Energia. 3 4 Uma publicação do instituto acende brasil “Barragem é excelente meio de controle de vazões, eliminação de cheias e inundações.” José Minuzzo Energia: Quanto custa o meio ambiente? José Costanzo: O meio ambiente não tem preço. Projetos bem planejados, com visão clara das obrigações ambientais e sociais e soluções encontradas em conjunto com órgãos ambientais esclarecidos e pró-ativos conduzirão ao almejado desenvolvimento sustentado. Compete ao Governo, através de seus diversos ministérios, incluir em seu planejamento as ações nas áreas destes empreendimentos para que, além de cumprirem com as obrigações de Estado, criem, em conjunto com os empreendedores, as condições necessárias para o desenvolvimento global destas regiões. José Minuzzo: O que deve ser discutido não é o custo, mas a relação custo-benefício de um empreendimento, avaliando-se todos os fatores a ele vinculados, para a adoção de soluções racionais. No caso de fornecimento de recursos essenciais, como a energia elétrica, esta análise tem de incluir todos os reflexos diretos e indiretos existentes no campo econômico, social e ambiental. Tomando-se como exemplo o campo ambiental, é preciso considerar que eventuais perdas localizadas podem ser amplamente superadas por ganhos através de novas possibilidades científicas, tecnológicas e, principalmente, sociais. Energia: Nos valores orçados para a construção de uma usina está embutido o custo que a empresa deve pagar pelo impacto ambiental? José Minuzzo: A minimização da transformação ambiental ocasionada por um empreendimento, assim como a questão social, é um dos custos importantes na implantação de novos projetos. Seu valor é estimado e orçado a partir dos requisitos de licenciamento ambiental estabelecidos na concessão do empreendimento, e abrange tanto a fase de instalação quanto a de operação. Para o empreendedor, esses valores fazem parte do custo total do empreendimento e são considerados no estudo de viabilidade, que considera o retorno do capital empregado com base nas receitas futuras, estimadas a partir do valor que o consumidor está disposto a pagar pela energia. Esse é um fator levado em consideração por qualquer empresa, seja ela privada ou estatal. José Costanzo: Daí para frente, surgem novas demandas, não previstas, de cunho ambiental e social, ou mesmo de origem política ou decorrentes da omissão do Estado, que são acrescentadas no decorrer da instalação ou operação do empreendimento e dão início a um processo de desequilíbrio que pode até inviabilizar a continuidade da implantação. Energia: Quais as principais demandas dos empreendedores do setor elétrico na área ambiental? Gil Maranhão: Regras claras e estáveis, não aumento do escopo de responsabilidades e compensações após a obtenção das licenças. “Outras fontes de energia (que não hidrelétrica) são potencialmente mais danosas ao meio ambiente e mais caras para o consumidor.” Gil Maranhão José Minuzzo: A legislação ambiental tem de oferecer maior segurança jurídica ao empreendedor, esclarecendo os limites de responsabilidade de cada instituição. É preciso mais recursos para os órgãos ambientais responsáveis pelo licenciamento e fiscalização. Os problemas sociais poderiam ser minimizados e os potenciais de inclusão ampliados por meio de um maior envolvimento do Governo e da identificação prévia das carências sociais da região de inserção de um novo empreendimento, separando o que é de real responsabilidade do empreendedor daquilo que programas governamentais podem e devem suprir, ampliando as perspectivas de desenvolvimento sustentável, dos pontos de vista econômico, ambiental e social. José Costanzo: A minimização dos riscos ambientais, a partir da emissão das Licenças Prévias. O Ministério Público e o Tribunal de Contas da União devem estar bem informados e conscientes das demandas e ações em andamento para não precipitar ações judiciais, embargos etc. Todos os órgãos federais envolvidos devem estar bem informados e sintonizados com as metas do Governo. “A compensação ambiental não deve ser vista como mais uma fonte de receita do governo.” José Constanzo Energia: Compensação ambiental. Problema ou solução? Gil Maranhão: Acredito na compensação ambiental. Mas defendo que os beneficiários não sejam apenas os parques, mas também as reservas indígenas. Defendo também que o valor cobrado dos projetos seja fixado em 0,5%. José Costanzo: A compensação ambiental deve ser vista como um complemento às ações ambientais de responsabilidade dos empreendedores e não como mais uma fonte de receita. E os valores arrecadados têm de ser muito bem aplicados em unidades de conservação novas ou já existentes e com claros objetivos ambientais. José Minuzzo: O termo “compensação” embute a idéia de que somente impactos negativos são criados por conta de empreendimentos de geração de energia. Mas impactos positivos também são obtidos por intermédio dos seus usos múltiplos. Barragem, por exemplo, é excelente meio de controle de vazões, eliminação de cheias e inundações, além de possibilitar formas de turismo e lazer. O objetivo da “compensação” é que um novo empreendimento, além do benefício da geração de energia em si, acrescente perspectivas de desenvolvimento social e econômico e de preservação ambiental. A compensação ambiental deveria ser substituída por “medidas de desenvolvimento sustentável”, as quais deveriam estar claramente definidas quando da licitação para concessão de implantação, operação e exploração de cada novo empreendimento. SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL - ENERGIA E MEIO AMBIENTE 5 AAI, EIA, PBA, TR, RIMA, LP, LI, LO, AP. Siglas que, não raro, transformam-se em pedras no caminho da geração de energia e, por conseqüência, do crescimento do país. uma corrida de obstáculos Via Crucis Em junho de 2007 havia 151 usinas, entre hidrelétricas e térmicas, com autorização da Aneel – Agência Nacional de Energia Elétrica – para serem construídas. Isso representa 20.927 megawatts de potência, incluindo 107 pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), que também têm processos autorizados pelo órgão regulador. São números grandiosos que representam 20% da potência instalada de energia elétrica do país (96,6 mil megawatts), mas são apenas números de intenção... E o motivo tem nome e sobrenome: Licenciamento Ambiental. Um holofote apenas sobre as 38 hidrelétricas, previstas para integrar o parque gerador, demonstra que 22 delas, 57%, estão paralisadas por “problemas no licenciamento ambiental”. Problemas que vão desde a solicitação de “informações complementares” dos Estudos de Impacto Ambiental (EIA), até pedidos de “avaliação ambiental integrada” (AAI). O que não seria nada demais, se a AAI não fosse uma determinação criada após o início do processo de autorização de construção das usinas em questão. A Natureza nos oferece o rio. O Homem, a tecnologia para gerar energia a partir dele. Para que isso aconteça, entretanto, o empreendedor que quiser investir tem que, primeiro, contratar uma consultoria para fazer a AAI - Avaliação Ambiental Integrada, que é o estudo do rio inteiro, de ponta a ponta. Por meio da AAI se identificam os locais ideais para a construção de usinas, levando em conta o menor impacto ambiental, a menor área inundada e o menor comprometimento de flora e fauna. É a AAI que determina quantas usinas podem ser construídas ao longo do rio e a melhor localização de cada uma delas. Identificadas as usinas possíveis na Avaliação Ambiental Integrada, cada uma terá de passar por um processo de licenciamento ambiental. Para isso, o interessado na construção terá de preencher uma Ficha de Solicitação de Abertura de Processo no Ibama – Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis – e enviar sua proposta de Termo de Referência (TR). No caso de empreendimentos que não interferem em áreas federais, o processo de licenciamento ocorre em órgão ambiental estadual. 6 Uma publicação do instituto acende brasil Termo de Referência é a proposta detalhada do que será feito no Estudo de Impacto Ambiental (EIA). É um protocolo de intenções. O Ibama, então, avalia a proposta de TR e emite o Termo de Referência Definitivo. Essa tramitação, de acordo com a Instrução Normativa 65/2005 do Ibama, deveria demorar um mês, mas, de acordo com o relatório preliminar do Banco Mundial a média de espera para recebimento do Termo de Referência Definitivo é de um ano e um mês. (Veja abaixo o quadro Descompasso). De posse do TR Definitivo, é elaborado, pelo interessado na construção da usina, o EIA-RIMA (há duas versões do Estudo de Impacto Ambiental: o EIA, em linguagem técnica, e o RIMA, Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente, um resumo do EIA em linguagem mais acessível à população) e entregue para análise do Ibama. O Ibama tem um ano para aprovar o EIA-RIMA, mas segundo o mesmo levantamento do Banco Mundial, nesta fase do processo o tempo médio de espera é de três anos e três meses. A voz do povo A participação da sociedade no processo de licenciamento para a construção de usinas acontece por meio de audiências públicas (AP). Nelas, é apresentado o Estudo de Impacto Ambiental e todos podem manifestar-se, fazendo perguntas, defendendo pontos de vista, apresentando outros estudos e, se for o caso, apresentando sugestões e outros estudos. Normalmente, são realizadas quantas audiências públicas o Ibama julgar necessárias. E será dele, Ibama, a palavra final. Em outras palavras, o órgão licenciador pode tanto emitir a primeira licença do processo – a Licença Prévia (LP) –, que atesta a viabilidade ambiental do empreendimento, como pedir complementação do Estudo de Impacto Ambiental ou declarar o empreendimento inviável do ponto de vista ambiental. Projeto Aprovado Com a Licença Prévia concedida, o empreendimento pode ser colocado em leilão pela agência reguladora, a Aneel. Ao empreendedor que arrematar a usina licitada caberá detalhar os programas de meio ambiente identificados no Estudo de Impacto Ambiental e apresentar o Projeto Básico Ambiental (PBA) para aprovação do Ibama. Uma vez aprovado o PBA, é emitida a Licença de Instalação (LI), que autoriza o início da obra. Durante a construção da usina, o empreendedor deve implantar os programas de meio ambiente do PBA, que serão vistoriados in loco ao final da obra pelo órgão licenciador, para emissão da Licença de Operação (LO), que autoriza o funcionamento das turbinas para se gerar energia. Vale saber que usinas hidrelétricas têm que encher seus reservatórios antes de entrar em operação. E isso pode levar, em média, um mês. Todo o processo, de acordo com normas e regras do próprio Ibama, deveria ser concluído em, no máximo, dois anos e meio, sem contar o tempo de construção da usina – em média, cinco anos para hidroelétricas. Mas a morosidade no processo de licenciamento ambiental tem feito com que esse tempo seja, no mínimo, o dobro. Isso quando não surgem outras questões após todo processo concluído, como aconteceu recentemente com a hidrelétrica de Estreito, localizada entre os Estados de Tocantins e Maranhão. Vale dizer que não existem muitas diferenças entre a construção de uma hidrelétrica e usinas de geração de outras fontes de energia elétrica. Tudo é bastante similar. Para a construção de termoelétricas, por exemplo, não é necessária a Avaliação Ambiental Integrada e o tempo de construção é, em geral, três anos. Mau exemplo Licitada em 2002, a hidrelétrica de Estreito foi alvo de duas complementações sobre a influência do empreendimento em três grupos indígenas, além do Estudo de Impacto Ambiental. Todos foram aprovados pelo Ibama que, em 2006, expediu a licença de instalação. Para surpresa geral, no último 24 de abril, a Justiça Federal determinou a interrupção das obras com base em uma nova exigência de análise antropológica de um grupo indígena, localizado fora da bacia hidrográfica do rio Tocantins. Isso provocou um atraso na construção de mais de um mês. Em 31 de maio, a Advocacia Geral da União conseguiu a cassação da liminar que proibia o trabalho no canteiro de obras. DESCOMPASSO Etapas Aprovação do Termo de Referência pelo IBAMA Prazos Legais 30 dias - Instrução Normativa 65/2005 Aprovação Estudo de Impacto Ambiental/ Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente 60 dias - aprovação abrangência 120 dias - parecer de mérito - Instrução Normativa 65/2005 Realização Audiência Pública 45 dias após aprovação Estudo de Impacto Ambiental Emissão da Licença Prévia Até 1 ano - Conselho Nacional do Meio Ambiente Máximo 270 dias - Instrução Normativa 65/2005 Dados preliminares do relatório do Banco Mundial referentes a 63 empreendimentos licenciados pelo IBAMA entre os anos de 1997 e 2006. Fonte: Ministério de Minas e Energia. PRAZOS REAIS 1 ano e 1 mês 1 ano e 7 meses 8 meses 3 anos e 3 meses SUSTENTABILIDADE AMBIENTAL - ENERGIA E MEIO AMBIENTE ganhos da natureza Três exemplos de ações empresariais que adicionam valor ao meio ambiente. Botos e quelônios > Ampliar o conhecimento científico sobre botos e quelônios no rio Tocantins é uma das tarefas ambientais assumida pela Rede Empresas de Energia Elétrica na construção da usina hidrelétrica Luís Eduardo Magalhães, em Lajeado (TO). A idéia é que informações sobre população, estrutura etária e habitats preferenciais, por exemplo, subsidiem propostas de conservação da espécie no rio. Isso, no caso dos botos. Quanto aos quelônios, a prioridade é proteger as áreas de reprodução e monitorar o período reprodutivo de duas espécies presentes na área da usina, que são a tartaruga da Amazônia (na foto em destaque) e a tracajá. O monitoramento possibilita o desenvolvimento de ações de educação ambiental às comunidades ribeirinhas para a conservação das espécies. Estes estudos são realizados em Miracema do Tocantins, Lajeado, Palmas, Porto Nacional, Ipueiras, Brejinho de Nazaré e Tocantinia, no Estado do Tocantins. Na foto maior, soltura de quelônios no município de Palmas. Fotos: Divulgação / Duke Energy Arara-azul-grande > A Energias do Brasil realiza o levantamento e o monitoramento da arara-azul-grande com a técnica da radiotelemetria, que consiste na colocação de rádios-transmissores para facilitar a localização das aves. O objetivo do programa é determinar qual o deslocamento e o tamanho da área necessária para a sobrevivência da espécie. Considerada o maior psitacídeo (da família das araras, piriquitos e papagaios) do mundo, com cerca de 98 cm de altura e 1,5kg, a arara-azul-grande vive em cerrados, buritizais, florestas à margem dos rios, sendo encontrada no Pantanal Matogrossense, na região do rio Tocantins e no Pará. A população estimada dessa espécie na natureza é entre três e cinco mil. Todo trabalho é realizado na área de influência do reservatório da usina de Peixe Angical, em Tocantins. Na foto, dois filhotes de arara-azul, monitorados com rádio-colar, no ninho, dentro do tronco de uma palmeira buriti. Fotos: Márcio Di Pietro Pacus, piaparas e outros > A soltura de filhotes de peixes (alevinos) é atividade básica de meio ambiente para empresas geradoras de energia hidrelétrica. O objetivo é manter o equilíbrio do ecossistema e preservar a biodiversidade e a riqueza da fauna aquática. A Duke Energy, por exemplo, promove, todo ano, a soltura de um milhão e meio de alevinos na bacia do rio Paranapanema. Uma das conseqüências positivas desse trabalho é o desenvolvimento das comunidades regionais através da pesca profissional e esportiva, conscientizando seus habitantes quanto ao controle da poluição do rio e respeito à piracema. A AES Tietê mantém duas estações de piscicultura nas usinas de Promissão e Barra Bonita, ambas no interior paulista, e despeja dois milhões e meio de alevinos nos reservatórios. Além da ação voltada ao repovoamento, a AES mantêm estudos que garantem tanto a quantidade como a diversidade de peixes. Os repovoamentos são realizados quando os filhotes atingem, no mínimo, 8 cm de comprimento total para aumentar as chances de sobrevivência. Na foto, o trabalho realizado pela Duke Energy, na divisa entre São Paulo e Paraná. Foto: Divulgação / Naturae Consultoria Ambiental 7 8 Uma publicação do instituto acende brasil excesso de LEIS? As dezenas de milhares de dispositivos legais convidam à reflexão para mudança de comportamento dos responsáveis pela elaboração e cumprimento das leis ambientais. “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.” Assim está escrito no artigo 225 da Constituição Federal de 1988, no capítulo sobre Meio Ambiente, com seis parágrafos e sete incisos que se referem à educação ambiental, preservação de ecossistemas, proteção de flora e fauna, licenciamento ambiental, controle da produção e comercialização de substâncias que impliquem risco para a vida e para o meio ambiente. Mas ele não é suficiente para que a natureza seja plenamente respeitada. Além do capítulo específico na Constituição, existem leis federais, estaduais, municipais e complementares, decretos-leis, medidas provisórias, resoluções e normas que compreendem portarias, instruções, ordens de serviços, atos, pareceres etc. A consultoria Âmbito Homem & Ambiente tem em seu banco de dados 26 mil normas sobre legislação ambiental - seis mil de nível federal e vinte mil nos níveis estadual e municipal. Vale salientar que entre as normas municipais só foram computados os dados das capitais e dos municípios com mais de 300 mil habitantes. E a conta não pára por aí. A somar-se existem dezenas de projetos no Congresso Nacional, propondo a criação de novas leis sobre meio ambiente. E pelo menos quarenta deles têm a ver com a área de energia, tais como: compensação e licenciamento ambiental, avaliação ambiental estratégica, deslocamento populacional, assistência às populações de áreas inundadas, exploração de recursos naturais em terras indígenas e biodiversidade aquática. Tiro pela culatra A percepção de que o país possui uma das melhores e mais exigentes legislações ambientais do mundo deixa de ser conseqüente diante de tamanha quantidade de normas. Isso porque elas são desconhecidas por quem deve cumpri-las e fiscalizá-las. Com o agravante de que, no Brasil, a falta de conhecimento da lei não desobriga o seu cumprimento. O excesso se reflete também no conteúdo de tudo que vem sendo aprovado. São leis recheadas de minúcias, distantes da realidade que pretendem normatizar e que, não raro, sugerem interpretações variadas. Os empreendedores do setor são unânimes em afirmar que há muita coisa boa na legislação ambiental, mas muito precisa ser melhorado. E eles citam como exemplo a necessidade de se definir limites de responsabilidade no que diz respeito ao licenciamento ambiental de empreendimentos: não está claro se a responsabilidade de autorizar a construção de uma usina é da União ou dos Estados. Envie sua opinião sobre o Energia, uma publicação do Instituto Acende Brasil, para: [email protected]