ESTUDO DA POSSÍVEL CORRELAÇÃO ENTRE A OCORRÊNCIA DE INFECÇÃO POR ROTAVÍRUS E MUDANÇA DAS CONDIÇÕES CLIMÁTICAS NA AMAZÔNIA Maria Aurora Santos da Mota (1); Maria do Carmo Felipe de Oliveira; Paulo Fernando de Souza Souza; Rosa Helena P. Gusmão; Joana P. Mascarenhas; Alexandre C. Linhares; Yvone D. Gabbay (1) Departamento de Meteorologia- Centro de Geociências - UFPa.- Caixa Postal 1611- 66075-110 Belém- PA- Brasil ABSTRACT In an attempt to determine the relationship between infection caused by rotavirus and changing weather conditions in Belém, Pará, thermodynamic parameters were established based upon data furnished by the UFPa. climatological station plus faeces clinical analysis of 290, 0-5 year old patients of both sexes in a public hospital of Belém, during 19 months (November/92-May/93). A negative relationship was found between the rotavirus infection occurrence and equivalent potential temperature, with a -0,596 correlation, that is, infection increased as this parameter decreased, showing that infection caused by rotavirus area related to air temperature and mixing ratio, not only with the air temperature. INTRODUÇÃO A região Amazônica é caracterizada por um clima quente e úmido, onde os gradientes de temperaturas são muito pequenos (variação entre 25 e 26 oC). A umidade presente embora de valores altos sofre variações acentuadas (16 e 20g/Kg). Estas condições muitas vezes são alteradas por influência de sistemas de meso e grande escala, que fazem surgir atividades convectivas muito fortes, o que gera um novo conceito de estações do ano: “seca” (junho a novembro) e “chuvosa” (dezembro a maio). Na estação seca é comum a penetração de frentes frias procedentes do Sul do País, que no inverno podem ultrapassar o equador geográfico, o que faz com que as altas temperaturas da região sejam amenizadas, e provoquem uma secagem mais acentuada. SERRA(1971) denominou esta penetração de frente fria na região Amazônica como friagem, esta alterações contribuem para o desenvolvimento de doenças e aumento de viroses. Os rotavírus são considerados uma das mais importantes causas de diarréia grave em crianças de baixa idade (0 a 5 anos), tanto em países desenvolvidos como em desenvolvimento, respondendo em média por cerca de 33% das internações em menores de 2 anos. (BLACKLOW & GREENBERG, 1991). Em diferentes regiões tropicais do mundo, a incidência das infecções por rotavírus tende a elevar-se durante os meses menos quentes e de mais baixa umidade relativa do ar (PAUL & ERINLE, 1982; GOMWALK et al., 1993). No Brasil, os rotavírus foram pela primeira vez registrados por LINHARES et al. (1977) em crianças diarréicas atendidas em um hospital público de Belém, Pará. Com o objetivo de verificar se mudanças das condições climáticas na região Amazônica influem na incidência das infecções por rotavírus, é que foi desenvolvido este trabalho. METODOLOGIA Os dados meteorológicos foram obtidos da estação de superfície da UFPa e, posteriormente foram determinados os parâmetros termodinâmicos, tais como temperatura potencial, razão de mistura e temperatura potencial equivalente, para uma análise detalhada da variação temporal das condições climáticas. Foram analisadas fezes de 290 crianças, ambos os sexos, de 0 a 5 anos de idade, internadas em um hospital público de Belém-Pará, no período de novembro de 1992 a maio de 1993. Os rotavírus foram detectados pelo método imunoenzimático (“ELISA”), realizado nos laboratórios do Instituto Evandro Chagas. Com base nas informações foi calculado o índice de correlação entre as duas séries (infecção por rotavírus X parâmetros termodinâmicos), confeccionado gráficos representativos das séries. RESULTADOS A Figura 01 apresenta a variação temporal das infecções por rotavírus (barra) e temperatura potencial média(linha) para cada mês. Nota-se uma relação fraca, correlação de -0,0479 (4,8%), entre a temperatura e as infecções por rotavírus. Ou seja, à semelhança do que é usualmente descrito em países tropicais, tais agentes foram detectados ao longo dos 18 meses de estudo, denotando endemicidade em nossa região. 7 6 5 4 3 2 1 0 Tem p (ºK) 300 N. casos 299,5 299 298,5 298 297,5 N D 1992 J F M A M J Rotavírus J A 1993 S O N D J F M 1994 A M Tem peratura Potencial FIGURA 01- Variação temporal das infecções por rotavírus e temperatura potencial. A Figura 02 mostra a variação temporal da razão de mistura (linha) e as infecções por rotavírus (barra). Observa-se que a razão de mistura é bastante alta, com valores em sua maioria maiores que 18 g/Kg, o que confirma a característica da região, quando a média para uma série de 100 anos é de 18,7 g/Kg. Existe uma correlação negativa entre a razão de mistura e as infecções (a= -0,51), ou seja quando ocorre um aumento da razão de mistura as infecções tendem a diminuir. Como a razão de mistura é uma medida do conteúdo de água na atmosfera, percebe-se que existiu uma aumento da incidência das infecções quando o ar esteve mais seco. 7 6 5 4 3 2 1 0 N. casos r (g/Kg) 21 20 19 18 17 16 15 N D 1992 J F M A M Rotavírus J J A 1993 S O N D J F M 1994 Razão de Mistura FIGURA 02- Variação temporal das infecções por rotavírus e a razão de mistura A M A Figura 03 mostra a variação temporal da temperatura potencial equivalente média e as infecções por rotavírus. Verifica-se que existe uma relação inversa entre esses parâmetros, ou seja uma correlação negativa (a=-0,596), significando que 60% das infecções estiveram relacionadas com a diminuição da temperatura potencial equivalente. Daí se infere que a incidência das infecções está relacionada com temperatura do ar e o conteúdo de água da atmosfera (umidade), e não somente com a temperatura do ar, já que a temperatura potencial equivalente é um parâmetro função da temperatura e umidade do ar (conteúdo de água). 7 6 5 4 3 2 1 0 N. casos Tem p.(ºK) 359 354 349 344 N D 1992 J F M A M J Rotavírus J 1993 A S O N D J F M 1994 A M Tem p. Potencial Equivalente FIGURA 03- Variação temporal das infecções por rotavírus e temperatura potencial equivalente CONCLUSÃO A incidência das infecções por rotavírus está relacionada com a temperatura do ar e conteúdo de água do meio ambiente, e não só com a temperatura, pois a temperatura potencial equivalente, que é um parâmetro que relaciona temperatura do ar e razão de mistura teve uma correlação negativa (a= -0,596) com a incidência das infecções por rotavírus. Isso significa que podemos explicar 60% da incidência das infecções devido ao aumento deste parâmetro. Outra característica foi a correlação negativa (a= 0,51), entre as infecções e a razão de mistura, que é uma medida do conteúdo de água na atmosfera, ou seja, existe um aumento da incidência quando o ar se torna mais seco. É importante notar que houve aumento da incidência sempre que a razão de mistura esteve abaixo de 18g/Kg na região, ocorreu principalmente nos meses de julho e agosto de 1993, onde os valores foram de 17,5 g/Kg e 16,2 g/Kg respectivamente. Além disso, os meses foram caracterizados pela influência da penetração de frentes frias provenientes do Sul do País, o que amenizou a temperatura e secou o ambiente em determinados dias conforme relatado por MOTA et al, 1994, situação esta que não é usualmente registrada em Belém, Pará. Coincidindo com essa atipicidade, verificou-se um aumento das infecções por rotavírus (p= 0,05). Por exemplo, as infecções por rotavírus no mês de agosto, foram as maiores da distribuição. Os nossos achados oferecem as primeiras evidências a nível local, de que a freqüência com que ocorrem as infecções por rotavírus pode ser condicionada a variações climáticas na região, ou seja existe considerável influência dos fatores climáticos com as infecções por rotavírus. Então as informações das condições climáticas são sem dúvida de grande valia, para o estudo das infecções por rotavírus, determinando assim o período de maior risco para as infecções, permitindo uma melhor estratégia no combate aos rotavírus por parte dos médicos virologistas, através de vacinas. BIBLIOGRAFIA BLACKLOW, N.R. & GREENBERG, H.B. (1991). Viral gastroenteritis. N. Engl. J. Med., 325: 252-64. GOMWALK et al..(1993) Influence of climatic factors on rotavirus infection among children with acute gastroenteritis in Zaria, Northern Nigeria. J. Trop. Pediatr., 39: 293-7. GUSMÃO, R.H.P. (1995). Subgrupos, sorotipos e eletroferotipos de rotavírus em crianças hospitalizadas em Belém, Pará. Tese doutorado. Universidade Federal de São Paulo-Escola Paulista de Medicina. 230 p. LINHARES, A.C.et al. (1977). Duovirus (rotavirus) em Belém do Pará. Rev. Inst. Med. Trop. (São Paulo), 19:278–9. [Nota prévia]. MOTA, M.A.S et al. (1994). Evolução termodinâ-mica da estrutura da atmosfera de uma situação de bom tempo para uma situação pertubada associada a um sistema frontal durante o RBLE-2. Anais do VII Cong. Bras. de Met., 230-3. PAUL, M.O. & ERINLE, E.A. (1982). Influence of humidity on rotavirus prevalence among Nigerian infants an young children with gastroenteritis. J. Clin. Microbiol., 15: 212-5. SERRA. A. 1971. Circulação no Hemisfério Sul. Bol. Geográfico. Rio de Janeiro, 30(224): 1-158.