“NADA É PEQUENO ONDE O AMOR É GRANDE” (Santa Terezinha) Quando recebi o convite para a elaboração deste texto, cujo objetivo é a comemoração dos vinte e cinco anos da Paróquia Santa Terezinha do Menino Jesus, de Sarandi, confesso que fui, imediatamente, tomada por dois sentimentos. O primeiro, de imensa responsabilidade, por ter que descrever a trajetória da comunidade, buscando fazer jus a uma caminhada sempre marcada pela fé, perseverança e pela luta de todos aqueles que não mediram esforços para que chegássemos até o presente. O segundo sentimento, sendo que este me dominou com mais vigor, consiste no fato de que, ao voltar os olhos para a história da Paróquia Santa Terezinha, estarei revendo a minha própria história e a de minha família na caminhada cristã, pois foi aqui, onde meu irmão e eu fizemos a Primeira Eucaristia, fomos crismados e onde nossos filhos foram batizados. Sendo assim, não hei de conseguir esconder, nestas linhas, o elo afetivo que mantenho com a Paróquia, já que em quase trinta e oito anos de residência na comunidade, tive, juntamente com outros membros, também antigos de casa, o privilégio de participar, como testemunha ocular, de vários episódios que serão narrados a seguir. O verbo comemorar é de origem latina (commemorare) e significa recordar, lembrar, trazer à memória. Nesta perspectiva, toda comemoração é realizada à luz do passado, com a intenção de que este, como uma chama, ilumine o presente e o futuro, a fim de valorizar o trabalho daqueles que nos antecederam e de encorajaros que nos sucederem, pois toda caminhada é cheia de percalços. Já dizia o escritor mineiro, João Guimarães Rosa, que “viver é muito perigoso” e que para realizar este intento “carece de ter coragem, muita coragem”. Realmente, muitos são os caminhos que poderemos encontrar em nossas vidas e se ter coragem é condição necessária para atravessá-los, quanto mais o será se quisermos trilhar os caminhos que nos levam a Jesus Cristo, tendo como princípios seus ensinamentos de viver em comunidade e lutar em prol do bem comum. Com certeza, nesses vinte e cinco anos, muitos foram aqueles que tiveram a coragem de levar adiante o projeto evangelizador de Cristo, pois quem hoje avista a solidez da Paróquia Santa Terezinha, em sua organizaçãoe trabalho, talvez não imagine quão árdua, mas também prodigiosa, tenha sido sua história. Graças aos depoimentos de alguns pioneiros, como os senhores Manoel Gardino, Nivaldo Tozzo, Raimundo Bianco, Anísio Paglianini e da senhora Noêmia Teresinha Bota, todos com residência aproximada entre trinta e quarenta anos na comunidade, poderemos recuperar fatos que foram significativos nessa travessia. Segundo eles, foram o Padre Jorge School e a Irmã Dolores, na década de 70, que plantaram as sementes da evangelização em nossa comunidade. O senhor Manoel Gardino lembra que, na época, a regiãoconstituía-sede chácaras, nas quais residia a família Volpato. Em seu relato, disse que pegava uma estradinha (atual Rua Júlio Limonta que dava acesso à Rua Guaiapó) e que ia para o Km 8. Tudo era cafezal e a primeira casa a ser construída teria sido a sua, de madeira ainda. Com o passar do tempo, outras casas foram surgindo.Um dia, quando estava cercando aquela mesma casa com balaústre, o Padre Jorge chegou, bateu palmas e se apresentou como padre (o senhor Manoel já o conhecia da Igreja São José, no Km 15). Pediu um gole de café e disse que iria construir uma Igreja (não se falou em capela), sendo que já havia conseguido a madeira. O senhor Manoel concordou em ajudar o Padre na construção econvém destacar que, no sábado seguinte a este encontro, foi celebrada a primeira missa na casa do senhor Inácio e senhora Antônia (entre os anos de 1977 e 1978). A partir daí, até o final da construção, as missas eram celebradas nas casas, sendo que em algumas delas foram realizados até batizados. Inicialmente, foi construída uma Capela de madeira em um terreno doado pelo prefeito de Marialva (Sarandi pertencia a este município, na época). De acordo com um dos pioneiros, em 1977, havia uma placa no local da atual Igreja, informando que ali seria construída uma creche. Posteriormente, o prefeito chamou os membros da comunidade para a doação de dois terrenos, localizados na Avenida Brasil e no Jardim Panorama, destinados às Igrejas Católica e Evangélica. Como no dia da doação, não havia comparecido ninguém da Igreja Católica, a Igreja Evangélica optou pelo terreno da Avenida Brasil, cabendo a nós o do Jardim Panorama. O nome da comunidade fora motivado por um fato trágico, o falecimento da menina Terezinha Ghiraldi, com oito anos de idade, atropelada na Avenida Colombo. A família Ghiraldi era muito atuante na região do Parque Alvamar, onde dava catequese e animava a comunidade. Em homenagem à pequena menina, o Padre Jorge decidiu nomear a Capelade Santa Terezinha. A senhora Noêmia Teresinha Bota, cujo nome teria sido dado pelos pais, devotos da Santa, senhor Júlio Bota e senhora Paulina Bota (hoje, com cento e um anos de idade),faz um relato de como tudo acontecera: “Eu me lembro bem.Morávamos na Rua Princesa Isabel, 1058.O Padre Jorge foi me visitar no trabalho e me disse para eu convidar o povo para uma reunião em casa. Foi um sucesso! Vieram umas cem pessoas. Ele ficou animado e me disse que marcaria uma missa. Que lindo, hoje, lá é a comunidade Santa Luzia!Daí morreu a Terezinha Ghiraldi, com oito anos. O Padre Jorge disse na missa que faria uma Igrejinha Santa Terezinha, em homenagem à menina. O meu pai e o seu “Nego” doaram suas aposentadorias em prol da construção. O meu vizinho, xará do Padre Jorge, foi até a cidade de Aparecida, Estado de São Paulo, para trazer uma Santa Terezinha para a capelinha.Toda a comunidade se reuniu e fez uma procissão da casa do seu Jorge, que ficava na rua José Bonifácio, até a capelinha, no Jardim Panorama.Lá, não tinha altar, era tão pobre, que os homens puseram um tronco de uma linda árvore, para poderem colocar a imagem de Santa Terezinha. Assim, começou e vieram o Nivaldo Tozzo, o João e o José Polo. Lá, eram celebradas as missas e também sedava catequese. O Santonino, o Toninho carteiro, os Capelato e eu tínhamos um grupo de jovens. Era tanto jovem que nos reuníamos no Colégio Mauro Padilha, na Av. Londrina, pois no Jardim Panorama não havia colégio ainda. O Padre Jorge vinha de circular rezar as missas em vários locais, como na casa do seu Alécio Paglioto; em um salão, onde hoje é a Bia Papelaria, e também, no sítio do seu Rezende, onde hoje é o Jardim Independência”. Se o Padre Jorge School e a Irmã Dolores foram os responsáveis pelo plantio da semente do Evangelho em nossa comunidade, coube a dois outros padres, ambos malteses, a missão de cultivar essa semente, a fim de que pudesse germinar e dar frutos. Primeiramente, com o Padre Vicente Costa (hoje, Dom Vicente, bispo de Jundiaí-SP) e, posteriormente, com o Padre João Caruana. No ano de 1980, com o Padre Vicente Costa, houve o primeiro CPP, sendo o senhor Manoel Gardino o primeiro coordenador. Nessa época, havia apenas três ministros na comunidade. Após a capela, iniciou-se a construção do Salão Paroquial, existente até hoje. Para a realização desse projeto, contou-se com a ajuda financeira de uma Associação de Católicos Alemães - ADVENIAT- que doou marcos alemães. Isso ocorreu no ano de 1982, após a construção da Igreja Nossa Senhora das Graças, que já era Paróquia. Uma figura que não pode deixar de ser lembrada, pelo importante trabalho que desenvolveu, durante muitos anos, diante da Promoção Humana, é Dona Manoelina. Entre 1985 e 1986, anos marcados por sua intensa dedicação, foram recolhidos muitos materiais para serem utilizados na construção de casas para as pessoas mais necessitadas, bem como alimentos para o preparo dos tradicionais sopões, que saciaram a fome de muitas pessoas. Após o salão, deu-se início a construção da primeira casa paroquial, feita por dois profissionais e concluída em mutirão pela comunidade. Por volta do ano de 1985, as celebrações passaram a ser realizadas somente no salão, ficando a antiga capelinha de madeira desativada. Nesta época, já com o Padre JoãoCaruana, atendendo à comunidade, iniciaram-se os trabalhos para a construção da Igreja Matriz, cujo formato foi inspirado no modelo de uma igreja maltesa, trazido pelo padre. A pedra fundamental foi colocada onde hoje é o atual altar, por volta do ano de 1985, contendo o nome de todos os fundadores. Depois de ser abençoada pelo Monsenhor Bernardo, sua colocação foi realizada pelos senhores Manoel Gardino e Carlos Russo. No final dos anos 80 e início dos anos 90, foram realizadas diversas ações, como a coleta de garrafas vazias, ferro velho, papelão e outros materiais que poderiam ser vendidos para o levantamento de fundos. Também merecem destaque as quermesses realizadas no salão, que eram bastante animadas, principalmente, pela força e união da juventude da época. No dia vinte e cinco de março de 1990, foi instituída a Paróquia Santa Terezinha do Menino Jesus por Dom Jaime Luiz Coelho, tendo como primeiro pároco o Padre João Caruana, que permaneceria ainda por mais treze anos, até 2003. Os anos que se seguiram, até a inauguração da Matriz, foram intensos. Inúmeras promoções foram realizadas e multiplicaram-se os esforços da comunidade para conseguirmos chegar ao feliz acabamento. Não poderia deixar de mencionar as Festas da Rainha que acontecem até os dias atuais (hoje, da Primavera), em que há o empenho das comunidades, sendo estas representadas por jovens ou jovens senhoras, com o objetivo de angariar fundos em prol das realizações da Paróquia (como eu disse, não tenho como dissociar esses fatos das minhas recordações, pois até Princesa eu fui, no alto dos meus quatorze anos!). Finalmente, em primeiro de abril de 1995, mediante o empenho de toda a comunidade, foi realizada a primeira missa na Matriz Santa Terezinha do Menino Jesus, com a presença do Arcebispo e de vários outros padres. Tive o privilégio de, neste dia tão especial, ter sido a comentarista da Celebração, e me recordo que viemos, em procissão, com velas acesas, do centro de Sarandi até a nova Igreja, sendo conduzidos pela imagem de Santa Terezinha. A arquitetura da Igreja, toda imersa em um contexto de evangelização, nos enche de orgulho, pois todos que a visitam, encantam-se com a riqueza de detalhes. O belíssimo painel, atrás do altar, idealizado pelo Padre João e concretizado pelo artista Eder Portalha, foi inspirado em um momento histórico vivido não só pela comunidade, como também por toda a sociedade. Como o próprio Padre João declara em seu livro, The MalteseMissionary Experience GoandTeachallNations, a escultura é inspirada na opçãoevangélica e preferencial da Igreja Latino-Americana pelos pobres.No painel, é possível ver, de um lado, os desafios enfrentados pelos trabalhadores da cidade e do campo, baseados na aridez das relações sociais; de outro, um mapa da América Latina, envolto em correntes, com osnomes das cidades sedes das reuniões do Conselho Episcopal Latino Americano (CELAM), até aquele momento, que eram Medellin, Puebla e Santo Domingo. Ainda desse mesmo lado, temos o contorno de toda Arquidiocese de Maringá, iluminada pela Catedral. Podemos ver, ainda, Nossa Senhora e Santa Terezinha, apontando para Jesus Cristo que se encontra, ao centro e no alto, quebrando as correntes e libertando seu povo. Os belos vitrais também colaboram para enaltecer a singularidade da Igreja. Neles estão desenhados ramos de rosas, juntamente com os nomes das pastorais, dos movimentos e dos serviços existentes. O trabalho foi realizado pela secretária da Paróquia, na época, Fátima Aparecida Lopes, verdadeira artista na pintura e em outras atividades artesanais. Nos quase dezoito anos em que esteve presente junto à comunidade, muitas foram as realizações do Padre João Caruana, sendo impossível elencar a todas. Mas não poderia deixar de destacar o seu incansável trabalho de motivação das CEBs (Comunidades Eclesiais de Base), comunidades formadas porpessoas que se unem em torno de um bem comum, a comunhão fraterna, e que se tornam a base da Igreja viva, formada por pessoas que lutam.Desde a sua origem, as comunidades cristãs organizadas, sempre guiadas pelos ideais de libertação de Jesus, lutaram contra as opressões políticas e sociais, dentre as quais poderíamos citar a ditadura militar, a discriminação racial e de gênero, a exclusão dos pobres e oprimidos, os grandes latifúndios, as políticas econômicas neoliberais opressoras, entre muitas outras que todos nós conhecemos muito bem. Tudo isso foi vivenciado e combatido pelas CEBs. Os sete setores (comunidades) que compunham a Paróquia foram renomeados pelo Padre João e, a partir dali, cada comunidade seria denominada CEB, cada qual homenageando pessoas como nós e religiosos, que deram a vida, ou melhor, tiveram suas vidas ceifadas em prol da realização de uma sociedade justa, lutando contra a opressão dos poderosos e estando ao lado dos humildes, dos trabalhadores e marginalizados. Como exemplos, podemos citar as CEBs PadreHenrique Pereira Neto, Raul Leger, Tito de Alencar, Ita Ford, entre outras. Ao longo da caminhada da Paróquia, novamente, as comunidades foram rebatizadas, tendo cada comunidade escolhido um Santo da Igreja para representála.Hoje, temos as comunidades Santa Luzia, São José, São Paulo Apóstolo, Nossa Senhora Aparecida, apenas para citar algumas, que, embora possuam novas designações, ainda mantêm vivo o mesmo espírito de união e de luta. Após as etapas iniciais vencidas, a Paróquia dedicou-se a cobrar do poder público a criação de uma praça, em um terreno em frente da Igreja, que, na época, estava tomado pelo mato.Finalmente, no final dos anos 90, depois de muitas reuniões, a praça que, atualmente, serve como lazer para a comunidade, foi construída. Apesar dos vinte e cinco anos, foram poucas as trocas de Padres na Paróquia, e, por coincidência, lá estava eu, como comentarista, nas missas de despedida do Padre João Caruana e de posse do Padre José Mello, sendo esta última realizada no dia vinte e sete de julho de 2003. Ao Padre Mello, como era chamado pela comunidade, dando continuidade ao trabalho em prol da frutificação da Paróquia,coube a missão de concluir algumas obras e de realizar outras, como o Centro Catequético, o Auditório, a reforma do Salão Paroquial e a transferência da secretaria para o lugar, até então, destinado como Casa Paroquial. Nos anos seguintes, foi adquirido o terreno para a construção da primeira Capela, denominada São Francisco Xavier, bem como foram realizadas a aquisição e a construção da nova Casa Paroquial. Em vinte seis de agosto de 2012, o Padre José Aparecido de Miranda toma posse como Pároco, dando continuidade aos trabalhos de Pastoral e encarando novos desafios. Já em 2013, houve a aquisição de um terreno,localizado no Jardim São José, para a construção da Segunda Capela,que será dedicada a São João Paulo II. Nos anos de 2012 e 2013, podemos dizer que o trabalho mais expressivo da pastoral foi a criação de grupos de Pós-crisma para adolescentes e jovens, culminando com a ida para a Jornada Mundial da Juventude, ocorrida em julho de 2013, no Rio de Janeiro. Ao todo, foram dezenove pessoas, entre adolescentes, jovens e adultos. Foi um momento especial, principalmente, pelo amadurecimento pastoral. Houve o empenho de toda a comunidade que não mediu esforços para que os jovens partissem em missão, rumo à JMJ. Este e outros trabalhos têm rendido muitos frutos para a Juventude, com a ativa participação dos jovens nas atividades paroquiais e com a formação de grupos muito animados. Encaminhando-se para o final do percurso, há uma frase latina que eu gostaria de compartilhar, cujo significado tende a emoldurartoda a caminhada da Paróquia Santa Terezinha do Menino Jesus até aqui:Per aspera ad astra, ou seja, por caminhos ásperos, pedregosos,longe se vai, em direção aos astros, em direção ao Céu.Realmente, graças a muitos corajosos que vieram antes de nós, pioneiros que desbravaram caminhos tortuosos (muitos deles, já falecidos), é que, hoje, podemos comemorar esta data tão especial e dizer que temos uma Paróquia organizada e bem atuante, seja na evangelização, na pastoral ou na sociedade como um todo. Nossa Pastoral é formada, atualmente, por: dezenas de Ministros; Catequistas; participantes de Grupos de Reflexão;assistência dada, desde a gestação, com a Pastoral da Criança, Infância Missionária, Catequeses, Pastoral da Saúde, até às idades mais avançadas com a Pastoral da Pessoa Idosa; movimentos atuantes como o da Mãe Peregrina; Apostolado da Oração; Renovação Carismática; Marianos; Dízimo;Grupos de Canto; serviços, como a preparação para o batismo e para os noivos; o recémimplantado Encontro de Casais com Cristo, além de mais de cem adolescentes e jovens participantes dos grupos de Pós-Crisma e Pastoral da Juventude. Inspirados pelo sentimento de luta, que sempre deve existir no interior das CEBs, em prol dos direitos da comunidade, temos membros que participam de Associações de Moradores e de discussões políticas. Mensalmente, também são entregues mais de quarenta cestas básicas, frutos do gesto da partilha, realizado por toda a comunidade. Chegando ao término desse texto, o sentimento que me invadebaseia-se em um eterno dar graças. Dar graças,por poder participar de mais um momento significativoda história de nossa Paróquia,de poder relembrar alguns fatos e de conhecer muitos outros que fizeram e fazem parte de sua trajetória. Dar graças, porque acredito que nossa Comunidade seguirá, continuamente, em direção aos astros, em direção ao Céu. Dar graças, porque com fé, esperança e caridade, procuraremos sempre seguir os passos de Santa Terezinha do Menino Jesus, pois nada haverá de ser pequeno, onde o amor é grande. Eliane Batista Professora Doutoranda do Curso de Letras da UEM