Tecnologia, Educação e Inclusão TECNOLOGIAS, EDUCAÇÃO E A CRITICIDADE DIANTE DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO Ângela Maria Oliveira da Cruz Silva Antonilma S. de Almeida Castro (orientadora, Mestre em Educação Especial) Universidade Estadual de Feira de Santana RESUMO Objetiva-se, neste trabalho, evidenciar o papel relevante que as telenovelas brasileiras vem desenvolvendo no âmbito educacional, principalmente na alfabetização de jovens e adultos. Além de abrir caminhos para o diálogo de temas polêmicos e atuais e de desenvolver uma consciência crítica quanto aos meios de comunicação – neste caso a tv. A novela Senhora do Destino, exibida pela Rede Globo, de segunda à sábado, foi o meio mais utilizado para realização desse trabalho, que envolveu as dezessete classes do Programa Alfabetização Solidária, desenvolvido no Município de Serra Preta – BA, orientado pela Coordenadora Setorial Ângela Maria Oliveira da Cruz Silva da UEFS, no período de março a junho de 2005. Tecnologia, Educação e Inclusão TECNOLOGIAS, EDUCAÇÃO E A CRITICIDADE DIANTE DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO Ângela Maria Oliveira da Cruz Silva Antonilma S. de Almeida Castro (orientadora, Mestre em Educação Especial) Universidade Estadual de Feira de Santana Entendemos que o salto tecnológico tem causado profundas modificações culturais no país, podendo efetivamente trazer melhorias sociais, sobretudo quando se amplia as oportunidades de apreensão do saber através das variadas mídias existentes. A interatividade cada vez maior dos meios de comunicação exige o desenvolvimento de habilidades específicas dos que dela fazem uso. Caso contrário, aparecerá uma nova forma de exclusão social: O analfabetismo nos meios de comunicação. Ciente dessa nova realidade a equipe da Alfabetização Solidária do Município de Serra Preta – Ba, desenvolveu durante o primeiro semestre do ano em curso o Projeto Tecnologias, Educação e a criticidade diante dos meios de comunicação, usando como ferramenta a telenovela brasileira, oferecendo oportunidade de se vivenciar uma realidade própria do Brasil, no que se refere à produção cultural de massa - a novela. O uso da tv como instrumento de educação justifica–se pela sua incontestável importância na sociedade brasileira pois, a tv desempenha inúmeros papeis e funções, entre os quais destacam-se a capacidade de influenciar o comportamento das pessoas, de criar novos hábitos, e de atender às demandas simbólicas por lazer e companhia. Por essas funcionalidades, a tv é um excelente aliado na difusão de idéias e mensagens que visam à promoção humana, ao desenvolvimento integral do homem, podendo estimular a reflexão, a criticidade e a transformação social. A linguagem televisiva permite que os alfabetizandos ganhem intimidade com os diversos portadores textos, condições para que se constituam como leitores, escritores e propricientes, desenvolvendo também a capacidade de se posicionarem criticamente frente aos meios de comunicação. A educação para os meios e a alfabetização de jovens e adultos Quando o adulto chega à escola, os processos fundamentais de aprendizagem já estão desenvolvidos de forma significativa. Urge também a educação para as mídias, para compreende-las, critica-las da forma mais abrangente possível. A educação para os meios começa com sua a incorporação na fase da alfabetização. Alfabetizar-se não consiste só em decifrar os códigos da linguagem falada e escrita, mas dos códigos de todas as linguagens do homem atual e da sua interação. O adulto, ao chegar à escola, já sabe ler histórias complexas, como uma telenovela, com mais de trinta personagens e cenários diferentes. Essas habilidades são praticamente ignoradas pela escola, que, no máximo, utiliza a imagem falada e a música como suportes para facilitar a compreensão da linguagem falada e escrita, mas não pelo seu valor intrínseco. Os adultos precisam desenvolver mais conscientemente o conhecimento e a prática da imagem fixa, da imagem em movimento, da imagem sonora e fazer isso como parte do aprendizado central e não marginal. Aprender a ver mais completamente o que já estão acostumados a ver, mas que não costumam perceber com maior profundidade (como os programas de televisão) O desenvolvimento do conhecimento é um dos aspectos fundamentais da escola e deve ser acompanhado do desenvolvimento de habilidades e de atitudes. Habilidades que levem o indivíduo a caminhar sozinho, a interpretar os fenômenos, a saber expressar-se melhor, a comunicar-se com facilidade, a dominar atitudes que o ajudem a ter auto-estima, impulso para avançar, para querer aprender sempre, não se isolando, mas colaborando para chegar a ter uma sociedade mais justa. A utilização que faremos das tecnologias mais avançadas é conseqüência do que somos, de como nos relacionamos com os outros e com a vida. Se somos pessoas abertas, utilizaremos para comunicar-nos mais, para interagir melhor. Se somos pessoas fechadas. Desconfiadas, utilizaremos as tecnologias de forma defensiva, superficial, como substitutivo. Das relações com outras pessoas. Se somos autoritários, utilizaremos as tecnologias para controlar, para aumentar o nosso poder. O poder de interação não está fundamentalmente nas tecnologias, mas nas nossas mentes. Educar com a nova mídia será uma revolução, se mudarmos simultaneamente os paradigmas convencionais do ensino, que mantêm distantes professores e alunos. Caso contrário, conseguiremos apenas um verniz de modernidade, sem mexer no essencial. Construção do Projeto: as intenções iniciais e o produto final No início do Módulo XVIII, as professoras queixavam-se do grande número de ausentes, e os alunos que freqüentaram pediam a professora para que terminasse a aula mais cedo, situação que tornou-se corriqueira chamando nossa atenção, resolvemos investigar e descobrimos que os alunos pediam para sair, pois queriam assistir a novela Senhora do Destino. Durante as visitas de avaliação da Coordenadora Setorial, era nítido o interesse dos educandos pela novela e os temas abordados. Eles contavam os capítulos do dia anterior e faziam relação das personagens das novelas com pessoas da comunidade. Diante desta situação, optamos por elaborar um Projeto que atendesse o interesse dos alfabetizandos, envolvendo assim, a novela aos conteúdos propostos e planejados para o módulo XVIII. Definir o objetivo geral foi a nossa primeira tarefa que estava voltado para uma educação midiática. Já os específicos estavam tinha por objetivo o desenvolvimento de habilidades de ouvir, falar, ler e escrever, habilidades necessárias para uma comunicação competente, além de promover a consciência critica e alfabetização visual. Tinha-se ainda, como objetivo avaliar a própria experiência do uso da tv para que, de forma lúdica fossem trabalhados os conteúdos transdisciplinares. A princípio trabalhamos com conteúdos conceituais usando para tanto o tema gerador novela, em seguida trabalhamos o gênero textual - narrativo, destacando a estrutura e os elementos da narrativa (o quê, quando, com quem, onde). No que se refere aos conteúdos atitudinais foi observado a influência da novela e da televisão no comportamento das pessoas, a falta de diálogo com a família e mudança de valores. No tocante as áreas do conhecimento, transcendemos os nossos limites para a transdisciplinaridade. Segundo Piaget (1970) a transdiciplinaridade engloba e transcende o que passa por todas as disciplinas, reconhecendo o desconhecido e o inesgotável que estão presentes em todas elas, buscando encontrar seus pontos de interseção e um vetor comum. Assistir e comentar os capítulos da novela Senhora do Destino, possibilitou a reflexão de vários temas. Entre eles podem ser citados: a migração e imigração, a imagem da mulher nordestina, gravidez na adolescência, drogas, extrapolando para temas contidos em outras novelas como por exemplo, a questão do negro no Brasil. Refletiu-se ainda, sobre o papel de subservância dos negros nas novelas. Podemos observar a criticidade diante da seguinte fala de um dos alfabetizandos: ”...Você não vê nas novelas uma família de negros bem sucedida...” No âmbito da discussão foram abordados os valores de vários grupos sociais (negros, pobres, homossexual entre outros). discutiu-se ainda as diferenças regionais, as paisagens e os climas. Ainda explorando os conteúdos conceituais foram estudados as regiões brasileiras, em especial o Norte/Nordeste e Sudeste, destacando a diversidade cultura. A consciência critica foi tomando consistência à medida que os alfabetizandos perceberam a inversão dos valores morais modificados por falta de censura nas novelas, a exemplo do personagem Naldo, político corrupto que faz tudo por poder e dinheiro. A imagem da mulher nordestina, forte, heroína, foi amplamente reforçada pela personagem Maria do Carmo da novela Senhora do Destino, gerando uma certa identificação com as alunas envolvidas no programa. No que se refere aos conhecimentos matemáticos, os números cardinais e ordinais foram trabalhados a partir da contagem de números de capítulos da novela, bem como a sua ordem. Adição e subtração foram trabalhadas a partir de situação problemas envolvendo atores e atrizes da novela. Para o desenvolvimento dos conhecimentos lingüísticos, focalizou-se o estudo da base alfabética, por meio das consoantes N,V,L, ainda na área da linguagem a exploração da novela Senhora do Destino, possibilitou a vivência da compreensão dos capítulos, algo que instigou bastante os alunos, observou-se a existência da diversidade de entendimentos dos alunos para um mesmo capítulo ou uma mesma personagem. No âmbito da escrita, o exercício foi motivador, pois possibilitou de forma lúdica a narração dos capítulos da novela, neste momento trabalhou-se os elementos da narrativa. A diversidade lingüística: o sotaque carioca e nordestino, foi o aspecto que mais gerou controvérsias, os alfabetizandos não se reconheciam na fala das personagens nordestinas, mas analisaram -a como um ponto que estimulou o preconceito para com os nordestinos. Dentro das discussões observamos um nível elevado de criticidade dos alfabetizandos, pois eles refletiam os padrões de beleza impostos pela mídia ( pele branca, olhos azuis, cabelos loiros e lisos), que representam a classe dominante, fugindo assim das características da grande maioria da população brasileira (formada pela mistura do negro, europeu e índio). As artes cênicas também foram exploradas a partir da novela. Foram realizadas atividades envolvendo a dramatização e o uso da linguagem gestual. A realização das atividades contribuíram para o exercício da convivência em grupo, da cooperação, do respeito e da solidariedade. A realização desse Projeto deixou marcas positivas, pois a partir da proposta, percebeu-se os que os alunos passaram a freqüentar as aulas com maior interesse e participação, pois os assuntos correspondiam aos seus interesses. Destacamos também mudança de postura diante de pré-conceitos e preconceitos da turma no que se refere a valores vivenciados pela sociedade. A realização do Projeto superou nossas expectativas, pois contou com a participação e envolvimento de todos. Tanto na esfera da aprendizagem conceitual, formal e sistemática. Acreditamos que os alfabetizandos que participaram deste trabalho, hoje têm uma postura mais crítica e mais reflexiva diante do que exposto pela mídia eletrônica. Ressaltamos também que a importância do Programa Alfabetização Solidária no Município de Serra Preta é evidente, pois trata-se de uma região com grande número de analfabetos, sendo que 99% das classes estão localizadas na zona rural, formadas na grande maioria por mulheres, acima de trinta anos, trabalhadores e trabalhadoras rurais, com pouca expectativa de participação e cidadania. Acreditamos que ao trazer para o espaço da escola as novas linguagens da comunicação e ao utilizar esses meios para ministrar os conteúdos programáticos, operou-se interessante processo. Mudou-se o próprio meio, pois deu-se a ele uma nova função - a pedagógica. Com os conteúdos operou-se também transformações, pois foram dispostos em um novo contexto, permitindo outras relações com os demais conteúdos e com o conhecimento já acumulado por cada um dos participantes do processo de ensino, tanto professores, quanto alunos. Foi, portanto, uma apropriação diferenciada do saber. Verificamos que esse processo procurou a formação humanística, valorizando a aquisição do conhecimento e do saber como possibilitadores e facilitadores da melhoria das condições de vida. REFERÊNCIAS BLIBLIOGRÁFICAS COMUNICAÇÃO & EDUCAÇÃO, Revista do curso de Gestão de Processos Comunicacionais da USP. São Paulo: Moderna. v. 8, 1/97 MEC/SEED. Módulo I . TV na Escola e os Desafios de Hoje. Brasília, 1999 MORAN, José Manuel. Como ver televisão: leitura crítica dos meios de comunicação. São Paulo : Paulinas, 1991 OBRADOVIE, Daniela. Telenovelas brasileiras na Iugoslávia como símbolo do heroísmo feminino. Itercon – Revista Brasileira de Comunicação. São Paulo, v. 13, n. 62/63, 1990, p.73-79. VINK, Nico. A novela como narrativa sobre opressão e mudança. Revista de Biblioteconomia e Comunicação. Porto Alegre, v. 4, jan/dez.1989, p.7-28