Título: PROJETO DE PESQUISA : A REORGANIZAÇÃO DAS ESCOLAS
PÚBLICAS FRENTE AOS NOVOS MODELOS DE GESTÃO NO ESTADO DO
PARANÁ
Área Temática: Política Educacional e Gestão da Educação
Autor: ANGELA MARIA HIDALGO (1)
Instituição: Universidade Estadual de Londrina
Este projeto de pesquisa pretende desenvolver um estudo sobre os
novos modelos de gestão da educação e da escola implementados a partir de
1995 no Estado do Paraná, tendo como foco principal de análise as escolas
estaduais e como estão sendo reorganizadas neste contexto de reformas.
Consideramos importante realizar esta pesquisa em grupo, na
perspectiva de apreender as contradições do fenômeno a partir de mais
variáveis e princípios, além de viabilizar a observação de um número maior de
escolas, espaço a ser investigado. Neste sentido, formamos um grupo com
cinco pedagogas, professoras do Departamento de Educação, e uma
socióloga, professora do Departamento de Ciências Sociais, da Universidade
Estadual de Londrina. Este grupo contará com a assessoria de uma professora
do curso de pós-graduação em Educação da PUC-SP, que estará
desenvolvendo uma pesquisa sobre gestão da escola em nível nacional, o que
permitirá uma articulação entre os estudos e as análises, que serão
enriquecidas pelas informações locais e nacionais produzidas pelas duas
instituições (UEL e PUC-SP) sobre o tema proposto.
Esperamos, com esta pesquisa, contribuir para uma caracterização
problematizadora da organização das escolas a partir da introdução dos novos
mecanismos de gestão, apreendendo o perfil das relações estabelecidas no
interior das escolas, bem como das relações extra-escolares no contexto em
que se inserem. Ou seja, acreditamos que se faz necessário pesquisar os
efeitos concretos engendrados pelos novos padrões de gestão do sistema de
ensino e de gestão da escola.
2
As Políticas de Gestão da Educação no contexto das reformas no Brasil
Através de reformas no sistema de ensino, os governos estaduais, a
partir da década de 90, assumem um discurso no qual a causa da crise na
educação brasileira é atribuída à ineficiência dos sistemas públicos de ensino.
É possível elencar como questões centrais das propostas de reforma na
educação brasileira, elaboradas por instituições como IPEA (Instituto de
Pesquisa Econômica Aplicada), Instituto de Estudos Avançados da USP,
Instituto Herbert Levy, CEPAL/UNESCO, Banco Mundial: “a) descentralização,
b) gestão da qualidade do sistema e das escolas; c) sistema de avaliação; d)
sistema de ensino eficiente e qualitativo; e) prioridade ao ensino básico; f)
modernização e flexibilização dos currículos e das práticas de ensino; g)
princípios da qualidade total na gestão das escolas; h) sistema público não
estatal de ensino básico; i) privatização das universidades; j) capacitação dos
professores em serviço”. (SILVA, 1998:35).
As principais justificativas para a implementação de tais reformas se
pautam pelo resgate de um ensino básico de caráter geral e abstrato para o
conjunto dos trabalhadores, já que as novas formas de racionalização na
organização da produção e do trabalho, com a implantação das novas
tecnologias, exigem dos trabalhadores capacidade de abstração pela
necessidade de leitura de códigos diversificados, de lidar com situações novas
e de trabalho em grupo. Este discurso substitui a política de expansão pela
meta de dar maior qualidade à estrutura educacional já existente - qualidade
compreendida como eficiência - e dota a educação de uma centralidade no
papel de promoção do desenvolvimento econômico com eqüidade social. As
principais medidas tomadas são: mudanças no modelo de gestão das
unidades de ensino e instituição de sistemas de avaliação externa do sistema
educacional. (Carnoy e Moura Castro, 1997).
Concebe-se a educação de “qualidade” como condição para a
promoção do crescimento econômico aliado à eqüidade, “... o conhecimento
(...) o único elemento capaz de unir modernização e desenvolvimento humano
.” (Mello, 1996:35). Essa eqüidade fica subordinada à qualidade na educação,
que por sua vez impõe a necessidade de desenvolvimento de “modelos
diferenciados e flexíveis de organização” (Mello, 1996:35). A gestão do sistema
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educacional passa a ser um dos focos de mudanças empreendidas pelas
reformas educacionais em curso.
O debate em torno dos modelos de gestão da educação e da gestão da
escola pode ser caracterizado a partir de perspectivas e concepções
diferenciadas ao longo das décadas de 80 e 90. De maneira bastante sintética
pode-se agrupar as diferentes propostas de gestão em duas grandes
vertentes.
A primeira vertente, destacou-se sobretudo na década de 80 e propunha
a construção de modelos de gestão da escola capazes de envolver a
comunidade com a escola, almejando desenvolver relações democráticas intra
e extra-escolares. A escola teria um papel fundamental na democratização das
relações políticas (Paro, 1997). Procura-se concretizar uma escola pública
realmente voltada aos interesses das classes populares e para isso ela
precisaria oferecer mecanismos de participação dos envolvidos direta ou
indiretamente com suas atividades. Os princípios da descentralização, da
autonomia e da autogestão estavam vinculados ao ideal da democratização da
escola e do fortalecimento do espaço público, em que o Estado teria papel
fundamental na sustentação deste processo.
A segunda vertente, que se fortaleceu na década de 90, parte do
pressuposto de que a maioria dos problemas educacionais do país reside no
modelo ineficiente de gestão da educação e da escola, ou seja, o problema
não é falta de democracia ou de recursos na educação, mas sim de má
gestão. Dessa forma, o debate desloca-se para um conteúdo administrativo
que visa propor modelos de gestão da escola que aumentem a eficiência e a
eficácia do sistema de ensino como um todo. Nessa perspectiva também
defende-se a criação e o fortalecimento de mecanismos de participação da
sociedade na escola, porém, não a partir da premissa da democratização, mas
sim do pressuposto de que as escolas devem superar os problemas
educacionais administrando melhor os seus recursos e encontrando novas
fontes na própria sociedade (denominada de comunidade). O objetivo é que a
"comunidade" assuma a responsabilidade pela manutenção da escola. Os
princípios da descentralização, da autonomia e da autogestão estão vinculados
aos objetivos da eficiência e da reestruturação do Estado.
4
Pode-se questionar qual a diferença básica das duas vertentes e, ainda
se elas não se complementam, uma vez que a partir da democratização da
gestão da escola espera-se como decorrência uma gestão eficiente dos
recursos, bem como autonomia para decisões de como gastá-los, de como
organizar as atividades pedagógicas da escola, entre outros. Porém, as
reformas que estão sendo implementadas nos anos noventa têm colocado
contradições fundamentais no aspecto da gestão do sistema de ensino e da
gestão da escola quando fundem justificativas democráticas com propostas de
reestruturação do papel do Estado diante dos serviços sociais, entre eles a
educação (Costa, 1995). O conjunto de estudos e de análises sobre as
reformas do Estado e da Educação têm apontado para a tendência ao
desmonte dos sistema público a partir da introdução de novos modelos de
gestão, inspirados nas teorias modernas da administração do setor privado (2).
A introdução de tais modelos, originados nas empresas privadas, nas
instituições públicas, sobretudo nas educacionais, podem provocar várias
conseqüências sociais e políticas, algumas já apontadas em estudos recentes
(3), outras ainda precisam ser mais investigadas, uma vez que depois de
quase uma década de alterações nos modelos de gestão da escola
encontramos as condições favoráveis para verificação do impacto da reforma
nas relações internas e externas das escolas, ou seja, que tipo de relações
sociais e educacionais o novo padrão de gestão do sistema de ensino e de
gestão da escola tem potencializado? Tem democratizado a educação? Tem
aumentado a eficiência da administração e dos resultados das escolas? Tem
promovido a igualização social e educacional? Tem melhorado a qualidade do
ensino? Entre outras questões pertinentes.
O discurso dos setores críticos a essa política aponta a desobrigação do
Estado para com a educação e a privatização do ensino público como
conseqüências da adoção do modelo empresarial hegemônico das teorias das
ciências administrativas na gestão educacional.
A implementação destes novos modelos de gestão do sistema
educacional vem ocorrendo a partir de projetos elaborados em alguma
unidades da federação, financiados pelo Banco Mundial. Tommasi (1996:196),
aponta que treze estados (4) do Brasil iniciaram programas de melhoria da
qualidade do ensino público pautados pela reforma da estrutura da Rede de
5
Ensino, incorporando componentes propostos pelo Banco Mundial, entre os
quais, a reestruturação da gestão da educação e da escola.
A Gestão da Educacão e a legislação
O processo de reforma da educação no Brasil têm como momentos
importantes, no aspecto da normatização, a elaboração da Constituição na
década de 80 e, posteriormente, o desenvolvimento do debate em torno da
definição de uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional-LDB,
em que os diferentes setores coloram suas propostas de configuração do
sistema público de ensino, inclusive no que se refere à gestão.
No Brasil, durante os debates para a elaboração da Constituição de
1988, o “Fórum da Educação na Constituinte em Defesa do Ensino Público e
Gratuito” (5), elaborou a proposta de “gestão democrática, acadêmica,
científica, administrativa e financeira de todas as instituições e cursos, em
todos os níveis”. Propôs ainda, eleições para diretores e coordenadores, que
tivessem o envolvimento de todos os segmentos. Tivemos como resultado,
inscrito no texto da Carta Constitucional: “gestão democrática do ensino
público, na forma da lei” (art.206, inciso VI, apud Cunha, 1997:31). Essa
determinação constitucional precisaria ser regulamentada em lei ordinária, que
no caso da educação consiste na Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional-LDB.
Assim, o embate transfere-se para a elaboração da LDB, durante a
tramitação dos vários substitutivos no Congresso e Senado, a concepção de
gestão democrática_ defendida agora pelo Fórum Nacional em Defesa do
Ensino Público e Gratuito_ vai sofrendo um processo gradual de esvaziamento
de seu significado, chegando à aprovação da nova LDB, Lei n.º 9.394 de
20/12/1996, com dois artigos que se referem à gestão democrática (art.14 e
15). Estes artigos não prevêem os mecanismos institucionais de participação
sugeridos pelo Fórum (Cunha, 1997:34-35). Entretanto, a nova LDB ressalta a
autonomia das escolas enquanto diretriz importante e permite uma maior
flexibilização da estrutura administrativa e pedagógica, que tem permitido a
implantação de inúmeros programas e medidas (6) com o foco na escola,
enquanto principal executora e dinamizadora dos objetivos anunciados.
6
Pode-se afirmar que a nova LDB por um lado, deixa de definir o que
entende por gestão democrática, e por outro reforça o caráter de unidade
individualizada da escola enquanto executora das políticas educacionais. Na
medida em que a nova LDB não criou um Sistema Nacional de Ensino
contemplando todos os níveis e graus, o princípio da fragmentação
predominou, porque além da divisão entre sistemas municipal, estadual e
federal, estimula a divisão da base de cada sistema a partir das escolas,
faculdades,
universidades,
organizações
autônomas,
entre
outras,
consideradas unidades independentes no processo de gestão da atividade
educativa (Saviani, 1997).
A Política de Gestão da Educacão no Paraná
Tendo em vista que o processo de reforma da educação tem alterado
substancialmente a gestão do sistema de ensino e a gestão da escola nos
estados da federação, consideram-se necessárias pesquisas que busquem
apreender as novas dinâmicas que estão sendo desenvolvidas nas escolas
dos sistemas estaduais de ensino. Nesse sentido, esse projeto pretende
empreender um estudo específico do Estado do Paraná, uma vez que a partir
de 1995 inúmeros programas de alteração da gestão da escola foram
implantados e alguns estudos já caracterizaram possíveis tendências a partir
de tais programas, cabendo agora um esforço coletivo de análise para uma
caracterização mais ampla dos efeitos dos novos modelos de gestão no
conjunto da rede estadual. Um estudo que busque apreender a natureza dos
novos mecanismos de gestão da escola, bem como as dinâmicas que os
mesmos imprimem na organização da escola.
Os estudos sobre as reformas da educação no Paraná nos anos 90
indicam importantes alterações nos modelos de gestão do sistema e de gestão
da escola. Gonçalves (1994) (7) evidenciou em seu estudo que a concepção
de autonomia da escola começa a ser alterada na gestão de governo do
período de 1991-1994, quando defendia-se a construção da escola cidadã a
partir da autogestão e da autonomia da escola. Gonçalves (1994) mostra que
pouco a pouco a idéia de autonomia passou a significar transferência de
responsabilidades do Estado para a escola e a comunidade, sem entretanto
7
debater o modelo de gestão que levaria à autonomia. A referida pesquisa
indicou que o início das negociações da Secretaria de Estado da Educação
com o Banco Mundial para a elaboração e financiamento de um projeto de
qualidade para o ensino básico propiciou a reformulação do modelo de
autonomia da escola a partir de uma ênfase maior no aspecto administrativo
nos moldes do setor privado.
A pesquisa de Azevedo (1995) (8) sobre as Escolas Cooperativas de
Maringá-PR também evidencia a possibilidade de fortalecimento da gestão
empresarial do setor privado na gestão da escola. O autor indica a tendência
privatista na educação municipal também justificada pela autonomia da escola.
Gonçalves
(1994)
e
Azevedo
(1995)
apontaram
a
possibilidade
de
fortalecimento do neoliberalismo na educação paranaense no início da década
de 90. Gonçalves o fez em nível estadual e Azevedo em nível municipal, mas
ambos contribuíram para o debate em torno dos modelos de gestão da escola
e do sistema de ensino em suas implicações para a consolidação ou não de
um Sistema de Ensino Estadual Público.
Santos (1998) (9) analisando o processo de municipalização no período
de 1987 à 1994 constata que a modificação na gestão do sistema de ensino
fundamental, (1.ª à 4.ª série) que consistiu na descentralização, em que o
Estado transfere para os municípios a responsabilidade administrativa sobre
este nível de ensino, foi marcada por diferentes objetivos políticos nas três
gestões de governo, sendo que no governo 1991-1994 a concepção da
descentralização foi sendo cada vez mais moldada pelo Projeto de Qualidade
da Educação Básica financiado pelo Banco Mundial. A autora denomina essa
fase de transição, ou seja o governo 1991-1994 começa a assumir a
municipalização no seu sentido mais administrativo e técnico. Contudo este
processo de descentralização não garantiu que o financiamento da ensino
fundamental ocorresse a partir das determinações legais da Constituição
brasileira de 1988.
Para Amaral (1996) (10) os dois primeiros anos do Governo Lerner
(1995-1996) já indicaram que seu projeto educacional estava marcado pela
concepção de qualidade vinculada às idéias das teorias das ciências
administrativas
modernas,
sobretudo
aos programas denominados de
"Qualidade Total". A referida autora demonstra que a gestão da escola tenderá
8
a se pautar nos programas de qualidade total enquanto uma "fórmula mágica"
capaz de reverter os problemas educacionais. Assim, se a gestão da escola for
orientada pelos princípios administrativos, já testados nas empresas privadas,
a educação alcançará maior eficiência e eqüidade. A pesquisa questiona que
tipo de qualidade pode ser almejada a partir desse referencial organizacional.
Será a qualidade para todos? Ou, para alguns? Uma vez que os programas de
qualidade total são elaborados para aumentar a competitividade entre as
empresas, justificando-se que essa competitividade é que imprime maior
qualidade nos produtos. Será essa lógica a predominar na gestão das escolas
e na gestão do sistema? A autora considera isso uma possibilidade na rede de
ensino paranaense.
Silva (1998) (11) demonstrou em sua análise sobre os governos Requião
(1991-1994) e Lerner (1995-1998) que ocorreu um deslocamento da proposta
de gestão democrática, anunciada até 1994 pelo governo estadual, para a
proposta de gestão compartilhada anunciada a partir de 1995. Nunes (1997) já
havia discutido essa problemática em torno da semântica, indicando que a
mudança na denominação da gestão da escola e do sistema significa uma
mudança de concepção de autonomia, de participação e de gestão da escola.
Silva (1998) – ao analisar em que medida os projetos de reconfiguração
do sistema de ensino, implementados pelos governos Requião (1991-1994) e
Lerner (1995-1998), se constituem em movimentos de reforma ou contrareforma educacional, a partir da análise de como a meta da igualdade social
tem sido tratada, ou seja, “como estes governos pensaram, criaram ou
modificaram mecanismos de desenvolvimento da igualdade social" (p.1) –
constata a existência de um processo de descentralização das políticas sociais
desde 1987, transferindo-se para os municípios os encargos e a administração
de determinadas demandas sociais. Na gestão 1991-1994, aponta a existência
de ambigüidades na idéia de políticas sociais, em função da tentativa de
conciliação da necessidade de restruturação do Estado, a partir dos
imperativos da crise fiscal com a consolidação da cidadania, mesclando o ideal
de cidadania com o de modernização para a competitividade. A partir de 1995
o debate sobre as políticas sociais e o papel do Estado parece estar resolvido,
explicita-se a idéia de que os problemas sociais são superados através do
9
desenvolvimento econômico, aprofunda-se o processo de descentralização e a
criação das agências sociais autônomas.
A referida autora analisa as principais metas, objetivos, princípios e
programas anunciados pelo governo entre 1991 e 1998. No período 91/94,
indica que as metas apresentam dois eixos: a educação para a modernidade e
a construção da escola cidadã, discurso este inserido no contexto nacional de
associação de vários discursos de origens e conteúdos diversificados e
antagônicos.
Os
princípios
norteadores
das
ações
foram:
a
gestão
democrática, o envolvimento da comunidade, a autonomia para a escola
elaborar seu projeto pedagógico e a avaliação de desempenho. Verifica, ainda,
que o ideal de igualdade social estava presente no ideal de escola cidadã. No
período 1995-1998, o governo apresenta enquanto objetivo maior a
constituição de uma gestão compartilhada, flexibilizando os mecanismos do
sistema de ensino para atingir a meta da excelência nas escolas. Identifica um
vínculo da política educacional deste período com os princípios da Qualidade
Total, explicitando na origem do discurso da gestão compartilhada, o modelo
de administração empresarial de gestão participativa. Modelo este que, nas
empresas, busca o envolvimento dos trabalhadores com o objetivo de
intensificação da produtividade, e na educação, este envolvimento visa
exclusivamente a adesão dos trabalhadores do ensino à política educacional
implementada centralizadamente.
Dessa forma, percebe-se que a gestão da escola no Paraná vem sendo
modificada a partir de princípios e concepções diferenciadas em cada contexto
histórico, que imprimem uma reorganização total no sistema de ensino e na
unidade escolar.
A pesquisa de Hidalgo (1998) (12) também evidenciou vários problemas
e contradições que decorrem das modificações nos padrões de gestão da
escola. Através de um estudo em seis escolas da rede estadual de Ensino do
Paraná, em que selecionou três escolas classificadas na primeira etapa do
Projeto Premiação, previsto pelo Projeto de qualidade da Educação Básica do
Paraná (1994) e três escolas indicadas pelos Núcleo Regional de Ensino como
escolas com dificuldades no desenvolvimento dos trabalhos, indicou que a
competitividade, a individualidade e o processo de diferenciação, seleção e
exclusão dos alunos têm se tornando os princípios norteadores das ações
10
administrativas
das
escolas.
Ou
seja,
há
uma
tendência
clara
do
estabelecimento da lógica privatista na gestão do sistema e na gestão da
escola. O Estado não privatiza as escolas, mas imprime uma lógica de
mercado no sistema de ensino a partir de programas que incidem diretamente
nos modelos de gestão das unidades escolares. A competição entre as
escolas passa a ser a principal forma de relacionamento no interior do sistema
de ensino,
"A orientação para satisfação do cliente pode difundir o seguinte
raciocínio: as escolas que se destacam, conseguem obter a participação da
comunidade em sua gestão em função da disputa por vagas, o que por sua vez
possibilita um melhor aproveitamento dos recursos enviados pelo Estado e a
cobrança de tarifas dos pais interessados em manterem seus filhos em escolas
melhores que as outras. Estimula-se desta forma a competição entre as
escolas para se destacar das demais, pela adoção de modelos de gestão
preestabelecidos pela SEED como uma forma de angariar um número
crescente de alunos" (Hidalgo, 1998: 126).
Esse conjunto de pesquisas citadas trazem ao debate hipóteses,
tendências e evidências de alterações no padrão de gestão do sistema de
ensino e de gestão da escola no Paraná que precisam ser melhor investigados,
uma vez que tais estudos ocorreram durante o processo de implementação
das novas políticas de gestão da escola, o que limita a visualização das
conseqüências e dos efeitos em suas dimensões mais amplas.
Assim, faz-se necessário continuar pesquisando os efeitos dos novos
modelos de gestão da escola, ampliando o campo de estudo para mais
escolas e tentando apreender a dinâmica das escolas reorganizadas nos
aspectos administrativos e pedagógicos, enquanto aspectos entrelaçados e
articulados na gestão da escola.
Acredita-se que as organizações, apesar de serem estruturadas e
sofrerem as influências da institucionalização das normas demandadas pelos
órgãos centralizados, desenvolvem também uma cultura própria, ou seja,
possuem uma dinâmica peculiar, em que as propostas de alterações passam
por um processo de reelaboração e são reinterpretadas. O processo de
11
implantação das medidas implicam em mudanças que engendram múltiplas
contradições. Cabe pesquisar os limites e as possibilidades das propostas
quando colocadas em prática, nas realidades concretas de cada escola.
Dessa forma, as questões que emergem a partir da introdução dos
referidos modelos de gestão são as seguintes: quais os padrões de relações
intra e extra-escola que estão sendo produzidos pelos novos modelos de
gestão do sistema de ensino, implementados pelas reformas educacionais no
Estado do Paraná nos anos 90? Qual a natureza dos mecanismos de gestão
da escola criados e implementados?
Objetivos do trabalho
Definimos os seguintes objetivos para o trabalho aqui proposto: analisar
as mudanças provocadas na dinâmica institucional desencadeadas pela atual
reforma na gestão da escola pública do Estado do Paraná. Buscar-se-á
conhecer as alterações na cultura organizacional da escola, na relação desta
com a sociedade e o impacto na qualidade de ensino. Portanto, o propósito do
estudo é identificar as possíveis contradições engendradas pelas novas formas
de gestão, evidenciando as possibilidades e os limites das propostas em curso.
Para tanto faz-se necessário: sistematizar os estudos já existentes ou que
estejam em desenvolvimento sobre a gestão da educação no Paraná;
identificar as parcerias estabelecidas entre as escolas e os diferentes
segmentos
da
comunidade,
-
o
setor
produtivo,
organismos
não
governamentais, instituições públicas- e o papel que cada um desses vem
desempenhando na gestão escolar; analisar as representações dos diferentes
sujeitos educativos - diretores, professores, pais e alunos- sobre a gestão
escolar e suas práticas no processo de gestão da instituição; indicar a
existência ou não de processos- explícitos e/ou implícitos- seletivos de alunos;
descrever e analisar as relações existentes entre a gestão da escola e a
qualidade do serviço educativo oferecido.
Procedimentos metodológicos
12
Optamos
pelos
seguintes
procedimentos
metodológicos:
uma
abordagem qualitativa, uma vez que ela permite a transcendência dos
problemas iniciais, a partir de um intercâmbio mais dinâmico entre
pesquisador, interlocutor e universo investigado. Dessa forma, pode-se
concentrar mais na riqueza do processo do que nos resultados ou
confirmações das hipótese iniciais. Espera-se que essa estratégia permita a
apreensão das singularidades essenciais do objeto, observando-o tanto em
sua dinâmica própria, quanto em sua relação com o todo. Cabe ressaltar, que
apesar de priorizar esta estratégia, procurou-se destacar um número maior de
casos a serem estudados, o que não caracteriza um estudo quantitativo, mas
apenas busca o enriquecimento do estudo a partir de um número mais
significativo de espaços. Ressalta-se, ainda, que não se trata de um estudo de
caso de tipo etnográfico, o que demandaria uma limitação dos espaços
investigados, bem como o manejo de um conjunto de técnicas e referenciais
que não serão adotados aqui.
A pesquisa será desenvolvida em quatro momentos:
1. Identificação e análise dos projetos da SEED-PR que definem ações
relacionadas à gestão do sistema de ensino e da unidade escolar, bem como
documentos produzidos no âmbito da unidade escolar.
2. Seleção da amostra a partir do seguintes critérios: serão pesquisadas
24 escolas. Dadas as peculiaridades sócio-econômicas e culturais, escolhemos
três regiões do Paraná: Norte, Sul e Oeste (13). Selecionaremos dois
municípios de cada uma destas regiões, um de grande e outro de pequeno
porte. Em cada um destes municípios, trabalharemos em quatro escolas: duas
consideradas de bom nível de ensino e que apresentam inovações no aspecto
da gestão, segundo a SEED (uma escola de grande e outra de pequeno porte)
e duas outras reconhecidas como escolas que possuem dificuldades para
atingir as metas administrativas e pedagógicas (uma escola de grande e outra
de pequeno porte) .
3. Realização de entrevistas com diretores, funcionários, professores,
pais de alunos, alunos, representantes nos Conselhos Escolares e APMs e
representantes de entidades que mantêm parcerias com as escolas da
amostra.
13
3.1. Utilizaremos os seguintes instrumentos para a coleta de dados:
roteiros de entrevistas a serem administradas aos diretores das escolas,
professores, pais, alunos, representantes no conselho escolar, na APM.
Roteiros de observação das reuniões do conselho escolar, da APM e dos
trabalhos na escola.
4. Análise e organização dos dados no que se refere à caracterização
problematizadora dos novos padrões de gestão da escola e da qualidade dos
serviços educativos.
Notas
(1) Autores da Pesquisa: Angela Hidalgo, Edmilson Lenardão, Eliane Cleide
da Silva Czernicz, Ileizi Luciana Fiorelli Silva, Marleide Silva Perrude, Sandra
Regina de Oliveira Garcia.
(2) Pablo Gentili tem enfatizado essa tendência em suas reflexões. Ver
especialmente: GENTILI, Pablo. O discurso da "Qualidade" como nova retórica
conservadora no campo educacional. In. GENTILI, Pablo & SILVA, Tomaz
Tadeu da. (orgs.) Neoliberalismo, Qualidade Total e Educação . 2. ed.
Petrópolis: Vozes, 1995. pp. 111-177; _____. A Falsificação do Consenso:
Simulacro e Imposição na Reforma Educacional do Neoliberalismo.
Petrópolis, RJ: Vozes, 1998. Frigotto (1995a) (1995b), também indica as
contradições que emergem na educação quando os modelos de gestão do
setor privado tornam-se hegemônicos nas reformas, subordinando totalmente
a educação ao interesse do novo padrão de acumulação capitalista. Dale
(1995) discute o mesmo processo na Nova Zelândia e demonstra a
possibilidade da criação de mercados educacionais como forma de
privatização da escola pública.
(3) Conferir, entre outros: Pablo Gentili, op. cit. OLIVEIRA, Dalila Andrade. A
Qualidade Total na Educação: os Critérios da Economia Privada na Gestão da
Escola Pública. In: BRUNO, Lúcia (org.) Educação e Trabalho no
Capitalismo Contemporâneo. São Paulo: Atlas, 1996. pp. 57-90. OLIVEIRA,
Maria Auxiliadora M. de. A Política Educacional de Minas: Qualidade Total?
Caxambu, MG: 20.ª Reunião Anual da ANPED ,21-25 set./1997 (mimeo).
(4) Nove Estados do Nordeste, São Paulo, Paraná, Minas Gerais e Espírito
Santo.
(5) Cunha (1997), explica que o Fórum da Educação na Constituinte em defesa
do Ensino Público e Gratuito, composto por 15 entidades, após aprovada a
Constituição, acompanhou a tramitação da LDB , com o nome de Fórum
Nacional em Defesa da Escola Pública na LDB.
(6) Um exemplo de programa é o intitulado "Dinheiro na Escola", que envia
verbas diretamente a cada escola.
(7) GONÇALVES, Maria Dativa Salles. Autonomia da Escola e
Neoliberalismo: Estado e Escola Pública. São Paulo, 1994. Tese de
Doutorado (Doutorado em Educação) Pontifícia Universidade Católica - PUC.
14
(8) AZEVEDO, Mário Luiz Neves de. Neoliberalismo e Educação: Novo
Conflito entre o Público e o Privado. São Carlos, 1995. Dissertação de
Mestrado (Mestrado em Educação) - Universidade Federal de São Carlos.
(9)SANTOS, Jussara Maria T. Puglielli. As Políticas Governamentais para o
Ensino Fundamental do Paraná diante dos preceitos da Constituição. São
Paulo, 1998. Tese de Doutorado (Doutorado em Educação), Faculdade de
Educação da Universidade de São Paulo-FEUSP.
(10) AMARAL, Marilene Alves. A qualidade da educação na qualidade total.
São Paulo, 1996 Dissertação de Mestrado (Mestrado em Educação) - Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo.
(11) SILVA, Ileizi L. F. Reforma ou contra-reforma no sistema de ensino do
Estado do Paraná? Uma análise da meta da igualdade social nas políticas
educacionais dos anos 90.. São Paulo, 1998. Dissertação de Mestrado
(Mestrado em Educação), Faculdade de Educação da USP.
(12) HIDALGO, Angela Maria. Tendências Contemporâneas da Privatização
do Ensino Público: o caso do Paraná. São Paulo, 1998. Dissertação de
Mestrado (Mestrado em Educação), Pontifícia Universidade Católica-PUC.
(13) Este procedimento justifica-se na história da colonização do Estado do
Paraná, que resultou em diferenças étnicas, culturais, econômicas,
educacionais e políticas. Em síntese: a região sul foi a primeira a ser ocupada
a partir do século XVI, predominantemente por imigrantes europeus (italianos,
alemães, poloneses, ucranianos, entre outros); a região norte foi colonizada no
início do nosso século, a partir dos anos 20 e anos 30, atraindo inicialmente
mineiros e paulistas e, posteriormente japoneses, alemães e italianos; a região
oeste foi mais intensamente colonizada a partir dos anos 40 e anos 50 com um
fluxo migratório do rio Grande do Sul e de Santa Catarina. Evidentemente que
a população que ocupou as regiões não é o único fator determinante das
diferenças culturais, sociais, econômicas, políticas e educacionais, porém,
mencionamos essa variante porque ela ilustra bem como a configuração das
referidas regiões do Estado ocorreu em processos históricos diferenciados no
tempo e no espaço.
Contato
Endereço: Angela Maria Hidalgo
Rua Pernambuco, 601, ap 33. CEP 86020-070 – Londrina – PR
Fone: (043) 324-7114
e-mail: [email protected]
Referências bibliográficas
AMARAL, Marilene Alves. A qualidade da educação na qualidade total. São
Paulo, 1996 Dissertação de Mestrado (Mestrado em Educação) - Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo.
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