REFLECTINDO…. Desde pequenino que ouço contar histórias da Marinha e “estórias” de marinheiros. O meu Avô materno, a quem sempre estive muito ligado, foi oficial da Armada. Já reformado, tinha por hábito, na minha infância, levar-‐me a passear nas manhãs de Domingo. Visitávamos museus, miradouros, bairros antigos, etc. Durante esses passeios, como não quer a coisa, ia-‐me falando das suas experiências náuticas, dos seus embarques, das suas comissões em terra…. Quando passávamos no Terreiro do Paço e havia algum navio no Quadro, amarrado a uma das bóias, era certo e sabido que lá vinha mais “estória” de marinheiros. O mesmo acontecia perante a estátua de um ilustre antepassado ligado à Marinha ou nos museus, quando a ocasião era propícia. A pouco e pouco, foi-‐se cimentando no meu espírito o desejo de, também, poder viver experiências semelhantes, abraçando a Carreira Naval. Já adolescente e para vencer as agruras das matemáticas e das físicas liceais, o meu Avô dava-‐me explicações e dos seus ensinamentos transparecia muito das suas antigas vivências navais. Nessa altura, contava-‐me episódios passados no mar, durante as duas últimas Guerras Mundiais, a bravura dos marinheiros envolvidos, não olhando à sua proveniência, mas sim aos feitos praticados. Assim, a coisa mais natural depois de concluída a etapa liceal, seria concorrer à Escola Naval. Quis o acaso que não concluísse o 7º ano na primeira época, o que me impediu de concorrer nesse ano. Concluído o 7º ano na segunda época, matriculei-‐me no Instituto Superior Técnico (IST) com grande desgosto do meu Pai, que gostava que eu cursasse medicina. A vivência de um ano lectivo no IST, deu-‐me para perceber que estava num mundo completamente diferente daquele em que ansiava viver No ano seguinte, concorri à Escola Naval e logrei entrar, dando uma grande alegria ao meu Avô, quando me viu fardado de Cadete pela primeira vez. Nas visitas subsequentes que lhe ia fazendo, sempre que as lides navais e namoradeira o permitiam, as posições invertiam-‐se: eu era o relator e ele o auditor. Já estava muito velhinho, mal saía de casa, mas mantinha o seu espírito arguto e crítico, aconselhando-‐me com sábias palavras. Ainda lhe dei a grande alegria de me ver fardado de Guarda-‐marinha. Os anos passaram-‐se com uma rapidez espantosa. Durante os meus 45 anos de vida activa na Marinha, houve momentos em que me lembrei dos seus sábios conselhos e me perguntei: como faria o meu Avô? Neste meu momento de reflexão, recordo as muitas vezes que o meu Avô disse: “De todas as funções que venhas a desempenhar, a mais nobre será sempre a de Comando”. Quão verdadeiro e sábio foi este conselho. Na multifacetada carreira que tive oportunidade de viver, desempenhando funções no ensino e formação militar, no fomento marítimo, nas comissões de embarque ou nos fuzileiros e como conselheiro militar junto de embaixadores, o que mais me marcou foi o comando de unidades, quer no mar quer em terra. Naqueles momentos em que reina um silêncio profundo e todos olham para o comandante, ansiosos por ouvirem a ordem mais oportuna para enfrentar as adversidades do presente, e as consequências vividas após a tomada das decisões, são situações inolvidáveis que nos marcam para toda vida. Ter consciência que o êxito duma missão, do destino dos homens e do material que nos estão entregues, dependem unicamente da decisão, que é só nossa, consubstanciada na avaliação da sua propriedade e oportunidade, é um acto solitário da nossa inteira responsabilidade, é viver o conceito de comando em toda a sua plenitude As revivências na minha mente dos episódios passados, desde a entrada na Escola Naval até ao presente, tornam ainda mais saudosa a lembrança de quem me norteou na escolha da Carreira Naval, e me levam a reflectir que muitas das ”estórias” eram verdadeiras histórias, algumas das quais tive oportunidade de viver, e que voltaria a tomar a decisão de abraçar a Marinha, sem qualquer dúvida ou arrependimento. Pedro Correia do Amaral