TESTEMUNHOS HOSPITALEIROS “Feliz por gastar a vida servindo” Emília da Conceição Nogueira Irmã Hospitaleira do Sagrado Coração de Jesus 1. Dados biográficos e vocação 2. Jesus continua a fascinar-me 3. Cem por um nesta vida 4. Hospitalidade em ação 5. O Senhor continua a chamar TESTEMUNHOS HOSPITALEIROS, fevereiro 2015 2 1. Dados biográficos e vocação Sou a Irmã Emília da Conceição Nogueira, muito mais conhecida por Irmã Crisantina de Maria, natural de S. Simão de Litém, diocese de Leiria. Nasceu em outubro de 1933. Posso dizer que a Vocação Hospitaleira nasceu comigo e tive essa percepção desde muito pequena (a percepção que se pode ter na idade de 4-5 anos). Olhava para uma fotografia de uma tia, Hospitaleira, irmã da minha mãe e repetia com frequência: “quando for grande quero ser como a tia….” Contra ventos e marés A ideia foi crescendo comigo e tornou-se num projeto de vida, contra todos os ventos e marés. Durante a adolescência senti outras solicitações, que me apontavam outros caminhos, mas a verdade é que todos me pareciam muito limitativos: casar, ter um marido, uns filhos, como tinham feito os meus pais… era muito pouco e não preenchia o meu vazio… Era muito feliz com os meus pais, irmãos e toda a família extremamente unida e estável, mas sentia necessidade de mais. A vocação foi amadurecendo e no momento próprio deixei tudo e dei “um salto no vazio”, tendo antes enfrentado bastantes dificuldades: resistência por parte dos meus pais, a quem fazia falta – era a mais velha de 6 irmãos – e eu sentia e compreendia a relutância deles. O ter de deixá-los, aos meus irmãos e a tantas pessoas queridas… Mas a força interior que sentia era superior a tudo isto. Faço parte da Congregação das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus desde 1950, ano em que ingressei no Postulantado. Fiz a Profissão temporária em 1953 e a Perpétua em 1957. A minha vivência na Hospitalidade consagrada passou pelos mais variados serviços, que sempre me esforcei por desempenhar com dedicação ao carisma hospitaleiro e à minha missão na Igreja: Trabalhei como ajudante de secretaria no período de juniorado. Entre 1958 e 1970, tirei o curso de Educação básica – professora primária, em Braga e, a seguir fui a responsável pelo Colégio das Teresinhas. Fui mestra de noviças entre 1970 e 1976, em Idanha e em Braga, porque se deu a mudança do noviciado para essa Casa. Entre 1976 e 1977 ocupei o lugar de Diretora do Colégio apostólico, em Condeixa. Em 1978 fui mestra de Junioras, na Idanha. Servi como Superiora da comunidade de S. Roque – Funchal, entre 1979 e 1982. Em 1982, fui eleita Vigária Provincial, cargo que acumulei com o de Superiora na Casa de Saúde da Idanha, durante 6 anos. Entre 1988 e 2000 realizei o serviço de Superiora, primeiro na comunidade de Braga e depois, em S. Roque – Funchal. A partir de 2000, estou integrada na comunidade da Casa de Saúde do Espírito Santo (Angra do Heroísmo - Açores), tendo realizado os serviços de administradora, vice- TESTEMUNHOS HOSPITALEIROS, fevereiro 2015 3 superiora, conselheira local. A partir de 2013, assumi o serviço de pastoral da saúde e voluntariado. A área pastoral muito tem contribuído para o meu dinamismo, entusiasmo e criatividade. Tento ser uma presença reconfortante, paciente e acolhedora para proporcionar aos doentes o bem estar que procuram. 2. Jesus continua a fascinar-me Hoje, a tantos anos de distância, sinto que não poderia ter sido de outro modo, porque a força interior que me impelia era irresistível e continua a ser. Se tivesse hoje de fazer uma opção vocacional, seria exatamente a mesma, porque Jesus, presente nos pobres e doentes a quem, cada dia, me envia continua a fascinar-me; preenche totalmente o meu vazio e cada dia é uma descoberta de que Ele necessita do meu coração para amá-los, das minhas mãos para acolhê-los, dos meus pés para caminhar, da minha simplicidade e entrega alegre e gratuita para semear ao meu redor: paz, alegria e esperança. Cada dia sou desafiada, através das solicitações, a “ser mesa posta para todos”, o que nem sempre é fácil, porque muito limitada, mas estas mesmas limitações entrego-lhas a Ele, para que com elas faça maravilhas, como fez em Maria, em Bento Menni e em tantas Hospitaleiras comprometidas com a causa dos mais pobres, que me surpreenderam quando iniciei esta caminhada e que tenho descoberto ao longo do meu percurso; umas que já partiram para Deus e outras que, como eu, ainda estão em caminho. 3. Cem por um nesta vida Quando chego à noite e faço uma retrospetiva do que foi o meu dia, sinto que recebi muito mais do que dei e também aqui descubro “o cem por um” oferecido por Jesus àqueles que aceitam o seu convite para segui-lO. Sempre fui muito feliz em todas as tarefas em que fui chamada a servir ao longo do meu percurso. Em todas elas, direta ou indiretamente, sinto-me a servir Jesus, na pessoa dos seus pobres. É muito, muito gratificante e fonte de alegria, de paz e plenitude. TESTEMUNHOS HOSPITALEIROS, fevereiro 2015 4 Os últimos anos, livre de formas de servir que me absorviam muito tempo e energias, estou mais disponível para os doentes, e tem sido uma bênção de Deus sentir-me a servi-lO nos mais pobres dos pobres, a tempo inteiro, tentando responder às suas necessidades mesmo não formuladas. 4. Hospitalidade em ação Recriar a Hospitalidade passa também por aqui, pelos pequenos gestos e compromissos do dia a dia, vividos com coração, para quem, como eu, já não pode fazer coisas de grande vulto. A compaixão, a misericórdia, a paciência, o serviço humilde e desinteressado, a simplicidade, o acolhimento, o transmitir paz, esperança etc. são valores que muito prezo e que são a Hospitalidade em ação. Olhando para o presente e para o futuro (pelo menos futuro próximo), sinto que cada vez será maior o número de pobres e doentes, “caídos à beira do caminho”, incapazes de acompanhar o ritmo frenético desta sociedade agressiva, onde não há lugar para os TESTEMUNHOS HOSPITALEIROS, fevereiro 2015 5 Deficientes, Idosos e portadores de patologias que os impedem de competir e de oferecerem o seu potencial, porque o têm; o que lhe faltam são as oportunidades. Tudo isto gera frustração, desânimo e outros tipos de sofrimento que só quem se compromete a sério com a sua causa é capaz de avaliar. Por isso, entregar a vida a Deus para servi-lO em cada pobre é dar-lhe sentido pleno, fecundidade, plenitude, numa palavra, é fonte de felicidade, no presente e no futuro. 5. O Senhor continua a chamar Estou convencida que o Senhor continua “a bater à porta” e a chamar. Apesar de, na Europa, se verificar pouca adesão aos seus apelos, por múltiplas causas, que não vem a propósito agora analisar, a Congregação continua a sua Missão de tornar presente o Reino de Deus no mundo dos pobres: São os milhares de Colaboradores Hospitaleiros que, contagiados pelo exemplo de S. Bento Menni, comungam o Carisma e, lado a lado com as Irmãs, a quem cabe a Missão de ser “Memória Carismática” damos corpo a esta Missão da Igreja, que continuará, porque é Obra do Espírito Santo e é Ele que lhe dá Vida. Se as respostas ao apelo de Deus escasseiam aqui, na Europa, florescem noutros continentes e talvez, no futuro, sejam elas a injetar nova vida onde a visibilidade do Carisma foi iniciada. Os pobres vivem o momento presente, sem se inquietarem com o dia de amanhã. É esta pobreza, a das Bem-aventuranças, que nós somos chamadas a viver neste momento da história eclesial e congregacional, com paz, serenidade, alegria profunda, (aquela que, segundo Jesus “ninguém nos poderá tirar”) e abandono ao seu amor. A Obra é d’Ele e Ele não pode deixar de velar por aquilo que é pertença Sua, e sobretudo, pelos doentes, que “são a menina dos seus olhos”. TESTEMUNHOS HOSPITALEIROS, fevereiro 2015 6