VIII ESPECIAL
PÚBLICO•SÁBADO, 27 SET 2003
Concelhos desfavorecidos
também conseguem rivalizar
com os mais “ricos”
Há concelhos mais desfavorecidos que continuam a estar entre os que têm as
médias mais baixas. Mas outros conseguem romper a barreira e subir para junto
dos “ricos”. Valadares Tavares, professor catedrático do Instituto Superior
Técnico, em Lisboa, mantém a tese de que o sucesso dos alunos depende mais
da escola do que do contexto sócio-económico.
Por Bárbara Wong
Independentemente do seu
nível sócio-económico, há
concelhos que persistem em
manter-se nos piores lugares, ou seja, com as médias
mais baixas a Matemática
e a Português B. Ainda que
em muitos a média nos exames nacionais de 12º ano até
tenha sido melhor, tal não foi
suficiente para fazê-los sair do
fim da lista.
Esses concelhos estão espalhados por todo o país. Apesar
dos que têm melhores resultados, sobretudo a Matemática,
se concentrarem mais no litoral. O interior também está
representado entre os que têm
médias mais altas, sobretudo
a Português B.
O professor catedrático do
Instituto Superior Técnico,
em Lisboa, e antigo presidente do Comité de Educação da
OCDE, Valadares Tavares,
voltou a fazer o trabalho que,
no ano passado, realizou para
a Sedes — em conjunto com
Pedro Maia Graça e Maria
Manuel Valadares Tavares.
Começou por tirar a fotografia dos concelhos do país,
distribuindo-os por diferentes
grupos tendo em conta dois
indicadores: primeiro, o poder de compra por habitante
(pegando nos dados do Instituto Nacional de Estatística,
referentes a 1999); segundo, a
percentagem da população
com pelo menos 25 anos de
idade e com formação igual
ou superior ao 12º ano (de
acordo com o Censos 2001).
Com estas duas variáveis foi
possível dividir os concelhos
por oito grupos: do A, onde
estão os mais “pobres”, ao F,
os mais “ricos”. Criaram-se
ainda mais dois grupos para
Porto (G) e Lisboa (H), porque
são consideradas realidades
distintas. De seguida, em
cada concelho foi feito o levantamento das escolas com
pelo menos 25 alunos a fazer
exames nacionais de Matemática e Português B. Calculou-se
a média geral do concelho e foi
analisar-se como se posicionava este em termos nacionais.
Para o estudo foram escolhi-
dos apenas os 20 por cento de
concelhos com as médias mais
altas e os 20 por cento com as
médias mais baixas.
Valadares Tavares confirmou que há sempre concelhos menos desenvolvidos
que conseguem furar a
barreira da mediocridade e
sentar-se, lado a lado, com
os mais favorecidos. Portanto, mesmo quando as condições sócio-económicas são
diferentes, é possível haver
notas semelhantes.
Isto sucede porque não são
os factores sócio-económicos
que determinam o sucesso
dos alunos, mas o factor
humano, defende Valadares
Tavares.
Ponte de Lima melhor a
Matemática que... Lisboa
Pegando no caso da Matemática. Tal como no ano passado,
entre os 20 por cento melhores
estão os concelhos óbvios: Lisboa (8,9 valores de média na
12º fase do exame nacional)
e Porto (8 valores). Mas está
também um dos mais desfavorecidos, como Baião (média de
7,9), que é o único do Grupo
A (o dos mais pobres). Ponte
de Lima (9,1), Melgaço (8,3) e
Vila Verde (8,2), do grupo seguinte, também conseguem
figurar entre os melhores.
Todos tiveram médias superiores à nacional, que foi de
7,7 valores.
Os estudantes de Ponte de
DANIEL ROCHA
Num mesmo concelho coexistem escolas com notas díspares: as diferenças chegam a atingir os seis valores
Lima tiveram inclusivamente melhores resultados que os
de Lisboa e do Porto. Mas se
não se quisermos comparar
com estas duas cidades, podemos fazê-lo com os do Grupo
F, por exemplo. E conclui-se
que Coimbra (8,9) ou Aveiro
(8,3) tiveram médias abaixo
das obtidas pelos alunos
limianos.
No fundo da tabela volta a
suceder o mesmo. Concelhos
com melhores condições
sócio-económicas têm piores
notas que os que são menos
desenvolvidos.
Por outro lado, tanto numa ponta como na outra da
tabela, há concelhos que, de
um ano para o outro, desaparecem. Veja-se o caso de
Mértola. No ano passado, era
o único dos mais pobres que
tinha um lugar no grupo dos
que apresentavam médias
mais altas; agora saltou para
o meio da lista.
De 2002 para 2003, verificase que, na lista dos melhores
resultados, os concelhos
mais estáveis, os que repetem a sua posição, são os dos
grupos mais favorecidos (E e
F). Acontece o inverso entre
os piores, ou seja, os que se
mantêm de pedra e cal, são
os dos grupos A e B, havendo mudanças maiores nos
restantes.
Diferenças dentro
do mesmo concelho
Também a Português B, cuja
média na 1ª fase dos exames
nacionais foi de 10,7 valores,
se verifica a mesma tendência
que na Matemática. Independentemente da sua posição sócio-económica, há concelhos
mais pobres que têm médias
semelhantes aos mais ricos,
o que atenua as assimetrias
regionais.
Este ano, apenas um
concelho do grupo dos mais
desfavorecidos está entre os
melhores: Mondim de Basto
com 11,8 valores. O ano passado havia três representantes
do grupo A. Em relação a
2002, no total dos dois grupos
seguintes, B e C, há mais três
concelhos representados. Esta
é uma das razões porque, no
mapa de Portugal, as regiões
do interior se evidenciam entre as melhores a Português.
Em relação às notas mais
baixas, as médias variam
entre os 5,4 valores de Vila
Nova de Poiares (grupo C)
e 9,5 em Vinhais (grupo A).
Mais uma vez, um concelho
fraco supera a média de um
mais favorecido.
Outra análise que Valadares Tavares faz é que, mesmo
no interior de cada um dos
concelhos, as diferenças entre as médias das escolas são
enormes, com disparidades,
entre as notas máximas e
mínimas, na ordem dos seis
valores. Portanto, conclui o
catedrático, a tese de que o
grau de desenvolvimento
da região determina o sucesso escolar dos alunos é
falsa. A questão que se põe
é outra: “A oferta educativa
é diferente” de escola para
escola. Já o ano passado, Valadares Tavares declarava
que tudo depende do factor
humano. “É o entusiasmo
dos conselhos executivos
e dos professores que faz a
diferença”. ■
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