Vivências: Revista Eletrônica de Extensão da URI
ISSN 1809-1636
PASSANDO UM “CAFEZINHO”: MISTURAS E SEPARAÇÃO DE MISTURAS
A PARTIR DE UM EXPERIMENTO COM MATERIAIS DO COTIDIANO
Making a black coffee: Chemical mixture and mixture separations from an experiment with common
materials
Adjane Maia UCHÔA1
Renatha Fraga do NASCIMENTO1
Adezuita Pinto da SILVA1
Aline Araújo Dias BARROS1
Ana Maria Botelho de LIMA1
Elaine Sueli da Silva PINTO1
Geovana da Silva Vieira LEMES1
Joicemara de Queiroz SOUZA1
Josiane Silva de OLIVEIRA1
Maria Jailane Pereira da SILVA1
Patrícia da Silva GOMES1
Priscila de Andrade Barbosa SANTOS1
Viviane Martins GARCIA1
Gilvan José Pereira JÚNIOR2
Ana Carolina Garcia de OLIVEIRA3
Miyuki YAMASHITA4
Wilmo Ernesto Francisco JUNIOR5
RESUMO
O presente trabalho relata uma atividade desenvolvida no âmbito do PIBID (Programa Institucional
de Bolsa de Iniciação à Docência) da Universidade Federal de Rondônia-UNIR, conduzida com 76
alunos de três turmas do primeiro ano do ensino médio de uma escola pública localizada na cidade
de Porto Velho, Rondônia. A atividade visou à discussão dos temas misturas e separação de
misturas e foi dividida basicamente em duas etapas. A primeira etapa foi o levantamento prévio de
algumas concepções acerca desses temas a partir de uma situação-problema cotidiana. O intuito foi
analisar quais os fenômenos os alunos tinham conhecimento na preparação do café. Em seguida, foi
realizado e discutido um experimento que consistia no preparo de um “cafezinho” e sua
consequente destilação. Após a explanação dos conceitos envolvidos, foi solicitada aos estudantes
1
Graduanda em Licenciatura em Química pela UNIR e bolsista do PIBID Química.
Professor da rede estadual de educação de Rondônia (EEEM Major Guapindaia) e supervisor do PIBID.
3
Professora do Departamento de Química da UNIR e colaboradora do PIBID Química.
4
Professora do Departamento de Química da UNIR e coordenadora do PIBID área de Química.
5
Professor do Departamento de Química da UNIR e Coordenador Institucional do PIBID/UNIR.
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uma atividade avaliativa em que deveriam desenhar e explicar os processos. Todas as respostas
continham desenhos, mas poucos utilizaram o nível microscópio para explicá-lo. Ao fim, a maior
parte dos estudantes soube identificar os processos ocorridos na preparação de um café, porém,
ainda encontraram dificuldades para explicar os processos adequadamente.
Palavras-chave: PIBID, experimentação, ensino de química.
ABSTRACT
This work reports an activity developed in PIBID (Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à
Docência) scope from Federal University of Rondonia and conducted with 76 high school students
from Porto Velho. The aim was discuss chemical mixture and mixture separations themes. The
proposal was divided in two parts. At first, it was realized a survey about theme based on a common
problematic situation. The objective was analyze phenomenons had been known by students about
black coffee preparing and its distillation. At second part was realized an experiment that consisted
in make a black coffee and its consequent distillation. After concepts explanation, evaluative
activity in which the students should draw and explicate the process was performed. In all answers
had contained draws, but just some students employed a microscopic level in their explanation. The
most of students was able to identify the process involved during black coffee preparation.
However, they still presented difficulties to explain the process suitably.
Keywords: PIBID, experimentation, chemistry teaching.
INTRODUÇÃO
Não obstante a existência de vários recursos que contribuem para o ensino de química, a
experimentação ainda possui grande apelo para a motivação do aluno em sala de aula. É comum
entre os professores de ciências a crença no fato de a experimentação despertar um forte interesse
entre alunos de diversos níveis de escolarização (HOODSON, 1994; GIORDAN, 1999;
GONÇALVES; GALIAZZI, 2004).
Se retornarmos ao passado, veremos que a experimentação possuía um papel fundamental
para a construção do pensamento científico, primeiramente através da observação de fenômenos, até
então explicados de forma teológica. Giordan afirma que Aristóteles já defendia a experimentação
quando falava que “quem possuía a noção sem a experiência, e conhecia o universo ignorando o
particular nele contido enganar-se-ia a muitas vezes no tratamento” (1999, p. 43). E assevera
também a experimentação como tendo um papel essencial na consolidação das ciências naturais a
partir do século XVII, quando ocorreu uma ruptura com o senso comum, onde se estabelecia que a
explicação para todos os fenômenos era simplesmente de natureza divina.
Conforme assinala Laburú (2006), a partir de experimentos apropriados torna-se possível
estimular o aluno em sala de aula e, consequentemente, engajá-lo no conteúdo a ser ensinado. O
autor acena preocupação com o experimento que é escolhido, que deve ser potencialmente
motivador (LABURÚ, 2006). Também concordamos que o experimento tenha um papel
fundamental em ativar a curiosidade dos alunos, mas isso também se coloca em um contexto mais
amplo da estratégia de ensino, envolvendo, além do experimento em si, a forma com que o mesmo é
trabalhado. Nesse sentido, a experimentação é um recurso que pode ser bastante explorado de
variadas formas.
Muitos professores e estudantes da área de ciências identificam a importância da
experimentação para a aprendizagem e alguns dos objetivos das aulas experimentais (GALIAZZI et
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al., 2001; GALIAZZI; GONÇALVES, 2004), mas o que ainda se nota, sobretudo nas escolas de
educação básica, é certa resistência na realização dessas atividades. Essa resistência está
concentrada, muitas vezes, no discurso da carência ou da deficiência de algo, além das deficiências
formativas para a condução desse tipo de prática e das condições de trabalho, especialmente tempo
para busca, seleção e preparo de propostas experimentais. Por outro lado, vale sublinhar que para
Assis et al. (2009), a não adesão às atividades experimentais também evidencia-se a partir da
relação com o saber profissional que alguns professores mantêm, que é de simples emprego, e não
de profissão. Nesse caso, as propostas alternativas de experimentação dificilmente farão eco nas
escolas.
De uma maneira geral, são duas as formas básicas com as quais a experimentação pode ser
trabalhada: ilustrativamente e investigativamente. Para Francisco Junior (2010, p. 205):
A experimentação ilustrativa, por vezes denominada demonstrativa, geralmente é
mais fácil de ser conduzida. Ela é empregada para demonstrar conceitos discutidos
anteriormente, sem muita problematização e discussão dos resultados
experimentais. O professor apresenta o problema, relacionando-o com outros
anteriores, e conduz a demonstração fornecendo informações do tipo “receita”. Já
experimentação investigativa, por sua vez, visa obter informações que subsidiem a
discussão, reflexão, ponderações e explicações, de forma que o aluno compreenda
não só os conceitos, mas a diferente forma de pensar e de se falar sobre o mundo
por meio da ciência.
A aula prática, se bem empregada, pode levar o aluno a confrontar o pensamento do senso
comum adquirido por meio de experiências cotidianas com o conhecimento científico, induzindo os
estudantes a ampliar seus conhecimentos, preparando-os para tomar decisões e ter pensamento
crítico diante da sociedade, conforme definido em documentos oficiais como a LDB (Lei de
Diretrizes e Bases) e sugerido nos PCN’s (Parâmetros Curriculares Nacionais). A LDB estabelece a
necessidade de
[...] preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar
aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas
condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores; o aprimoramento do
educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da
autonomia intelectual e do pensamento crítico; a compreensão dos fundamentos
científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a
prática, no ensino de cada disciplina. (LDB, Lei nº 9.394/96 art. 35°, § II, III,IV.)
Baseados nessa lei, os PCN’s reforçam a ideia de que
[...] a escola contribua para a constituição de uma cidadania de qualidade nova,
cujo exercício reúna conhecimentos e informações a um protagonismo responsável,
para exercer direitos que vão muito além da representação política tradicional:
emprego, qualidade de vida, meio ambiente saudável, igualdade entre homens e
mulheres, enfim, ideais afirmativos para a vida pessoal e para a convivência.
(BRASIL, 2000, p. 59)
Por meio da experimentação poderá também ser aberto um canal para que o professor saia
do tradicionalismo da sala de aula, contribuindo com a motivação e a curiosidade dos discentes
através de experimentos que tenham ligação direta com o cotidiano, proporcionando o
envolvimento mais próximo da química em sua vida. Assim, se faz necessário a prática de um
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ensino mais contextualizado, onde se pretende relacionar os conteúdos de química com o cotidiano
dos estudantes, respeitando as diversidades de cada um, visando à formação do cidadão e o
exercício de seu senso crítico.
Uma importante proposta para a experimentação é um trabalho que envolva o uso de
materiais alternativos, como por exemplo, um destilador feito com uma lâmpada e garrafa PET
(material usado na prática experimental apresentada nesse trabalho). Segundo Valadares (2001), a
inclusão de protótipos e experimentos simples em nossas aulas é fator decisivo para estimular os
alunos a adotar uma atitude mais empreendedora, permitindo rescindir a passividade que, em geral,
lhes é subliminarmente imposta nos esquemas tradicionais de ensino. É pautado nestas hipóteses
que neste trabalho mostraremos os resultados de uma aula experimental com materiais alternativos,
cujo tema é comum à maioria das pessoas. O intuito é também incentivar outros professores na
realização de atividades que, assim como esta, envolvam aspectos do dia-a-dia no ensino de
química.
Esta é uma ação que se desenvolve dentro do PIBID – Programa Institucional de Bolsa de
Iniciação à Docência – da Universidade Federal de Rondônia/UNIR. O PIBID foi criado pelo
governo federal, no ano de 2008, com a finalidade de contribuir para o aperfeiçoamento da
formação docente e para a melhoria da educação no país mediante o fomento da iniciação à
docência. Dentre os objetivos principais do Programa está a inserção dos futuros professores no
cotidiano das escolas da rede pública de educação. Condizente com uma proposta extensionista, o
PIBID busca integrar ações de pesquisa e ensino no cotidiano escolar. A construção, aplicação e
avaliação de propostas didáticas mediante colaboração entre pesquisadores, licenciandos e
professores foi um dos meios encontrados para o trabalho de extensão dentro do subprojeto de
Química.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A atividade foi conduzida com três turmas do primeiro ano do ensino médio da Escola
Estadual de Ensino Médio Major Guapindaia, localizada na cidade de Porto Velho, Rondônia.
Participou da atividade um total de 76 alunos. Inicialmente, foi feito um levantamento prévio de
algumas concepções acerca de processos de separação de misturas, a partir de uma situaçãoproblema (Quadro 1). O intuito foi analisar quais conhecimentos possuíam e se eram capazes de
aplicá-los numa situação-problema.
Quadro 1. Situação-problema apresentada para o levantamento das concepções prévias.
Joãozinho queria um café, então colocou água em uma chaleira e a pôs sobre o fogão para
esquentar. Assim que a água começou a ferver, Joãozinho colocou o pó de café e em seguida
despejou o café no coador. Quais os fenômenos (processos) físico-químicos você consegue
identificar no texto?
Em seguida, foi realizado o experimento que consistia no preparo de um “cafezinho” e sua
consequente destilação. De início, os estudantes misturaram o pó de café com a água quente,
agitando a mistura. Neste processo, tem-se a formação de uma mistura heterogênea, caracterizada
por mais de uma fase. Após algum tempo de repouso, a parte do sólido (café em pó) insolúvel na
água se deposita no fundo do recipiente, o que sinaliza o primeiro processo de separação
(decantação ou sedimentação). Após, a mistura passou por filtração simples (outro processo de
separação), a partir do qual é recolhida a solução de café (água + componentes solúveis do café em
pó). Ao fim, esta solução passou pelo processo de destilação simples. Neste, a parte sólida solúvel
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do café fica retida “balão de destilação” (lâmpada) e a água evapora sendo condensada em uma
mangueira de borracha (utilizada como condensador) e recuperada em um béquer (Figura 1). Em
outro experimento, uma parte da solução de café também foi aquecida em uma colher para a
discussão do processo de evaporação.
Nessa atividade propomos que através da preparação de um café fossem debatidos alguns
métodos de separação de misturas, tais como: decantação, filtração, evaporação e destilação. Para
isso, foram empregadas algumas vidrarias e um destilador feito com material alternativo
(BELTRAN; CISCATO, 1991), conforme ilustrado pela Figura 1.
Figura 1. Fotografia do aparato alternativo empregado para a destilação, com destaque para a solução de
café contida no “balão de destilação” (lâmpada) e a mangueira mergulhada em uma garrafa PET cheia de
água que foi empregada como condensador.
Para a realização dos experimentos, os alunos foram divididos em 6 grupos distribuídos
pelas seis bancadas do laboratório. Em cada uma das bancadas havia uma monitora do PIBID que
auxiliou na realização das atividades e nas discussões conceituais.
Após o experimento, foi solicitado aos estudantes que desenhassem e explicassem os
processos de separação discutidos com os experimentos. Os registros serviram como fonte de dados
para identificar as principais dificuldades e analisar a compreensão dos processos pelos alunos. A
análise dos registros produzidos pelos estudantes levou em conta a correção conceitual e a
linguagem com que expressaram suas ideias.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Para a análise do material escrito produzido a partir da situação-problema inicial, as
respostas foram enquadradas em três categorias que representam a correção conceitual: incorretas
(nenhum processo foi identificado adequadamente), sem incorreções (aquelas que apresentavam
pelo menos um dos três processos, evaporação, decantação e filtração identificados de forma
correta, mas nenhum explicado de forma incorreta) e parcialmente corretas (aquelas que
apresentavam a identificação do processo de forma adequada, mas continham alguma explicação de
forma equivocada). Os resultados estão apresentados na Figura 2.
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Figura 2. Distribuição das respostas conforme as categorias de correção conceitual.
Dos 76 alunos avaliados, 58 repostas se apresentaram sem incorreções, onde 34 alunos
identificaram três fenômenos (processos), a evaporação, a decantação e a filtração, 10 levaram em
conta a evaporação da água e a filtração, 12 alunos observaram a decantação e a filtração, 2 alunos
consideraram somente a filtração, conforme Figura 3.
Figura 3. Processos de separação identificados pelos dos alunos na análise prévia.
Onze alunos ainda apontaram a mistura da água com o pó de café como processo ocorrido,
incluindo também a filtração. Porém, afirmaram que a mistura seria homogênea, não explicando
quando isso teria ocorrido, se antes ou depois da filtração. Somente um dos alunos classificou a
mistura como heterogênea. Quatro alunos deram como resposta todos os processos de separação
apresentados. Três alunos apresentaram como respostas os processos de “destilação simples” e
“destilação fracionada” que não correspondiam à preparação de um café,uma vez que a destilação
realizada foi do tipo simples.
O que se pode perceber é que a maioria dos estudantes consegue identificar os processos
físico-químicos de separação presentes na preparação de um café. Contudo, menos da metade foi
capaz de identificar todos os processos e, embora não solicitado, uma parcela muito pequena
conseguiu explicá-los. Apesar de estes processos serem estudados em diferentes momentos da
educação escolar, com exemplos de suas aplicações (geralmente o tratamento de água), poucas
vezes os estudantes têm a oportunidade de vivenciar isso na prática. Quando têm de aplicar o
conhecimento a outro contexto, encontram dificuldades por não estarem habituados a tal tarefa.
Uma das formas de se avaliar a aprendizagem é, justamente, analisar como os indivíduos
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aplicam o novo conhecimento em uma situação-problema similar àquelas estudadas anteriormente,
porém, inédita. Isso exige utilizar aquilo que foi aprendido ao invés de reproduzir ideias ou conceitos.
A incapacidade de aplicar o conhecimento a um novo contexto, desde que a situação-problema não
esteja muito acima do nível cognitivo dos estudantes, indica, na maioria das vezes, que o
conhecimento não foi totalmente incorporado a ponto de ser utilizado pelo indivíduo. Essa questão
merece especial reflexão, uma vez que, na vida diária, somos chamados a mobilizar conhecimentos
para lidar com situações-problemas.
Após o levantamento dessas concepções, deu-se início ao experimento. Os estudantes se
mostraram bastante entusiasmados e curiosos, querendo saber o que iria ser feito. Primeiramente,
apresentamos a eles as vidrarias que seriam usadas, e em seguida foi efetuada a leitura em conjunto
do roteiro experimental (que receberem individualmente). Iniciaram o experimento com o processo
de decantação onde puderam observar o pó de café indo para o fundo do recipiente. Após, iniciaram
a filtração na qual verificaram a separação das partículas sólidas (pó de café) da parte homogênea
(solução de café).
Os processos de evaporação e de destilação foram conduzidos de forma demonstrativa por
medida de segurança, sendo explicado passo a passo o que ocorria em cada processo. Foi notável a
expressão dos estudantes ao verem toda a água da solução de café sendo recuperada através da
destilação, e também quando viram o pó de café extraído da solução, ou pela evaporação ou pela
destilação.
A discussão dos experimentos foi conduzida pelas monitoras nas bancadas, buscando
sempre a explicitação e problematização das observações dos estudantes. A proposta foi partir dos
aspectos fenomenológicos palpáveis para, em seguida, buscar a interpretação em nível
microscópico. Jonhstone (2000), por exemplo, vem apontando como fundamental essa relação entre
os três níveis de realidade do conhecimento químico. Aprender química exige relacionar esses
níveis de compreensão, o que não é tão simples de ser realizado e pouco difundido entre aqueles
que fazem educação científica. É necessário integrar o macroscópico (observação de fenômenos
naturais) ao microscópico ou nanoscópio (nível no qual ocorrem as interações e modificações
atômico-moleculares) e ao simbólico (onde há representações de moléculas, átomos e íons para a
interpretação dos níveis microscópico e macroscópico).
Após, foi solicitado aos estudantes uma atividade avaliativa em que deveriam desenhar e
explicar os processos, demonstrando o que entenderam. A análise dessa atividade avaliativa seguiu
os seguintes critérios:
• Tipos de representações presentes no desenho;
• Correção conceitual;
• Emprego de terminologia adequada.
A solicitação por desenhos vem ao encontro de trabalhos recentes os quais estão debatendo
os benefícios de representações multi-modais na aprendizagem científica. Waldrip et al. (2006)
acenam sobre a necessidade de investigações que considerem a mudança entre diferentes modos de
representação para a compreensão do conhecimento científico. A representação por meio de
desenhos permite promover reflexões professor-estudante, abrindo diálogos para que os problemas
conceituais e dificuldades de compreensão do aprendiz possam emergir e serem trabalhadas
(FRANZONI et al., 2011).
Todas as avaliações (76) estavam representadas por desenhos, porém, poucos se referiam ao
nível microscópico. Apenas 4 tentaram representar os processos em nível microscópico. Na Figura
4 temos um dos desenhos apresentados.
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Figura 4. Desenho feito por um aluno para a representação em nível microscópico.
Como pode ser observado, o estudante emprega o modelo particulado para representar o
processo de dissolução e filtração durante a preparação do café. Há o cuidado em representar a água
e o café de maneira diferente. Pode ser visto que a maior parte das partículas do café é retida no
filtro, enquanto na solução (partículas que passam pelo funil) as partículas de água predominam. É
possível notar, nesta situação, que embora de maneira simplificada, há a incorporação de questões
atinentes ao nível microscópico para explicar o processo, o que constitui a base do pensamento
químico, sendo este um indicativo de aprendizagem. Todavia, a grande maioria (72 estudantes de
um total de 76) não usou representações em nível microscópico, apesar da ênfase nesta questão
durante a discussão dos resultados experimentais. Os estudantes, em geral, demonstram dificuldades
em empregar o modelo particulado da matéria para explicar fenômenos químicos (NAKHLEH,
1994).
Das 76, somente 15 respostas estavam completamente corretas, 16 estavam completamente
erradas, onde 10 descreviam as etapas do procedimento e 6 apresentavam confusão entre os
conceitos. Os erros mais frequentes foram atinentes ao processo de decantação. Neste, os estudantes
consideraram a decantação como sendo a mistura de água e pó de café (Figura 5). Outro erro muito
comum foi o uso inadequado de expressões e/ou da linguagem científica.
Figura 5. Explicação do processo de decantação apresentado por um dos participantes ao final da atividade.
Na Figura 6, o estudante, ao se referir à solução de café (água e compostos extraídos do pó)
a denomina de água. Na realidade, o que se tem após a extração e solubilização de alguns
compostos do pó café não é água, mas sim uma solução.
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Figura 6. Explicação do processo de filtração apresentado por um dos participantes ao final da atividade.
A dificuldade que os alunos têm em identificar a diferença entre solução e substância pura
ficou bastante clara em muitas das respostas. Tais dificuldades estão associadas a explicações que
enfatizam os aspectos perceptíveis do processo, como também reportam Carmo e Marcondes (2008)
em trabalho que envolveu o tema soluções. Como já salientado em outro momento, compreender
química exige a interpretação dos aspectos perceptíveis (macroscópicos) a partir de modelizações
mentais, isto é, da imaginação de como ocorrem os fenômenos em nível microscópico. As
dificuldades na construção de noções mais complexas em relação a esse tema poderiam estar
ligadas a não articulação dos conceitos prévios pelo aluno e à ausência de visão microscópica
durante o processo de ensino. Ainda que esta atividade tenha buscado a ênfase da visão
microscópica, essa é uma habilidade que se desenvolve gradativamente.
Não podemos deixar de salientar a destilação, na qual poucos alunos souberam explicar o
processo de maneira correta. Devemos ainda considerar as respostas que estão parcialmente corretas
(aquelas que estavam com as respostas incompletas, ou seja, não apresentaram todos os processos
de separação abordados no experimento ou que continham alguma delas explicada de forma
incorreta), que foram 45 ao todo. Na Tabela 1 é apresentado o número total de respostas adequadas
distribuídas para cada processo de separação.
Tabela1. Número de respostas certas para cada um dos processos de separação envolvidos.
DECANTAÇÃO
FILTRAÇÃO
EVAPORAÇÃO
DESTILAÇÃO
42
43
36
25
Quanto à terminologia, os resultados são apresentados na figura a seguir:
Figura 7: Número de vezes em que as terminologias foram empregadas adequadamente pelos alunos em
cada processo de separação.
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A Figura 7 mostra que maior parte os alunos (10) usou termos adequados ao descreverem o
processo de filtração; 7 tiveram melhor desempenho quanto aos termos corretos ao explicarem o
processo de evaporação; 4 estudantes explicaram com êxito o processo de decantação e somente 3
explicaram a destilação utilizando terminologia adequada. Os demais alunos que explicaram de
maneira correta não usaram termos científicos em suas explicações, desenvolvendo linguagem
própria que se aproximam da linguagem cotidiana. A Figura 8 mostra a explicação para dois
processos.
Figura 8. Explicação dos processos de decantação e filtração apresentada por um dos participantes.
Pode ser notado que a explicação do processo de filtração, embora adequado, contém uma
linguagem mais próxima da cotidiana. É importante que os estudantes sejam instruídos sobre a
diferença das linguagens científica e cotidiana, aprendendo quando e como empregá-las, o que pode
ser conduzido aproveitando-se as próprias expressões utilizadas. Apesar de este não ter sido o
enfoque da pesquisa, nota-se a importância dessa questão.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Analisando os resultados é possível concluir que a maior parte dos estudantes soube
identificar os processos ocorridos na preparação de um café quando colocados diante de uma
situação-problema. Porém, na atividade final, boa parte ainda não soube explicar os processos
adequadamente, principalmente o processo de destilação, provavelmente por este não fazer parte do
dia-a-dia dos alunos. Muitos descreveram as etapas do experimento, não se preocupando em
explicar os processos ali presentes. Infiltrar a química no cotidiano do aluno é uma tarefa que ainda
necessita de muitos esforços.
Ainda que possam ter estudado muitos destes processos, raras são as ocasiões em que os
estudantes experienciam esses fenômenos. Atividades com materiais presentes no cotidiano podem
ser uma forma de aproximar os estudantes de fenômenos que, em geral, passam
desapercebidamente por eles, mas cuja compreensão exige conhecimentos científicos. Isso pode
atuar favoravelmente no aumento de interesse pelos temas científicos.
Também se observou que praticamente todas as explicações ficaram em aspectos
observáveis. A dimensão microscópica, fundamental para a compreensão destes e de outros
fenômenos da química, ainda é intangível para a maioria. Apesar da dificuldade, é fundamental se
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atentar a tal questão. O trabalho com desenhos e animações pode ser de grande valia para auxiliar o
raciocínio imaginativo dos estudantes, melhorando assim a compreensão que têm da química e de
outras ciências.
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