Ciência Rural
ISSN: 0103-8478
[email protected]
Universidade Federal de Santa Maria
Brasil
Riddell Millar, Patricia; Daguer, Heitor; Trigueiro Vicente, Regiane; da Costa, Tatiana; Lustoza de
Carli, Alexandre; Gatti Sobreiro, Leila; Reis Amendoeira, Maria Regina
Soroprevalência de anticorpos anti-Toxoplasma gondii em trabalhadores de um matadouro de suínos
e em indivíduos com outras atividades na cidade de Palmas, Paraná, Brasil
Ciência Rural, vol. 37, núm. 1, janeiro-fevereiro, 2007, pp. 292-295
Universidade Federal de Santa Maria
Santa Maria, Brasil
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Ciência
292 Rural, Santa Maria, v.37, n.1, p.292-295, jan-fev, 2007
Millar et al.
ISSN 0103-8478
Soroprevalência de anticorpos anti-Toxoplasma gondii em trabalhadores de um
matadouro de suínos e em indivíduos com outras atividades
na cidade de Palmas, Paraná, Brasil
Seroprevalence of anti-Toxoplasma gondii antibodies in workers of a swine
slaughterhouse and in individuals with other activities in the
city of Palmas, Paraná, Brazil
Patricia Riddell MillarI Heitor DaguerII Regiane Trigueiro VicenteIII
Tatiana da CostaIII Alexandre Lustoza de CarliIV Leila Gatti SobreiroV
Maria Regina Reis Amendoeira III
- NOTA RESUMO
ABSTRACT
O risco de infecção por Toxoplasma gondii em
trabalhadores de um frigorífico de suínos em Palmas, Paraná,
Brasil, foi estudado comparativamente a outros indivíduos
que não mantinham contato com animais e suas carcaças. As
174 amostras de soros foram divididas em dois grupos: grupo 1
- funcionários de um matadouro-frigorífico de suínos (133) e
grupo 2 - controle (41). No ato da coleta, todos os participantes
responderam a um questionário epidemiológico com as
seguintes variáveis: sexo, idade, contato com gatos e solo,
hábito de ingerir carne crua ou mal cozida, embutidos crus e
leite cru. Todas as amostras de soros foram submetidas aos
testes ELISA (Enzyme linked immunosorbent assay) e RIFI
(Reação de imunofluorescência indireta) - IgG anti-T. gondii;
por sua vez, para IgM anti-T. gondii, foi utilizada a RIFI.
Todos os 174 indivíduos eram IgM soro não-reagentes. No
grupo 1, 48,1% eram IgG sororreagentes na RIFI e 58,6% na
ELISA. No grupo 2, 39,0% eram IgG sororreagentes na RIFI
e 51,2% na ELISA. Não foram observadas diferenças
estatisticamente significativas entre os grupos 1 e 2 em todas
as variáveis, com exceção de “contato com gatos”, para o
grupo 1, e de “ingestão de leite cru”, para o grupo 2, que
foram estatisticamente significativas. Os resultados sugerem
que a manipulação de carcaças (cistos) não deve ter sido o
único mecanismo de infecção envolvido na alta freqüência de
sororeagentes na população estudada, embora possa ter
contribuído na transmissão do parasita como fator de risco,
assim como o contato com solo contaminado ou com gatos
(oocistos).
The risk of Toxoplasma gondii infection in workers
of a swine slaughterhouse in Palmas, Paraná, Brazil was
compared to other individuals not exposed to these animals
and its carcasses. The 174 serum samples were divided in two
groups: group 1 - slaughterhouse workers (133), and group 2
- control (41). During blood sampling, workers answered an
epidemiological questionnaire with the following variables:
sex, age, contact with cats and soil, habit of eating raw or
poorly cooked meat, sausages and raw milk. Serum samples
were tested for IgG antibodies anti-T. gondii by enzyme-linked
immunosorbent assay (ELISA) and indirect fluorescent antibody
test (IFAT) and to the investigation of IgM antibodies anti-T. gondii
by IFAT. All the 174 individuals examined were not IgM reacting.
In the first group, 48.1% were IgG seroreacting by IFAT and
58.6% by ELISA. In the second group, 39.0% were IgG
seroreacting in the IFAT and 51.2%. by ELISA. No statistically
significant difference was found between groups 1 and 2 among
the majority of the variables, except for the “contact with cats”
in group 1 and “raw milk ingestion” in group 2. The results
suggest that ingestion of cysts as a consequence of carcass
manipulation probably was not the only mechanism involved
in the high frequency of reactive serum in the studied population,
although it should have contributed in the transmission of the
parasite as risk factor, as well as contact with contamined soil
or with cats (oocysts).
Palavras-chave: toxoplasmose; matadouro de suínos;
soroprevalência, fatores de risco.
Key
words:
toxoplasmosis; swine slaughterhouse;
seroprevalence; risk factors.
I
Programa de Pós-graduação em Higiene Veterinária e Processamento Tecnológico de Produtos de Origem Animal, Universidade
Federal Fluminense (UFF), Niterói, RJ, Brasil.
II
Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Serviço de Inspeção Federal, Curitiba, PR, Brasil.
III
Laboratório de Toxoplasmose, Departamento de Protozoologia, Instituto Oswaldo Cruz-FIOCRUZ, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Av Brasil 4365, 21045-900, Manguinhos, RJ. E-mail: [email protected].
IV
Laboratório Gram – Análises Clínicas, Palmas, PR, Brasil.
V
Departamento de Saúde Coletiva Veterinária e Saúde Pública, Faculdade de Veterinária, Universidade Federal Fluminense (UFF),
Niterói, RJ, Brasil.
Ciência Rural, v.37, n.1, jan-fev, 2007.
Recebido para publicação 28.11.05 Aprovado em 26.07.06
Soroprevalência de anticorpos anti -Toxoplasma gondii em trabalhadores de um matadouro de suínos...
A toxoplasmose, zoonose de distribuição
mundial causada pelo Toxoplasma gondii, tem como
hospedeiros o homem e outros animais de sangue
quente. A infecção humana por T. gondii pode ocorrer
após o nascimento, principalmente pelo consumo de
carne crua/mal cozida contendo cistos teciduais, bem
como por alimentos e águas contaminadas pelos
oocistos (AMENDOEIRA et al., 1999). A
soroprevalência anti-T. gondii mais elevada entre os
trabalhadores de frigoríficos do que na população em
geral sugere que o manuseio de carcaças e vísceras
também representa um risco de infecção (ISHIZUKA,
1978; SOUZA, 1995; HORIO et al., 2001).
Com o objetivo de contribuir para o estudo
epidemiológico da infecção por T.gondii na cidade de
Palmas, Paraná, estudou-se a soroprevalência em
trabalhadores de um matadouro-frigorífico de suínos,
comparando-a à encontrada em profissionais com
atividades não relacionadas com os animais e suas
caraças (grupo controle).
Dos 174 indivíduos estudados, 133 eram
trabalhadores de um matadouro-frigorífico de suínos
sob inspeção federal (grupo 1) e 41 pertenciam a um
grupo controle (grupo 2). Todos responderam a um
questionário epidemiológico com as variáveis: sexo,
idade e hábitos e costumes (contato com gatos e com
solo, hábito de ingerir carne crua/mal cozida, embutidos
crus e leite cru). O período de estudo foi de novembro
de 2004 a fevereiro de 2005.
Para a detecção de IgG anti-T. gondii, foram
utilizadas técnicas de imunoensaio enzimático - ELISA
(VOLLER et al., 1976) e reação de imunofluorescência
indireta RIFI (CAMARGO, 1964), também utilizada para
IgM. Utilizou-se antígeno de taquizoítas da cepa RH
de T. gondii. Para RIFI, os soros, foram diluídos ao
quádruplo (de 1:16 até 1:4096), sendo considerados
positivos os títulos iguais ou superiores a 16; para
ELISA, leituras iguais ou superiores ao valor de cutoff da placa foram consideradas.
A avaliação da concordância real entre as
técnicas sorológicas foi feita pelo índice de
concordância ajustada kappa (k). Para a análise das
variáveis e da freqüência da infecção, utilizou-se o quiquadrado (χ2), com 5% de significância (MOORE, 2000).
No grupo 1: 48,1% era IgG sororreagente
na RIFI e 58,6% na ELISA. No grupo 2, 39,0% eram
IgG sororreagentes na RIFI e 51,2% na ELISA.
Observou-se um índice de concordância bom entre as
duas técnicas (κ = 0,79 para o Grupo 1 e κ = 0,75 para o
Grupo 2). Considerando-se os soros IgG reagentes para
ELISA e/ou RIFI, observou-se positividade de 58,6%
para o grupo 1 e de 51,2% para o grupo 2, não sendo
estatisticamente significante a diferença entre eles (χ2
= 0,7; P>0,05). Todos os 174 indivíduos examinados
eram IgM não-sororreagentes.
293
O encontro da freqüência mais elevada de
sororreagentes entre magarefes de matadouros de
suínos, utilizando RIFI, em relação a outras atividades,
também tem sido relatado por outros autores, em
diferentes regiões. No entanto, são observadas
discordâncias. Em São Paulo, ISHIZUKA (1978)
observou diferença estatisticamente significante entre
a prevalência de IgG anti-T. gondii em magarefes e no
grupo controle, enquanto SOUZA (1995), no Rio de
Janeiro, tal como no presente trabalho, não obteve
diferença estatisticamente significativa entre os dois
grupos.
Nos grupos 1 e 2, prevaleceram títulos
baixos, sendo 64 o mais freqüente (51,6%, grupo 1 e
62,5%, grupo 2). Os maiores títulos foram 256 no grupo
1 (9,4%) e 1.024 (6,3%) no grupo 2, sugerindo infecção
crônica. SOUZA (1995) e DAGUER et al. (2004) também
encontraram baixos títulos e ausência de infecção
aguda em magarefes.
Na tabela 1, estão representadas as
distribuições das variáveis segundo a freqüência da
infecção por T. gondii. Considerando-se o sexo (grupo
1: χ2 = 0,089, P>0,05 e grupo 2: χ2 = 0,620; P>0,05) e
idade (grupo 1: χ2 = 4,80; P>0,05 e grupo 2: χ2 = 2,07;
P>0,05), não foram observadas diferenças significantes,
o que está de acordo com SOUZA (1995) e DAGUER
et al. (2004).
O solo tem sido considerado, em algumas
regiões, como uma importante fonte de infecção por T.
gondii, por meio de oocistos (SPALDING et al., 2005).
No entanto, na amostra estudada, em ambos os grupos,
a relação entre essa variável e a freqüência de
sororreagentes não foi estatisticamente significante
(grupo 1: χ2 = 1,23; P>0,05 e grupo 2: χ2 = 1,27; P>0,05).
Por outro lado, pelo menos no grupo 1, a variável
contato com gatos, na qual a mesma forma do parasita
está envolvida na transmissão, provavelmente teve
um papel mais relevante, uma vez que havia uma maior
freqüência de sororreagentes entre os que tinham
contato com estes animais (75%) do que entre os que
não tinham (54,3%), sendo esta diferença
estatisticamente significativa (χ2 = 3,91; P<0,05). O
mesmo não ocorreu no grupo 2, onde ocorreu maior
freqüência de sororreagentes entre os que não tinham
contato com gatos, embora não fosse estatisticamente
significante (χ2 = 1,26; P>0,05).
Ainda que a ingestão freqüente de carne
crua/mal cozida seja considerada um fator de exposição
importante (NAVARRO et al., 1992; AMENDOEIRA,
1999; SPALDING et al., 2005), não foi um resultado
estatisticamente significativo, tanto no grupo 1 (χ2 =
1,44; P>0,05), quanto no grupo 2 (χ2 = 1,89; P>0,05). O
Ciência Rural, v.37, n.1, jan-fev, 2007.
294
Millar et al.
Tabela 1 – Distribuição dos indivíduos dos grupos frigorífico e controle reagentes ou não a anticorpos IgG anti-T. gondii nas técnicas de
imunoensaio enzimático (ELISA) e/ou de reação de imunofluorescência indireta (RIFI), de acordo com as variáveis sexo, faixa
etária, contato com solo e gatos, hábito de ingerir carne crua/ mal cozida, embutidos crus e leite cru.
Grupo 1 (frigorífico)
Variável
Reagentes
% (n)
Não Reagentes
% (n)
Grupo 2 ( controle)
Total
% (n)
Reagentes
% (n)
Não Reagentes
% (n)
Total
% (n)
Sexo
Masculino
Feminino
59,5 (53)
56,8 (25)
40,5 (36)
43,2 (19)
100,0 (89)
100,0 (44)
55,6 (15)
42,9 (06)
44,4 (12)
57,1 (08)
100,0 (27)
100,0 (14)
Faixa etária
≤30
31-39
≥40
51,7 (30)
57,2 (28)
76,9 (20)
48,3 (28)
42,8 (21)
23,1 (06)
100,0 (58)
100,0 (49)
100,0 (26)
40,9 (09)
62,5 (05)
63,6 (07)
59,1 (13)
37,5 (03)
36,4 (04)
100,0 (22)
100,0 (08)
100,0 (11)
Contato com solo
Sim
63,6 (42)
46,4 (24)
100,0 (66)
61,1 (11)
38,9 (07)
100,0 (18)
53,7 (36)
46,3 (31)
100,0 (67)
43,5 (10)
56,5 (13)
100,0 (23)
Contato com gatos
Sim
Não
75,0 (21)
54,3 (57)
25,0 (07)
45,7 (48)
100,0 (28)
100,0 (105)
36,4 (04)
56,7 (17)
63,6 (07)
43,3 (13)
100,0 (11)
100,0 (30)
Ingestão de carne
crua ou mal cozida
Sim
Não
65,3 (32)
54,8 (46)
34,7 (17)
45,2 (38)
100,0 (49)
100,0 (84)
40,0 (08)
61,9 (13)
60,0 (12)
38,1 (08)
100,0 (20)
100,0 (21)
Ingestão de embutidos
Sim
Não
59,7 (71)
50,0 (07)
40,3 (48)
50,0 (07)
100,0 (119)
100,0 (14)
48,2 (13)
57,1 (08)
51,8 (14)
42,9 (06)
100,0(27)
100,0 (14)
Ingestão de leite cru
Sim
Não
39,6 (19)
46,8 (59)
39,6 (19)
28,6 (36)
100,0 (38)
100,0 (95)
20,8 (10)
8,7 (11)
0,0 (00)
15,9 (20)
100,0 (10)
100,0 (31)
Não
hábito de ingerir embutidos crus não apresentou
relação estatisticamente significante com a freqüência
de soropositivos, tanto no grupo 1 (χ2 = 0,39; P>0,05),
quanto no Grupo 2 (χ2 = 0,27; P>0,05). No entanto,
SPALDING et al. (2005) relataram que a ingestão de
embutidos artesanais provavelmente estaria envolvida
na transmissão da protozoose em Erechim.
A freqüência de reagentes no grupo 1, com
relação à ingestão de leite cru, não foi estatisticamente
significativa (χ2 = 1,64; P>0,05), ao contrário do grupo 2
(χ2 = 12,6; P>0,05). Sendo assim, o papel dessa variável
na transmissão da infecção do T. gondii pode ter sido
mais significativo para o grupo 2, sugerindo que o
grupo 1 estaria exposto a outros fatores com igual
importância, como ao contato com as carcaças.
A ingestão de cistos de T. gondii por meio
da manipulação de carcaças não deve ter sido o único
mecanismo de infecção que contribuiu para o aumento
da freqüência de sororreagentes, embora possa ter
contribuído para a transmissão do parasita. Do mesmo
modo, a ingestão de oocistos pelo contato com solo
contaminado ou com gatos também podem ter
contribuído para o aumento da frequência de
sororreagentes, tendo o contato com estes felinos se
mostrado significativo.
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Ciência Rural, v.37, n.1, jan-fev, 2007.
Soroprevalência de anticorpos anti -Toxoplasma gondii em trabalhadores de um matadouro de suínos...
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HORIO, M. et al. Risk of Toxoplasma gondii infection in
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Kitakyushu, v.23, n.3, p.233-243, 2001.
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