Autoridades queixam-se de que cibercrime está preso num emaranhado legislativo José Bento Amaro e Maria José Oliveira Falta criar órgão coordenador e reforçar os meios repressivos, mas já existe um sistema informático que ilude os criminosos • Portugal não tem uma visão estratégica aprovada nem um órgão capaz de coordenar todos os serviços necessários para combater o cibercrime. A ideia foi expressa ontem pelo general Carlos Chaves, assessor do primeiroministro, Pedro Passos Coelho, para os assuntos de segurança nacional. No decurso da conferência O Desafio da Cibersegurança, realizada no Centro Cultural de Belém, em Lisboa, outras entidades ligadas ao meio judicial, policial e académico acabaram por apontar um sem-número de falhas no sistema, as quais poderão potenciar o aumento do crime. As boas notícias são as que dão conta de que o Conselho de Ministros já deu aval positivo para a criação de um Centro Nacional de Cibersegurança, e que um investigador português criou um sistema que permite aos crimino- viajarem num ambiente fictício, pensando, no entanto, que estão a piratear um sítio real. "O aumento das ameaças tem sido ignorado", disse Esteves Veríssimo, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa. "É necessária uma coordenação integrada entre forças policiais e prestadores de serviços", referiu a directora do Departamento de Investigação e Acção Penal de Lisboa, Maria José Morgado. "A actual legislação é uma manta de retalhos", afirmou o inspector-chefe Rogério Bravo, da Polícia Judiciária. Seja qual for o quadrante, todos se queixam do actual estado legislativo ou investigatório relativo ao cibercrime. Os números deste tipo de criminalidade em Portugal não são, para já, conhecidos. Sabe-se, no entanto, que podem incluir casos como os recentes ataques (actos criminosos, como prefere dizer Rogério Bravo) a sos portais do Governo, ou a divulgação de pornografia infantil, o branqueamento de capitais, a difamação ou até o terrorismo. "O DIAP de Lisboa vive uma situação de privilégio", disse Maria José Polémica "atenuada" Morgado quando se reportava à existência de um magistrado especializado no cibercrime. É que nos restando país não existe tes departamentos ninguém habilitado no desempenho dessas tarefas. A solução passa, sempre, pelo recurso aos investigadores da PJ, mas estes, de acordo com a procuradora, também têm "carência de meios humanos e materiais". Partindo do princípio de que "o medo é que guarda a vinha", Maria José Morgado entende que no futuro terá como vertentes a cibersegurança fundamentais "a prevenção, a recolha e análise de dados, a investigação criminal e a repressão", ao mesmo tempo que classifica este tipo de criminalidade como "agressiva, perigosa, volátil e global". Enquanto o Governo não estabelece futuras regras, parcerias e tempos de actuação, é o engenheiro Manuel Honorato, do Centro de Gestão da Rede Informática do Governo, quem avança com uma boa nova: após dez meses de investigações e estudos, foi possível criar um sistema informático que leva o criminoso a pensar estar dentro de um ambiente verdadeiro quando, na verdade, se encontra num artificial e onde os seus actos não causam qualquer dano. "O indivíduo está numa espécie de jardim zoológico, mas pensa que se encontra na selva. Os danos que pretende causar não vão está ser notados e, em contrapartida, a ser identificado para poder vir a ser as processado." 0 secretário-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa (SIRP), Júlio Pereira, considerou ontem que as polémicas que envolvem os serviços secretos estão mais "atenuadas". Durante uma pausa na conferência 0 Desafio da Cibersegurança, realizada ontem no Centro Cultural de Belém, o responsável, questionado sobre o caso das alegadas irregularidades nas secretas, afirmou: "Felizmente parece estar mais atenuado." E quando o Correio da Manhã lhe perguntou se dormia descansado, respondeu: "Durmo bem. Nunca dormi muito."