PRÁTICAS DE ENSINO DE MATEMÁTICA: ESPAÇO E TEMPO DE INTEGRAÇÃO COM O ESTÁGIO SUPERVISIONADO, O PIBID E O OBEDUC Vivilí Maria Silva Gomes Universidade Federal do ABC-UFABC Resumo Neste trabalho relata-se a experiência de docência no ensino superior que se constitui num processo de pesquisa da prática docente com abordagem qualitativa e observação participante. A investigação ocorreu no contexto da componente curricular Práticas de Ensino de Matemática no Ensino Fundamental do Curso de Licenciatura em Matemática da UFABC. Teve como objetivos, acompanhar o processo de construção do conhecimento dos discentes, por meio de sua participação ativa, a avaliação contínua, as narrativas por eles produzidas sobre o processo e inserí-los num processo colaborativo com professoras da rede de ensino público da região do ABC, SP, participantes do Projeto Observatório da Educação-OBEDUC. Alguns dos discentes também participavam do PIBID e do Estágio Supervisionado do Curso de Licenciatura em Matemática. Os caminhos trilhados partiram de propostas iniciais da docente pesquisadora que eram acolhidas e discutidas em sala de aula pelos discentes que as juntavam com suas próprias ideias, as reorganizavam e encaminhavam no sentido de desenvolver atividades de estudo que se desdobravam por caminhos individuais, em grupos e no coletivo. As ações propostas eram apresentadas e discutidas semanalmente no coletivo da sala, e também fora da sala, por meio das rodas de conversa e rede social, pelas exposições de seus estudos individuais ou em pequenos grupos, pela dramatização de situações de sala de aula imaginadas, registradas em seus portfólios e reavaliadas. Um processo contínuo de construção do conhecimento discente de forma colaborativa e mediado pela docente, culminando na elaboração e execução de sequências didáticas que foram trabalhadas com alunos da escola pública na UFABC ou adaptadas ao currículo das salas de aula das professoras participantes do Projeto OBEDUC. A integração entre as salas de aula universitária e de educação básica concretizou a articulação necessária entre teoria e prática por meio da colaboração já na formação inicial. Palavras-Chave: trabalho colaborativo, práticas de Matemática, Ensino Fundamental. Contextualização Este trabalho situa-se no contexto da componente curricular Práticas de Ensino de Matemática no Ensino Fundamental-EF que foi ministrada pela pesquisadora no período matutino no ano de 2013 e no período noturno no ano de 2014, cujas turmas para efeito de organização são aqui denominadas T13 e T14, respectivamente. As aulas com carga horária de 4h semanais ocorreram no Laboratório de Práticas de Ensino de 2 Matemática e Cognição-LAPEMC, mostrado na Figura 1. O LAPEMC possui infraestrutura para a realização de aulas teóricas e práticas, com recursos materiais como equipamento multimídia, lousa digital, bancadas com computadores com acesso livre à internet e aos softwares neles disponibilizados, além de material didático variado para o ensino de Matemática, tanto na forma de livros didáticos e paradidáticos e outras propostas curriculares, podendo comportar em torno de 25 alunos para aulas práticas. A turma T13 teve 11 alunos dos quais dois se interessavam pela Licenciatura em Matemática. Dois dos alunos desta turma também eram bolsistas do subprojeto de Matemática do PIBID. A turma T14 teve 19 alunos dos quais 5 estavam interessados na Licenciatura em Matemática, sendo 4 alunos bolsistas do PIBID e uma aluna bolsista do OBEDUC e também aluna de Estágio Supervisionado do Curso. O Projeto Político Pedagógico-PPP da UFABC (2006) permite que em uma mesma sala de aula encontrem-se alunos com interesse por diversas áreas do conhecimento, provindos dos cursos específicos ou dos dois bacharelados interdisciplinares obrigatoriamente cursados por todos os alunos ao ingressarem na Universidade. Essa heterogeneidade proporciona um ambiente de sala de aula rico para o processo de aprendizagem contando com contribuições individuais que se mesclam ao conhecimento epistemologicamente construído. Tendo como pressuposto básico a articulação entre formação, pesquisa e extensão, a docente procura a construção de uma ação de sala de aula que respeite a diversidade do grupo de alunos e seus referenciais culturais dentro dos pressupostos etnomatemáticos (D’Ambrósio, 2001; Knijnik, Wanderer, Duarte e Giorgio, 2012) e que propicie a reflexão, pautada no modelo de professor pesquisador em direção a sua autonomia (Freire, 1996; Contreras, 2012). O lugar ocupado pela docente no processo foi de organizadora das ações didáticas iniciais ao longo dos encontros, animadora e mediadora a cada momento em que se fizesse necessária, quando os rumos se afastassem das problematizações e ações acordadas no grupo e quando os impasses surgissem de forma a interferir no andamento das ações coletivas. Essa posição está relacionada às convicções e concepções da pesquisadora e que levam às suas escolhas teórico-metodológicas no campo da educação e da educação matemática para a fundamentação e mediação das trilhas percorridas. Esse processo é, assim, guiado por uma postura da pesquisadora observadora participante em sintonia com as abordagens qualitativas apresentadas para pesquisa educacional por Lüdke & André (2013) e Lüdke (2001), onde a docente entra no processo como participante, com um olhar mais 3 observador que interventor, que colhe e recolhe os dados, sem preocupação com categorizações e critérios analíticos à priori. Buscando assumir uma postura na qual acredita ser mais mediadora que interventora, a pesquisadora procura instigar os discentes a também assumir tal postura em aula e em suas produções, a fim de que possam compreendê-la e a trabalha-la em si e incorporá-la em seu trabalho como professores de Matemática no EF futuramente. Essa postura metodológica de pesquisa, que é também de docência reflexiva e crítica que compunha o repertório da pesquisadora-docente em suas práticas como professora da Educação Básica, se transfere para o ensino superior nos moldes da pesquisa-ação que se delineia nos estudos de Thiollent (2004) e na visão de autonomia e emancipação dos professores descritos por Contreras (2010) Neste artigo nos concentramos no processo de integração de ações que ocorrem no campo acadêmico da UFABC no âmbito da componente curricular Práticas de Ensino de Matemática no EF por meio dos elementos humanos, projetos e programas advindos de experiências de outros espaços-tempos e que adentram a sala de aula universitária e se vinculam a sala de aula da Educação Básica, a saber: - a docente que num determinado espaço-tempo foi professora da Educação Básica, que é colaboradora de dois projetos de pesquisa OBEDUC em vigência na UFABC e coordenadora de área do subprojeto interdisciplinar do PIBID. - as alunas do Curso de Licenciatura em Matemática no contexto do Estágio Supervisionado. - as alunas bolsistas dos Projetos OBEDUC. - os alunos e as alunas do PIBID. Também expomos de forma breve os resultados obtidos nas duas turmas consideradas, T13 e T14, relativos às produções e os trabalhos desenvolvidos posteriormente com alunos da rede pública de ensino. Integração com o Estágio Supervisionado A interlocução entre a T13 e a turma de alunos de uma Escola Estadual nos arredores da UFABC se deu por intermédio de uma aluna estagiária que conhecia uma das professoras de Matemática da Escola. A aluna e a professora articularam a vinda de uma turma de 28 alunos com dificuldades de aprendizagem para a UFABC com quem os alunos da T13 trabalharam o Projeto Interdisciplinar-PI elaborado ao longo do quadrimestre. A aluna bolsista de um dos Projetos OBEDUC, também estagiária e 4 pertencente a T14, utilizou algumas das atividades da Sequência Didática-SD proposta pela T14 nas salas de estágio com as quais teve contato. Integração com o Projeto OBEDUC A aluna bolsista mencionada acima integrou seus estudos do Projeto OBEDUC relacionados a jogos, em especial a Torre de Hanói (Piaia, Henriques-Santos e Gomes, 2014), desenvolvido em Práticas de Ensino de Matemática I (voltada par o Ensino Médio) e as atividades da T14 contribuindo muitíssimo para a montagem de várias intervenções didáticas. Uma das alunas da T13, estudante do Curso de Neurociência, também bolsista do outro Projeto OBEDUC aqui mencionado pode fazer relações entre esses espaços de aprendizagem e demonstrá-los em suas produções. Integração com o PIBID Na T13, dois alunos pertenciam ao subprojeto de Matemática do PIBID sendo que um deles ainda atua no mesmo subprojeto dentro do PIBID vigente. Esse último foi aluno da escola pública que participou da oficina ministrada pela T13. Por diversas vezes nas rodas de conversa feitas nas aulas, puderam contribuir com suas experiências de PIBID para as reflexões e as propostas de intervenções didáticas elaboradas. A T14 possuía 4 bolsistas do PIBID do subprojeto de Matemática, os quais puderam trazer reflexões sobre a sua prática no Programa e também levar contribuições das reflexões feitas nas rodas de conversa para suas ações de PIBID. As atividades elaboradas coletivamente pelas turmas T13 e T14 Os caminhos trilhados partiram de propostas iniciais da docente pesquisadora que eram acolhidas e discutidas em sala de aula pelos discentes que as juntavam com suas próprias ideias, as reorganizavam e encaminhavam no sentido de desenvolver atividades de estudo que se desdobravam por caminhos individuais, em grupos e no coletivo. As ações propostas eram apresentadas e discutidas semanalmente no coletivo da sala, e também fora da sala, por meio das rodas de conversa e rede social, pelas exposições de seus estudos individuais ou em pequenos grupos, pela dramatização de situações de sala de aula imaginadas, registradas em seus portfólios e reavaliadas. 5 As ações de sala de aula se desenvolveram, portanto, numa perspectiva prospectiva onde além das atividades rotineiras de sala e aula envolvendo leituras, reflexões sobre estas, análise de materiais didáticos, seus usos e elaboração de pequenas intervenções didáticas apresentadas visavam tanto à construção do conhecimento individual em termos de práticas docentes experimentadas na formação inicial, assim como aquelas experimentadas em grupo e coletivamente. A seguir apresentamos as principais características das propostas coletivas das duas turmas. T13. O projeto foi construído a partir da temática financeira ou econômica e envolveu várias atividades incluindo jogos e resolução de problemas sendo apresentado na forma de oficina. Detalhando, os alunos ousaram e deram o título seguinte para o PI: “STOP Z.I.K.A: Zoneando conceitos Introdutórios “Korrelacionados” A economia”. Segundo os alunos, os objetivos do PI foram:- introduzir novos métodos de raciocínio lógico com a aplicação de jogos simples, mas que desenvolvessem a capacidade cognitiva e a abordagem de conceitos de Economia, operações e/ou manipulações com dinheiro; aumentar o interesse dos alunos pela Matemática e tentar melhorar a impressão ruim que as crianças criam em relação ao raciocínio lógico matemático. Na própria síntese dos alunos: “a proposta propiciou a interação social dos graduandos com as escolas públicas, promoveu o processo de síntese do conhecimento para todos os alunos e representou, de fato, um desafio para todos”. A Figura 2 apresenta os alunos da T13 em atividade no LAPEMC. Na Figura 2 são apresentadas algumas imagens relativas à intervenção didática feita com o PI. T14. Nesta turma o trabalho coletivo versou sobre a construção de uma SD tendo como tema o Teorema de Pitágoras. O processo envolveu discussões coletivas em sala de aula que no decorrer dos estudos levou a divisão em 4 grupos de trabalho um para cada ano do EF, do 6º ao 9º ano. Cada grupo, respeitando o nível cognitivo dos alunos de cada ano e as expectativas de aprendizagem constantes na Proposta Curricular de Matemática para o EF do Estado de São Paulo (São Paulo, 2008), produziu um conjunto de 3 aulas preparando gradualmente, a partir de conteúdos conceituais, procedimentais e atitudinais (Zabala, 1998) para a aprendizagem do Teorema de Pitágoras. Produzida a SD e apresentada, esta foi avaliada pelo coletivo da sala de aula e disponibilizada para o grupo em rede social para apropriação das duas professoras de escola pública que acompanharam o processo virtualmente. Essas professoras, participantes de um dos Projetos OBEDUC em vigência na UFABC, adaptaram 6 algumas das atividades propostas na SD ao currículo de suas salas de aula, elaboraram um cronograma de trabalho, estão realizando-as e coletando os dados. Considerações Finais Este artigo se ateve a relatar as conexões existentes entre diversos espaços sejam de pesquisa, formação e extensão no contexto da sala de aula universitária de Práticas de Ensino de Matemática no EF. Os dados existentes relativos aos processos, sejam na sala de aula universitária ou de EF, estão em processo de análise sob diversos aspectos. Numa perspectiva retrospectiva, o processo envolveu a produção de relatório coletivo avaliando as ações tanto de produção do PI na T13 e da SD na T14 como as apresentações dos portfólios individuais contendo as impressões e expressões, em múltiplas linguagens, bem como suas reflexões sobre o processo. O conteúdo desses instrumentos está em fase de análise e os resultados serão apresentados em outra comunicação. Agradecimentos Agradecemos a CAPES pelo financiamento tanto do Projeto OBEDUC, do qual sou colaboradora, e do PIBID, do qual sou coordenadora de área interdisciplinar, bem como a UFABC. Às professoras colaboradoras Sabrina Maria Pedrão (Secretaria de Educação do Estado de São Paulo) e Tathiane Anile (Prefeitura Municipal de São Caetano do Sul). Às alunas do estágio Supervisionado Cintia Maria Barbosa e Carolina Sanches Piaia. Aos alunos e às alunas participantes das salas de aula: (T13) Caio Ferreira Alvares, Camila Hitomi Osawa, Camila Silva dos Santos, Daniel Hubner Bacellar Duarte Lima, Danilo Keite Tamburu Shimabuco, Davi Ferreira Leite Monteiro, Denis Alves Cardoso, Isaque Silva Chagas, Marcelo Goncalves Tauro, Miguel Gustavo Farias de Oliveira, Renan Correa de Lima e (T14) Adson Batista, André Belasques Ruiz Picon, Andre Luiz Ramos de Oliveira, Andre Machado Nakandakare, Carolina Sanches Piaia, Fabio Adauto Dominciano, Felipe Augusto dos Santos, Fernando Henrique Tamasiro Vieira, Gabrielle Collato Marcelino, Juliana Jucá Rodrigues Correa, Kleber da Silva Mendes Alvarenga, Lucas Mazim de Sousa, Nathalia Levorato, Renata de Almeida, Ricardo Luís Patroni, Rodrigo Jose de Souza Leite, Thiago Felipe Uwarow, Viviane Gagliardi, Yuri Ferreira Soares. 7 Referências CONTRERAS, J. A autonomia de professores. São Paulo, SP: Cortez, 2012. D’AMBRÓSIO, U. Transdisciplinaridade. São Paulo, SP: Palas Athena, 2001. 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