Maria José da Conceição Afonso Salavisa era filha de Beatriz da Conceição Pereira (30.09.1889) e de José da Silva Afonso Salavisa (10.03.1878). Nasceu em 25 de Abril de 1925 em Castelo Branco e morreu a 12 de Janeiro de 2006, em Lisboa, no Hospital da CUF em Lisboa, onde estava hospitalizada na sequência de uma intervenção cirúrgica. Casou-se aos dezassete anos com o pintor, autor de cenários e figurinista Abílio Leal de Mattos e Silva (01.04.1908), não havendo descendência deste casamento. Arquitecta e decoradora de interiores, é considerada pioneira da decoração em Portugal e foi aluna da primeira geração formada em Artes Decorativas e História dos Estilos em Mobiliário nos anos 60 pela Fundação Ricardo Espírito Santo Silva, instituição onde também leccionou durante muitos anos. Dotada de uma personalidade forte e sensível, foi uma figura marcante e ousada no mundo da decoração de interiores em Portugal na segunda metade do século XX, deixando uma marca perdurável na Arquitectura de Interiores em Portugal. Era uma mulher radicalmente moderna e visualmente excessiva, numa sociedade cinzenta e sem horizontes, vigente no Portugal dos anos sessenta. Estes excessos conviviam com a contenção e o estilo depurado dos seus trabalhos de forma muito pessoal. Numa entrevista à revista Pública afirmou que não era subsidiária de estéticas, mas abraçara uma visão minimalista do seu trabalho - "o despojamento espacial, a luz que entra, os materiais, os bons acabamentos". "No mundo da decoração de interiores, Maria José Salavisa tinha o trabalho mais interessante. Tinha uma visão abrangente, trabalhando com artistas plásticos num processo que se aproxima do design de interiores como disciplina autónoma", afirmou Rui Afonso Santos, historiador de "design". Dotada de espírito criativo e de grande rigor e exigência profissional, foi pioneira na arte de projectar os interiores em Portugal de uma forma muito marcante e coerente, apoiada pela sua cultura, saber e requinte, ao dar largas à sua imaginação e intuição. Adorava a luz que o branco lhe transmitia, e a serenidade que se lhe seguia, a maior parte das vezes estes elementos criavam empatia e eram o início para mais um projecto de arquitectura de interiores, que tomava corpo e levantava voo, animado sempre pelo seu brilhante espírito crítico e muito criativo. Ao longo do seu percurso profissional trabalhou com graúdo arquitectos no país e no estrangeiro e assinou inúmeros projectos de Design de Interiores para residências privadas, todas elas de grande modernidade na organização e interligação dos espaços, como é exemplo a Casa Redonda, na Quinta do Lago, no Algarve, publicada na Revista Casa e Jardim (Agosto de 1992). A sua obra ficou marcada pela beleza do imaculado branco, que adorava (pintava as paredes de branco, umas vezes lacadas outras caiadas), a interligação dos espaços, as grandes paredes de vidro rasgadas, a criar cumplicidades com a natureza, e a luz. Sempre a luz a transportar para o interior a característica luminosidade do azul do Atlântico, e as linhas depuradas, contidas, a exaltar peças escultóricas, como as lareiras vividas como ponto fulcral da casa. A nobreza dos materiais contemporâneos como o vidro e o aço viria também a influenciar o seu trabalho de design de interiores. Destacou-se em obras de vulto como a remodelação do salão nobre do Teatro da Trindade, empreendimentos turísticos como o campo de golfe Vitória em Vilamoura, vários hotéis como o Hotel de Montechoro e o Hotel Ritz, , a Discoteca/Bar Kapital, o Restaurante/Bar Kais e o Pavilhão da Cruz Vermelha na Expo'98 , entre muitos outros. Afirmava que lhe faltava decorar um hotel de sete estrelas e, com alguma ironia, um bairro para desalojados das barracas. Sobre a sua obra notável de Interiores foram publicadas duas obras de referência "Regras e princípio em decoração", em 1991, com texto de Hélder Carita e fotografia de Homem Cardoso, e "Interiores 1965-2001" em 2001, com edição de José Manuel das Neves, da editora Estar, nos quais se fazia o balanço dos trinta anos de trabalho da designer. Maria José Salavisa tinha um singular carinho por Óbidos e em especial pela Casa do Arco, adquirida pelo casal, em 1962, quase em ruínas. A sua recuperação foi trabalho de amor, melhor, de paixão, sendo o resultado da atracção que a vila sempre exerceu sobre Maria José Salavisa. É sobejamente conhecido um pequeno texto de Maria José Salavisa relacionado com este espaço encantatório e intimista, intitulado "O objecto da minha vida". "Qual o objecto da minha vida? Não tive reposta, nenhum se me impôs... Mas se um 'cipreste' fosse um objecto? - o cipreste da minha casa de Óbidos, seria o objecto da minha vida. Entrou pequenino na minha vida. Há 35 anos era uma varinha com alguns ramos -mas havia já um projecto para ele, faria parte de uma cena: - "A casa e ele". Cumpriu, cresceu, e tornou-se majestoso. Quis mostrar-se a quem passava nas muralhas, elas seriam a sua plateia. Admiro-o pelo seu porte e altivez, assusta-me pela sua altivez e porte. É protagonista, ocupa-me a atenção: - coloquem-lhe esticadores à parede, não vá o vento derrubá-lo. Há visitas? - retirem-lhe os esticadores, porque o desfeitam e humilham. Cresceu demais, e usurpou o espaço da escada vizinha, há que desbastá-lo, mas cuidado não lhe alterem o "perfil", cuidado não magoem as suas raízes. De repente percebi, não será "o objecto da minha vida", mas é "objecto da minha vida". E ele, o cipreste, mudo e indiferente, testemunha a minha existência em Óbidos - Até quando? Quem desistirá, ele ou eu?" A sua casa de Lisboa foi publicada na revista Casa & Jardim (Maio de 1984), uma residência em que a modernidade e o espírito da época dos anos setenta, estão presentes. Utiliza em grande profusão o vidro e aço polido e escovado, em contraste com as peças mais clássicas: a cadeira portuguesa do século XVIII em charão vermelho e ouro e o biombo de Kioto a mostrar a chegada dos portugueses ao Japão, acompanhadas pela flor de Kamakura, com dois metros de altura, feita por um artífice português. A Casa do Arco, em Óbidos, foi igualmente publicada na revista Casa & Jardim (Setembro de 2002). Nesta casa põe a descoberto janelas góticas originais, que vão ser o início de todo o trabalho de reconstrução, e recria um ambiente medieval, animado pela presença das naturezas mortas da pintora seiscentista Josefa de Óbidos. Vai animar o cenário Haute Époque com réplicas de peças medievais revivendo o ambiente de época. "Estranha e bizarra ironia. Eu que abraço a contemporaneidade e a modernidade, idealizei a casa de Óbidos tocada pelo passado, dominada pelo espírito desta vila medieval, inspirada no legado deixado nas muralhas e no casario" confidenciou a arquitecta e decoradora no dia em que foi feita a reportagem. Adoptando Óbidos como sua terra de eleição, exaltou sempre as suas características patrimoniais e dedicou-lhe nos últimos anos de vida grande parte do seu tempo, na concretização de um sonho de há muito: criar o Centro de Design de Interiores, um local muito especial para promover o encontro de designers e doar a sua Casa do Arco à vila que tanto amou e com a qual teve sempre uma empatia muito forte, com a sua traça medieval e o casario dentro de muralhas, para que fosse transformada na Casa-Museu Abílio de Mattos e Silva, numa homenagem ao artista plástico que passou parte da sua vida a promover e a pintar Óbidos. Estando a colaborar neste projecto à hora da sua morte, o seu sonho manteve-se presente e a Câmara Municipal de Óbidos continua a trabalhar no seu legado para a vila a que tinha uma forte ligação e onde viria a ser sepultada. Pesquisa realizada por Luísa Teresa