SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA PUBLICAÇÃO OFICIAL Revista de Súmulas Revista de Súmulas VOLUME 21, ANO 5 AGOSTO 2011 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Gabinete do Ministro Diretor da Revista Diretor Ministro Francisco Falcão Chefe de Gabinete Marcos Perdigão Bernardes Servidores Andrea Dias de Castro Costa Eloame Augusti Gerson Prado da Silva Jacqueline Neiva de Lima Maria Angélica Neves Sant’Ana Técnico em Secretariado Fagno Monteiro Amorim Mensageiro Cristiano Augusto Rodrigues Santos Superior Tribunal de Justiça www.stj.jus.br, [email protected] Gabinete do Ministro Diretor da Revista Setor de Administração Federal Sul, Quadra 6, Lote 1, Bloco C, 2º Andar, Sala C-240, Brasília-DF, 70095-900 Telefone (61) 3319-8003, Fax (61) 3319-8992 Revista de Súmulas do Superior Tribunal de Justiça - V. 1 (nov. 2005) -. Brasília: STJ, 2005 -. Periodicidade: Irregular. Repositório Oficial de Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Nome do editor varia: Superior Tribunal de Justiça / Editora Brasília Jurídica, 2005 a 2006, Superior Tribunal de Justiça, 2009 -. Disponível também em versão eletrônica a partir de 2009: https://ww2.stj.jus.br/web/ revista/eletronica/publicacao/?aplicacao=revista.sumulas ISSN 2179-782X 1. Direito, Brasil. 2. Jurisprudência, periódico, Brasil. I. Brasil, Superior Tribunal de Justiça (STJ). II. Título. CDU 340.142(81)(05) Revista de Súmulas MINISTRO FRANCISCO FALCÃO Diretor SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Plenário Ministro Ari Pargendler (Presidente) Ministro Felix Fischer (Vice-Presidente) Ministro Francisco Cesar Asfor Rocha (Diretor-Geral da ENFAM) Ministro Gilson Langaro Dipp Ministra Eliana Calmon Alves (Corregedora Nacional de Justiça) Ministro Francisco Cândido de Melo Falcão Neto (Diretor da Revista) Ministra Fátima Nancy Andrighi Ministra Laurita Hilário Vaz Ministro João Otávio de Noronha (Corregedor-Geral da Justiça Federal) Ministro Teori Albino Zavascki Ministro José de Castro Meira Ministro Arnaldo Esteves Lima Ministro Massami Uyeda Ministro Humberto Eustáquio Soares Martins Ministra Maria Thereza Rocha de Assis Moura Ministro Antonio Herman de Vasconcellos e Benjamin Ministro Napoleão Nunes Maia Filho Ministro Sidnei Agostinho Beneti Ministro Jorge Mussi Ministro Geraldo Og Nicéas Marques Fernandes Ministro Luis Felipe Salomão Ministro Mauro Luiz Campbell Marques Ministro Benedito Gonçalves Ministro Raul Araújo Filho Ministro Paulo de Tarso Vieira Sanseverino Ministra Maria Isabel Diniz Gallotti Rodrigues Ministro Antonio Carlos Ferreira Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva Ministro Sebastião Alves dos Reis Júnior Resolução n. 19/1995-STJ, art. 3º. RISTJ, arts. 21, III e VI; 22, § 1º, e 23. SUMÁRIO Súmulas 274...............................................................................................................................11 275...............................................................................................................................35 276 (Cancelada)...........................................................................................................65 277.............................................................................................................................127 278.............................................................................................................................181 279.............................................................................................................................205 280.............................................................................................................................255 281.............................................................................................................................281 282.............................................................................................................................323 283.............................................................................................................................347 284.............................................................................................................................387 285.............................................................................................................................421 Índice Analítico ................................................................................................................................................. 469 Índice Sistemático ........................................................................................................................................... 479 Siglas e Abreviaturas...................................................................................................................................... 485 Repositórios Autorizados e Credenciados pelo Superior Tribunal de Justiça ....................................................................................................................... 491 Súmula n. 274 SÚMULA N. 274 O ISS incide sobre o valor dos serviços de assistência médica, incluindo-se neles as refeições, os medicamentos e as diárias hospitalares. Referência: Decreto-Lei n. 406/1968, art. 8º, § 1º, e item 2 da lista anexa. Precedentes: REsp 11.533-SP (2ª T, 11.10.1995 – DJ 06.11.1995) REsp 25.599-SP (2ª T, 21.08.1995 – DJ 11.09.1995) REsp 36.199-SP (1ª T, 17.08.1994 – DJ 19.09.1994) REsp 40.161-SP (1ª T, 15.12.1993 – DJ 21.02.1994) REsp 130.621-CE (2ª T, 28.09.1999 – DJ 27.03.2000) Primeira Seção, em 12.02.2003 DJ 20.02.2003, p. 153 RECURSO ESPECIAL N. 11.533-SP (91.10895-2) Relator: Ministro Ari Pargendler Recorrente: Hospital Ana Costa S/A Recorrido: Município de Santos Advogados: Hugo Mosca e outro, Santiago Moreira Lima Sustentação oral: Hugo Mosca, pelo recorrente EMENTA Tributário. ISS. Base de cálculo. Hospitais. O valor da alimentação e dos medicamentos fornecidos pelos hospitais está embutido nas diárias hospitalares e faz parte da base de cálculo do Imposto Sobre Serviços. Recurso especial não conhecido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Antônio de Pádua Ribeiro, Hélio Mosimann e Peçanha Martins. Brasília (DF), 11 de outubro de 1995 (data do julgamento). Ministro Hélio Mosimann, Presidente Ministro Ari Pargendler, Relator DJ 06.11.1995 RELATÓRIO O Sr. Ministro Ari Pargendler: - O Recorrido ajuizou execução fiscal contra a Recorrente para cobrar o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza relativo aos anos-base de 1981 e 1983 (apenso, fls. 02 e 03). SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Opostos embargos do devedor, fundados em que o valor dos remédios, alimentos e sangue não integram a base de cálculo do tributo (fls. 02-08), foram julgados procedentes pela sentença de 1º grau (fls. 429-433). Todavia, a Egrégia Primeira Câmara do Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo fez por reformá-la, forte em que incluem-se na base de cálculo do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, “o custo de remédios, inclusive sangue e oxigênio, e de alimentação fornecida a pacientes e seus familiares” (fl. 456). Seguiram-se embargos de declaração a respeito das seguintes questões: “(a) a de ter ou não a Apelada o direito a deduzir do valor do ISS pago por terceiros fornecedores de serviço de transfusão de sangue, do total por ela devido a título do mesmo imposto; (b) a de, em havendo cobrança em separado do valor dos medicamentos, refeições, etc, ainda assim sobre ele incidirá o ISS” (fl. 459). O Tribunal a quo rejeitou-os do seguinte modo: “Percebe-se claramente que os embargos objetivam a reforma da decisão, e não a sua declaração. Foi dito expressamente no acórdão que o tributo seria devido também sobre o custo de remédios, inclusive sangue e oxigênio, e de alimentação fornecida a pacientes e seus familiares. A questão de que terceiros seriam envolvidos nesses fornecimentos não foi objeto de apreciação no acórdão porque não foi levantada no apelo interposto pela Municipalidade. Não tendo o embargante apelado da decisão de primeira instância, conformou-se com aquela decisão, não havendo porque ser reapreciado o inteiro teor de seus embargos” (fls. 462-263). Daí a interposição do presente recurso especial, com base no artigo 105, inciso III, da Constituição Federal, “tendo em vista que os vv. acórdãos recorridos a) contrariam leis federais; b) julgam válido ato do governo municipal de Santos em face de Lei Federal; c) deram interpretação diversa a questão jurídica decidida pelo SupremoTribunal Federal” (fl. 472), afrontando os artigos 8º e 9º do Decreto-Lei n. 406, de 1968 (fl. 474), bem assim o artigo 10 do Decreto-Lei n. 406, de 1968 e o artigo 121 do Código Tributário Nacional (fl. 475). O Ministério Público Federal, na pessoa da eminente SubprocuradoraGeral da República Dra. Helenita Amélia G. Caiado de Acioli, opinou pelo improvimento do recurso (fls. 507-509). VOTO O Sr. Ministro Ari Pargendler (Relator): - A petição que veiculou o presente recurso especial deixou de referir as alíneas do inciso III do artigo 105 da Constituição Federal. Fora de toda dúvida, no entanto, a irresignação foi 16 SÚMULAS - PRECEDENTES manifestada à base de todas elas, posto que se alega contrariedade à Lei Federal, prevalência de ato de governo municipal em face de lei federal e interpretação de lei diversa da que lhe deu o Supremo Tribunal Federal. O recurso especial só pode ser conhecido pela alínea a, posto que evidentemente não é o caso da alínea b e nem foi demonstrada analiticamente a divergência de interpretação alegada. Há uma questão preliminar. A sentença julgou procedentes os embargos do devedor ao fundamento de que a base de cálculo do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza só alcança os serviços prestados pelos hospitais, aí não incluídos o fornecimento de remédios, alimentação e sangue; assim, não precisou decidir se o sangue fornecido por terceiros estaria sujeito à nova tributação, sem ofensa ao princípio da não-cumulatividade do tributo. O acórdão repeliu o fundamento da sentença, julgando improcedentes os embargos do devedor. Provocada por embargos de declaração, a Egrégia Câmara se negou a examinar o segundo fundamento dos embargos do devedor, à consideração de que se tratava de matéria preclusa, que a Recorrente deveria ter ativado através de apelação. Vitoriosa no 1º grau de jurisdição, a Recorrente não tinha interesse para interpor o recurso de apelação. Houve, por isso, vício no julgamento, que, entretanto, não pode ser proclamado nesta instância porque o recurso especial apenas se referiu a ele incidentalmente, só atacando a tese de direito material consagrada no acórdão. A anulação do julgamento dependeria de interposição do recurso especial com fundamento no artigo 515, § 2º do Código de Processo Civil, in verbis: “Quando o pedido ou a defesa tiver mais de um fundamento e o juiz acolher apenas um deles, a apelação devolverá ao tribunal o conhecimento dos demais”. Sem que tenha sido preqüestionada a questão relativa ao princípio da não cumulatividade do tributo sobre o fornecimento do sangue, não é possível examiná-la no estado dos autos. Assim dimensionado, o recurso especial não pode prosperar. A jurisprudência da Corte é no sentido de que o valor da alimentação e dos medicamentos fornecidos pelos hospitais está embutido nas diárias hospitalares e faz parte da base de cálculo do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (REsp n. 25.599-9, SP, Rel. Min. Hélio Mosimann, DJU, 11.09.1995; REsp n. 36.199-0, SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJU, 19.09.1994). Voto, por isso, no sentido de não conhecer do recurso especial. RSSTJ, a. 5, (21): 11-33, agosto 2011 17 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VOTO-VOGAL O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro: - Sr. Presidente, realmente, depois dos esclarecimentos do Eminente Relator, não vejo como dele discordar, embora sensibilizado pela sustentação oral produzida pelo ilustre advogado. Com efeito, no caso, inclusive, não se discute matéria ligada a indigente, porque se trata de diária hospitalar. Indigente não paga diária hospitalar. Diante desses esclarecimentos, peço vênia para acompanhar o Ilustre Relator, porque não há, mesmo, negativa de vigência a nenhum dos dispositivos legais colacionados. Não se deu pela validade da lei local, contestada em face da lei federal, e nem qualquer dissídio pretoriano foi comprovado. Portanto, também, não conheço do recurso. VOTO O Sr. Ministro Peçanha Martins: - Senhor Presidente, sensibilizou-me a argüição feita pelo nobre advogado de que estaria havendo incidência sobre prestação de serviços gratuitos, porque prestados a indigentes, mas, com os esclarecimentos feitos pelo Relator, não há dúvida de que a incidência se faz somente sobre as diárias e quem as paga não é indigente. Razão por que, não podendo o Judiciário dar isenção quando a lei não o faz, acompanho o nobre Relator. RECURSO ESPECIAL N. 25.599-SP (92.0019263-7) Relator: Ministro Hélio Mosimann Recorrente: Hospital e Maternidade Vila Maria S/A Advogado: Paulo Roberto Cabral Nogueira e outros Recorrido: Município de São Paulo Advogado: Carmen Garcia Suller Marza e outros 18 SÚMULAS - PRECEDENTES EMENTA Tributário. Imposto Sobre Serviços. Estabelecimento hospitalar. Medicação e alimentos. Serviços de assistência médica prestados aos pacientes. Incidência do tributo. Os serviços de assistência médica prestados pelos hospitais aos seus pacientes, mesmo envolvendo a parte relativa ao fornecimento de remédios e alimentos, estão sujeitos ao ISS. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por votação unânime, não conhecer do recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Peçanha Martins e Ari Pargendler. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro. Brasília (DF), 21 de agosto de 1995 (data do julgamento). Ministro Hélio Mosimann, Presidente e Relator DJ 11.09.1995 RELATÓRIO O Sr. Ministro Hélio Mosimann: Cuida-se de Recurso Especial interposto pelo Hospital e Maternidade Vila Maria S/A., com fulcro no art. 105, III, a, da Carta Federal, contra acórdão proferido pela Oitava Câmara do Primeiro Tribunal de Alçada Cível, que negou provimento ao apelo, onde se pretendia livrar do pagamento do ISS, em sede de embargos à execução. Prende-se a irresignação à cobrança, pela Municipalidade, do Imposto Sobre Serviços, sobre os valores referentes ao fornecimento de medicação e alimentos aos pacientes, pois as diárias estabelecidas pelo Hospital não incluem esses valores na base de cálculo do tributo. Alega a recorrente contrariedade aos arts. 303, 514, II; 515, §§ 1º e 2º e 586 do CPC; 162 do CC; 174 do CTN e 9º do Decreto-Lei n. 406/1968. RSSTJ, a. 5, (21): 11-33, agosto 2011 19 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Contra-razões às fls. 190-193. Despacho do Presidente do Tribunal de origem admitiu o recurso e o parecer da Subprocuradoria-Geral da República, às fls. 204-206, opinou pelo seu improvimento. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Hélio Mosimann (Relator): Insurge-se, inicialmente, a entidade hospitalar contra a parte da decisão que não tomou conhecimento das preliminares de prescrição e iliquidez do débito, porque constituíram mera reiteração das razões dos embargos. Realmente, a fundamentação da apelação era indispensável, ainda mais que a argüição em ambos os aspectos, foi repelida, sem qualquer contrariedade. Seja como for, restou demonstrada, fora de dúvida, a inocorrência da prescrição, como também da nulidade das certidões da dívida que, satisfazendo todos os requisitos legais, levam a presunção de verdadeiras. Quanto ao mérito, não é melhor a posição da embargante-recorrente. Se os hospitais cobram dos pacientes e seus acompanhantes as diárias hospitalares que incluem os valores da alimentação fornecida e do remédio utilizado, essa atividade não está abrangida pelas hipóteses de não incidência do ISS. Não ocorre bitributação ou qualquer outro vício, como destacou acertadamente a decisão recorrida, acrescentando que “as diárias cobradas por hospitais, casas de saúde e estabelecimentos congêneres, englobam, sem dúvida, o fornecimento de assistência medicamental e alimentação” (...). “A apelante está pretendendo pagar o ISS relativo a serviços hospitalares, excluídos da renda bruta os medicamentos e alimentação fornecida a pacientes e acompanhantes. E para isso argumenta com a exceção de alguns pacientes que não tomam medicamento e outros que se submetem a jejum controlado e pagam a mesma diária. Ocorre que o argumento de exceção vem exatamente confirmar a procedência da cobrança executiva, tal como ajuizada. É que a hospitalização exige, praticamente, o fornecimento de medicação e alimentos, englobados os seus valores no preço único cobrado e que serve de base de cálculo para o ISS. E mesmo no caso excepcional de pacientes que não se alimentam, nem por isso é feita a distinção dessa alimentação no preço da diária, 20 SÚMULAS - PRECEDENTES o que vem demonstrar, que de regra esses valores estão mesmo englobados, porque postos à disposição do paciente, sempre que é recebido no hospital. Correto, portanto, o cálculo efetuado para a cobrança do ISS sobre a renda bruta”. Precedentes desta Corte não destoam do entendimento esposado pela decisão acima referida, como segue: - ISS. Serviços de assistência médica. Medicamentos e refeições servidos nos hospitais. Incidência. Como os serviços de assistência médica prestados pelos hospitais são incluídos na lista anexa ao Decreto-Lei n. 406/1968 e envolvem o fornecimento de mercadorias (remédios e alimentação) estão eles sujeitos apenas ao ISS. Não se pode destacar da prestação de serviços de assistência médica, como um todo, a parte dela integrante referente ao fornecimento de remédios e alimentação aos pacientes (REsp n. 40.161-5-SP, Min. Garcia Vieira, RSTJ, 58/415). - Tributário. Imposto Sobre Serviços (ISS). Hospital. Fornecimento de refeições e medicamento. O preço de refeições e medicamentos, fornecidos em hospitais, reintegra-se ao valor dos serviços de assistência médica, para efeito de incidência do ISS (DL n. 406/1968, art. 8°, § 1° e item n. 2 da Lista anexa) - REsp n. 36.199-0-SP, Min. Gomes de Barros, DJ 19.09.1994, Ementário STJ, 10/328, reformando decisão do Tribunal de origem, mencionada às fls. 208 e seguintes. Atento, pois, aos precedentes e pelos mesmos fundamentos, não conheço do recurso, interposto que foi apenas pela letra a do permissivo constitucional. É como voto. RECURSO ESPECIAL N. 36.199-SP (93.0017544-0) Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros Recorrente: Município de Santos Recorrido: Hospital Ana Costa S/A Advogados: Santiago Moreira Lima e Ricardo do Amaral Silva Miranda de Carvalho e outro RSSTJ, a. 5, (21): 11-33, agosto 2011 21 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EMENTA Tributário. ISS. Hospital. Fornecimento de refeições e medicamentos. - O preço de refeições e medicamentos, fornecidos em hospitais, integra-se ao valor dos serviços de assistência médica, para efeito de incidência do ISS (DL n. 406/1968, art. 8º, § 1º e item n. 2 da Lista anexa). ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso. Votaram com o Relator os Ministros Milton Luiz Pereira, Cesar Asfor Rocha e Demócrito Reinaldo. Ausente, justificadamente, o Ministro Garcia Vieira. Brasília (DF), 17 de agosto de 1994 (data do julgamento). Ministro Demócrito Reinaldo, Presidente Ministro Humberto Gomes de Barros, Relator DJ 19.09.1994 RELATÓRIO O Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros: - O E. Tribunal de Alçada Civil de São Paulo decidiu que O imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza não incide sobre o preço dos medicamentos ministrados e das refeições servidas nos hospitais, aos pacientes. (fl. 229). O Município de Santos desafia esta decisão, interpondo recurso especial, fincado nas alíneas a e c (fls. 244 e segts). O apelo foi admitido, pela divergência. É o relatório. 22 SÚMULAS - PRECEDENTES VOTO O Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros (Relator): - O Município Recorrente traz a confronto o v. acórdão do Supremo Tribunal Federal, no RE n. 86.343-PB, assim resumido: Imposto de serviços. Base de cálculo. Incidência que se faz sobre a receita bruta. Inocorrência de negativa de vigência ao artigo 9º do Dec.-Lei n. 406/1966. Improcedência, ainda, da alegação de ofensa ao princípio que veda a bitributação. (fl. 251). O tema já é nosso conhecido. Esta Turma, quando julgou o REsp n. 40.161, foi conduzida pelo E. Ministro Garcia Vieira, ao entendimento de que: Como os serviços de assistência médica prestados pelos hospitais são incluídos na lista anexa ao Decreto-Lei n. 406/1968 e envolvem o fornecimento de mercadorias (remédios e alimentação) estão eles sujeitos apenas ao ISS. Não se pode destacar da prestação de serviços de assistência médica, como um todo, a parte integrante referente ao fornecimento de remédio e alimentação aos pacientes. (Julg. em 15.12.1993 - unânime). Esta orientação é a que melhor se afina com o Sistema consagrado pelo DL n. 406/1968. Com efeito, o art. 8º, § 1º, do Decreto-Lei afasta qualquer perplexidade, quando esclarece: Os serviços incluídos na lista ficam sujeitos apenas ao imposto previsto neste artigo, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias. Na hipótese, a lista (Item n. 2), arrola o serviço de hospital, como gerador de ISS. Ora, ninguém discute que o fornecimento de remédios e refeições inserese na atividade hospitalar. Dou provimento ao recurso. RECURSO ESPECIAL N. 40.161-SP (93.0030146-2) Relator: Ministro Garcia Vieira RSSTJ, a. 5, (21): 11-33, agosto 2011 23 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Recorrente: Município de São Paulo Recorrido: Hospital e Maternidade N. Senhora de Lourdes S/A Advogados: Edgard Ortega Sant’anna e outros Alexandre Coli Nogueira e outros EMENTA ISS. Serviços de assistência médica. Medicamentos e refeições servidos nos hospitais. Incidência. Como os serviços de assistência médica prestados pelos hospitais são incluídos na lista anexa ao Decreto-Lei n. 406/1968 e envolvem o fornecimento de mercadorias (remédios e alimentação) estão eles sujeitos apenas ao ISS. Não se pode destacar da prestação de serviços de assistência médica, como um todo, a parte dela integrante referente ao fornecimento de remédios e alimentação aos pacientes. Recurso provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Exmo. Sr. Ministro-Relator. Participaram do julgamento: os Exmos. Srs. Ministros Demócrito Reinaldo, Humberto Gomes de Barros, Milton Luiz Pereira e Cesar Asfor Rocha. Brasília (DF), 15 de dezembro de 1993 (data do julgamento). Ministro Garcia Vieira, Presidente e Relator DJ 21.02.1994 24 SÚMULAS - PRECEDENTES RELATÓRIO O Sr. Ministro Garcia Vieira: - Trata-se de recurso especial interposto pelo Município de São Paulo, com apoio na alínea a do permissivo constitucional, onde se aponta como violados os artigos 1º, § 3º, inciso III e 8º, § 1º, do Decreto-Lei n. 406/1968, além de dissídio jurisprudencial. Insurge-se o recorrente contra acórdão do E. Primeiro Tribunal de A1çada Civil do Estado de São Paulo que entendeu pela não incidência do ISS sobre os preços dos medicamentos ministrados e das refeições servidas nos hospitais aos pacientes (fls. 138-140). Sustenta que os serviços prestados pelo recorrido constam da lista anexa ao Decreto-Lei n. 406/1968, estando sujeitos apenas ao ISS, ainda que a prestação envolva fornecimento de mercadoria, nos justos termos do § 1º, do art. 8º do citado diploma. Indica acórdãos divergentes e requer o provimento do especial (fls. 142154). Oferecidas contra-razões (fls. 167-172) e indeferido o processamento do especial (fls. 179-180), subiram os autos a este C. Tribunal, face ao provimento de agravo de instrumento regularmente interposto. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Garcia Vieira (Relator): - Aponta a recorrente como violados vários dispositivos legais, versando sobre questões devidamente prequestionadas. Conheço do recurso pela letra a. O recurso é admissível e merece provimento. O ISS tem como fato gerador a prestação de serviço constante de lista (artigo 8º do Decreto-Lei n. 406/1968). A embargante, Hospital e Maternidade Nossa Senhora de Lourdes, presta serviços que se enquadram no item n. 02 da lista de serviços anexa ao Decreto-Lei n. 406/1968, com a redação dada pela Lei Complementar n. 56/1987 e 04, antes desta norma legal. Os hospitais, além da assistência médica, fornecem remédios e alimentação que são incluídos nas diárias. Resta saber se o Imposto sobre Serviços incide também sobre os RSSTJ, a. 5, (21): 11-33, agosto 2011 25 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA remédios e refeições fornecidos pelo hospital a seus pacientes. Estabelece o artigo 8º, parágrafo 1º do citado Decreto-Lei n. 406/1968 que, os serviços incluídos na lista ficam sujeitos apenas ao imposto previsto neste artigo, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias. Como os serviços prestados pelo recorrido, de assistência médica são incluídos na lista e envolvem o fornecimento de mercadorias (remédios e alimentação) estão eles sujeitos apenas ao ISS. Os serviços prestados pelo embargante só não estariam sujeitos ao ICMS se não estivessem especificados na lista (parágrafo 2º), como, por exemplo, o fornecimento de alimentação, bebidas e outras mercadorias, por bares, restaurantes, clubes e outros estabelecimentos similares (Decreto-Lei n. 406/1968, artigo 1º, item III). Os hospitais, no desempenho de suas atividades específicas de prestação de serviços de assistência médica, fornecem remédios e alimentação e, nem por isso podem ser equiparados a farmácias, restaurantes, bares, etc., porque não são comerciantes. Bernardo Ribeiro de Morais, citado por ambas as partes, no seu livro de Doutrina e Prática do Imposto Sobre Serviços, 1984, p. 183, ensina que: Está na atividade específica dos hospitais, cujo escopo é assistência médica e hospitalização, a prestação de serviços, com o conseqüente abrigo e fornecimento de alimentos, bebidas e remédios. O hospital presta serviços aos doentes ou acidentados. Assiste-os. Ministra-lhes remédios. Faz exames e intervenções. Acompanha os respectivos tratamentos. Não podemos negar que o fornecimento de abrigo, refeições e remédios aos enfermos, acompanhantes ou familiares, constitui atividade acessória e indispensável à execução da obrigação de fazer que o hospital possui: prestar hospitalização e assistência médica. O legislador considera os serviços de hospitais tais como serviços tributáveis pelo ISS, não fazendo distinção alguma com referência ao fornecimento de abrigo, alimentos ou remédios, relativamente à sua sujeição ao ICM. (fl. 20). O artigo 12, parágrafo 1º do Decreto Estadual n. 22.470/1986 estabelece que a base de cálculo do ISS é o preço do serviço e considera este como “a receita bruta a ele correspondente, sem nenhuma dedução, excetuados os descontos ou abatimentos concedidos independentemente de qualquer condição. Como se vê, no caso, o preço do serviço é a receita bruta, neste incluído o fornecimento de remédios e alimentação que são indispensáveis ao tratamento médico dos pacientes. O próprio Bernardo Ribeiro de Morais, citado pela embargante (fl. 26), afirma que os serviços médicos ficam sujeitos apenas ao Imposto Sobre Serviços. O próprio venerando acórdão recorrido (fls. 13826 SÚMULAS - PRECEDENTES 140), entendeu que a principal finalidade do recorrido é a prestação de serviços médicos e não a venda de remédios e refeições a serem fornecidos a seus pacientes e salientou que: O hospital não tem por objetivo precípuo vender remédios e muito menos refeições (...) (fl. 139). E que: A diária hospitalar é compreensiva do leito, da refeição balanceada (...) (fl. 139). Ora, se assim entendeu não poderia concluir que o ISS não incide sobre a parte referente ao fornecimento de remédios e alimentação que integram o tratamento e as diárias hospitalares e constituem serviços incluídos na lista, estando sujeitos apenas ao ISS. No caso não se pode destacar da prestação de serviços de assistência médica, como um todo, a parte dela integrante, referente ao fornecimento de remédios e alimentação aos pacientes. O Colendo Supremo Tribunal Federal já entendeu que o Imposto de Circulação de Mercadorias não incide sobre a alimentação e remédios fornecidos pelos hospitais ao cliente ao prestar-lhe a assistência médica, como se verifica dos Recursos Extraordinários n. 75.760-RJ, RTJ 70/473 e n. 86.343-PB, RTJ 91/565 e no Agravo de Instrumento n. 51.045-SP, RTJ 56/427. Dou provimento ao recurso para reformar o venerando aresto recorrido e restabelecer a respeitável sentença monocrática e inverter as penas de sucumbência. RECURSO ESPECIAL N. 130.621-CE (97.0031268-2) Relator: Ministro Francisco Peçanha Martins Recorrente: Município de Fortaleza Advogado: Edvaldo Assunção e Silva e outros Recorrido: Ultra Som S/C Ltda. Advogado: José Matias Sousa Neto RSSTJ, a. 5, (21): 11-33, agosto 2011 27 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EMENTA Tributário. Imposto Sobre Serviços (ISS). Hospitais. Base de cálculo. Incidência. Precedentes. - As diárias hospitalares estão sujeitas à incidência do ISS, mesmo envolvendo o valor referente aos medicamentos e a alimentação. - Recurso conhecido pela letra c e provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso quanto a alínea c e lhe dar provimento. Votaram com o Relator os Ministros Eliana Calmon e Francisco Falcão. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Paulo Gallotti. Brasília (DF), 28 de setembro de 1999 (data do julgamento). Ministro Francisco Peçanha Martins, Presidente e Relator DJ 27.03.2000 RELATÓRIO O Sr. Ministro Francisco Peçanha Martins: Trata-se de recurso especial manifestado pelo Município de Fortaleza, com fundamento nas letras a e c do permissivo constitucional contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Ceará que, por unanimidade, negou provimento à remessa oficial e à apelação do ora recorrente interposta nos autos da ação mandamental impetrada por Ultra Som S/C Ltda., objetivando seja decretada a ilegalidade da cobrança do ISS, sobre a receita bruta. O v. acórdão confirmou a r. sentença a qual decidiu que o preço dos medicamentos e o das refeições, não compondo o preço do serviço por falta de previsão legal devem ser excluídos da base de cálculo do ISS, visto constituírem objeto de incidência do ICMS. Daí o apelo especial em que a ora recorrente alega ter o aresto contrariado o artigo 1º, § 3º, inciso III e artigo 8º, § 1º do DL n. 406/1968, bem como 28 SÚMULAS - PRECEDENTES divergido de julgados deste STJ e de outros Tribunais do país, quando determinou a exclusão da base de cálculo do preço do serviço, os medicamentos ministrados e as refeições fornecidas. Contra-razões às fls. 112-122. O recurso foi admitido pelo Tribunal a quo, subindo os autos a esta Eg. Corte, onde vieram a mim conclusos. Dispensei o parecer da Subprocuradoria-Geral da República, nos termos regimentais. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Francisco Peçanha Martins (Relator): Cuida-se, na hipótese dos autos, de questão atinente à base de cálculo do ISS, com ou sem a inclusão do valor dos medicamentos, alimentos e mercadorias envolvidas na prestação de serviços. O Município recorrente insurge-se contra a decisão do Tribunal a quo, ao declarar que “os hospitais ao adquirirem remédios, alimentos e mercadorias outras de que se utilizam, no atendimento aos pacientes, no ato da aquisição já vem embutido nos preços o imposto incidente sobre tais produtos, sendo portanto considerados como consumidores finais (...),” e que não seria justo onerar duas vezes a mesma coisa, por exigência da autoridade municipal, querendo tributar matérias que não consistem em serviço, porque importaria num bis in idem. Em síntese, o acórdão negou provimento à apelação do recorrente especial ao fundamento de que, não havendo previsão legal, o preço dos medicamentos, das refeições e mercadorias não compõem a base de cálculo para a incidência do ISS e que, incidindo sobre os mesmos o ICMS, não comportaria a cobrança de qualquer outro tributo. Daí este apelo especial fundado nas letras a e c do autorizativo constitucional. O Tribunal a quo, ao decidir a lide, sequer mencionou os preceitos legais invocados como contrariados e não foram opostos os embargos de declaração cabíveis, carecendo o recurso do prequestionamento da questão federal, indispensável à admissibilidade do apelo nesta instância (Súmula n. 282-STF). RSSTJ, a. 5, (21): 11-33, agosto 2011 29 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Conheço do recurso, porém, pela divergência jurisprudencial, por isso que comprovada nos termos legais e regimentais (Lei n. 8.038/1990 e RISTJ, art. 255 e §§). A jurisprudência desta Segunda Turma é firme no sentido de que o valor da alimentação e dos remédios fornecidos nos hospitais está embutido nas diárias hospitalares e se incluem na base de cálculo do ISS. Como precedentes, alinho os seguintes julgados transcrevendo as respectivas ementas: Tributário. ISS. Base de cálculo. Hospitais. O valor da alimentação e dos medicamentos fornecidos pelos hospitais está embutido nas diárias hospitalares e faz parte da base de cálculo do Imposto Sobre Serviços. Recurso especial não conhecido. (REsp n. 11.533-SP, D.J. 06.11.1995, Rel. Min. Ari Pargendler). Tributário. Imposto Sobre Serviços. Estabelecimento hospitalar. Medicação e alimentos. Serviços de assistência médica prestados aos pacientes. Incidência do tributo. Os serviços de assistência médica prestados pelos hospitais aos seus parentes, mesmo envolvendo a parte relativa ao fornecimento de remédios e alimentos, estão sujeitos ao ISS. (REsp n. 25.599-SP, D.J. 11.09.1995, Rel. Min. Hélio Mosimann). Comungo desse entendimento, razão pela qual conheço do recurso pela letra c, dando-lhe provimento. VOTO-VISTA A Sra. Ministra Eliana Calmon: - 1. Neste recurso, cujo Relator é o Ministro Peçanha Martins, discute-se quanto à ilegalidade da cobrança do ISS sobre a receita bruta, porque o entendimento de ambas as instâncias ordinárias foi de que, da receita bruta, para efeito de determinar-se a base de cálculo do ISS, deveriam ser excluídos os preços dos medicamentos e das refeições, por não comporem eles o preço do serviço, por falta de previsão legal. 2. Alegou o Município recorrente que o aresto contrariou os arts. 1º, § 3º, inciso III e 8º, § 1º do DL n. 406/1968, ao tempo em que divergiu de julgados desta Corte que sustentam a exclusão, da base de cálculo do preço do serviço, do valor dos medicamentos e das refeições. 3. O Relator, em judicioso voto, embora inadmitisse o recurso pela letra a (Súmula n. 282-STF), dele conhecia por divergência jurisprudencial. 30 SÚMULAS - PRECEDENTES Afirmou S. Exa. que era firme o entendimento da Segunda Turma, quanto a não-exclusão do valor dos remédios e da alimentação das diárias hospitalares, sobre as quais incidem o ISS. E, para demonstrar a assertiva, trouxe à colação dois precedentes: Tributário. ISS. Base de cálculo. Hospitais. O valor da alimentação e dos medicamentos fornecidos pelos hospitais está embutido nas diárias hospitalares e faz parte da base de cálculo do Imposto Sobre Serviços. Recurso especial não conhecido. (REsp n. 11.533-SP, DJ de 06.11.1995, Rel. Min Ari Pargendler). Tributário. Imposto sobre serviços. Estabelecimento hospitalar. Medicação e alimentos. Serviços de assistência médica prestados aos pacientes. Incidência do tributo. Os serviços de assistência médica prestados pelos hospitais aos seus pacientes, mesmo envolvendo a parte relativa ao fornecimento de remédios e alimentos, estão sujeitos ao ISS. (REsp n. 25.599-SP, DJ de 11.09.1995, Rel. Min. Hélio Mosimann). Finalizando, concluiu o Relator pelo provimento do especial, pela letra c. 4. Não familiarizada com a jurisprudência, ainda, pedi vista para melhor compreender a querela. Verifiquei que também a Primeira Turma tem posicionamento idêntico ao adotado por este órgão fracionário, como demonstram os arestos seguintes: ISS. Serviços de assistência médica. Medicamentos e refeições servidos nos hospitais. Incidência. Como os serviços de assistência médica prestados pelos hospitais são incluídos na lista anexa ao Decreto-Lei n. 406/1968 e envolvem o fornecimento de mercadorias (remédios e alimentação) estão eles sujeitos apenas do ISS. Não se pode destacar da prestação de serviços de assistência médica, como um todo, a parte dela integrante referente ao fornecimento de remédios e alimentação aos pacientes. Recurso provido. (REsp n. 40.161-SP, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ de 21.02.1994, unânime). Tributário. ISS. Hospital. Fornecimento de refeições e medicamentos. O preço de refeições e medicamentos, fornecidos em hospitais, integra-se ao valor dos serviços de assistência médica, para efeito de incidência do ISS (DL n. 406/1968, art. 8º, § 1º e item n. 02 da lista anexa). (REsp n. 36.199-SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 19.09.1994). RSSTJ, a. 5, (21): 11-33, agosto 2011 31 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA É bem verdade que o Ministro José Delgado inaugurou divergência no REsp n. 132.435-CE, assim proclamado: Tributário. Serviços hospitalares. ISS. Medicamentos utilizados e refeições servidas nos hospitais. Não incidência. 1. Não há que se falar em incidência do ISS sobre mercadorias envolvidas na prestação do serviço efetuado nos hospitais. 2. Precedente. 3. Recurso improvido. A divergência, segundo o Ministro José Delgado, apoiou-se em lição do Prof. Hugo de Brito Machado, e em precedente desta Corte, relatado pelo Ministro Garcia Vieira, cujo verbete resumo é o seguinte: ISS. Serviços de assistência médica. Medicamentos e refeições servidos nos hospitais. Incidência. Como os serviços de assistência médica prestados pelos hospitais são incluídos na lista anexa ao Decreto-Lei n. 406/1968 e envolvem o fornecimento de mercadorias (remédios e alimentação) estão eles sujeitos apenas ao ISS. Não se pode destacar da prestação de serviços de assistência médica, como um todo, a parte dela integrante referente ao fornecimento de remédios e alimentação aos pacientes. Recurso provido. (REsp n. 40.161-5-SP, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ de 21.02.1994). Peço vênia para divergir do Ministro José Delgado, o que faço na convicção de que, na política fiscal de ajustamento do ICMS e do ISS, em que disputam Estados e Municípios fatia de arrecadação, a elaboração da lista de serviços do DL n. 406/1968 levou em consideração as situações de per si, de modo a não fazer incidir o ICMS, quando os serviços superassem o valor das mercadorias, de forma a fazer-se uma equilibrada divisão do campo de incidência. Dentro deste enfoque, a interferência do Judiciário para interpretar a norma dentro de uma lógica sua, sem levar em conta a política legislativa, longe de pacificar, mais acirra a disputa entre entes estatais. Entendo, consequentemente, que não está o Judiciário autorizado a proceder ao não-cômputo dos valores dos remédios e da alimentação das diárias hospitalares, porquanto superam os serviços o valor dos itens expurgados. 32 SÚMULAS - PRECEDENTES Assinalo, ainda, que o precedente relatado pelo Ministro Garcia Vieira e que foi apontado como alavanca para a mudança de posição, ao contrário da tese defendida pelo Ministro José Delgado, proclama a incidência do ISS sobre os valores questionados. Por tudo isso, portanto, não tenho dúvida em acompanhar o Relator, Ministro Peçanha Martins. É o voto. VOTO O Sr. Ministro Francisco Falcão: Sr. Presidente, também acompanho o bem lançado voto-vista da Sra. Ministra Eliana Calmon que, por sua vez, acompanhou o voto V. Exa. RSSTJ, a. 5, (21): 11-33, agosto 2011 33 Súmula n. 275 SÚMULA N. 275 O auxiliar de farmácia não pode ser responsável técnico por farmácia ou drogaria. Referências: Lei n. 3.820/1960, arts. 13, 14 e 16. Lei n. 5.692/1971 revogada pela Lei n. 9.394/1996. Decreto n. 793/1993, que alterou o Decreto n. 74.170/1974 e o Decreto 79.094/1977, que regulamentam, respectivamente, a Lei n. 5.991/1973 e a Lei 6.360/1976. Precedentes: AgRg no REsp 278.904-SP (1ª T, 16.10.2001 – DJ 18.02.2002) REsp 143.337-AL (2ª T, 04.10.2001 – DJ 11.03.2002) REsp 167.987-SP (1ª T, 27.11.2001 – DJ 03.06.2002) REsp 205.935-SP (1ª T, 21.06.2001 – DJ 1º.04.2002) REsp 270.853-SP (2ª T, 12.06.2001 – DJ 17.09.2001) REsp 280.401-SP (2ª T, 07.05.2002 – DJ 1º.07.2002) Primeira Seção, em 12.03.2003 DJ 19.03.2003, p. 141 AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL N. 278.904-SP (2000.0096458-1) Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros Agravante: Luiz Carlos Pazeto Advogado: Olavo José Vanzelli e outro Agravado: Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo Advogado: Patrícia Aparecida Simoni Barretto e outros EMENTA Registro profissional. Auxiliar de farmácia. Curso autorizado pelo Ministério do Estado de Educação. Lei n. 5.692/1971. “O ‘auxiliar de farmácia’, de nível médio, habilitado com carga horária de trabalho escolar inferior ao mínimo exigido para o ensino de segundo grau, sem direito ao prosseguimento de estudos em nível superior, também carece de direito líquido e certo para assumir a responsabilidade técnica na atividade farmacêutica. A legislação de regência não contempla, como direito líquido e certo, a sua inscrição no Conselho Regional de Farmácia”. (REsp n. 173.317-Milton). Os auxiliares de farmácia, mesmo que o curso seja reconhecido, não podem ser responsáveis por farmácias e drogarias - Lei n. 5.692/1971, artigos 22 e 23. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros José Delgado e Garcia Vieira votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Falcão. Brasília (DF), 16 de outubro de 2001 (data do julgamento). Ministro José Delgado, Presidente Ministro Humberto Gomes de Barros, Relator DJ 18.02.2002 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RELATÓRIO O Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros: Luiz Carlos Pazeto intenta Agravo Regimental contra decisão em que confirmei acórdão do TRF da 3ª Região “que entendeu não haver a possibilidade de inscrição do auxiliar de farmácia no CRF, pois o curso que capacita tais profissionais perfaz carga horária inferior ao exigido por lei para formação de um técnico-profissional”. 175 - (fls. 182-183). Fundamentei a negativa de seguimento do recurso citando, a exemplo, os seguintes REsp’s: n. 170.944; n. 173.317 e n. 173.714-Milton; e, n. 169.633-Nancy. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros (Relator): Correta a decisão agravada, assim expressa: O Recurso não merece prosperar. Restei vencido, juntamente com o Ministro Delgado, no REsp n. 173.714, relatado para acórdão pelo Ministro Milton. A jurisprudência está no mesmo sentido do acórdão recorrido, verbis: Mandado de segurança. Ausência de direito líquido e certo. Registro profissional. Auxiliar de farmácia. Curso autorizado pelo Ministério do Estado de Educação. Inexistência de quadro profissional específico. Necessidade de lei em sentido estrito. Impossibilidade de requerimento de registro com conseqüente assunção de responsabilidade técnica de estabelecimento farmacêutico. Necessidade de atendimento do art. 14, parágrafo único da Lei n. 3.820/1960 e art. 15, § 3º da Lei n. 5.991/1973. Dilação probatória incompatível com a imprescindibilidade da prova preconstituída. I - A terminologia utilizada pela Lei n. 5.991/1973 “ou outro, igualmente inscrito no Conselho Regional de Farmácia, na forma da lei”, em seu art. 15, § 3º, deve ser interpretada restritivamente, pois está condicionada a existência de lei estrito senso, e apenas estendeu o rol do art. 14, parágrafo único da Lei n. 3.820/1960, para a finalidade excepcional de “razão do interesse público, caracterizada a necessidade de farmácia ou drogaria, e na falta de farmacêutico”, sujeito, ainda, ao licenciamento do “órgão sanitário competente da fiscalização local.” II - Dada a própria natureza subjetiva dos conceitos abertos indeterminados de “interesse público”, “necessidade” e “falta de 40 SÚMULAS - PRECEDENTES farmacêutico”, e a controvérsia de seu atendimento, torna-se imprópria a sua discussão em sede mandamental, além de inexistente prova preconstituída de preenchimento dos requisitos excepcionais. (REsp n. 169.633-Nancy); Administrativo. Mandado de segurança. Auxiliar de farmácia. Inscrição no Conselho Regional de Farmácia. Leis n. 3.820/1960 e n. 5.692/1971, n. 5.991/1973 e n. 5.210/1978. Decretos n. 74.170/1974 e n. 793/1993. Resoluções n. 101/1973 e n. 11/1973. CFF. Resolução n. 2/1973. CFE. 1. O “auxiliar de farmácia”, de nível médio, habilitado com carga horária de trabalho escolar inferior ao mínimo exigido para o ensino de segundo grau, sem direito ao prosseguimento de estudos em nível superior, também carece de direito líquido e certo para assumir a responsabilidade técnica na atividade farmacêutica. A legislação de regência não contempla, como direito líquido e certo, a sua inscrição no Conselho Regional de Farmácia. 2. Precedentes jurisprudenciais. 3. Recurso sem provimento. (REsp n. 173.317-Milton; do mesmo Relator, o REsp n. 170.944). Nego seguimento ao recurso. (CPC, art. 557). - fls. 182-183 -. A matéria prossegue pacificada neste Tribunal, verbis: Administrativo. Conselho de farmácia. Inscrição. 1. Há duas categorias distintas, ambas de nível médio, que não se confundem, em atribuições, com profissionais de farmácia. 2. Os antigos oficiais de farmácia, práticos quando regulamentada a profissão, ficaram preservados e com direito a inscreverem-se no Conselho e serem responsáveis por farmácias e drogarias - Súmula n. 120-STJ - art. 114, parágrafo único, letras a e b - Lei n. 3.820/1960. 3. Diferentemente, os auxiliares de farmácia ou os novos oficiais, de nível médio, mesmo que o curso seja reconhecido, não podem ser responsáveis por farmácias e drogarias - Lei n. 5.692/1971, artigos 22 e 23. 4. O impetrante, ora recorrente, como auxiliar, não pode ser inscrito no Conselho. 5. Recurso especial provido. (REsp n. 143.343-Eliana). De todo o enunciado se infere o acerto da decisão recorrida: o auxiliar de farmácia não pode ser inscrito no Conselho. Nego provimento ao Agravo Regimental. RSSTJ, a. 5, (21): 35-64, agosto 2011 41 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO ESPECIAL N. 143.337-AL (97.0055674-3) Relator: Ministro Franciulli Netto Recorrente: Conselho Regional de Farmácia - CRF-AL Advogado: José Claudionor Rocha Lima Melo e outros Recorrido: Élida Costa Cavalcante Advogado: José Damasceno Lima e outro EMENTA Administrativo. Mandado de segurança. Auxiliar de farmácia. Conselho Regional de Farmácia. Inscrição. Lei n. 5.692/1971. Artigo 22. Impossibilidade. O Decreto n. 74.170/1974, em seu artigo 28, § 2o, b, na redação que lhe conferiu o Decreto n. 793/1993, considerou aptos para assumir a responsabilidade técnica pelas farmácias e drogarias, os técnicos formados em curso de segundo grau, com diploma registrado no Ministério da Educação e Cultura, e inscrito no Conselho Regional de Farmácia, observadas as exigências dos artigos 22 e 23 da Lei n. 5.692/1971, que estabelecem que o ensino de segundo ciclo compreende 2.200 ou 2.900 horas de trabalho escolar efetivo e habilita ao prosseguimento de estudos em grau superior. O curso de auxiliar de farmácia concluído pela recorrida não se amolda às exigências da legislação de regência, visto que a carga horária cursada encontra-se muito abaixo do mínimo exigido para a inscrição no respectivo órgão profissional. Recurso especial provido. Decisão por unanimidade de votos. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Laurita Vaz, Paulo Medina, Francisco 42 SÚMULAS - PRECEDENTES Peçanha Martins e Eliana Calmon votaram com o Sr. Ministro Relator. Custas, como de lei. Brasília (DF), 04 de outubro de 2001 (data do julgamento). Ministra Eliana Calmon, Presidente Ministro Franciulli Netto, Relator DJ 11.03.2002 RELATÓRIO O Sr. Ministro Franciulli Netto: Trata-se de recurso especial interposto pelo Conselho Regional de Farmácia de Alagoas - CRF-AL, com fulcro no artigo 105, inciso III, alíneas a e c, da Constituição Federal, contra v. acórdão proferido pela Segunda Turma do egrégio Tribunal Regional Federal da 5a Região, que deu provimento à apelação da recorrida. Élida Costa Cavalcante impetrou mandado de segurança, com pedido de liminar, contra ato do Presidente do CRF-AL, que indeferiu o pedido de registro do seu título de auxiliar de farmácia naquele Conselho, conforme determina o artigo 13 da Lei n. 3.820/1960, para o exercício de atividades profissionais farmacêuticas no país. Afirmou a impetrante que concluiu o curso em comento em 13.01.1995, no Centro de Estudos de 1o e 2o Graus Pe. Teófanes Augusto de Araújo Barros - CEPS, aprovado pelo Conselho Estadual de Educação do Estado de Alagoas. A segurança foi denegada pelo Juízo de primeiro grau sob o fundamento de que “o curso de Auxiliar de Farmácia que realizara, muito embora rotulado de segundo grau, a sua carga horária não autorizaria a considerá-lo como tal, pois atingiu apenas 362 horas/aula, ficando muito aquém da exigência de 2.200 horas, estabelecida como carga horária mínima para os cursos de segundo grau, pela Lei n. 5.692. de 11.08.1971.” (fl. 80). Irresignada com esse desate, a impetrante ajuizou apelação, cujo v. acórdão do Tribunal de origem restou assim ementado: Administrativo. Conselho Regional de Farmácia. Inscrição. Possibilidade. Exercício da profissão de auxiliar de farmácia. Alteração de nomenclatura (auxiliar de farmácia hospitalar ou oficial de farmácia). Nível de segundo grau. Curriculum. Carga horária. RSSTJ, a. 5, (21): 35-64, agosto 2011 43 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 1 - Auxiliar de Farmácia é a nova nomenclatura do “Auxiliar de Farmácia Hospitalar” e “Oficial de Farmácia” e atende, tanto à Farmácia Hospitalar, quanto à Farmácia Comercial. 2 - O conteúdo curricular e a carga horária do curso de Auxiliar de Farmácia - de nível de 2o grau - atendem às exigências do CFE e habilitam o portador do certificado a ter sua inscrição no Conselho de Farmácia. (Leis n. 3.820/1960, art. 14, b, n. 5.991/1973, art. 15, § 3o e Decreto n. 74.170/1974). 3 - Apelação provida (fl. 94). Inconformado, o Conselho Regional de Farmácia de Alagoas - CRF-AL interpõe recurso especial alegando, primeiramente, violação ao artigo 14 da Lei n. 3.820/1960, que criou os Conselhos Regionais de Farmácia e disciplinou a inscrição dos profissionais de farmácia, estabelecendo a distinção entre o Quadro de Farmacêuticos e o pessoal inscrito em quadro distinto, não incluindo o auxiliar de farmácia nesse quadro. Assegura que, conforme o artigo 1o da Resolução n. 198/1989 do Conselho Federal de Farmácia, é vedada a aprovação, pelos Conselhos Regionais de Farmácia, de inscrição de “auxiliar de farmácia”. Afirma, ademais, que o curso técnico exige uma carga horária de, no mínimo, 2.200 horas, ao passo que o curso de auxiliar de farmácia, da qual é detentora a recorrida, apenas consta de uma carga horária de 362 horas/aula, ou seja, aquém do exigido pela Lei de Diretrizes e Bases para Ensino de 1o e 2o graus, Lei n. 5.592, de 11 de agosto de 1971, em seus artigos 22 e 23, e pelo artigo 28. § 2o, alínea b, do Decreto Federal n. 74.170/1974, alterado pelo Decreto n. 793/1993. Por fim, colaciona precedente daquela colenda Corte, da lavra do douto Juiz Francisco Falcão, agora Ministro deste egrégio Superior Tribunal de Justiça, o qual negou provimento à apelação sob o fundamento de que o certificado de conclusão de 2o grau de Habilitação Profissional de Farmácia fornecido pela impetrante não observou a carga horária determinada pela Lei n. 5.692/1971. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Franciulli Netto (Relator): Versam os autos sobre a possibilidade de inscrição em quadro profissional da categoria denominada Auxiliar de Farmácia. 44 SÚMULAS - PRECEDENTES A Lei n. 3.820/1960, em seu artigo 14, parágrafo único, admitiu a inscrição no Conselho Regional de Farmácia dos práticos ou oficiais de farmácia licenciados, categoria de profissionais então existente, além dos profissionais que, embora não farmacêuticos, exerçam sua atividade como responsáveis ou auxiliares técnicos de laboratórios industriais farmacêuticos, laboratórios de análises clínicas e laboratórios de controle e pesquisas relativas a alimentos, drogas, tóxicos e medicamentos. Nesse sentido, não fez alusão à categoria da recorrida, qual seja, a de auxiliar de farmácia. Posteriormente, entretanto, a Lei n. 5.991/1973, em seu artigo 15, § 3o, estendeu o rol das hipóteses de inscrição no referido órgão profissional, ao estabelecer, in verbis: Art. 15 - A farmácia e a drogaria terão, obrigatoriamente, a assistência do técnico responsável, inscrito no Conselho Regional de Farmácia, na forma da lei. (omissis); § 3o - Em razão do interesse público, caracterizada a necessidade da existência de farmácia ou drogaria e na falta de farmacêutico, o órgão sanitário competente de fiscalização local licenciará os estabelecimentos sob a responsabilidade técnica de prático de farmácia, oficial de farmácia ou outro, igualmente inscrito na forma da lei. Por fim, o Decreto n. 74.170/1974, regulamentando a Lei acima referida, em seu art. 28, § 2o, b, na redação que lhe conferiu o Decreto n. 793, de 05.04.1993, considerou aptos para assumir essa responsabilidade técnica pelas farmácias e drogarias, os técnicos formados em curso de segundo grau, oficiais ou reconhecidos pelo Conselho Federal de Educação, com diploma registrado no Ministério da Educação e Cultura, e inscrito no Conselho Regional de Farmácia, observadas as exigências dos artigos 22 e 23 da Lei n. 5.692/1971, que estabelecem que o ensino de segundo ciclo compreende 2.200 ou 2.900 horas de trabalho escolar efetivo e habilita ao prosseguimento de estudos em grau superior. Dessarte, além dos práticos ou oficiais de farmácia, possibilitou-se que se tornassem responsáveis por farmácias e drogarias, também os técnicos formados em segundo grau, com diploma registrado no Ministério da Educação e Cultura e inscrito no Conselho Regional de Farmácia, desde que cumpridos os requisitos previstos em lei. In casu, a recorrida demonstrou deter a qualidade de auxiliar de farmácia, mediante certificado expedido em 24 de julho de 1995, pelo Centro de Estudos RSSTJ, a. 5, (21): 35-64, agosto 2011 45 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA de 1o e 2o Graus “Pe. Teófanes Augusto de Araújo Barros” - CEPS, onde se consigna ter tido o curso a duração de 362 horas (fl. 13). Nesse sentido, o curso de auxiliar de farmácia de que participou não se amolda às exigências da legislação de regência (Lei n. 5.991/1973, art. 15, § 3o e Decreto n. 74.170/1974, art. 28, § 2º, b, na redação que lhe conferiu o Decreto n. 793/1993), visto que a carga horária cursada pela recorrida encontra-se muito abaixo do mínimo exigido, de 2.200 ou 2.900 horas de currículo escolar efetivo, para a inscrição no respectivo órgão profissional. Ora, se assim é, não há como se reconhecer à recorrida o pretendido direito líquido e certo em ver-se registrada no Conselho Regional de Farmácia, porquanto não possui habilitação para tanto. Desse modo, diante da ausência de amparo legal à sua pretensão, torna-se inviável o seu registro nos quadros daquele Conselho Regional de Farmácia. Nessa trilha de raciocínio, permita-se citar julgado da relatoria do eminente Ministro Milton Luiz Pereira: Administrativo. Mandado de segurança. Auxiliar de farmácia. Inscrição no Conselho Regional de Farmácia. Leis n. 3.820/1960 e n. 5.692/1971 - CFF. Resolução n. 2/73 - CFE. 1. O “auxiliar de farmácia”, de nível médio, habilitado com carga horária de trabalho escolar inferior ao mínimo exigido para o ensino de segundo grau, sem direito ao prosseguimento de estudos em nível superior, também carece de direito líquido e certo para assumir a responsabilidade técnica na atividade farmacêutica. A legislação de regência não contempla, como direito líqüido e certo, a sua inscrição no Conselho Regional de Farmácia. 2. Recurso sem provimento (REsp n. 170.944-SP, in DJ de 24.05.1999). Mais a mais, ad argumentandum tantum, ainda que se cogitasse da possibilidade da soma das cargas horárias do curso de segundo grau concluído pela recorrida com as do curso de auxiliar de farmácia em análise, essa hipótese não estaria configurada na espécie dos autos, porquanto não demonstrado o número de horas cumpridas no primeiro. Vale ressaltar, por último, que não se trata de reexame de matéria de fato, uma vez que ficou devidamente esclarecida, na sentença de primeiro grau, a quantidade de horas-aula cumpridas pela recorrida e, nada obstante, entendeu o Tribunal de origem serem elas suficientes para o registro profissional, em manifesto desacordo com os ditames da Lei n. 5.692/1971. Pelo que precede, dou provimento ao recurso especial. É como voto. 46 SÚMULAS - PRECEDENTES RECURSO ESPECIAL N. 167.987-SP (98.0019900-4) Relator: Ministro Francisco Falcão Recorrente: Amilton de Souza Amaro e outros Advogado: Olavo José Vanzelli e outro Recorrido: Conselho Regional de Farmácia - CRF Advogado: Patrícia Aparecida Simoni Barretto e outros EMENTA Administrativo. Auxiliar de farmácia. Inscrição no Conselho Regional de Farmácia. - Os portadores dos certificados de auxiliar de farmácia, expedidos pelo Senac, habilitados com carga inferior ao mínimo exigido para o ensino de segundo grau, não fazem jus ao registro no Conselho Regional de Farmácia, não estando aptos a assumir a responsabilidade técnica por farmácia. - Não existe equiparação entre os auxiliares de farmácia e os oficiais de farmácia habilitados com fulcro nos Decretos n. 20.373/1931 e n. 20.877/1931 e arts. 32 e 33, da Lei n. 3.820/1960. - Recurso improvido. ACÓRDÃO Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, decide a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Os Srs. Ministros Garcia Vieira, Humberto Gomes de Barros e José Delgado votaram com o Sr. Ministro Relator. Custas, como de lei. Brasília (DF), 27 de novembro de 2001 (data do julgamento). Ministro José Delgado, Presidente Ministro Francisco Falcão, Relator DJ 03.06.2002 RSSTJ, a. 5, (21): 35-64, agosto 2011 47 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RELATÓRIO O Sr. Ministro Francisco Falcão: Trata-se de recurso especial interposto por Amilton de Souza Amaro e outros, com fulcro no artigo 105, III, alíneas a e c do permissivo constitucional, contra v. acórdão do Tribunal Regional Federal da Terceira Região assim ementado, verbis: Mandado de segurança. Administrativo. Conselho Regional de Farmácia. Registro. Auxiliar de farmácia. Decreto n. 793, de 05.04.1993. - O Decreto n. 793, de 05.04.1993 mantém as exigências dos artigos 22 e 23 da Lei n. 5.692/1971, dentre as quais o cumprimento de, pelo menos, 2.200 ou 2.900 horas de trabalho escolar efetivo. - Os impetrantes não cumpriram o horário previsto no Decreto n. 793, de 05.04.1993. Inexistência do direito de registro na categoria “Auxiliar de Farmácia”. - Remessa oficial provida. Opostos embargos declaratórios, foram eles rejeitados. Sustentam os recorrentes que em assim decidindo o Tribunal a quo violou diversos dispositivos de lei federal, bem como divergiu de entendimento jurisprudencial de outros Tribunais. Afirmam que são titulares de diploma como auxiliar de farmácia, expedidos pelo Senac, e possuem qualificação parcial de 2º grau, compatível com a inscrição no Conselho Profissional, segundo a Lei n. 5.991/1973. Instado, o douto Ministério Público Federal manifestou-se pelo desprovimento do recurso. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Francisco Falcão (Relator): Os recorrentes, auxiliares de farmácia, pleiteiam o reconhecimento à inscrição profissional no Conselho Regional de Farmácia de São Paulo, para se tornarem aptos a trabalhar como responsáveis técnicos em farmácias. Para tanto, apresentam certificados expedidos pelo Senac, que os credenciam ao exercício da atividade de auxiliar de farmácia. A inscrição no Conselho Regional de Farmácia está disciplinada pela Lei n. 3.820/1960, para os seguintes quadros: 48 SÚMULAS - PRECEDENTES Art. 13. - Somente aos membros inscritos nos Conselhos Regionais de Farmácia será permitido o exercício de atividades profissionais farmacêuticas no País. Art. 14. - Em cada Conselho Regional serão inscritos os profissionais de Farmácia que tenham exercício em seus territórios e que constituirão o seu quadro de farmacêuticos. Parágrafo único - Serão inscritos, em quadros distintos, podendo representarse nas discussões, em assuntos concernentes às suas próprias categorias; a) os profissionais que, embora não farmacêuticos, exerçam sua atividade (quando a lei autorize) como responsáveis ou auxiliares técnicos de laboratórios industriais farmacêuticos, laboratórios de análises clínicas e laboratórios de controle e pesquisas relativas a alimentos, drogas, tóxicos e medicamentos; b) os práticos ou oficiais de Farmácia licenciados. Art. 15. - Para inscrição no quadro de farmacêuticos dos Conselhos Regionais é necessário, além dos requisitos legais de capacidade civil: 1) ser diplomado ou graduado em Farmácia por instituto de ensino oficial ou a este equiparado; 2) estar com seu diploma registrado na repartição sanitária competente; 3) não ser nem estar proibido de exercer a profissão farmacêutica; 4) gozar de boa reputação por sua conduta pública, atestada por 03 (três) farmacêuticos inscritos. Art. 16. Para inscrição nos quadros a que se refere o parágrafo único do art. 14, além de preencher os requisitos legais de capacidade civil, o interessado deverá: 1) ter diploma, certificado, atestado ou documento comprobatório da atividade profissional, quando se trate de responsáveis ou auxiliares técnicos não farmacêuticos, devidamente autorizados por lei; 2) ter licença, certificado ou título, passado por autoridade competente, quando se trate de práticos ou oficiais de Farmácia licenciados; 3) não ser nem estar proibido de exercer sua atividade profissional; 4) gozar de boa reputação por sua conduta pública, atestada por 03 (três) farmacêuticos devidamente inscritos. O v. acórdão recorrido obstou tal pretensão, sob o argumento de que falta a categoria de auxiliar de farmácia amparo legal para efetuar inscrição no referido Conselho, in verbis: Ademais, a legislação superveniente, o Decreto n. 793, de 05 de abril de 1993 ressalta em seu artigo 1º que as exigências dos artigos 22 e 23 da Lei n. 5.692/1971 ficam mantidas, quais sejam: RSSTJ, a. 5, (21): 35-64, agosto 2011 49 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Art. 22 - O ensino de 2º grau terá três ou quatro séries anuais conforme previsto para cada habilitação, compreendendo, pelo menos, 2.200 ou 2.900 horas de trabalho escolar efetivo, respectivamente. Art. 23 - Observado o que sobre o assunto conste da legislação própria: a) a conclusão da 3ª série do ensino de 2º grau, ou do correspondente no regime de matrícula por disciplina, habilitará ao prosseguimento de estudos em grau superior. Ora, conforme revelam os certificados de fls. 24-26, os impetrantes não cumpriram o horário de trabalho escolar efetivo acima exigido. Destarte, tais documentos ainda salientam que os impetrantes estão habilitados na “parte referente à Formação Especial sem direito a prosseguir os estudos em nível superior”. Desse modo, é de se reconhecer a impossibilidade de registro nos quadros do Conselho Regional de Farmácia, na categoria de “Auxiliar de Farmácia”, diante da ausência de amparo legal (...). Efetivamente, os recorrentes não participam de nenhum dos quadros acima explicitados, não se equiparando aos práticos ou oficiais de farmácia, habilitados com fulcro nos Decretos n. 20.377/1931; n. 20.877/1931; DecretoLei n. 8.345/1945 e Lei n. 1.472/1951 e art. 32 e 33, da Lei n. 3.820/1960, estes últimos regramentos assim definidos, verbis: Art. 32. - A inscrição dos profissionais e práticos já registrados nos órgãos de Saúde Pública na data desta lei, será feita, seja pela apresentação de títulos, diplomas, certificados ou cartas registradas no Ministério da Educação e Cultura, ou Departamentos Estaduais, seja mediante prova de registro na repartição competente. Parágrafo único - Os licenciados, práticos habilitados, passarão a denominarse, em todo território nacional, “oficial de farmácia”. Art. 33. - Os práticos e oficiais de Farmácia, já habilitados na forma da lei, poderão ser provisionados para assumirem a responsabilidade técnicoprofissional para farmácia de sua propriedade, desde que, na data da vigência desta lei, os respectivos certificados de habilitação tenham sido expedidos há mais de 06 (seis) anos pelo Serviço Nacional de Fiscalização da Medicina ou pelas repartições sanitárias competentes dos Estados e Territórios, e sua condição de proprietários de farmácia datado de mais de 10 (dez) anos, sendo-lhes, porém, vedado o exercício das mais atividades privativas da profissão de farmacêutico. § 1º - Salvo exceção prevista neste artigo, são proibidos provisionamentos para quaisquer outras finalidades. 50 SÚMULAS - PRECEDENTES § 2º - Não gozará do benefício concedido neste artigo o prático ou oficial de Farmácia estabelecido com farmácia sem a satisfação de todas as exigências legais ou regulamentares vigentes na data da publicação desta lei. Nesse contexto, tenho que os portadores dos certificados de “auxiliar de farmácia”, expedidos pelo Senac, habilitados com carga horária de trabalho escolar inferior ao mínimo exigido para o ensino de segundo grau, não fazem juz ao registro no Conselho Regional de Farmácia, não estando aptos a assumir a responsabilidade técnica por farmácia. Tais as razões expendidas, nego provimento ao recurso. É o voto. RECURSO ESPECIAL N. 205.935-SP (99.0018739-3) Relator: Ministro Milton Luiz Pereira Recorrente: Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo CRF Advogado: Patrícia Aparecida Simoni Barretto e outros Recorrido: Antônio Francisco de Camargo e outros Advogado: Olavo José Vanzelli e outros Sustentação oral: Marcus Elidius Michelli de Almeida, pela parte recorrente EMENTA Administrativo. Mandado de segurança. Auxiliar de farmácia. Curso de qualificação profissional (Senac - Ceusp). Inscrição no Conselho Regional de Farmácia. Leis n. 3.820/1960, n. 5.692/1971 e n. 5.210/1978. Decretos n. 74.170/1974 e n. 793/1993. Resoluções n. 2/1973, n. 101/1973 e n. 111/1973 - CFE. Portaria n. 363/1995. 1. O “auxiliar de farmácia”, de nível médio, habilitado com carga horária de trabalho escolar inferior ao mínimo exigido para o ensino de segundo grau (médio), sem direito ao prosseguimento de estudos RSSTJ, a. 5, (21): 35-64, agosto 2011 51 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA em nível superior, carece de direito líquido e certo para assumir a responsabilidade técnica na atividade farmacêutica (farmácia ou drogaria). Os cursos ministrados no Senac e Ceusp possuem carga horária variando de 300 a 470 horas, portanto, inferior àquela necessária para o segundo grau. 2. Multifários precedentes jurisprudenciais. 3. Recurso provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, a Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros José Delgado, Francisco Falcão, Garcia Vieira e Humberto Gomes de Barros votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília (DF), 21 de junho de 2001 (data do julgamento). Ministro José Delgado, Presidente Ministro Milton Luiz Pereira, Relator DJ 1º.04.2002 RELATÓRIO O Sr. Ministro Milton Luiz Pereira: A colenda Sexta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região constituiu acórdão assim ementado: Administrativo. Auxiliar de farmácia. Conselho Regional de Farmácia. Sentença extra petita. Inocorrência. Registro. I. Não há desacordo entre a r. sentença monocrática e o pedido dos impetrantes. II. Não se pode falar em ausência de previsão legal para registro dos auxiliares de farmácia no Conselho impetrado. III. Aplicação do art. 5o, XIII da Constituição Federal. IV. Preliminar rejeitada. Apelação e remessa oficial improvidas. (fl. 224). Contra o aresto e com fulcro no artigo 105, inciso III, alíneas a e c, da Carta Magna, foi interposto Recurso Especial. 52 SÚMULAS - PRECEDENTES Em suas razões o Recorrente disse que, de acordo com o artigo 14 da Lei n. 3.820/1960, as categorias de Auxiliares Técnicos de Laboratórios e a de Auxiliares de Farmácia são totalmente distintas. Sustentou que “o curso de ‘auxiliar de farmácia’ não os habilita para assumir a responsabilidade técnica de estabelecimento farmacêutico, mas somente como auxiliares do farmacêutico, no desenvolvimento do trabalho em conjunto com este.” O Recorrente ressaltou que “mesmo que o curso da Impetrante seja reconhecido pelo Ministério da Educação e Cultura, somente poderá exercer suas atividades nos limites que a lei permitir, ou seja, somente em conjunto com o profissional farmacêutico, não podendo ser inscrita no Conselho Regional de Farmácia.” Disse ainda: XII - Assim, (...) técnico. omissis XXV - Assim, (...) técnico. (fls. 234-238). Simultaneamente foi interposto Recurso Extraordinário (art. 102, III, a, da CF), admitido na origem. Nas contra-razões, os Recorridos enfatizaram a não particularização, pelo Recorrente, dos artigos tidos como violados. Disseram ainda que o Recorrente trouxe legislação superveniente, “não tendo o devido cuidado de verificar que os certificados dos ‘auxiliares de farmácia’ eram anteriores, não podendo a demanda ser visualizada pelo Decreto novo”. Registraram também que a “legislação vigente considera o auxiliar de farmácia (outro), responsável técnico por farmácia ou drogaria, e ele, nessa condição, tem de ser inscrito em Conselho Regional de Farmácia” e, em relação à carga horária do curso, que o certificado dos recorridos foram expedidos antes do Decreto n. 793/1993. O ínclito Vice-Presidente do Tribunal a quo admitiu o Recurso Especial, com as seguintes observações: Presentes (...) legais. (fl. 309). É o relatório. RSSTJ, a. 5, (21): 35-64, agosto 2011 53 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VOTO O Sr. Ministro Milton Luiz Pereira (Relator): As anunciações processuais revelam que o despique bate de frente com o v. acórdão, assim resumido: Administrativo. Auxiliar de farmácia. Conselho Regional de Farmácia. Sentença extra petita. Inocorrência. Registro. I. Não há desacordo entre a r. sentença monocrática e o pedido dos impetrantes. II. Não se pode falar em ausência de previsão legal para registro dos auxiliares de farmácia no Conselho impetrado. III. Aplicação do art. 5o, XIII da Constituição Federal. IV. Preliminar rejeitada. Apelação e remessa oficial improvidas. (fl. 224). A insurreição processual, sem insistência quanto à alegação da sentença extra petita, além da divergência jurisprudencial, suscitou que o aresto contrariou os padrões legais malsinados, destacando o artigo 14, da Lei n. 3.820/1960 (fls. 230 a 243). Presentes os requisitos formais intrínsecos e extrínsecos da admissibilidade, o recurso merece conhecimento (art. 105, III, a, c, CF). Destravado o exame, inicialmente, registra-se que a trilha básica do inconformismo assenta-se na Lei de Diretrizes e Bases da Educação, na compreensão dos Recorridos contendo previsão da formação dos “auxiliares de farmácia” no curso de aprendizagem ou de qualificação profissional (arts. 27 e 28, Lei n. 5.692/1971 e arts. 39 a 42, Lei n. 9.394/1996), conquanto de duração menor àquela dos cursos de segundo grau, acolhida pelo Parecer n. 5.210/1978 do Conselho Federal de Educação. Esse entendimento, outrossim, tem por premissa a afirmação de que os Recorrentes concluiram o curso antes da vigência da Lei n. 5.692/1971 (arts. 22 e 23), ficando afastadas as incidências do Decreto n. 793/1973 e da Portaria MC n. 363/1995. Feito o memento favorecedor da compreensão da questão jurídico-litigiosa, apesar de boas as razões desenvolvidas no recurso sob exame e, ao depois, reiteradas e explicadas nos memoriais distribuídos, aconsoantado aos pertinentes precedentes jurisprudenciais, a respeito do tema tenho convencimento sedimentado, manifestado em julgamentos anteriores, conforme o sumário, por si, suficiente para elucidar a sua fundamentação: 54 SÚMULAS - PRECEDENTES Administrativo. Mandado de segurança. Auxiliar de farmácia. Inscrição no Conselho Regional de Farmácia. Leis n. 3.820/1960 e n. 5.692/1971. Decretos n. 74.170/1974 e n. 793/1993. Resoluções n. 101/1973 e n. 111/1973 - CFF, Resolução n. 2/1973 - CFE. 1. O “auxiliar de farmácia”, de nível médio, habilitado com carga horária de trabalho escolar inferior ao mínimo exigido para o ensino de segundo grau, sem direito ao prosseguimento de estudos em nível superior, também carece de direito líquido e certo para assumir a responsabilidade técnica na atividade farmacêutica. A legislação de regência não contempla, como direito líquido e certo, a sua inscrição no Conselho Regional de Farmácia. 2. Recurso sem provimento. (REsp n. 170.944-SP, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, in DJU de 24.05.1999); Mandado de segurança. Ausência de direito líquido e certo. Registro profissional. Auxiliar de farmácia. Curso autorizado pelo Ministério do Estado de Educação. Inexistência de quadro profissional específico. Necessidade de lei em sentido estrito. Impossibilidade de requerimento de registro com conseqüente assunção de responsabilidade técnica de estabelecimento farmacêutico. Necessidade de atendimento do art. 14, parágrafo único da Lei n. 3.820/1960 e art. 15, § 3º da Lei n. 5.991/1973. Dilação probatória incompatível com a imprescindibilidade de prova preconstituída. I - A terminologia utilizada pela Lei n. 5.991/1973 “ou outro, igualmente inscrito no Conselho Regional de Farmácia, na forma da lei”, em seu art. 15, § 3º, deve ser interpretada restritivamente, pois está condicionada a existência de lei estrito senso, e apenas estendeu o rol do art. 14, parágrafo único da Lei n. 3.820/1960, para a finalidade excepcional de “razão do interesse público, caracterizada a necessidade da farmácia ou drogaria, e na falta de farmacêutico”, sujeito, ainda, ao licenciamento do “órgão sanitário competente da fiscalização local”. II - Dada a própria natureza subjetiva dos conceitos abertos indeterminados de “interesse público”, “necessidade” e “falta de farmacêutico”, e a controvérsia de seu atendimento, torna-se imprópria a sua discussão em sede mandamental, além de inexistente a prova preconstituída de preenchimento dos requisitos excepcionais. (REsp n. 169.633-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, in DJU de 15.05.2000). No mesmo sentido: REsps n. 173.317-SP e n. 173.714-SP. Comporta alvoroçar que, na fundamentação do voto-condutor do aludido REsp n. 170.944-SP, como uma das vertentes do convencimento, referenciando o tema, foram rememoradas preciosas observações do saudoso Hely Lopes Meirelles, textualmente: RSSTJ, a. 5, (21): 35-64, agosto 2011 55 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 20. Quando a Lei n. 3.820/1960 admitiu, no art. 14, a inscrição dos práticos ou oficiais de farmácia licenciados, não fez alusão a uma formação acadêmica determinada, mas a uma categoria de profissionais já então existente, com vistas a legitimar a continuidade de seus serviços em face da nova sistemática legal. A atual habilitação curricular de nível médio, denominada “Auxiliar de Farmácia”, recentemente instituída, nada tem a ver, portanto, com as antigas categorias a que a Lei fez referência. 21. O “Auxiliar de Farmácia”, na verdade, não tem capacidade legal para assumir responsabilidade pela atividade farmacêutica. Trata-se de um ajudante do farmacêutico, que está sob a orientação e as ordens deste, sem sujeitar-se, inclusive, à responsabilidade administrativa. Sua inscrição não está prevista em lei, não havendo, pois, razão plausível para ser ela deferida. 22. Futuramente, nada impede que o legislador venha a criar um quadro suplementar nos Conselhos Regionais de Farmácia, destinados a abrigar os novos “Auxiliares de Farmácia”, definindo-lhes precisamente a área de atuação profissional e prefixando-lhes responsabilidade administrativa. Todavia, enquanto isso não acontecer, não cabe registrá-los nos Conselhos Regionais, acomodandoos em quadros que não foram estruturados para recebê-los. (REsp n. 170.944-SP). Nesse contexto, calha anotar que os certificados (expedidos pelo Senac e Centro de Estudos Unificados de São Paulo), por via supletiva, credenciam os Recorridos à “Habilitação Parcial do Curso de Qualificação Profissional III de Auxiliar de Farmácia”, “sem direito a prosseguir os estudos em nível superior” (docs. fls. 27 a 34). É dizer: a trato de qualificação estrita, não tem suficiência de curso médio completo, pressuposto indispensável para cursar o nível superior. Ora, se para o Farmacêutico (curso superior), habilitado profissionalmente como responsável por farmácia e drogaria, é imprescindível o curso médio, ficaria desajustado à razão habilitar-se para as mesmas funções quem está órfão daquela condição básica. Também sublinha-se que os preditos certificados anotam que os Impetrantes, aqui recorridos, não completaram o mínimo das horas de trabalho escolar efetivo - 2.200 ou 2.900 - (art. 22, Lei n. 5.692/1971). As cargas horárias variaram de 300 a 470 (versos docs. fls. 27 a 34). Andante, mesmo escapando dos efeitos decorrentes do Decreto n. 793/1993, verifica-se que a situação dos Recorridos não se amolda às comentadas exigências legais e, também, estão desamparadas pela prevalecente compreensão pretoriana que não reconhece o vindicado direito líquido e certo à inscrição no respectivo Conselho de fiscalização profissional. 56 SÚMULAS - PRECEDENTES Confluente à exposição, sem acolhimento a sugerida contrariedade aos mencionados padrões legais e encontrando-se a pretensão recursal sob vigoroso amparo da compreensão jurisprudencial favorável, voto provendo o recurso. É o voto. RECURSO ESPECIAL N. 270.853-SP (2000.0078553-9) Relatora: Ministra Eliana Calmon Recorrente: Alexandre Vicente Melges e outros Advogado: Olavo José Vanzelli e outros Recorrido: Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo Advogado: Patricia Aparecida Simoni e outros EMENTA Administrativo. Conselho de farmácia. Inscrição de profissionais de nível médio. 1. Os antigos oficiais de farmácia, práticos quando regulamentada a profissão, ficaram preservados e com direito a inscreverem-se no Conselho responsáveis por farmácias e drogarias - Súmula n. 120-STJ - art. 114, parágrafo único, letras a e b - Lei n. 3.820/1960. 2. Diferentemente, os auxiliares de farmácia ou os novos oficiais, também de nível médio, com curso reconhecido, não podem ser responsáveis por farmácias e drogarias - Lei n. 5.692/1971, artigos 22 e 23, inclusive por não atenderem a carga horária mínima prevista em lei. 4. Recurso especial não conhecido pela letra a do permissivo constitucional. RSSTJ, a. 5, (21): 35-64, agosto 2011 57 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso. Votaram com a Relatora os Srs. Ministros Franciulli Netto, Castro Filho e Francisco Peçanha Martins. Brasília (DF), 12 de junho de 2001 (data do julgamento). Ministro Francisco Peçanha Martins, Presidente Ministra Eliana Calmon, Relatora DJ 17.09.2001 RELATÓRIO A Sra. Ministra Eliana Calmon: Trata-se de recurso especial, com fulcro nas letras a e c do permissivo constitucional, interposto de acórdão do Tribunal Regional Federal da Terceira Região que negou a inscrição dos autores no Conselho Regional de Farmácia a fim de que figurassem como responsáveis técnicos no ramo farmacêutico. Julgou o Tribunal recorrido improcedente o pedido por não ter sido cumprida a carga horária mínima exigida pelo art. 22, caput da Lei n. 5.692/1971 para se formar um técnico profissional, que é de 2.000 (duas mil) horas, tendo os requerentes cumprido apenas 470 (quatrocentas e setenta) horas. Alegam os recorrentes negativa de vigência ao art. 4º da Lei n. 5.692/1971, ao art. 15, § 3º da Lei n. 5.991/1973 e aos arts. 13, 14 e 16 da Lei n. 3.820/1960, além de restar configurado o dissídio jurisprudencial. Após as contra-razões, subiram os autos. É o relatório. VOTO A Sra. Ministra Eliana Calmon (Relatora): - Não conheço do especial pela letra c, porque não caracterizado o dissídio jurisprudencial nos termos do art. 255 do RISTJ. 58 SÚMULAS - PRECEDENTES Limita-se a análise deste especial apenas ao art. 14 da Lei n. 3.820/1960, porque não prequestionados os demais dispositivos, incidindo, neste ponto, a Súmula n. 356-STF. O acórdão recorrido está em sintonia com a atual posição desta Corte, que entende ser o auxiliar de farmácia o técnico de nível médio que, mesmo tendo curso e diploma reconhecido pelo Conselho Federal de Educação, nunca será capaz de assumir a responsabilidade técnica do estabelecimento farmacêutico, por não ter cumprido a carga horária mínima prevista em lei. Nada tem o auxiliar a ver com o antigo oficial de farmácia, expressamente resguardado pelo citado art. 14 da Lei n. 3.820/1960, sendo ele o prático licenciado que já exercia a profissão quando veio a ser a mesma regulamentada pela referida lei, tendo, portanto, o direito de ser responsável por farmácia ou drogaria quando devidamente inscrito no Conselho Regional de Farmácia. Destaco, para melhor compreensão, os seguintes arestos: Administrativo. Conselho de farmácia. Inscrição. 1. Há duas categorias distintas, ambas de nível médio, que não se confundem, em atribuições, com profissionais de farmácia. 2. Os antigos oficiais de farmácia, práticos quando regulamentada a profissão, ficaram preservados e com direito a inscreverem-se no Conselho e serem responsáveis por farmácias e drogarias - Súmula n. 120-STJ - art. 114, parágrafo único, letras a e b - Lei n. 3.820/1960. 3. Diferentemente, os auxiliares de farmácia ou os novos oficiais, de nível médio, mesmo que o curso seja reconhecido, não podem ser responsáveis por farmácias e drogarias - Lei n. 5.692/1971, artigos 22 e 23. 4. O impetrante, ora recorrente, como auxiliar, não pode ser inscrito no Conselho. 5. Recurso especial provido. (REsp n. 143.343, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, Julgado em 1º.03.2001). Mandado de segurança. Administrativo. Conselho Regional de Farmácia. Auxiliar de farmácia. Registro no Conselho Regional de Farmácia. 1. O Decreto n. 793/1993 mantém as exigências dos artigos 22 e 23 da Lei n. 5.692/1971, dentre as quais o cumprimento de, no mínimo, 2.200 ou 2.900 horas de currículo escolar efetivo. 2. Incompleta a carga horária exigida no Decreto n. 793/1993, falta requisito indispensável ao reconhecimento do vindicado direito líquido e certo para o registro na categoria de “Auxiliar de Farmácia”. RSSTJ, a. 5, (21): 35-64, agosto 2011 59 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 3. Recurso sem provimento. (REsp n. 173.714-SP, Rel. p/ Acórdão Min. Milton Luiz Pereira, Primeira Turma, DJ de 05.06.2000, p. 122). Administrativo. Mandado de segurança. Auxiliar de farmácia. Inscrição no Conselho Regional de Farmácia. Leis n. 3.820/1960 e n. 5.692/1971 e n. 5.210/1978. Decretos n. 74.170/1974 e n. 793/1993. Resoluções n. 101/1973 e n. 111/1973 CFF. Resolução n. 2/1973 - CFE. 1. O “auxiliar de farmácia”, de nível médio, habilitado com carga horária de trabalho escolar inferior ao mínimo exigido para o ensino de segundo grau, sem direito ao prosseguimento de estudos em nível superior, também carece de direito líquido e certo para assumir a responsabilidade técnica na atividade farmacêutica. A legislação de regência não contempla, como direito líquido e certo, a sua inscrição no Conselho Regional de Farmácia. 2. Recurso sem provimento. (REsp n. 170.944-SP, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, Primeira Turma, DJ de 24.05.1999, p. 102). Por estas considerações, não conheço do especial. RECURSO ESPECIAL N. 280.401-SP (2000.0099715-3) Relator: Ministro Francisco Peçanha Martins Recorrente: Valdomiro Donizeth Batista e outro Advogado: Olavo José Vanzelli e outros Recorrido: Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo Advogado: Anna Paola Novaes Stinchi e outros EMENTA Administrativo. Recurso especial. Mandado de segurança. Conselho Regional de Farmácia.Auxiliar de farmácia.Responsabilidade técnica. Impossibilidade. Precedentes do STJ. Súmula n. 83. 1. Consoante jurisprudência iterativa desta Corte, com a qual o acórdão recorrido está afinado, o auxiliar de farmácia não dispõe de 60 SÚMULAS - PRECEDENTES capacitação para assumir responsabilidade técnica por farmácia ou drogaria. 2. Incidência da Súmula n. 83-STJ. 3. Recurso especial não conhecido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso. Votaram com o Relator os Ministros Eliana Calmon, Franciulli Netto, Laurita Vaz e Paulo Medina. Brasília (DF), 07 de maio de 2002 (data do julgamento). Ministra Eliana Calmon, Presidente Ministro Francisco Peçanha Martins, Relator DJ 1º.07.2002 RELATÓRIO O Sr. Ministro Francisco Peçanha Martins: - Valdomiro Donizeth Batista, auxiliar de farmácia, e Droga Bulli Ltda. da qual é proprietário impetraram mandado de segurança, com pedido de liminar, contra o Presidente do Conselho Regional de Farmácia de São Paulo que indeferiu pedido de funcionamento da mencionada drogaria sob a responsabilidade técnica do primeiro impetrante. O deferimento da liminar foi confirmado pela sentença concessiva da segurança, sendo esta reformada no TRF da 3ª Região, pelos motivos constantes do acórdão de fls. 179-184 assim resumidos na ementa: Administrativo. Apelação em mandado de segurança. Conselho Regional de Farmácia. Auxiliar de farmácia. Responsabilidade técnica. Lei n. 5.991/1973. Lei n. 5.692/1971, art. 22. Impossibilidade. - I. Dispõe a Lei n. 5.991/1973, sobre o controle sanitário do comércio de drogas, medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, e conforme leitura do art. 15, fica estabelecido que as farmácias e drogarias devem ter de modo obrigatório, a assistência do técnico inscrito no Conselho Regional de Farmácia. - II. Na falta de um farmacêutico o estabelecimento RSSTJ, a. 5, (21): 35-64, agosto 2011 61 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA pode ser licenciado sob a responsabilidade de um técnico desde que inscrito no Conselho Regional de Farmácia. - III. O auxiliar de farmácia não tem capacidade legal para assumir a responsabilidade técnica da atividade farmacêutica. - IV. O tempo de curso que uma pessoa precisa efetuar para se tornar um técnico profissional, é diverso do cursado por um auxiliar de farmácia, vez que o ensino de 2º grau deve ter, obrigatoriamente, pelo menos 2.000 horas de trabalho escolar efetivo, não podendo tal ensino ter horas inferiores a estabelecida por lei (art. 22 caput, e parágrafo único da Lei n. 5.692 de 11.08.1971). - V. Verifica-se que nos cursos de auxiliar de farmácia, as cargas horárias não passam de 470 horas, não correspondendo ao expresso na lei retro-citada, que estabelece a necessidade de uma carga horária superior a efetuada nos cursos. - VI. Havendo duração inferior à exigida legalmente e, contrariando o art. 22 parágrafo único da Lei n. 5.692/1971, a pretensão é improcedente, não configurada a lesão de direito líquido e certo. VII. Apelação e remessa oficial providas. Inconformados, os impetrantes manifestaram recurso especial pelos permissivos a e c, alegando negativa de vigência às Leis Federais n. 5.692/1971 (art. 4o, § 4o), n. 5.991/1973 (art. 15), n. 3.820/1960 (arts. 13, 14 e 16) e Decreto n. 20.377/1931 (art. 2°, § 1º), bem como divergência com as decisões indicadas como paradigmas, postulando a reforma do acórdão. Sem contra-razões, o recurso foi admitido na origem e remetido a esta Corte, dispensando-se o parecer do Ministério Público Federal nos termos regimentais. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Francisco Peçanha Martins (Relator): Pretendem os recorrentes a reforma de acórdão regional que denegou mandado de segurança impetrado contra ato do Presidente do Conselho Regional de Farmácia de São Paulo, consubstanciado no indeferimento do pedido de funcionamento de drogaria sob a responsabilidade técnica do primeiro impetrante, auxiliar de farmácia. Consolidou-se a mais recente jurisprudência das duas Turmas da eg. Primeira Seção desta Corte em sentido contrário à pretensão dos recorrentes, como atestam as ementas abaixo transcritas: Mandado de segurança. Ausência de direito líquido e certo. Registro profissional. Auxiliar de farmácia. Curso autorizado pelo Ministério do Estado da 62 SÚMULAS - PRECEDENTES Educação. Inexistência de quadro profissional específico. Necessidade de lei em sentido estrito. Impossibilidade de requerimento de registro com conseqüente assunção de responsabilidade técnica de estabelecimento farmacêutico. Necessidade de atendimento do art. 14, parágrafo único da Lei n. 3.820/1960 e art. 15, § 3º da Lei n. 5.991/1973. Dilação probatória incompatível com a imprescindibilidade de prova preconstituída - I. A terminologia utilizada pela Lei n. 5.991/1973 “ou outro, igualmente inscrito no Conselho Regional de Farmácia, na forma da lei”, em seu art. 15, § 3º, deve ser interpretada restritivamente, pois está condicionada a existência de lei “estrito senso”, e apenas estendeu o rol do art. 14, parágrafo único da Lei n. 3.820/1960, para a finalidade excepcional de “razão do interesse público, caracterizada a necessidade da farmácia ou drogaria, e na falta de farmacêutico, sujeito”, ainda, ao licenciamento do “órgão sanitário competente da fiscalização local”. - II. Dada a própria natureza subjetiva dos conceitos abertos indeterminados de “interesse público”, “necessidade” e “falta de farmacêutico”, e a controvérsia de seu atendimento, torna-se imprópria a sua discussão em sede mandamental, além de inexistente a prova preconstituída de preenchimento dos requisitos excepcionais. (REsp n. 169.633-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 15.05.2000). Registro profissional. Auxiliar de farmácia. Curso autorizado pelo Ministério do Estado de Educação. Lei n. 5.692/1971. - O “auxiliar de farmácia”, de nível médio, habilitado com carga horária de trabalho escolar inferior ao mínimo exigido para o ensino de segundo grau, sem direito ao prosseguimento de estudos em nível superior, também carece de direito líquido e certo para assumir a responsabilidade técnica na atividade farmacêutica. A legislação de regência não contempla, como direito líquido e certo, a sua inscrição no Conselho Regional de Farmácia (REsp n. 173.317-Milton). - Os Auxiliares de Farmácia, mesmo que o curso seja reconhecido, não podem ser responsáveis por farmácias e drogarias Lei n. 5.692/1971, artigos 22 e 23. (AgRg-REsp n. 278.904-SP, Rel. Min. Gomes de Barros, DJ 18.02.2002). Administrativo. Conselho de farmácia. Inscrição. - 1. Há duas categorias distintas, ambas de nível médio, que não se confundem, em atribuições, com profissionais de farmácia. - 2. Os antigos Oficiais de Farmácia, práticos quando regulamentada a profissão, ficaram preservados e com direito a inscreverem-se no Conselho e serem responsáveis por farmácias e drogarias - Súmula n. 120-STJ - art. 114, parágrafo único, letras a e b - Lei n. 3.820/1960. - 3. Diferentemente, os Auxiliares de Farmácia ou os novos Oficiais, de nível médio, mesmo que o curso seja reconhecido, não podem ser responsáveis por farmácias e drogarias - Lei n. 5.692/1971, artigos 22 e 23. - 4. O impetrante, ora recorrente, como auxiliar, não pode ser inscrito no Conselho. - 5. Recurso especial provido. (REsp n. 143.343-AL, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 04.06.2001). RSSTJ, a. 5, (21): 35-64, agosto 2011 63 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Denegando a segurança por considerar inexistente o alegado direito líquido e certo dos impetrantes, ora recorrentes, o acórdão recorrido está em perfeita harmonia com o entendimento jurisprudencial desta Corte incidindo a Súmula n. 82, razão pela qual não conheço do recurso. 64 Súmula n. 276 (*) SÚMULA N. 276 (CANCELADA) As sociedades civis de prestação de serviços profissionais são isentas da Cofins, irrelevante o regime tributário adotado. Referências: Lei Complementar n. 70/1991, art. 6º, II. Lei n. 8.541/1992, arts. 1º e 2º. Lei n. 9.430/1996, que revoga os arts. 1º e 2º do Decreto-Lei n. 2.397/1987. Precedentes: AgRg no REsp 226.386-PR (2ª T, 13.08.2002 – DJ 09.09.2002) AgRg no REsp 297.461-PR (1ª T, 03.04.2001 – DJ 03.09.2001) AgRg no REsp 422.342-RS (1ª T, 15.08.2002 – DJ 30.09.2002) AgRg no REsp 422.741-MG (1ª T, 18.06.2002 – DJ 09.09.2002) REsp 221.710-RJ (2ª T, 04.10.2001 – DJ 18.02.2002) REsp 227.939-SC (1ª T, 19.10.2000 – DJ 12.03.2001) REsp 260.960-RS (1ª T, 13.02.2001 – DJ 26.03.2001) Primeira Seção, em 14.05.2003 DJ 02.06.2003, p. 365 (*) Julgando a AR n. 3.761-PR, na sessão de 12.11.2008, a Primeira Seção deliberou pelo CANCELAMENTO da Súmula n. 276. DJe 20.11.2008 – ed. 262 AÇÃO RESCISÓRIA N. 3.761-PR (2007.0101073-2) Relatora: Ministra Eliana Calmon Revisor: Ministro Francisco Falcão Autor: Fazenda Nacional Procuradores: Claudia Aparecida de Souza Trindade e outro(s) Claudio Xavier Seefelder Filho Réu: J Amatuzi S/C Ltda. Réu: Climar Clinicas S/C Ltda. Réu: Cepeo Centro Paranaense de Atendimento e Estudos Odontológicos S/C Ltda. Advogado: Alexandre Pelissari Cidade e outro(s) EMENTA Processual Civil e Tributário. Ação rescisória. Cabimento. Violação do art. 97 da CF/1988: Súmula Vinculante n. 10-STF. Súmula n. 343-STF: inaplicabilidade. Cofins. Isenção concedida pela LC n. 70/1991. Revogação pela Lei n. 9.430/1996. Recurso especial. Descabimento. 1. A ação rescisória não se presta a rever regra técnica relacionada com a admissibilidade de recurso especial. 2. Violação do art. 97 da CF/1988 porque o aresto rescindendo não submeteu a reserva de plenário a inconstitucionalidade do art. 56 da Lei n. 9.430/1996, concluindo tão-somente por afastar a incidência deste dispositivo, sob o fundamento de que, em razão do princípio da hierarquia das leis, a isenção concedida por lei complementar não poderia ser revogada por lei ordinária. Aplicação da Súmula Vinculante n. 10-STF. 3. À época em que prolatado o aresto rescindendo, era controvertida a interpretação desta Corte em relação à legitimidade da revogação da isenção da Cofins. 4. Orientação firmada neste Tribunal no sentido de que a incidência da Súmula n. 343-STF deve ser afastada nos casos em que a interpretação controvertida disser respeito a texto constitucional. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 5. O tema relativo à possibilidade de revogação, por lei ordinária (Lei n. 9.430/1996), da isenção da Cofins concedida às sociedades civis pela LC n. 70/1991 não há de ser resolvido em âmbito infraconstitucional, segundo precedentes do STF. 6. Ação rescisória julgada procedente. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça “A Seção, por unanimidade, julgou procedente a ação rescisória, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.” Os Srs. Ministros Francisco Falcão, Teori Albino Zavascki, Castro Meira, Denise Arruda, Humberto Martins, Herman Benjamin, Mauro Campbell Marques e Benedito Gonçalves votaram com a Sra. Ministra Relatora. Compareceu à sessão o Dr. Claudio Xavier Seefelder Filho, pela Fazenda Nacional. Brasília (DF), 12 de novembro de 2008 (data do julgamento). Ministra Eliana Calmon, Relatora DJ 1º.12.2008 RELATÓRIO A Sra. Ministra Eliana Calmon: - Trata-se de ação rescisória com pedido de tutela antecipada ajuizada pela Fazenda Nacional contra acórdão proferido pela Primeira Turma, relatado pelo Min. José Delgado, assim ementado: Processual Civil e Tributário. Agravo regimental. Cofins. Isenção. Sociedades civis prestadoras de serviços. LC n. 70/1991. Lei n. 9.430/1996. DL n. 2.397/1987. Precedentes. Aplicação da Súmula n. 276-STJ. Análise de violação de dispositivos constitucionais. Impossibilidade. 1. A Lei Complementar n. 70/1991, de 30.12.1991, em seu art. 6º, II, isentou, expressamente, da contribuição da Cofins, as sociedades civis de que trata o art. 1º do Decreto-Lei n. 2.397, de 22.12.1987, sem exigir qualquer outra condição senão as decorrentes da natureza jurídica das mencionadas entidades. 70 SÚMULAS - PRECEDENTES 2. Em conseqüência da mensagem concessiva de isenção contida no art. 6º, II, da LC n. 70/1991, fixa-se o entendimento de que a interpretação do referido comando posto em Lei Complementar, conseqüentemente, com potencialidade hierárquica em patamar superior à legislação ordinária, revela que serão abrangidas pela isenção da Cofins as sociedades civis que, cumulativamente, apresentem os seguintes requisitos: - sejam sociedades constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no Brasil; - tenham por objetivo a prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada; e - estejam registradas no Registro Civil das Pessoas Jurídicas. 3. Outra condição não foi considerada pela Lei Complementar, no seu art. 6º, II, para o gozo da isenção, especialmente, o tipo de regime tributário adotado para fins de incidência ou não de Imposto de Renda. 4. Posto tal panorama, não há suporte jurídico para se acolher a tese da Fazenda Nacional de que há, também, ao lado dos requisitos acima elencados, um último, o do tipo de regime tributário adotado pela sociedade. A Lei Complementar não faz tal exigência, pelo que não cabe ao intérprete criá-la. 5. É irrelevante o fato de a recorrente ter optado pela tributação dos seus resultados com base no lucro presumido, conforme lhe permite o art. 71 da Lei n. 8.383/1991 e os arts. 1º e 2º da Lei n. 8.541/1992. Essa opção terá reflexos para fins de pagamento do IR. Não afeta, porém, a isenção concedida pelo art. 6º, II, da LC n. 70/1991, visto que esta não colocou como pressuposto para o gozo da isenção o tipo de regime tributário seguido pela sociedade civil. 6. A revogação da isenção pela Lei n. 9.430/1996 fere, frontalmente, o princípio da hierarquia das leis, visto que tal revogação só poderia ter sido veiculada por outra lei complementar. 7. Precedentes das 1ª e 2ª Turmas desta Corte Superior. 8. Aplicação da Súmula n. 276, aprovada, à unanimidade, pela Primeira Seção desta Corte Superior, em Sessão realizada em 14.05.2003, a qual dispõe “As sociedades civis de prestação de serviços profissionais são isentas de Cofins, irrelevante o regime tributário adotado”. 9. No curso de recurso especial não há lugar para se discutir, com carga decisória, preceitos constitucionais. Ao STJ compete, unicamente, unificar o direito ordinário federal, em face de imposição da Carta Magna. Na via extraordinária é que se desenvolvem a interpretação e a aplicação de princípios constantes no nosso Diploma Maior. A relevância de tais questões ficou reservada, apenas, para o colendo STF. Não pratica, pois, omissão o acórdão que silencia sobre alegações da parte no tocante à ofensa ou não de regra posta na Lei Maior. 10. Agravo regimental não-provido. (AgRg no REsp n. 759.683-SP, Rel. Ministro José Delgado, Primeira Turma, DJ 10.10.2005, p. 254). RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 71 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Insurge-se a Fazenda Nacional, alegando violação do art. 485, II, do CPC, sustentando que esta Corte é absolutamente incompetente para conhecer do recurso especial analisado pelo acórdão ora impugnado, sob o argumento de que o TRF da 4ª Região decidiu a questão em torno da revogação da isenção da Cofins com fundamento exclusivamente constitucional, qual seja, de que o art. 6º, II, da LC n. 70/1991, nos termos do art. 195, I, da CF/1988, constitui lei materialmente ordinária. Alega que o STJ usurpou a competência do Pretório Excelso, contrariando os arts. 102, III e 105, III, da Constituição da República de 1988. Colaciona julgados desta Corte e do STF nos quais restou consignada a natureza constitucional da questão ora discutida. Aponta, ainda, afronta ao art. 485, V, do CPC, defendendo a inaplicabilidade da Súmula n. 343-STF, aduzindo, para tanto, que os demais Tribunais devem seguir a interpretação que o STF conferiu ao texto constitucional, sob pena de fragilizar a força normativa da Carta Magna. Nesse sentido, aduz que a Primeira Seção do STJ já firmou entendimento pela natureza constitucional da discussão em torno da revogação da isenção da Cofins levada a termo pelo art. 56 da Lei n. 9.430/1996. Alega violação dos arts. 146, 150, § 6° e 195, I, da CF/1988, asseverando que não há no texto constitucional norma que disponha que a isenção da Cofins seja regulada por lei complementar, espécie normativa que deve ser prevista expressamente pela Constituição Federal. Cita precedentes do STF que atestam que as disposições em torno da Cofins devem ser tratadas por lei ordinária (ADC n. 1-DF; RE’s n. 150.755PE; n. 406.074-BA; n. 377.457 e n. 381.964). Afirma que a LC n. 70/1991 é materialmente ordinária e que não há falar-se em violação ao princípio da hierarquia das leis. Sustenta, ainda, contrariedade ao art. 97 da CF/1988, aduzindo que o STJ somente poderia deixar de aplicar o art. 56 da Lei n. 9.430/1996 caso tal dispositivo houvesse sido submetido a incidente de inconstitucionalidade perante a Corte Especial. Nesse diapasão, menciona o RE n. 240.096-RJ e o AI n. 466.506-SC. Por fim, pugna pela antecipação dos efeitos da tutela, asseverando que os requisitos para a concessão do pretendido provimento jurisdicional, quais sejam, prova inequívoca, verossimilhança e fundado receio de dano irreparável encontram-se presentes, já que restou comprovada a exigibilidade da Cofins. 72 SÚMULAS - PRECEDENTES Ademais, alega que, caso seja mantido o decisum impugnado, a União será compelida a restituir os valores recolhidos pelos requeridos a título da mencionada contribuição social. Às fl. 471, neguei a antecipação dos efeitos da tutela pretendida pela requerente, sob o fundamento de que os pressupostos para sua concessão não se encontram demonstrados. Às fl. 488-503, foi apresentada contestação, na qual as requeridas argumentam que a ação rescisória foi ajuizada em razão da perda de prazo da Fazenda Nacional para interpor agravo de instrumento contra a decisão que inadmitiu o recurso extraordinário manejado contra o acórdão rescindendo. No mérito, assevera que o STJ tem entendimento de que a Súmula n. 343-STF somente não se aplica nos casos em que o STF declara a inconstitucionalidade da lei aplicada pelo aresto rescindendo. Em réplica, a autora pugna, preliminarmente, seja decretada a revelia das requeridas que não apresentaram contestação. No mérito, reitera os argumentos em torno da inaplicabilidade da Súmula n. 343-STF e da violação dos dispositivos constitucionais apontados na exordial. Alega que o STJ firmou orientação de que não detém competência para julgar a matéria ora discutida. Aduz que a Fazenda Nacional ajuizou 02 (duas) reclamações perante o STF nas quais foram concedidas liminares para suspender acórdãos do STJ que decidiram questão em torno da revogação da isenção da Cofins. Menciona, ainda, que o STF, no julgamento dos RE´s n. 451.988 e n. 457.884, concluiu que a LC n. 70/1991 detém natureza de lei materialmente ordinária. Ouvido, opinou o Ministério Público Federal em parecer assim ementado: Ação rescisória. Cofins. Isenção. Revogação. Sociedade civil de profissão regulamentada. Incompetência absoluta. Violação literal a dispositivo de lei. ADC. 1. É constitucional e não infraconstitucional a discussão sobre a revogação do art. 6°, II, da Lei Complementar n. 70/1991 pela Lei n. 9.430/1996. Por conseguinte, vislumbra-se na espécie a incompetência absoluta do STJ suscitada pela autora. 2. Não se aplica a Súmula n. 343-STF ao caso dos autos, pois ao tempo em que proferido o acórdão rescindendo não havia, no âmbito do STJ, controvérsia acerca da isenção da Cofins com relação às sociedades civis de profissão regulamentada. 3. A matéria encontrava-se pacificada desde a edição da Súmula n. 276, de 14 de maio de 2003, embora contrastasse com a ADC n. 1-1/93-DF, que julgara RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 73 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA constitucional o art. 56 da Lei n. 9.430/1996, que revogou a isenção da Cofins prevista no art. 6°, II, da Lei Complementar n. 70/1991. 4. Pela procedência da ação rescisória. (fl. 606). É o relatório. VOTO A Sra. Ministra Eliana Calmon (Relatora): - Preliminarmente, advirto que não há falar-se em revelia, já que todos os requeridos contestaram a inicial (fl. 488-503). No tocante aos argumentos de que o recurso especial não poderia ter sido conhecido em razão da fundamentação constitucional do acórdão proferido pelo TRF da 4ª Região, observo que tal questão não é susceptível de análise na via da rescisória, ação voltada para ataque à decisão meritória. Ultrapassados esses pontos, inicio a análise da presente rescisória, tecendo um breve histórico acerca da evolução do entendimento desta Corte sobre a questão da isenção da Cofins concedida às sociedades de prestação de serviços profissionais. Observa-se que a LC n. 70/1991, com esteio no art. 195, I, da CF/1988, cuidou de, entre outras disposições, instituir a Cofins, contribuição social devida pelas pessoas jurídicas para financiamento da Seguridade Social. Verificase, ainda, que o art. 6°, II, da LC n. 70/1991 conferiu isenção da Cofins às sociedades civis de prestação de serviços profissionais de que trata o art. 1° do Dec.-Lei n. 2.397/1987. Instaurou-se, então, debate acerca dos requisitos que deveriam ser preenchidos pelas pessoas jurídicas para fazerem jus ao citado benefício fiscal, tendo a jurisprudência desta Corte firmado posição no sentido de ser irrelevante a circunstância de haverem optado pelo regime instituído pela Lei n. 8.541/1992, quanto ao imposto de renda. Conferir AgRg no REsp n. 226.386PR, DJ 09.09.2002 e AgRg no REsp n. 297.461-PR, DJ 03.09.2001. Com a sedimentação do aludido entendimento, foi editada a Súmula n. 276 desta Corte, redigida nos seguintes termos: As sociedades civis de prestação de serviços profissionais são isentas da Cofins, irrelevante o regime tributário adotado. 74 SÚMULAS - PRECEDENTES Ultrapassado tal questionamento, adveio, então, a Lei n. 9.430/1996 que cuidou de, no seu art. 56, caput, revogar a isenção da Cofins criada pela LC n. 70/1991: Art. 56. As sociedades civis de prestação de serviços de profissão legalmente regulamentada passam a contribuir para a seguridade social com base na receita bruta da prestação de serviços, observadas as normas da Lei Complementar n. 70, de 30 de dezembro de 1991. Nesse momento, surgiu discussão em torno da viabilidade da revogação da isenção da Cofins levada a termo pela Lei n. 9.430/1996, tendo os contribuintes se insurgido quanto ao fato da lei ordinária ter revogado isenção que havia sido concedida por lei complementar. Conforme depreende-se dos arestos abaixo transcritos, este Tribunal Superior se posicionou inicialmente pela ilegalidade da mencionada revogação, sob o argumento de que tal providência encontrava óbice no princípio da hierarquia das leis: Tributário e Processual Civil. Agravo regimental nos embargos de divergência. Dissídio notório. Cofins. Sociedades prestadoras de serviços. LC n. 70/1991 e Lei n. 9.430/1996. Isenção. Revogação. Impossibilidade. Princípio da hierarquia das leis. Precedentes. Súmula n. 126-STJ. Questão nova não suscitada no momento processual oportuno. Preclusão. Recurso desprovido. 1. Conforme o entendimento uniforme deste Tribunal Superior, “tratandose de matéria reiteradamente examinada por esta Corte e sendo notória a divergência entre a orientação adotada pelo acórdão recorrido e a jurisprudência aqui predominante, é de se dispensar o rigor formal na demonstração do dissídio” (AEREsp n. 280.619-MG, Corte Especial, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, DJ 19.12.2003). 2. Esta Corte já consolidou o entendimento no sentido de ser inviável a revogação da isenção da Cofins concedida às sociedades civis prestadoras de serviços profissionais, prevista na LC n. 70/1991, pela Lei n. 9.430/1996, por constituir ofensa ao princípio da hierarquia das leis. 3. Limitando-se a discussão ao âmbito infraconstitucional, não há que se falar em usurpação da competência do Pretório Excelso. 4. O pedido de aplicação da Súmula n. 126-STJ configura questão nova, tendo em vista que não foi suscitada no momento processual oportuno, que seria o das contra-razões ao recurso especial. Ocorrência de preclusão da matéria. 5. Considerando o disposto no artigo 105 da Carta Magna, o Superior Tribunal de Justiça não é competente para se manifestar sobre suposta violação de RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 75 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA dispositivos constitucionais (arts. 146, 150, § 6º, 195, I e § 4º), sequer a título de prequestionamento. 6. Agravo Regimental desprovido. (AgRg nos EREsp n. 438.347-RS, Rel. Ministra Denise Arruda, Primeira Seção, julgado em 25.08.2004, DJ 20.09.2004 p. 180). Tributário. Agravo regimental. Recurso especial. Cofins. Isenção. Sociedades civis prestadoras de serviços (art. 6º, II, da LC n. 70/1991). Precedentes. Violação a preceitos constitucionais. Análise. Impossibilidade. Nega-se provimento ao agravo regimental, em face das razões que sustentam a decisão recorrida, sendo certo que a jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que as sociedades civis prestadoras de serviços são isentas da Cofins, nos termos do artigo 6º, inciso II, da Lei Complementar n. 70/1991. Ressaltese, ainda, que a revogação do benefício em tela só poderia ter sido veiculada por outra lei complementar, sob pena de violação ao princípio da hierarquia das leis. Ademais, é vedado a esta Corte analisar suposta violação a preceitos constitucionais. (AgRg no AgRg no REsp n. 457.016-RS, Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, julgado em 04.09.2003, DJ 20.10.2003 p. 186). Conforme observa-se dos julgados abaixo transcritos, tal orientação foi seguida pelas Turmas de Direito Público desta Corte. Todavia, à época em que prolatado o aresto impugnado (15.09.2005), alguns Ministros da Primeira Seção já manifestavam o entendimento pessoal de que a LC n. 70/1991 era materialmente ordinária e que a revogação da mencionada isenção era legítima: Tributário. Cofins. Sociedades civis de prestação de serviços profissionais. Isenção. Revogação da LC n. 70/1991. Impossibilidade. Princípio da hierarquia das leis. Lei n. 9.430/1996 (lei ordinária). Compensação/restituição das quantias recolhidas indevidamente. Tema não decidido nas instâncias ordinárias. Impossibilidade de apreciação em sede de recurso especial. CF, art 105, III. Devolução dos autos. Precedentes. - O julgador não é obrigado a abordar todos os temas invocados pelas partes, para decidir a questão controvertida, se apenas um deles é suficiente ou prejudicial dos demais. - A Lei Complementar n. 70/1991, em seu art. 6º, inc. II, isentou da Cofins as sociedades civis de prestação de serviços de que trata o art. 1º do Decreto-Lei n. 2.397, de 22 de dezembro de 1987, estabelecendo como condições somente aquelas decorrentes da natureza jurídica das referidas sociedades. 76 SÚMULAS - PRECEDENTES - A isenção concedida pela Lei Complementar n. 70/1991 não pode ser revogada pela Lei n. 9.430/1996, lei ordinária, em obediência ao princípio da hierarquia das leis. - Inexistindo decisão de única ou última instância sobre a compensação dos valores recolhidos indevidamente, impõe-se a devolução dos autos ao Tribunal de origem para apreciação e decisão do tema. - Recurso especial conhecido e parcialmente provido, determinando-se a remessa dos autos à instância a quo, para apreciação do pedido de compensação/ restituição das quantias recolhidas indevidamente. (REsp n. 752.017-PR, Rel. Ministro Francisco Peçanha Martins, Segunda Turma, julgado em 02.08.2005, DJ 19.09.2005 p. 307). Tributário e Processual Civil. Cofins. Isenção. LC n. 70/1991. Sociedades prestadoras de serviços. Revogação. Lei n. 9.430/1996. Súmula n. 276-STJ. Fundamentação deficiente. Súmula n. 284-STF. 1. É pressuposto de admissibilidade do recurso especial a adequada indicação da questão controvertida, com informações sobre o modo como teria ocorrido a violação a dispositivos de lei federal (Súmula n. 284-STF). 2. A teor da Súmula n. 276-STJ, “as sociedades civis de prestação de serviços profissionais são isentas da Cofins, irrelevante o regime tributário adotado”. Ressalva do ponto de vista pessoal do Relator, no sentido de que lei formalmente complementar, mas materialmente ordinária, pode ser revogada por lei ordinária, sendo, portanto, legítima a revogação, operada pela Lei n. 9.430/1996, da isenção prevista no art. 6º da LC n. 70/1991. 3. Recurso especial a que se dá provimento. (REsp n. 757.486-PR, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 04.08.2005, DJ 22.08.2005 p. 166). Processual Civil e Tributário. Agravo de instrumento. Art. 544 do CPC. Recurso especial. Cofins. Sociedades prestadoras de serviço. Isenção. LC n. 70/1991. Lei n. 9.430/1996. Revogação. Súmula n. 276-STJ. Súmula n. 83-STJ. 1. Lei Ordinária não pode revogar determinação de Lei Complementar, revelando-se ilegítima a revogação instituída pela Lei n. 9.430/1996 da isenção conferida pela LC n. 70/1991 às sociedades prestadoras de serviços, por colidir com o Princípio da Hierarquia das Leis. (Precedentes da Primeira e Segunda Turmas do STJ). Sob esse enfoque foi editada a Súmula n. 276 deste Tribunal, que assim dispõe: “As sociedades civis de prestação de serviços profissionais são isentas da Cofins, irrelevante o regime tributário adotado.” 2. Ressalva do entendimento do Relator, em observância ao novel posicionamento do STF, intérprete maior do texto constitucional, que no julgamento da ADC n. 1-DF, assentou que a LC n. 70/1991 possui status de lei RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 77 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ordinária, posto não se enquadrar na previsão do art. 154, I, da Constituição Federal. Em conseqüência e consoante o princípio da lex posterius derrogat priori, consagrado no art. 2º, § 1º, da LICC, não padece de ilegalidade o disposto no art. 56, da Lei n. 9.430/1996, pelo que, em razão de a lei isencional e a revogadora possuírem o mesmo status de lei ordinária, legítima seria a revogação da isenção anteriormente concedida, pelo que estão obrigados ao pagamento da Cofins as sociedades civis prestadoras de serviços. Destarte, a aplicação de norma supralegal, in casu, a Lei de Introdução ao Código Civil, torna desnecessária a análise de matéria de índole constitucional. 3. Agravo Regimental desprovido. (AgRg nos EDcl no Ag n. 658.529-PR, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 06.09.2005, DJ 26.09.2005 p. 204). Tributário. Agravo regimental. Art. 557, § 1º do CPC. Cofins. Sociedades prestadoras de serviço. Isenção. LC n. 70/1991. Lei n. 9.430/1996. Revogação. Súmula n. 276-STJ. 1. Lei Ordinária não pode revogar determinação de Lei Complementar, revelando-se ilegítima a revogação instituída pela Lei n. 9.430/1996 da isenção conferida pela LC n. 70/1991 às sociedades prestadoras de serviços, por colidir com o Princípio da Hierarquia das Leis. (Precedentes da Primeira e Segunda Turmas do STJ). Sob esse enfoque foi editada a Súmula n. 276 deste Tribunal, que assim dispõe: “As sociedades civis de prestação de serviços profissionais são isentas da Cofins, irrelevante o regime tributário adotado.” 2. Ressalva do entendimento do Relator, em observância ao novel posicionamento do STF, intérprete maior do texto constitucional, que no julgamento da ADC n. 1-DF, assentou que a LC n. 70/1991 possui status de lei ordinária, posto não se enquadrar na previsão do art. 154, I, da Constituição Federal. Em conseqüência e consoante o princípio da lex posterius derrogat priori, consagrado no art. 2º, § 1º, da LICC, não padece de ilegalidade o disposto no art. 56, da Lei n. 9.430/1996, pelo que, em razão de a lei isencional e a revogadora possuírem o mesmo status de lei ordinária, legítima seria a revogação da isenção anteriormente concedida, pelo que estão obrigados ao pagamento da Cofins as sociedades civis prestadoras de serviços. Destarte, a aplicação de norma supralegal, in casu, a Lei de Introdução ao Código Civil, torna desnecessária a análise de matéria de índole constitucional. 3. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp n. 724.743-RS, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 04.08.2005, DJ 29.08.2005 p. 207). Posteriormente, com a maturação da tese posta à apreciação, restou sedimentado o entendimento de que a questão em torno da hierarquia das leis 78 SÚMULAS - PRECEDENTES era matéria de índole constitucional, que não poderia ser veiculada por meio de recurso especial. A título ilustrativo, colaciono os seguintes precedentes desta Corte: Tributário. Cofins. Sociedades civis de prestação de serviços profissionais. Isenção reconhecida pela Lei Complementar n. 70/1991 (art. 6º, II). Revogação pela Lei Ordinária n. 9.430/1996. Inadmissibilidade. Súmula n. 276-STJ. Matéria constitucional. Competência do STF. 1. O Supremo Tribunal Federal, guardião da Constituição Federal, reúne competências próprias de Corte Suprema e de Tribunal Constitucional. 2. Afigura-se a natureza constitucional do pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça sobre a incompatibilidade entre lei ordinária (Lei n. 9.430/1996) e lei complementar (LC n. 70/1991), em face do princípio da hierarquia de leis. 3. Consoante se observa da leitura dos autos, o acórdão a quo firmou-se em questão de natureza constitucional, logo intransitável o recurso especial, porquanto esbarra na competência atribuída pela Carta Magna ao STF, pela via do recurso extraordinário, na forma do art. 102, III. Recurso especial não-conhecido. (REsp n. 847.999-SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 22.08.2006, DJ 1º.09.2006 p. 257). Tributário. Cofins. Isenção. Sociedade civil de prestação de serviços profissionais. Lei Complementar n. 70/1991. Revogação pela Lei n. 9.430/1996. Recurso especial. Descabimento. Precedente da Seção no REsp n. 728.754-SP. 1. O tema relativo à possibilidade de revogação, por lei ordinária (Lei n. 9.430/1996), da isenção da Cofins concedida às sociedades civis pela LC n. 70/1991 não há de ser resolvido em âmbito infraconstitucional, segundo precedentes do STF. 2. “O conflito entre lei complementar e lei ordinária não há de solver-se pelo princípio da hierarquia, mas sim em função de a matéria estar ou não reservada ao processo de legislação complementar” (RE n. 419.629-DF, 1ª Turma, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, julgado em 23.05.2006). 3. A Primeira Seção deste Sodalício, em 26.04.2006, enfrentou o problema posto para apreciação das Turmas de Direito Público reunidas, oportunidade em que concluiu pela manutenção da Súmula n. 276-STJ e determinou o exame do recurso especial caso a caso, observando se o enfoque foi exclusivamente infraconstitucional. 4. Entretanto, ficou estabelecido que o STJ não conheceria dos recursos quando o acórdão recorrido tivesse analisado tão-somente a tese de revogação da lei complementar por lei ordinária. RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 79 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 5. Agravo regimental improvido. (AgRg no AgRg no REsp n. 638.853-RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 20.06.2006, DJ 29.06.2006 p. 173). Processual Civil. Art. 535 do CPC. Negativa de prestação jurisdicional. Inocorrência. Constitucional e Tributário. Cofins. Isenção. Sociedades civis de prestação de serviços profissionais. Incompatibilidade entre lei complementar e lei ordinária superveniente. Matéria de índole constitucional. Precedentes do STF. 1. Não viola os artigos 458 e 535 do CPC, nem importa em negativa de prestação jurisdicional, o acórdão que adota fundamentação suficiente para decidir de modo integral a controvérsia posta. Precedentes: EDcl no AgRg no EREsp n. 254.949-SP, Terceira Seção, Min. Gilson Dipp, DJ de 08.06.2005; EDcl no MS n. 9.213-DF, Primeira Seção, Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 21.02.2005; EDcl no AgRg no CC n. 26.808-RJ, Segunda Seção, Min. Castro Filho, DJ de 10.06.2002. 2. A controvérsia a respeito da incompatibilidade de lei ordinária em face de lei complementar é de natureza constitucional, já que a invasão, por lei ordinária, da esfera de competência reservada constitucionalmente à lei complementar, acarreta a sua inconstitucionalidade, e não a sua ilegalidade. Precedentes do STF. 3. Assim, a discussão sobre a Lei Complementar n. 70/1991 ser materialmente ordinária, bem como a respeito da revogação de seu art. 6º, II, pela Lei n. 9.430/1996, tem índole constitucional, sendo vedada sua apreciação em recurso especial. 4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido. (REsp n. 775.273-PR, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, julgado em 1º.06.2006, DJ 12.06.2006, p. 447). Observa-se, portanto, que, na data em proferido o julgado rescindendo, era controvertida a interpretação desta Corte quanto à legitimidade da revogação da isenção da Cofins, razão pela qual demonstrar-se-ia legítima a incidência da Súmula n. 343-STF, não fosse a natureza da matéria ora discutida. Com relação a esse tópico, a autora advoga a tese de que a Excelsa Corte detém o entendimento de que o referido enunciado não incide nos casos em que a interpretação controvertida diz respeito a texto constitucional. Conforme deflui-se dos julgados abaixo transcritos, este Tribunal, a partir do entendimento firmado no Pretório Excelso, posicionou-se no sentido de afastar a incidência da referida súmula quando a tese jurídica discutida tiver sido examinada em nível constitucional: 80 SÚMULAS - PRECEDENTES Processual Civil. Ação rescisória (CPC, art. 485, V). Matéria constitucional. Inaplicabilidade da Súmula n. 343-STF. Existência de pronunciamento do STF, em controle difuso, em sentido contrário ao da sentença rescindenda. 1. Na interpretação do art. 485, V, do Código de Processo Civil, que prevê a rescisão de sentença que “violar literal disposição de lei”, a jurisprudência do STJ e do STF sempre foi no sentido de que não é toda e qualquer violação à lei que pode comprometer a coisa julgada, dando ensejo à ação rescisória, mas apenas aquela especialmente qualificada. 2. Na esteira desse entendimento, editou-se a Súmula n. 343-STF, segundo a qual “Não cabe ação rescisória por ofensa a literal dispositivo de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais”. 3. Ocorre, porém, que a lei constitucional não é uma lei qualquer, mas a lei fundamental do sistema, na qual todas as demais assentam suas bases de validade e de legitimidade, e cuja guarda é a missão primeira do órgão máximo do Poder Judiciário, o Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102). 4. Por essa razão, a jurisprudência do STF emprega tratamento diferenciado à violação da lei comum em relação à da norma constitucional, deixando de aplicar, relativamente a esta, o Enunciado de sua Súmula n. 343, à consideração de que, em matéria constitucional, não há que se cogitar de interpretação apenas razoável, mas sim de interpretação juridicamente correta. 5. Essa, portanto, a orientação a ser seguida nos casos de ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC: em se tratando de norma infraconstitucional, não se considera existente “violação a literal disposição de lei”, e, portanto, não se admite ação rescisória, quando “a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais” (Súmula n. 343). Todavia, esse enunciado não se aplica quando se trata de “texto” constitucional. 6. A orientação revela duas preocupações fundamentais da Corte Suprema: a primeira, a de preservar, em qualquer circunstância, a supremacia da Constituição e a sua aplicação uniforme a todos os destinatários; a segunda, a de preservar a sua autoridade de guardião da Constituição. Esses os valores dos quais deve se lançar mão para solucionar os problemas atinentes à rescisão de julgados em matéria constitucional. 7. Assim sendo, concorre decisivamente para um tratamento diferenciado do que seja “literal violação” a existência de precedente do STF, guardião da Constituição. Ele é que justifica, nas ações rescisórias, a substituição do parâmetro negativo da Súmula n. 343 por um parâmetro positivo, segundo o qual há violação à Constituição na sentença que, em matéria constitucional é contrária a pronunciamento do STF. Precedente da 1ª Seção: EREsp n. 391.594-DF, Min. José Delgado, DJ de 30.05.2005. RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 81 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 8. No caso dos autos, a existência de precedente do STF, ainda que em controle difuso (RE n. 150.755-1-PE, relatado pelo Ministro Sepúlveda Pertence), reconhecendo a constitucionalidade do art. 28 da Lei n. 7.738, de 09.03.1989, relativamente às empresas “exclusivamente prestadoras de serviços”, que anteriormente não foi aplicado sob alegação de inconstitucionalidade, enseja o cabimento da ação rescisória. 9. Embargos de divergência providos. (EREsp n. 608.122-RJ, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Seção, julgado em 09.05.2007, DJ 28.05.2007, p. 280). Processual Civil. Embargos de divergência. Ação rescisória. Finsocial. Empresa prestadora de serviços. Majoração. Constitucionalidade. Função harmonizadora dos julgados. Súmula n. 343-STF. Inaplicabilidade. Precedentes desta Corte. 1. Há de se rescindir decisão baseada em lei considerada inconstitucional pelo colendo Supremo Tribunal Federal, mesmo que tal posicionamento venha a ocorrer após o trânsito em julgado do acórdão rescindendo. 2. A Súmula n. 343-STF há de ser compreendida com a mensagem específica que ela contém: a de não ser aplicada quando a controvérsia esteja envolvida com matéria de nível constitucional. 3. A coisa julgada tributária não deve prevalecer para determinar que contribuinte recolha tributo cuja exigência legal foi tida como inconstitucional pelo Supremo. O prevalecimento dessa decisão acarretará ofensa direta aos princípios da legalidade e da igualdade tributárias. 4. Não é concebível se admitir um sistema tributário que obrigue um determinado contribuinte a pagar tributo cuja lei que o criou foi julgada definitivamente inconstitucional, quando os demais contribuintes a tanto não são exigidos, unicamente por força da coisa julgada. 5. Em face da mudança de entendimento do colendo STF (RE n. 188.016-3SC, Rel. Min. Moreira Alves), as majorações das alíquotas do Finsocial, quando o contribuinte é empresa prestadora de serviço, foram consideradas constitucionais. 6. Precedentes desta Corte. 7. Embargos de divergência acolhidos, nos termos do voto. (EREsp n. 391.594-DF, Rel. Ministro José Delgado, Primeira Seção, julgado em 13.04.2005, DJ 30.05.2005, p. 202). Observa-se dos precedentes abaixo colacionados, que o STF já se posicionou quanto à natureza constitucional da discussão em torno do princípio da hierarquia das leis: Embargos de declaração em recurso extraordinário. Conversão em agravo regimental. Constitucional. Tributário. Cofins. Isenção. Possibilidade de revogação por lei ordinária. Precedentes. 82 SÚMULAS - PRECEDENTES I - A revogação, por lei ordinária, da isenção da Cofins, concedida pela LC n. 70/1991 às sociedades civis de prestação de serviços profissionais, é constitucionalmente válida. Precedentes. II - O conflito entre lei complementar e lei ordinária possui natureza constitucional. III - Embargos de declaração convertidos em agravo regimental a que se nega provimento. (EDcl no RE n. 327.418-SC, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, DJ 24.11.2006, p. 74). Constitucional. Tributário. Cofins. Isenção. Usurpação de competência. Precedentes. I - O conflito entre lei complementar e lei ordinária possui natureza constitucional, pelo que a sua análise pelo Superior Tribunal de Justiça configura usurpação de competência desta Corte. II - Agravo improvido. (AgRg no RE n. 480.145-SC, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, Primeira Turma, DJ 24.11.2006, p. 73). I. Recurso extraordinário e recurso especial: interposição simultânea: inocorrência, na espécie, de perda de objeto ou do interesse recursal do recurso extraordinário da entidade sindical: apesar de favorável a decisão do Superior Tribunal de Justiça no recurso especial, não transitou em julgado e é objeto de RE da parte contrária. II. Recurso extraordinário contra acórdão do STJ em recurso especial: hipótese de cabimento, por usurpação da competência do Supremo Tribunal para o deslinde da questão.C. Pr. Civil, art. 543, § 2º. Precedente: AI n. 145.589-AgR, Pertence, RTJ 153/684. 1. No caso, a questão constitucional - definir se a matéria era reservada à lei complementar ou poderia ser versada em lei ordinária - é prejudicial da decisão do recurso especial, e, portanto, deveria o STJ ter observado o disposto no art. 543, § 2º, do C. Pr. Civil. 2. Em conseqüência, dá-se provimento ao RE da União para anular o acórdão do STJ por usurpação da competência do Supremo Tribunal e determinar que outro seja proferido, adstrito às questões infraconstitucionais acaso aventadas, bem como, com base no art. 543, § 2º, do C. Pr. Civil, negar provimento ao RE do Sescon-DF contra o acórdão do TRF-1ª Região, em razão da jurisprudência do Supremo Tribunal sobre a questão constitucional de mérito. III. PIS/Cofins: revogação pela Lei n. 9.430/1996 da isenção concedida às sociedades civis de profissão pela LC n. 70/1991. RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 83 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 1. A norma revogada - embora inserida formalmente em lei complementar concedia isenção de tributo federal e, portanto, submetia-se à disposição de lei federal ordinária, que outra lei ordinária da União, validamente, poderia revogar, como efetivamente revogou. 2. Não há violação do princípio da hierarquia das leis - rectius, da reserva constitucional de lei complementar - cujo respeito exige seja observado o âmbito material reservado pela Constituição às leis complementares. 3. Nesse sentido, a jurisprudência sedimentada do Tribunal, na trilha da decisão da ADC n. 1, 1º.12.1993, Moreira Alves, RTJ 156/721, e também pacificada na doutrina. (RE n. 419.629-8-DF, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ 30.06.2006, p. 658). Por outro lado, verifica-se que o acórdão rescindendo afastou a aplicação do art. 56 da Lei n. 9.430/1996 tão-somente sob o fundamento de que, em razão do princípio da hierarquia das leis, a isenção concedida por lei complementar não poderia ser revogada por lei ordinária. Desta forma, o julgado incorreu em nítida ofensa ao art. 97 da CF/1988, afastando a aplicação da lei federal sem, contudo, declarar-lhe a inconstitucionalidade. Nesse contexto, o acórdão rescindendo contrariou frontalmente o disposto na Súmula Vinculante n. 10STF, que dispõe: Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de Tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, afasta sua incidência, no todo ou em parte. Justifica, também por esse fundamento, a admissão da presente ação rescisória. Superado o óbice do conhecimento, passo a examinar a tese jurídica questionada. Constata-se que a Suprema Corte, partindo da interpretação de dispositivos constitucionais, firmou posição de que não se faz necessária a edição de lei complementar para regular as contribuições de que trata o art. 195 da CF/1988, providência que pode ser levada a termo por meio de lei ordinária. Diante de tal entendimento, verifica-se que o STF concluiu que a LC n. 70/1991, no tocante à concessão da debatida isenção, é materialmente ordinária, razão pela qual demonstra-se legítima a revogação perpetrada pelo art. 56 da Lei n. 9.430/1996: 84 SÚMULAS - PRECEDENTES Recurso extraordinário. Sociedade civil de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada. Cofins. Modalidade de contribuição social. Outorga de isenção por lei complementar (LC n. 70/1991). Matéria não submetida à reserva constitucional de lei complementar. Conseqüente possibilidade de utilização de lei ordinária (Lei n. 9.430/1996) para revogar, de modo válido, a isenção anteriormente concedida pela LC n. 70/1991. Inexistência de violação constitucional. A questão concernente às relações entre a lei complementar e a lei ordinária. Inexistência de vínculo hierárquico-normativo entre a lei complementar e a lei ordinária. Espécies legislativas que possuem campos de atuação materialmente distintos. Doutrina. Precedentes (STF). Recurso de agravo improvido. (AgRg no RE n. 516.053-SP, Rel. Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJ 14.11.2007, p. 487). Recurso extraordinário. Sociedade civil de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada. Cofins. Modalidade de contribuição social. Outorga de isenção por lei complementar (LC n. 70/1991). Matéria não submetida à reserva constitucional de lei complementar. Conseqüente possibilidade de utilização de lei ordinária (Lei n. 9.430/1996) para revogar, de modo válido, a isenção anteriormente concedida pela LC n. 70/1991. Inexistência de violação constitucional. A questão concernente às relações entre a lei complementar e a lei ordinária. Inexistência de vínculo hierárquico-normativo entre a lei complementar e a lei ordinária. Espécies legislativas que possuem campos de atuação materialmente distintos. Doutrina. Precedentes (STF). Recurso de agravo improvido. (AgRg no RE n. 476.264-1-SP, Rel. Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJ 09.11.2007, p. 70). Tributário. Sociedade civil de prestação de serviços profissionais. Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins. Revogação de isenção por lei ordinária. Possibilidade. Precedentes. Agravo regimental desprovido. O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento no sentido de que a revogação da isenção do recolhimento da Cofins concedida pela Lei Complementar n. 70/1991 por lei ordinária não afronta o princípio da hierarquia das leis. (AgRg no RE n. 412.748-2-RJ, Rel. Ministra Carmem Lúcia, Primeira Turma, DJ 29.06.2007, p. 50). A fim de melhor elucidar os fundamentos adotados pela Excelsa Corte para tomada de posição em relação ao presente tema, transcrevo trecho do voto condutor proferido pelo Min. Celso de Mello no EDcl no RE n. 476.227-MG: Mostra-se importante registrar que esta Corte já assinalou, a propósito das contribuições a que se refere o art. 195 da Constituição (RTJ 143/313-314 - RTJ 143/684), que a lei ordinária revela-se tipo normativo juridicamente adequado RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 85 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA à veiculação dessa modalidade de tributo, o que permite reconhecer que a regulação de tais espécies tributárias - notadamente dos elementos estruturais que lhes compõem a hipótese de incidência - não se acha incluída no domínio normativo da lei complementar. Não foi por outra razão que o Supremo Tribunal Federal, em pronunciamento concernente à própria Cofins, deixou assentado - como tive o ensejo de destacar em diversas decisões proferidas nesta Corte (RE n. 480.156-RJ, Rel. Min. Celso de Mello - RE n. 481.779, Rel. Min. Celso de Mello , v.g.) - que a Lei Complementar n. 70/1991, a despeito de seu caráter formalmente complementar, veiculou matéria não submetida à reserva constitucional de lei complementar, a permitir, por isso mesmo, que eventuais alterações no texto desse diploma legislativo pudessem ser introduzidas mediante simples lei ordinária (RTJ 156/721-722). À luz dos julgados proferidos pelo Pretório Excelso, entendo, portanto, que o STJ não detinha competência para analisar matéria de índole exclusivamente constitucional, qual seja, afronta ao princípio da hierarquia das leis. Assim sendo, admito a ação rescisória para, julgando-a procedente, rescindir o acórdão impugnado, confirmando o aresto do TRF da 4ª Região que manteve a sentença proferida pelo Juízo de 1º Grau, a qual denegou a segurança postulada pelos impetrantes. Condeno as requeridas a reembolsar a autora nas custas e a pagar honorários de advogado, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa. É o voto. VOTO-REVISÃO O Sr. Ministro Francisco Falcão: Trata-se de ação rescisória ajuizada pela Fazenda Nacional contra o acórdão proferido pela Primeira Turma, relatado pelo Ministro José Augusto Delgado, onde restou consignada a aplicação da Súmula n. 276 deste STJ, reconhecendo-se a isenção da Cofins para as sociedades civis de prestação de serviços profissionais. A autora pleiteia a rescisão do julgado por entender que o STJ usurpou a competência do Supremo Tribunal Federal, contrariando os artigos 102, III e 105, III da CF. Primeiramente, observo que deve ser afastada a incidência da Súmula n. 343 do STF, haja vista que a referida súmula não tem aplicação nos casos em que a interpretação controvertida diz respeito a texto constitucional. 86 SÚMULAS - PRECEDENTES Este o entendimento majoritário deste Tribunal, conforme se dessume dos seguintes precedentes, verbis: Recurso especial em ação rescisória. Violação literal de lei. Imposto de renda. Pessoa jurídica. Decisão rescindenda. Abordagem constitucional. Lei n. 7.738/1989, art. 15, parágrafo único. Súmula n. 343-STF. Afastamento. Inexistência de violação aos arts. 458 e 535 do CPC. Decadência. Matéria acobertada pela preclusão. I - Não há que se falar em afronta aos arts. 458 e 535 do CPC, haja vista que já nos embargos infringentes a questão ora tida por omissa, ou seja, a alegada aplicação da Súmula n. 343 do STF à espécie, foi explicitamente decidida pelo Tribunal a quo, que entendeu por afastá-la. Assim, os embargos de declaração opostos tinham caráter eminentemente infringente, o que não se coaduna com a sua função integrativa, tendo andado bem a Corte de origem ao improvê-los. II - Afastada a preliminar de decadência para o ajuizamento da ação rescisória pela unanimidade do Colegiado. Assim, tendo em vista que o acórdão referido fora prolatado e publicado antes das alterações promovidas pela Lei n. 10.325/2001 ao art. 498 do CPC, impunha-se ao recorrente interpor simultaneamente embargos infringentes à porção não-unânime do julgado e recurso especial à parte unânime da decisão, sob pena da matéria decidida por unanimidade restar acobertada pela preclusão. Precedentes: REsp n. 416.858-SC, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 15.03.2004; REsp n. 593.465-RS, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 14.11.2005. III - O acórdão recorrido entendeu que a decisão rescindenda não teria traduzido “o entendimento filiado por esta Colenda Corte, ao considerar inconstitucional o artigo 15, parágrafo único da Lei n. 7.730/1989” (fl. 179), versando, pois, de questão constitucional, pelo que não se aplicaria ao caso o Verbete Sumular n. 343-STF. IV - Não prospera a tese trazida pelo ora recorrente de que a questão controvertida fora tratada unicamente pelo enfoque infraconstitucional. Na decisão rescindenda realmente houve o afastamento da posição adotada pelo Tribunal Pleno acerca da constitucionalidade do art. 15, parágrafo único, da Lei n. 7.738/1989, de sorte que houve inegável discussão acerca da constitucionalidade ou não do referido artigo de Lei. Assim sendo, é de ser mantido o entendimento pela inaplicabilidade, ao caso, do Verbete Sumular n. 343 do STF. V - Importante destacar que o Supremo Tribunal Federal em diversas oportunidades já se manifestou pela constitucionalidade, mesmo que em controle difuso, do ditame do dispositivo legal ora em testilha, merecendo destaque o entendimento exarado pela Eg. Primeira Seção desta Corte de que “concorre decisivamente para um tratamento diferenciado do que seja ‘literal violação’ a existência de precedente do STF, guardião da Constituição. Ele é que justifica, nas ações rescisórias, a substituição do parâmetro negativo da Súmula n. 343 por um parâmetro positivo, segundo o qual há violação à Constituição RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 87 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA na sentença que, em matéria constitucional é contrária a pronunciamento do STF. Precedente da 1ª Seção: EREsp n. 391.594-DF, Min. José Delgado, DJ de 30.05.2005”. “No caso dos autos, a existência de precedente do STF, ainda que em controle difuso, declarando constitucional lei que anteriormente não foi aplicada sob alegação de inconstitucionalidade, importa o cabimento da ação rescisória” (EREsp n. 608.122-RJ, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Seção, julgado em 09.05.2007, DJ de 28.05.2007). VI - Recurso especial improvido (REsp n. 946.970-RJ, Rel. Min. Francisco Falcão, DJ de 08.10.2007, p. 237). Processual Civil. Ação rescisória (CPC, art. 485, V). Matéria constitucional. Inaplicabilidade da Súmula n. 343-STF. Existência de pronunciamento do STF, em controle difuso, em sentido contrário ao da sentença rescindenda. 1. Na interpretação do art. 485, V, do Código de Processo Civil, que prevê a rescisão de sentença que “violar literal disposição de lei”, a jurisprudência do STJ e do STF sempre foi no sentido de que não é toda e qualquer violação à lei que pode comprometer a coisa julgada, dando ensejo à ação rescisória, mas apenas aquela especialmente qualificada. 2. Na esteira desse entendimento, editou-se a Súmula n. 343-STF, segundo a qual “Não cabe ação rescisória por ofensa a literal dispositivo de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos Tribunais”. 3. Ocorre, porém, que a lei constitucional não é uma lei qualquer, mas a lei fundamental do sistema, na qual todas as demais assentam suas bases de validade e de legitimidade, e cuja guarda é a missão primeira do órgão máximo do Poder Judiciário, o Supremo Tribunal Federal (CF, art. 102). 4. Por essa razão, a jurisprudência do STF emprega tratamento diferenciado à violação da lei comum em relação à da norma constitucional, deixando de aplicar, relativamente a esta, o Enunciado de sua Súmula n. 343, à consideração de que, em matéria constitucional, não há que se cogitar de interpretação apenas razoável, mas sim de interpretação juridicamente correta. 5. Essa, portanto, a orientação a ser seguida nos casos de ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC: em se tratando de norma infraconstitucional, não se considera existente “violação a literal disposição de lei”, e, portanto, não se admite ação rescisória, quando “a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos Tribunais” (Súmula n. 343). Todavia, esse enunciado não se aplica quando se trata de “texto” constitucional. 6. A orientação revela duas preocupações fundamentais da Corte Suprema: a primeira, a de preservar, em qualquer circunstância, a supremacia da Constituição e a sua aplicação uniforme a todos os destinatários; a segunda, a de preservar a sua autoridade de guardião da Constituição. Esses os valores dos quais deve se lançar mão para solucionar os problemas atinentes à rescisão de julgados em matéria constitucional. 88 SÚMULAS - PRECEDENTES 7. Assim sendo, concorre decisivamente para um tratamento diferenciado do que seja “literal violação” a existência de precedente do STF, guardião da Constituição. Ele é que justifica, nas ações rescisórias, a substituição do parâmetro negativo da Súmula n. 343 por um parâmetro positivo, segundo o qual há violação à Constituição na sentença que, em matéria constitucional é contrária a pronunciamento do STF. Precedente da 1ª Seção: EREsp n. 391.594-DF, Min. José Delgado, DJ de 30.05.2005. 8. No caso dos autos, a existência de precedente do STF, ainda que em controle difuso (RE n. 150.755-1-PE, relatado pelo Ministro Sepúlveda Pertence), reconhecendo a constitucionalidade do art. 28 da Lei n. 7.738, de 09.03.1989, relativamente às empresas “exclusivamente prestadoras de serviços”, que anteriormente não foi aplicado sob alegação de inconstitucionalidade, enseja o cabimento da ação rescisória. 9. Embargos de divergência providos (EREsp n. 608.122-RJ, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ de 28.05.2007). Assim, tendo em vista que a tese jurídica é de natureza constitucional, tenho como afastada a Súmula n. 343-STF. Ultrapassado este óbice, tem-se de rigor a procedência da ação rescisória. É que o STF, com base na interpretação de princípios e dispositivos constitucionais, já definiu que não se faz necessária a edição de lei complementar para regular as contribuições de que trata o art. 195 da CF/1988, sendo viável a alteração da Lei Complementar n. 70/1991, com a revogação da isenção da Cofins. Assim, em face da higidez da Lei n. 9.430/1996, restou viabilizada a revogação isencional pretendida. Nesse panorama, observando-se que a matéria era mesmo de natureza constitucional (princípio da hierarquia das leis), não era permitido ao STJ examinar a controvérsia no âmbito do recurso especial. Tais as razões expendidas, tenho como procedente a ação para rescindir o acórdão impugnado, confirmando o acórdão recorrido que manteve a sentença de Primeiro Grau. É o voto. VOTO O Sr. Ministro Teori Albino Zavascki: Sr. Presidente, acompanho o voto da Sra. Ministra Relatora, apenas a rescisão, no meu entender, o juízo de rescisão deve-se dar também por ofensa ao art. 97. Digo isso com base na Súmula Vinculante n. 10, do Supremo Tribunal Federal. RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 89 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA O acórdão rescindendo afastou a aplicação de uma lei sem declarar a sua inconstitucionalidade. Isso equivale à ofensa ao art. 97. Rescindido, também voto no sentido de confirmar as decisões que denegaram a segurança, tendo em vista que o Supremo Tribunal Federal, conforme foi anunciado no voto da Sra. Ministra Relatora, considerou legítima a revogação, por lei ordinária, da isenção prevista na lei complementar. Por esse fundamento, acompanho o voto da Sra. Ministra Relatora, julgando procedente a ação rescisória. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL N. 226.386-PR (99.0071448-2) Relatora: Ministra Eliana Calmon Agravante: Fazenda Nacional Procurador: Dolizete Fátima Michelin e outros Agravado: G A Hauer Advogados Associados Advogado: Arnaldo Conceição Junior e outros EMENTA Processual Civil e Tributário. Agravo regimental. Recurso especial. Seguimento negado (Art. 557 do CPC). Cofins. Isenção. Sociedades civis. LC n. 70/1991 e Decreto-Lei n. 2.397/1987. 1. Pacificado o entendimento desta Corte no sentido de que as sociedades civis de prestação de serviços são isentas da Cofins, nos termos do art. 6º, II da Lei Complementar n. 70/1991, sendo irrelevante a circunstância de haverem optado pelo regime instituído pela Lei n. 8.541/1992. 2. Confirmada a decisão monocrática que, nos termos do art. 557 do CPC, negou seguimento ao recurso especial, cuja pretensão era contrária à jurisprudência pacífica desta Corte. 3. Agravo regimental improvido. 90 SÚMULAS - PRECEDENTES ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental. Votaram com a Relatora os Srs. Ministros Franciulli Netto e Laurita Vaz. Ausentes os Srs. Ministros Paulo Medina e Francisco Peçanha Martins. Brasília (DF), 13 de agosto de 2002 (data do julgamento). Ministra Eliana Calmon, Presidente e Relatora DJ 09.09.2002 RELATÓRIO A Sra. Ministra Eliana Calmon: - Trata-se de agravo regimental interposto de decisão que, nos termos do art. 557 do CPC, negou seguimento ao recurso especial, porque a pretensão articulada era contrária à jurisprudência dominante nesta Corte, no sentido de que as sociedades mencionadas no art. 1º do DecretoLei n. 2.297/1987 são isentas da Cofins, sendo irrelevante a circunstância de terem optado pelo regime da Lei n. 8.541/1992, para fins de pagamento do imposto de renda, pois a isenção independe do modo pelo qual as empresas recolhem este imposto. Alega a agravante que, ao concluir que a Lei n. 9.430/1996 por ser ordinária, não podia extinguir isenção outorgada pela Lei Complementar n. 70/1991, a decisão agravada acabou por declarar a inconstitucionalidade daquela lei, exercendo controle difuso de constitucionalidade, matéria reservada ao plenário do Tribunal, violando, assim, o art. 97 da CF/1988. Sustenta, também, que houve ofensa ao art. 102, § 2º da Carta Magna, que atribui efeito vinculante às decisões definitivas de mérito do STF, em ações declaratórias de constitucionalidade, ao argumento de que a decisão impugnada orientou-se de forma contrária ao entendimento sufragado pela Suprema Corte, no julgamento da ADC n. 1-DF, de 1º.02.1993, no sentido de que a LC n. 70/1991 é materialmente ordinária, podendo, assim, ser regulamentada por lei de mesmo nível hierárquico. Postula exame do pleito pelo Órgão Colegiado, se não reconsiderada a decisão. É o relatório. RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 91 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VOTO A Sra. Ministra Eliana Calmon (Relatora): - O agravo não logra prosperar. Trata-se, na verdade, de matéria reiteradamente examinada por esta Corte, onde se firmou jurisprudência no sentido de que as sociedades civis de prestação de serviços são isentas da Cofins, nos termos do art. 6º, II da Lei Complementar n. 70/1991, sendo irrelevante a circunstância de haverem optado pelo regime instituído pela Lei n. 8.541/1992, quanto ao imposto de renda, conforme precedentes colacionados na decisão agravada. Na mesma linha, inúmeros outros julgados, dos quais destaco os seguintes: Tributário. Agravo regimental. Recurso especial. Cofins. Isenção. Sociedades civis prestadoras de serviços. Art. 6º, II, LC n. 70/1991. Precedentes. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que as sociedades civis prestadoras de serviços são isentas da Cofins, nos termos do art. 6º, II, da Lei Complementar n. 70/1991. Agravo regimental improvido. (REsp n. 297.461-PR, Relator Ministro Francisco Falcão, 1ª Turma, unânime, DJ de 03.09.2001, p. 153). Tributário e Processual Civil. Agravo regimental. Recurso especial. Cofins. Sociedades civis. Isenção. Acórdão recorrido. Fundamento constitucional e infraconstitucional. - Verificado que o acórdão recorrido está assentado em fundamentos constitucional e infraconstitucional, qualquer deles suficiente, por si só, para mantê-lo, tendo o recorrente impetrado o competente recurso extraordinário, escapando do óbice contido na Súmula n. 126, desta Corte, faz-se necessária a apreciação da questão federal suscitada. - O art. 6º, da Lei Complementar n. 70/1991, isentou da contribuição da Cofins as sociedades civis de que trata o art. 1º, do Decreto-Lei n. 2.397/1987, abrangendo as sociedades civis que tenham por objetivo a prestação de serviços profissionais, relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, registradas no Registro Civil das Pessoas Jurídicas e constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no País. - Precedentes. - Agravo regimental improvido. (AGREsp n. 258.236-RS, Relator Francisco Falcão, 1ª Turma, unânime, DJ de 03.09.2001, p. 149). 92 SÚMULAS - PRECEDENTES Como a pretensão do recurso especial era manifestamente contrária à jurisprudência consolidada por este Tribunal, outra solução não restava senão negar-lhe seguimento, na forma do art. 557 do CPC, sendo inviável, a esta altura, reabrir discussão sobre a matéria, principalmente mediante a abordagem de temas de que o recurso especial não tratou. Com essas considerações, nego provimento ao agravo regimental. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL N. 297.461-PR (2000.0143771-2) Relator: Ministro Francisco Falcão Agravante: Fazenda Nacional Procurador: Ricardo Py Gomes da Silveira e outros Agravado: Prolegis Assessoria Contábil e Tributária S/C Ltda. e outro Advogado: Flavio Zanetti de Oliveira e outros EMENTA Tributário. Agravo regimental. Recurso especial. Cofins. Isenção. Sociedades civis prestadoras de serviços. Art. 6o, II, LC n. 70/1991. Precedentes. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que as sociedades civis prestadoras de serviços são isentas da Cofins, nos termos do art. 6°, II, da Lei Complementar n. 70/1991. Agravo regimental improvido. ACÓRDÃO Vistos e relatados os autos em que são partes as acima indicadas, decide a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 93 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Votaram de acordo com o Relator os Srs. Ministros Humberto Gomes de Barros, Milton Luiz Pereira e José Delgado. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Garcia Vieira. Custas, como de lei. Brasília (DF), 03 de abril de 2001 (data do julgamento). Ministro José Delgado, Presidente Ministro Francisco Falcão, Relator DJ 03.09.2001 RELATÓRIO O Sr. Ministro Francisco Falcão: Trata-se de agravo regimental interposto pela Fazenda Nacional, contra decisão que proferi às fls. 233-234, que declarou a não incidência da Cofins sobre as sociedades prestadoras de serviço, nos termos do art. 6º, II, da LC n. 70/1991. Sustenta a agravante que a r. decisão agravada teria concluído pela inconstitucionalidade da Lei n. 9.430/1996, ofendendo, por conseguinte, os artigos 97, 195, § 4º, 102, § 2º e 105, III, da Constituição Federal. Em mesa, para julgamento. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Francisco Falcão (Relator): Tenho que o presente agravo não merece provimento, em face das razões que sustentam o despacho recorrido. A matéria em debate já recebeu o pronunciamento desta Colenda Primeira Turma, restando assente o entendimento de que as sociedades civis são isentas da Cofins. Sobre o assunto, destaco a ementa dos seguintes julgados: Processual Civil e Tributário. Agravo regimental contra decisão que deu provimento a recurso especial. Cofins. Isenção. Sociedades civis prestadoras de serviços. Precedentes. 1. Agravo regimental interposto contra decisão que, com base no art. 557, § 1o, do CPC, deu provimento ao recurso especial ofertado pelo recorrido. 94 SÚMULAS - PRECEDENTES 2. A Lei Complementar n. 70/1991, de 30.12.1991, em seu art. 6º, II, isentou, expressamente, da contribuição da Cofins, as sociedades civis de que trata o art. 1º, do Decreto-Lei n. 2.397, de 22.12.1987, sem exigir qualquer outra condição senão as decorrentes da natureza jurídica das mencionadas entidades. 3. Em conseqüência da mensagem concessiva de isenção contida no art. 6º, II, da LC n. 70/1991, fixa-se o entendimento de que a interpretação do referido comando posto em Lei Complementar, conseqüentemente, com potencialidade hierárquica em patamar superior à legislação ordinária, revela que será abrangida pela isenção da Cofins as sociedades civis que, cumulativamente, apresentem os seguintes requisitos: - seja sociedade constituída exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no Brasil; - tenha por objetivo a prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada; e - esteja registrada no registro civil das pessoas jurídicas. 4. Outra condição não foi considerada pela Lei Complementar, no seu art. 6º, II, para o gozo da isenção, especialmente, o tipo de regime tributário adotado para fins de incidência ou não de Imposto de Renda. 5. Posto tal panorama, não há suporte jurídico para se acolher a tese da Fazenda Nacional de que há, também, ao lado dos requisitos acima elencados, um último, o do tipo de regime tributário adotado pela sociedade. A Lei Complementar não faz tal exigência, pelo que não cabe ao intérprete criá-la. 6. É irrelevante o fato de a recorrente ter optado pela tributação dos seus resultados com base no lucro presumido, conforme lhe permite o art. 71, da Lei n. 8.383/1991 e os arts. 1º e 2º, da Lei n. 8.541/1992. Essa opção terá reflexos para fim de pagamento do Imposto de Renda. Não afeta, porém, a isenção concedida pelo art. 6º, II, da Lei Complementar n. 70/1991, haja vista que esta, repita-se, não colocou como pressuposto para o gozo da isenção o tipo de regime tributário seguido pela sociedade civil. 7. A revogação da isenção pela Lei n. 9.430/1996 fere, frontalmente, o princípio da hierarquia das leis, visto que tal revogação só poderia ter sido veiculada por outra lei complementar. 8. Inexistência no acórdão recorrido de fundamentação unicamente na esfera constitucional. O ilustre Relator a quo apreciou, também, no âmbito legal (LC n. 70/1991, arts. 1º e 6º, II), sendo, portanto, suficiente à apreciação do recurso especial. 9. Agravo regimental improvido. (AGREsp n. 253.984-RS; DJ de 18.09.2000; Rel. Min. José Delgado). Tributário. Cofins. Sociedades civis. Isenção (art. 6o, Lei Complementar n. 70/1991. Decreto-Lei n. 2.397/1987 (art. 1o). RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 95 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 1. As sociedades civis de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, registradas no Registro Civil das Pessoas Jurídicas e constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no País, gozam de isenção da Cofins. 2. Desinfluente para solução da querela o direito de opção pelo regime de tributação de rendimentos com base no lucro real ou presumido. 3. Precedentes jurisprudenciais. 4. Recurso provido. (REsp n. 209.629-MG, Relator Ministro Milton Luiz Pereira, DJU 16.11.1999, p. 192). Direito Tributário. Isenção. Cofins. Sociedades civis. Artigo 1º do Decreto-Lei n. 2.397/1987. Imposto de renda. Isenção. Prova. Desnecessidade. A isenção relativamente ao imposto de renda não influencia na isenção relativa à Cofins conferida pelo artigo 6º da Lei Complementar n. 70/1991. As sociedades civis, beneficiadas com o favor isencional previsto no citado dispositivo, não têm que fazer prova da isenção do imposto de renda. Recurso improvido (REsp n. 192.156-PE, Relator Ministro Garcia Vieira, DJU 16.11.1999, p. 192). Ainda sobre o assunto, confira-se: REsp n. 156.839-SP, Relator Ministro José Delgado, DJU 27.04.1998, p. 104. Ressalte-se que, no acórdão recorrido, o ilustre Relator a quo apreciou a matéria no âmbito constitucional, mas também no âmbito legal (LC n. 70/1991, arts. 1º e 6º, II), sendo, portanto, suficiente à apreciação do recurso especial. Destarte, não tendo a agravante em seus argumentos conseguido infirmar o referido entendimento, não vejo como reformar o decidido. Isto posto, nego provimento ao agravo. É o meu voto. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL N. 422.342-RS (2002.0034384-7) Relator: Ministro Garcia Vieira Agravante: Fazenda Nacional 96 SÚMULAS - PRECEDENTES Procurador: Andrea Schramm e Rocha Santana e outros Agravado: Clinirim Clínica de Doenças Renais Ltda. Advogado: Ulisses André Jung e outros EMENTA Processual Civil e Tributário. Cofins. Sociedades civis prestadoras de serviços profissionais. Isenção. Decisão consoante com precedentes jurisprudenciais do STJ. Negativa de seguimento a recurso especial. Agravo regimental. Inalterabilidade do decisum. Mantém-se a decisão monocrática que negou seguimento a recurso especial interposto em confronto com a jurisprudência dominante no âmbito do STJ. As sociedades civis de prestação de serviços profissionais são beneficiadas com o favor isencional previsto pelo artigo 6º, inciso II da Lei Complementar n. 70/1991, sendo irrelevante que se tenha feito opção pelo regime tributário instituído pela Lei n. 8.541/1992. Agravo regimental improvido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Humberto Gomes de Barros, José Delgado, Francisco Falcão e Luiz Fux votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília (DF), 15 de agosto de 2002 (data do julgamento). Ministro Francisco Falcão, Presidente Ministro Garcia Vieira, Relator DJ 30.09.2002 RELATÓRIO O Sr. Ministro Garcia Vieira: A Fazenda Nacional apresenta agravo regimental contra decisão de minha lavra, pela qual neguei seguimento ao seu RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 97 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA recurso especial, porque a pretensão recursal encontrava-se contrária a iterativa jurisprudência desta Corte. Sustenta a agravante ser inaplicável o disposto no art. 557 do CPC, eis que, no caso em tela, a jurisprudência não se encontra consolidada. Alega que “a LC n. 70 ao instituir a isenção condicionou-a ao regime de tributação pelo imposto de renda, que pela simetria do sistema tributário também se aplica à isenção da Cofins, devendo ser observada a mesma exigência, pois não há qualquer embasamento lógico-jurídico para que a empresa que optou pelo regime dos lucros presumidos tenha que recolher o imposto de renda, por não fazer jus à isenção, e em relação a Cofins em que observa o mesmo regime haja a pretendida isenção”. Pede reconsideração ou seja o feito submetido a julgamento pela Eg. Primeira Turma. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Garcia Vieira (Relator): Ao recurso interposto pela Fazenda Nacional contra decisão que reconheceu a isenção da Cofins para as sociedades civis de prestação de serviços profissionais, até a vigência da Lei n. 9.430/1996, neguei seguimento, com amparo em precedentes jurisprudenciais desta Corte, constando da decisão os seguintes termos: O inconformismo recursal não merece prosperar, porquanto a C. Turma Julgadora adotou posicionamento em sintonia com a jurisprudência pacífica desta Egrégia Corte Superior, que se posicionou no sentido de que as sociedades civis de prestação de serviços profissionais são beneficiadas com o favor isencional previsto pelo artigo 6º, inciso II da Lei Complementar n. 70/1991, sendo irrelevante que se tenha feito opção pelo regime tributário instituído pela Lei n. 8.541/1992. Neste diapasão, devem ser citados os seguintes precedentes nos Recursos Especiais n. 221.710-RJ, DJ de 18.02.2002, rel. Eminente Ministro Francisco Peçanha Martins, n. 260.960-RS, DJ de 26.03.2001, rel. Eminente Ministro Humberto Gomes de Barros, e n. 371.214-MG, DJ de 18.03.2002, da relatoria do Eminente Ministro José Delgado, este último assim ementado: Tributário. Cofins. Isenção. Sociedades civis prestadoras de serviços. Precedentes. 1. A Lei Complementar n. 70/1991, de 30.12.1991, em seu art. 6º, II, isentou, expressamente, da contribuição do Cofins, as sociedades civis 98 SÚMULAS - PRECEDENTES de que trata o art. 1º, do Decreto-Lei n. 2.397, de 22.12.1987, sem exigir qualquer outra condição senão as decorrentes da natureza jurídica das mencionadas entidades. 2. Em conseqüência da mensagem concessiva de isenção contida no art. 6º, II, da LC n. 70/1991, fixa-se o entendimento de que a interpretação do referido comando posto em Lei Complementar, conseqüentemente, com potencialidade hierárquica em patamar superior à legislação ordinária, revela que será abrangida pela isenção do Cofins as sociedades civis que, cumulativamente, apresentem os seguintes requisitos: - seja sociedade constituída exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no Brasil; - tenha por objetivo a prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada; e - esteja registrada no registro civil das pessoas jurídicas. 3. Outra condição não foi considerada pela Lei Complementar, no seu art. 6º, II, para o gozo da isenção, especialmente, o tipo de regime tributário adotado para fins de incidência ou não de Imposto de Renda. 4. Posto tal panorama, não há suporte jurídico para se acolher a tese da Fazenda Nacional de que há, também, ao lado dos requisitos acima elencados, um último, o do tipo de regime tributário adotado pela sociedade. A Lei Complementar não faz tal exigência, pelo que não cabe ao intérprete criá-la. 5. É irrelevante o fato de a recorrente ter optado pela tributação dos seus resultados com base no lucro presumido, conforme lhe permite o art. 71, da Lei n. 8.383/1991 e os arts. 1º e 2º, da Lei n. 8.541/1992. Essa opção terá reflexos para fins de pagamento do Imposto de Renda. Não afeta, porém, a isenção concedida pelo art. 6º, II, da Lei Complementar n. 70/1991, haja vista que esta, repita-se, não colocou como pressuposto para o gozo da isenção o tipo de regime tributário seguido pela sociedade civil. 6. A revogação da isenção pela Lei n. 9.430/1996 fere, frontalmente, o princípio da hierarquia das leis, visto que tal revogação só poderia ter sido veiculada por outra lei complementar. 7. Recurso provido. (REsp n. 371.214-MG, Rel. Min. José Delgado, DJ 18.03.2002) (fl. 68). Contra esta decisão, a vencida apresenta agravo regimental, repisando as razões suscitadas no recurso especial e alegando que a matéria não se encontra pacificada, sendo, portanto, inaplicável o art. 557 do CPC. A irresignação recursal não prospera, todavia, por isso que subsistem os fundamentos da decisão hostilizada. RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 99 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Na verdade, o entendimento pacífico adotado no âmbito desta Corte é o que foi trazido à colação nos precedentes citados, conforme ficou demonstrado na decisão ora impugnada. Não há, portanto, nenhuma perspectiva de êxito do inconformismo recursal. Diante do exposto, por entender que subsistem incólumes os fundamentos da decisão impugnada, nego provimento ao presente agravo regimental. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL N. 422.741-MG (2002.0035148-1) Relator: Ministro José Delgado Agravante: Fazenda Nacional Procurador: Andrea Schramm de Rocha Santana e outros Agravado: Dhisa Auditoria e Assessoria Contabil S/C Ltda. Advogado: Renato Ourives Neves e outros EMENTA Processual Civil e Tributário. Agravo regimental. Cofins. Isenção. Sociedades civis prestadoras de serviços. Precedentes. 1. Agravo Regimental interposto contra decisão que, com base no art. 557, § 1º, do CPC, deu provimento ao recurso especial ofertado pela parte agravada. 2. A Lei Complementar n. 70/1991, de 30.12.1991, em seu art. 6º, II, isentou, expressamente, da contribuição da Cofins, as sociedades civis de que trata o art. 1º, do Decreto-Lei n. 2.397, de 22.12.1987, sem exigir qualquer outra condição senão as decorrentes da natureza jurídica das mencionadas entidades. 3. Em conseqüência da mensagem concessiva de isenção contida no art. 6º, II, da LC n. 70/1991, fixa-se o entendimento de que a interpretação do referido comando posto em Lei Complementar, conseqüentemente, com potencialidade hierárquica em patamar 100 SÚMULAS - PRECEDENTES superior à legislação ordinária, revela que serão abrangidas pela isenção da Cofins as sociedades civis que, cumulativamente, apresentem os seguintes requisitos: - sejam sociedades constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no Brasil; - tenham por objetivo a prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada; e - estejam registradas no registro civil das pessoas jurídicas. 4. Outra condição não foi considerada pela Lei Complementar, no seu art. 6º, II, para o gozo da isenção, especialmente, o tipo de regime tributário adotado para fins de incidência ou não de Imposto de Renda. 5. Posto tal panorama, não há suporte jurídico para se acolher a tese da Fazenda Nacional de que há, também, ao lado dos requisitos acima elencados, um último, o do tipo de regime tributário adotado pela sociedade. A Lei Complementar não faz tal exigência, pelo que não cabe ao intérprete criá-la. 6. É irrelevante o fato de a recorrente ter optado pela tributação dos seus resultados com base no lucro presumido, conforme lhe permite o art. 71, da Lei n. 8.383/1991 e os arts. 1º e 2º, da Lei n. 8.541/1992. Essa opção terá reflexos para fins de pagamento do Imposto de Renda. Não afeta, porém, a isenção concedida pelo art. 6º, II, da Lei Complementar n. 70/1991, haja vista que esta, repita-se, não colocou como pressuposto para o gozo da isenção o tipo de regime tributário seguido pela sociedade civil. 7. A revogação da isenção pela Lei n. 9.430/1996 fere, frontalmente, o princípio da hierarquia das leis, visto que tal revogação só poderia ter sido veiculada por outra lei complementar. 8. Agravo regimental não provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 101 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Ministro Relator. Os Srs. Ministros Francisco Falcão, Luiz Fux, Garcia Vieira e Humberto Gomes de Barros votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília (DF), 18 de junho de 2002 (data do julgamento). Ministro Francisco Falcão, Presidente Ministro José Delgado, Relator DJ 09.09.2002 RELATÓRIO O Sr. Ministro José Delgado: Cuida-se de agravo regimental interposto contra decisão que, com base no art. 557, § 1º, do CPC, deu provimento ao recurso especial ofertado pela parte agravada. Acórdão a quo segundo o qual a isenção da Cofins, prevista na LC n. 70/1991, pode ser revogada pela Lei n. 9.430/1996, por não se tratar de matéria reservada exclusivamente à lei complementar. Alega-se, em síntese, que: a) decisão agravada, ao entender que a Lei n. 9.430/1996 (art. 56) não tem o condão de revogar a isenção criada pelo art. 6º, II, da LC n. 70/1991, fez, indubitavelmente, controle difuso de sua constitucionalidade, apesar de não admiti-lo, restando violado o art. 97, da CF/1988, o qual determina reserva de plenário para decisões de tal monta; b) o colendo STF já se pronunciou acerca da constitucionalidade de legislação ordinária revogar dispositivo de lei complementar se esta é apenas formalmente complementar; c) em se tratando de matéria para cujo trato a Constituição Federal não exige lei complementar, como é o caso das contribuições sociais previstas no art. 195, do Texto Constitucional, lei ordinária pode revogar norma veiculada em lei complementar. d) no julgamento da ADC n. 1-DF, de 1993, restou amplamente consignado que a LC n. 70/1991 é materialmente ordinária, uma vez que a Cofins tem sua sede constitucional no art. 195, I, da Carta Magna; e) houve violação ao art. 102, § 2º, da CF/1988, o qual impõe efeito vinculante às decisões definitivas e de mérito proferidas pelo STF em sede de ADC. 102 SÚMULAS - PRECEDENTES Tecendo considerações sobre a tese abraçada e citando decisões a respeito, requer, por fim, a reforma da decisão agravada. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro José Delgado (Relator): A decisão atacada não merece ser reformada, pelo que a mantenho pelos seus próprios fundamentos. Para tanto, mister se faz a transcrição do decisório guerreado, litteratim: Vistos, etc. Cuida-se de Recurso Especial interposto pela empresa epigrafada com fulcro no art. 105, III, a e c, da Carta Magna vigente, contra v. acórdão segundo o qual a isenção da Cofins, prevista na LC n. 70/1991, pode ser revogada pela Lei n. 9.430/1996, por não se tratar de matéria reservada exclusivamente à lei complementar. Afirma-se que o v. acórdão negou vigência aos arts. 6º, II, da LC n. 70/1991, apontando, ainda, dissídio jurisprudencial. Relatados, decido. Merece prosperar a irresignação da recorrente. De início, registre-se que a Lei Complementar n. 70/1991, em seu artigo 6º, dispõe expressamente: São isentas da contribuição: I - (...). II - As sociedades civis de que trata o artigo 1º do Decreto-Lei n. 2.397, de 22.12.1987. O artigo 1º, do Decreto-Lei n. 2.397, de 22.12.1987, acima referido, tem a seguinte redação: A partir do exercício financeiro de 1989, não incidirá o Imposto de Renda das pessoas jurídicas sobre o lucro apurado, no encerramento de cada período-base, pelas sociedades civis de prestações de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, registradas no registro civil das pessoas jurídicas e constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no país. A recorrente, por ser sociedade civil de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, registradas no registro civil de pessoas jurídicas e constituídas exclusivamente por pessoas RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 103 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA físicas domiciliadas no país, entende que, independentemente do seu regime tributário, goza do direito à referida isenção. Afirma, também, que a revogação da isenção por lei ordinária fere o princípio da hierarquia das leis. Convém, para se realizar seguro confronto entre as teses divergentes das partes, que se volte a reexaminar os termos do art. 1º, do Decreto-Lei n. 2.397/1987 e, conseqüentemente, a extensão dos seus efeitos. Afirma o referido dispositivo legal que, a partir do exercício financeiro de 1989, não incidirá o imposto de renda das pessoas jurídicas sobre o lucro apurado, no encerramento de cada período base, em se tratando de sociedades civis de prestações de serviços profissionais (...). O entendimento expelido pela mensagem contida no texto da lei é o de que não haverá incidência do imposto de renda sobre lucro apurado, isto é, mesmo que a sociedade civil apure, em sua escrita fiscal, lucro decorrente das suas atividades de prestação de serviço, não incide imposto de renda, isto é, está isenta do pagamento do referido tributo. Não tem, assim, qualquer relacionamento com a Cofins. Volto-me, agora, para o conteúdo do art. 6º, II, da Lei Complementar n. 70, de 30.12.1991, com a dicção seguinte: São isentas da contribuição: I - (...) II - As sociedades civis de que trata o artigo 1º do Decreto-Lei n. 2.397, de 22.12.1987. A proposição da lei é isentar, conforme está expressamente consignado em seus termos, as sociedades civis de que trata o dispositivo legal mencionado, ou seja, as sociedades civis que prestam atividades de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada. A Lei Complementar, em nenhum momento, condicionou a isenção ao regime de tributação adotado pela sociedade civil, para fins de Imposto de Renda. A interpretação do referido comando posto em Lei Complementar, conseqüentemente, com potencialidade hierárquica em patamar superior à legislação ordinária, revela que será abrangida pela isenção da Cofins as sociedades civis que, cumulativamente, apresentem os seguintes requisitos: - seja sociedade constituída exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no Brasil; - tenha por objetivo a prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada; e - esteja registrada no registro civil das pessoas jurídicas. Outra condição não foi considerada pela Lei Complementar, no seu art. 6º, II, para o gozo da isenção. 104 SÚMULAS - PRECEDENTES Posto tal panorama, há suporte jurídico para se acolher a tese da recorrente de que há, também, ao lado dos requisitos acima elencados, um último, o do tipo de regime tributário adotado pela sociedade. A Lei Complementar não faz tal exigência, pelo que não cabe ao intérprete criá-la. É irrelevante o fato de a recorrente ter optado pela tributação dos seus resultados com base no lucro presumido, conforme lhe permite o art. 71, da Lei n. 8.383/1991, e os arts. 1º e 2º, da Lei n. 8.541/1992. Essa opção terá reflexos para fins de pagamento do Imposto de Renda. Não afeta, porém, a isenção concedida pelo art. 6º, II, da Lei Complementar n. 70/1991, haja vista que esta, repita-se, não colocou como pressuposto para o gozo da isenção o tipo de regime tributário seguido pela sociedade civil. Em caso análogo ao aqui tratado (REsp n. 156.839-SP, 1ª Turma, julgado, à unanimidade, em 03.03.1998), assim me pronunciei: Há, também, de se considerar que a isenção aqui tratada é a de natureza subjetiva ou pessoal. Ela toma como elemento essencial para produzir efeitos o aspecto pessoal do contribuinte, isto é, a sua natureza jurídica, sem qualquer vinculação, portanto, com o regime tributário a que se encontra subordinado. Torna-se oportuno destacar, na oportunidade, os termos do voto condutor do acórdão proferido na Apelação em Mandado de Segurança n. 53.519-PE, pelo eminente Juiz Geraldo Apoliano, anexado aos autos às fls. 125-126, onde enfrentou a questão com os fundamentos seguintes: A impetrante pretende lhe seja reconhecido o direito de não recolher a Cofins, com base no art. 6º, II, da Lei Complementar n. 70, de 30.12.1991. Porém, a Receita Federal entende que, no momento que a sociedade civil, por força da Lei n. 8.541/1992, optou pela tributação com base no lucro real ou presumido, descaracterizada ficou a situação para a isenção da Cofins, vez que a tributação passou da pessoa física dos sócios para ser exercida sobre o lucro real ou presumido, tornando-a também, obrigada ao recolhimento da Cofins. A LC n. 70/1991 declara literalmente isentas da contribuição as sociedades civis de que trata o DL n. 2.397 de 21.12.1987 e, em nenhum momento, vinculou a isenção à forma de tributação daquelas sociedades pelo imposto de renda. O que ocorre é que a contribuição para financiamento da seguridade social (Cofins), nada tem a ver com o imposto sobre a renda. É contribuição sobre o faturamento, e não sobre o lucro. É devida por qualquer pessoa jurídica que não tenha faturamento, ainda que tenha lucro. RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 105 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Conforme ensinamento do eminente tributarista Hugo de Brito Machado, na obra Curso de Direito Tributário, 8a ed., Ed. Forense, RJ, 1993 p. 151: A isenção instituída pelo art. 6º, II, da LC n. 70/1991, não é decorrente do regime de tributação dos rendimentos das sociedades de profissionais, embora tenha os mesmos fundamentos pré-jurídicos da isenção do IR concedida àquelas sociedades. Verifica-se, portanto, acolhendo entendimento do douto Parquet Federal, que a opção deferida consoante a Lei n. 8.541/1992 pela tributação do Imposto de Renda sobre o lucro presumido, não descaracteriza em nenhum momento a isenção concedida pelo art. 6º, II, da LC n. 70/1991, por constituírem dois impostos com regimes jurídicos próprios. Teria fundamento o argumento da Impetrada se a norma isentiva da Cofins tivesse dito que estão isentas da contribuição as pessoas jurídicas que adotarem o regime tributário instituído pelo DL n. 2.397/1987, o que efetivamente não ocorreu. In casu, conclui-se que o exercício do direito de optar por uma outra forma de tributação não retira da impetrada o direito à isenção da Cofins. Isto posto, confirmo a sentença do MM. juiz singular, negando provimento à apelação e à remessa oficial. É como voto. Ressalte-se, por último, que o Primeiro Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda, ao examinar o Processo de n. 10860.000.406/93-71, colheu, à unanimidade, a tese exposta nesta decisão, acompanhando voto do Conselheiro Nelson Mallmann, Relator, anexado aos autos às fls. 132134, com as razões que transcrevo: Discute-se nos presentes autos a procedência da incidência da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social – Cofins, para as sociedades civis de prestação de serviços profissionais relativo ao exercício de profissão legalmente regulamentada quando exercerem opção pela tributação do imposto de renda com base no lucro presumido. Diz o Decreto-Lei n. 2.397, de 21 de dezembro de 1987: Art. 1º - A partir do exercício financeiro de 1989, não incidirá o imposto de renda das pessoas jurídicas sobre o lucro apurado, no encerramento de cada período-base, pelas sociedades civis 106 SÚMULAS - PRECEDENTES de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, registradas no Registro Civil das Pessoas Jurídicas e constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no País. Diz a Lei Complementar n. 70, de 30 de dezembro de 1991: Art. 6º - São isentas da contribuição; I- (...) II - as sociedades civis de que trata o art. 1º do Decreto-Lei n. 2.397, de 21 de dezembro de 1987. Diz a IN RF n. 21, de 26 de fevereiro de 1992: Art. 3º - Poderão optar pela tributação com base no lucro presumido, a partir de 1º de janeiro de 1992, as pessoas jurídicas constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no País, inclusive as sociedade civis de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada e as empresas rurais, desde que: (...) Diz a Lei n. 8.541, de 23 de dezembro de 1992: Art. 1º - A partir do mês de janeiro de 1993, o imposto sobre a renda e adicional das pessoas jurídicas, inclusive das equiparadas, das sociedades civis em geral, das sociedades cooperativas, em relação aos resultados obtidos em suas operações ou atividades estranhas a sua finalidade, nos termos da legislação em vigor, e, por opção, o das sociedades civis de prestação de serviços relativos às profissões regulamentadas, será devido mensalmente, à medida em que os lucros forem auferidos. Art. 2º - A base de cálculo do imposto será o lucro real, presumido ou arbitrado, apurado mensalmente, convertida em quantidade de Unidade Fiscal de Referência - UFIR (Lei n. 8.383, de 30 de dezembro de 1991, art. 1º) diária pelo valor desta no último dia do período-base. Evidentemente se o contribuinte não estivesse enquadrado como sociedade civil de prestação de serviços relativos à profissão legalmente regulamentada não caberia, sem margem de dúvida, a restituição do valor recolhido a título de Contribuição para o RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 107 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Financiamento da Seguridade Social - Cofins, porém não é isto que se constata nos autos. Entendo que a isenção da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - Cofins, prevista na Lei Complementar n. 70/1991, art. 6º, inciso II, somente, será aplicável às sociedades civis de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, registradas no Registro Civil das Pessoas Jurídicas e constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no País, sendo que a natureza de suas atividades e dos serviços prestados deve ser exclusivamente civil; e todos os sócios devem estar em condições legais de exercer a profissão regulamentada para a qual estiverem habilitados, ainda que diferentes entre si, desde que cada um desempenhe as atividades ou prestem os serviços privativos de suas profissões e esses objetivos estejam expressos no contrato social e cujas receitas da sociedade devem provir da retribuição ao trabalho profissional dos sócios e cujas receitas da sociedade devem provir da retribuição ao trabalho profissional dos sócios ou empregados igualmente qualificados. Sendo a forma de tributação do imposto de renda destas sociedades irrelevantes (lucro real, presumido ou arbitrado), pois a isenção concedida pela lei, anteriormente citada, é para a sociedade civil, acima descrita, e não para o rendimento. Diante do exposto, voto no sentido de dar provimento ao recurso, para deferir o pedido de restituição da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social - Cofins, nos termos do pedido. A reforçar a tese acima abraçada, este Sodalício já se pronunciou sobre o tema, conforme as ementas que registro: Tributário. Cofins. Isenção. Sociedades civis prestadoras de serviços. Precedentes. 1. A Lei Complementar n. 70/1991, de 30.12.1991, em seu art. 6º, II, isentou, expressamente, da contribuição do Cofins, as sociedades civis de que trata o art. 1º, do Decreto-Lei n. 2.397, de 22.12.1987, sem exigir qualquer outra condição senão as decorrentes da natureza jurídica das mencionadas entidades. 2. Em conseqüência da mensagem concessiva de isenção contida no art. 6º, II, da LC n. 70.1991, fixa-se o entendimento de que a interpretação do referido comando posto em Lei Complementar, conseqüentemente, com potencialidade hierárquica em patamar superior à legislação ordinária, revela que será abrangida pela isenção do Cofins as sociedades civis que, cumulativamente, apresentem os seguintes requisitos: 108 SÚMULAS - PRECEDENTES - seja sociedade constituída exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no Brasil; - tenha por objetivo a prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada; e - esteja registrada no registro civil das pessoas jurídicas. 3. Outra condição não foi considerada pela Lei Complementar, no seu art. 6º, II, para o gozo da isenção, especialmente, o tipo de regime tributário adotado para fins de incidência ou não de Imposto de Renda. 4. Posto tal panorama, não há suporte jurídico para se acolher a tese da Fazenda Nacional de que há, também, ao lado dos requisitos acima elencados, um último, o do tipo de regime tributário adotado pela sociedade. A Lei Complementar não faz tal exigência, pelo que não cabe ao intérprete criá-la. 5. É irrelevante o fato de a recorrente ter optado pela tributação dos seus resultados com base no lucro presumido, conforme lhe permite o art. 71, da Lei n. 8.383/1991 e os arts. 1º e 2º, da Lei n. 8.541/1992. Essa opção terá reflexos para fins de pagamento do Imposto de Renda. Não afeta, porém, a isenção concedida pelo art. 6º, II, da Lei Complementar n. 70/1991, haja vista que esta, repita-se, não colocou como pressuposto para o gozo da isenção o tipo de regime tributário seguido pela sociedade civil. 6. A revogação da isenção pela Lei n. 9.430/1996 fere, frontalmente, o princípio da hierarquia das leis, visto que tal revogação só poderia ter sido veiculada por outra lei complementar. 7. Recurso provido. (REsp n. 354.012-SC, 1ª Turma, deste Relator, julg. em 20.11.2001). Tributário. Cofins. Sociedades civis. Isenção (art. 6º, Lei Complementar n. 70/1991. Decreto-Lei n. 2.397/1987 (art. 1º). 1. As sociedades civis de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, registradas no Registro Civil das Pessoas Jurídicas e constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no país, gozam de isenção da Cofins. 2. Desinfluente para solução da querela o direito de opção pelo regime de tributação de rendimentos com base no lucro real ou presumido. 3. Precedentes jurisprudenciais. 4. Recurso provido. (REsp n. 209.629-MG, 1ª Turma, Rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ de 16.11.1999). RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 109 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Direito Tributário. Isenção. Cofins. Sociedades civis. Artigo 1º do DecretoLei n. 2.397/1987. Imposto de Renda. Isenção. Prova. Desnecessidade. - A isenção relativamente ao imposto de renda não influencia na isenção relativa à Cofins conferida pelo artigo 6º da Lei Complementar n. 70/1991. - As sociedades civis, beneficiadas com o favor isencional previsto no citado dispositivo, não têm que fazer prova da isenção do imposto de renda. - Recurso improvido. (REsp n. 192.156-PE, 1ª Turma, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ de 28.06.1999). Por outro lado, a revogação da isenção pela Lei n. 9.430/1996 fere, frontalmente, o princípio da hierarquia das leis, visto que tal revogação só poderia ter sido veiculada por outra lei complementar. Como se percebe, o venerando acórdão está a reclamar reparação, pelo que há, conforme visto do posicionamento acima demonstrado, possibilidade de se apoiar a tese desenvolvida pela recorrente, face à existência de suporte legal e jurisprudencial. Pacificado o assunto a respeito no seio jurisprudencial deste Egrégio Sodalício, não havendo mais dissídio a respeito da matéria, cabe-se prover o recurso. Por tais fundamentações e amparado pelo art. 557, § 1º, do CPC, dou provimento ao Especial. Com relação à irresignação da agravante, neste aspecto, não vislumbro qualquer novidade em seu agravo regimental, modificadora dos fundamentos supra-referenciados, pelo que nada tenho a acrescentar. Não há, conforme visto das assertivas acima demonstradas, possibilidade de se apoiar a tese desenvolvida. Por tais fundamentos, nego provimento ao agravo regimental. É como voto. RECURSO ESPECIAL N. 221.710-RJ (99.0059187-9) Relator: Ministro Francisco Peçanha Martins Recorrente: Fazenda Nacional Procurador: Maria da Graça Santiago de Almeida e outros 110 SÚMULAS - PRECEDENTES Recorrido: Motta Fernandes Rocha e Associados - Advogados Advogado: Antônio Carlos Garcia de Souza e outros Sustentação oral: Eunyce Faveret Porchat Secco, pelo recorrido EMENTA Tributário. Cofins. Sociedades civis de prestação de serviços profissionais. Isenção. Requisitos essenciais. Regime tributário. Lei n. 8.541/1992. Revogação da LC n. 70/1991. Impossibilidade. Princípio da hierarquia das leis. Lei n. 9.430/1996 (Lei Ordinária). Precedentes. - A Lei Complementar n. 70/1991, em seu art. 6º, inc. II, isentou da Cofins, as sociedades civis de prestação de serviços de que trata o art. 1º do Decreto-Lei n. 2.397, de 22 de dezembro de 1987, estabelecendo como condições somente aquelas decorrentes da natureza jurídica das referidas sociedades. - A isenção concedida pela Lei Complementar n. 70/1991 não pode ser revogada pela Lei n. 9.430/1996, lei ordinária, em obediência ao princípio da hierarquia das leis. - A opção pelo regime tributário instituído pela Lei n. 8.541/1992 não afeta a isenção concedida pelo art. 6º, II da LC n. 70/1991. Entre os requisitos elencados como pressupostos ao gozo do benefício não está inserido o tipo de regime tributário adotado pela sociedade para recolhimento do Imposto de Renda. - Recurso especial não conhecido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso. Votaram com o Relator os Ministros Eliana Calmon, Franciulli Netto, Laurita Vaz e Paulo Medina. Brasília (DF), 04 de outubro de 2001 (data do julgamento). Ministra Eliana Calmon, Presidente Ministro Francisco Peçanha Martins, Relator DJ 18.02.2002 RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 111 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RELATÓRIO O Sr. Ministro Francisco Peçanha Martins: Trata-se de recurso especial manifestado pela Fazenda Nacional, com fundamento na letra a do permissivo constitucional, contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região que, por unanimidade, negou provimento à remessa oficial e à apelação interposta pela ora recorrente nos autos da ação mandamental com pedido de liminar impetrada por Motta Fernandes Rocha e Associados - advogados, objetivando suspender e eximir-se da exigibilidade de crédito tributário decorrente da Cofins incidente sobre seu faturamento mensal, a partir de janeiro/1993. O v. acórdão declarou que as sociedades civis prestadoras de serviços relativos à profissão regulamentada estão isentas da Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social - Cofins. (art. 6º da LC n. 70/1991). Daí o apelo especial em que a ora recorrente alega ter o v. aresto violado o disposto nos artigos 1º da LC n. 70/1991, 71 da Lei n. 8.383/1991 e 1º e 2º da Lei n. 8.541/1992, quando não reconheceu que a empresa-recorrida é sujeito passivo da Cofins. Contra-razões às fls. 112-119. O recurso foi admitido no Tribunal a quo, subindo os autos a esta eg. Corte, onde vieram a mim conclusos. Dispensei o parecer do Ministério Público Federal, nos termos regimentais. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Francisco Peçanha Martins (Relator): Cuidam os autos de recurso especial manifestado pela Fazenda Nacional, com fundamento na letra a do art. 105, III da CF, contra acórdão proferido pelo TRF da 2ª Região que, por unanimidade, negou provimento à apelação e à remessa necessária interpostas nos autos de ação mandamental com pedido de liminar impetrada por Motta Fernandes Rocha e Associados - advogados visando a suspensão da exigibilidade do crédito tributário decorrente da Cofins incidente sobre o seu faturamento mensal auferido a partir de janeiro/1993, inclusive, e para eximir-se de pagamento do mesmo tributo. 112 SÚMULAS - PRECEDENTES Julgado procedente o pedido no Juízo Federal de 1ª instância, a Fazenda Nacional interpôs recurso de apelação alegando ser devida a referida contribuição, “por não se enquadrar a impetrante no art. 1º do Decreto-Lei n. 2.397/1987, pelo que não lhe alcança a isenção do art. 6º da Lei Complementar n. 70/1991.” O acórdão recorrido decidiu a lide nos termos da ementa que resumiu, transcrita a seguir (fl. 103): Tributário. Sociedade civil. Isenção. Decreto-Lei n. 2.397/1987. Lei Complementar n. 70/1991, art. 6º. As sociedades civis prestadoras de serviços relativos a profissão regulamentada, que perderam o direito a isenção do imposto de renda, por terem optado pela tributação real, não perdem sua qualidade de sociedade civil prestadora de serviços relativos a profissão regulamentada, e, assim, estão, de acordo com o art. 6º, inciso II, da Lei Complementar 70, de 1991, isentas da Contribuição Social para Financiamento da Seguridade Social - Cofins. Irresignada, a Fazenda Nacional argumenta que “o art. 2º da Lei n. 8.541/1992 dispõe que a sociedade que optar por um dos Regimes de Tributação, qual seja sobre o lucro real ou presumido, abdica do previsto no art. 1º do DL n. 2.397/1987 e enquadra-se como contribuinte do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica e, conforme definição dada pelo art. 1º da LC n. 70/1991, passa a ser sujeito passivo da Cofins.” Não assiste razão à Fazenda recorrente. É o art. 6º, II da Lei Complementar n. 70, de 30.12.1991 que estabelece a isenção da Cofins para as sociedades civis que prestam atividades de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, elencando os requisitos essenciais ao gozo do benefício, não incluído entre estes o tipo de regime tributário adotado pela sociedade. Sobre o tema esta eg. Corte já firmou entendimento que não agasalha a tese da recorrente. Vale referir julgado da eg. 1ª Turma, no REsp n. 156.839-SP, relatado pelo Min. José Delgado, do qual transcrevo trecho elucidativo, em sentido oposto à tese da recorrente: Posto tal panorama, não há suporte jurídico para se acolher a tese da recorrente de que há, também, ao lado dos requisitos acima elencados, um último, o do tipo de regime tributário adotado pela sociedade. A Lei Complementar não faz tal exigência, pelo que não cabe ao intérprete criá-la. RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 113 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA É irrelevante o fato das recorridas terem optado pela tributação dos seus resultados com base no lucro presumido, conforme lhes permite o artigo 71 da Lei n. 8.383/1991 e os artigos 1º e 2º da Lei n. 8.541/1992. Essa opção terá reflexos para fins de pagamento do Imposto de Renda. Não afeta, porém, a isenção concedida pelo artigo 6º, II, da Lei Complementar n. 70/1991, haja vista que esta, repita-se, não colocou como pressuposto para o gozo da isenção o tipo de regime tributário seguido pela sociedade civil. Há, também, de se considerar que a isenção aqui tratada é a de natureza subjetiva ou pessoal. Ela toma como elemento essencial para produzir efeitos o aspecto pessoal do contribuinte, isto é, a sua natureza jurídica, sem qualquer vinculação, portanto, com o regime tributário a que se encontra subordinado. No mesmo sentido, por mais recente, transcrevo ementa de acórdão da relatoria do Min. Gomes de Barros, no REsp n. 260.960-RS, (DJ de 13.02.2001), in verbis: Tributário. Cofins. Sociedades civis. LC n. 70/1991. DL n. 2.397/1987. A circunstância de as sociedades a que se refere o caput do art. 1º do DL n. 2.397/1987, haverem optado pelo regime instituído pela Lei n. 8.541/1992 é irrelevante para que se lhe reconheça a isenção relativa à contribuição “Cofins”. Tal isenção nada tem a ver com o modo pelo qual as empresas recolhem o Imposto de Renda. Desta eg. 2ª Turma, destaco o REsp n. 226.062-SC (DJ de 04.04.2000, Relatado pela Min. Eliana Calmon, assim ementado: Tributário. Cofins. Isenção. Sociedade livre: LC n. 70/1991. Revogação da isenção pela Lei n. 9.430, de 27.12.1998. 1. Estabelecida isenção da Cofins em lei complementar, não é lícita a supressão do favor fiscal por lei ordinária. 2. Recurso especial provido. Do exposto, não conheço do recurso. RECURSO ESPECIAL N. 227.939-SC (99.0076239-8) Relator: Ministro Milton Luiz Pereira Recorrente: Fazenda Nacional 114 SÚMULAS - PRECEDENTES Procurador: Dolizete Fatima Michelin e outros Recorrido: Centro de Diagnósticos Radimagem S/C Ltda. e outros Advogado: Armeu Bergmann e outro EMENTA Tributário. Cofins. Sociedades civis. Isenção (art. 6º, Lei Complementar n. 70/1991. Decreto-Lei n. 2.397/1987 (art. 1º). 1. As sociedades civis de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, registradas no registro civil das pessoas jurídicas e constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no país, gozam de isenção da Cofins. 2. Precedentes jurisprudenciais. 3. Recurso não provido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas: Decide a egrégia Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Senhor Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Votaram de acordo com Relator os Senhores Ministros José Delgado, Francisco Falcão, Garcia Vieira e Humberto Gomes de Barros. Presidiu o julgamento o Senhor Ministro José Delgado. Custas, como de lei. Brasília (DF), 19 de outubro de 2000 (data do julgamento). Ministro José Delgado, Presidente Ministro Milton Luiz Pereira, Relator DJ 12.03.2001 RELATÓRIO O Sr. Ministro Milton Luiz Pereira: Cuida-se de Recurso Especial com fundamento na alínea a, do inciso III, do artigo 105, da Constituição Federal, RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 115 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA interposto em face de v. acórdão do egrégio Tribunal Regional Federal da 4a Região que, reformando r. sentença, concedeu a segurança impetrada contra ato do Delegado da Receita Federal em Joaçaba (SC). Eis a ementa do julgado: Tributário. Cofins. Sociedades civis de profissão regulamentada. Isenção. Renovação. Revogação. Inoperância. Instituída da contribuição pela LC n. 70/1991, impõe-se sua modificação ou revogação também por lei complementar. (fl. 80). Os Embargos de Declaração interpostos foram julgados nos termos da ementa, a saber: Embargos declaratórios. Cabimento. Omissão. Os embargos declaratórios só têm cabimento em caso de obscuridade, contradição ou omissão do julgado, não se prestando para reavivar a discussão de questões decididas ou para alterar as conclusões do acórdão recorrido. (fl. 93). A recorrente sustenta contrariedade ao artigo 56 da Lei n. 9.430/1996. Alega que, a partir da edição da Lei n. 9.430/1996, as sociedades civis, de que tratava o Decreto-Lei n. 2.397/1987, passaram a ser tributadas integralmente como pessoas jurídicas, perdendo a isenção da Cofins. Transcorreu o prazo sem que a Recorrida apresentasse suas contra-razões. O eminente Vice-Presidente do Tribunal a quo admitiu o processamento do recurso, porque a matéria foi devidamente prequestionada e porque foram preenchidos os requisitos de admissibilidade. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Milton Luiz Pereira (Relator): O recurso especial, como venho de aludir no relatório, traz à lume quaestio juris versante sobre a exigibilidade da Cofins, porquanto sustenta a recorrente que estaria ao abrigo da Lei n. 9.430/1996, que suspendeu a isenção antes concedida às sociedades profissionais. No Tribunal a quo a pretensão foi recusada, tendo o v. acórdão gerado a seguinte ementa: 116 SÚMULAS - PRECEDENTES Tributário. Cofins. Sociedades civis de profissão regulamentada. Isenção. Renovação. Revogação. Inoperância. Instituída da contribuição pela LC n. 70/1991, impõe-se sua modificação ou revogação também por lei complementar. (fl. 80). Impende, desde logo, reconhecer que o Recurso Especial merece conhecimento pela alínea a do permissivo constitucional. Deveras, refiro-me ao maltrato à Lei Federal (art. 6o, LC n. 70/1991) e, bem assim, a demonstrada divergência com aresto promanado desta Turma, por ocasião do julgamento do REsp n. 156.839-SP, publicado no DJU de 27.04.1998, de que foi Relator o eminente Ministro José Delgado, assim resumido: Tributário. Cofins. Isenção. Sociedades civis prestadoras de serviços médicos. 1. A Lei Complementar n. 70/1991, de 30.12.1991, em seu art. 6o, II, isentou, expressamente, da contribuição do Cofins, as sociedades civis de que trata o artigo 1o do Decreto-Lei n. 2.397, de 22.12.1987, sem exigir qualquer outra condição senão as decorrentes da natureza jurídica das mencionadas entidades. 2. Em conseqüência da mensagem concessiva de isenção contida no art. 6o, II, da LC n. 70/1991, fixa-se o entendimento de que a interpretação do referido comando posto em Lei Complementar, consequentemente, com potencialidade hierárquica em patamar superior à legislação ordinária, revela que será abrangida pela isenção do Cofins as sociedades civis que, cumulativamente, apresentem os seguintes requisitos: - seja sociedade constituída exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no Brasil; - tenha por objetivo a prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada; e - esteja registrada no registro civil das pessoas jurídicas. 3. Outra condição não foi considerada pela Lei Complementar, no seu art. 6o, II, para o gozo da isenção, especialmente, o tipo de regime tributário adotado para fins de incidência ou não de Imposto de Renda. 4. Posto tal panorama, não há suporte jurídico para se acolher a tese da Fazenda Nacional de que há, também, ao lado dos requisitos acima elencados, um último, o do tipo de regime tributário adotado pela sociedade. A Lei Complementar não faz tal exigência, pelo que não cabe ao intérprete criá-la. 5. É irrelevante o fato das recorridas terem optado pela tributação dos seus resultados com base no lucro presumido, conforme lhe permite o artigo 71 da Lei n. 8.383/1991 e os artigos 1º e 2º da Lei n. 8.541/1992. Essa opção terá reflexos RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 117 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA para fins de pagamento do Imposto de Renda. Não afeta, porém, a isenção concedida pelo artigo 6º, II, da Lei Complementar n. 70/1991, haja vista que esta, repita-se, não colocou como pressuposto para o gozo da isenção o tipo de regime tributário seguido pela sociedade civil. 6. Recurso especial improvido. (fl. 83). Aberto o pórtico para exame, colho do erudito voto-condutor do acima citado precedente, de cuja assentada de julgamento não participei, o tópico que hei por bem em transcrever: De início, registre-se que a Lei Complementar n. 70/1991, em seu artigo 6o, dispõe expressamente: São isentas da contribuição: I. (...) II. As sociedades civis de que trata o artigo 1º do Decreto-Lei n. 2.397, de 22.12.1987. O artigo 1º, do Decreto-Lei n. 2.397, de 22.12.1987, acima referido, tem a seguinte redação: A partir do exercício financeiro de 1989, não incidirá o Imposto de Renda das pessoas jurídicas sobre o lucro apurado, no encerramento de cada período-base, pelas sociedades civis de prestações de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, registradas no registro civil das pessoas jurídicas e constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no país. A recorrida, por ser uma sociedade civil de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada (médicos), registrada no registro civil de pessoas jurídicas e constituída exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no país, entende que, independentemente, do seu regime tributário, goza do direito à referida isenção. O contrário entende a recorrente. Para esta, além dos requisitos acima anunciados, necessita, também, que a sociedade civil utilize o regime tributário previsto pelo próprio art. 1o, do Decreto-Lei n. 2.397/1987 e, consequentemente, a extensão dos seus efeitos. Afirma o referido dispositivo legal que, a partir do exercício financeiro de 1989, não incidirá o imposto de renda das pessoas jurídicas sobre o lucro apurado, no encerramento de cada período base, em se tratando de sociedades civis de prestações de serviços profissionais (...). 118 SÚMULAS - PRECEDENTES O entendimento expelido pela mensagem contida no texto da lei é o de que não haverá incidência do imposto de renda sobre lucro apurado, isto é, mesmo que a sociedade civil apure, em sua escrita fiscal, lucro decorrente das suas atividades de prestação de serviço, não incide imposto de renda, isto é, está isenta do pagamento do referido tributo. Não tem, assim, qualquer relacionamento com o Cofins. Volto-me, agora, para o conteúdo do art. 6o, II, da Lei Complementar n. 70, de 30.12.1991, com a dicção seguinte: São isentas da contribuição: I. (...) II. As sociedades civis de que trata o artigo 1º do Decreto-Lei n. 2.397, de 22.12.1987. A proposição da lei é isentar, conforme está expressamente consignado em seus termos, as sociedades civis de que trata o dispositivo legal mencionado, ou seja, as sociedades civis que prestam atividades de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada. A Lei Complementar, em nenhum momento, condicionou a isenção ao regime de tributação adotado pela sociedade civil, para fins de Imposto de Renda. A interpretação do referido comando posto em Lei Complementar, consequentemente, com potencialidade hierárquica em patamar superior à legislação ordinária, revela que será abrangida pela isenção do Cofins as sociedades civis que, cumulativamente, apresentem os seguintes requisitos: - seja sociedade constituída exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no Brasil; - tenha por objetivo a prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada; e - esteja registrada no registro civil das pessoas jurídicas. Outra condição não foi considerada pela Lei Complementar, no seu art. 6o, II, para o gozo da isenção. Posto tal panorama, não há suporte jurídico para se acolher a tese da recorrente de que há, também, ao lado dos requisitos acima elencados, um último, o do tipo de regime tributário adotado pela sociedade. A Lei Complementar não faz exigência, pelo que não cabe ao intérprete criá-la. É irrelevante o fato das recorridas terem optado pela tributação dos seus resultados com base no lucro presumido, conforme lhes permite o artigo 71 da Lei n. 8.383/1991 e os artigos 1º e 2º da Lei n. 8.541/1992. Essa opção terá reflexos para fins de pagamento do Imposto de Renda. Não afeta, porém, a isenção concedida pelo artigo 6º, II, da Lei Complementar n. 70/1991, haja vista que esta, RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 119 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA repita-se, não colocou como pressuposto para o gozo da isenção o tipo de regime tributário seguido pela sociedade civil. Há, também, de se considerar que a isenção aqui tratada é a de natureza subjetiva ou pessoal. Ela toma como elemento essencial para produzir efeitos o aspecto pessoal do contribuinte, isto é, a sua natureza jurídica, sem qualquer vinculação, portanto, com o regime tributário a que se encontra subordinado. Neste diapasão o entendimento abroquelado pelo não menos eminente Ministro Garcia Vieira, como Relator do REsp n. 192.156-PE, publicado no DJU de 28.06.1999, deste teor: A Lei Complementar n. 70, de 30 de dezembro de 1991, artigo 6º, item II, isentou das Contribuições para Financiamento da Seguridade Social - Cofins as sociedades civis de que trata o artigo 1o do Decreto-Lei n. 2.397, de 21 de dezembro de 1987. Por sua vez, o artigo 1o do Decreto-Lei n. 2.397, de 21 de dezembro de 1987, esclarece que as sociedades civis são as de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, registradas no Registro Civil das Pessoas Jurídicas e constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no país. O fato de ter referido dispositivo legal concedido isenção do imposto de renda, a partir do exercício financeiro de 1989, não tem qualquer influência ou pertinência no deslinde da controvérsia, porque, com isso, nenhuma alteração ocorreu no disposto no artigo 6o, inciso II da Lei Complementar n. 70/1991. Continuam referidas sociedades civis isentas do Cofins e para beneficiarem-se deste favor não têm de provar serem também isentas do imposto de renda. Se estas sociedades perdem a isenção do imposto de renda ao optarem pela tributação real, mesmo assim continuam a usufruir da isenção do Cofins. Com razão, a meu ver, o Egrégio Tribunal Regional Federal da 1ª Região (fls. 27-28) ao ter sustentado que: Ressalte-se, finalmente, que a razão de ser da isenção das sociedades de profissionais é o caráter eminentemente pessoal dos rendimentos por elas auferidos, como explicado na exposição de motivos que ensejou a edição do Decreto-Lei n. 2.397/1987 e tal razão não desaparece pelo fato de, em face de permissão legal, optarem por outra forma de tributação. Ocorre que, em determinadas situações, o regime tributário instituído pelo Decreto n. 2.397/1987 terminava sendo mais oneroso e o que seria um benefício, em virtude daquela natureza pessoal dos rendimentos das sociedades de profissionais, terminava sendo um castigo. Daí a possibilidade, introduzida na legislação do imposto de renda, da opção pelo regime de tributação com base no lucro real, ou presumido. Tal opção foi instituída exatamente para que as sociedades de profissionais e seus integrantes, não sejam obrigados a se submeter a um tratamento 120 SÚMULAS - PRECEDENTES tributário mais oneroso do que o dispensado às pessoas jurídicas em geral e a seus integrantes. É evidente que o exercício do direito de optar por uma outra forma de tributação de seus rendimentos, não retira das sociedades de profissionais o direito à isenção da Cofins, nos termos do art. 6º, II da Lei Complementar n. 70/1991, combinado com o art. 1º do Dec. n. 2.397/1987, devendo ser emitida a conseqüente Certidão Negativa de Débito. Emprestei minha adesão a percuciente fundamentação que, com a habitual excelência, ficou estratificada em esclarecedora ementa, verbis: Direito Tributário. Isenção. Cofins. Sociedades civis. Artigo 1º do Decreto-Lei n. 2.397/1987. Imposto de Renda. Isenção. Prova. Desnecessidade. A isenção relativamente ao imposto de renda não influencia na isenção relativa à Cofins conferida pelo artigo 6o da Lei Complementar n. 70/1991. As sociedades civis, beneficiadas com o favor isencional previsto no citado dispositivo, não têm que fazer prova da isenção do imposto de renda. Recurso improvido. Por essa viseira, reanimando a fundamentação comemorada, incorporando-a como motivação, voto pelo não provimento do recurso. É o voto. RECURSO ESPECIAL N. 260.960-RS (2000.0052961-3) Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros Recorrente: Fazenda Nacional Procuradores: Dolizete Fátima Michelin e outros Recorrido: BS Consultoria Fiscal Ltda. Advogados: Maurivan Botta e outros EMENTA Tributário. Cofins. Sociedades civis. LC n. 70/1991. DL n. 2.397/1987. RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 121 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - A circunstância de as sociedades a que se refere o caput do art. do DL n. 2.397/1987, haverem optado pelo regime instituído pela Lei n. 8.541/1992 é irrelevante para que se lhe reconheça a isenção relativa à contribuição “Cofins”. Tal isenção nada tem a ver com o modo pelo qual as empresas recolhem o Imposto de Renda. 1o ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Votaram de acordo com o Sr. Ministro Relator os Srs. Ministros Milton Luiz Pereira, José Delgado e Francisco Falcão. Licenciado o Sr. Ministro Garcia Vieira. Brasília (DF), 13 de fevereiro de 2001 (data do julgamento). Ministro José Delgado, Presidente Ministro Humberto Gomes de Barros, Relator DJ 26.03.2001 RELATÓRIO O Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros: A União maneja recurso especial (alínea a) desafiando acórdão resumido nesta ementa: 1. A interpretação adequada é considerar como “empregadores” as empresas que potencialmente empreguem. Tese contrária implica em situação antiisonômica e admitir que as empresas automatizadas que, via de regra são mais lucrativas, sejam agraciadas com o não-pagamento de contribuições previdenciárias, em detrimento das empresas que se baseiam na mão-de-obra humana e que, por isso mesmo, cumprem com mais efetividade sua função social. 2. É legítima a revogação da isenção prevista no artigo 6º, II, da LC n. 70/1991, pelo artigo 56 da Lei n. 9.430/1991. 3. Ilegítima a cobrança da Cofins, no caso, porque fundada em parecer normativo, que não pode, em face do disposto nos artigos 97, VI e 111, II, ambos do CTN, revogar isenção legalmente instituída, fl. 84. A recorrente reclama negativa de vigência aos artigos 1º e 6º, II, da LC n. 70/1991; art. 1º do DL n. 2.397/1987; e, art. 111, I do CTN. Este o relatório. 122 SÚMULAS - PRECEDENTES VOTO O Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros (Relator): Discute-se, mais uma vez, a cobrança da Cofins de sociedade civil de prestação de serviços profissionais, sem empregados. A Autora, ora recorrida, afirma a ilegalidade da cobrança porque imposta pelo Parecer Normativo Cosit n. 34/1994, norma hierarquicamente inferior à LC n. 70/1991, que isentou as sociedades civis de que trata o art. 1º do DL n. 2.397/1987. Aduz, ainda, que não tendo empregados, não pode ser compelida a recolher contribuição que é dirigida apenas aos empregadores, conforme previsto no art. 195, I da CF/1988. O acórdão recorrido proveu em parte o pedido da Autora, por entender que a revogação de isenção legalmente instituída não poderia ter sido feita com base em parecer normativo, tendo em conta o que preceitua o CTN em seus artigos 97, VI e 111, II. Em recurso especial, a União Federal reclama de ofensa aos arts. 6º da Lei Complementar n. 70/1991 e 1º do DL n. 2.397/1987. Finca-se no argumento de que: 1. a Lei Complementar n. 70/1991 delimitou claramente o âmbito de isenção das sociedades civis à Cofins; 2. nestes limites cabem somente as sociedades civis que optem pela forma de tributação estabelecida pelo DL n. 2.397/1987; 3. adotada como diferencial, para efeito de isenção da Cofins, a forma de tributação disciplinada pelo DL, não é permitido alargar o alcance do benefício. Esta Turma, quando do julgamento do REsp n. 251.922-Garcia, examinou matéria semelhante. Naquela oportunidade, proferi voto-vista cujo teor reportome: (...) O eminente Relator deste recurso especial nega provimento ao recurso. Pedi vista, para refletir sobre o tema, que me parece novo, nesta Turma. Para melhor expor meu pensamento, repito os textos legais supostamente ofendidos. Ei-los: Lei Complementar n. 70 de 30.12.1991. DOU 31.12.1991. Texto: Art. 6o - São isentas da contribuição: I - as sociedades cooperativas que observarem ao disposto na legislação específica, quanto aos atos cooperativos próprios de suas finalidades; RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 123 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA II - as sociedades civis de que trata o art. 1º, do Decreto-Lei número 2.397, de 21 de dezembro de 1987; III - as entidades beneficentes de assistência social que atendam às exigências estabelecidas em lei. Decreto-Lei n. 2.397 de 21.12.1987. DOU 22.12.1987. Art. 1 - A partir do exercício financeiro de 1989, não incidirá o Imposto sobre a Renda das pessoas jurídicas sobre o lucro apurado, no encerramento de cada período-base, pelas sociedades civis de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, registradas no Registro Civil das Pessoas Jurídicas e constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no país. § 1º - A apuração do lucro de cada período-base será feita com observância das leis comerciais e fiscais, inclusive correção monetária das demonstrações financeiras, computando-se: I - as receitas e rendimentos pelos valores efetivamente recebidos no período-base; II - os custos e despesas operacionais pelos valores efetivamente pagos no período-base; III - as receitas recebidas ou não, decorrentes da venda de bens do ativo permanente; IV - o valor contábil dos bens do ativo permanente baixados no curso do período-base; V - os encargos de depreciação e amortização correspondentes ao período-base; VI - as variações monetárias ativas e passivas correspondentes ao período-base; VII - o saldo da conta transitória de correção monetária, de que trata o art. 3, II, do Decreto-Lei número 2.341, de 29 de junho de 1987. § 2º - Às sociedades de que trata este artigo não se aplica o disposto no art. 6 do Decreto-Lei número 2.341, de 29 de junho de 1987. Como se percebe, a Lei Complementar declara a isenção das “sociedades civis de que trata o art. 1º do Decreto-Lei”. Este, de sua vez, refere-se às “sociedades civis de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, registradas no Registro Civil das Pessoas Jurídicas e constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no País.” O § 1º do DL cuida tão somente do modo de apurar a base de cálculo do tributo (Imposto de Renda), em cada período base. Igual ao Ministro Garcia Vieira, tomo emprestada a expressão do Juiz Geraldo Apoliano, em seu voto condutor: 124 SÚMULAS - PRECEDENTES O que ocorre é que a Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), nada tem a ver com o imposto sobre a renda. É contribuição sobre o faturamento, e não sobre o lucro. É devida por qualquer pessoa jurídica que não tenha faturamento, ainda que tenha lucro. (fl. 90). Valho-me, também, das palavras que expressaram a conclusão a que chegou Sua Excelência: Teria fundamento o argumento da Impetrada se a norma isentiva da Cofins tivesse dito que estão isentas da contribuição as pessoas jurídicas que adotaram o regime tributário instituído pelo DL n. 2.397/1987, o que efetivamente não ocorreu. (fl. 91). Nego provimento ao recurso. No mesmo sentido, destaco também, os acórdãos: Tributário. Cofins. Sociedades civis. Isenção (art. 6º, Lei Complementar n. 70/1991. Decreto-Lei n. 2.397/1987 (art. 1º). 1. As sociedades civis de prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada, registradas no Registro Civil das Pessoas Jurídicas e constituídas exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no país, gozam de isenção da Cofins. 2. Desinfluente para solução da querela o direito de opção pelo regime de tributação de rendimentos com base no lucro real ou presumido. 3. Precedentes jurisprudenciais. 4. Recurso provido. (REsp n. 209.629-Milton). Direito Tributário. Isenção. Cofins. Sociedades civis. Artigo 1º do Decreto-Lei n. 2.397/1987. Imposto de Renda. Isenção. Prova. Desnecessidade. A isenção relativamente ao imposto de renda não influencia na isenção relativa à Cofins conferida pelo artigo 6º da Lei Complementar n. 70/1991. As sociedades civis, beneficiadas com o favor isencional previsto no citado dispositivo, não têm que fazer prova da isenção do imposto de renda. Recurso improvido. (REsp n. 192.156-Garcia); e Processual Civil e Tributário. Agravo regimental contra decisão que deu provimento a recurso especial. Cofins. Isenção. Sociedades civis prestadoras de serviços. Precedentes. 1. Agravo Regimental interposto contra decisão que, com base no art. 557, § 1º, do CPC, deu provimento ao recurso especial ofertado pelo recorrido. RSSTJ, a. 5, (21): 65-126, agosto 2011 125 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2. A Lei Complementar n. 70/1991, de 30.12.1991, em seu art. 6º, II, isentou, expressamente, da contribuição da Cofins, as sociedades civis de que trata o art. 1º, do Decreto-Lei n. 2.397, de 22.12.1987, sem exigir qualquer outra condição senão as decorrentes da natureza jurídica das mencionadas entidades. 3. Em conseqüência da mensagem concessiva de isenção contida no art. 6º, II, da LC n. 70/1991, fixa-se o entendimento de que a interpretação do referido comando posto em Lei Complementar, conseqüentemente, com potencialidade hierárquica em patamar superior à legislação ordinária, revela que será abrangida pela isenção da Cofins as sociedades civis que, cumulativamente, apresentem os seguintes requisitos: - seja sociedade constituída exclusivamente por pessoas físicas domiciliadas no Brasil; - tenha por objetivo a prestação de serviços profissionais relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada; e - esteja registrada no registro civil das pessoas jurídicas. 4. Outra condição não foi considerada pela Lei Complementar, no seu art. 6º, II, para o gozo da isenção, especialmente, o tipo de regime tributário adotado para fins de incidência ou não de Imposto de Renda. 5. Posto tal panorama, não há suporte jurídico para se acolher a tese da Fazenda Nacional de que há, também, ao lado dos requisitos acima elencados, um último, o do tipo de regime tributário adotado pela sociedade. A Lei Complementar não faz tal exigência, pelo que não cabe ao intérprete criá-la. 6. E irrelevante o fato de a recorrente ter optado pela tributação dos seus resultados com base no lucro presumido, conforme lhe permite o art. 71, da Lei n. 8.383/1991 e os arts. 1º e 2º, da Lei n. 8.541/1992. Essa opção terá reflexos para fins de pagamento do Imposto de Renda. Não afeta, porém, a isenção concedida pelo art. 6º, II, da Lei Complementar n. 70/1991, haja vista que esta, repita-se, não colocou como pressuposto para o gozo da isenção o tipo de regime tributário seguido pela sociedade civil. 7. A revogação da isenção pela Lei n. 9.430/1996 fere, frontalmente, o princípio da hierarquia das leis, visto que tal revogação só poderia ter sido veiculada por outra lei complementar. 8. Inexistência no acórdão recorrido de fundamentação unicamente na esfera constitucional. O ilustre Relator a quo apreciou, também, no âmbito legal (LC n. 70/1991, arts. 1º e 6º, II), sendo, portanto, suficiente à apreciação do recurso especial. 9. Agravo regimental improvido. (AgREsp n. 192.156-Delgado). Esta, as razões que me levam a negar provimento também a este recurso. 126 Súmula n. 277 SÚMULA N. 277 Julgada procedente a investigação de paternidade, os alimentos são devidos a partir da citação. Referência: Lei n. 5.478/1968, art. 13, § 2º. Precedentes: EREsp 85.685-SP (2ª S, 18.02.2002 – DJ 24.06.2002) EREsp 152.895-PR (2ª S, 13.12.1999 – DJ 22.05.2000) REsp 78.563-GO (3ª T, 05.11.1996 – DJ 16.12.1996) REsp 174.732-RO (4ª T, 08.02.2000 – DJ 04.09.2000) REsp 211.902-MG (3ª T, 14.12.1999 – DJ 14.02.2000) REsp 218.119-MG (3ª T, 14.12.1999 – DJ 24.04.2000) REsp 224.783-DF (4ª T, 16.12.1999 – DJ 02.05.2000) REsp 226.686-DF (4ª T, 16.12.1999 – DJ 10.04.2000) REsp 240.954-MG (4ª T, 14.03.2000 – DJ 15.05.2000) REsp 275.661-DF (4ª T, 06.02.2001 – DJ 02.04.2001) Segunda Seção, em 14.05.2003 DJ 16.06.2003, p. 416 EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL N. 85.685-SP (97.0066072-9) Relatora: Ministra Nancy Andrighi Embargante: Alair Pulhes - menor impúbere Representado por: Naide Conceição Pulhes Advogado: Liamara Soliani Lemos de Castro e outro Embargado: Alair Cândido de Oliveira Advogado: Célio Ernani Macedo de Freitas EMENTA Ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos. Termo inicial da pensão alimentícia. Entendimento uniforme da egrégia Segunda Seção do STJ. Dissídio notório. Incidência a partir da citação. - Os alimentos devidos em ação de investigação de paternidade, decorrentes de sentença declaratória de paternidade e condenatória de alimentos, são os definitivos, e, portanto, vige a disciplina do art. 13, § 2º, da Lei n. 5.478/1968, com retroação dos efeitos à data da citação. - O art. 5º da Lei n. 883, de 21.10.1949, e o art. 7º da Lei n. 8.560, de 29.12.1992, discorrem também sobre a fixação de alimentos provisionais, e não impedem o arbitramento de verba alimentar de natureza definitiva, na forma apregoada pela Lei de Alimentos, ainda que não baseada em prova preconstituída da filiação. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer dos embargos e os acolher nos termos do voto da Sra. Ministra-Relatora. Os Srs. Ministros Castro Filho, Antônio de Pádua Ribeiro, Sálvio de Figueiredo Teixeira, Cesar Asfor Rocha, Ruy Rosado de Aguiar, Carlos Alberto Menezes Direito e Aldir Passarinho Junior votaram com a Sra. Ministra Relatora. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Ari Pargendler. Sustentou oralmente, pelo embargado, o Dr. Donizetti Pereira. Brasília (DF), 18 de fevereiro de 2002 (data do julgamento). Ministro Barros Monteiro, Presidente Ministra Nancy Andrighi, Relatora DJ 24.06.2002 RELATÓRIO A Sra. Ministra Nancy Andrighi: Cuida-se de ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos, julgada procedente pelo e. TJSP, que determinou como termo inicial dos alimentos a citação. Interposto o recurso especial, este foi provido, parcialmente, por maioria de votos, pela e. 4ª Turma, vencido o e. Min. Relator, para que os alimentos incidissem a partir da sentença, cuja ementa foi lavrada nos seguintes termos: Ação de investigação de paternidade cumulada com pedido de alimentos. Assertiva de julgamento extra petita. Fixação do montante da prestação alimentícia. Vinculação ao salário-mínimo. Termo inicial. - Não prequestionamento do tema relativo ao julgamento extra petita. - Inocorrência, de qualquer forma, do vício alegado. - Inexistência de contrariedade ao art. 400 do CC, uma vez determinado o quantum da prestação alimentícia em face dos fatos e circunstâncias da causa (Súmula n. 7-STJ). - Segundo a jurisprudência dominante no c. Supremo Tribunal Federal e nesta corte, admissível é fixar-se a prestação alimentícia com base no salário-mínimo. - Os alimentos na ação de investigação de paternidade julgada procedente são devidos desde a sentença. Posição vencido do relator. Recurso especial conhecido, em parte, e provido parcialmente, a fim de estabelecer como termo inicial dos alimentos a data da sentença. A autora opôs embargos de divergência no recurso especial, trazendo à colação o REsp n. 34.425 da e. 3ª Turma. Recebidos os embargos de divergência, pelo e. Min. Eduardo Ribeiro, meu antecessor, o Réu embargado apresentou impugnação, afirmando que o 132 SÚMULAS - PRECEDENTES dissídio não foi comprovado e que não se aplica a Lei n. 5.478/1968 que trata, especificamente, de ação de alimentos. Remetidos os autos à douta Subprocuradoria-Geral da República, em 11.11.1997, e devolvidos em 05.04.2001, opinou o ilustre representante do Parquet, pelo acolhimento dos embargos de divergência. Em 09.05.2001 o processo foi julgado, mas por não ter constado o nome do atual patrono do recorrido, decidiu-se pela anulação do julgamento e sua reinclusão em pauta com as necessárias alterações na capa dos autos. As fls. 684-693, o recorrido suscitou a ocorrência de perempção porque o Ministério Público permaneceu com o processo por três anos e meio, para ofertar parecer, sendo que aquele tem os mesmos deveres das partes. Em 04.06.2001, o embargado pleiteou a nulidade do julgamento porque não havia sido dele intimado pessoalmente. Obtida a declaração de nulidade pleiteada, em 12.12.2001, embora não tenha requerido posterior intimação pessoal naquela oportunidade, vem suscitar, em 16.01.2002, a superveniente perda do interesse de agir do embargante porque a Jurisprudência da 2a Seção já está pacificada. É o relatório. VOTO A Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relatora): Inicialmente, afasto a preliminar de “perempção”, que em nada se aproxima da escorreita técnica processual do art. 267, V do CPC. Na verdade, o recorrido pretende suscitar que o excessivo decurso do prazo implicaria na perda do direito recursal, porque a douta Subprocuradoria-Geral da República reteve os autos por três anos e meio. De qualquer sorte, o Ministério Público Federal atuou como custus legis, e não como substituto processual, além do que o prazo excessivo de permanência do processo, na instituição, deve ser questionada na via administrativa adequada, perante os órgãos superiores de atividade correicional, não prejudicando o interesse da parte, em benefício daquele que se valeu da própria torpeza, ao não comunicar o fato da demora ao Relator do processo. Os embargos de divergência merecem conhecimento, porque cuida-se de dissídio notório entre as Turmas integrantes da 2ª Seção, e que está pacificado pelo julgamento do EREsp n. 152.895, da lavra do e. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, julgado em 13.12.1999, em cuja ementa consta: RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 133 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Investigação de paternidade cumulada com alimentos. Termo inicial dos alimentos. 1. Na forma do paradigma da Terceira Turma, “em ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos o termo inicial destes é a data da citação, com apoio no artigo 13, § 2º, da Lei n. 5.478/1968, que comanda tal orientação em qualquer caso”. 2. Embargos de divergência conhecidos e providos. O embargante só alcançará a integral satisfação da sua pretensão com o julgamento do recurso, portanto assiste-lhe interesse recursal. No EREsp n. 64.465, a e. Corte Especial, em acórdão cujo Redator designado foi o e. Min. Barros Monteiro, DJ de 06.04.1998, consignou-se que, sendo notório o dissídio, mitiga-se a exigência de citação do repositório oficial de jurisprudência e de autenticação das cópias dos acórdãos paradigmas: Recurso especial. Divergência jurisprudencial. Caracterização. Autenticação das cópias dos arestos paradigmas ou indicação do repertório de jurisprudência em que se encontram publicados. Dispensa quando se tratar de dissídio notório. As exigências de natureza formal (cópia autenticada dos arestos paradigmas ou a menção do repositório em que estejam publicados) devem ser mitigadas quando se cuidar de dissonância interpretativa notória, manifestamente conhecida do Tribunal. Embargos conhecidos, mas rejeitados. A e. 4ª Turma, em observância ao entendimento pacificado no seio da e. 2ª Seção, modificou seu anterior entendimento, o qual havia motivado a interposição dos presentes embargos de divergência, para reconhecer a fixação de alimentos na sentença, mas com efeitos retroativos à citação, mesmo se tratando de ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos: Investigação de paternidade. Alimentos. Termo inicial. Data da citação. Orientação da Segunda Seção. Ressalva de ponto de vista. Recurso desacolhido. I - A Segunda Seção deste Tribunal firmou orientação no sentido de que, em ação de investigação de paternidade, cumulada com alimentos, o termo inicial destes é a data da citação. II - Não se mostra razoável, até porque esta Corte tem por missão uniformizar o entendimento jurisprudencial no País, que se mantenha posicionamento contrário ao do próprio Tribunal, criando insegurança jurídica para as partes. (REsp n. 242.099, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 25.09.2000). E, no REsp n. 257.885, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 06.11.2000, decidiu-se que “A sentença de procedência da ação de investigação 134 SÚMULAS - PRECEDENTES de paternidade pode condenar o réu em alimentos provisionais ou definitivos, independentemente de pedido expresso na inicial. Art. 7º da Lei n. 8.560, de 29.12.1992”. No EREsp n. 186.298, desta Relatoria, julgado em 28.03.2001, decidiu-se no mesmo sentido. Os alimentos devidos em ação de investigação de paternidade, decorrentes de sentença declaratória de paternidade e condenatória de alimentos, são os definitivos, e, portanto, vige a disciplina do art. 13, § 2º, da Lei n. 5.478/1968, com retroação dos efeitos à data da citação. O art. 5º da Lei n. 883, de 21.10.1949, e o art. 7º da Lei n. 8.560, de 29.12.1992, por seu turno, discorrem também sobre a fixação de alimentos provisionais, e não impedem o arbitramento de verba alimentar de natureza definitiva, na forma apregoada pela Lei de Alimentos, ainda que não baseada em prova preconstituída da filiação. Neste diapasão, o notável ensinamento deixado pelo e. Min. Waldemar Zveiter, no REsp n. 2.203, RSTJ 26/305: A ação de alimentos, embora cumulada com a investigatória, é de natureza condenatória e, consequentemente, em consonância com a regra geral, há de retrotrair à da propositura da demanda, melhor explicando, a contar da previsão legal, como afirmado, da data da citação. Há que se examinar, ainda, a possibilidade de se aplicar à espécie, a norma contida no § 2º do artigo 13, da Lei n. 5.478/1968, por se tratar de regra de natureza genérica, em contraste com a da antiga Lei n. 883/1949, art. 5º, a qual se restringe à verba alimentícia em apreço, resultante da investigatória da paternidade, que é de natureza específica. A última diz respeito aos alimentos provisionais, enquanto que a outra se refere tanto aos provisórios quanto aos definitivos. E isto porque, como asseverou o e. Min. Aldir Passarinho, no EREsp n. 152.895, “(...) o principal é que da ação de investigação, exatamente por revelar o vínculo de parentesco, exsurgem inúmeros reflexos civis. O filho que é reconhecido passa a ter, por exemplo, um pai, avós, eventualmente irmãos, etc. Altera-se a sucessão, talvez obrigações contraídas no período de ignorância dessa relação, v.g. doações feitas aos demais filhos. E, tudo isso fica alcançado pela retroação dos efeitos da paternidade ou da maternidade declarada a posteriori”. Forte nestas razões, acolho os embargos. É o voto. RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 135 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUESTÃO DE ORDEM A Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relatora): O presente embargos de divergência no recurso especial, originariamente da Relatoria do e. Min. Eduardo Ribeiro, foi-me atribuído, em 07.04.2001, quando retornou da douta Subprocuradoria-Geral da República com parecer. Foi incluído em pauta no dia 26.04.2001, e julgado em 09.05.2001, decidindo-se pelo seu acolhimento, à unanimidade da 2ª Seção. Quando foi impugnado o recurso, o embargado outorgou nova procuração, e não substabelecimento, e a Secretaria da Seção não atentou para alteração do nome do patrono na capa dos autos, o que levou a e. 2ª Seção ao julgamento do processo sem ciência do causídico, decorrendo nulidade por defeito de forma. Embora o novo patrono não tenha requerido a anotação do seu nome na capa dos autos, nem requerido que as publicações fossem feitas no seu nome, o que contribuiu para o equívoco da Secretaria, a nulidade é inafastável, porque violou o devido processo legal. Por estas razões, acolho a petição protocolada em 04.06.2001, para declarar a nulidade do julgamento e determinar a reinclusão dos embargos de divergência na pauta do dia 27.06.2001, independente de acórdão. QUESTÃO DE ORDEM - VOTO-VISTA O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha: 01. Exmo. Sr. Presidente, cuida-se de mera questão de ordem suscitada pela eminente Ministra Nancy Andrighi, a quem foi atribuída a relatoria dos presentes Embargos de Divergência. A ilustrada Relatora, com muita propriedade, como de hábito, assim expôs a questão: Quando foi impugnado o recurso, o embargado outorgou nova procuração, e não o substabelecimento. A Secretaria da Seção não atentou para a alteração do nome do patrono na capa nos autos, o que levou esta Seção ao julgamento do processo sem a ciência do causídico, decorrendo, então, a nulidade por defeito de forma. Embora o novo patrono não tenha requerido a anotação do seu nome na capa dos autos, nem requerido que as publicações fossem feitas em seu nome - o que contribuiu para o equívoco da Secretaria - a nulidade é inafastável, porque violou o devido processo legal. Por essas razões, acolho a petição protocolada no dia 04 de junho de 2001, para declarar a nulidade do julgamento e determinar a reinclusão dos embargos 136 SÚMULAS - PRECEDENTES de divergência na pauta do dia 27 de junho, e deixaria, então, de lavrar o acórdão do julgamento anterior. Destarte, a eminente Sra. Ministra declarou a nulidade do julgamento realizado no dia 09.05.2001, determinando a reinclusão do feito em pauta, no que foi acompanhada, sem explicitações, pelo ilustre Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. 02. Pedi vista dos autos para melhor exame da matéria, após o que de logo registro que ouso dissentir, data máxima venia, do entendimento da eminente Relatora. E o faço com fulcro nos fundamentos a seguir expostos. É certo que a jurisprudência desta Corte se consolidou no sentido de que, em caso de outorga de substabelecimento, mesmo que com reserva de iguais poderes, devem as intimações dos atos processuais se efetivar em nome do advogado substabelecido, desde que tenha este último requerido que as publicações se fizessem em seu nome. Veja-se, apenas para exemplificar, o REsp n. 57.934-RS, da relatoria do eminente Ministro Nilson Naves, publicado no DJ de 03.10.1995, onde citados diversos outros precedentes das Terceira e Quarta Turmas. Todavia, considero que a presente hipótese merece tratamento diferenciado. A uma, porque de substabelecimento não se trata, mas sim de juntada de novo instrumento de mandato outorgado a advogado diverso daqueles inúmeros outros constituídos durante todo o curso do processo, por sucessivos substabelecimentos, sendo certo que não houve qualquer revogação dos poderes anteriormente conferidos. E nem valeria o argumento, não invocado pela parte - diga-se de passagem - de que o mandato posterior revoga o anterior, o que somente se admitiria se houvesse comunicação expressa de eventual revogação ao primeiro mandatário, conforme exige o art. 1.319 do Código Civil. Tenho por certo, dessa forma, que o causídico que precedeu ao que agora suscita a nulidade, em cujo nome foi efetivada a publicação, mantém todos os poderes que lhe foram outorgados no processo. A duas, porque conforme esclarecido pela própria Ministra Relatora, não houve qualquer requerimento por parte do advogado ora peticionante no sentido de que fosse feita a anotação do seu nome na capa dos autos ou que as publicações fossem feitas na sua pessoa. RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 137 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Em verdade, verifico da peça de impugnação aos embargos que sequer houve o requerimento de juntada da novel procuração. A três, porque não procede o argumento de que o advogado requerente teria sido constituído para atuar com exclusividade nesta instância de superposição, pois verifico que tem registro na OAB do Estado de São Paulo (fl. 678), local onde reside, e que vem atuando regularmente no primeiro grau de jurisdição, naquele Estado, já que o processo se encontra em fase de execução (fls. 611-612), ao passo que o patrono anteriormente constituído tem domicílio e escritório nesta Capital Federal, com a respectiva OAB do Distrito Federal. 03. Diante de tais pressupostos, tenho por não caracterizada a alegada nulidade, estando perfeitamente válida a publicação anteriormente efetivada. É como voto. VOTO-VISTA O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: Em 30.10.1997, ao impugnar os Embargos de Divergência, o embargado juntou a procuração com poderes outorgados ao Dr. Célio Ernani Macedo de Freitas (fl. 678), especificamente para impugnar os embargos. Quando do julgamento do EREsp, a nota publicada inclui o nome do anterior procurador do embargado, Dr. João Leal Júnior (fl. 693). Penso que a outorga de amplos poderes ao novo advogado, com a finalidade específica de atuar nos embargos de divergência, fazia presumir que a intimação para a sessão de julgamento do recurso seria feita na pessoa do novo procurador. Não o fazendo, nulo o julgado naquela oportunidade proferido, que se há de renovar, com as cautelas da lei. Acolho o pedido de fl. 690. VOTO-VISTA O Sr. Ministro Ari Pargendler: O Dr. Célio Ernani Macedo de Freitas se habilitou para representar Alair Cândido de Oliveira por meio de procuração (fl. 678), e não mediante substabelecimento. O respectivo teor confere “amplos poderes para o foro em geral”, nada importando que se tivesse referido, especificamente, à impugnação dos embargos de divergência - que era o primeiro ato processual a ser praticado no processo. 138 SÚMULAS - PRECEDENTES Essa nova procuração, salvo melhor juízo, revogou a anterior, que havia sido outorgada ao Dr. João Leal Júnior, em nome de quem recaiu a intimação para o julgamento dos embargos de divergência (fl. 693). Voto, por isso, no sentido de que se renove o julgamento, após prévia e regular intimação das partes. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL N. 152.895-PR (98.171445-6) (6.858) Relator: Ministro Carlos Alberto Menezes Direito Embargante: Ministério Público Federal Embargado: Rossini José de Oliveira Advogados: José Ambrósio Dias Filho e outro Interessados: Lucas Ramon Dombrosky Vrech EMENTA Investigação de paternidade cumulada com alimentos. Termo inicial dos alimentos. 1. Na forma do paradigma da Terceira Turma, “em ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos o termo inicial destes é a data da citação, com apoio no artigo 13, § 2º, da Lei n. 5.478/1968, que comanda tal orientação em qualquer caso”. 2. Embargos de divergência conhecidos e providos. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Senhores Ministros da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, após o voto vista do Senhor Ministro Aldir Passarinho Junior, por maioria, conhecer dos embargos e lhes dar provimento. Votaram com o Relator os Senhores Ministros Aldir Passarinho Junior, Nilson RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 139 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Naves, Eduardo Ribeiro, Barros Monteiro e Ari Pargendler. Votaram em divergência, os Senhores Ministros Cesar Asfor Rocha e Ruy Rosado de Aguiar. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Waldemar Zveiter. Brasília (DF), 13 de dezembro de 1999 (data do julgamento). Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Presidente Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Relator DJ 22.05.2000 RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito: Admiti os presentes embargos de divergência, opostos pelo Ministério Público Federal, em despacho assim motivado: Vistos. O Ministério Público Federal opõe embargos de divergência ao acórdão de fls. 213 a 225, da 4ª Turma desta Corte, Relator o Senhor Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ de 08.09.1998, com a seguinte ementa: Alimentos. Pretensão não fundada na Lei n. 5.478/1968. Ausência de prova preconstituída da paternidade. Sentença como termo inicial de incidência. Evolução do posicionamento da Turma. Distinção em relação às ações de revisão de alimentos. Posicionamento da Turma. Recurso desprovido. I - A Lei n. 5.478/1968 (art. 13), pela sua própria teleologia, não incide nas ações em que se postula alimentos inexistindo prova preconstituída da paternidade. II - Destarte, em não se aplicando a referida lei, o dies a quo da incidência dos pretendidos alimentos não pode ser a data da citação, mas sim a da sentença, mesmo que sujeita à apelação (CPC, art. 520, II). (fls. 225). O embargante, para comprovar a divergência, indica o REsp n. 98.654, de minha relatoria, DJ de 30.06.1997, assim ementado: Recurso especial. Ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos. Termo inicial. Precedentes da Corte. 1. Como assentado em precedentes da Corte, em ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos o termo inicial destes é a data da 140 SÚMULAS - PRECEDENTES citação, com apoio no artigo 13, § 2º da Lei n. 5.478/1968, que comanda tal orientação em qualquer caso. 2. Recurso especial conhecido pela alínea c, mas improvido. (fls. 230). Decido. A divergência está comprovada, razão porque admito os embargos. Intime-se o embargado para apresentar impugnação. (fls. 236). O embargado não apresentou impugnação (fls. 237v). Opina o ilustre Subprocurador-Geral da República, Dr. Roberto Casali, pelo recebimento dos embargos, para reformar a decisão recorrida e acolher a tese jurídica adotada pelo acórdão paradigma. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito (Relator): Embargos de divergência admitidos para consolidar interpretação sobre o termo inicial dos alimentos, sendo a ação não fundada na Lei n. 5.478/1968. A Quarta Turma, com o voto condutor do Senhor Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira entende que “não se aplicando a referida lei, o dies a quo da incidência dos pretendidos alimentos não pode ser a data da citação, mas sim a da sentença, mesmo que sujeita à apelação (CPC, art. 520 - II)”; A Terceira Turma no paradigma apresentado, de que fui Relator, entende que “em ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos o termo inicial destes é a data da citação, com apoio no artigo 13, § 2º, da Lei n. 5.478/1968, que comanda tal orientação em qualquer caso”. Neste feito, o recorrido é réu em ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos, julgada procedente. O Tribunal de Justiça do Paraná acolheu o entendimento esposado no acórdão embargado. O Ministério Público Federal opina pelo acolhimento dos embargos de divergência. Não encontro razão para modificar o meu entendimento. No paradigma mostrei as raízes da divergência, destacando os diversos precedentes, merecendo destacado o trecho que se segue de voto vista do Senhor Ministro Eduardo Ribeiro, quando do julgamento do REsp n. 78.563-GO, de que foi Relator o Senhor Ministro Waldemar Zveiter: RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 141 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Tornando a meditar sobre a matéria, não modifiquei minha opinião, malgrado reconhecendo que ponderáveis os argumentos em contrário. Alega-se que, nas ações de alimentos, cabível a retroação porque desde logo comprovada a paternidade, questionando-se apenas em relação ao quantum da pensão. Diversa a situação quando aquela só é reconhecida mediante o processo. Antes disso não haveria falar em obrigação de pagar alimentos. Permito-me observar, com a devida vênia, que o processo em que se pleiteiam alimentos não visa apenas a fixar o respectivo montante, mas a decidir sobre a própria existência da obrigação. Essa exige, além do vínculo de parentesco, que concorram a necessidade do alimentando e a possibilidade do alimentante, podendo sustentar o réu que nenhuma pensão é devida, por faltarem esses pressupostos fácticos. Não sendo viável afirmar, antes do trânsito em julgado da sentença, que exista obrigação, também nesse caso não se justificaria fossem os alimentos devidos desde a citação. Creio impossível negar que a obrigação alimentar preexiste à sentença. Não é ela, evidentemente, que cria a relação de parentesco. Exigido seu adimplemento, pela citação, a partir daí será devida. Cumpre ter-se em conta, permito-me insistir, que a Lei n. 883 refere-se a alimentos provisórios e disso não se cogita. Aqui se cuida dos definitivos que são devidos desde a citação, mas exigíveis apenas quando se viabilizar a execução. Os provisórios é que poderão ser desde logo exigidos. Motivo relevante costuma ser trazido e o foi no voto do Ministro Ruy Rosado, dizendo com o pesado encargo, eventualmente insuportável, que recairá sobre o alimentante que, ao fim de um processo, muitas vezes demorado, terá de arcar com o pagamento imediato de dezenas de prestações vencidas. E sob ameaça de prisão. Ademais, o pagamento mais significará indenização ao autor, não tendo propriamente a finalidade de alimentá-lo. A isso se pode contrapor que a adoção da tese de que só a partir da sentença serão devidos os alimentos servirá de estímulo ao não reconhecimento voluntário da paternidade. Convirá retardar ao máximo seja proferida a sentença, em detrimento daquele que carece de meios para seu sustento e a eles tem direito, embora isso não possa ser logo proclamado. Creio que viável a adoção de certas medidas, tendentes a minorar os efeitos de pensões atrasadas, sugeridas em acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, mencionado por Yussef Cahali (Dos Alimentos - RT - 2ª ed. - p. 503). Assim é que se pode deixar de determinar a prisão, se o recomendarem as circunstâncias, parcelar o respectivo pagamento e mesmo arbitrá-las em valores distintos para as diversas épocas. Negar que já existe a obrigação alimentar é que não me parece compatível com a ordem jurídica e a própria natureza das coisas. Essas razões são mais do que suficientes para que eu conheça dos embargos de divergência e lhes dê provimento para que o termo inicial dos alimentos seja a data da citação, na forma do paradigma. 142 SÚMULAS - PRECEDENTES VOTO-VISTA O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: Discute-se nos presentes embargos sobre o marco inicial para o pagamento da prestação alimentar em ação de investigação de paternidade. Enquanto o aresto a quo, da Egrégia 4ª Turma, fixa os alimentos a partir da sentença que reconhece a relação de parentesco, a decisão paradigmática, da Colenda 3ª Turma, estabelece como começo a citação do réu-alimentante. Ambas as correntes se acham respaldadas em argumentos sólidos e em percuciente doutrina. Inclino-me, dentre elas, pela tese sufragada pelo aresto trazido a confronto, da 3ª Turma. Dispõe a Lei n. 5.478, de 25.07.1968, que: Art. 13 (...) § 2º. Em qualquer caso, os alimentos fixados retroagem à data da citação. No caso da investigação de paternidade, não se sabe se o réu é parente do autor, de modo que - argumenta-se para afastar a aplicação da citada regra legal - inexistiria uma resistência ao pedido, mas uma incerteza que somente se dissipa com a decisão judicial que declara a existência da relação. Entretanto, o principal é que da ação de investigação, exatamente por revelar o vínculo de parentesco, exsurgem inúmeros reflexos civis. O filho que é reconhecido passa a ter, por exemplo, um pai, avós, eventualmente irmãos, etc. Altera-se a sucessão, talvez obrigações contraídas no período de ignorância dessa relação, v.g. doações feitas aos demais filhos. E, tudo isso fica alcançado pela retroação dos efeitos da paternidade ou da maternidade declarada a posteriori. Daí não me parecer melhor que se interprete a obrigação alimentar como uma exceção, ou seja, se os efeitos, no geral, remetem, com o reconhecimento da relação, a datas até do nascimento do filho, como exemplificado acima, não vejo porque limitar-se a repercussão do dito reconhecimento apenas a partir da decisão monocrática que o declara quando se cuide da prestação do dever do pai de prover o sustento da sua prole. Embora para muitos seja a paternidade encarada como uma surpresa, salvo hipóteses excepcionais há de se convir que dificilmente o réu pode ignorar, por completo, que se colocou em determinada situação - que não depende apenas RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 143 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA dele, pois são duas as pessoas envolvidas que poderia, em tese, gerar uma prole. A ignorância, portanto, nunca é absoluta. E se assim é, razoável esperar que o réu, de boa-fé, não retarde a solução da questão, submetendo-se, de logo, aos exames técnicos pertinentes, o que torna pouco significante o lapso temporal entre a citação e a conclusão pericial. Já a tese oposta permite ao réu, de má-fé, utilizar-se de expedientes processuais para retardar a prestação jurisdicional, criando incidentes e utilizando-se até o último dia dos prazos legais para protelar o momento da sentença, que marcaria o início da prestação alimentar. Finalmente, estou em que, no plano metajurídico, mais próprio é esperar que o pai aceite auxiliar seu filho do que o oposto, e mesmo fixando-se como data inicial a da citação, não se pode deixar de atentar que por todo o período anterior o alimentado, além de ignorar quem era seu genitor, ficando sem seu apoio pessoal, também dele nada recebeu em termos materiais. Desejo, todavia, adiantar preocupação que tenho relativamente à possibilidade de prisão civil em casos que tais, muito embora não esteja o tema agora em julgamento. Penso que, em face da particularidade da hipótese, a constrição não pode se vincular às parcelas correspondentes ao período anterior à decisão, pois não representa, propriamente, uma dívida vencida, de sorte que somente entendo cabível a coação quanto às prestações que se vencerem após a sentença. Ante o exposto, conheço dos embargos e dou-lhes provimento, aderindo ao voto do eminente relator, Min. Carlos Alberto Menezes Direito. É como voto. APARTE O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: - Não se aplicaria o entendimento jurisprudencial de que a prisão não se referiria a prestações pretéritas, limitada a ameaça de coerção pessoal ao inadimplente das três últimas? VOTO O Sr. Ministro Barros Monteiro: Sr. Presidente, na egrégia Quarta Turma, também tenho uma posição definida em vários pronunciamentos. Tenho me 144 SÚMULAS - PRECEDENTES mantido na posição minoritária naquela Turma. Até o momento tenho sido o único vencido, sustentando que os alimentos, nessas hipóteses, fluem a partir da citação. Não bastasse a expressa disposição do art. 13, § 2º, da Lei n. 5.478, há circunstâncias relevantes de que essa sentença proferida na ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos tem também caráter declaratório, daí por que se justifica o termo inicial dos alimentos na forma referida. Acompanho o voto do Sr. Ministro-Relator. VOTO VENCIDO O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha: - Também tenho, Sr. Presidente, na Quarta Turma, uma posição já definida e no mesmo sentido da decisão aqui embargada que é do seguinte teor: A divergência está bem demonstrada, por isso mesmo é que conheço do recurso. A Lei n. 883, de 21.10.1949, que dispunha sobre o reconhecimento de filhos ilegítimos, pontificava no seu art. 5º que “na hipótese de ação investigatória da paternidade, terá direito o autor a alimentos provisionais desde que lhe seja favorável a sentença de primeira instância, embora se haja, desta, interposto recurso”. A Lei n. 8.560, de 29.12.1992, que “regula a investigação de paternidade dos filhos havidos fora do casamento e dá outras providências”, pontifica, no seu art. 7º, que “sempre que na sentença de primeiro grau se reconhecer a paternidade, nela se fixarão os alimentos provisionais ou definitivos do reconhecido que deles necessite”. Desses dispositivos percebe-se que o propósito do legislador foi o de assegurar alimentos ao filho desde o primeiro momento em que se der um reconhecimento judicial que abone a sua pretensão, pois a partir de então já milita uma forte presunção a seu favor. Não se aplica ao caso o § 2º do art. 13, da Lei n. 5.478, como consignou o r. aresto hostilizado, pois tal dispositivo refere-se aos cônjuges e aos parentes já previamente assim considerados, e na ação proposta com base nesse Diploma Legal discute-se apenas se estão presentes os demais pressupostos para a estipulação dos alimentos (necessidade do alimentando e possibilidade do alimentante de prestá-los). Já a Lei n. 883, e agora a Lei n. 8.560, regulam, de início, o reconhecimento dos filhos havidos fora do casamento, em que, quando da propositura da ação, não militava em prol do filho a presunção da filiação, que só passa a existir depois da sentença. RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 145 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Com efeito, a obrigação do pai de prestar alimentos ao filho não pode retroagir à data da citação, porque o reconhecimento só se dá quando expresso na sentença, de que o dever alimentar passa a ser decorrente. Diante de tais pressupostos, conheço do recurso, pela divergência, para lhe dar provimento, modificando o r. aresto atacado para o fim de determinar que os alimentos são devidos a partir da sentença. (REsp n. 5.887-SP, de minha relatoria, in DJ de 08.09.1998). Assim, peço vênia para discordar dos eminentes Ministros que me antecederam, por entender que os alimentos, na hipótese, são devidos a partir da sentença, e não da citação. VOTO-VOGAL O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: - Sr. Presidente, também peço vênia ao eminente Relator para manter o entendimento predominante na egrégia Quarta Turma, isso porque, em se tratando de ação de investigação de paternidade, a lei determina - já era assim na Lei n. 883 - que somente depois da sentença são concedidos alimentos ao investigante. A determinação que está na Lei de Alimentos é apenas para os casos em que o autor, ao propor a ação, já disponha de prova pré-constituída da relação originária da obrigação alimentar. Mais recentemente, a Lei n. 8.560, de 1992, veio estabelecer, dispondo sobre a investigação de paternidade de filhos havidos fora do casamento que “sempre que na sentença de primeiro grau se reconhecer a paternidade, nela se fixarão os alimentos provisionais ou definitivos do reconhecido que deles necessite”. Daí por que, penso eu, nos termos da legislação vigente, os alimentos, nesses casos, são devidos a partir da sentença. RECURSO ESPECIAL N. 78.563-GO (95.0056886-1) Relator: Ministro Waldemar Zveiter Recorrente: Odenir José da Silveira Recorrido: Elvis Henrique Ribeiro - menor impúbere Representado por: Magali Luiza Ribeiro Advogados: Joaquim Alves de Castro Neto José Alves Teixeira 146 SÚMULAS - PRECEDENTES EMENTA Ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos. Matéria de fato. Fixação do termo inicial da pensão alimentícia a partir da citação. I - Matéria de fatos e provas não se reexamina em sede do especial (Súmula n. 7, do STJ). II - Reconhecida a paternidade, a obrigação de alimentar, em caráter definitivo exsurge, de forma inconteste, desde o momento em que exercido aquele direito, com o pedido de constrição judicial, qual seja, quando da instauração da relação processual válida, que se dá com a citação. Inteligência do parágrafo 2º, do art. 13, da Lei n. 5.478/1968. Precedentes do STJ. III - Recurso não conhecido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Senhores Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Eduardo Ribeiro, por unanimidade, não conhecer do recurso especial. Participaram do julgamento os Senhores Ministros Costa Leite, Nilson Naves e Eduardo Ribeiro. Não participou do julgamento o Sr. Ministro Menezes Direito (§ 2º, art. 162, RISTJ). Brasília (DF), 05 de novembro de 1996 (data do julgamento). Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Presidente Ministro Waldemar Zveiter, Relator DJ 16.12.1996 RELATÓRIO O Sr. Ministro Waldemar Zveiter: Elvis Henrique Ribeiro - menor impúbere, representado por sua mãe Magali Luiza Ribeiro, ajuizou Ação de Investigação de Paternidade, cumulada com Pensão de Alimentos, contra Odenir José da Silveira. RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 147 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA A sentença julgou procedente o pedido, determinando a expedição do Mandado Averbatório no Cartório de Registro Civil; fixando o termo inicial dos Alimentos, a partir da citação; e condenando, ainda, o vencido nos ônus da sucumbência (fls. 86-100 e 104-105 - Embargos Declaratórios). Interposta apelação (fls. 106-114), a Terceira Turma Julgadora da Primeira Câmara Cível do Colendo Tribunal de Justiça de Goiás, à unanimidade, negoulhe provimento, consignando “Em sede de investigação de paternidade, todos os meios de prova são admitidos com amplidão desmedida, eis que o ato sexual é, por princípio, realizado às escondidas, na intimidade do casal. Comportável, pois, a prova indiciária e as presunções que a verdade dos fatos oferece, para a formação da convicção judicial.” (fls. 150-160). Opostos Embargos de Declaração (fls. 162-165), foram acolhidos, em parte, para sanar omissão apontada, e de conseqüência passo a incorporar o decisum anterior, integrando-o em sua plenitude. No mais, ratificado o acórdão embargado (fls. 168-174). Inconformado, interpôs o apelante Recurso Especial, fundado no art. 105, III, a e c, da Constituição, alegando negativa de vigência dos artigos 363, II, do Código Civil; 515, §§ 1º e 2º, 333, I, parágrafo único, do CPC. Aponta, ainda, dissídio jurisprudencial (fls. 176-184). Com contra-razões (fls. 186-188) e após manifestação do Ministério Público Estadual pelo indeferimento de seu processamento (fls. 191-192), o nobre Presidente daquela Corte o admitiu, apenas, pela letra c (fls. 195-199). Remetidos os autos a esta Superior Instância, opinou a douta Subprocuradoria-Geral da República pelo não conhecimento do apelo extremo (fls. 206-208). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Waldemar Zveiter (Relator): Para melhor compreensão da controvérsia e em face ao acerto com que se houve, é ler, no ponto, o que dispôs o acórdão (fls. 156-158): No caso dos autos, creio que o julgador agiu com ponderado bom senso e extrema cautela, depurando os fatos e as provas constantes dos autos. A realidade emerge do processo com altivez: o apelado foi concebido em relação sexual haurida entre o apelante e a mãe do apelado. A genitora, na época, 148 SÚMULAS - PRECEDENTES tinha apenas 16 anos e deixara o serviço de doméstica na casa do apelante face ao constante assédio que sofria por parte do mesmo. É o que se depreende dos documentos constantes dos autos. As testemunhas do apelante são muito lacônicas e, ainda assim, nada puderam afirmar que comprometesse a conduta da menor, mãe do apelado. Aliás, a bem da verdade, isso não é tão importante, especialmente face ao exame hematológico que não exclui a possível paternidade. Reporto-me por oportuno, ao bem elaborado parecer de fls. 131-136, na parte em que o Promotor de Justiça assevera: Em momento algum, conseguiu o apelante provar ter Magali mantido relações plúrimas à época da concepção de Elvis, não merecendo crédito as testemunhas por ele (apelante) arroladas, porquanto claramente tendenciosas. Mesmo que se quisesse atribuir-lhes algum crédito, a única relação sexual noticiada, que Magali teria mantido com o tal Alemão do Pit Dog, data-se do final de 1991 para começo de 1992. Ora, o congresso carnal de que resultou a concepção do autor, data-se de 14 de abril de 1992, período em que não se tem notícias de qualquer outro relacionamento concomitante, estando, pois, descartada a hipótese da exceptio plurium concubentium. A corroborar as provas documentais, vários outros indícios despontam dos autos, a saber: a - o exame hematológico, ao invés de excluir, só veio reforçar ainda mais a convicção do condutor do feito, porquanto sendo a mãe do autor do grupo sangüíneo “O”, e o requerido, do grupo “A”, pertence o apelado também ao grupo “A”. b - A má vontade demonstrada pelo apelante, procurando furtar-se à coleta do sangue, através de subterfúgios, bem revela a convicção de ser ele o pai da criança; e c - a incrível semelhança fisionômica entre o criador e sua obra, ou melhor, entre o apelante e o autor, no contorno dos olhos, os olhos, formato do rosto, nariz e testa, não deixam dúvida quanto à paternidade. Ao teor do exposto e acolhendo o judicioso parecer ministerial de fls. 143-147, conheço do apelo mas nego-lhe provimento, mantendo a sentença apelada em sua integralidade e por seus próprios fundamentos. Vê-se, assim, que o aresto, ao decidir como feito, arrimou-se nas provas e circunstâncias constantes dos autos. Daí porque o recurso tal como posto, RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 149 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA implicaria em reexaminar matéria de fato, defeso na via eleita do Especial, por expressa disposição da Súmula n. 7, deste Superior Tribunal de Justiça. No tocante ao termo inicial da pensão alimentícia, por igual, a insurgência não merece prosperar. A propósito do tema, confira-se os acórdãos proferidos pela Turma quando do julgamento dos REsp’s n. 2.203-SP (RSTJ 26/305) e n. 31.340-9-SP (DJ de 10.05.1993), de minha relatoria, ambos citados pelo Dr. Juiz singular, onde, assim, sustentei: Reconhecida a paternidade, a obrigação de alimentar exsurge, de forma inconteste, desde o momento em que exercido aquele direito, com o pedido de constrição judicial, qual seja, quando da instauração da relação processual válida, que se dá com a citação do réu, no caso, o investigando. A ação de alimentos, embora cumulada com a investigatória, é de natureza condenatória e, conseqüentemente, em consonância com a regra geral, há de retrotrair à da propositura da demanda, melhor explicitando, a contar da previsão legal, como afirmado, da data da citação. Há que se examinar, ainda, a possibilidade de se aplicar à espécie, a norma contida no § 2º do artigo 13, da Lei n. 5.478/1968, por se tratar de regra de natureza genérica, em contraste com a da antiga Lei n. 883/1949, art. 5º, a qual se restringe à verba alimentícia em apreço, resultante da investigatória da paternidade, que é de natureza específica. A última diz respeito aos alimentos provisionais, enquanto que a outra se refere tanto aos provisórios quanto aos definitivos. Nesse mesmo sentido, os REsp’s n. 21.115-SP, n. 28.345-SP e n. 34.425-SP. De igual, os precedentes da Quarta Turma: REsp’s n. 40.436-RJ e n. 44.927-8-SP. No que diz com as alegadas violações da Lei tomo do despacho de admissão os tópicos seguintes que com correção os repeliu assim (fls. 197-198): A análise do acórdão não revela as violações legais argüidas. Na ação de investigação de paternidade, predominam os fatos. O fato principal, que é o relacionamento sexual da mãe do investigante com o investigado, no período da concepção, não tem, via de regra, testemunha, daí a doutrina seguida pela jurisprudência segundo a qual todos os meios de prova são admissíveis, inclusive indícios e presunções, na referida ação. De fatos demonstrados por qualquer meio parte-se para a presunção de paternidade. A presunção é, pois, “a conclusão ou conseqüência, que se tira de um fato conhecido, para se admitir como certa, verdadeira e provada a existência de um fato desconhecido ou duvidoso.” 150 SÚMULAS - PRECEDENTES O acórdão pôs em prática a doutrina, sem cometer os deslizes a que se refere o recorrente, relativamente à valoração da prova, que não se confunde com o exame da prova. No entender do recorrente, o acórdão teria infringido dois princípios probatórios, invertendo o ônus da prova de paternidade e admitindo a conclusão do exame hematológico sobre a não exclusão da paternidade como afirmação da paternidade. O acórdão não cometeu tais erros. Ao contrário do que assevera o recorrente, em momento algum, ele admitiu que o recorrente é pai do recorrido porque aquele “não conseguiu provar que não é o pai”. A leitura dos acórdãos, especialmente o proferido nos embargos de declaração, mostra que a Turma Julgadora interpretou corretamente a conclusão do exame hematológico, não como prova da paternidade, mas como revelação de que a paternidade do recorrente não podia ser excluída. Quanto ao dissídio com o acórdão de Minas quanto ao dies a quo para início do pensionamento, resultou superado, em face do entendimento uniforme da Corte, o que impõe incidir o Enunciado de sua Súmula n. 83 eis que determinado a partir da citação e não da sentença. Forte nesses lineamentos, não conheço do recurso. VOTO-VISTA O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: Em relação ao reconhecimento da paternidade, acompanho simplesmente o Relator. O pedido de vista que formulei prendeu-se ao outro ponto, ou seja, o momento a partir do qual serão devidos os alimentos. Tive como necessário voltar a refletir sobre o tema, em atenção ao fato de que existe divergência entre as Turmas que compõem a Segunda Seção deste Tribunal. Em um período inicial a jurisprudência era uniforme. Terceira e Quarta Turmas tinham como certo que os alimentos seriam devidos a partir da citação, ainda quando a condenação ao pagamento daqueles se condicionasse a que, no mesmo processo, se reconhecesse judicialmente a paternidade. Ocorre, entretanto, que a Quarta Turma, após haver assim decidido em alguns casos (REsp n. 6.583 e n. 26.692), em que vencido o Ministro Sálvio de Figueiredo, veio a modificar seu entendimento, a partir do julgamento do REsp n. 56.905, de que Relator o Ministro Ruy Rosado. Passou-se a entender que os alimentos, em tal caso, seriam devidos a partir da sentença. RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 151 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Esta Terceira Turma persistiu na anterior orientação e assim tenho votado, ainda que salientando a excelência dos votos, até então vencidos, proferidos pelo Ministro Sálvio de Figueiredo. Assim me manifestei, a propósito, ao apreciar o REsp n. 21.115. O tema sujeita-se a controvérsia mas, neste Tribunal, domina o entendimento acolhido pelo acórdão. Esta 3ª Turma assim decidiu no julgamento dos Recursos Especiais n. 2.203 e n. 6.826. No mesmo sentido a Egrégia 4ª Turma, ao apreciar o Recurso Especial n. 1.273. Cumpre assinalar que o eminente Ministro Sálvio de Figueiredo proferiu substancioso voto divergente, sustentando a inaplicabilidade do disposto no artigo 13 § 2º da Lei n. 5.478/1968. Esta Lei regularia ações de alimentos quando houvesse “prova pré-constituída da paternidade, de vínculo conjugal ou de laços de parentesco”. Sujeitando-se a concessão de alimentos à prejudicial de reconhecimento da paternidade, o procedimento seria o ordinário. Como assinalei no julgamento do REsp n. 2.203, já sustentei também o entendimento por que propugno o recorrente. Vim, entretanto, a mudar de opinião e nela persisto, malgrado a excelência das razões deduzidas no citado voto discordante do Ministro Sálvio de Figueiredo, cuja autoridade na matéria é sobejamente reconhecida. Considero que não é mister se invoque o disposto naquela lei especial para que se possa reconhecer que os alimentos serão devidos a partir da citação. Não se pode razoavelmente colocar em dúvida que declaratória a sentença, na parte em que reconhece a paternidade, seja incidentemente, como prejudicial, seja quando integre o pedido. A existência desse vínculo acrescendo-se a necessidade do alimentando e a possibilidade do alimentante, tem-se presente a obrigação de pensionar. Solicitado que o fizesse, haveria de adimplir a obrigação de imediato. Formalizada a demanda e aperfeiçoada a citação, o alimentante está em débito desde esse momento, embora só o trânsito em julgado da sentença permita afirmá-lo com certeza. Supérfluo, a rigor, o dispositivo da lei específica, a determinar que os alimentos sejam devidos a partir da citação. Entendo que foi inserido apenas para espancar possíveis dúvidas. Por fim, parece-me desvaliosa a invocação do disposto no artigo 5º da Lei n. 883/1949. Aí se cogita de alimentos provisionais. Favorável ao investigante a sentença, aqueles serão devidos e, por conseguinte, desde logo exigíveis. Aqui se cuida de alimentos definitivos, cujo pagamento se haverá de pleitear em execução de sentença. Tornando a meditar sobre a matéria, não modifiquei minha opinião, malgrado reconhecendo que ponderáveis os argumentos em contrário. Alega-se que, nas ações de alimentos, cabível a retroação porque desde logo comprovada a paternidade, questionando-se apenas em relação ao quantum da 152 SÚMULAS - PRECEDENTES pensão. Diversa a situação quando aquela só é reconhecida mediante o processo. Antes disso não haveria falar em obrigação de pagar alimentos. Permito-me observar, com a devida vênia, que o processo em que se pleiteiam alimentos não visa apenas a fixar o respectivo montante, mas a decidir sobre a própria existência da obrigação. Essa exige, além do vínculo de parentesco, que concorram a necessidade do alimentando e a possibilidade do alimentante podendo sustentar o réu que nenhuma pensão é devida, por faltarem esses pressupostos fáticos. Não sendo viável afirmar, antes do trânsito em julgado da sentença, que exista a obriga©¥o, tamb«m nesse caso não se justificaria fossem os alimentos devidos desde a citação. Creio impossível negar que a obrigação alimentar preexiste à sentença. Não é ela, evidentemente, que cria a relação de parentesco. Exigido seu adimplemento, pela citação, a partir daí será devida. Cumpre ter-se em conta, permito-me insistir, que a Lei n. 883 refere-se a alimentos provisórios e disso não se cogita. Aqui se cuida dos definitivos que são devidos desde a citação, mas exigíveis apenas quando se viabilizar a execução. Os provisórios é que poderão ser desde logo exigidos. Motivo sem dúvida relevante costuma ser trazido, e o foi no voto do Ministro Ruy Rosado, dizendo com o pesado encargo, eventualmente insuportável, que recairá sobre o alimentante que, ao fim de um processo, muitas vezes demorado, terá de arcar com o pagamento imediato de dezenas de prestações vencidas. E sob ameaça de prisão. Ademais, o pagamento mais significará indenização ao autor, não tendo propriamente a finalidade de alimentá-lo. A isso se pode contrapor que a adoção da tese de que só a partir da sentença serão devidos alimentos servirá de estímulo ao não reconhecimento voluntário da paternidade. Convirá retardar ao máximo seja proferida sentença, em detrimento daquele que carece de meios para seu sustento e a eles tem direito, embora isso não possa ser de logo proclamado. Creio que viável a adoção de certas medidas, tendentes a minorar os efeitos do acumulo de pensões atrasadas, sugeridas em acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo, mencionado por Yussef Cahali (Dos Alimentos - RT - 2ª Ed. - p. 503). Assim é que se pode deixar de determinar a prisão, se o recomendarem as circunstâncias, parcelar o respectivo pagamento e mesmo arbitrá-las em valores distintos para as diversas épocas. Negar que já existisse a obrigação alimentar é que não me parece compatível com a ordem jurídica e a própria natureza das coisas. Acompanho o Relator. RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 153 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO ESPECIAL N. 174.732-RO (98.0037539-2) Relator: Ministro Barros Monteiro Recorrente: José Mário de Melo Advogado: Gilson Luiz Juca Rios Recorrido: Alexandre Felipe Domingos (menor) Representado por: Dalva Margarete Domingos Advogado: Rosângela Lázaro de Oliveira EMENTA Investigação de paternidade. Cumulação com pedido de alimentos. Termo a quo da prestação alimentícia. - Segundo assentou a Eg. Segunda Seção, em ação de investigação de paternidade cumulada com pedido de alimentos, o termo inicial destes é a data da citação (EREsp n. 152.895-PR). Recurso especial não conhecido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas: Decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas precedentes que integram o presente julgado. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Ruy Rosado de Aguiar e Aldir Passarinho Júnior e Sálvio de Figueiredo Teixeira. Brasília (DF), 08 de fevereiro de 2000 (data do julgamento). Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Presidente Ministro Barros Monteiro, Relator DJ 04.09.2000 RELATÓRIO O Sr. Ministro Barros Monteiro: - Alexandre Felipe Domingos, menor impúbere, representado por sua mãe Dalva Margarete Domingos, com 154 SÚMULAS - PRECEDENTES fundamento nos arts. 363, II, do Código Civil e 227, § 6º da Constituição da República, ajuizou ação de investigação de paternidade, cumulada com pedido de alimentos, contra José Mário de Melo, afirmando que, ao tempo da concepção, a sua mãe mantinha exclusivo relacionamento sexual com o réu. O MM. Juiz de Direito da Segunda Vara de Família da Comarca de Porto Velho-RO julgou parcialmente procedente a ação para declarar que o autor é filho do requerido, bem como para fixar a pensão alimentícia no montante de 10% dos rendimentos líquidos do requerido, inclusive sobre o 13º salário, a partir da data da citação. Foram interpostos apelação do réu e do Ministério Público e, bem assim, recurso adesivo do autor. A Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Rondônia, à unanimidade, rejeitou a preliminar de intempestividade do recurso do autor; no mérito, deu parcial provimento ao apelo do réu e negou-o aos recursos do Ministério Público e o do autor, em acórdão cujos os fundamentos se resumem na seguinte ementa: Triplo apelo. Investigação de paternidade. Percentual alimentício. Fixação e início. A pensão alimentícia é devida desde a citação e deve ser fixada em percentual sobre o salário líquido do alimentante. Custas judiciais. Ônus da sucumbência. Cumprimento. Somente após o trânsito em julgado da sentença pode·se exigir do sucumbente o pagamento das custas processuais. Recurso do réu provido parcialmente. Percentual alimentício fixado na sentença em 10% sobre os rendimentos. Majoração. Mãe do alimentando sadia e possuidora de emprego fixo. Contribuição dos pais para o sustento do menor. Os apelos interpostos pelo autor e pelo MP pedindo a majoração da pensão alimentícia não podem prosperar, uma vez que emerge dos autos ser a mãe do alimentando mulher jovem, sadia e possuir emprego fixo, devendo também contribuir com o sustento do filho. (fl. 180). Rejeitados os declaratórios, o réu manifestou o presente recurso especial com arrimo nas alíneas a e c, do permissivo constitucional, alegando negativa de vigência dos arts. 5º da Lei n. 883/1949; 7º da Lei n. 8.560/1992 e 13 da Lei n. 5.478/1968, além de dissídio jurisprudencial. Sustentou, em síntese, que nas ações de investigação de paternidade cumulada com alimentos, estes são devidos a partir da sentença e não da citação. RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 155 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Oferecidas as contra-razões, o recurso foi admitido na origem, subindo os autos a esta Corte. O Subprocurador-Geral da República opinou pelo conhecimento e provimento do recurso. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Barros Monteiro (Relator): - Dado o conteúdo declaratório da decisão que julga a ação de investigação de paternidade, os alimentos retroagem à data da citação. Segundo assentou a C. Terceira Turma desta Corte, a ação de investigação de paternidade, dotada de natureza declaratória, não cria laço de parentesco, mas tão-somente estabelece sua certeza jurídica (REsp n. 2.203-SP, relator Ministro Waldemar Zveiter, in RSTJ, vol. 26, p. 3.305-312). Reza o art. 13, § 2º, da Lei n. 5.478, de 25.07.1968, que “em qualquer caso, os alimentos fixados retroagem à data da citação”. Escorreita, pois, a diretriz firmada pelas instâncias ordinárias no sentido de que os alimentos, nessa hipótese, são devidos desde a citação, tal como acabou de definir recentemente a Eg. Segunda Seção deste Tribunal quando do julgamento do EREsp n. 152.895-PR, relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito. Não ocorre, pois, a alegada afronta a normas de lei federal, nem tampouco é passível de concretizar-se o dissídio pretoriano, nos termos do Verbete Sumular n. 83-STJ. Do quanto foi exposto, não conheço do recurso. É como voto. VOTO O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha: - Acompanho o eminente Ministro Relator, com ressalva do meu entendimento. VOTO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar (Presidente): - Acompanho o eminente Sr. Ministro Relator, com ressalva do meu entendimento, pois a lei 156 SÚMULAS - PRECEDENTES determina que, nesses casos, os alimentos são devidos depois da sentença de procedência da ação de investigação. VOTO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: - Acompanho o eminente Sr. Ministro-Relator, com ressalva do meu entendimento. VOTO O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: Acompanho, com ressalva do ponto de vista pessoal. RECURSO ESPECIAL N. 211.902-MG (99.0038247-1) Relator: Ministro Ari Pargendler Recorrente: Marcelo Penido de Oliveira Advogado: Segismundo Gontijo e outros Recorrido: Thiago Henrique Marchi Nicolao (menor) Representado por: Mara Lucia Nicolao Advogado: Rubens Francisco Duarte EMENTA Civil. Alimentos. Termo inicial na ação de investigação de paternidade. Na ação de investigação de paternidade, os alimentos são devidos a partir da citação. Precedente da Egrégia 2ª Seção (EREsp n. 152.895-PR). Recurso especial não conhecido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 157 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso especial. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Menezes Direito, Nilson Naves e Eduardo Ribeiro. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Waldemar Zveiter. Brasília (DF), 14 de dezembro de 1999 (data do julgamento). Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Presidente Ministro Ari Pargendler, Relator DJ 14.02.2000 RELATÓRIO O Sr. Ministro Ari Pargendler: A Egrégia Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, Relator o eminente Desembargador Francisco Figueiredo, confirmou sentença de procedência de ação de investigação de paternidade proposta por Thiago Henrique Marchi Nicolao contra Marcelo Penido de Oliveira, à base da seguinte motivação: A questão - em que pese ter se arrastado por anos - é de fácil desate. Na presente ação investigatória - depois de muita procrastinação - o Réu acabou por submeter-se ao exame de DNA e o resultado confirmou ser ele o pai do Autor, nascido de relacionamento íntimo, confessado em seu depoimento pessoal. Diante destas evidências e com as demais provas produzidas, o ilustre Juiz sentenciante decidiu pela procedência da ação. Quanto ao pedido de “Alimentos”, fixou a pensão em cinco (05) salários mínimos e, como não poderia deixar de ser, em razão de jurisprudência dominante, a começar pelo Superior Tribunal de Justiça, a partir da citação. O Apelante junta um rol de arestos dando pela obrigação a partir da sentença. Rol respeitável, mas, pelas datas dos arestos, vêse que os citados entendimentos estão superados pela dinâmica do tempo. A vigência é a partir da citação, pois não existe “prato de comida de graça”. Alguém responde por ele! (...) A ação e seu risco, a partir da citação do Réu, já não são para este novidade. Não são as indenizações e expropriatórias passíveis de correção e juros a partir do ato ilícito ou ato incivil? Por que não a Investigatória, com muito mais razão. Assim, de total acerto o decisum do nobre e brilhante colega de primeira instância, com o que anuiu o Órgão Ministerial de ambas as instâncias (fls. 500-501). Seguiram-se embargos de declaração (fls. 509-518), rejeitados (fls. 520522), bem assim o presente recurso especial, interposto por Marcelo Penido de Oliveira, com base no artigo 105, inciso III, letras a e c, da Constituição 158 SÚMULAS - PRECEDENTES Federal, por violação do artigo 5º da Lei n. 883, de 1949, do artigo 7º da Lei n. 8.560, de 1992 e do artigo 13, § 2º, da Lei n. 5.478, de 1968, e por divergência jurisprudencial (fls. 525-548) - admitido pela letra c (fls. 599-600). VOTO O Sr. Ministro Ari Pargendler (Relator): A 3ª e 4ª Turmas do Superior Tribunal de Justiça divergiam a respeito do tema, conforme se vê dos seguintes precedentes: REsp n. 98.654-MG, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito. Recurso especial. Ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos. Termo inicial. Precedentes da Corte. 1. Como assentado em precedentes da Corte, em ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos o termo inicial destes é a data da citação, com apoio no artigo 13, § 2º, da Lei n. 5.478/1968, que comanda tal orientação em qualquer caso. 2. Recurso especial conhecido pela letra c, mas improvido (DJU 30.06.1997). REsp n. 172.834-PR, Rel. Min. Eduardo Ribeiro. Alimentos. Investigação de paternidade. Termo inicial. Na ação de alimentos, ainda que não submetida ao procedimento da Lei n. 5.470/1968, serão devidos a partir da citação (DJU 16.03.1999). REsp n. 84.077-SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo. Alimentos. Pretensão não fundada na Lei n. 5.478/1968. Ausência de prova preconstituída da paternidade. Sentença como termo inicial de incidência. Evolução do posicionamento da Turma. Distinção em relação às ações de revisão de alimentos. Recurso desprovido. I - A Lei n. 5.478/1988 (art. 13), pela sua própria teleologia, não incide nas ações em que se postula alimentos, inexistindo prova preconstituída da paternidade. II - Destarte, em não se aplicando a referida lei, o dies a quo da incidência dos pretendidos alimentos não pode ser a data da citação, mas sim a da sentença, mesmo que sujeita a apelação (CPC, art. 520, II) (DJU 17.03.1997). REsp n. 200.254-SP, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar. Na ação de investigação de paternidade julgada procedente, os alimentos são devidos desde a publicação da sentença. Precedentes da Quarta Turma. Recurso conhecido e provido (DJU 02.08.1999). RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 159 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Na sessão de ontem, todavia, 13 de dezembro de 1999, a Egrégia 2ª Seção, decidiu no EREsp n. 152.895-PR, que, na ação de investigação de paternidade, os alimentos retroagem à data da citação. Na ocasião, enfatizei que a regra geral de que a sentença é ditada como se proferida no momento do ajuizamento da demanda só cede diante de lei expressa. Diz-se que a Lei n. 883, de 1949, dispôs excepcionalmente no sentido de que os alimentos só retroagissem até a sentença de procedência da ação. Sem razão, o aludido diploma legal se refere aos alimentos provisionais, não aos definitivos. Voto, por isso, no sentido de não conhecer do recurso especial. RECURSO ESPECIAL N. 218.119-MG (99.0049327-3) Relator: Ministro Eduardo Ribeiro Recorrente: Agostinho Resende Advogado: Orlando Resende e outros Recorrido: Maria das Dores Advogado: Almir José dos Santos e outro EMENTA Alimentos. Investigação de paternidade. Termo inicial. Os alimentos são devidos a partir da citação. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial, mas negar-lhe provimento. 160 SÚMULAS - PRECEDENTES Participaram do julgamento os Srs. Ministros Ari Pargendler, Menezes Direito e Nilson Naves. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Waldemar Zveiter. Brasília (DF), 14 de dezembro de 1999 (data do julgamento). Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Presidente Ministro Eduardo Ribeiro, Relator DJ 24.04.2000 RELATÓRIO O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: - O Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais deu parcial provimento à apelação inteposta por Agostinho Resende, réu de ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos, para reduzir o valor da pensão alimentícia a um salário mínimo, mantendo a sentença nos demais pontos, inclusive no que se refere à citação como termo inicial da condenação ao pagamento da verba alimentar. Opostos embargos de declaração pelo réu, foram rejeitados. Contra essas decisões apresentou o réu recurso especial. Sustentou que o termo inicial para pagamento da pensão alimentícia é a sentença. Alegou que, sendo a ação de alimentos cumulada com a de investigação de paternidade, incide o artigo 5º, da Lei n. 883/1949, não se aplicando o artigo 13, § 2º, da Lei n. 5.478/1968, que somente regula as hipóteses nas quais já existe prova pr«-constituída da filiação. Apontou, ainda, dissídio com acórdãos dessa Corte. Pediu fosse o pedido inicial julgado improcente, tendo em vista que não consideradas as provas que demonstrariam o comportamento promíscuo da mãe da autora. Por fim, invocando o artigo 218 do Código de Processo Civil, afirmou ser nulo o processo, desde a citação, pois, sofrendo o réu de atrofia cerebral, imprescindível a nomeação de curador especial. Contra-arrazoado, foi o recurso admitido, vindo os autos a esta Corte. O Ministério Público Federal opinou pelo não provimento do recurso. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro (Relator): - Três as questões versadas no recurso. Uma, pertinente à existência de provas a demonstrar ser o réu o pai da RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 161 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA autora. Outra, relativa à capacidade processual do réu. Finalmente, a última; referente ao termo inicial da obrigação de pagar alimentos. Fixou-o o acórdão na citação e o recorrente sustenta que o deveria ter sido na sentença. As duas primeiras dizem com matéria de fato. Constitui entendimento mais que pacífico neste Tribunal não se viabilizar o especial enquanto pretenda reexame da prova produzida, objetivando verificar se efetivamente conduziria à demonstração de determinados fatos. A base fática do julgamento, afirma-se reiteradamente, é a estabelecida na instância ordinária. Não é dado, pois, sopesar provas, para avaliar se delas efetivamente resultaria a conclusão, relativa aos fatos, acolhida pelo Tribunal de origem. A decisão da Corte mineira que declarou ser o réu o pai da autora, sob a simples perspectiva da análise das provas, é, portanto, soberana. Da mesma forma, partindo-se da premissa insuperável de que a idade avançada do réu não afetou suas faculdades mentais, não se pode ter como violado o artigo 218 do Código de Processo Civil. Incide a Súmula n. 7 desta Corte. Conheço do recurso, entretanto, tendo em vista o dissídio quanto ao terceiro ponto, nego-lhe, contudo, provimento. Controvertida a questão pertinente à obrigação de pagar alimentos, decorrente do reconhecimento judicial da paternidade, ainda não havendo consenso entre as Turmas que compõem a Seção de Direito Privado desta Corte. A jurisprudência desta Terceira Turma, todavia, adota a citação como o momento a partir do qual é devida a verba alimentar. Neste sentido, os Recursos Especiais n. 2.203, n. 21.115, n. 28.345, n. 98.654 e n. 141.468. Peço vênia para transcrever os fundamentos aduzidos por ocasião do julgamento do REsp n. 21.115, por mim relatado: Não se pode razoavelmente colocar em dúvida que declaratória a sentença, na parte em que reconhece a paternidade, seja incidentemente, como prejudicial, seja quando integre o pedido. À existência desse vínculo acrescendo-se a necessidade do alimentando e a possibilidade do alimentante, tem-se presente a obrigação de pensionar. Solicitado que o fizesse, haveria de adimplir a obrigação de imediato. Formalizada a demanda e aperfeiçoada a citação, o alimentante está em débito desde esse momento, embora só o trânsito em julgado da sentença permita afirmá-lo com certeza. Supérfluo, a rigor, o dispositivo da lei específica, a determinar que os alimentos sejam devidos a partir da citação. Entendo que foi inserido apenas para espancar possíveis dúvidas. Por fim, parece-me desvaliosa a invocação do disposto no artigo 5º da Lei n. 883/1949. Aí se cogita de alimentos provisionais. Favorável ao investigante a 162 SÚMULAS - PRECEDENTES sentença, aqueles serão devidos e, por conseguinte, desde logo exigíveis. Aqui se cuida de alimentos definitivos, cujo pagamento se haverá de pleitear em execução de sentença. Pelo exposto, conheço parcialmente do recurso, mas nego-lhe provimento. RECURSO ESPECIAL N. 224.783-DF (99.0067523-1) Relator: Ministro Cesar Asfor Rocha Recorrente: Ministério Público do Distrito Federal e Territórios Recorrido: Darci de Souza Advogado: João Cyrino Filho Interessadas: Fernanda Virgini - menor Maria Helena Virgini Advogada: Adeline Cecília Castilho Dias EMENTA Direito Civil. Direito de família. Investigação da paternidade cumulada com alimentos. Termo inicial destes. Petição inicial. Fixação dos alimentos. Reexame de prova. Impossibilidade. - Na ação de investigação de paternidade cumulada com postulação de alimentos, estes são devidos a partir da citação. Precedente da Segunda Seção. - Adequação do percentual fixado a título de alimentos. “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”. (Súmula n. 7-STJ). - Recurso parcialmente conhecido e, nesta parte, provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 163 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nessa parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Ruy Rosado de Aguiar, Aldir Passarinho Júnior e Sálvio de Figueiredo Teixeira. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Barros Monteiro. Brasília (DF), 16 de dezembro de 1999 (data do julgamento). Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Presidente Ministro Cesar Asfor Rocha, Relator DJ 02.05.2000 RELATÓRIO O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha: - Cuida a hipótese de ação de investigação de paternidade cumulada com pedido de alimentos ajuizada pela menor impúbere Fernanda Virgini, representada por sua mãe Maria Helena Virgini, em face do ora recorrido Darci de Souza, que foi julgada procedente em ambas as instâncias, do que resultou a condenação deste último a pagar a obrigação alimentar fixada em 12% de seus rendimentos brutos, deduzidos os descontos obrigatórios, a partir da r. sentença que os concedeu. O v. acórdão hostilizado recebeu a seguinte ementa, verbis: Civil. Investigação de paternidade c.c. alimentos. 1. Recurso do réu. O laudo de exame DNA, aliado às declarações das testemunhas, são provas suficientes para o reconhecimento da paternidade. 2. Alimentos reduzidos de 15% para 12% dos rendimentos brutos do alimentante. Apelação provida parcialmente. 3. Recurso da autora. Na ação de investigação de paternidade c.c. pedido de alimentos serão estes devidos desde a sentença que os concedeu e não a partir da citação. Jurisprudência do STJ. Apelação desprovida. (fl. 198). Inconformado, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, na qualidade de fiscal da lei e por meio de seu Vice-Procurador-Geral de Justiça, o Exmo. Sr. Romeu Gonzaga Neiva, interpôs o recurso especial em exame com base nas letras a e c do permissor constitucional, por suposta contrariedade ao artigo 13, § 2°, da Lei n. 5.478/1968 e ao artigo 5º da Lei n. 883/1949, pretendendo que a obrigação alimentar retroaja à data da citação; e ao artigo 400 do Código Civil, pleiteando a fixação dos alimentos no patamar de 15% dos rendimentos brutos do alimentante. 164 SÚMULAS - PRECEDENTES Aduz, ainda, divergência com o entendimento sufragado pelo Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria. Respondido, o recurso foi admitido na origem, tendo a douta Subprocuradoria-Geral da República opinado pelo seu não conhecimento. Recebi o processo em 03.11.1999, e remeti-o para pauta no dia 26 do mesmo mês. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha (Relator): Registro, prefacialmente, que a pretendida majoração do percentual fixado a título de alimentos sobre os rendimentos do alimentante, por sugerida vulneração ao artigo 400 do Código Civil, tem amparo em substratos exclusivamente fáticos, consubstanciados na aferição da capacidade contributiva de ambos os genitores da alimentada, além da necessidade desta última, que se pretende rediscutir. Ademais, verifico que a questão recebeu a devida análise no Tribunal de origem, restando consignado que “elevado se torna o percentual de 15% porque se trata de inativo possuidor de esposa como dependente, devendo, portanto, sustentar a si e a esta” (fl. 204). Adicionou-se, por fim, que “dentro desse quadro, parece-me razoável estabelecer os alimentos em 12% dos rendimentos brutos do apelante, deduzidos os descontos compulsórios” (fl. 205). Assim sendo, o acolhimento do recurso nessa parte demandaria o reexame do conjunto fático-probatório, tarefa esta imune ao crivo do Superior Tribunal de Justiça, consoante a orientação sumulada no Verbete n. 7. No tocante ao prazo inicial para a incidência dos alimentos, a divergência está bem demonstrada, por isso mesmo é que conheço do recurso. Efetivamente, após inicial divergência entre as Terceira e Quarta Turmas, a matéria foi levada à apreciação da Seção de Direito Privado no julgamento do EREsp n. 152.895-PR, da relatoria do eminente Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, em 13.12.1999, momento em que prevaleceu o entendimento de que na ação de investigação de paternidade, quando cumulada com o pedido de condenação em prestação de alimentos, estes são devidos retroativamente, desde a data da citação. RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 165 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Assim, com a ressalva de meu entendimento pessoal, revejo meu posicionamento anterior para adequá-lo ao precedente uniformizador da jurisprudência no âmbito da egrégia Segunda Seção. Diante de tais pressupostos, conheço parcialmente do recurso pela divergência e, nessa extensão, dou-lhe provimento, para determinar que os alimentos retroajam à data da citação. RECURSO ESPECIAL N. 226.686-DF (99.0071842-9) Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar Recorrente: Ministério Público do Distrito Federal e Territórios Recorrido: Edo Antonio Ferreira de Freitas Advogado: Marcio Machado Vieira e outros EMENTA Investigação de paternidade. Ministério Público. Recurso. Legitimidade. Alimentos. Data inicial. O Ministério Público tem legitimidade para recorrer da sentença que fixa alimentos. Os alimentos concedidos na sentença de procedência de ação de investigação de paternidade são devidos a partir da citação inicial. Orientação adotada pela 2ª Seção no julgamento do EREsp n. 152.895-PR. Ressalva do relator. Recurso conhecido, pela divergência, e provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das 166 SÚMULAS - PRECEDENTES notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Aldir Passarinho Junior, Sálvio de Figueiredo Teixeira e Cesar Asfor Rocha. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Barros Monteiro. Brasília (DF), 16 de dezembro de 1999 (data do julgamento). Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Presidente e Relator DJ 10.04.2000 RELATÓRIO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: João Victor Rêgo da Trindade, representado por sua mãe, Maria Nilma Rêgo Trindade, promoveu ação de investigação de paternidade c.c. alimentos contra Edo Antônio Ferreira de Freitas, alegando que Maria Nilma mantivera com o réu relacionamento amoroso desde 1989, daí a concepção e o nascimento do autor em 26 de novembro de 1990. Pleiteou o reconhecimento de sua paternidade, com a conseqüente condenação do pai em alimentos. A demanda foi julgada procedente, declarando-se o autor filho do réu, “garantindo-lhe o direito de incluir em seu nome o apelido paterno e a inclusão em seu registro de nascimento do nome de seus avós paternos, por força do vínculo de parentesco que ora se lhe reconhece”. Outrossim, o réu foi condenado ao pagamento de alimentos a partir da citação, fixados em 10% (dez por cento) dos rendimentos brutos do réu. O autor apelou, e a eg. Quarta Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal, por votação majoritária, deu parcial provimento ao recurso, assim ementando o acórdão: Investigação de paternidade cumulada com pedido de alimentos. Percentual e termo inicial dos alimentos. Honorários advocatícios. 1 - Provado que a concepção do autor ocorreu no período de relacionamento amoroso de sua mãe com o investigado, com ela sempre fiel a esse, e não afastada a paternidade por exames de sangue, impõe seja essa reconhecida. 2 - Fixados os alimentos em percentual compatível com as necessidades do credor e com as possibilidades do devedor, é de se manter o percentual arbitrado. 3 - Na ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos esses são devidos a partir da sentença. RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 167 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - Honorários que atendem os critérios do § 3º do art. 20 do CPC não reclamam alteração. Apelo provido parcialmente. (fl. 240). Votou vencido o il. Des. Revisor, que deferia alimentos a partir da citação. O Ministério Público opôs embargos infringentes. Às fls. 284-285, as partes formalizaram composição amigável, requerendo sua homologação, após a oitiva do d. MP. O MP opinou pela homologação do acordo, com a consequente extinção do feito (fls. 289-293). À fl. 309, o em. Des. Waldir Leôncio proferiu despacho no sentido de que “a homologação de transação após o julgamento do feito refoge às atribuições do relator (art. 68, V, do RITJDF), devendo ser submetida à apreciação do MM. Juiz da causa, após o trânsito em julgado.” A eg. Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, por maioria de votos, negou provimento aos embargos infringentes, assim sumulando o v. acórdão: Ministério Público. Ação de investigação de paternidade julgada procedente. Termo inicial da obrigação. Legitimidade do Ministério Público para perseguir a solução mais favorável ao menor. 1. A legitimação do Ministério Público para recorrer em favor do menor visando uma posição mais vantajosa exsurge do disposto no art. 499, § 2º, do CPC, considerando-se que se trata de peculiar modalidade de intervenção do órgão ministerial, como assistente diferenciado do incapaz, ad coajuvando, com os amplos poderes de assistente litisconsorcial, sem, todavia, com este se confundir, porque não detém relação jurídica com a parte contrária. 2. Subsiste na doutrina e na jurisprudência dissenso sobre o termo a quo para a obrigatoriedade alimentar nas ações de investigação de paternidade cumulada com alimentos, preferindo uns que se iniciem com a citação, enquanto outros defendem a data da prolação da sentença como marco inicial. Opção pela derradeira. A retroação dos alimentos à data da citação decorre de expressa previsão legal para as ações de alimentos em que a paternidade é conhecida e declarada (art. 13, § 2º, da Lei n. 4.768/1968); para a paternidade reconhecida por meio de provimento judicial a regra é outra. Inicialmente a do artigo 5º da Lei n. 883/1949. Atualmente a do artigo 7º da Lei n. 8.560/1992. Esta Lei é especial em relação à Lei de Alimentos que dava substrato legal à citação válida como marco inicial para exigibilidade da obrigação alimentar, por isso há de prevalecer. (fl. 295). 168 SÚMULAS - PRECEDENTES O d. MPDF ingressou com recurso especial por ambas as alíneas, alegando “afronta ao § 2º do art. 13 da Lei n. 5.478/1968 e a indevida aplicação do art. 5º da Lei n. 883/1949 e do art. 7º da Lei n. 8.560/1992”, (fl. 316), além de dissídio jurisprudencial com os REsp’s n. 161.347-DF, n. 98.654-MG e n. 118.467RS. Sustenta que os alimentos devem retroagir à data da citação, não só pela determinação do art. 13, § 2º, da citada lei, mas porque a sentença que reconhece a paternidade é de natureza declaratória. Afirma, ainda, a inaplicabilidade do art. 5º da Lei n. 833/1949. Com as contra-razões, o Tribunal de origem admitiu o recurso especial, subindo os autos a esta Corte. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar (Relator): 1. A primeiro questão diz com a legitimidade do MP para oferecer o recurso especial a fim de alterar a data inicial da obrigação alimentar do investigado. Reiteirando entendimento mais de uma vez exposto, penso que o MP, como custos legis, pode recorrer de decisão ou sentença proferida nos autos. Assim também é a orientação deste eg. Tribunal. Ministério Público. Recurso, em ação de investigação de paternidade, com pedido de alimentos, proposta pela mãe em nome do filho, menor impúbere. Legitimidade. Oficiando, em processos, como parte (órgão agente) ou como fiscal da lei (órgão interveniente), tem o Ministério Público legitimidade (ou interesse) para recorrer, sempre. Cód. de Pr. Civil, art. 499, par-2º. Recurso Especial conhecido e provido, para que seja retomado o julgamento da apelação. (REsp n. 5.333-SP, 3ª Turma, rel. em. Ministro Nilson Naves, DJ 25.11.1991). I - O Ministério Público, mesmo quando atua no processo como custos legis, o que acontece em inventário no qual haja menor interessado, tem legitimidade para intervir, inclusive para argüir a incompetência relativa do juízo. (REsp n. 100.690-DF, 4ª Turma, rel. em. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 08.03.1999). I - Consoante entendimento fixado pela Turma, o Ministério Público detém legitimidade para recorrer nas causas em que atua como custos legis, ainda que se trate de discussão a respeito de direitos individuais disponíveis e mesmo que RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 169 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA as partes estejam bem representadas. (REsp n. 160.125-DF, 4ª Turma, rel. em. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 24.05.1999). Separação judicial. Legitimidade do Ministério Público para apelar. Custos legis. Incidência da Súmula n. 99-STJ. 1. Ausência de nulidade do acórdão porque o Tribunal a quo, expressamente, reconheceu a ilegitimidade passiva. 2. A teor da Súmula n. 99-STJ, tem o Ministério Público, na qualidade de custos legis, legitimidade para apelar nos autos de separação judicial, ainda que a parte interessada não tenha recorrido. 3. Recurso Especial conhecido e provido. (REsp n. 102.040-MG, 3ª Turma, rel. em. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 15.09.1997). Ministério Público. Custos legis. Recurso. Legitimidade. Separação judicial. O Ministério Público tem legitimidade para recorrer de sentença proferida em processo de separação judicial, ainda que inexista recurso das partes. Art. 499, par. 2º do CPC e Súmula n. 99-STJ. Recurso conhecido e provido. (REsp n. 176.632-MG, 4ª Turma, de minha relatoria). 2. O acordo celebrado entre as partes (fl. 284) ainda não foi homologado e não inclui cláusula sobre o ponto ora em exame. 3. A divergência é notória, como bem exposto nos autos e lavra no âmbito desta Turma. Sustentando que deveria ser paga a partir da sentença de procedência da ação de investigação de paternidade, já assim votava: A regra do § 2º do artigo 13 da Lei n. 5.478/1968: “Em qualquer caso, os alimentos fixados retroagem à data da citação”, refere-se especificamente às situações criadas nos processos regulados pela Lei de Alimentos, a qual pressupõe uma prova preconstituída da obrigação alimentar e, por isso mesmo, impõe ao juiz o dever de fixar alimentos provisórios já ao despachar a inicial (artigos 2º e 4º). Como nos processos submetidos a esta lei sempre serão deferidos alimentos provisórios, a eventual revisão deles, na forma do § 1º do artigo 13, implicará a retroação, não integral (à data do despacho inicial) mas à da citação (§ 2º do artigo 13). Diferentemente ocorre na ação de investigação da paternidade, onde se está em busca da prova da relação de filiação, suporte do dever alimentar. Para estes, não se deferem provisórios, nomenclatura restrita à Lei n. 5.478; sobrevindo sentença favorável ao investigante, o artigo 5º da Lei n. 883/1949 autoriza a concessão de provisionais. Penso eu que apenas a partir da sentença, uma vez que não existe, para o caso, regra semelhante àquela do artigo 13, que favorece os que encontram abrigo na lei especial. 170 SÚMULAS - PRECEDENTES O sistema legal, assim interpretado, merece aplausos. Enquanto na hipótese da Lei n. 5.478 haveria apenas a necessidade de reajustar prestações devidas desde a citação, nas ações de investigação da paternidade o réu seria confrontado, ao final de um processo sabidamente demorado, com o dever de pagar o valor equivalente a 30, 40 ou mais prestações, relativas ao tempo pretérito, o que significa a constituição de uma dívida dificilmente suportável pelo comum dos cidadãos, à qual se acrescenta a pena de prisão. Para este entendimento muito pesa sobre as conseqüências da decisão, de que nos fala Hassemmer, preocupação que devo ter sempre presente. Nessa linha de raciocínio pondero. Ainda, que o investigante chegou à sentença de primeiro grau independentemente do deferimento dos provisionais e a sua concessão a posteriori, com efeito retroativo, mais servirá para indenizar o autor do que para alimentá-lo, o que parece ser um desvio de finalidade. Essa a argumentação que expendera no julgamento do REsp n. 44.927-8-SP, de 17.05.1994, quando votei acompanhando o voto vencido do eminente Min. Sálvio de Figueiredo, que entendeu contrariar o sistema a concessão de alimentos, na ação de investigação de paternidade, com efeito retroativo à citação. O caso dos autos evidencia bem a gravidade da situação que resultará do deferimento da pensão desde a citação inicial, para a qual chamo a atenção da eg. Turma: o réu, que é garçom, está sendo condenado a pagar uma dívida de 96 salários mínimos, correspondente ao tempo pretérito, desde março de 1987, pois a ação se arrasta há mais de oito anos, além das prestações vincendas. É fácil deduzir que o investigado não tem condições econômicas para fazer frente a esse débito, criando-se com isso uma situação insustentável, com a constituição de dívida impagável, cujo descumprimento, porém, pode resultar em prisão. Se o devedor percebe 4,5 salários mínimos por mês, deverá passar os próximos três anos reservando a totalidade da sua renda para resgatar o débito já vencido e pagar a prestação mensal vincenda, que é de um salário mínimo mensal. Isto posto, conheço do recurso, por violação ao art. 5º da Lei n. 883/1949, e pela divergência, suficientemente demonstrada, para deferir os alimentos a partir da data de publicação do acórdão que julgou procedente a ação de investigação. (REsp n. 56.905-RS, 4ª Turma, de minha relatoria). 4. Agora, porém, o dissídio já está superado com o julgamento da eg. 2ª Seção, que acolheu a tese de que, em situação como a dos autos, os alimentos são devidos desde a citação para a ação de investigação de paternidade. (EREsp n. 152.895-PR, rel. em. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, julgado em 13.12.1999). 5. Submetendo-me a essa orientação, com ressalva da posição pessoal, conheço do recurso e lhe dou provimento, para deferir alimentos a partir da citação. É o voto. RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 171 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO ESPECIAL N. 240.954-MG (99.0110654-0) Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior Recorrente: Manoella Alves Malheiros (menor) Representado por: Juliana Paula Alves Malheiros Advogado: Arthur Bernardes da Silva Júnior Recorrido: Marcus Vinicius Abritta Garzon Leite Advogados: Luiz Carlos Abritta e outros EMENTA Civil. Ação de investigação de paternidade. Alimentos. Marco inicial. Citação. I. Os alimentos, na ação de investigação de paternidade, têm como termo inicial a data da citação do réu. II. Jurisprudência pacificada no âmbito do STJ (EREsp n. 152.895-PR, rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, 2ª Seção, julgado em 13.12.1999). III. Recurso especial conhecido e provido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo Teixeira, Barro Monteiro, Cesar Asfor Rocha e Ruy Rosado de Aguiar. Custas, como de lei. Brasília (DF), 14 de março de 2000 (data do julgamento). Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Presidente Ministro Aldir Passarinho Junior, Relator DJ 15.05.2000 172 SÚMULAS - PRECEDENTES RELATÓRIO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: - Manoella Alves Malheiros interpõe, com base nas letras a e c do art. 105, III, da Constituição Federal, recurso especial contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, assim ementado (fl. 311): Ementa: investigação de paternidade c.c. alimentos. Valor da pensão. Data inicial da obrigação. Os alimentos são fixados com observância da necessidade do alimentando e da possibilidade do alimentante e, quando deferidos em ação de investigação de paternidade, têm por termo inicial a data da condenação. Sustenta a recorrente que a decisão violou o art. 23, parágrafo 2º, da Lei n. 5.478/1968, que determina a retroação dos alimentos fixados à data da citação do réu, e que se assim não for entendido haverá prejuízo aos alimentandos, uma vez que premiará os desidiosos, permitindo o uso de recursos protelatórios para retardar a decisão do litígio, o que se contrapõe à aplicação social da lei, princípio preconizado no art. 5º, da LICC. Aduz que a orientação firmada pela Corte a quo diverge do entendimento de diversos outros Tribunais sobre a mesma matéria, citando precedentes a respeito. Contra-razões às fls. 338-350, alegando a inaplicabilidade à espécie da norma legal tida com violada, eis que se dirige apenas aos casos de prova preconstituída da paternidade, inocorrente na hipótese da ação investigatória, em que existe dúvida, até a sentença, sobre quem é o genitor da alimentanda. Afirma, mais, que o dissídio jurisprudencial não se acha demonstrado na forma regimental, invocando, por fim, doutrina em apoio à tese de mérito que defende. O recurso especial foi admitido na instância de origem pelo despacho presidencial de fls. 352-353. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior (Relator): Inicialmente, tenho que o dissídio jurisprudencial não se acha demonstrado, seja porque transcritos RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 173 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA os arestos paradigmáticos apenas por suas ementas, seja por haver faltado o confronto analítico. Todavia, interposto também o recurso pela letra a do permissivo constitucional, tem-se que a questão foi prequestionada no âmbito do Tribunal a quo, pelo que passo ao exame do mérito. A controvérsia aqui configurada já foi motivo de amplo debate no Superior Tribunal de Justiça, encerrado recentemente quando do julgamento, em 13.12.1999, pela Colenda 2ª Seção, do EREsp n. 152.895-PR, de relatoria do eminente Ministro Carlos Alberto Menezes Direito. Naquela oportunidade, manifestei, após pedir vista dos autos para melhor exame do tema, o seguinte voto, litteris: Discute-se nos presentes embargos sobre o marco inicial para o pagamento da prestação alimentar em ação de investigação de paternidade. Enquanto o aresto a quo, da Egrégia 4ª Turma, fixa os alimentos a partir da sentença que reconhece a relação de parentesco, a decisão paradigmática, da colenda 3ª Turma, estabelece como começo a citação do réu-alimentante. Ambas as correntes se acham respaldadas em argumentos sólidos e em percuciente doutrina. Inclino-me, dentre elas, pela tese sufragada pelo aresto trazido a confronto, da 3ª Turma. Dispõe a Lei n. 5.478, de 25.07.1968, que: Art. 13 (...) § 2º Em qualquer caso, os alimentos fixados retroagem à data da citação. No caso da investigação de paternidade, não se sabe se o réu é parente do autor, de modo que - argumenta-se para afastar a aplicação da citada regra legal - inexistiria uma resistência ao pedido, mas uma incerteza que somente se dissipa com a decisão judicial que declara a existência da relação. Entretanto, o principal é que da ação de investigação, exatamente por revelar o vínculo de parentesco, exsurgem inúmeros reflexos civis. O filho que é reconhecido passa a ter, por exemplo, um pai, avós, eventualmente irmãos, etc. Altera-se a sucessão, talvez obrigações contraídas no período de ignorância dessa relação, v.g. doações feitas aos demais filhos. E, tudo isso, fica alcançado pela retroação dos efeitos da paternidade ou maternidade declarada a posteriori. 174 SÚMULAS - PRECEDENTES Daí não me parecer melhor que se interprete a obrigação alimentar como uma exceção, ou seja, se os efeitos, no geral, remetem, com o reconhecimento da relação, a datas até do nascimento do filho, como exemplificado acima, não vejo porque limitar-se a repercussão do dito reconhecimento apenas a partir da decisão monocrática que o declara quando se cuide da prestação do dever do pai de prover o sustento da sua prole. Embora para muitos seja a paternidade encarada como uma surpresa, salvo hipóteses excepcionais há que se convir que dificilmente o réu pode ignorar, por completo, que se colocou em determinada situação, que não depende apenas dele, pois são duas as pessoas envolvidas, que poderia, em tese, gerar uma prole. A ignorância, portanto, nunca é absoluta. E se assim é, razoável esperar que o réu, de boa-fé, não retarde a solução da questão, submetendo-se, de logo, aos exames técnicos pertinentes, o que torna pouco significante o lapso temporal entre a citação e a conclusão pericial. Já a tese oposta permite ao réu, de má-fé, utilizar-se de expedientes processuais para retardar a prestação jurisdicional, criando incidentes e utilizando-se até o último dia dos prazos legais para protelar o momento da sentença, que marcaria o início da prestação alimentar. Finalmente, estou em que, no plano metajurídico, mais próprio é esperar que o pai aceite auxiliar seu filho do que o oposto, e mesmo fixando-se como data inicial a da citação, não se pode deixar de atentar que por todo o período anterior o alimentado, além de ignorar quem era seu genitor, ficando sem seu apoio pessoal, também dele nada recebeu em termos materiais. Desejo, todavia, adiantar preocupação que tenho relativamente à possibilidade de prisão civil em casos que tais, muita embora não esteja o tema agora em julgamento. Penso que, em face da particularidade da hipótese, a constrição não pode se vincular às parcelas correspondentes ao período anterior à decisão, pois não representa, propriamente, uma dívida pré-constituída, de sorte que somente entendo cabível a coação quanto às prestações vencidas após a sentença. Ante o exposto, conheço dos embargos e dou-lhe provimento, aderindo ao voto do eminente relator, Min. Carlos Alberto Menezes Direito. Firmado, assim, por este Tribunal, o entendimento final sobre a matéria - e as razões ora trazidas pelo recorrido não logram infirmá-las - conheço do recurso especial e dou-lhe provimento, para fixar como marco inicial da pensão alimentar a data da citação do réu. É como voto. RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 175 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO ESPECIAL N. 275.661-DF (2000.0089148-7) Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira Recorrente: Pedro Diniz Goncalves (menor) Representado por: Tatiana Diniz Gonçalves Advogados:Tulio Marcio Cunha e Cruz Arantes e outros Recorrido: Antonio Diurive Ramos Jube Pedroza Advogados: Elcio Curado Brom e outros EMENTA Investigação de paternidade. Alimentos. Termo inicial. Data da citação. Orientação da Segunda Seção. Honorários advocatícios. Art. 20, § 3º, CPC. Majoração. Despesas de tratamento anteriores ao ajuizamento e não postuladas na inicial. Recurso parcialmente provido. I. - A Segunda Seção deste Tribunal firmou orientação no sentido de que, em ação de investigação de paternidade, cumulada com alimentos, o termo inicial destes é a data da citação. II. - Em havendo pedido cumulado de condenação em alimentos, legítima a incidência do § 3º do art. 20, CPC. III. - Eventuais despesas de tratamento, anteriores ao ajuizamento da ação e não postuladas na inicial, somente podem ser deferidas em via própria. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe parcial provimento. Votaram com o Relator os Ministros Barros Monteiro, Cesar Asfor Rocha, Ruy Rosado de Aguiar e Aldir Passarinho Junior. Brasília (DF), 06 de fevereiro de 2001 (data do julgamento). Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Presidente Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Relator DJ 02.04.2001 176 SÚMULAS - PRECEDENTES EXPOSIÇÃO O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: Em ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos, ajuizada pelo recorrente, que teve seu pedido julgado procedente em sentença, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal, dentre outros pontos, reconheceu que os alimentos seriam devidos desde a data da sentença. Interpôs o autor recurso especial, fundamentado nas alíneas a e c do autorizativo constitucional, apontando, além de divergência com julgados deste Tribunal, violação dos arts. 4º e 400 do Código Civil e 20, § 3º, CPC, sustentando, em primeiro lugar, ser a data da citação o termo inicial da cobrança dos alimentos. No mais, questiona o percentual dos honorários advocatícios e postula o ressarcimento das despesas médicas, referentes ao parto e ao tratamento de doença congênita que possui desde o nascimento, desembolsadas antes da instauração da relação processual. Sem as contra-razões, foi o recurso admitido na origem, opinando o Ministério Público Federal, em parecer da lavra do Dr. Washington Bolivar Júnior, pelo provimento do recurso apenas quanto ao termo inicial dos alimentos. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira (Relator): 1. A Segunda Seção deste Tribunal, no julgamento dos EREsp n. 152.985-PR (DJ 22.05.2000), ao uniformizar a jurisprudência entre as duas Turmas que a compõem, firmou orientação diversa, consoante esta ementa: Investigação de paternidade cumulada com alimentos. Termo inicial dos alimentos. 1. Na forma do paradigma da Terceira Turma, “em ação de investigação de paternidade cumulada com alimentos o termo inicial destes é a data da citação, com apoio no artigo 13, § 2º, da Lei n. 5.478/1968, que comanda tal orientação em qualquer caso”. 2. Embargos de divergência conhecidos e providos. Esta Turma, já com a nova orientação, ementou: Alimentos. Ação de investigação de paternidade. Os alimentos são devidos desde a data da citação do réu em ação de investigação julgada procedente. RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 177 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Precedente da 2ª Seção. Recurso não conhecido (REsp n. 219.338-SC, DJ 12.06.2000). Não vejo razão para deixar de acolher a orientação firmada pela Segunda Seção, notadamente porque esta Corte tem por missão constitucional uniformizar o entendimento jurisprudencial no País, não sendo razoável que se mantenha posicionamento contrário ao fixado pelo próprio Tribunal, criando insegurança jurídica para as partes. 2. No que toca ao quantum dos honorários advocatícios, de igual forma o recurso merece guarida. Não se nega, é bem verdade, que a questão relacionada com o quantum dos honorários advocatícios está normalmente envolta com os fatos da causa, pelo que seria, em princípio, inapreciável no âmbito do recurso especial. Cuidando-se, no entanto, de questões de direito ou quando a estipulação feita nas instâncias ordinárias desborda dos critérios estipulados em lei, seja porque se distanciam do juízo de equidade, seja porque desatendem aos limites previstos, esta Turma tem conhecido dos apelos visando à alteração do quantitativo escolhido, para elevá-los ou reduzi-los. No caso dos autos, ao fixar os honorários em três por cento sobre o valor da causa, além de estabelecer quantum reduzido para a causa, deixou o acórdão impugnado de atentar para o § 3º do art. 20, CPC, que estabelece mínimo e máximo para a fixação dos honorários. In casu, não obstante se cuide, como pedido principal, de investigação de paternidade, ação constitutiva, portanto, há pedido cumulado de alimentos, de natureza condenatória. Destarte, com base nos elementos descritos no art. 20, § 3º, alíneas a a c, levando em conta as circunstâncias da causa, arbitro os honorários em 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, assim como fez a sentença. 3. Por fim, não prospera a alegada violação dos arts. 4º e 400 do Código Civil. O eg. Tribunal de origem não afirmou que a sentença declaratória de paternidade não teria efeitos a partir da concepção, mas sim que as despesas anteriores à citação do réu nesta ação constituíam “gastos pretéritos, levados a efeito sem a competente perquirição do fato possibilidade, um dos termos do binômio a ser, inquestionavelmente, observado para que se possa compelir o devedor de alimentos a prestá-los” (fl. 573). 178 SÚMULAS - PRECEDENTES Não fosse por isso, certo é que os gastos com despesas médicas integram os alimentos. Logo, se esses são devidos apenas a partir da citação, por essa mesma razão as despesas anteriores à essa data não podem ser impostas ao alimentante, e nem cobradas pelo alimentando nesta via. Por outro lado, nada impede que os interessados possam postular, pelas vias judiciais próprias, a cobrança de eventuais gastos (hospedagem, remédios, médicos, deslocamentos etc.) desembolsados no tratamento da criança, que nasceu com “lábios leporinos e fenda palatina (garganta de lobo)” e com suspeita de “síndrome de binder.” 4. Pelo exposto, conheço do recurso pelo dissídio e dou-lhe parcial provimento para fixar a data da citação como o termo inicial da incidência dos alimentos, e, aplicando o direito à espécie (art. 257, RISTJ), fixar os honorários advocatícios em 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, nos termos da sentença. RSSTJ, a. 5, (21): 127-179, agosto 2011 179 Súmula n. 278 SÚMULA N. 278 O termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca da incapacidade laboral. Referências: CC/1916, art. 178, § 6º, II. Súmula n. 101-STJ. Súmula n. 229-STJ. Precedentes: AgRg no REsp 329.479-SP (4ª T, 09.10.2001 – DJ 04.02.2002) REsp 220.080-SP (3ª T, 11.04.2000 – DJ 29.05.2000) REsp 228.772-SP (4ª T, 09.11.1999 – DJ 14.02.2000) REsp 309.804-MG (3ª T, 06.12.2001 – DJ 25.03.2002) REsp 310.896-SP (3ª T, 17.05.2001 – DJ 11.06.2001) Segunda Seção, em 14.05.2003 DJ 16.06.2003, p. 416 AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL N. 329.479-SP (2001.0073619-9) Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira Agravante: Sul América Companhia Nacional de Seguros Advogado: Fernando Neves da Silva e outros Agravado: Evileusa Rosa Gomes Advogado: José Wiazowski e outros EMENTA Civil. Seguro. Acidente no trabalho. Termo a quo. Ciência inequívoca. Perícia. Caso concreto. Microtraumas. Cobertura securitária. Orientação da Turma. Agravo desprovido. I - Na ação que envolve contrato de seguro, segundo entendimento do Tribunal, o termo a quo não é a data do acidente, mas aquela em que o segurado teve ciência inequívoca da sua invalidez e da extensão da incapacidade de que restou acometido. II - Nos termos da orientação desta Turma, “inclui-se no conceito de acidente de trabalho o microtrauma repetitivo que ocorre no exercício do trabalho a serviço da empresa, provocando lesão que causa incapacidade laborativa”. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental. Votaram com o Relator os Ministros Barros Monteiro, Cesar Asfor Rocha, Ruy Rosado de Aguiar e Aldir Passarinho Junior. Brasília (DF), 09 de outubro de 2001 (data do julgamento). Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Relator DJ 04.02.2002 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EXPOSIÇÃO O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: Em execução de contrato de seguro ajuizada pela agravante, a sentença acolheu a prescrição suscitada pela seguradora, relativamente ao acidente de trabalho ocorrido em 04.05.1993, e entendeu que a outra moléstia sofrida pela segurada não teria relação com acidente de trabalho ou com a sua atividade laborativa, por ser moléstia degenerativa, além do fato de que tal tipo de moléstia não estaria coberta pelo seguro. Assim, os embargos foram acolhidos, para extinguir a execução. Apelou a exeqüente, tendo o Segundo Tribunal de Alçada Civil de São Paulo negado provimento ao recurso, com esta ementa: Seguro de vida em grupo. Execução. Embargos. Segurado contra seguradora. Prescrição ânua. Termo inicial. Reconhecimento. Embargos procedentes. Sentença confirmada. O termo inicial de fluência do prazo prescricional é a data em que o acidentado teve efetiva ciência de sua enfermidade ou do fato incapacitante, e não a partir do laudo médico que serviu para instruir a execução. Seguro de vida em grupo. Acidente pessoal. Microtraumas. Moléstias de origem degenerativa. Ausência de previsão contratual. Pretensão à indenização. Inadmissibilidade. Os microtraumas ocorridos na etilogia de determinadas doenças profissionais não se equiparam ao acidente típico para fins de indenização, obrigando-se o segurador só pelos riscos contratualmente assumidos (CC, art. 1.460). Não há como caracterizar-se as moléstias diagnosticadas com o dano indenizável no seguro privado de acidentes pessoais, por não encontra respaldo nas condições do seguro contratado. Rejeitados os declaratórios, adveio recurso especial da vencida, apontando dissídio jurisprudencial e ofensa aos arts. 535-II, CPC e 178, § 6º, II, do Código Civil. Sustentou a recorrente que o acórdão impugnado foi omisso na análise do laudo judicial e aduziu que o termo inicial da contagem da prescrição não seria a data do acidente, mas sim a do laudo médico que atestou sua invalidez. No mérito, argumentou que a lesão sofrida pela autora - microtraumas - estaria coberta pelo seguro. Sem as contra-razões, foi o recurso admitido. Ao prover o recurso especial, lancei decisão assim sumariada: Civil. Seguro. Acidente no trabalho. Prescrição prazo. Temo a quo. Ciência inequívoca. Perícia. Caso concreto. Microtraumas. Cobertura securitária. Orientação da Turma. Recurso provido. 186 SÚMULAS - PRECEDENTES I - No prazo prescricional da ação que envolve contrato de seguro, segundo entendimento do Tribunal, o termo a quo não é a data do acidente, mas aquela em que o segurado teve ciência inequívoca da sua invalidez e da extensão da incapacidade de que restou acometido. II - Nos termos da orientação desta Turma, “inclui-se no conceito de acidente de trabalho o microtrauma repetitivo que ocorre no exercício do trabalho a serviço da empresa, provocando lesão que causa incapacidade laborativa”. Irresignada, manifesta a então recorrida agravo interno, argumentando que o entendimento fixado pelo acórdão impugnado não diverge da decisão agravada, mas apenas restou aplicado diante das circunstâncias específicas do caso concreto, que não podem ser revistas em sede de recurso especial. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira (Relator): A decisão agravada restou com a seguinte fundamentação, a dispensar maiores acréscimos: 3. Relativamente ao termo a quo da prescrição, este Tribunal é uníssono em afirmar que o termo inicial de fluência do prazo prescricional, não é a data do acidente, mas aquela em que o segurado teve ciência inequívoca de sua invalidez e da extensão da incapacidade que restou acometida. Para tanto, não há um momento exato ou documento certo, sendo exigível apenas, repita-se, que tenha o segurado, na data, ciência exata de seu problema. A respeito, confira-se, dentre outros, o REsp n. 257.596-SP (DJ 16.10.2000), assim ementado, no que interessa: II - No prazo prescricional da ação que envolve contrato de seguro, segundo entendimento do Tribunal, o termo a quo não é a data do acidente, mas aquela em que o segurado teve ciência inequívoca da sua invalidez e da extensão da incapacidade de que restou acometido. Na espécie, os elementos dos autos demonstram que apenas quando da realização do laudo médico (fls. 13-19 do apenso) é que a exeqüente teve essa ciência exata e inequívoca dos seus males, sabido não ser suficiente para esse fim a mera realização de consultas, tratamentos ou diagnósticos (a propósito, REsp n. 184.573-SP, DJ 15.03.1999, relator o Ministro Ruy Rosado de Aguiar). Assim, realizada a perícia em 20.10.1994, e tendo a execução sido ajuizada em 18.11.1994, é de afastar-se a prescrição. 4. No mérito, esta Turma, em casos semelhantes, vem decidindo que se inclui no conceito de acidente laboral os chamados microtraumas, assim entendidos RSSTJ, a. 5, (21): 181-204, agosto 2011 187 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA os males que se repetem no local do trabalho, provocando lesão da qual resulta incapacidade laborativa, como, por exemplo, o ruído que provoca redução ou perda da audição, esforço excessivo e repetitivo etc. Neste sentido, dentre outros, os REsps n. 196.302-SP (DJ 29.03.1999) e n. 237.594-SP (DJ 08.03.2000) e assim ementados: - Seguro de vida em grupo. Acidente. Microtrauma. Audição. Os microtraumas que o operário sofre quando exposto a ruído excessivo inclui-se no conceito de acidente, para o fim de cobertura securitária estabelecida em contrato de seguro em grupo estipulado pela sua empregadora. - Acidente no trabalho. Microtraumas. Tenossinovite. Inclui-se no conceito de acidente no trabalho o microtrauma repetitivo que ocorre no exercício do trabalho a serviço da empresa, provocando lesão que causa incapacidade laborativa. Acrescente-se que não houve reexame dos fatos e de cláusula contratual, mas apenas adequação das circunstâncias fixadas pelas instâncias ordinárias à jurisprudência do Tribunal. À vista do exposto, nego provimento ao agravo. RECURSO ESPECIAL N. 220.080-SP (99.0055389-6) Relator: Ministro Waldemar Zveiter Recorrente: Ye Sui Yong Advogado: Carlos Adolfo Bellio do Amaral Schmidt e outros Recorrido: BCN Seguradora S/A Advogado: Osmar da Costa Sobrinho e outros Recorrido: Companhia de Seguros do Estado de São Paulo - Cosesp Advogado: Lúcia Aparecida Alvares Kotait e outros Recorrido: Itaú Seguros S/A Advogado: Caio Luiz de Souza e outros Recorrido: Bradesco Seguros S/A Advogado: Hélio Eduardo Dias de Moura e outros 188 SÚMULAS - PRECEDENTES EMENTA Civil. Beneficiário de seguros de vida e acidentes pessoais em grupo e individuais. Prescrição ânua. Artigo 178, § 6º, II, do CC e Súmula n. 101-STJ. Termo a quo de contagem do prazo. Súmula n. 229-STJ. I - Segundo o disposto no artigo 178, § 6°, II, do CC e Enunciado da Súmula n. 101, desta Corte, a ação de indenização do segurado contra a seguradora prescreve em um ano. II - O prazo prescricional da ação do segurado contra o segurador, para haver reparação por incapacidade, começa a fluir a partir de quando aquele toma ciência inequívoca da referida incapacidade. III - Pacífico no âmbito desta Corte o entendimento segundo o qual não flui o prazo de prescrição ânua enquanto a seguradora não dá efetiva ciência ao segurado do indeferimento do seu pedido de indenização (Súmula n. 229-STJ). IV - Recurso conhecido e provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Senhores Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Ari Pargendler, Menezes Direito e Eduardo Ribeiro. Brasília (DF), 11 de abril de 2000 (data do julgamento). Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Presidente Ministro Waldemar Zveiter, Relator DJ 29.05.2000 RELATÓRIO O Sr. Ministro Waldemar Zveiter: Ye Sui Yong ajuizou ação de indenização em desfavor de BCN Seguradora S/A, Companhia de Seguros do Estado de São RSSTJ, a. 5, (21): 181-204, agosto 2011 189 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Paulo, Itaú Seguros S/A e Bradesco Seguros S/A, com fundamento em apólices de seguro de vida e acidentes pessoais, em grupo e individuais. A r. sentença monocrática acolheu preliminar de prescrição, julgando extinta a ação (fls. 264-265), na forma do artigo 269, IV, do CPC. Em sede de apelação, a Eg. Décima Segunda Câmara do Segundo Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, por unanimidade de votos, negou provimento ao recurso do Autor, em aresto que restou assim ementado: Ação de cobrança. Seguro de vida. Aplicabilidade do artigo 178, § 6°, II, do CC. Prescrição configurada. Incabível manifestação da Turma julgadora quanto ao mérito da causa. (fls. 343). Opostos Embargos Declaratórios, foram rejeitados (fls. 359-360). Ainda inconformado, interpôs Recurso Especial, com fulcro nas alíneas a e c do permissivo constitucional, sustentando violação aos artigos 118, 170, I, 178, § 6°, II, e 1.457 do CC; além de dissídio jurisprudencial. Com contra-razões (fls. 412-426, 428-431, 433-439 e 441-449), o recurso foi inadmitido às fls. 451. Irresignado, aviou agravo de instrumento, ao qual neguei seguimento às fls. 345 - apenso. Porém, em sede de agravo regimental, reconsiderei a decisão, determinando a subida dos autos principais a esta Corte (fls. 368 - apenso). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Waldemar Zveiter (Relator): Primeiramente, no que tange aos artigos 118, 170, I, e 1.457 do CC, ressalta-se que não foram objeto de deliberação por parte do aresto combatido, restando ausente, então, o requisito indispensável do prequestionamento. Entendendo o Recorrente ainda permanecer omissão no que concerne à análise destas questões, deveria ter aduzido, nas razões de Especial, vulneração ao artigo 535, II, do CPC. É que, segundo entendimento deste Tribunal, caracterizar-se-á ofensa a este dispositivo legal, se, a despeito da oposição de Embargos Declaratórios, persiste omissão a respeito de questão sobre que deveria pronunciar-se o órgão julgador. Precedentes: REsp n. 160.185-ES, DJ de 17.08.1998, Relator Min. Costa Leite; REsp n. 182.475-SP, DJ de 1º.02.1999, Relator Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, etc. 190 SÚMULAS - PRECEDENTES No mais, razão assiste ao Recorrente. Esta Corte pacificou entendimento adotando a prescrição ânua para as ações de beneficiário de seguro de vida e acidentes pessoais em grupo, nos termos da Súmula n. 101, verbis: A ação de indenização do segurado em grupo contra a seguradora prescreve em um ano. No entanto, a alegação dos Recorridos de que o termo inicial para a contagem de tal prazo deveria ser a data do acidente, ocorrido em 30.10.1994, não procede. A jurisprudência deste Tribunal definiu que o dies a quo para o início do prazo prescricional é a data em que o beneficiário teve ciência da incapacidade em caráter permanente. E assim também determina a lei ao mencionar que o prazo prescricional será contado do dia em que o interessado tiver conhecimento do fato, ou melhor, na espécie, da incapacidade. In casu, o Recorrente somente teve ciência de forma inequívoca desta incapacidade, seu grau e percentual, ao ser submetido a perícia médica realizada em 02.12.1994. Assim asseverou às fls. 275-276, verbis: Depreende-se da atenta leitura dos documentos de fls. 62 e 63 que até o início do ano de 1995, o apelante apesar de ter deixado o hospital em 05 de novembro de 1994, não tinha conhecimento integral da extensão das lesões, ocasionadas pelo acidente ocorrido em 30 de outubro de 1994, em virtude de não saber ao certo, se ficaria permanentemente privado, não só do membro que havia sido amputado, como também, da perda definitiva dos movimentos e do uso dos demais dedos da mão esquerda, comprometendo a sua capacidade total ou parcialmente. A indefinição acerca dos riscos envolvidos e acerca ainda da real e exata extensão do dano levou, conforme atesta o documento de fl. 62, o Dr. Alexandre, em 02.12.1994, profissional atuante na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, a determinar o incontinenti afastamento do apelante de suas atividades usuais por tempo indeterminado. Como a ação foi proposta no dia 1º.12.1995, não há que se falar em prescrição. Embora não tenha negado vigência ao artigo 178, § 6°, II, do Código Civil, o aresto, ao determinar a data do acidente como o termo a quo para contagem do prazo prescricional, divergiu da jurisprudência desta Corte. Inúmeros são os precedentes deste Tribunal nesse sentido. A respeito, confira-se acórdão da lavra do Exmo. Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, assim ementado: RSSTJ, a. 5, (21): 181-204, agosto 2011 191 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Direito Civil. Seguro em grupo contratado pela empregadora. Empregado segurado. Prescrição ânua. Enunciado n. 101 da Súmula-STJ. Termo a quo do prazo. Recurso desacolhido. I - Consoante entendimento firmado na Corte, no seguro facultativo em grupo a estipulante, empregadora, se qualifica como mandatária dos segurados, empregados, e, nos termos do Enunciado n. 101 da Súmula-STJ, a ação de indenização do segurado em grupo contra a seguradora prescreve em um ano. II - No prazo ânuo, segundo entendimento do Tribunal, o termo a quo não é a data do acidente, mas aquela em que o segurado teve ciência inequívoca da sua invalidez e da extensão da capacidade de que restou acometido. (REsp n. 175.575-SP, publicado no DJ de 03.11.1998). E, ainda, REsp’s n. 159.920-SP e n. 158.675-SP, ambos de minha relatoria; REsp n. 143.891-SP, Relator Min. Carlos Alberto Menezes Direito; REsp n. 598.321-SP, Relator Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira; e REsp n. 150.057-SP, Relator Min. Ruy Rosado de Aguiar. Ademais, logo após o acidente, o Recorrente requereu administrativamente, e por intermédio do Procon, às seguradoras, ora Recorridas, o pagamento da indenização devida, não obtendo qualquer resposta das mesmas. Ainda insistiu no pleito e, em 10 de março de 1995, as empresas solicitaram, então, a abertura de inquérito policial visando apurar a ocorrência de fraude no recebimento de indenizações securitárias, com fundamento no artigo 171, V, do Código Penal, sob argumento de automutilação. Em 25 de maio do mesmo ano ocorreu a última tentativa de composição amigável, indeferindo as seguradoras, mais uma vez, o pedido do Recorrente. Pacífico no âmbito desta Corte o entendimento segundo o qual não flui o prazo de prescrição ânua enquanto a seguradora não dá efetiva ciência ao segurado do indeferimento do seu pedido de indenização. Este o entendimento da Súmula n. 229-STJ, a amparar, também, o Recorrente. Assim dispõe o verbete: O pedido do pagamento de indenização à seguradora suspende o prazo de prescrição até que o segurado tenha ciência da decisão. Diante do exposto, conheço do recurso e dou-lhe provimento para, cassando as decisões ordinárias, afastar a prescrição e determinar o exame das demais questões, como de direito. É como voto. 192 SÚMULAS - PRECEDENTES RECURSO ESPECIAL N. 228.772-SP (99.0079149-5) Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar Recorrente: João Munhoz Botaro Advogado: José Wiazowski e outros Recorrido: Companhia Paulista de Seguros Advogado: José Américo Lombardi e outros EMENTA Seguro. Acidente no trabalho. Prescrição. Termo a quo. O prazo prescricional somente começa a fluir depois que o segurado tem ciência inequívoca da sua incapacidade, extensão e causa vinculada ao emprego. Resultado de exame que não esclarece suficientemente sobre a incapacidade, grau, natureza e origem. Negado pela ré qualquer efeito aos documentos apresentados pelo autor sobre a prova da sua incapacidade, requerendo, por isso, a produção de prova pericial, não pode ser a data daqueles exames considerada como de ciência inequívoca da incapacidade do operário. Recurso conhecido em parte e provido, para afastar a prescrição. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nessa parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Aldir Passarinho Junior, Sálvio de Figueiredo Teixeira, Barros Monteiro e Cesar Asfor Rocha. Brasília (DF), 09 de novembro de 1999 (data do julgamento). Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Presidente e Relator DJ 14.02.2000 RSSTJ, a. 5, (21): 181-204, agosto 2011 193 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RELATÓRIO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: João Munhoz Botaro promoveu ação ordinária de indenização contra Companhia Paulista de Seguros, dizendose beneficiário do contrato de seguro de vida em grupo e acidentes pessoais firmado entre a ré e a estipulante Laminação Nacional de Metais S/A., onde exercera atividade laborativa desde os dezesseis anos, tendo sofrido, em razão do seu trabalho, incapacidade por surdez profissional. Requereu, ao final, a procedência da ação, com a condenação da ré ao “pagamento de uma indenização correspondente ao percentual que for apurado através de perícia médica no curso do processo, proporcional aos 100% do capital segurado (R$ 20.807,04), devidamente atualizado daquela data até a do efetivo pagamento, acrescido de custas, juros de mora de 1 % ao mês, 20% de honorários sobre o total da condenação e demais cominações legais.” (fl. 05). O MM. Juiz a quo, com fundamento no art. 176, § 6°, inciso II, do Código Civil, c.c. a Súmula n. 101 desta Corte, declarou prescrita a ação, acolhendo a preliminar da ré, e julgou extinto processo com julgamento do mérito, a teor do art. 269, inciso I, do CPC. O autor apelou, e a eg. Décima Primeira Câmara do Segundo Tribunal de Alçada Civil, de São Paulo, por votação unânime, negou provimento ao recurso, em acórdão com a seguinte ementa: Seguro de vida e acidentes pessoais. Prescrição ânua. Contada a partir da constatação médica. Sentença mantida. (fl. 127). Rejeitados os embargos de declaração, o autor interpôs recurso especial por ambas as alíneas, sob a alegação de afronta aos arts. 535, inciso II, do CPC, art. 178, § 6º, inciso II, do Código Civil, bem como divergência jurisprudencial. Depois de apontar para omissão que teria havido no acórdão embargado, argumenta que o termo a quo para a contagem do prazo prescricional, consoante pacífica jurisprudência desta Corte, é a data do laudo que constata a invalidez, não se prestando, como ocorreu nestes autos, uma simples audiometria para revelar o grau, o percentual e, notadamente, o caráter da incapacidade, se permanente ou não. Salienta que o v. acórdão recorrido teve como único fundamento e referência o exame efetivado em 10 de abril de 1995. Com as contra-razões, o Tribunal de origem inadmitiu o recurso especial, daí o Agravo de Instrumento n. 239.264-SP (autos apensos), que provi para melhor exame. Requisitados os autos. É o relatório. 194 SÚMULAS - PRECEDENTES VOTO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar (Relator): O presente recurso versa sobre o termo inicial da prescrição ânua a que está submetida a pretensão indenizatória do acidentado, oriunda do contrato de seguro de vida em grupo e de acidentes pessoais, tratando-se de operário que alega invalidez por deficiência auditiva adquirida no trabalho. A jurisprudência deste Tribunal tem reiteradamente afirmado que o prazo somente começa a fluir da data em que o empregado tem efetiva ciência da sua incapacitação e da relação de causalidade com o trabalho desenvolvido: A prescrição da ação de cobrança do seguro por acidente no trabalho somente flui desde a data em que o segurado toma conhecimento inequívoco da existência da invalidez permanente, através de laudo médico elaborado para esse fim, indicando causa, sua natureza e extensão, não se considerando suficiente ter realizado consultas, tratamentos ou recebido diagnósticos. (REsp n. 784.573-SP, Quarta Turma, de minha relatoria, DJ 15.03.1999). Prescrição. Seguro. Acidente do trabalho. Tratando-se de invalidez resultante de uma série de fatores que se sucederam no tempo, não sendo sua etiologia identificável por um leigo, não se poderia exigir ingressasse o segurado em juízo enquanto não patenteasse a extensão do mal e sua causa. Desse modo, antes que isso se verificasse não fluiria o prazo de prescrição. (REsp n. 84.415-SP, Terceira Turma, Rel. em. Min. Eduardo Ribeiro, DJ 06.04.1998). Apesar do entendimento desta Corte ser no sentido de aplicar-se a prescrição ânua ao beneficiário do seguro (Súmula n. 101), o termo inicial é contado a partir de quando há a ciência inequívoca do fato, no caso, da data em que foi diagnosticada a invalidez (laudo pericial em julho/1986). (REsp n. 78.654-SP, Rel. em. Min. Waldemar Zveiter). Direito Civil. Seguro em grupo contratado pela empregadora. Empregado que figura como segurado. Prescrição ânua da ação do segurado contra a seguradora. Enunciado n. 101 da Súmula-STJ. Termo a quo do prazo. Ciência pelo acidentado da extensão de sua incapacidade. Acórdão que afirma não haver transcorrido um ano entre a ciência do fato pelo segurado e o ajuizamento da execução. Incidência do Verbete n. 7 da Súmula da Corte. Recurso desacolhido. I - Consoante entendimento firmado na Corte, no seguro facultativo em grupo a estipulante, empregadora, se qualifica como mandatária dos segurados, empregados. RSSTJ, a. 5, (21): 181-204, agosto 2011 195 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA II - “A ação de indenização do segurado em grupo contra a seguradora prescreve em um ano” (Súmula-STJ, Enunciado n. 101). III - O mencionado prazo, segundo entendimento do Tribunal, tem como termo a quo a data em que o segurado teve ciência inequívoca da sua invalidez e da extensão da incapacidade de que restou acometido, e não a data do acidente. IV - Havendo o acórdão de segundo grau acolhido a argumentação do segurado, no sentido de não ter transcorrido um ano entre a data da ciência pelo segurado da extensão de sua incapacidade e a propositura da execução, a acolhida da pretensão recursal demandaria revolvimento do quadro fático delineado pelas instâncias ordinárias, inviável em sede de recurso especial, nos termos do Verbete n. 7 da Súmula desta Corte. (REsp n. 59.832-SP, Quarta Turma, Rel. em. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 12.05.1997). Seguro acidente. Prescrição. O prazo prescricional para propor a ação de indenização, que a Jurisprudência do STJ tem considerado ser de um ano, começa a correr da data em que o acidentado teve conhecimento da extensão de sua incapacidade, como tal podendo ser considerado o dia da concessão da aposentadoria. Recurso não conhecido. (REsp n. 59.352-SP, Quarta Turma, de minha relatoria, DJ 14.08.1995). Na hipótese em exame, a eg. Câmara considerou como suficiente o exame realizado em 10.04.1995, cujo resultado está à fl. 17 dos autos, com a seguinte conclusão: “Áudio: D. e E. Perda auditiva neurossensorial de grau moderado a partir da freqüência de 3KHz. Imp. Curva tipo A - reflexos presentes”. Sustenta o recorrente que esse documento não era suficiente para lhe dar conhecimento inequívoco da sua incapacidade, extensão, natureza e causa vinculada ao emprego. Tenho para mim que ele tem razão, pois, de acordo com os nossos precedentes, um documento assim inespecífico não pode ser tomado como sendo o termo a quo do prazo de perda da pretensão de exigir o pagamento da indenização. Além disso, a seguradora ré negou qualquer eficácia à documentação apresentada pelo autor da ação (“os documentos acostados na inicial não fazem prova alguma das alegações feitas pelo autor”) e requereu a realização de perícia para comprovação da alegada incapacidade. Nesse caso, como ela mesma recusou qualquer valia à documentação apresentada paro o fim de esclarecer a condição física do autor, não se pode considerar o exame anterior, em função 196 SÚMULAS - PRECEDENTES do qual foram elaborados os atestados médicos, como bastante para esclarecer o operário - com menores condições de entender os resultados - e suficiente para o fim de fixar a data daqueles exames como sendo o dia “do inequívoco conhecimento da incapacidade laboral”, termo a quo do prazo. Em circunstância assemelhado, assim já se julgou nesta Quarta Turma: Não aceitando a seguradora os dados de que dispunha em seu departamento médico como suficientes para caracterizar a incapacidade coberta pelo seguro, nem reconhecendo como bastante o laudo apresentado pelo segurado ao propor a ação, o que determinou a realização de perícia em juízo, não pode ela invocar aquelas datas anteriores para a fluência do prazo prescricional, pois se ela mesma não aceita aqueles fatos como reveladores da incapacidade, não pode esperar que sejam considerados para a contagem do prazo que marcaria a inércia do titular do direito. A boa-fé objetiva, que também está presente no processo, não permite que uma parte alegue contra a outra um fato que ela não aceita e para o qual exige prova judicializada. (REsp n. 184.573-SP, Quarta Turma, de minha relatoria, DJ 15.03.1999). Não houve a alegada omissão no julgamento da eg. Câmara, que, apreciou as questões propostas, ainda que não tenha dado a certos aspectos de fato o realce que o autor pretendia. Assim, conheço em parte do recurso, pela alínea c, quanto à prescrição, e lhe dou provimento para afastar a questão e, assim, permitir que o pedido seja processado, retornando os autos à primeira instância. É o voto. RECURSO ESPECIAL N. 309.804-MG (2001.0029427-8) Relator: Ministro Carlos Alberto Menezes Direito Recorrente: Sasse Companhia Nacional de Seguros Gerais Advogado: Amélia Aparecida de Faria Oliveira e outros Recorrido: Marcelo Drumond Araújo Advogado: Marcos Inácio Araújo e Oliveira e outros RSSTJ, a. 5, (21): 181-204, agosto 2011 197 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EMENTA Seguro. Ação de cobrança. Prescrição. Precedentes. 1. O termo inicial do prazo é a data da ciência inequívoca da incapacidade, no caso, a data da aposentadoria, suspenso entre a data da comunicação do sinistro à seguradora e a resposta negativa ao segurado. O acórdão recorrido considerou que a ciência inequívoca ocorreu com a concessão da aposentadoria, em julho de 1996, correndo até março de 1997, data da comunicação, oito meses, quando suspensa; a resposta negativa veio em abril de 1997, daí recomeçando a contagem; se a ação ingressou em novembro de 1997, o prazo de um ano já estava esgotado. 2. Recurso especial conhecido e provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso especial e lhe dar provimento. Os Srs. Ministros Nancy Andrighi e Ari Pargendler votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Castro Filho. Brasília (DF), 06 de dezembro de 2001 (data do julgamento). Ministro Ari Pargendler, Presidente Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Relator DJ 25.03.2002 RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito: Sasse Companhia Nacional de Seguros Gerais interpõe recurso especial, com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra acórdão da Quarta Câmara Civil do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais, assim fundamentado: (...) A preliminar suscitada não prospera. 198 SÚMULAS - PRECEDENTES O prazo prescricional de um ano para que o segurado reclame do segurador o pagamento da indenização, nos exatos termos do inciso II, do § 6o, do art. 178, do Código Civil, é contado “do dia em que o interessado tiver conhecimento do mesmo fato”, ou seja, do fato gerador do direito à cobertura do seguro. No entanto, reclamado o pagamento da indenização dentro do prazo legal, sendo negado, é desta data que fluirá o prazo prescricional, pois é neste momento que nasce o direito de ação. (...) Com estas considerações e fundamentos, nego provimento ao recurso. (fls. 704 a 707). Alega a recorrente violação ao artigo 178, § 6o, inciso III, do Código Civil, tendo em vista que a presente ação foi proposta após a ocorrência da prescrição. Destaca que o prazo prescricional começa a fluir a partir do conhecimento do fato, ou seja, da invalidez do autor, não tendo ocorrido, neste caso, nenhuma das hipóteses de interrupção da prescrição previstas no artigo 172 do Código Civil. Aponta dissídio jurisprudencial colacionando julgados e a Súmula n. 101 desta Corte. Contra-arrazoado (fls. 745 a 751), o recurso especial (fls. 712 a 730) foi admitido (fls. 753). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito (Relator): O recorrido ajuizou ação de cobrança alegando que sofreu acidente de trabalho, com diagnóstico de LER, tenossinovite difusa de membros superiores, com incapacidade permanente; a indenização foi negada ao fundamento de que se tratava de doença profissional, da responsabilidade do INSS. A sentença considerou que a apólice cobria a doença, interpretando as condições gerais que contém uma garantia adicional de invalidez total por doença e julgou procedente o pedido. O Tribunal de Alçada de Minas Gerais manteve a sentença afirmando, expressamente, que foi contratada a “cobertura da morte ou invalidez, decorrentes de doença ou acidente, no trabalho ou fora dele. Sendo, portanto, irrelevante a causa da doença ou do acidente”. Assinalou, ainda, que “quando da aposentação do apelado, foi ele considerado inválido pelos profissionais do INSS que, diga-se de passagem, são rigorosos em seus exames no que se refere à concessão de aposentadorias por invalidez”. RSSTJ, a. 5, (21): 181-204, agosto 2011 199 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Vejamos a alegada violação ao art. 178, § 6o, III, do Código Civil. O que alega o especial é que a Previdência concedeu a aposentadoria em 1º.07.1996, sendo a ação ajuizada em 24.11.1997, há mais de um ano. O acórdão recorrido considerou que o termo inicial é a data em que o segurado teve negado o seu pedido de indenização, desta data nascendo o direito de ação. O prazo, segundo a jurisprudência da Corte, começa a correr da data em que o segurado tem conhecimento inequívoco da incapacidade (REsp n. 202.827-SP, da minha relatoria, DJ de 07.02.2000), mas, permanece suspenso entre a comunicação do sinistro e a resposta ao segurado da recusa do pagamento da indenização (AgRgAg n. 235.095-SP, da minha relatoria, DJ de 11.12.1999). No caso, asseriu o acórdão recorrido, “mesmo que se considere a data de concessão da aposentadoria como sendo 1º.07.1996 - f. 10 - como quer a apelante, o ‘Aviso de Sinistro’ - f. 11 - é de março de 1997, dentro, pois, do prazo prescricional. A negativa ao pagamento se deu em 02 de abril de 1997 - f. 12 o que torna a ação proposta em 24.11.1997 imune à prescrição alegada”. Mas, não torna não. No caso, o acórdão recorrido considerou que a ciência inequívoca ocorreu com a concessão da aposentadoria, em julho de 1996, correndo até março de 1997, data da comunicação, oito meses, quando suspensa; a resposta negativa veio em abril de 1997, daí recomeçando a contagem; se a ação ingressou em novembro de 1997, o prazo de um ano já estava esgotado. Com tais razões, eu conheço do especial e lhe dou provimento para acolher a prescrição. Custas e honorários de 10% sobre o valor da causa pela parte vencida. RECURSO ESPECIAL N. 310.896-SP (2001.0031066-4) Relatora: Ministra Nancy Andrighi Recorrente: Irineu Domingues Fernandes de Oliveira Advogado: Jose Wiazowski e outros Recorrido: Bradesco Seguros S/A Advogado: Alexandre Lobosco e outros 200 SÚMULAS - PRECEDENTES EMENTA Civil. Processo Civil. Recurso especial. Comprovação de dissídio jurisprudencial. Ação de cobrança de indenização securitária por invalidez permanente. Prazo prescricional. Termo a quo. - Para a comprovação do dissídio jurisprudencial alegado em recurso especial, é necessário indicar a similitude entre os casos confrontados. - O termo a quo para contagem do prazo prescricional de ação de segurado contra seguradora deve ser o momento em que o segurado obteve ciência inequívoca de estar acometido de moléstia incapacitante. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento. Os Srs. Ministros Antônio de Pádua Ribeiro, Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes Direito votaram com a Sra. Ministra Relatora. Brasília (DF), 17 de maio de 2001 (data do julgamento). Ministro Ari Pargendler, Presidente Ministra Nancy Andhighi, Relatora DJ 11.06.2001 RELATÓRIO A Sra. Ministra Nancy Andrighi: Cuida-se de Recurso Especial arrimado nas letras a e c, do art. 105, inciso III, da Constituição Federal, interposto contra acórdão do Segundo Tribunal de Alçada do Estado de São Paulo, que declarou a prescrição da pretensão de cobrança de indenização securitária por acidente pessoal. Narram os autos que Irineu Domingues Fernandes de Oliveira ajuizou ação de cobrança de indenização securitária em face do Bradesco Seguros, com quem havia contratado seguro de vida e acidentes pessoais. Alegava que RSSTJ, a. 5, (21): 181-204, agosto 2011 201 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA sofria de invalidez permanente representada por surdez e outros distúrbios neuropsíquicos causados por longa exposição a ruídos na usinagem em que trabalhava. O processo foi extinto, declarando-se prescrita a pretensão, com base no art. 178, § 6o, inciso II, do Código Civil, considerando-se, como termo a quo da contagem de tal prazo, a data em que o segurado havia se aposentado e imediatamente mudado-se para local tranqüilo, esperando melhoria na sua condição de saúde. Opôs o autor, embargos de declaração, que foram rejeitados por inexistência de vícios na sentença. Apelou, então, o ora recorrente, tendo sido negado provimento ao apelo, em acórdão do qual se colhem os seguintes fundamentos: (...) Se no momento em que foi demitido da empresa o autor mudou-se para o “interior, lugar sossegado, onde esperava desaparecessem os sintomas os quais, contudo, permanecem e por essa razão entende que é portador de incapacidade permanente” (cf. inicial, item IV - fls. 03), ele já tinha nesse momento a ciência inequívoca do mal que o acometia e da incapacidade que lhe causava, pois apresentava, ainda segundo a vestibular, “surdez total, zumbidos permanentes, nervosismo, angústia, depressão, tristeza sem motivos (distúrbios neuropsiquicos), que também lhe deixam com incapacidade permanente. (...) Ora, como entre o momento em que o recorrente teve ciência inequívoca de que estava doente e incapacitado, “tanto que se mudou para o interior em busca de sossego” e que ocorreu quando de seu desligamento da empresa e a data em que foi ajuizada ação decorreram seis anos, é forçoso o reconhecimento da prescrição - (fls. 231-232). Daí o presente recurso especial, em que se alega ofensa ao seguinte dispositivo legal: - Art. 178, § 6º, inciso II, porque contado o prazo prescricional aí previsto a partir do momento em que simplesmente constatou o segurado que estava acometido de alguma doença, e não de quando teve ciência inequívoca de estar incapacitado permanentemente em virtude desse mal, o que é o evento ensejador da cobrança da indenização securitária, e que somente ocorreria com o laudo pericial. Alega, ainda, que sobre considerar-se a fixação do dies a quo, da prescrição, divergiu o acórdão recorrido do entendimento desta Corte. 202 SÚMULAS - PRECEDENTES Em contra-razões sustenta, a recorrida, que não houve qualquer ofensa àquele dispositivo legal, e que o recorrente pretende reexame de matéria fática. Aduz, ainda, que o dissídio não foi comprovado. É o relatório. VOTO A Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relatora): - Do apontado dissídio jurisprudencial Primeiramente, quanto a pretensão recursal fulcrada na alínea c, do permissivo constitucional, tem-se que não restou demonstrada a similitude fática entre os casos confrontados, a fim de comprovar-se a divergência jurisprudencial. Com efeito, os acórdãos paradigmas consideraram que, nas situações ali examinadas, a ciência inequívoca de sofrer de moléstia incapacitante só foi conhecida pelo segurado após o resultado de laudo pericial, que assim atestou. Todavia, no caso, em tela, considerou-se que tal ciência ocorreu com outro fato, pois tratava-se de hipótese fática diversa. A fixação deste termo depende da investigação do caso concreto, para se determinar quando o estado de incapacidade absoluta foi conhecido pelo segurado. - Da alegada ofensa a dispositivo legal No que concerne ao recurso especial calcado na alínea a, do permissivo constitucional, cinge-se a questão à determinação de qual seja o termo a quo para contagem do prazo prescricional ânuo previsto no art. 178, § 6°, inciso II, do Código Civil. Já decidiu essa Corte que inicia-se tal cômputo no momento em que o segurado teve ciência inequívoca de estar acometido de moléstia incapacitante. Não basta que saiba estar doente, mas que tenha presente sofrer de mal capaz de causar sua invalidez total ou parcial, permanentemente. Nesse sentido: Seguro. Acidente no trabalho. Prescrição. Termo a quo. O prazo prescricional somente começa a fluir depois que o segurado tem ciência inequívoca da sua incapacidade, extensão e causa vinculada ao emprego. Resultado de exame que não esclarece suficientemente sobre a incapacidade, grau, natureza e origem. (...) (REsp n. 228.772-SP, DJ: 14.02.2000, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar). RSSTJ, a. 5, (21): 181-204, agosto 2011 203 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Por outro lado, a ciência inequívoca da doença é determinada através da apreciação dos elementos fáticos e probatórios contidos nos autos. Em regra, apenas toma conhecimento do estado de incapacidade, o segurado, quando isto é atestado através de laudo pericial. Porém, nada impede que existam provas suficientes de que mesmo antes de realizada a perícia o doente sabia perfeitamente estar acometido de moléstia que o invalidaria em caráter permanente. No caso em tela, todavia, conforme demonstra o trecho do acórdão recorrido transcrito, concluiu-se pela ciência inequívoca do segurado, apenas porque este, aposentando-se, mudou-se para local tranqüilo, a fim de que melhorasse da surdez e de outros distúrbios que sentia. Tais fatos, como se nota, não são suficientes para demonstrar ter o segurado conhecimento de sofrer de doença incapacitante, prevista como coberta na apólice securitária, mas antes denotam que o ora recorrente acreditava que iria curar-se pela simples mudança de ambiente, sem ter, então, noção da extensão do mal e de suas conseqüências. Com efeito, inexistindo elementos suficientes nos autos para se precisar quando teria havido a mencionada ciência inequívoca da doença pelo segurado, deve-se considerar que a certeza só ocorrerá quando do laudo pericial. Veja-se, nesse passo, o seguinte precedente: (...) III - Na linha do entendimento adotado pela Corte, o termo inicial do prazo prescricional, em casos de acidente de trabalho, é a data em que teve o segurado ciência inequívoca de sua enfermidade, não havendo, para esse fim, documento determinado ou data específica, sendo certo que isso pode ocorrer com o laudo pericial (regra geral) ou em outro momento. IV - No caso, diante de suas circunstâncias, e considerando que a ré negou valor aos documentos apresentados pelo autor, requerendo, inclusive, a produção de prova pericial para aferir a incapacidade laborativa, o prazo prescricional só terá início com a realização da perícia médica em juízo. (REsp n. 182.944-SP; DJ: 07.08.2000; Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira). Forte em tais razões, conheço do recurso calcado na alínea a, do permissivo constitucional, e, nessa parte, dou-lhe provimento para afastar a preliminar de prescrição e determinar que se dê prosseguimento ao exame das demais questões relativas à causa. É o voto. 204 Súmula n. 279 SÚMULA N. 279 É cabível execução por título extrajudicial contra a Fazenda Pública. Precedentes: AgRg no REsp 199.343-SP (3ª T, 11.09.2001 – DJ 08.10.2001) AgRg no REsp 255.161-SP (2ª T, 15.08.2000 – DJ 11.09.2000) REsp 42.774-SP (3ª T, 09.08.1994 – DJ 19.09.1994) REsp 79.222-RS (3ª T, 25.11.1996 – DJ 03.03.1997) REsp 98.104-PR (6ª T, 15.10.1996 – DJ 16.12.1996) REsp 171.228-SP (1ª T, 25.05.1999 – DJ 1º.07.1999) REsp 181.353-SP (1ª T, 20.05.1999 – DJ 21.06.1999) REsp 188.864-RS (2ª T, 02.08.2001 – DJ 24.09.2001) REsp 193.876-SP (6ª T, 04.03.1999 – DJ 12.04.1999) REsp 193.896-RJ (1ª T, 23.03.2000 – DJ 12.06.2000) REsp 203.962-AC (1ª T, 06.05.1999 – DJ 21.06.1999) REsp 212.689-SP (5ª T, 21.03.2000 – DJ 17.04.2000) Corte Especial, em 21.05.2003 DJ 16.06.2003, p. 415 AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL N. 199.343-SP (98.0097677-9) Relator: Ministro Castro Filho Agravante: Fazenda do Estado de São Paulo Procurador: Geraldo Horikawa e outros Agravado: Maurício José Capovilla Advogado: Luciana Civolani Dotta EMENTA Execução. Título extrajudicial. Honorários de perito em processo crime. Fazenda Pública. Em sendo o Ministério Público órgão integrante do Estado, sua atuação vincula o erário, sujeitando a Fazenda Pública à execução por título extrajudicial, representado por certidão relativa aos honorários de perito arbitrados em processo crime promovido pelo Parquet Estadual. Agravo a que se nega provimento. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental. Os Srs. Ministros Antônio de Pádua Ribeiro, Carlos Alberto Menezes Direito e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Ari Pargendler. Brasília (DF), 11 de setembro de 2001 (data do julgamento). Ministro Ari Pargendler, Presidente Ministro Castro Filho, Relator DJ 08.10.2001 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RELATÓRIO O Sr. Ministro Castro Filho: A Fazenda do Estado de São Paulo opôs embargos à execução que lhe move Maurício José Capovilla, tendo por objeto título extrajudicial, representado por certidão de arbitramento de honorários periciais, expedida nos autos de processo crime, promovido pelo Ministério Público Estadual. O pedido foi julgado procedente, tendo consignado o juiz sentenciante que a via executiva não é meio próprio para a cobrança de honorários periciais em relação à Fazenda Pública, que nem sequer foi parte no processo judicial. Em sede recursal, o egrégio Segundo Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, por maioria de votos, proveu a apelação, ao entendimento de que os honorários de perito aprovados por decisão judicial são título executivo judicial. Apresentou, então, a Fazenda Pública embargos infringentes, objetivando fazer prevalecer o voto minoritário, que entendeu ser o autor do processo executivo carecedor do direito à ação. Os embargos infringentes foram rejeitados, em acórdão assim ementado: Execução por título extrajudicial. Fazenda Pública. Salários periciais arbitrados em processo-crime. Constitui título hábil à via executiva (art. 730, CPC) a certidão de arbitramento de salários de perito que, nomeado pelo Juiz, atuou em processo crime promovido pelo Ministério Público, extinto sem obtenção de condenação. Embargos infringentes rejeitados. Manifestou a Fazenda Estadual recurso especial, com fundamento no art. 105, III, alínea a, da Constituição Federal, alegando ofensa aos artigos 583, 585, V, 618, I, e 730, do Código de Processo Civil, o qual foi improvido por decisão do eminente Ministro Waldemar Zveiter (fls. 127-128), à consideração de que o aresto recorrido encontra-se em consonância com a jurisprudência desta Corte sobre a matéria, no sentido da possibilidade da execução contra a Fazenda Pública se fundar em título executivo extrajudicial. Em abono à sua tese, citou vários precedentes jurisprudenciais. Enfatizou, ainda, em sua decisão que, “sendo o Ministério Público órgão do Estado, sua atuação vincula o erário e por isso se sujeita a Fazenda Pública não só à obrigação de remunerar o Auxiliar do Juízo como o valor que àquele fora judicialmente arbitrado.” 210 SÚMULAS - PRECEDENTES Seguiu-se a interposição do presente agravo, sustentando a recorrente que, na espécie, em que pesem os respeitáveis precedentes citados e o entendimento esposado, a Fazenda Pública Estadual está sendo responsabilizada a pagar, em sede de execução fundada em título extrajudicial, quantia fixada em ação da qual não foi parte. Ademais, mesmo considerando que a atuação do Ministério Público vincula o erário, a Fazenda Estadual há de ter o direito constitucional do contraditório. Por tal motivo, inquestionável que a via própria é o processo de conhecimento, a fim de ser franqueada a sua defesa. É o breve relatório. VOTO O Sr. Ministro Castro Filho (Relator): Presentes os requisitos que lhe são próprios, conheço do recurso. Sustenta a Fazenda Pública que o título extrajudicial levado à execução não lhe é oponível, pois não tendo ela participado do processo, não poderia se vincular aos salários periciais arbitrados pelo Juízo. Ademais, as execuções contra a Fazenda devem fundar-se, exclusivamente, em títulos judiciais. Em sede doutrinária, a questão vertente ainda suscita discussão. Para Vicente Greco Filho, se os textos legal e constitucional falam somente na execução de sentença, não poderia o legislador ampliar a previsão e chegar à execução por título extrajudicial contra as pessoas jurídicas de direito público, devendo cingir-se a execução à hipótese de título judicial. No seu entender, é indispensável que o detentor de um título extrajudicial ingresse com uma ação de conhecimento para obter uma sentença que corresponda a um título judicial, e somente depois poder ajuizar a execução. Outros autores, entretanto, asseveram que o procedimento previsto nos artigos 730 e 731 do Código de Processo Civil é aplicável não só em relação aos títulos judiciais - como deflui de uma literal interpretação do atual artigo 100 da Constituição Federal -, como também aos títulos extrajudiciais, figurando entre eles Pontes de Miranda, Araken de Assis, Humberto Theodoro Júnior e Cândido Rangel Dinamarco. Alinhando-se a essa segunda corrente, a jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de poder a execução contra a Fazenda Pública fundar-se, RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 211 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA também, em título extrajudicial. Confiram-se, a propósito, os seguintes julgados: AgREsp n. 255.161-SP, DJ 11.09.2000 (Relª. Minª. Nancy Andrighi), REsp n. 193.896-RJ, DJ 12.06.2000 (Rel. Min. Milton Luiz Pereira), REsp n. 203.962, DJ 21.06.1999 (Rel. Min. Garcia Vieira), REsp n. 79.222-RS, DJ 03.03.1997 (Rel. Min. Nilson Naves) e REsp n. 42.774-SP, DJ 19.09.1994 (Rel. Min. Costa Leite). É de se ter presente que o art. 585, V, do aludido Diploma Processual Civil elencou entre os títulos executivos extrajudiciais o crédito de perito. Por outro lado, não vinga o argumento da recorrente no sentido de que, não tendo participado do processo, o título não lhe seria oponível. Também por esse aspecto, há de ser prestigiada a decisão recorrida, pois que, no sistema Processual Civil pátrio, a locução Fazenda Pública deve ser entendida de forma mais ampla, como sendo o Estado, assim compreendidos a União, os Estados, os Municípios, o Distrito Federal e os Territórios, bem como suas autarquias e fundações. Logo, apropriada a utilização do termo em qualquer causa em que o Poder Público tenha interesse. Nesse sentido, a lição do saudoso Hely Lopes Meirelles: A Administração Pública, quando ingressa em juízo por qualquer de suas entidades estatais, por suas autarquias, por suas fundações públicas ou por seus órgãos que tenham capacidade processual, recebe a designação tradicional de Fazenda Pública, porque seu erário é que suporta os encargos patrimoniais da demanda. (Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros Editores, 21ª ed., p. 623624). Daí porque, na hipótese dos autos, sendo o Ministério Público órgão integrante do Estado, sua atuação vincula o erário, sujeitando a Fazenda Pública à execução por título extrajudicial, representado por certidão relativa aos honorários de perito, arbitrados em processo crime promovido pelo Parquet Estadual. Nesse particular, preciso o voto condutor do aresto recorrido, proferido pelo culto Juiz Arantes Theodoro que, ao dirimir a controvérsia, assentou: Em se cuidando de ação penal promovida pelo Ministério Público, e sendo ele vencido, naturalmente não haverá recolhimento do que for devido ao Estado porque “sendo a ação pública, vencido é o Ministério Público. Órgão do Estado que é, não está sujeito ao pagamento de custas” (Magalhães Noronha, Curso de Direito Processual Penal, Saraiva, 13ª Ed., p. 497). 212 SÚMULAS - PRECEDENTES Ocorre que a remuneração do perito que tenha atuado no feito criminal não está abrangida por aquela evidente inexigibilidade, eis que se trata, agora, de paga por serviço prestado pelo particular no interesse do Estado. Por essa verba responde o erário público. Assim como o Ministério Público atuou no feito em nome do Estado, como órgão que dele é, ao ser vencido naquela propositura cabe ao próprio Estado, agora como Fazenda Pública, suportar a cobrança do crédito. Daí ser irrelevante o argumento de não ter a Fazenda acompanhado o processo ou ter participado do arbitramento dos salários periciais, já que razão alguma há para que se estabeleça dicotomia entre aqueles entes, um com atribuição para a promoção da ação penal e oferecimento de recursos em geral, inclusive contra decisão que arbitra honorários de perito e perante quem foram os referidos salários de fato arbitrados; outro com legitimidade para arcar com os custos do processo relativamente aos Auxiliares da Justiça na hipótese de não acolhimento do pedido condenatório formulado no processo-crime, como na espécie se deu. Sendo o Ministério Público órgão do Estado, sua atuação vincula o erário o por isso se sujeita a Fazenda Pública não só à obrigação de remunerar o Auxiliar do Juízo como ao valor que àquele fora judicialmente arbitrado. A propósito, a egrégia Primeira Turma deste Superior Tribunal já enfrentou questão assemelhada, envolvendo a Fazenda Estadual Paulista. Naquela ocasião, o Ministro Humberto Gomes de Barros, relator do acórdão, teceu as seguintes considerações: Sabemos todos que a atuação do Estado divide-se em três funções: legislativa, administrativa e jurisdicional. Em regra, o exercício de tais funções é reservado a cada um dos três poderes. A reserva de competência, entretanto, não é absoluta. Há várias situações em que um dos poderes pratica funções que, normalmente não lhe são próprias. Assim, o Poder Judiciário constantemente pratica atos de natureza administrativa. De sua parte, o perito, atua no processo, como auxiliar do juiz. Vale dizer, como um particular em colaboração com o Estado. Para remunerar tal colaboração, arbitra-se um valor que lhe deve ser pago pela entidade que o nomeou. Quando o faz, o magistrado atua como órgão do Estado. Ele não impõe condenação; simplesmente exerce a competência que o Ordenamento Jurídico lhe confere, para se vincular a uma obrigação. Isto significa: o Estado, por um de seus órgãos, assumiu a obrigação de remunerar quem lhe prestou serviço. Ora, a função jurisdicional tem como característica, o condão de resolver pendências, substituindo a vontade de um dos contendores pela do outro. Aqui, não houve contenda entre o perito e o Estado. Este, espontaneamente, prometeu remunerar aquele. A promessa resultou, assim, de ato administrativo. RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 213 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Não há, portanto, como aludir a contraditório ou devido processo legal: o Estado concedeu ao perito, um crédito, cujo título é de natureza administrativa. Estabelecida a natureza administrativa do título, pergunta-se: é possível execução contra o Estado, instrumentada em título extrajudicial? A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça responde no sentido afirmativo. (REsp n. 181.353-SP, DJ 21.06.1999). Por todo o exposto, e na esteira dos precedentes jurisprudenciais colacionados, nego provimento ao agravo. É o voto. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL N. 255.161-SP (2000.0036615-3) Relator: Ministra Nancy Andrighi Agravante: Fazenda do Estado de São Paulo Procurador: Regina Maria Rodrigues da Silva e outros Agravado: Construtora Fundasa S/A Advogado: Manoel Ferraz Whithaker Salles e outros EMENTA Agravo no recurso especial. Processual Civil. Execução contra a Fazenda Pública. Título extrajudicial. Possibilidade. Admite-se, pelo sistema processual vigente, a execução contra a Fazenda Pública fundada em título executivo extrajudicial. Agravo a que se nega provimento. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao 214 SÚMULAS - PRECEDENTES agravo regimental, nos termos do voto da Sra. Ministra-Relatora. Votaram com a Sra. Ministra-Relatora os Srs. Ministros Eliana Calmon, Paulo Gallotti e Franciulli Netto. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Francisco Peçanha Martins. Brasília (DF), 15 de agosto de 2000 (data do julgamento). Ministra Eliana Calmon, Presidente Ministra Nancy Andrighi, Relatora DJ 11.09.2000 EXPOSIÇÃO A Sra. Ministra Nancy Andrighi: - Cuida·se de agravo interposto pela Fazenda do Estado de São Paulo contra decisão que, com fundamento no art. 557, do CPC, negou seguimento ao Recurso Especial manifestado contra acórdão que entendeu ser possível a execução contra a Fazenda Pública fundada em título executivo extrajudicial. A decisão agravada está assim ementada: Processo Civil. Execução contra a Fazenda Pública. Título extrajudicial. Possibilidade. A jurisprudência desta Colenda Corte está assentada no sentido de ser admitido, pelo sistema processual vigente, execução contra a Fazenda Pública, fundada em título extrajudicial. Recurso a que se negou seguimento, com arrimo no art. 557, caput, do CPC, por estar em confronto com a jurisprudência dominante deste eg. Tribunal. Sustenta a agravante que inexiste jurisprudência dominante nesta Corte acerca da matéria debatida, pelo que entender imprescindível o exame do Recurso Especial pela eg. Segunda Turma deste Tribunal. É a exposição. VOTO A Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relatora): - A decisão agravada está em harmonia com precedentes deste Colendo Tribunal, manifestados no sentido de RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 215 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ser admitida, pelo nosso sistema processual vigente, a execução contra a Fazenda Pública assentada em título executivo extrajudicial. Colacionam-se os julgados assim ementados: Processual. Execução contra a Fazenda Pública. Honorários de perito. Processo de assistência judiciária. Título extrajudicial. Possibilidade. I - (omissis) II - Nosso ordenamento jurídico admite execução contra a Fazenda Pública, aparelhada em título extrajudicial, observando-se o rito descrito pelo art. 730 do Código de Processo Civil. (REsp n. 181.353-SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ 21.06.1999). Execução. Fazenda Pública. Título extrajudicial. Toda e qualquer execução contra a Fazenda Pública, com base em título judicial ou extrajudicial, se faz com apoio no artigo 730 do CPC. Quando ela se basear em título extrajudicial, os embargos equivalerão a contestação. Recurso improvido. (REsp n. 152.149-PE, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ 27.04.1998). Forte em tais razões, nego provimento ao agravo. É o voto. RECURSO ESPECIAL N. 42.774-SP (94.001175-0) Relator: Ministro Costa Leite Recorrente: Município de São Paulo Recorrida: Carrocerias Buoro Ltda. Advogados: Deborah R. L. Ferreira da Costa Luiz Carlos Borges da Silveira e outro EMENTA Execução. Fazenda Pública. Título extrajudicial. A execução por quantia certa contra a Fazenda Pública pode fundar-se em título executivo extrajudicial. Recurso conhecido, pelo dissídio, mas não provido. 216 SÚMULAS - PRECEDENTES ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, em conformidade com os votos e notas taquigráficas a seguir, após o voto vista do Sr. Ministro Waldemar Zveiter, por unanimidade, conhecer do recurso especial, mas negar-lhe provimento. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Nilson Naves, Eduardo Ribeiro, Waldemar Zveiter e Cláudio Santos. Brasília (DF), 09 de agosto de 1994 (data do julgamento). Ministro Eduardo Ribeiro, Presidente Ministro Costa Leite, Relator DJ 19.09.1994 RELATÓRIO O Sr. Ministro Costa Leite: O Município de São Paulo manifestou recurso especial, com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra acórdão da Segunda Câmara do Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, alegando que negou vigência ao art. 730, do Código de Processo Civil e dissentiu dos julgados que arrola, ao admitir execução fundada em título extrajudicial contra a Fazenda Pública. Negativo o juízo de admissibilidade, dei provimento ao agravo e determinei fosse autuado como recurso especial, na forma do disposto no art. 28, § 3º, da Lei n. 8.038/1990. É o relatório, Senhor Presidente. VOTO O Sr. Ministro Costa Leite (Relator): - A questão trazida a lume é controvertida, mas, em verdade, não há razão lógica ou jurídica para que se arrede a possibilidade de a execução por quantia certa contra a Fazenda Pública fundar-se em título executivo extrajudicial. A necessidade de observância da disciplina do art. 730, do CPC, não induz o raciocínio de que a execução pressupõe título judicial. RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 217 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Como observa Celso Neves, “eliminada a ação executiva e unificada a via executória, já agora hábil tanto para os casos de sentença condenatória quanto para os de títulos extrajudiciais dotados de executividade, a disciplina do art. 730 atende às particularidades de um processo executório em que não pode haver a penhora de bens sobre os quais verse a atividade juris-satisfativa que lhe é própria” (“Comentários ao Código de Processo Civil”, Vol. VII, Forense, p. 166). Só uma interpretação estreita da norma constitucional conduziria ao absurdo de obrigar o credor ao processo de conhecimento por que o sujeito passivo na relação creditícia de direito material é a Administração, como enfatiza Araken de Assis, em escólio transcrito no voto condutor do aresto recorrido. Ressalte-se que o extinto Tribunal Federal de Recursos já se posicionara sobre o tema, nestes termos do acórdão proferido pela Quinta Turma na Apelação Cível n. 164.425-SP: Tem validade a execução contra a Fazenda Pública fundada tão-somente em título executivo extrajudicial, porquanto inexiste o excepcionamento pretendido para a r. decisão a quo. Conhecendo do recurso, pela letra c, nego-lhe provimento. É como voto, Senhor Presidente. VOTO-VISTA O Sr. Ministro Waldemar Zveiter: Senhor Presidente, a hipótese versa a aplicação do artigo 730 do Código de Processo Civil. A matéria, embora controvertida na jurisprudência, como diz o Eminente Ministro-Relator, não oferece neste caso dificuldade alguma. Faço apenas uma ressalva: fiquei vencido em caso anterior, acompanhando o parecer exarado pela douta Subprocuradoria-Geral da República. Cuidava-se de execução por título extrajudicial contra prefeitura do interior num Estado do Nordeste, em face da peculiaridade apresentada. O Doutor Juiz intimara o exequente para explicar a origem da dívida assumida pelo Prefeito que já deixara o cargo. Limitou-se o Autor a dizer que o título originara-se em fornecimento de material não especificado ou sobre comissões devidas. Ante tal circunstância, sem dúvida estranha, como Relator, entendi não aplicar, de logo, os princípios insertos no artigo 730 do Código de Processo Civil, para que pudesse a Prefeitura melhor defender-se na ação ordinária. Na hipótese em julgamento, embora, controvertido o entendimento, tenho que plenamente possível a execução por título extrajudicial contra o Município. 218 SÚMULAS - PRECEDENTES Assim, como Sua Excelência, o Senhor Ministro Relator, conheço do recurso pela letra c, mas nego-lhe provimento. RECURSO ESPECIAL N. 79.222-RS (95.581744) Relator: Ministro Nilson Naves Recorrente: Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem do Estado do Rio Grande do Sul - DAER-RS Recorrido: Cocipar Comércio de Peças para Tratores Ltda. Advogados: Maria Alice Costa Hofmeister e outros Josino Figueira da Silva EMENTA Execução por quantia certa contra a Fazenda Pública. Pode fundar-se em título executivo extrajudicial. Precedente da 3ª Turma do STJ: REsp n. 42.774. Recurso conhecido pelo dissídio, porém não provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso especial, mas lhe negar provimento. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Menezes Direito e Costa Leite. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Eduardo Ribeiro. Brasília (DF), 25 de novembro de 1996 (data do julgamento). Ministro Costa Leite, Presidente Ministro Nilson Naves, Relator DJ 03.03.1997 RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 219 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RELATÓRIO O Sr. Ministro Nilson Naves: - A sentença rejeitou os embargos, apensados à execução com base em título executivo extrajudicial. À apelação o acórdão negou provimento. Inconformado, o Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem do Estado do Rio Grande do Sul - DAER entrou com recurso especial, fundado em divergência jurisprudencial, visto que Tal entendimento discrepa do adotado pelo 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, no julgamento da Apelação n. 365.405 8ª Câmara - j. em 24.02.1987, Relator Juiz Raphael Salvador, publicado no periódico Revista dos Tribunais, vol. 619, p. 120-121, configurando-se dissídio jurisprudencial, como se verá a seguir: Execução. Título extrajudicial. Propositura contra a Fazenda Pública. Impossibilidade jurídica. Afronta ao art. 117 da CF. Necessidade da ação de conhecimento, com obtenção do título judicial, para posterior execução. A execução contra a Fazenda Pública somente pode fundar-se em título judicial. O detentor do título extrajudicial deve propor ação de conhecimento para obtenção do título judicial e posterior execução. A interpretação dada ao artigo 730 do CPC pelo aresto recorrido (à unanimidade) acha-se em frontal desacordo à sustentada pelo 1º Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, no acórdão antes mencionado. Assim, o aresto recorrido não acolheu a tese argumentada em apelação, a da inviabilidade da execução especial, prevista no artigo 730 do CPC, se não é judicial o título exeqüendo. O recorrente pleiteia a reforma da decisão recorrida, postulando a aplicação do critério esposado pela decisão paradigma, ou seja, impossibilidade jurídica da execução embasada em título extrajudicial, devendo o detentor do título extrajudicial propor ação de conhecimento para obtenção do título judicial e posterior execução. Isto posto, pede e espera o Departamento Autônomo de Estradas de Rodagem - DAER - que este Egrégio Tribunal conheça o presente Recurso Especial e lhe dê provimento integral para reformar o acórdão da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Alçada a este Estado. Foi o recurso assim admitido: O recorrente sustenta que a decisão, ao considerar apropriada a execução especial do 730 do Código de Processo Civil, tanto para títulos judiciais quanto para títulos extrajudiciais, divergiu de entendimento adotado pelo Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, que restringe, a mesma, a títulos judiciais. 220 SÚMULAS - PRECEDENTES Verifica-se que está comprovado o dissídio, motivo pelo qual é admitido o recurso. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Nilson Naves (Relator): - Existe o dissídio, conheço portanto do recurso. Veja-se a nota de n. 06 ao art. 730 do Cód. de Pr. Civil (in Theotonio Negrão, “Código de Processo Civil e Legislação Processual em vigor”, 26ª edição, p. 528): Na execução contra a Fazenda Pública aplicam-se as disposições do art. 730 do CPC e não a Lei n. 6.830/1980, que trata de cobrança judicial da dívida ativa (STJ - 2ª Turma, REsp n. 28.883-0-SP, rel. Min. Hélio Mosimann, j. 18.11.1992, deram provimento, v.u., DJU 1º.02.1993, p. 459, 2ª col., em.). A execução contra a Fazenda Pública obedece ao procedimento previsto no art. 730 do CPC, quer se funde em título judicial, quer em título extrajudicial (TFR 2ª Seção, REO n. 104.540-MG-EI, Rel. Min. Torreão Braz, j. 28.03.1989, receberam os embs., vencidos o Min. Carlos Velloso, que os recebeu em parte, e o Min. Antônio de Pádua Ribeiro, que os rejeitou, DJU 04.09.1989, p. 14.026, 1ª col., em.). Que a execução pode fundar-se nesse título, também é da jurisprudência desta 3ª Turma, conforme o REsp n. 42.774, assim ementado: “Execução. Fazenda Pública. Título extrajudicial. A execução por quantia certa contra a Fazenda Pública pode fundar-se em título executivo extrajudicial. Recurso conhecido, pelo dissídio, mas não provido” (Sr. Ministro Costa Leite, DJ de 19.09.1994). Conhecendo do recurso, nego-lhe porém provimento. RECURSO ESPECIAL N. 98.104-PR (96.0036965-8) Relator: Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro Recorrente: Estado do Paraná Recorridos: Cláudio Domanski e outros RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 221 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Advogados: Márcia Dieguez Leuzinger e outros Osmar Nodari e outros EMENTA REsp. Processual Civil. Fazenda Pública. Execução. Título extrajudicial. A execução contra a Fazenda Pública obedece o procedimento do art. 730, CPC e seguintes. A exigência do art. 100, da Constituição da República, impondo, para expedir o precatório, sentença judiciária, não interfere na conclusão. O Estado pode efetuar pagamento, independemente de precatório: vencimentos de servidores, obrigações decorrentes de contrato para realização de obras públicas. Também o pagamento de alugueres, impõe-se distinguir: o precatório deve ser precedido de “sentença judiciária”. Esta é pressuposto. Não exclui, entretanto, a execução por título executório extra judicial. Dever-se-á entender teleologicamente os dispositivos legais. Conferese, pois, equilíbrio aos interesses do particular e do Estado. Extremo formalismo reclamar processo de conhecimento para conferir o título executório extrajudicial. Entenda-se, para efeito do art. 100, da Carta Política - sentença judiciária - como - verificação judicial do débito reclamado. Acontece, no processo executório, haja, ou não embargos do devedor. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, não conhecer do recurso pela alínea a, quanto à alínea c, conhecer do recurso para negar-lhe provimento. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Vicente Leal, Fernando Gonçalves e Anselmo Santiago. Ausente, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Patterson. Brasília (DF), 15 de outubro de 1996 (data do julgamento). Ministro Anselmo Santiago, Presidente Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, Relator DJ 16.12.1996 222 SÚMULAS - PRECEDENTES RELATÓRIO O Sr. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro: Recurso Especial interposto pelo Estado do Paraná, com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra v. acórdão da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Alçada do Estado do Paraná, assim ementado: Apelação cível e reexame necessário. Execução contra Fazenda Pública fundada em título executivo extrajudicial. Possibilidade. A moderna tendência doutrinária e jurisprudencial admite a possibilidade de execução contra a Fazenda Pública, obedecendo o procedimento previsto no art. 730 do CPC, quer se funde em título judicial ou extrajudicial. Apelação conhecida e desprovida (fl. 76). O recorrente argúi contrariedade ao art. 730 do CPC sustentando a impossibilidade de execução contra a Fazenda Pública apoiada em título extrajudicial. Aduz, ainda, dissídio jurisprudencial. Contra-razões às fls. 106-109. Despacho de admissão às fls. 136-138. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro (Relator): O debate é restrito à extensão normativa da execução contra a Fazenda Pública. Especificamente, se necessário título judicial. No caso dos autos, o Autor, ora Recorrido, em juízo, postulou o pagamento de alugueres. A ementa do v. acórdão, Relator o E. Desembargador Noeval de Quadros, encerra: Apelação cível e reexame necessário. Execução contra Fazenda Pública fundada em título executivo extrajuducial. Possibilidade. A moderna tendência doutrinária e jurisprudencial admite a possibilidade de execução contra a Fazenda Pública, obedecendo o procedimento previsto no art. 730 do CPC, quer se funde em título judicial ou extrajudicial. Apelação conhecida e desprovida (fls. 76). RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 223 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Daí o inconformismo do Recorrente. Invoca, por seu turno, o comando do art. 100, da Constituição da República, que menciona “sentença judiciária”, para ser expedido o precatório. Penso, data venia, mais uma vez, vale a advertência, de a interpretação jurídica não se esgotar na letra da lei. Não procede afirmar que, qualquer pagamento da Fazenda se faça por precatório. Ao contrário, nada impede o Estado honrar suas obrigações, independentemente daquele procedimento. Ilustrativamente: pagamento de servidores, de obrigações decorrentes de obras públicas. E porque não também, de alugueres. Impõe-se a seguinte distinção: o precatório deverá ser precedido de “sentença judiciária”. Entenda-se o pressuposto. Nada exclui a execução por título executório extra judicial. Este é idôneo para detonar o processo de execução. Inidôneo, entretanto, para, por si só, justificar o precatório. No caso do processo de que trata o art. 730 do Código de Processo Civil, ainda que não haja sentença, quando não interpostos os Embargos, haverá manifestação judicial, o que basta para a fiscalização pensada pelo preceito do art. 100 da Carta Política. Dever-se-á, portanto, entender esse dispositivo atento à sua teleologia. Com isso, conferir-se-á atenção aos interesses do Estado e do particular. Insistase, a Constituição não está se preocupando com o título em si, mas com a segurança da decisão judicial. Extremo formalismo, em título executório extra-judicial, precisos, para ganhar eficácia, esgotar o penoso processo de conhecimento. Não conheço do Recurso Especial quanto à alínea a; conheço, relativamente à al¯nea c, todavia, para negar provimento. VOTO O Sr. Ministro Vicente Leal: Sr. Presidente, este tema foi debatido no âmbito do Tribunal Regional Federal, e a Terceira Turma proclamou o entendimento de que é admissível a execução, nos termos do art. 730, do título executivo extrajudicial contra a Fazenda Pública, que pugnava para que o título extrajudicial se submetesse a um processo de conhecimento e, só depois de uma sentença é que se pudesse executar. A Terceira Turma consagrou o entendimento que foi proclamado no acórdão e no voto de S. Exª. Acompanho o Sr. Ministro-Relator. 224 SÚMULAS - PRECEDENTES RECURSO ESPECIAL N. 171.228-SP (98.0025949-0) Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros Recorrente: Município de São Bernardo do Campo Advogado: Dermeval Lopes da Silva Recorrido: Fazenda do Estado de São Paulo Advogados: Márcia Ferreira Couto e outros EMENTA Processual. Execução. Título extrajudicial. Fazenda Pública. Possibilidade. I - É possível a execução contra a Fazenda Pública com base em título extrajudicial. II - Precedentes do STJ. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Votaram com o Sr. Ministro Relator os Srs. Ministros José Delgado, Garcia Vieira e Demócrito Reinaldo. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Milton Luiz Pereira. Brasília (DF), 25 de maio de 1999 (data do julgamento). Ministro José Delgado, Presidente Ministro Humberto Gomes de Barros, Relator DJ 1º.07.1999 RELATÓRIO O Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros: - Cuida-se de execução fiscal movida pelo Município de São Bernardo do Campo contra o Estado de São Paulo para a cobrança de tarifas de consumo de água. RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 225 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA O v. acórdão do Eg. Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo restou assim ementado: Execução fiscal. Crédito tributário. Ação promovida contra a Fazenda do Estado. Impossibilidade de qualquer tipo de execução, que não seja por sentença judicial, contra a Fazenda Pública. Falta de interesse de agir e impossibilidade jurídica do pedido reconhecidos. Recursos improvidos (fl. 45). Agasalhado nas alíneas a e c, do permissivo constitucional, o Município recorrente aponta ofensa aos artigos 244, 249, § 1º e 730 do CPC, bem como divergência jurisprudencial. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros (Relator): Discute-se a possibilidade de executar título extrajudicial contra a Fazenda Pública. O v. acórdão extinguiu o processo, sem julgar o mérito, firmado na impossibilidade jurídica do pedido, porque não se tratava de sentença judicial. No entanto, em orientação diametralmente oposta, o Superior Tribunal de Justiça se manifesta no sentido de que é perfeitamente possível a execução contra a Fazenda, fundada em título executivo extrajudicial. Entre outros julgamentos, podemos encontrar, verbis: Agravo regimental. Execução contra a Fazenda Pública. O legislador não afastou a execução com base em título extrajudicial. O STJ, no Recurso Especial n. 42.774-6-SP - RSTJ 63/435, entendeu que: A execução por quantia certa contra a Fazenda Pública pode fundar-se em título executivo extrajudicial. Agravo improvido (AGA n. 180.621-SP, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ de 10.08.1998). Processual Civil. Execução fiscal. INSS versus Estado da Bahia. Título executivo extrajudicial. Inteligência do art. 730 do CPC. 1. É juridicamente possível a execução contra a Fazenda, fundada em título executivo extrajudicial (certidão de dívida ativa), observadas em seu processamento as disposições aplicáveis a espécie (art. 730 e seguintes do CPC). 2. Na sistemática do CPC de 1973, a ação executiva a que alude o art. 730 do CPC, passou a ser embasada em título executivo judicial ou extrajudicial dotado de executoriedade. 226 SÚMULAS - PRECEDENTES 3. Recurso improvido à unanimidade (REsp n. 100.700-BA, Rel. Min. Demócrito Reinaldo, DJ de 31.03.1997). Processual Civil. Execução por título extrajudicial contra Fazenda Pública. Cabimento. Correção monetária. IPC/Março/1990. - A execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, prevista no art. 730, do CPC, pode ser fundada em título executivo extrajudicial. Precedentes. - Em sede de liquidação de sentença, o cálculo da correção monetária deve ser efetuado de modo a refletir a efetiva desvalorização da moeda, provocada pelo fenômeno da inflação, sendo descabido o uso de índices que contenham expurgos ditados pela política governamental. - A correção monetária calculada com base no índice de variação dos títulos da dívida pública (OTN e BTN) implica redução do valor real da dívida, pois no preço de tais títulos não se computou, plenamente, a desvalorização da moeda. - Recurso especial não conhecido (REsp n. 76.627-SP, Rel. Min. Vicente Leal, DJ de 05.05.1997). Assim, apoiado no entendimento desta Corte, dou provimento ao recurso. RECURSO ESPECIAL N. 181.353-SP (98.0049942-3) Relator: Ministro Humberto Gomes de Barros Recorrentes: Fazenda do Estado de São Paulo Advogados: Geraldo Horikawa e outros Recorrido: Luiz Fernando de Mello Advogado: Cinara Bortolin Mazzei EMENTA Processual. Execução contra a Fazenda Pública. Honorários de perito. Processo de assistência judiciária. Título extrajudicial. Possibilidade. I - O ato do juiz que fixa honorários de perito em processo de assistência judiciária é de natureza administrativa, gerando título extrajudicial. RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 227 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA II - Nosso ordenamento jurídico admite execução contra a Fazenda Pública, aparelhada em título extrajudicial, observando-se o rito descrito pelo art. 730 do Código de Processo Civil. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao recurso. Votaram com o Sr. Ministro Relator os Srs. Ministros Milton Luiz Pereira, José Delgado, Garcia Vieira e Demócrito Reinaldo. Brasília (DF), 20 de maio de 1999 (data do julgamento). Ministro Milton Luiz Pereira, Presidente Ministro Humberto Gomes de Barros, Relator DJ 21.06.1999 RELATÓRIO O Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros: O Recorrido funcionou como perito em processo que se desenvolveu sob o patrocínio da assistência judiciária. Por essa atuação, o juiz conferiu-lhe honorários a serem pagos pelo Estado. Munido de certidão relativa à outorga dos honorários, o recorrido promoveu execução, que foi embargada pelo Estado. O v. acórdão recorrido declarou improcedentes os embargos, determinando o prosseguimento da execução, expedindo-se precatório. Para chegar a tal dispositivo, o E. Tribunal a quo desenvolveu raciocínio que resumo, assim: a) o art. 585, V, do Código de Processo Civil está umbilicalmente ligado à primeira parte do art. 19. Por isso, o ato do juiz, fixando o valor dos honorários periciais tem caráter administrativo, gerando título extrajudicial; b) em sendo título administrativo, sua eficácia não se restringe às partes; c) em verdade o preceito do art. 585, V, tem como escopo a concessão de crédito ao auxiliar do Juízo, por sua colaboração com o Estado - crédito revestido de liquidez e certeza; 228 SÚMULAS - PRECEDENTES d) não procede o argumento de que a existência de título executivo pressupõe controvérsia entre devedor e credor: é possível a formação unilateral de título executivo, como é o caso da certidão de dívida ativa (art. 585, VI); e) a jurisprudência tem reconhecido ser do Estado a responsabilidade pela remuneração do perito, nos casos de assistência judicial; f ) a garantia do contraditório é assegurada pela faculdade de o Estado poder embargar a execução (art. 730 do CPC); g) o art. 54 da Lei n. 9.099/1995, ao dizer que o acesso ao Juizado Especial independerá do pagamento de custas, indica o encargo do Estado pelas despesas processuais, especialmente aquelas relativas a trabalhos prestados por terceiros; h) a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reconhece a possibilidade de execução contra a Fazenda Pública, fundada em título extrajudicial; i) a previsão constitucional de os pagamentos relativos a sentenças judiciais serem feitos mediante precatório não exclui aquelas dívidas geradas nos embargos do art. 730; j) o Estado não contraditou o fato de o perito haver prestado serviço, nem impugnou-lhe o valor. O recurso especial monta-se no permissivo a. O Estado reclama de ofensas aos artigos 583; 585, V; 618, I e 730 do Código de Processo Civil. Este, o relatório. VOTO O Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros (Relator): Discute-se a possibilidade de execução contra o Estado, fundada em ato judicial que outorgou honorários a perito, por atuação em processo desenvolvido sob a égide da assistência judicial. O Estado repele o título, sob dois argumentos, a saber: a) o título corresponde a sentença judicial, cujos efeitos limitam-se às partes que litigaram no processo. Como o Estado não figurou na lide, o título não o alcança; b) se não há título executivo, a execução é inviável (CPC, art. 586). O acórdão recorrido afastara o primeiro desses argumentos, dizendo que o título malsinado é de natureza administrativa, não sofrendo restrição quanto à eficácia em relação a terceiros. Tenho esta assertiva como correta. RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 229 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Sabemos todos que a atuação do Estado divide-se em três funções: legislativa, administrativa e jurisdicional. Em regra, o exercício de tais funções é reservado a cada um dos três poderes. A reserva de competência, entretanto, não é absoluta. Há várias situações em que um dos poderes pratica funções que, normalmente não lhe são próprias. Assim, o Poder Judiciário constantemente pratica atos de natureza administrativa. De sua parte, o perito, atua no processo, como auxiliar do juiz. Vale dizer, como um particular em colaboração com o Estado. Para remunerar tal colaboração, arbitra-se um valor que lhe deve ser pago pela entidade que o nomeou. Quando o faz, o magistrado atua como órgão do Estado. Ele não impõe condenação; simplesmente exerce a competência que o Ordenamento Jurídico lhe confere, para se vincular a uma obrigação. Isto significa: o Estado, por um de seus órgãos, assumiu a obrigação de remunerar quem lhe prestou serviço. Ora, a função jurisdicional tem como característica, o condão de resolver pendências, substituindo a vontade de um dos contendores pela do outro. Aqui, não houve contenda entre o perito e o Estado. Este, espontaneamente, prometeu remunerar aquele. A promessa resultou, assim, de ato administrativo. Não há, portanto, como aludir a contraditório ou devido processo legal: o Estado concedeu ao perito, um crédito, cujo título é de natureza administrativa. Estabelecida a natureza administrativa do título, pergunta-se: é possível execução contra o Estado, instrumentada em título extrajudicial? A Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça responde no sentido afirmativo. Vejamos, a propósito, Processual Civil. Execução por título extrajudicial contra Fazenda Pública. Cabimento. Pagamento de valores locatícios. Prescrição. Obrigação de trato sucessivo. - A execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, prevista no art. 730, do CPC, pode ser fundada em título executivo extrajudicial. Precedentes. (6ª Turma, REsp n. 193.876, Leal). Agravo regimental. Execução contra a Fazenda Pública. O legislador não afastou a execução com base em título extrajudicial. O STJ, no Recurso Especial n. 42.774-6-SP - RISTJ 63/435, entendeu que: A execução por quantia acerta contra a Fazenda Pública pode fundar-se em título executivo extrajudicial. (1ª Turma, AGA n. 180.621, Garcia). Nego provimento ao recurso. 230 SÚMULAS - PRECEDENTES RECURSO ESPECIAL N. 188.864-RS (98.0068793-9) Relator: Ministro Franciulli Netto Recorrente: Estado do Rio Grande do Sul Advogado: Cláudio Varnieri e outros Recorrido: Cooperativa Tritícola São Gabriel Ltda. Advogado: Nilson Ubirajara da Rosa Pacheco EMENTA Processo Civil. Recurso especial. Agravo de instrumento. Execução fiscal. Certidão de dívida ativa. Título extrajudicial. Embargos à execução improcedentes. Execução definitiva. É definitiva a execução de decisão que julgou improcedentes os respectivos embargos, ainda que sujeita a apelação. Uma vez iniciada a execução por título extrajudicial (certidão de dívida ativa da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Sul), será definitiva, caráter que não é modificado pela oposição de embargos do devedor, tampouco pela interposição de recurso contra sentença que julgar improcedentes os embargos. O título extrajudicial goza de executoriedade, além de certeza, liqüidez e exigibilidade. Improcedentes os embargos, tais características são reforçadas, devendo a execução seguir, mesmo ante a interposição de recurso com efeito apenas devolutivo. Recurso especial conhecido e provido. Decisão por unanimidade. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Laurita Vaz, Paulo Medina, Eliana Calmon e Francisco Peçanha Martins votaram com o Sr. Ministro Relator. Custas, como de lei. RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 231 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Brasília (DF), 02 de agosto de 2001 (data do julgamento). Ministra Eliana Calmon, Presidente Ministro Franciulli Netto, Relator DJ 24.09.2001 RELATÓRIO O Sr. Ministro Franciulli Netto: Cuida-se de recurso especial interposto pelo Estado do Rio Grande do Sul contra v. acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça desse Estado, que deu provimento ao agravo de instrumento tirado pela Cooperativa Tritícola São Gabriel Ltda. de decisão proferida pelo Juízo monocrático de primeiro grau, que determinou o prosseguimento da execução fiscal, cujos embargos foram julgados improcedentes. O v. acórdão recorrido guarda ementa do seguinte teor: Processual Civil. Execução fiscal embargada. Sentença de improcedência. Execução provisória. Enquanto não transitada em julgado a decisão do recurso em execução fiscal, cuja apelação foi recebida só no efeito devolutivo, a execução é provisória. Interpretação do art. 587 do CPC. Agravo provido. (fl. 143). Irresignado com esse desfecho, o Estado-recorrente opôs embargos de declaração, cujo seguimento foi negado (fl. 153). Sobreveio, então, o presente recurso especial fundado no artigo 105, inciso III, alíneas a e c da Carta Magna, indicando o recorrente que foi contrariado o artigo 535 e violados os artigos 520, inciso V, e 587, combinados com os artigos 584, inciso I, 686, inciso V, e 588, inciso II, todos do Código de Processo Civil. Como matéria preliminar, argúi a nulidade da r. decisão que negou seguimento aos embargos de declaração, entendendo contrariado o artigo 535 do Código de Processo Civil, porquanto foram obstaculizados sem suprir as omissões ali apontadas e não ensejar manifestação do órgão julgador colegiado quanto à incidência dos dispositivos apontados. Aduz que o equívoco na digitação do artigo 686, inciso V, do Código de Processo Civil, caracterizando “erro inocente”, não pode servir de argumento para a negação de prestação jurisdicional. 232 SÚMULAS - PRECEDENTES No mérito, sustenta que restaram violados os artigos 520, V, e 587, combinados com os artigos 584, inciso I, 686, inciso V, e 588, inciso II, todos do Código de Processo Civil, porque a interpretação dada pelo v. acórdão ao artigo 587 limita-se à leitura integral da segunda parte do dispositivo, transcrevendo parte de voto do Desembargador Araken de Assis. Aduz que o artigo 520 do CPC baseia-se num juízo de probabilidades, e que o credor dispõe de título beneficiado pela presunção de certeza, liqüidez e exigibilidade, e, militando, ainda, em seu favor, a sentença proferida na ação incidental, é absolutamente admissível supor-se que o crédito é legítimo e exigível, daí porque o legislador optou por assegurar-lhe a executoriedade imediata, em detrimento da suspensão protelatória. Essa a razão de ser da regra posta no artigo 574 do Estatuto Processual Civil, que prevê o ressarcimento do devedor prejudicado, pelo credor exeqüente, se a final a decisão venha a ser favorável ao executado. Alega, outrossim, dissídio pretoriano, transcrevendo trechos de julgados para o cotejo analítico. O Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul manifestou-se pelo provimento do recurso especial (fls. 199-202). Regularmente processado, o recurso conta com as contra- razões (fls. 185190). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Franciulli Netto (Relator): Nunca é demais lembrar que restou sedimentado por este egrégio Superior Tribunal de Justiça, por meio da Súmula n. 86, que: Cabe recurso especial contra acórdão proferido no julgamento de agravo de instrumento. De outra parte, veio a lume a Lei Federal n. 9.756, de 17 de dezembro de 1998, que atribuiu nova redação ao § 3º do artigo 542 do Código de Processo Civil, determinando que o recurso especial interposto contra decisão interlocutória ficará retido nos autos, devendo ser processado se o reiterar a parte, em suas razões de recurso interposto contra a decisão final ou, ainda, nas RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 233 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA contra-razões. Nesse diapasão é o comando inserto no artigo 1º, da Resolução n. 1, de 12 de março de 1999, deste Pretório ao prever que, verbis: Os recursos especiais interpostos contra decisão interlocutória em processo de conhecimento, cautelar ou embargos à execução, bem como agravos de instrumentos, visando a que sejam admitidos, aguardarão, no Superior Tribunal de Justiça, a remessa do especial relativo à decisão final da causa. Deflui que a sistemática processual, agasalhada pela Resolução citada, modificou o regime de subida imediata do recurso especial interposto contra acórdão proferido em agravo de instrumento, para o da retenção obrigatória do recurso especial. No particular, é curial trazer à colação os ensinamentos de Nelson Nery Júnior, no sentido de que “o novo regime, da retenção obrigatória do RE e REsp se aplica às decisões finais, de última ou única instância, proferidas a partir de 18.12.1998, porque o recurso cabível, bem como seu regime jurídico, são os da lei que vigorava na data da decisão impugnável”. E continua: “Proferido o julgamento, nasce para a parte ou interessado o direito de recorrer, de acordo com as regras legais vigentes à época do referido julgamento. Ocorre o direito adquirido processual àquele recurso, com as regras ditadas pelo regime jurídico da lei vigente por ocasião do julgamento, direito adquirido esse que a lei posterior (Lei n. 9.756/1998), não pode atingir (CF, 5º, XXXVI)” (cfr. “Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos Cíveis de Acordo com a Lei n. 9.756/1998”, Coordenação: Teresa Arruda Alvim Wambier e Nelson Nery Júnior, Ed. Revista dos Tribunais, 1ª ed., p. 480). Infere-se, pois, que o presente recurso especial foi interposto sob a égide do dispositivo legal revogado, não devendo, por conseguinte, obediência à nova regra trazida pelo artigo 542, § 3º do Estatuto Processual Civil, razão pela qual, no particular, correta a subida imediata. A preliminar sobre a nulidade da r. decisão monocrática, que inadmitiu o processamento dos embargos declaratórios (fl. 153), deve ser repelida, por cuidar-se de matéria preclusa, uma vez que não manifestado agravo regimental. No mais, são procedentes, tanto pela alínea a como pela c, as alegações contidas nas razões deste recurso especial (fls. 157-171). É definitiva a execução de decisão que julgou improcedentes os respectivos embargos, ainda que sujeita a apelação. Já se pacificou neste egrégio Sodalício o entendimento sobre a definitividade da execução fundada em título extrajudicial, como é a hipótese dos autos. 234 SÚMULAS - PRECEDENTES Uma vez iniciada, a execução por título extrajudicial (certidão de dívida ativa da Fazenda Pública do Estado do Rio Grande do Sul) será definitiva. Tal caráter não é modificado pela oposição de embargos do devedor, tampouco pela interposição de recurso contra sentença que julgar improcedentes os embargos. Ora, o título extrajudicial goza de executoriedade, além de certeza, liqüidez e exigibilidade. Improcedentes os embargos, tais características são reforçadas, devendo a execução seguir, mesmo ante a interposição de recurso com efeito apenas devolutivo. A propósito, é o magistério do eminente processualista José Carlos Barbosa Moreira: A execução prossegue em caráter provisório, caso a sentença exeqüenda - que é proferida no anterior processo de conhecimento, não a que repeliu os embargos - esteja ainda sujeita a recurso (art. 587, 2ª parte); em caráter definitivo, na hipótese contrária, bem como na de título extrajudicial (art. 587, 1ª parte). A eventual pendência de recurso contra a sentença que julgou improcedentes os embargos não obsta à definitividade da execução; a esse recurso é que alude o art. 686, n. V, 2a parte, por onde se vê que apesar dele se promove, na execução pecuniária, a hasta pública - inconcebível se aquela fosse provisória (art. 588, n. II). (“O Novo Processo Civil Brasileiro”, Forense, 1990, 10ª ed., p. 404). Nesse mesmo caminhar de entendimento segue Silva Pacheco: O disposto no art. 520, V, tem muito interesse, principalmente na execução com base em título extrajudicial. Julgados improcedentes os embargos opostos, a execução prosseguirá, independemente do recurso, e nem por isso tornar-se-á provisória, porque definitiva é ela, desde o início, consoante o art. 587. (“Tratado das Execuções”, Saraiva, 1976, 2a ed., vol. I, p. 209-210). Esse raciocínio é corroborado pelo professor Nelson Nery Júnior: Quando iniciada a execução, por título judicial transitado em julgado ou por título extrajudicial, é sempre definitiva. Iniciada definitiva, não se transmuda em provisória, nem pela oposição de embargos do devedor, nem pela interposição de recurso contra sentença que julgar improcedentes os embargos ou rejeitálos liminarmente (CPC, 520, V). É que a sentença transitada em julgado e o título extrajudicial têm plena eficácia executiva e gozam de presunção de certeza, liqüidez e exigibilidade. Com a rejeição liminar ou a improcedência dos embargos, essa presunção resta reforçada e confirmada, de sorte que a execução deve prosseguir sem a suspensividade operada pela oposição dos embargos e/ou pela interposição de recurso recebido apenas no efeito devolutivo. Provido o recurso, resolve-se em perdas e danos em favor do devedor. (“Código de Processo Civil RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 235 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Comentado e legislação processual civil extravagante em vigor”, 4ª ed., 1999, Revista dos Tribunais, p. 1.106). Alguns dos precedentes sobre o tema: REsp n. 116.610, rel. Min. Adhemar Maciel, DJ de 06.10.1997; REsp n. 152.280-SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 31.05.1999; AgREsp n. 149.533-MG, rel. Min. Ari Pargendler, DJ de 14.06.1999; MS n. 6.687-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 23.11.1999; REsp n. 76.799-RS, Rel. Min. Waldemar Zveiter, DJ 03.06.1996; REsp n. 58.368-MG, Rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJ 03.06.1996; REsp n. 217.358-SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 1º.09.1999; REsp n. 236.786, Rel. Min. Nilson Naves, DJ 10.12.1999; REsp n. 235.456-SP, Rel. Barros Monteiro, DJ 08.03.2000; AG n. 271.977-SP, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ 08.03.2000; AG n. 281.578-SP, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ 14.03.2000; REsp n. 246.006-SP, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 24.03.2000; AG n. 288.971-SP, rel. Min. José Delgado, DJ de 09.05.2000; MC n. 3.367-RS, rel. Min. Paulo Gallotti, DJ de 11.12.2000; REsp n. 152.051-SP, rel. Min. Milton Luiz Pereira, DJ de 28.05.2001; REsp n. 182.966-SP, rel. Min. Eliana Calmon, DJ de 28.06.2001, e REsp n. 142.495-SP, da relatoria deste subscritor. A propósito, merecem transcrição ementas citadas em uma das decisões acima mencionadas, da lavra da eminente Ministra Nancy Andrighi: Processual. Execução fiscal. Embargos de devedor. Rejeição. Pendência de recurso especial. Execução definitiva. Caução desnecessária. Confirmada a rejeição dos embargos de devedor, a execução torna-se definitiva. Não importa a pendência de recurso especial. Em tal situação, nada impede a alienação do bem penhorado, ficando o exeqüente livre de prestar caução. Execução por título extrajudicial. Embargos rejeitados liminarmente. Apelação do executado recebida somente no efeito devolutivo. Não suspensividade da execução. Possibilidade de realização de praça com a expedição da respectiva carta de arrematação. I - É definitiva a execução por título extrajudicial mesmo quando pendente de recurso os embargos do executado. Tal definitividade abrange todos os atos, podendo realizar-se praça para a alienação do bem penhorado com a expedição da respectiva carta de arrematação (...) (MS n. 6.687, DJ de 23.11.1999). Houve afronta ao artigo 587 do Código de Processo Civil, porquanto tratase de execução de título extrajudicial, legalmente determinada como definitiva. 236 SÚMULAS - PRECEDENTES Sequer a oposição de embargos do devedor teria o poder de transmudá-la, ou recurso por eventual improcedência destes, segundo dita o artigo 520, V, do mesmo Codex, o qual não confere o duplo efeito à apelação. Por outro lado, não se pode ratificar decisum que determina seja paralisada a execução, pela não apreciação de agravo de instrumento da competência deste Superior Tribunal de Justiça, ao qual não se deferiu efeito suspensivo. Ao recurso especial, que também não possui tal atributo, segundo se depreende do artigo 542, § 2º, da Lei Adjetiva pátria, só se tem admitido a suspensividade por intermédio de medida cautelar, mas desde que se comprove que não foi negado trânsito ao apelo de sede constitucional. Outro caminho não há, portanto, sob pena de fugir à coerência e aos expressos preceitos de lei, que reconhecer definitiva a execução fundada em certidão de dívida ativa, título extrajudicial, dotado de executividade. A corroborar o entendimento aqui esposado vale citar o seguinte precedente, in verbis: Execução fundada em título extrajudicial. Embargos do devedor. Sentença de improcedência. Apelação. Efeito apenas devolutivo. Definitividade da execução. Art. 587, CPC. Precedentes, prosseguimento. Autos principais. Art. 589, CPC. Recurso provido. I - É definitiva a execução fundada em títulos extrajudiciais, ainda que pendente de julgamento apelação interposta em ataque a sentença de improcedência dos embargos do devedor. II - Como regra, sendo a execução definitiva, impõe-se que prossiga em seus ulteriores termos nos autos principais, nos termos do art. 589, CPC, e não através de carta de sentença (REsp n. 148.483-SP, DJ 1º.03.1999, p. 326, rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira). Por outra vertente, o recurso também pode ser conhecido sob o fundamento da alínea c do inciso III do artigo 105 da Constituição Federal, porquanto o recorrente transcreveu trechos e realizou o necessário cotejo analítico, demonstrando suficientemente as circunstâncias identificadoras da divergência entre o caso confrontado, vindo em desacordo com o que já está pacificado na jurisprudência desta egrégia Corte. Pelo que precede, conheço do recurso para dar-lhe provimento nos termos aqui deduzidos. É como voto. RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 237 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO ESPECIAL N. 193.876-SP (98.0081388-8) Relator: Ministro Vicente Leal Recorrente: Fazenda do Estado de São Paulo Recorridos: Dirce Paiva Magalhães e outros Advogados: Iso Chaitz Scherkerkewitz e outros Armando Pedro EMENTA Processual Civil. Execução por título extrajudicial contra Fazenda Pública. Cabimento. Pagamento de valores locatícios. Prescrição. Obrigação de trato sucessivo. - A execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, prevista no art. 730, do CPC, pode ser fundada em título executivo extrajudicial. Precedentes. - A prescrição qüinqüenal das ações contra a Fazenda Pública atinge o fundo de direito quando o ato lesivo da Administração negar a situação jurídica fundamental em que se embasa a pretensão veiculada. - Na hipótese, envolvendo a pretensão executória o pagamento de valores locatícios solvidos parcialmente pela Fazenda Pública, não se aplica a prescrição da ação, mas o comando incerto na Súmula n. 85-STJ, que disciplina a prescrição qüinqüenal nas relações de trato sucessivo, em que são atingidas apenas as parcelas relativas ao qüinqüênio antecedente à propositura da ação. - Recurso especial não conhecido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso especial, na conformidade dos votos e notas taquigráficas a seguir. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Luiz Vicente Cernicchiaro e Fernando Gonçalves. Ausente, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Patterson. 238 SÚMULAS - PRECEDENTES Brasília (DF), 04 de março de 1999 (data do julgamento). Ministro Vicente Leal, Presidente e Relator DJ 12.04.1999 RELATÓRIO O Sr. Ministro Vicente Leal: - Insurgindo-se contra execução fundada em contrato locatício proposta pelo Espólio de Dirce Paiva Magalhães, a Fazenda do Estado de São Paulo ajuizou embargos, que foram julgados improcedentes pelo r. Juízo de Primeiro Grau. A eg. Primeira Câmara do Segundo Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo, por unanimidade, deu parcial provimento à apelação da ré, apenas para reduzir o percentual fixada à título da verba honorária advocatícia, mantendo o entendimento quanto a viabilidade da execução contra a Fazenda Pública com base em título extrajudicial, bem como a prescrição das parcelas anteriores ao qüinqüênio que precedeu o ajuizamento da ação. O julgamento em tela foi consolidado em ementa do seguinte teor, in verbis: Inobstante o disposto nos arts. 730, CPC e 100, CF, não afronta tais regras o ajuizamento de ação de execução por quantia certa fundada em título executivo extrajudicial (contrato de locação), eis que revestido de liquidez, certeza e exigibilidade, dispensando o processo de conhecimento. Honorários advocatícios - A verba honorária deve ser fixada em percentual condizente com o trabalho desenvolvido, atendidos o grau de zelo profissional, o lugar da prestação do serviço, a natureza e importância da causa, o trabalho realizado e o tempo exigido - recurso parcialmente procedente. (fl. 63). Irresignada, a embargante interpõe o presente recurso especial, com esteio nas alíneas a e c do autorizativo constitucional, verberando ter o v. acórdão recorrido, além de ensejado divergência jurisprudencial, violado o artigo 730, do CPC, bem como os artigos 1º e 3º, do Decreto n. 20.910/1932. Sustenta, em síntese a inviabilidade do ajuizamento de execução por quantia certa fundada em título executivo extrajudicial contra a Fazenda Pública em face do que estatui o artigo 100 da CF/1988, bem como a ocorrência da prescrição do fundo de direito. Apresentadas as contra-razões, e admitido o recurso na origem, ascenderam os autos a esta Corte. É o relatório. RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 239 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VOTO O Sr. Ministro Vicente Leal (Relator): - A primeira controvérsia estabelecida no presente apelo nobre, centra-se na possibilidade do ajuizamento de processo executivo fundado em título executivo extrajudicial contra a Fazenda Pública. As instâncias ordinárias sufragaram a tese de que os títulos extrajudiciais legitimam o credor de um débito contra a Fazenda Pública a propor a execução, sem necessitar ajuizar ação de conhecimento para a obtenção de um título executivo judicial. Em posição contrária, sustenta a recorrente que não se concebe ação executória por quantia certa em face da Fazenda Pública quando o credor dispõe tão-somente de um título extrajudicial, de vez que, promovendo-se a interpretação analógica do art. 730 à luz do comando inscrito no artigo 100 da Carta Magna de 1988, seu ajuizamento demanda a existência de uma sentença judicial condenatória. Data venia, a despeitos dos judiciosos argumentos do nobre signatário da peça recursal, não vejo como prosperar a irresignação. A jurisprudência pretoriana consolidou o entendimento de que a regra do art. 730, do CPC, tem aplicação em qualquer execução proposta contra a Fazenda Pública objetivando o pagamento por quantia certa. Significa dizer que o procedimento previsto no citado preceito legal deve ser observado tanto na execução por título judicial - sentença proferida em processo de conhecimento -, como na execução fundada em título executivo extrajudicial. A propósito, merece registro os seguintes precedentes deste Tribunal: Execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, pode fundar-se em título executivo extrajudicial. Precedente da 3ª turma do STJ: REsp n. 42.774. Recurso conhecido pelo dissídio, porém não provido. (REsp n. 79.222-RS, Relator Min. Nilson Naves, in DJ 03.03.1997). Processual Civil. Execução fiscal. Autarquia Federal (INSS) versus Fazenda Pública municipal. Título executivo extrajudicial (certidão de dívida ativa). Possibilidade. Inteligência dos arts. 730 e 731 do CPC. I - A execução contra a Fazenda Pública há de obedecer a princípios próprios e específicos, em razão mesma da impenhorabilidade dos seus bens, legalmente assegurada. Descabida, contudo, a ampliação dos seus privilégios, onde a lei não os permite. 240 SÚMULAS - PRECEDENTES II - Na sistemática do Código de Processo Civil de 1973, a ação executiva de que se cogita nos artigos 730 e 731, passou a ser a de título judicial ou a de título extrajudicial dotado de executividade. III - Recurso a que se nega provimento, sem discrepância. (REsp n. 62.454-BA, Relator Min. Demócrito Reinaldo, in DJ 20.05.1996). Execução. Fazenda Pública. Título extrajudicial. A execução por quantia certa contra a Fazenda Pública pode fundar-se em título executivo extrajudicial. Recurso conhecido, pelo dissídio, mas não provido (REsp n. 42.774-SP, Relator Min. Costa Leite, in DJ 19.09.1994). Na hipótese sub judice, o ora·recorrido promoveu ação de execução fundada em contrato locatício subscrito por duas testemunhas, sendo certo que, segundo o estatuído no artigo 535, II, do CPC, o documento público ou particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas, do qual conste obrigação de pagar quantia determinada, constitui título executivo. Tenho, assim, que o acórdão recorrido aplicou ao caso correta solução jurídica, pois representando os embargos verdadeira ação de conhecimento embutida no processo de execução, não podem ser equiparados ao instituto processual da contestação, que tem fisionomia própria e inconfundível. Por derradeiro, a última questão emoldurada no presente recurso especial em sido objeto de inúmeras demandas que ascenderam a este Tribunal, pertinentes ao reconhecimento da prescrição do próprio fundo de direito ou do das parcelas devidas antes do qüinqüênio anterior ao ajuizamento da ação, em se tratando de prestações periódicas. Na hipótese sub examen, o Tribunal a quo, em sede de apelação, rejeitou a alegação de prescrição dos valores locatícios devidos, sob o entendimento de que o fundo de direito não se encontra prescrito, mas tão somente as prestações vencidas no qüinqüênio que precedeu o ajuizamento da demanda, ao reconhecer não ter a Fazenda do Estado negado a obrigação de pagar os alugueres, já que solvia parcialmente o débito. Desde logo, cabe deixar consignado que a pretensão recursal não merece agasalho, sendo incensuráveis os fundamentos lançados no r. acórdão recorrido. Centra-se, primeiramente, a res in judicio deducta na discussão quanto a prescrição qüinqüenal das ações contra a Fazenda Pública. O ainda vigente Decreto n. 20.910/1932 assim disciplina o assunto, verbis: RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 241 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Art. 1º. As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda Federal, Estadual ou Municipal, seja qual for a natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem. Perfilhando acerca desta questão, a jurisprudência desta Colenda Corte tem acentuado a distinção entre a prescrição do próprio fundo de direito e a prescrição das parcelas não reclamadas quinquênio que antecedeu a propositura da ação, nas hipóteses de prestações de trato sucessivo. Essa última situação foi inclusive objeto de súmula, que assim ficou emoldurada: Súmula n. 85 - Nas relações de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do qüinqüênio anterior à propositura da ação. No debate desta distinção, merece registro as oportunas conclusões do eminente Ministro Moreira Alves, bastante elucidativas para o deslinde da controvérsia: Fundo de direito é a expressão utilizada para significar que o direito de ser funcionário (situação jurídica fundamental) ou os direitos a modificações que se admitem com relação a esta situação jurídica fundamental, como reclassificações, reenquadramentos, direito a adicionais por tempo de serviço, direito a gratificação por prestação de serviço especial, etc. A pretensão do fundo de direito prescreve, em direito administrativo, em cinco anos a partir da data da violação dele, pelo seu não reconhecimento inequívoco. Já o direito a receber as vantagens pecuniárias decorrente dessa situação jurídica fundamental ou de suas modificações ulteriores é mera conseqüência daquele, e sua pretensão, que diz respeito ao quantum, renasce cada vez que este é devido (dia a dia, mês a mês, ano a ano, conforme a periodicidade em que é devido o seu pagamento), e, por isso, se restringe as prestações vencidas há mais de cinco anos. Cabe ainda citar, a título ilustrativo, precedente de que foi relator o eminente Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, que situa com propriedade a questão, in verbis: REsp. Prescrição. Fundo de direito. Parcelas vencidas. Prescreve o fundo de direito quando, por ação ou omissão, o Estado deixa de constituir situação jurídica que enseja a vantagem do funcionário. Prescreve o direito a percepção de parcelas vencidas, anteriores a cinco anos, contados da lide, uma vez constituída a relação jurídica, sendo a relação de trato sucessivo. (REsp n. 34.349-9-SP in DJ de 02.08.1993). 242 SÚMULAS - PRECEDENTES Analisando o caso posto em debate nos autos, verifica-se que a pretensão executória envolve o pagamento de valores locatícios solvidos parcialmente pela Fazenda do Estado que, por decorrerem de relação jurídica de trato sucessivo, renascem periodicamente. Não há como se falar em prescrição da ação ou do fundo de direito, pois não se questiona a obrigação de pagar os alugueres, consolidada pelo contrato locatício celebrado. Nessa hipótese, o lapso prescricional alcança as parcelas devidas referentes ao recálculo mês a mês, antes do qüinqüênio que antecedeu ao ajuizamento da ação. Hipótese diversa ocorre quando o próprio direito que consubstancia a vantagem devida é violado por expresso indeferimento da Administração Pública. A partir desta data deve o interessado ajuizar a ação no prazo de cinco anos pois, caso contrário, o próprio fundo de direito (situação jurídica) prescreverá, vez que o próprio direito terá sido negado. Significa dizer que do expresso ato denegatório do direito vindicado começa a correr o prazo para a ação judicial, hipótese diversa da que se verifica nos presentes autos. Isto posto, não conheço do recurso especial. É o voto. RECURSO ESPECIAL N. 193.896-RJ (98.0081428-0) Relator: Ministro Milton Luiz Pereira Recorrente: Estado do Rio de Janeiro Advogado: Waldemar Deccache e outros Recorrido: Adef Rio Material Hospitalar Ltda. Advogado: Artur Roberto Santos Gomes Sustentação oral: Artur Roberto Santos Gomes, pelo recorrente EMENTA Processual Civil. Execução contra a Fazenda Pública. Título extrajudicial. CPC, artigos 458, I, 535, I e II e 730. 1. É possível a execução, fundada em título extrajudicial, contra a Fazenda Pública (REsp n. 42.774-SP, Rel. Min. Costa Leite e n. 79.222-RS, Rel. Min. Nilson Naves). 2. Recurso sem provimento. RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 243 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas: Decide a egrégia Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e, no mérito, negar-lhe provimento, julgando extinta a Medida Cautelar n. 1.406-RJ, nos termos do voto do Senhor Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Votaram com o Relator os Senhores Ministros José Delgado, Garcia Vieira e Humberto Gomes de Barros. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Francisco Falcão. Presidiu o julgamento o Senhor Ministro José Delgado. Custas, como de lei. Brasília (DF), 23 de março de 2000 (data do julgamento). Ministro José Delgado, Presidente Ministro Milton Luiz Pereira, Relator DJ 12.06.2000 RELATÓRIO O Sr. Ministro Milton Luiz Pereira: Nos embargos à execução, em sede de apelação, o colendo Tribunal de Alçada Cível do Estado do Rio de Janeiro firmou o entendimento, cristalizado no aresto assim ementado: Embargos à execução. Possível é a execução por título extrajudicial em face da Fazenda Pública. Desnecessária a inicial ação de conhecimento. Exegese sistemática e lógica do art. 100 da Constituição Federal. A norma Constitucional não autoriza uma hermenêutica acanhada a ponto de respaldar a procrastinação, com procedimentos longos e demorados, em prejuízo da satisfação de crédito. Negado provimento. Confirmação da r. sentença em duplo grau de jurisdição·(fl. 93). Aquele Tribunal rejeitou os embargos de declaração interpostos, em acórdão vazado nos seguintes termos: Embargos de declaração. Inexistência de obscuridade, dúvida ou contradições. Impossibilidade de discussão da matéria de mérito já decidida, através de embargos de declaração. Negado provimento. (fl. 105). Com apoio nas alíneas a e c do autorizativo constitucional, foi interposto Recurso Especial, no qual a parte interessada sustenta negativa de vigência aos 244 SÚMULAS - PRECEDENTES artigos 535, inciso II e 458, inciso II, do Código de Processo Civil, 15, inciso II, alínea a, da Lei n. 5.474/1968 e 618, inciso I, do Código de Processo Civil, e ainda dissídio jurisprudencial. Em síntese, a Recorrente disse que o título extrajudicial apresentado não autoriza a cobrança da referida duplicata mediante a ação executiva, tendo em vista que não foi observado o requisito essencial para constituição do título executivo, assim “não havendo prova do aceite e tampouco o protesto da cártula, configurando ausência de título executivo extrajudicial a amparar a ação executiva, uma vez que os requisitos essenciais à sua formação não foram observados”. As contra-razões foram apresentadas às fls. 127-130. O ínclito Terceiro Vice-Presidente do Tribunal de origem admitiu o Recurso Especial, assentando: A questão que se avulta nestes autos não é mais aquela que deu azo aos embargos de devedor, que questionada a possibilidade de ter o ente público cobrado o débito pela via executiva, mas sim o fato de poder lastrear a execução duplicata sem aceite e sem protesto. Superada efetivamente restou a discussão sobre a necessidade de se instaurar, de início, o processo de conhecimento, ressaltando-se o acerto da decisão guerreada quando vaticinou: “A menção que faz o artigo 100 da Constituição com relação a ‘sentença judiciária’ deve ser interpretada em seu sentido sistemático e lógico e não tão acanhado a ponto de se estabelecer um privilégio à inadimplência com concessões procedimentais mais extensas e o mais que delas decorrem, com retardamento na satisfação do direito de crédito do apelado (fls. 95). Ocorre, todavia, que o mesmo correto aresto concluiu, no que concerne ao título executivo que embasa o processo de execução, uma duplicata, que o fato de na exordial não ter o ora recorrente atacado sua executividade, vindo somente a fazê-lo em sede recursal, estaria a prejudicar sua pretensão, desprezando, dessarte, os fortes argumentos deduzidos pelo Ministério Público, no sentido de que a falta do aceite e do protesto desproviam a cambial de sua força executiva. Provocado o enfrentamento explícito do tema jurídico em tela, deixou de se pronunciar o órgão julgado, na sede dos declaratórios, ao rejeitá-los. Assim é que, mesmo que não se possa dar trânsito ao Recurso Especial, pela falta do prequestionamento explícito do disposto no artigo 15, II, a, da Lei n. 5.474/1968, não se pode olvidar que as razões recursais revelam razoabilidade suficiente para alçar a questão a instância superior, ante a virtual ofensa aos artigos 458, II, e 535, II, do Código de Processo Civil. (fls. 138-139). É o relatório. RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 245 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VOTO O Sr. Ministro Milton Luiz Pereira (Relator): Da contemplação das anunciações processuais revela-se que, no julgamento dos embargos à execução, o v. acórdão sobe ferrete recursal, em suma, assentou: - Embargos à execução. Possível é a execução por título extrajudicial em face da Fazenda Pública. Desnecessária a inicial ação de conhecimento. Exegese sistemática e lógica do art. 100 da Constituição Federal. A norma Constitucional não autoriza uma hermenêutica acanhada a ponto de respaldar a procrastinação, com procedimentos longos e demorados, em prejuízo da satisfação de crédito. Negado provimento. Confirmação da r. sentença em duplo grau de jurisdição. (fl. 93). Presentes os requisitos processuais de admissibilidade, merecem conhecimento as razões do recurso posto à consideração (art. 105, III, a, c, CF). Seguindo a guia do exame liberado, além de acenada ofensa aos artigos 458, I, 535, I e II, CPC, a questão jurídica de fundo algema-se à possibilidade, ou não, baseada em título extrajudicial, de execução forçada contra a Fazenda Pública. Vincado o itinerário, primeiramente, finca-se a atenção no ponto afeito à vulneração do artigo 535, I e II, CPC. E, a respeito, verificados os conteúdos do v. acórdão embargado e das razões fundamentais à rejeição dos embargos (fls. 93 a 97 e 105 a 106), não prospera a irresignação. A mesa sorte tem a imaginada ofensa ao artigo 458, I, CPC. De efeito, vezes a basto, tem sido assinalado que “o Juiz não precisa reportar-se a todos os argumentos trazidos pelas partes. Claro que se o Juiz acolhe um argumento bastante para a conclusão, não precisará dizer se os outros, que objetivam o mesmo fim são procedentes ou não”. (O Juiz e a Função Jurisdicional - 1958, p. 350 - Mário Guimarães -). Deveras, a finalidade da jurisdição é compor a lide e não a discussão exaustiva de teses jurídicas. Assim, se por um dos motivos invocados for acolhida a pretensão das partes, pode ser dispensado o exame dos demais. Pois, privativamente, incumbe ao Juiz (ou colegiado) estabelecer as normas jurídicas que incidem sobre o caso, atividade essa excluída da vontade dos litigantes que, por isso, não podem impor limite máximo ou mínimo para a pesquisa jurídico-normativa do julgador. Desse modo, na espécie, por uma ou todas as razões, não prospera a alegada contrariedade ou negativa de vigência ao artigo 535, I e II, e, andante, ao artigo 458, I, CPC. 246 SÚMULAS - PRECEDENTES No lanço da questão derradeira e maior, verdadeiramente, nas veredas da doutrina e da jurisprudência o debate é tormentoso. Todavia, esta Corte tem precedentes alforriando a compreensão da possibilidade da execução contra a Fazenda Pública fundar-se em título executivo extrajudicial. Inter alia, à mão de ilustrar: - Execução. Fazenda Pública. Título extrajudicial. A execução por quantia certa contra a Fazenda Pública pode fundar-se em título executivo extrajudicial. Recurso conhecido, pelo dissídio, mas não provido. (REsp n. 42.774-SP - Rel. Min. Costa Leite - in DJU de 19.09.1994). A fundamentação do v. acórdão, acima ementado, é elucidativo; textualmente: A questão trazida a lume é controvertida, mas, em verdade, não há razão lógica ou jurídica para que se arrede a possibilidade de a execução por quantia certa contra a Fazenda Pública fundar-se em título executivo extrajudicial A necessidade de observância da disciplina do art. 730, do CPC, não induz o raciocínio de que a execução pressupõe título judicial. Como observa Celso Neves, “eliminada a ação executiva e unificada a via executória, já agora hábil tanto para os casos de sentença condenatória quanto para os de títulos extrajudiciais dotados de executividade, a disciplina do art. 730 atende às particularidades de um processo executório em que não pode haver a penhora de bens sobre os quais verse a atividade juris-satisfativa que lhe é própria” (“Comentários ao Código de Processo Civil”, Vol. VII, Forense, p. 166). Só uma interpretação estreita da norma constitucional conduziria ao absurdo de obrigar o credor ao processo de conhecimento por que o sujeito passivo na relação creditícia de direito material é a Administração, como enfatiza Araken de Assis, em escólio transcrito no voto condutor do aresto recorrido. Ressalte-se que o extinto Tribunal Federal de Recursos já se posicionara sobre o tema, nestes termos do acórdão proferido pela Quinta Turma na Apelação Cível n. 164.425-SP: - Tem validade a execução contra a Fazenda Pública fundada tão-somente em título executivo extrajudicial, porquanto inexiste o excepcionamento pretendido para a r. decisão a quo. (Rev. STJ 63/435). No mesmo sentido: - Execução por quantia certa contra a Fazenda Pública. Pode fundar-se em título executivo extrajudicial. Precedente da 3ª Turma do STJ: REsp n. 2.774. Recurso conhecido pelo dissídio, porém não provido. (REsp n. 79.222-RS, Rel. Min. Nilson Naves, in Rev. STJ 95/259). RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 247 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Por fim, comenta-se que, no tocante, à necessidade, ou não, de precedente protesto do título a tempo e modo a questão não foi objeto de exame nas antecedentes proposições da do Estado recorrente. Na confluência da exposição, de logo, vicejado que não prospera a alegada vulneração aos artigos 458, I e 535, I e II, CPC, no lanço da questão maior, reanimando a fundamentação dos precedentes como fonte do convencimento, pelo dissídio, ao fundo e cabo, voto negando provimento ao recurso. É o voto. RECURSO ESPECIAL N. 203.962-AC (99.0013246-7) Relator: Ministro Garcia Vieira Recorrente: Estado do Acre Advogado: Maria Cesarineide de Souza Lima e outros Recorrido: Viaje Agência de Viagens e Turismo Ltda. Advogado: Wanderley Cesario Rosa EMENTA Execução. Fazenda Pública. Título extrajudicial. Possibilidade. As requisições de passagens aéreas, acompanhadas de notas de empenho, são títulos executivos extrajudiciais. O legislador permite a execução contra a Fazenda Pública por título extrajudicial. Recurso improvido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Exmos. Srs. Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento ao recurso. 248 SÚMULAS - PRECEDENTES Votaram com o Relator os Exmos. Srs. Ministros Demócrito Reinaldo, Humberto Gomes de Barros, Milton Luiz Pereira e José Delgado. Brasília (DF), 06 de maio de 1999 (data do julgamento). Ministro Milton Luiz Pereira, Presidente Ministro Garcia Vieira, Relator DJ 21.06.1999 RELATÓRIO O Sr. Ministro Garcia Vieira: O Estado do Acre, com lastro na Constituição Federal, art. 105, III, a e c, interpõe recurso especial (fl. 134), guerreando acórdão cuja ementa foi vazada nos seguintes termos: Apelação cível. Reexame necessário. Execução contra a Fazenda Pública. Título executivo extrajudicial. Nota de empenho. Documento público assinado pelo devedor. Executoriedade. 1. A Jurisprudência dos Tribunais pátrios tem manifestado entendimento no sentido de que, desde que assinado pelo devedor, o documento público é título executivo extrajudicial, ainda que não subscrito por duas testemunhas. 2. Esta Egrégia Corte através de sua C. Câmara Cível pacificou o entendimento no sentido de que, a nota de empenho, emitida por agente público e assinada pela devedora, é título de dívida líquida, certa e exigível (CPC art. 586) a propiciar execução na conformidade do inciso II, art. 585, do mesmo Codex. 3. Recurso a que se nega provimento. Aduz carência da ação de execução, posto que lastreada em notas de empenho, documentos não subsumidos ao rol contido no CPC, art. 585. Afirma, ainda, que o contrato que deu lastro à compra das passagens ora em questão foi feito verbalmente, o que compromete sua validade. Pede provimento, reformando-se o v. aresto vergastado. Contrariedade às fls. 161. Despacho (fls. 193). É o relatório. RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 249 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VOTO O Sr. Ministro Garcia Vieira (Relator): Sr. Presidente - Aponta o recorrente, como violados, os artigos 301, X, 267, 585 e 730, todos do CPC, versando sobre questões devidamente prequestionadas. Conheço do recurso pela letra a. A execução movida pela recorrida contra a recorrente se baseia em títulos extrajudiciários, representados por faturas em empenhos expedidos pelo próprio Estado embargante (fls. 49-57 e 62-73) e a dívida foi devidamente reconhecida pelo recorrente (fls. 60-61). Os empenhos foram emitidos pelo próprio Estado que confirmou a requisição das passagens aéreas e confessa o débito (fls. 47-48). Estas requisições, acompanhadas das notas de empenho, são títulos executivos extrajudiciais que se encaixam no artigo 585, do CPC, porque é documento público assinado pelo devedor. O legislador permite a execução contra a Fazenda Pública, por título extrajudicial. Neste sentido o AGA n. 180.621-SP, DJ de 10.08.1998, do qual fui relator e Recurso Especial n. 42.774-6-SP, relator, Ministro Costa Leite, RSTJ n. 63/435. Neste Recurso Especial, entendeu a Egrégia Terceira Turma do STJ que: A execução por quantia certa contra a Fazenda Pública pode fundar-se em título executivo extrajudicial. A mesma Turma, no Recurso Especial n. 79.222-RS, Relator, Ministro Nilson Naves, RSTJ 95/259, decidiu que: Execução por quantia certa contra a Fazenda Pública. Pode fundar-se em título executivo extrajudicial. Se estamos diante de título executivo extrajudicial, e se a Fazenda Pública pode ser executada com base nele, o v. acórdão recorrido (fls. 126-131), ao afastar a preliminar argüida pelo recorrente, não violou os artigos 301, X e 267, VII do CPC. Também, no mérito, não tem razão o recorrente. Ainda que tivesse sido irregular a aquisição das passagens aéreas, sem licitação, continuariam a existir o débito do Estado, devidamente comprovado e por ele confirmado e é ele próprio, através do Parecer n. 130/97 da Procuradoria-Geral (fl. 183) que determinou: Ementa. Serviços prestados em benefício do Estado sem o devido processo licitatório. Validade do pagamento após o atesto dos mesmos. Obrigação que 250 SÚMULAS - PRECEDENTES subsiste mesmo no caso de abusivo poder ou transgressão de deveres. Restando tão somente a responsabilidade de quem não observou as disposições da Lei n. 8.666/1993. Precedentes. Nego provimento ao recurso. RECURSO ESPECIAL N. 212.689-SP (99.0039475-5) Relator: Ministro Felix Fischer Recorrente: Estado de São Paulo Advogado: Regina Maria Rodrigues da Silva e outros Recorrido: Liga Paulista contra a tuberculose Advogado: Luiz Inacio Aguirre Menin e outros EMENTA Locação. Execução contra a Fazenda Pública. Título extrajudicial. Multa. Código de Defesa do Consumidor. Inaplicabilidade. I - É possível a execução contra a Fazenda Pública, por quantia certa, com amparo em título extrajudicial. II - As relações locatícias possuem lei própria que as regule. Ademais, falta-lhes as características delineadoras da relação de consumo apontadas nos arts. 2° e 3º da Lei n. 8.078/1990. O Código de Defesa do Consumidor, no que se refere à multa pelo atraso no pagamento do aluguel, não é aplicável às locações prediais urbanas. Recurso não conhecido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso. Votaram com RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 251 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA o Relator os Ministros Gilson Dipp, Jorge Scartezzini e José Arnaldo. Ausente, ocasionalmente, o Ministro Edson Vidigal. Brasília (DF), 21 de março de 2000 (data do julgamento). Ministro José Arnaldo da Fonseca, Presidente Ministro Felix Fischer, Relator DJ 17.04.2000 RELATÓRIO O Sr. Ministro Felix Fischer: Trata-se de recurso especial interposto com fulcro na alínea a e c do permissivo constitucional pelo Estado de São Paulo contra acórdão proferido pelo e. 2º Tribunal de Alçada Civil daquele Estado, sumariado nos seguintes termos: Execução. Título extrajudicial. Fazenda Pública. Possibilidade. Arts. 730 do CPC e 100 da Constituição Federal. Compatibilidade. “Admite-se a execução contra a Fazenda Pública, fundada em título extrajudicial, desde que compatíveis os artigos 730 do Código de Processo Civil e 100 da Constituição Federal”. Locação. Não pagamento dos aluguéis. Descumprimento de cláusula contratual. Multa compensatória. Incidência. “O não pagamento dos aluguéis contratados enseja a incidência da multa compensatória, por se tratar de multa contratual, prevista para o caso de descumprimento de qualquer das cláusulas do contrato”. Locação. Código de Defesa do Consumidor. Não aplicação. “Nas ações sobre locação não têm aplicação as disposições do Código de Proteção ao Consumidor, desde que não se apresenta relação de consumo”. (fls. 75). Insurge-se a recorrente, primeiramente, sustentando violação ao art. 730 do CPC, alegando ser inadmissível, contra a Fazenda Pública, execução por título extrajudicial. O segundo argumento recursal prende-se à aplicabilidade do artigo 52, § 1º, CDC, nas relações locatícias, sob o fundamento de que estas estão inseridas no conceito de relação de consumo, que foi ampliado de modo a abranger também os contatos de locação. Traz, ainda, julgados para caracterização do dissídio jurisprudencial. 252 SÚMULAS - PRECEDENTES Recurso admitido na origem, subiram os autos a este Tribunal. Manifestação do ilustre representante do Ministério Público Federal pelo desprovimento do apelo. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Felix Fischer (Relator): O apelo não merece acolhida. No que se refere ao primeiro tópico, conforme entendimento deste Tribunal, é possível a execução contra a Fazenda Pública, por quantia certa, com amparo em título extrajudicial. Já decidiu esta Corte: Processual. Execução. Título extrajudicial. Fazenda Pública. Possibilidade. I - É possível a execução contra a Fazenda Pública com base em título extrajudicial. II - Precedentes do STJ. (REsp n. 171.228-SP, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJU de 1º.07.1999). Processual Civil. Execução por título extrajudicial contra Fazenda Pública. Cabimento. Pagamento de valores locatícios. Prescrição. Obrigação de trato sucessivo. - A execução por quantia certa contra a Fazenda Pública, prevista no art. 730, do CPC, pode ser fundada em título executivo extrajudicial. Precedentes. (…) (REsp n. 193.876-SP, Rel. Min. Vicente Leal, DJU de 12.04.1999). REsp. Processual Civil. Fazenda Pública. Execução. Título extrajudicial. - A execução contra a Fazenda Pública obedece o procedimento do art. 730, CPC e seguintes. A exigência do art. 100, CF/1988, impondo, para expedir precatório, sentença judiciária, não interfere na conclusão. O Estado pode efetuar pagamento, independente de precatório: vencimentos de servidores, obrigações decorrentes de contrato para a realização de obras públicas. Também pagamento de alugueres. Impõe-se distinguir: o precatório deve ser precedido de “sentença judiciária”. Esta é pressuposto. Não exclui, entretanto, a execução por título executório extrajudicial. Dever-se-á entender teleologicamente os dispositivos legais. Confere-se, pois, equilíbrio aos interesses do particular e do RSSTJ, a. 5, (21): 205-254, agosto 2011 253 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Estado. Extremo formalismo reclamar processo de conhecimento para conferir o título executório extrajudicial. Entenda-se, para efeito do art. 100, CF/1988 sentença judiciária - como - verificação judicial do débito reclamado. Acontece, no processo executório, haja, ou não embargos do devedor. (REsp n. 98.104-PR, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, DJU de 16.12.1996). Agravo regimental. Execução contra a Fazenda Pública. O legislador não afastou a execução com base em título extrajudicial. O STJ, no Recurso Especial n. 42.774-6-SP - RSTJ 63/435, entendeu que: “A execução por quantia acerta contra a Fazenda Pública pode fundar-se em título executivo extrajudicial.” Agravo improvido. (AgRg/Ag n. 180.621-SP, Rel. Min. Garcia Vieira, DJU de 10.08.1998). Quanto à aplicabilidade do CDC no tocante ao valor da multa por atraso de pagamento de aluguel, assevero que as relações locatícias possuem lei própria que as regule. Ademais, falta-lhes as características delineadoras da relação de consumo apontadas nos arts. 2º e 3º da Lei n. 8.078/1990. Conforme entendimento das duas Turmas componentes desta 3ª Seção, o Código de Defesa do Consumidor, no que se refere à multa pelo atraso no pagamento do aluguel, não é aplicável às locações prediais urbanas. É o que se colhe dos seguintes precedentes: Locação. Retenção por benfeitorias. Código do Consumidor. Lei n. 8.070/1990. Inaplicabilidade. Não é nula cláusula contratual da renúncia ao direito de retenção ou indenização por benfeitorias. Não se aplica à locações prediais urbanas reguladas pela Lei n. 8.245/1991, o Código do Consumidor. Recurso não conhecido. (REsp n. 38.274-SP, Rel. Min. Edson Vidigal, DJU de 22.05.1995). REsp. Civil. Locação. Código de Defesa do Consumidor. Multa. A Lei de Locação não se confunde com o Código de Defesa do Consumidor. Em assim sendo, a multa pode ser diferente. (REsp n. 131.851-SP, Rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, DJU de 09.02.1998). Diante destas considerações, não conheço do recurso (Súmula n. 83-STJ). É o voto. 254 Súmula n. 280 SÚMULA N. 280 O art. 35 do Decreto-Lei n. 7.661, de 1945, que estabelece a prisão administrativa, foi revogado pelos incisos LXI e LXVII do art. 5º da Constituição Federal de 1988. Referências: CF/1988, art. 5º, LXI e LXVII. Decreto-Lei n. 7.661/1945, art. 35. Precedentes: HC 19.308-SP (3ª T, 19.03.2002 – DJ 15.04.2002) HC 19.745-PR (4ª T, 05.03.2002 – DJ 29.04.2002) HC 21.316-SP (4ª T, 11.02.2003 – DJ 31.03.2003) HC 22.779-PR (3ª T, 08.11.2002 – DJ 16.12.2002) HC 26.184-RJ (4ª T, 11.02.2003 – DJ 31.03.2003) HC 26.196-SP (4ª T, 25.03.2003 – DJ 14.04.2003) Segunda Seção, em 10.12.2003 DJ 17.12.2003, p. 210 HABEAS CORPUS N. 19.308-SP (2001.0164289-9) Relator: Ministro Antônio de Pádua Ribeiro Impetrante: Cláudio Bonato Fruet e outros Impetrado: Sexta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Paciente: Hugo Haverroth Hilgert EMENTA Habeas corpus. Falência. Prisão administrativa. I - A prisão administrativa prevista no art. 35 da Lei de Falências não subsiste, porque em desacordo com os incisos LXI e LXVII do art. 5o da Constituição Federal. Precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal. II - Ordem concedida. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conceder a ordem, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Ari Pargendler, Carlos Alberto Menezes Direito e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Castro Filho. Brasília (DF), 19 de março de 2002 (data do julgamento). Ministro Ari Pargendler, Presidente Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Relator DJ 15.04.2002 RELATÓRIO O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro: Cláudio Bonato Fruet e outros impetraram ordem de habeas corpus em favor de Hugo Haverroth Hilgert, contra acórdão da 6a Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA São Paulo que manteve o decreto de prisão administrativa expedido pelo Juízo de Direito da 3a Vara da Comarca de Valinhos-SP. Alegam: 1o) que o paciente “encontra-se, por engano, na condição de representante legal da empresa falida HBC e Equipamentos”; (fl. 03). 2o) que o paciente já havia vendido a empresa HBC muito antes da quebra; 3o) que o paciente já indicou “o nome, endereço e telefone dos novos sócios, bem como do contador da empresa, o qual tinha em seu poder todos os livros contábeis da empresa”; (fl. 04). Afirmam que o paciente compareceu em Juízo no processo de falência para fins do art. 34 da Lei de Falências, visando esclarecer os fatos e evitar dissabores como o que está acontecendo e que foi ele vítima de falsificação pelo contador da empresa falida que, após, voltou atrás e informou ter cometido um equívoco, pois os livros contábeis não foram entregues ao ora paciente, mas aos representantes legais daquela empresa, que, contudo, intimados, negaram a aquisição da mesma e as assinaturas dos documentos apresentados. Enquanto se aguardava o deferimento do pedido de perícia grafotécnica feita pelo síndico, foi decretada a prisão administrativa pelo Juiz de Falências, pelo período de 30 dias, para que fossem entregues os livros da empresa. Interpôs agravo de instrumento, contudo o decreto prisional foi mantido pelo Tribunal a quo. Daí a razão do presente writ, no qual se afirma ser ilegal a prisão decretada por não ser o paciente dono da empresa e por estar o mesmo colaborando com o andamento do processo, tendo, inclusive, transferido sua residência para a Comarca onde se processa o feito. Sustentam, ainda, que foi interposto recurso especial contra o decidido no agravo, ainda não processado em razão da greve do Judiciário naquele Estado. Solicitei informações, deixando para examinar o pedido de liminar posteriormente (fl. 80). Com as informações, manifestou-se a douta Subprocuradoria-Geral da República pela denegação da ordem em decisão assim ementada (fl. 158): Constitucional e Processual Civil. Falência habeas corpus. Depositário. Decreto de prisão. Possibilidade. Pelo denegação da ordem requerida. O habeas corpus é via inidônea quando a solução da pendência exige dilação probatória. Pela denegação da ordem requerida. É o relatório. 260 SÚMULAS - PRECEDENTES VOTO O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro (Relator): O voto condutor do acórdão que manteve o decreto de prisão do paciente, está assim redigido em sua parte conclusiva (fl. 20): Bem agiu o magistrado, enfim, ao decretar a prisão administrativa do agravante, nos termos do previsto no art. 35 da Lei de Falências, pelo que ao presente recurso negam provimento, cassado o efeito suspensivo deferido a fls. 53. Este Tribunal vem se posicionando em sentido contrário ao que decidiu a sentença e o acórdão proferido pelo impetrado sobre a matéria constante destes autos. Vejam-se as seguintes ementas: Civil. Habeas corpus. Falência. Deveres do falido. Decreto-Lei n. 7.661/1945, arts. 34 e 35. Desobediência. Prisão. Constrangimento ilegal. Concessão da ordem. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal já firmaram que a prisão administrativa prevista no art. 35 da Lei de Falências não subsiste, porque em confronto com a disposição constante do art. 5o, LXVII, da Constituição Federal. II. Ordem concedida. (HC n. 18.029-RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 23.10.2001 e publicado no DJ de 18.02.2002). Constitucional. Habeas-corpus. Lei de Falência. Prisão administrativa. Impossibilidade. Em face da nova ordem constitucional, que restringiu a prisão civil às exclusivas hipóteses de depositário infiel e do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia (CF, art. 5o, LXVII), restou abolida a prisão administrativa prevista no art. 35, da Lei de Falências. Habeas-corpus concedido. (HC n. 15.046-CE, Rel. Min. Vicente Leal, julgado em 27.11.2001 e publicado no DJ de 18.02.2002). Falência. Prisão do comerciante. Habeas-corpus. Inexiste prisão civil fora do que excepciona a Constituição Federal. Ordem concedida. (HC n. 12.172-PR, Rel. Min. Fontes de Alencar, publicado no DJ de 18.06.2001). RSSTJ, a. 5, (21): 255-279, agosto 2011 261 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Neste último, assim se pronunciou o seu ilustre relator: Senhor Presidente, a matéria me parece bem clara. A Constituição de 1988 não se compadece com prisão civil, senão aquelas que excepciona no inciso LXVII do art. 5o: a prisão do depositário infiel e do prestador de alimentos. Deixo à margem qualquer consideração conceitual quanto à figura do falido em relação à sociedade falida, porque o exame deve ser feito à luz do campo penal. Abstraída essa hipótese, tenho que não subsiste, na sua inteireza, a lei falimentar, ainda que tenha como válidas as exigências do art. 34, não vejo como válido conservar o art. 35, que admitia, no seu bojo, a decretação dessa prisão administrativa falimentar, porque o caráter dessa prisão era meramente coercitivo. Não há que comparar com (inaudível) com a prisão cautelar, a prisão preventiva do campo do processo penal. O egrégio Supremo Tribunal Federal já decidiu que o art. 35 da Lei de Falências se encontra revogado pelos incisos LXI e LXVII do art. 5o da Constituição Federal, não admitindo a prisão administrativa prevista no dispositivo citado. O acórdão, proferido no RHC n. 76.741-MG, está assim ementado: Recurso ordinário em habeas-corpus. Como bem acentua o parecer da Procuradoria-Geral da República, em princípio, a superveniência da condenação criminal não torna sem efeito a prisão - que é medida administrativa de caráter coercitivo e não punitivo - decretada no processo cível falimentar que tem outra finalidade. Assim sendo, e estando revogado o artigo 35 da Lei de Falências pelos incisos LXI e LXVII do artigo 5o da Constituição que não admitem essa modalidade de prisão, impõe-se o provimento do presente recurso ordinário para que se casse o decreto dessa prisão. Recurso ordinário provido. (RHC n. 76.741-MG, Rel. Min. Moreira Alves, julgado em 24.04.1998 e publicado no DJ de 22.05.1998). Assim, não recepcionado pela atual Constituição Federal o disposto no art. 35 da Lei de Falências, a prisão do ora paciente, decretada com base no citado dispositivo, não pode ser considerada legal. Ante o exposto, concedo a ordem para tornar insubsistente a prisão administrativa imposta ao paciente. 262 SÚMULAS - PRECEDENTES HABEAS CORPUS N. 19.745-PR (2001.0191401-0) Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior Impetrante: Ronaldo Camilo Impetrado: Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná Paciente: Odair Tomaz EMENTA Civil. Habeas corpus. Falência. Deveres do falido. Decreto-Lei n. 7.661/1945, arts. 34 e 35. Desobediência. Prisão. Constrangimento ilegal. Concessão da ordem. I. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal já firmou que a prisão administrativa prevista no art. 35 da Lei de Falências não subsiste, porque em confronto com a disposição constante do art. 5o, LXVII, da Constituição Federal. II. Ordem concedida. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas. Decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, conceder a ordem, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Barros Monteiro, Cesar Asfor Rocha e Ruy Rosado de Aguiar. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. Custas, como de lei. Brasília (DF), 05 de março de 2002 (data do julgamento). Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente Ministro Aldir Passarinho Junior, Relator DJ 29.04.2002 RSSTJ, a. 5, (21): 255-279, agosto 2011 263 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RELATÓRIO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: O advogado Ronaldo Camilo impetrou habeas corpus em favor de Odair Tomaz, dirigido ao C. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, objetivando afastar decreto de prisão emanado do Juízo da 1a Vara Cível de Umuarama, PR, expedido com base no descumprimento das obrigações constantes do art. 35 do Decreto-Lei n. 7.661/1945, nos autos n. 608/1998, relativo à falência da empresa Emanuel Davi Veículos Ltda. Afirmou que o constrangimento foi decretado ex officio pelo julgador monocrático, imotivadamente, revogando acordo para quitação dos débitos, realizado com a concordância do Ministério Público Estadual entre os dois possuidores de créditos habilitados e a falida. Asseverou que houve discordância apenas quanto à conta que atualizou a segunda habilitação, havendo peticionado para que fosse refeita, aplicandose-lhe corretamente os indexadores de correção monetária, sem que obtivesse pronunciamento do Juízo, razão pela qual não foi prontamente atendido o despacho que determinou o imediato pagamento. Deferido salvo conduto liminarmente pela Corte Estadual, e após prestadas as informações pelo Juízo coator, a 1a Câmara Cível, por unanimidade, denegou a ordem, ao entendimento de que não constitui constrangimento ilegal a decretação de prisão do falido que descumpre acordo firmado e trepudia com os deveres previstos no art. 35 do Decreto-Lei n. 7.661/1945, em especial quando antecipadamente advertido dessa conseqüência. Interposto recurso impróprio, foi-lhe negado seguimento (fls. 53-54). Adveio, assim, o presente habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, consubstanciado nas razões supra. À fl. 39, deferi liminar para obstar o decreto de prisão confirmado pelo julgamento no TJPR e não atacado oportunamente pelo recurso próprio. Informações da autoridade apontada coatora às fls. 48-54, com juntada do andamento processual do habeas corpus primitivo (0109815-9). Às fls. 56-58, opina o douto Ministério Público Federal, em parecer da lavra do Subprocurador-Geral da República, Dr. Roberto Casali, pela concessão da ordem. É o relatório. 264 SÚMULAS - PRECEDENTES VOTO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior (Relator): Como visto do relatório, cuida-se de habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, interposto contra acórdão prolatado pelo Colendo Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, que denegou a ordem que buscava sustar decreto de prisão que qualificou como descumprimento das obrigações do falido, previstas no art. 35 do DecretoLei n. 7.661/1945, o não pagamento dos débitos da falida no prazo acordado, desrespeitando acordo firmado com a concordância do Ministério Público paranaense. Este Tribunal Superior já teve oportunidade de se pronunciar sobre a matéria constante destes autos, litteris: Falência. Prisão do comerciante. Habeas-corpus. - Inexiste prisão civil fora do que excepciona a Constituição Federal. - Ordem concedida. (6a Turma, HC n. 12.172-PR, Rel. Min. Fontes de Alencar, unânime, DJU de 18.06.2001). Civil. Habeas corpus. Falência. Deveres do falido. Decreto-Lei n. 7.661/1945, arts. 34 e 35. Desobediência. Prisão. Constrangimento ilegal. Concessão da ordem. I. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal já firmaram que a prisão administrativa prevista no art. 35 da Lei de Falências não subsiste, porque em confronto com a disposição constante do art. 5o, LXVII da Constituição Federal. II. Ordem concedida. (4a Turma, HC n. 18.029-RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, unânime, DJU de 18.02.2002) Também o Egrégio Supremo Tribunal Federal, em precedente da relatoria do eminente Ministro Moreira Alves, posicionou-se no mesmo sentido, corroborando o entendimento acima, em aresto assim ementado: Recurso ordinário em habeas corpus. - Como bem acentua o parecer da Procuradoria-Geral da República, em princípio, a superveniência da condenação criminal não torna sem efeito a prisão - que é medida administrativa de caráter coercitivo e não punitivo - decretada no processo cível falimentar que tem outra finalidade. Assim sendo, e estando revogado o artigo 35 da Lei de Falências pelos incisos LXI e LXVII do artigo RSSTJ, a. 5, (21): 255-279, agosto 2011 265 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 5º da Constituição que não admitem essa modalidade de prisão, impõe-se o provimento do presente recurso ordinário para que se casse o decreto dessa prisão. Recurso ordinário provido. (RHC n. 76.741-1-MG, unânime, DJU de 22.05.1998). Com efeito, não se pode confundir a medida administrativa e coercitiva, civil, prevista no art. 35 da Lei de Falências, com o intuito de conceder efetividade às disposições do art. 34 da mesma norma, com as figuras descritivas de condutas criminosas de seus artigos subseqüentes, ainda que subsistam no ordenamento jurídico as obrigações impostas ao falido. Porém, a Constituição Federal não excepcionou quanto ao caso específico em seu art. 5o, LXVII, não se podendo estender para além daqueles limites as hipóteses de prisão, havendo que se considerar derrogada qualquer modalidade de restrição legal da liberdade que com ela esteja em confronto. Ante o exposto, confirmando a liminar antes deferida, concedo o habeas corpus, determinando sejam feitas as comunicações de estilo. É como voto. HABEAS CORPUS N. 21.316-SP (2002.0033035-2) Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar Impetrante: Paulo Sérgio Santo André Impetrado: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Paciente: Cézar Fondora EMENTA Prisão civil. Comerciante. Falência. Inadmissibilidade. É incabível a prisão civil de administrador de empresa, por descumprimento do art. 34 da LF. Ordem deferida. 266 SÚMULAS - PRECEDENTES ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conceder a ordem, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Aldir Passarinho Junior, Sálvio de Figueiredo Teixeira e Barros Monteiro votaram com o Sr. Ministro-Relator. Brasília (DF), 11 de fevereiro de 2003 (data do julgamento). Ministro Aldir Passarinho Junior, Presidente Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Relator DJ 31.03.2003 RELATÓRIO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: Paulo Sérgio Santo André impetrou habeas corpus preventivo, com pedido de liminar, em favor de Cézar Fondora, contra r. acórdão da egrégia Sexta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, que decretou sua prisão administrativa, com base no art. 35, parágrafo único, do Decreto-Lei n. 7.661/1945, nos autos da falência de Irmãos Abreu S/A - Fundição, Mecânica e Ferragens, em trâmite na 15ª Vara Cível da Comarca de São Paulo. Sustentou não poder subsistir o decreto de prisão, por inconstitucional, e também por estar em desacordo com a Convenção Americana dos Direitos Humanos, aprovada pelo Pacto de São José da Costa Rica, do qual o Brasil é signatário. Por não ser sócio nem depositário dos bens da falida, não poderia ter descumprido as obrigações do art. 34 da Lei de Falência. Alega existência de contradição, pois a mesma Câmara julgadora, diz, concedeu ordem de habeas corpus em favor de José Eduardo Papa dos Santos, sócio da falida. Afirma terem sido afrontados os princípios do devido processo legal e da ampla defesa. Deferi a liminar. Não foram prestadas as informações, conforme requerido. O impetrante peticionou, informando ter sido expedido novo mandado de prisão. O d. MPF opinou pela concessão da ordem, tendo em vista o constrangimento ilegal a que está submetido o paciente. É o relatório. RSSTJ, a. 5, (21): 255-279, agosto 2011 267 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VOTO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar (Relator): Ao apreciar o pedido liminar, assim decidi: Considerando os últimos precedentes desta Quarta Turma, e também da egrégia Terceira Turma, sobre a inadmissibilidade da prisão administrativa em caso como o dos autos (falência), concedo a liminar para suspender a eficácia da decisão que ordenou a prisão do paciente. 2. Solicitar informações ao Exmo. Dr. Juiz de Direito da 15ª Vara Cível - Foro Central-São Paulo. Após, vista ao douto MPF. Oficiar (fl. 170). Cito as ementas de nossos precedentes, assim como enumeradas no douto parecer do Ministério Público Federal: Civil. Habeas corpus. Falência. Deveres do falido. Decreto-Lei n. 7.661/1945, arts. 34 e 35. Desobediência. Prisão. Constrangimento ilegal. Concessão da ordem. I. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal já firmou que a prisão administrativa prevista no art. 35 da Lei de Falências não subsiste, porque em confronto com a disposição constante do art. 5º, LXVII, da Constituição Federal. II. Ordem concedida (HC n. 19.745-PR, rel. o em. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ 29.04.2002). Processual Penal. Constitucional. Lei de Falência. Prisão administrativa. Não recepção pela CF/1988. Impossibilidade. - Em face da nova ordem constitucional, que restringiu a prisão civil às exclusivas hipóteses de depositário infiel e do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia (CF, art. 5º, LXVII), restou abolida a prisão administrativa prevista no art. 35, da Lei de Falências. - Habeas corpus concedido de ofício (HC n. 13.548-SP, rel. o em. Min. Vicente Leal, DJ 06.05.2002). Habeas corpus. Falência. Prisão administrativa. I - A prisão administrativa prevista no art. 35 da Lei de Falências não subsiste, porque em desacordo com os incisos LXI e LXVII do art. 5º da Constituição Federal. Precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal. II - Ordem concedida (HC n. 19.308-SP, rel. o em. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 15.04.2002). 268 SÚMULAS - PRECEDENTES Constitucional. Habeas corpus. Lei de Falência. Prisão administrativa. Impossibilidade. - Em face da nova ordem constitucional, que restringiu a prisão civil às exclusivas hipóteses de depositário infiel e do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia (CF, art. 5º, LXVII), restou abolida a prisão administrativa prevista no art. 35, da Lei de Falências. - Habeas corpus concedido (HC n. 15.046-CE, rel. o em. Min. Vicente Leal, DJ 18.02.2002). Falência. Prisão do comerciante. Habeas corpus. - Inexiste prisão civil fora do que excepciona a Constituição Federal. - Ordem concedida (HC n. 12.172-PR, rel. o em. Min. Fontes de Alencar, DJ 18.06.2001). Posto isso, defiro a ordem. É o voto. HABEAS CORPUS N. 22.779-PR (2002.0066839-6) Relatora: Ministra Nancy Andrighi Impetrante: Lúcio Ricardo Marcon Impetrado: Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná Paciente: Pedro José Marcon EMENTA Constitucional e Comercial. Habeas corpus. Falência. Prisão administrativa. - A prisão administrativa prevista no art. 35 da Lei de Falências não subsiste, porque em desacordo com os incisos LXI e LXVII do art. 5º da Constituição Federal. - Precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal. RSSTJ, a. 5, (21): 255-279, agosto 2011 269 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conceder a ordem, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Castro Filho, Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes Direito votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro. Brasília (DF), 08 de novembro de 2002 (data do julgamento). Ministro Ari Pargendler, Presidente Ministra Nancy Andrighi, Relatora DJ 16.12.2002 RELATÓRIO A Sra. Ministra Nancy Andrighi: Cuida-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado por Lúcio Ricardo Marcon em favor de Pedro José Marcon. O ora paciente é sócio da empresa Indústria e Comércio de Madeiras Marcon Ltda. Em 30.08.1999, tal empresa ajuizou pedido de concordata preventiva, sustentando que as dificuldades econômicas em que se encontrava a impediam de solver seus compromissos perante os seus credores. Pugnou pelo deferimento do pedido para que o seu passivo fosse adimplido no percentual de 100%, no prazo de 02 anos, em duas parcelas, sendo 40% no primeiro ano e 60% no segundo (fls. 14-22). O processamento da concordata restou deferido pela decisão às fls. 46-49. Posteriormente, a empresa requereu a conversão do pedido de concordata preventiva em auto-falência, alegando dificuldades no cumprimento das obrigações assumidas nos termos avençados perante o d. Juízo (fls. 62-67). Verificou-se que a empresa da qual o paciente figura como representante legal descumprira vários dispositivos legais atinentes à concordata preventiva presentes na Lei de Falência, emitira duplicatas fraudulentamente, incluíra indevidamente bens para compor o seu ativo, demonstrara inação na continuidade dos negócios e alienara o imóvel sede da empresa a terceiro. Em virtude dessas constatações, o d. Juízo a quo declarou rescindida a concordata preventiva e decretou a falência da aludida empresa. Outrossim, declarou sem efeito em relação à massa a alienação do mencionado imóvel e decretou antecipadamente a prisão do paciente, representante legal da falida, em 270 SÚMULAS - PRECEDENTES caso de descumprimento do disposto no art. 34 da Lei de Falências, com lastro no art. 35 desse diploma legal (decisão às fls. 72-78). Inconformado, o paciente levou a r. decisão prolatada ao crivo do eg. Tribunal a quo. O v. acórdão restou assim ementado: Agravo de instrumento. Concordata preventiva. Tentativa de elidir credores. Aplicabilidade do art. 150 da Lei de Falências. Rescisão da concordata. Falência decretada. Recurso desprovido. Decisão unânime. - Se presentes requisitos autorizadores para a rescisão da concordata, pode o juiz rescindi-la ex officio, a pedido dos credores ou do comissário, ainda mais quando evidente o intuito da concordatária de tentar elidir o pagamento dos credores. - O síndico é parte legítima para figurar no pólo passivo do agravo de instrumento sobre decisão que decretou a quebra da concordatária, tendo em vista que se incluem, dentre suas atribuições, a defesa dos interesses da massa falida. Particularmente sobre a decretação da prisão do paciente com lastro no art. 35 da LF, assim se manifestou o eg. Tribunal a quo: No que pertine à decretação da prisão do sócio Pedro José Marcon, mais uma vez decidiu com brilhantismo o ilustre magistrado a quo. Como já foi amplamente discutido, o falido tentou de todas as formas elidir o pagamento das dívidas, utilizando-se, inclusive, de meios fraudulentos para enganar o Juízo, havendo sérias evidências de crime falimentar. Assim, mais uma vez agiu acertadamente o ínclito Dr. Juiz de Direito ao decretar a prisão administrativa do falido, com a total observância dos artigos 14, VI e 35 da Lei de Falências. (fl. 160). Sobreveio a impetração de habeas corpus, com pedido liminar, perante este Tribunal. Em suas razões, assevera o impetrante que a decretação da prisão do paciente configura constangimento ilegal, pois com a promulgação da Constituição de 1988 não se fez mais possível a decretação de prisão administrativa na falência. Colacionou julgados no mesmo sentido da tese explicitada. O pedido liminar foi deferido às fls. 174-176. As informações da autoridade tida por coatora foram prestadas às fls. 182210. O Ministério Público Federal opinou pela concessão da ordem no parecer às fls. 212-214. É o relatório. RSSTJ, a. 5, (21): 255-279, agosto 2011 271 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VOTO A Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relatora): Nos termos do Decreto-Lei n. 7.661/1945, a prisão do falido pode ser decretada em duas situações distintas: a) art. 14, VI - possibilidade da decretação da prisão civil do falido pela existência de indícios da prática de crime falimentar. Conforme decidido pelo STF no Habeas Corpus n. 81.880-3, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de 30.08.2002, trata-se de prisão preventiva, cuja decretação deve se fundar no art. 312 do CPP; b) art. 35 - possibilidade de decretação da prisão civil do falido por descumprimento das obrigações que assumira, previstas no art. 34 da Lei. Pela decisão às fls. 72-78 e pelo v. acórdão às fls. 154-162, infere-se que a constrição ergastular perpetrada contra o paciente é de natureza administrativa, pois se funda no descumprimento das obrigações que assumira perante o juízo falimentar. A jurisprudência assente neste Tribunal veda a decretação da prisão administrativa do falido com base no art. 35 da LF, posto que contraria os preceitos legais insculpidos nos incisos LXI e LXVII da Magna Carta. Nesse sentido estão os seguintes precedentes jurisprudenciais: Civil. Habeas corpus. Falência. Deveres do falido. Decreto-Lei n. 7.661/1945, arts. 34 e 35. Desobediência. Prisão. Constrangimento ilegal. Concessão da ordem. I. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal já firmou que a prisão administrativa prevista no art. 35 da Lei de Falências não subsiste, porque em confronto com a disposição constante do art. 5º, LXVII, da Constituição Federal. II. Ordem concedida. (Habeas Corpus n. 19.745, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ de 29.04.2002). Habeas corpus. Falência. Prisão administrativa. I - A prisão administrativa prevista no art. 35 da Lei de Falências não subsiste, porque em desacordo com os incisos LXI e LXVII do art. 5º da Constituição Federal. Precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal. II - Ordem concedida. (Habeas Corpus n. 19.308, Rel. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, DJ de 15.04.2002). A questão restou igualmente dirimida pelo STF quando do julgamento do Recurso Ordinário em Habeas Corpus n. 76.741-1, Rel. Min. Moreira Alves, DJ de 22.05.1998. 272 SÚMULAS - PRECEDENTES Dessa forma, afigura-se ilegal a decretação da prisão administrativa do ora paciente, nos termos da jurisprudência assente neste Tribunal e no eg. STF. Forte em tal razão, concedo a ordem de habeas corpus. É como voto. HABEAS CORPUS N. 26.184-RJ (2002.0176426-9) Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior Impetrante: Valmery Jardim Guimarães - Defensor Público Impetrado: Nona Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro Paciente: Carlos Roberto Alves Valente EMENTA Civil. Habeas corpus. Falência. Deveres do falido. Decreto-Lei n. 7.661/1945, arts. 34 e 35. Desobediência. Prisão. Constrangimento ilegal. Concessão da ordem. I. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal já firmou que a prisão administrativa prevista no art. 35 da Lei de Falências não subsiste, porque em confronto com a disposição constante do art. 5º, LXVII, da Constituição Federal. II. Ordem concedida. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, conceder a ordem, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo Teixeira, Barros Monteiro e Ruy Rosado de Aguiar. RSSTJ, a. 5, (21): 255-279, agosto 2011 273 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Custas, como de lei. Brasília (DF), 11 de fevereiro de 2003 (data do julgamento). Ministro Aldir Passarinho Junior, Presidente e Relator DJ 31.03.2003 RELATÓRIO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: O Defensor Público Valmery Jardim Guimarães impetrou habeas corpus em favor de Carlos Roberto Alves Valente, objetivando afastar decreto de prisão emanado do Juízo da 2ª Vara Empresarial de Falências e Concordatas da Comarca do Rio de Janeiro, RJ, expedido com base no descumprimento das obrigações constantes do art. 34 do Decreto-Lei n. 7.661/1945, nos Autos n. 98.001167943-7, relativo à falência da empresa Socram Materiais de Construção Ltda. Afirmou que reiterou a revogação do constrangimento sem sucesso, até que impetrou igual pedido perante o C. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (HC n. 2002.14400133), diante da insubsistência daquele dispositivo frente à nova ordem constitucional, que não admite qualquer modalidade de prisão por dívida, com fulcro em pacífica jurisprudência deste Tribunal, porém também não logrou o intento, pela repetição pura e simples do argumento de infringência dos deveres do falido, sem que fosse indicado em qual inciso encontrar-se-ia incurso o paciente. O acórdão da 9ª Câmara Cível, que por unanimidade denegou a ordem, ficou assim redigido (fl. 56): Habeas corpus. Falência. Prisão administrativa do falido (arts. 34 e 35 da Lei n. 7.661/1945). Legalidade. Não há ilegalidade na prisão administrativa do falido em face da atual constituição. Por força da falência, os sócios devem cumprir as obrigações estatuídas no art. 34 da lei especial. Ordem denegada. Ao presente writ substitutivo de recurso, consubstanciado nas razões supra, o Exmo. Sr. Ministro Presidente, em regime de plantão, deferiu liminar para obstar o decreto de prisão confirmado pelo julgamento no TJRJ, sem que tenha sido informada a impugnação oportuna mediante recurso próprio. 274 SÚMULAS - PRECEDENTES Feitas as comunicações de estilo, não foi determinada a solicitação de esclarecimentos à autoridade apontada coatora. Às fls. 69-72, opina o douto Ministério Público Federal, em parecer da lavra da Subprocuradora-Geral da República, Dra. Armanda Soares Figueirêdo, pela concessão da ordem. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior (Relator): Como visto do relatório, cuida-se de habeas corpus substitutivo de recurso ordinário, interposto contra acórdão prolatado pelo Colendo Tribunal de Justiça do Estado do Estado do Rio de Janeiro, que denegou a ordem que buscava sustar decreto de prisão por descumprimento das obrigações do falido, previstas no art. 34 do Decreto-Lei n. 7.661/1945. Este Tribunal Superior já teve oportunidade de se pronunciar sobre a matéria constante destes autos, litteris: Falência. Prisão do comerciante. Habeas-corpus. - Inexiste prisão civil fora do que excepciona a Constituição Federal. - Ordem concedida. (6ª Turma, HC n. 12.172-PR, Rel. Min. Fontes de Alencar, unânime, DJU de 18.06.2001) Civil. Habeas corpus. Falência. Deveres do falido. Decreto-Lei n. 7.661/1945, arts. 34 e 35. Desobediência. Prisão. Constrangimento ilegal. Concessão da ordem. I. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal já firmaram que a prisão administrativa prevista no art. 35 da Lei de Falências não subsiste, porque em confronto com a disposição constante do art. 5º, LXVII, da Constituição Federal. II. Ordem concedida. (4ª Turma, HC n. 18.029-RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, unânime, DJU de 18.02.2002). Também o Egrégio Supremo Tribunal Federal, em precedente da relatoria do eminente Ministro Moreira Alves, posicionou-se no mesmo sentido, corroborando o entendimento acima, em aresto assim ementado: RSSTJ, a. 5, (21): 255-279, agosto 2011 275 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Recurso ordinário em habeas corpus. - Como bem acentua o parecer da Procuradoria-Geral da República, em princípio, a superveniência da condenação criminal não torna sem efeito a prisão - que é medida administrativa de caráter coercitivo e não punitivo - decretada no processo cível falimentar que tem outra finalidade. Assim sendo, e estando revogado o artigo 35 da Lei de Falências pelos incisos LXI e LXVII do artigo 5º da Constituição que não admitem essa modalidade de prisão, impõe-se o provimento do presente recurso ordinário para que se casse o decreto dessa prisão. Recurso ordinário provido. (RHC n. 76.741-1-MG, unânime, DJU de 22.05.1998). Com efeito, não se pode confundir a medida administrativa e coercitiva, civil, prevista no art. 35 da Lei de Falências, com o intuito de conceder efetividade às disposições do art. 34 da mesma norma, com as figuras descritivas de condutas criminosas de seus artigos subseqüentes, ainda que subsistam no ordenamento jurídico as obrigações impostas ao falido. Porém, a Constituição Federal não excepcionou quanto ao caso específico em seu art. 5º, LXVII, não se podendo estender para além daqueles limites as hipóteses de prisão, havendo que se considerar derrogada qualquer modalidade de restrição legal da liberdade que com ela esteja em confronto. Ante o exposto, confirmando a liminar em plantão deferida, concedo o habeas corpus, determinando sejam feitas as comunicações de estilo. É como voto. HABEAS CORPUS N. 26.196-SP (2002.0176494-1) Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar Impetrante: Edu Eder de Carvalho Impetrado: Primeira Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Paciente: Armando Martins Cordeiro Júnior 276 SÚMULAS - PRECEDENTES EMENTA Habeas corpus. Falência. Prisão civil. Não subsiste a prisão administrativa prevista no art. 35 da LF. Precedentes. Ordem concedida. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conceder a ordem, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Fernando Gonçalves, Aldir Passarinho Junior, Sálvio de Figueiredo Teixeira e Barros Monteiro votaram com o Sr. Ministro-Relator. Brasília (DF), 25 de março de 2003 (data do julgamento). Ministro Aldir Passarinho Junior, Presidente Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Relator DJ 14.04.2003 RELATÓRIO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: Edú Eder de Carvalho impetrou habeas corpus, com pedido de liminar, em favor de Armando Martins Cordeiro Júnior, contra o acórdão proferido pela egrégia Primeira Câmara da Seção de Direito Privado do TJSP, que denegou a ordem de habeas corpus e, assim, manteve a prisão administrativa do paciente, decretada no processo de falência, em curso na 30ª Vara Cível Central de São Paulo. Alega que a referida prisão não deveria ser decretada, pois o paciente não teve o conhecimento da sentença declaratória da falência e, ainda, porque referida modalidade de prisão não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988. Deferi a liminar, com a seguinte decisão: RSSTJ, a. 5, (21): 255-279, agosto 2011 277 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Defiro a liminar para suspender o cumprimento da ordem de prisão. De acordo com recentes precedentes deste Tribunal, não mais se admite a prisão administrativa no processo de falência: Habeas corpus. Falência. Prisão administrativa. I - A prisão administrativa prevista no art. 35 da Lei de Falências não subsiste, porque em desacordo com os incisos LXI e LXVII do art. 5º da Constituição Federal. Precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal. II - Ordem concedida (HC n. 19.308-SP, 3ª Turma, rel. o em. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 15.04.2002). Decreto-Lei n. 7.661/1945, arts. 34 e 35. Desobediência. Prisão. Constrangimento ilegal. Concessão da ordem. I. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal já firmou que a prisão administrativa prevista no art. 35 da Lei de Falências não subsiste, porque em confronto com a disposição constante do art. 5º, LXVII, da Constituição Federal. II. Ordem concedida (HC n. 19.745-PR, 4ª Turma, rel. o em. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ 29.04.2002). Posto isso, concedo a liminar. Oficie-se. Vindas as informações, vista ao douto MPF (fls. 19-20). Foram prestadas as informações, juntamente com as cópias de peças processuais (fls. 27-39). O d. MPF opinou pela concessão da ordem. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar (Relator): As duas Turmas da Seção de Direito Privado consolidaram o entendimento de ser inadmissível a prisão administrativa de administrador de empresa falida. Cito as ementas de nossos precedentes: Civil. Habeas corpus. Falência. Deveres do falido. Decreto-Lei n. 7.661/1945, arts. 34 e 35. Desobediência. Prisão. Constrangimento ilegal. Concessão da ordem. 278 SÚMULAS - PRECEDENTES I. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal já firmou que a prisão administrativa prevista no art. 35 da Lei de Falências não subsiste, porque em confronto com a disposição constante do art. 5º, LXVII, da Constituição Federal. II. Ordem concedida (HC n. 19.745-PR, rel. o em. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ 29.04.2002). Processual Penal. Constitucional. Lei de Falência. Prisão administrativa. Não recepção pela CF/1988. Impossibilidade. - Em face da nova ordem constitucional, que restringiu a prisão civil às exclusivas hipóteses de depositário infiel e do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia (CF, art. 5º, LXVII), restou abolida a prisão administrativa prevista no art. 35, da Lei de Falências. - Habeas corpus concedido de ofício (HC n. 13.548-SP, rel. o em. Min. Vicente Leal, DJ 06.05.2002). Habeas corpus. Falência. Prisão administrativa. I - A prisão administrativa prevista no art. 35 da Lei de Falências não subsiste, porque em desacordo com os incisos LXI e LXVII do art. 5º da Constituição Federal. Precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal. II - Ordem concedida (HC n. 19.308-SP, rel. o em. Min. Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 15.04.2002). Constitucional. Habeas corpus. Lei de Falência. Prisão administrativa. Impossibilidade. - Em face da nova ordem constitucional, que restringiu a prisão civil às exclusivas hipóteses de depositário infiel e do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia (CF, art. 5º, LXVII), restou abolida a prisão administrativa prevista no art. 35, da Lei de Falências. - Habeas corpus concedido (HC n. 15.046-CE, rel. o em. Min. Vicente Leal, DJ 18.02.2002). Falência. Prisão do comerciante. Habeas corpus. - Inexiste prisão civil fora do que excepciona a Constituição Federal. - Ordem concedida (HC n. 12.172-PR, rel. o em. Min. Fontes de Alencar, DJ 18.06.2001). Posto isso, defiro a ordem. É o voto. RSSTJ, a. 5, (21): 255-279, agosto 2011 279 Súmula n. 281 SÚMULA N. 281 A indenização por dano moral não está sujeita à tarifação prevista na Lei de Imprensa. Referências: CC/1916, art. 159. Lei n. 5.250/1967, art. 49. Precedentes: AgRg no REsp 323.856-RS (3ª T, 02.08.2001 – DJ 27.08.2001) REsp 168.945-SP (3ª T, 06.09.2001 – DJ 08.10.2001) REsp 169.867-RJ (4ª T, 05.12.2000 – DJ 19.03.2001) REsp 213.188-SP (4ª T, 21.05.2002 – DJ 12.08.2002) REsp 453.703-MT (4ª T, 21.10.2003 – DJ 1º.12.2003) REsp 513.057-SP (4ª T, 18.09.2003 – DJ 19.12.2003) Segunda Seção, em 28.04.2004 DJ 13.05.2004, p. 200 AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL N. 323.856-RS (2001/0059908-1) Relatora: Ministra Nancy Andrighi Agravante: Zero Hora Editora Jornalística S/A e outros Advogado: Fernando Ricardo Mostiack Agravado: Aldo de Souza Temperam Pereira Advogado: Talai Djalma Selistre e outros EMENTA Agravo no recurso especial. Processual Civil e Civil. Reexame de prova. Impossibilidade. Danos morais. Indenização. Lei de Imprensa. Tarifação. Inaplicabilidade. Na via especial, não é possível o reexame das provas produzidas pelas partes. Hipótese em que as matérias jornalísticas atacam a pessoa do magistrado, e não os atos por ele praticados no exercício da judicatura, de forma a restar descaracterizada a “crítica inspirada no interesse público” (art. 27, VIII, da Lei de Imprensa). A fixação do valor da indenização por danos morais não está sujeita ao tarifamento positivado na Lei de Imprensa (Lei n. 5.250/1967). ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental. Os Srs. Ministros Castro Filho, Antônio de Pádua Ribeiro, Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes Direito votaram com a Sra. Ministra Relatora. Brasília (DF), 02 de agosto de 2001 (data do julgamento). Ministro Ari Pargendler, Presidente Ministra Nancy Andrighi, Relatora DJ 27.08.2001 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RELATÓRIO A Sra. Ministra Nancy Andrighi: Cuida-se de Agravo interposto por Zero Hora Editora Jornalística S/A e outros contra decisão que, com fundamento no art. 557, do CPC, negou seguimento ao recurso especial interposto contra acórdão proferido em ação de conhecimento em que se pretende a indenização por danos morais decorrentes de veiculação de matéria jornalística em que são expendidas críticas à decisão proferida pelo ora agravado no exercício da judicatura. A decisão agravada está assim ementada: Recurso especial. Processual Civil e Civil. Reexame de prova. Impossibilidade. Danos morais. Indenização. Lei de Imprensa. Tarifação. Inaplicabilidade. Divergência jurisprudencial. Súmula n. 83 do STJ. Na via especial, não é possível o reexame das provas produzidas pelas partes. A fixação do valor da indenização por danos morais não está sujeito ao tarifamento positivado na Lei de Imprensa (Lei n. 5.250/1967). Não se conhece o recurso especial pela letra c do permissivo constitucional na hipótese em que este Col. Tribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão recorrido (Súmula n. 83 do STJ). Manifesta o agravante a sua irresignação nos seguintes termos: a) o exame da alegada violação ao art. 27, VIII, da Lei de Imprensa não demanda o reexame de provas, mas apenas a valoração destas, devendo, por conseguinte, o recurso especial ser conhecido; b) a Lei de Imprensa “impõe ao responsável pela divulgação a tarifa máxima de 05 (cinco) salários mínimos (art. 51, II) para os casos de injúria e limita a responsabilidade do veículo de divulgação a 10 (dez) vezes esta penalidade”, pelo que “a condenação, na espécie, não poderia ultrapassar os 50 (cinqüenta) salários mínimos”. É o relatório. VOTO A Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relatora): I - Art. 27, VIII, da Lei de Imprensa. Com relação à alegada violação ao art. 27, VIII, da Lei de Imprensa, o acórdão proferido pelo Tribunal a quo pronunciou-se nos seguintes termos: 286 SÚMULAS - PRECEDENTES No caso sob exame, as manifestações via imprensa escrita e falada, por óbvio, transcenderam a esfera jornalística e incidiram em ofensa a pessoa do apelado. Não se trata de mera crítica à manifestação a ato emanado do Poder Judiciário, conforme argumentam os apelantes. Ao contrário, do teor daquelas publicações possível extrair cunho ofensivo e pejorativo, especificamente à pessoa do apelado, refletindo sobre sua esfera pessoal, social e profissional. As reportagens valem-se de expressões tais como: “Em seu despacho, Temperani Pereira debocha do parlamento, afronta a democracia e não honra as melhores tradições da magistratura gaúcha” (...). E, em outra oportunidade: “Em resumo, esse senhor debocha do parlamento, do plenário, e não honra seu papel como magistrado (...)”. Não há que se falar, conforme argumentam os apelantes, que as manifestações jornalísticas se encontram sustentadas no interesse coletivo, social e público (artigo 27, VIII, Lei n. 5.250/1967) e que não houve ataque pessoal ao magistrado, mas sim a ato da autoridade judiciária. Ora, as acusações deram-se exclusivamente ao magistrado, na medida em que, inclusive, faz referência, o jornalista, de que o apelado desonra seu papel como magistrado e desmerece a magistratura gaúcha. De se observar que discordâncias ou insatisfação com decisões judiciais merecem remédio jurídico próprio, via judicial, e nunca ataque à pessoa do magistrado, como se verificou no caso sob exame. Por isso, tenho que desnecessária a análise do teor do ato jurisdicional criticado para que reste reconhecida a lesão de ordem moral. Ainda que afastado o óbice do Enunciado da Súmula n. 7 do STJ e examinada a controvérsia sob a ótica da valoração da prova, o exame da alegada violação ao art. 27, VIII, da Lei de Imprensa, não alteraria a conclusão da decisão agravada. As expressões ofensivas inseridas nas matérias jornalísticas e destacadas pelo acórdão recorrido evidenciam um ataque à pessoa do ora agravado, e não ao atos por ele praticados no exercício da judicatura, não configurando tais manifestações “crítica inspirada no interesse público” (art. 27, VIII, da Lei de Imprensa). Dessa forma, sendo inaplicável, ao caso, a excludente positivada no apontado dispositivo federal, é o ora agravante responsável pelos danos morais decorrentes da veiculação das matérias jornalísticas em questão. II - Arts. 51, II, e 52, ambos da Lei de Imprensa. No que diz respeito aos arts. 51, II, e 52, ambos da Lei de Imprensa, o entendimento esposado pelo Tribunal a quo e pela decisão ora agravada está RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 287 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA em harmonia com a jurisprudência desta Col. Corte de Justiça, que se firmou no sentido de que a fixação do valor da indenização por danos morais não está sujeita ao tarifamento positivado na Lei de Imprensa. Nesse sentido, os seguintes precedentes: REsp n. 196.424-RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, DJ 28.05.2001; REsp n. 295.175-RJ, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 02.04.2001; REsp n. 258.799-RJ, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ 19.03.2001; REsp n. 169.867-RJ, Rel. Min. Cesar Asfor Rocha, DJ 19.03.2001. Forte em tais razões, nego provimento ao Agravo. É o voto. RECURSO ESPECIAL N. 168.945-SP (98/0022105-0) Relator: Antônio de Pádua Ribeiro Recorrente: Afanasio Jazadji Advogado: Elisabeth V de Gennari e outros Recorrido: Igreja Universal do Reino de Deus e outro Advogado: Rubens Moraes Salles e outros EMENTA Processo Civil. Liquidação de sentença. Nulidade. Danos morais. Lei de Imprensa. Quantum indenizatório. I - A indenização por dano moral objetiva compensar a dor moral sofrida pela vítima, punir o ofensor e desestimular este e outros membros da sociedade a cometerem atos dessa natureza. II - Segundo reiterados precedentes, o valor da indenização por dano moral sujeita-se ao controle desta Corte, recomendando-se que a sua fixação seja feita com moderação. III - Conforme jurisprudência desta Corte, com o advento da Constituição de 1988 não prevalece a tarifação da indenização devida por danos morais. 288 SÚMULAS - PRECEDENTES IV - Se para a fixação do valor da verba indenizatória, consideradas as demais circunstâncias do ato ilícito, acaba sendo irrelevante o fato de ter havido provocação da vítima, não é nula a decisão que, em liquidação de sentença, faz referência a tal fato. Não há, no caso, modificação na sentença liquidanda. V - Recurso especial conhecido e parcialmente provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe parcial provimento. Os Srs. Ministros Ari Pargendler, Carlos Alberto Menezes Direito, Nancy Andrighi e Castro Filho votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília (DF), 06 de setembro de 2001 (data do julgamento). Ministro Ari Pargendler, Presidente Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Relator DJ 08.10.2001 RELATÓRIO O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro: Trata-se de recurso especial fundado nas letras a e c do permissivo constitucional em que se alega violação aos arts. 125, 126, 128, 165, 264, 458, 459, 460, 469, 471, 515, 535 e 610, todos do CPC, além de dissídio jurisprudencial. Insurge-se o recorrente contra acórdão que, em liquidação de sentença condenatória por danos morais, fixou a indenização conforme os valores tarifados da Lei de Imprensa, totalizando-a em 200 salários mínimos. Requer a majoração daquele valor para patamar mais elevado, sendo considerados, entre outros elementos, o ânimo de ofender e a capacidade econômica dos recorridos. Alternativamente, pleiteia a nulidade do acórdão, pois não reconheceu que a sentença teria extravasado os limites da sentença condenatória e versado fatos estranhos a esta última. É o relatório. RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 289 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VOTO O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro (Relator): Quanto à alegação de nulidade do acórdão, padece de razão o inconformismo. Como se depreende dos autos, no presente caso é irrelevante, para fixação do quantum indenizatório, a existência de provocação das recorridas pelo recorrente ou aqueles outros fatos que o recorrente destacou da decisão de liquidação. A uma porque, em primeiro grau, o julgador estipulou a quantia de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), valor de vulto e generoso em demasia, com base no “binômio capacidade financeira e a ofensa ao direito da personalidade” (fl. 1.072). A duas, porque o colegiado, em sede de apelação, reformou a sentença conforme o critério objetivo da Lei de Imprensa. Ambas as soluções, de qualquer forma, destoam da orientação que vem sendo firmada na jurisprudência desta Corte. Assim sendo, não ocorreu modificação da sentença que pôs termo à lide. Desrespeitar a coisa julgada, que determinou a liquidação por arbitramento, seria, in casu, desconsiderar a ocorrência do dano moral. Este considerado, impende fixar o justo valor da reparação, o qual, independentemente daqueles fatos a que faz referência a sentença de liquidação, pode ser estipulado sem os limites estabelecidos pelo Tribunal a quo com base na Lei de Imprensa. É de se ressaltar que tais limites indenizatórios da lei especial não mais imperam, porquanto a jurisprudência desta Superior Corte já sedimentou a orientação de que, após o advento da Constituição de 1988, a reparação deve alcançar a extensão do dano, obedecido o princípio da razoabilidade. Nesse sentido, confiram-se os seguintes julgados: Civil e Processual. Ação de indenização. Acórdão. Omissão não configurada. Nulidade afastada. Publicação de matéria considerada injuriosa, difamatória e caluniosa. Dano moral. Fixação do montante. Culpa reconhecida. Lei de Imprensa, arts. 51 e 52. Ressarcimento tarifado. Não recepção pela Carta de 1988. CC, art. 159. Redução do quantum. Guiou-se a jurisprudência das Turmas integrantes da 2ª Seção do STJ, no sentido de que, em face da Constituição de 1988, não mais prevalece a tarifação da indenização devida por dano moral, decorrente de publicação considerada ofensiva à honra e dignidade das pessoas (REsp n. 226.956-RJ, Relator Ministro Aldir Passarinho Júnior, 4ª T., DJ de 25.09.2000). Responsabilidade civil. Dano moral. Lei de Imprensa. Decadência. Limitação do quantum indenizatório. 290 SÚMULAS - PRECEDENTES - A limitação prevista pela Lei de Imprensa quanto ao montante da indenização não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988. Admissibilidade da fixação do quantum indenizatório acima dos limites ali estabelecidos (REsp n. 89.156-MS, Relator Ministro Barros Monteiro, 4ª T., DJ de 21.08.2000). Responsabilidade civil. Lei de Imprensa. Dano moral indenizado acima da limitação imposta pelo art. 52 da Lei de Regência. Não recepção da norma pela Constituição em vigor. Depósito do art. 57, § 6º da mesma lei. Descabimento de sua exigência por não recepcionado pela Carta Federal. Interpretação sistemática. Recurso desacolhido. O depósito prévio à apelação, no valor total da condenação imposta a título de indenização por dano moral advindo da atividade jornalística, foi concebido na vigência de um sistema que previa a indenização tarifada. Adotando-se nas instâncias ordinárias indenização que ultrapasse esse valor máximo, há que se ter, por força de interpretação sistemática do dispositivo que impõe o depósito, por inaplicável também tal exigência (REsp n. 72.415-RJ, Relator Ministro Waldemar Zveiter, 3ª T., DJ de 31.08.1998). Recurso especial. Dano moral. Lei de Imprensa. Limite da indenização. Prova do dano. Prequestionamento. O dano moral e o efeito não patrimonial da lesão de direito, recebendo a CF/1988, na perspectiva do relator, um tratamento próprio que afasta a reparação dos estreitos limites da lei especial que regula a liberdade de manifestação do pensamento e de informação. De fato, não teria sentido pretender que a regra constitucional que protege amplamente os direitos subjetivos privados nascesse limitada pela lei especial anterior ou, pior ainda, que a regra constitucional autorizasse um tratamento discriminatório (REsp n. 52.842-RJ, Relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, 3ª T., DJ de 27.10.1997). No presente recurso, pretende-se a majoração do valor fixado a título de indenização pelo dano moral sofrido pelo recorrente. Assim sendo, considerados os fatos tais como postos no acórdão recorrido, cabe analisar se o montante da indenização deferido é adequado - nem irrisório, nem excessivo - para efetivar a justa compensação à vítima do dano. Deve-se, pois, atentar aos parâmetros da razoabilidade, ou seja, ponderar as peculiaridades do caso concreto e estabelecer valores que possam significar uma compensação à vítima - ainda que precária, pois dor não se contabiliza - e, ao mesmo tempo, um incentivo para que o ofensor não venha a incidir novamente na conduta indesejada. Nesse contexto, não seria razoável uma indenização irrisória, que pouco significasse ao ofendido, nem uma indenização excessiva, com a qual o autor do fato não pudesse arcar sem enormes prejuízos, também socialmente indesejáveis. RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 291 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA A indenização por dano moral objetiva compensar a dor moral sofrida pela vítima, punir o ofensor e desestimular este e a sociedade a cometerem atos dessa natureza. Ademais, segundo vem sendo, reiteradamente, decidido, o valor da indenização por dano moral sujeita-se ao controle desta Corte, recomendandose que a sua fixação seja feita com moderação. No caso, é cabível a elevação daquele montante fixado no acórdão recorrido, mormente se considerada a gravidade da ofensa constatada nos autos, tal como exemplifica o trecho a seguir transcrito: A par da destruição das fitas de gravação dos programas, pesam contra as rés os depoimentos de fl. 473 e 478, onde se lembram referência a homossexualismo e trocadilhos com o nome do demandante, a associá-lo com Satanás, diabo e demônio. (fl. 678). Não me parece, pois, suficiente, tanto do ponto de vista punitivo como da reparação, o montante de 200 salários mínimos. Ao mesmo tempo, imprudente acatar o pedido inaugural do autor, porquanto é de se repudiar o enriquecimento sem causa, caracterizado por indenizações milionárias que exasperam demais as conseqüências previstas no art. 159 do Código Civil. Em caso, envolvendo dano moral, esta Corte decidiu: Civil e Processual Civil. Responsabilidade civil. Imprensa. Notícia jornalística imputando leviana e inverídica a Juíza Federal. Fraude do INSS. Pálida retratação. Responsabilidade tarifada. Inaplicabilidade. Não-recepção pela Constituição de 1988. Dano moral. Quantum indenizatório. Controle pelo Superior Tribunal de Justiça. Precedente. Recurso parcialmente provido. I - A responsabilidade tarifada da Lei de Imprensa não foi recepcionada pela Constituição de 1988. II - O valor da indenização por dano moral sujeita-se ao controle do Superior Tribunal de Justiça, sendo certo que, na fixação da indenização a esse título recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, observando a circunstâncias do caso, aplicáveis a respeito os critérios da Lei n. 5.250/1967. III - Sem embargo da leviandade da notícia jornalística, a atingir a pessoa de uma autoridade digna e respeitada, e não obstante se reconhecer que a condenação, além de reparar o dano, deve também contribuir para desestimular a repetição dos atos deste porte, a Turma houve por bem reduzir na espécie o valor arbitrado para manter coerência com seus precedentes e em atenção aos parâmetros legais. (REsp n. 295.175-RJ, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, 4a T, DJ de 02.04.2001). 292 SÚMULAS - PRECEDENTES Neste precedente, o valor atribuído para a compensação do dano moral discutido monta a R$100.000,00. Versou-se sobre danos advindos de notícia difamatória publicada em jornal. A vítima era uma conceituada magistrada. Em outro caso, de que fui Relator (REsp n. 162.545-RJ), versando sobre dano moral que atingiu Ex-Presidente da República e resultou de reiteradas publicações, inclusive editoriais, de cunho profundamente ofensivo, segundo reconhecido pelas instâncias ordinárias, esta Turma estipulou em R$ 194.400,00 o valor da verba indenizatória. O acórdão ficou assim ementado: Processo Civil e Direito Civil. Recurso especial. Indenização. Danos morais. Controle pelo STJ. Inaplicabilidade do art. 1.547 do CCB. Lei de Imprensa, arts. 51 e 52. Ressarcimento tarifado. Não recepção pela Constituição de 1988. I - Não mais prevalece, a partir da Constituição em vigor, a indenização tarifada, prevista na Lei de Imprensa, devida por dano moral, por publicação considerada ofensiva à honra e à dignidade das pessoas. Precedentes. II - A norma constante do art. 1.547, parágrafo único, do Código Civil, não se compatibiliza com o sistema de dias-multa, que veio a ser adotado pelo Código Penal, de maneira genérica, para todos os crimes. Precedentes III - O valor da indenização por dano moral não escapa ao controle do STJ. Assim se entendeu em razão dos manifestos e freqüentes abusos na estipulação das verbas indenizatórias, especialmente os decorrentes de dano moral. Precedentes. IV - Os insultos associados à pessoa considerada autoridade pública devem ser necessariamente punidos, de maneira a desestimular o agressor a repetir atos dessa natureza. V - Recurso especial conhecido, em parte, e, nessa parte, provido. Nesse contexto, parece-me razoável que o valor da indenização, no caso, possa equivaler-se àqueles estipulados para o primeiro caso citado, porquanto o segundo refere-se, sem dúvida, a hipóteses de gravidade significativamente maior, porquanto relativa a fatos geradores de aborrecimentos de maior amplitude e de grande repercussão nacional. Por isso, o valor fixado no aresto recorrido deve ser elevado, eis que fixado em valor pouco expressivo. Isso posto, em conclusão, conheço do recurso e dou-lhe parcial provimento para aumentar o valor da indenização para R$ 100.000,00 (cem mil reais), valor este a ser considerado nesta data, a partir da qual deverão incidir os acréscimos legais. RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 293 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VOTO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito: Senhor Presidente, acompanho o eminente Senhor Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, considerando que, no caso, não se cuida de pedido de revisão do valor do dano moral fixado nas instâncias ordinárias. Ao contrário, o que se está decidindo é superar o limite imposto pelo acórdão recorrido, no que concerne à indenização tarifada da Lei de Imprensa, para acompanhar a orientação da Corte, que já não mais admite tal teto, e a partir do conhecimento, por essa via, estabelecer o valor do dano moral em cem mil reais, atualizados desta data, na linha de precedentes da Corte em casos similares. VOTO O Sr. Ministro Castro Filho: - Sr. Presidente, noto que há no Tribunal uma preocupação muito grande e justa no sentido de evitar condenações excessivas. Algumas delas - partidas de certos Tribunais - chegam, deveras, às raias do escândalo. Se está a condenação ora fixada dentro dos parâmetros, nos quais vem se norteando, sensatamente, a Corte, estou plenamente de acordo com o voto do Sr. Ministro-Relator e, conhecendo do recurso, dou-lhe parcial provimento. RECURSO ESPECIAL N. 169.867-RJ (98.0023942-1) Relator: Ministro Cesar Asfor Rocha Recorrente: Luiz Alfredo Salomão Advogados: Guilherme Valdetaro Mathias e outros Recorrido: Geórgia de Carvalho Lima Advogado: Onurb Couto Bruno EMENTA Civil e Processual Civil. Ofensa à honra. Matéria veiculada em televisão. Legitimidade passiva do entrevistado. Indenização. Não tarifada. Quantificação. 294 SÚMULAS - PRECEDENTES Em se tratando de responsabilidade civil fundada em dano moral, admite-se que o pedido seja formulado sem se especificar o valor pretendido a título de indenização. A pessoa entrevistada que fez afirmação injuriosa veiculada em programa televisivo, de que decorreu a ação indenizatória de dano moral promovida pelo que se julga ofendido em sua honra, tem legitimidade para figurar no seu polo passivo. A Constituição de 1988 afastou, para a fixação do valor da reparação do dano moral, as regras referentes aos limites tarifados previstas pela Lei de Imprensa, sobretudo quando, como no caso, as instâncias ordinárias constataram soberana e categoricamente o caráter insidioso da matéria de que decorreu a ofensa. Precedentes. Ademais, a ação foi proposta com base no direito comum. “O valor da indenização por dano moral não pode escapar ao controle do Superior Tribunal de Justiça” (REsp n. 53.321-RJ, Min. Nilson Naves). Para se estipular o valor do dano moral devem ser consideradas as condições pessoais dos envolvidos, evitando-se que sejam desbordados os limites dos bons princípios e da igualdade que regem as relações de direito, para que não importe em um prêmio indevido ao ofendido, indo muito além da recompensa ao desconforto, ao desagrado, aos efeitos do gravame suportado. Recurso parcialmente conhecido e nessa parte parcialmente provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nessa parte, dar-lhe parcial provimento, nos termos do voto do Sr. MinistroRelator. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Ruy Rosado de Aguiar e Aldir Passarinho Júnior. Ausentes, ocasionalmente, os Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo Teixeira e Barros Monteiro. Brasília (DF), 05 de dezembro de 2000 (data do julgamento). RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 295 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Presidente Ministro Cesar Asfor Rocha, Relator DJ 19.03.2001 RELATÓRIO O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha: - Cuida-se de recurso especial, fundamentado nas alíneas a e c do permissivo constitucional, interposto contra v. acórdão do egrégio Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro resumido na seguinte ementa: Responsabilidade Civil. Entrevista em que candidato a deputado federal atribui a juíza de direito envolvimento com fraude eleitoral. Pedido genérico. Legitimidade. Dano moral. Arbitramento. Inépcia da inicial. Pedido genérico. Em se tratando de responsabilidade civil fundada em dano moral, admite-se a formulação de pedido genérico. Legitimidade ad causam passiva. Proposta a ação com base no direito comum, não se aplicam as normas da Lei de Imprensa. Demais, não pode a Lei de Imprensa restringir o direito assegurado constitucionalmente da haver indenização por ofensa à honra da parte de quem a praticou. A legitimidade passiva da empresa jornalística ou outra assemelhada ocorre quando a ela é imputado abuso no exercício do direito à liberdade de manifestação do pensamento e divulgação, o que não é a hipótese presente. Dano moral. A ofensa ao sentimento de honra dispensa comprovação. Indenização A fixação da indenização será feita em consideração à gravidade da ofensa e à repercussão do dano. (fl. 207). Rejeitados os declaratórios, insiste o recorrente, réu da ação indenizatória, sobre sua ilegitimidade passiva, sustentando negativa de vigência aos artigos: 296 SÚMULAS - PRECEDENTES a) 286 do Código de Processo Civil, porque a inicial seria inepta, já que não afirmado qual o valor pretendido na inicial, a título de indenização; b) 49, § 2º da Lei n. 5.250/1967, além do dissídio com julgados desta Corte e do c. STF (in RTJ 123/781), porquanto somente a empresa jornalística seria legitimada passivamente para a causa; e, c) 51 e 52 de referida Lei, que estabelecem a indenização no valor máximo correspondente a duzentos salários mínimos. Respondido, o recurso foi inadmitido na origem, tendo o seu curso sido desembaraçado em face do provimento que dei ao agravo de instrumento. Era o de importante a relatar. VOTO O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha (Relator): 1. A inicial não é inepta, pois que, como consignado do r. aresto hostilizado, em se tratando de responsabilidade civil fundada em dano moral a fixação do quantum indenizatório fica submetido ao prudente arbítrio do juiz, tendo em conta as peculiaridades presentes em caso examinado, por inexistirem critérios objetivos a nortear a parte no momento da formulação do pedido. 2. Aprecio agora a questão que reclama definição sobre se o autor da ofensa, veiculada pela imprensa, tem ou não legitimidade para figurar no polo passivo da ação ordinária para reparação de dano moral contra este intentada. Nesta fase, já não se discute mais nada no condizente com a autoria e com a existência da ofensa, estando o debate, neste ponto, limitado à questão processual da legitimidade passiva. Alega o recorrente que a responsabilidade seria exclusivamente da pessoa natural ou jurídica que explora o meio de comunicação. Já no julgamento do REsp n. 158.717-MS, a Segunda Seção deste Superior Tribunal de Justiça afastou a tese agora defendida pelo recorrente. Naquela oportunidade afirmei que a “ação pode ser proposta, a juízo do ofendido, contra a empresa que explora o meio de comunicação, contra o autor do escrito, ou contra os dois”, arrolando, dentre outros, os seguintes fundamentos: (...) nenhum prejuízo haveria, para ninguém, se ficasse ao alvedrio do ofendido escolher contra quem a ação deveria ser aforada: se contra o autor da informação, se contra a empresa que explora o meio de informação, ou se contra os dois. Ele - ofendido - mais do que ninguém saberá discernir sobre quem deverá chamar para responder pela reparação que reclama. RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 297 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA De mais a mais, tenho por pertinente anotar que muitas vezes o ofendido prefere investir contra o próprio autor da ofensa, seja porque o conforto íntimo da reparação moral se dá com maior intensidade quando esta recair contra o próprio ofensor, seja também pelo receio de despertar a ira da empresa proprietária do veículo, cujo poder é na grande maioria das vezes reconhecidamente maior que o do próprio autor da ofensa, por mais conceituado que este seja. Além de tudo isso, admitir que o autor da ofensa somente seja chamado a juízo regressivamente pela empresa de comunicação, além de dificultar o andamento do feito, por trazer também ao processo aquele a quem se impõe a culpa, implicaria, quando nada, na duplicação das contendas: uma, do ofendido contra a empresa; outra, da empresa contra o ofensor. Essas são, a meu sentir, as conclusões que podem ser extraídas das regras contidas na Lei n. 5.240/1967, a que se ajusta a espécie. Pontifica o seu art. 49 que “aquele que no exercício da liberdade de manifestação de pensamento e de informação, com dolo ou culpa, viola direito, ou causa prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar” os danos morais e materiais, nos casos que indica. Com efeito, em linha de princípio, quem deve reparar os danos é, nos termos da lei, “aquele que no exercício da liberdade de manifestação de pensamento e de informação, com dolo ou culpa, viola direito, ou causa prejuízo a outrem”. Assim, resulta evidente que a ofensa será respondida por quem a comete. É certo que o § 2º de mencionado dispositivo indica que “se a violação de direito ou o prejuízo ocorre mediante publicação ou transmissão em jornal, periódico, ou serviço de radiofusão, ou de agência noticiosa, responde pela reparação do dano a pessoa natural ou jurídica que explora o meio de informação ou divulgação”, tendo esta ação regressiva contra o autor do escrito (art. 50). Ora, quando a lei impõe a responsabilidade da pessoa natural ou jurídica que explora o meio de comunicação, ela está apenas conferindo mais garantia para o ofendido, tanto sob o aspecto material, por ser mais uma entidade a responder pelos prejuízos eventualmente causados, quanto também para possibilitar a descoberta da verdadeira origem da notícia divulgada, além, naturalmente, de servir de estímulo para a empresa exercitar com maior denodo o dever de avaliar o que publica. Com efeito, por qualquer ângulo que se queira examinar a questão posta não tenho como correto, data venia, extrair do reportado § 2º do art. 49, que traz, em essência, uma proteção a mais para o ofendido, uma ilação que resulte em seu desfavor e ainda mais para trazer beneficio ao próprio ofensor que é, sempre, ainda que em última análise, a pessoa que deve responder pelos danos causados, mesmo para aqueles que entendem que a ação deve ser proposta apenas contra a empresa de comunicação. 298 SÚMULAS - PRECEDENTES Ademais, no caso em exame ficou suficiente provado que a ofensa cogitada partiu mesmo do recorrente, conforme dá conta a seguinte passagem do v. acórdão recorrido: Os elementos existentes nos autos não deixam dúvida alguma de que ele relacionou a autora com fraude que teria ocorrido quando da apuração de votos por uma junta presidida por ela. Bastante esclarecedor foi o depoimento prestado pelo Dr. Paulo César Salomão, então Corregedor Eleitoral do Estado do Rio de Janeiro. Ele afirmou que, em razão da entrevista, abriu uma sindicância, tendo o réu, na oportunidade, não só reiterado as afirmações feitas na televisão, como afiançado que a Dra. Geórgia foi afastada da presidência da junta pelo juiz titular da zona eleitoral em razão de seu envolvimento com as fraudes. Argumenta o réu que a entrevista foi longa, sendo editada apenas a parte final e que, até onde vai sua memória, a nomeação da autora foi alusiva ao pedido de recontagem de votos feito a uma juíza. Não fez ele, porém, esforço no sentido de provar tais alegações. Por que não buscou ele o depoimento da repórter que o entrevistou para provar o alegado? Enfim, há nos autos elementos que confirmam o propósito ofensivo, extravasado no ato da entrevista, a justificar a responsabilização do réu por danos morais. (fl. 209). 3. Quanto ao terceiro ponto do recurso, isto é, à indenização tarifada, também sem razão o recorrente. A uma, porque a ação foi proposta com base no direito comum. Além disso, ao proferir voto-vista no REsp n. 63.520-RJ, consignei: (...) tenho por inquestionável a inaplicação da pena tarifada de que cuida a Lei n. 5.250/1967, por seus arts. 51 e 52, uma vez que quando muito a limitação ali prevista só teria cabimento - com o que não concordo e só admito para simples argumentação - se a ofensa moral decorresse, como previsto no art. 49, I, de calúnia, difamação ou injúria e, ainda, quando a notícia gerasse desconfiança no sistema bancário ou abalo de crédito de instituições financeiras ou de qualquer empresa, pessoa física ou jurídica, ou quando provocasse sensível perturbação na cotação das mercadorias e dos títulos mobiliários no mercado financeiro, ou fosse veiculada com o objetivo de obter ou procurar obter, para si ou para outrem, favor, dinheiro ou outra vantagem para não fazer ou impedir que se faça pública transmissão ou distribuição de notícias. Nenhuma dessas hipóteses acha-se retratada no caso em exame, pois as instâncias ordinárias foram categóricas em afirmar o caráter insidioso da matéria de que decorreu a ofensa. RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 299 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Em favor desse meu posicionamento trago o decidido, sem discrepância, pela eg. Terceira Turma no REsp n. 52.842-RJ, relatado pelo eminente Ministro Carlos Alberto Menezes Direito que ao proferir o seu judicioso voto condutor, demonstrou, com maestria, que “a Constituição de 1988 cuidou dos direitos da personalidade, direitos subjetivos privados, ou, ainda, direitos relativos à integridade moral, nos incisos V e X do artigo 5º assegurando o direito de resposta proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem, declarando, ademais, invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra, a imagem das pessoas, assegurando, também, o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente da violação”. (...) Assim, o valor da indenização do dano moral, depois de vigente a Constituição de 1988, passou a ser, para todos, condicionado única e exclusivamente ao atendimento da reparação plena - se é que seja possível alcança-lá - sendo inaplicável o privilégio de limitar o seu quantum quando se tratar de ofensa veiculada na imprensa, já que a regra jurídica constitucional é mais ampla, indo além das estipulações tarifárias previstas naquela lei especial. Aliás, seria mesmo inconcebível, sob pena de a lógica deixar de ser o caminho certo do raciocínio, que uma ofensa à honra feita pessoalmente por um indivíduo a outro, num ambiente restrito, pudesse, pelo menos em tese, sofrer indenização na exata extensão da reparabilidade plena do dano causado, enquanto que o dano decorrente de uma notícia maliciosa que a propagasse, de efeito destrutivo bem mais intenso, ficasse limitada apenas aos contornos da tarifação prevista na Lei de Imprensa. Devo observar, como destacado pelo eminente Ministro Barros Monteiro no seu judicioso voto, ser possível “em sede de apelo especial apreciar-se de forma incidente a compatibilidade entre a norma legal e o que vem preceituado a respeito da temática pela Constituição Federal (confira-se nesse sentido o voto proferido pelo Exmº Sr. Ministro Humberto Gomes de Barros, relator do REsp n. 68.143-SP)”. Assim, ao fim e ao cabo, estou em entender que a Constituição de 1988 afastou, para a fixação do valor da reparação do dano moral, as regras referentes aos limites tarifados previstas pela Lei de Imprensa, sobretudo quando, como no caso, as instâncias ordinárias constataram soberana e categoricamente o caráter insidioso da matéria de que decorreu a ofensa. No mesmo sentido, o julgado também da eg. Terceira Turma deste colendo Superior Tribunal de Justiça (REsp n. 53.321-RJ), da relatoria do eminente Ministro Nilson Naves. 4. Nada obstante tudo isso, tenho que o valor da indenização fixado pelo eg. Tribunal a quo, data venia, merece ser reduzido. 300 SÚMULAS - PRECEDENTES Desde o julgamento do REsp n. 53.321-RJ, da relatoria do eminente Ministro Nilson Naves, esta Corte tem admitido que “o valor da indenização por dano moral não pode escapar ao controle do Superior Tribunal de Justiça”. Nessa linha, observo que esta Quarta Turma tem se orientado, habitualmente, ainda que sem muita rigidez, em estabelecer a indenização por dano moral, decorrente da perda de familiar próximo, em torno de quinhentos salários-mínimos. Diante de tais pressupostos, e tendo em conta as peculiaridades da espécie, conheço parcialmente do recurso e nessa parte dou-lhe parcial provimento para o fim de fixar o valor da indenização em R$ 30.000,00 (trinta mil reais) que corresponde a duzentos salários-mínimos. aproximadamente, condenando ainda o réu/recorrente no pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios no percentual de 20% sobre o valor da condenação. RECURSO ESPECIAL N. 213.188-SP (99.0040190-5) Relator: Ministro Barros Monteiro Recorrente: Empresa Folha da Manhã S/A Advogado: Lucimara Morais Lima e outros Recorrido: Cláudio Gobetti Advogado: Maria da Conceição Ayres Cernicchiaro e outros Sustentação oral: Dra. Taís Gasparian, pela recorrente EMENTA Responsabilidade civil. Danos morais. Ofensa veiculada pela Imprensa. Limitação estabelecida na Lei n. 5.250, de 09.02.1967. Não-recepção pela Carta Política de 1988. Incidência da Súmula n. 7-STJ. - Intento de, em sede de declaratórios, rediscutir fatos e circunstâncias da causa. Inexistência de omissão e contradição do acórdão recorrido. RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 301 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - A limitação estabelecida pela Lei de Imprensa quanto ao montante da indenização não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988. Admissibilidade da fixação do quantum indenizatório acima dos limites ali previstos. - “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”. (Súmula n. 7-STJ) Recurso especial não conhecido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas: Decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas precedentes que integram o presente julgado. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Ruy Rosado de Aguiar, Aldir Passarinho Junior e Sálvio de Figueiredo Teixeira. Brasília (DF), 21 de maio de 2002 (data do julgamento). Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente Ministro Barros Monteiro, Relator DJ 12.08.2002 RELATÓRIO O Sr. Ministro Barros Monteiro: Cláudio Gobetti, delegado de polícia estadual, ajuizou ação reparatória de danos morais contra a “Empresa Folha da Manhã S/A”, sob a alegação de que, em matéria publicada na “Folha da Tarde”, edição do dia 22.09.1994, imputou-lhe falsamente a prática de ilícitos penais, de forma a macular a sua reputação, dignidade e decoro. Além disso, divulgou que o diretor houvera deixado o seu cargo, o que não é verdade, pois nele permanece. Abaixo do sub-título “Diretor é acusado de receptação”, foi afirmado o seguinte: Entre os 47 policiais afastados, mais um membro do alto escalão da Polícia Civil deixou o cargo ontem. Desta vez, as denúncias derrubaram o diretor do Dinfor (Departamento de Informática), delegado Cláudio Gobetti. (fl. 04). Julgado improcedente o pedido em 1º grau, o Tribunal de Justiça de São Paulo deu provimento ao apelo interposto pelo acionante para, acolhendo a 302 SÚMULAS - PRECEDENTES pretensão inaugural, condenar a ré ao pagamento da quantia de RS 50.000,00 (cinqüenta mil reais), além dos honorários advocatícios de 20% sobre o valor da condenação, em acórdão que registra a seguinte ementa: Indenizatória por danos morais. Imprensa. Notícia contrária à honra do autor, delegado de polícia. Imputação de fato criminoso. Ausência de supedâneo razoável para tal. Culpa da ré. Sentença de improcedência que se reforma. Apelo ativo provido. (fl. 695). Opôs a ré embargos declaratórios, destacando que: a) as denúncias somente foram publicadas após a instauração de sindicância administrativa; b) não se baseou tão-somente nas declarações do ex-informante policial “Zezinho do Ouro”; c) o autor estaria sendo investigado na Sindicância n. 639/94; d) o afastamento do suplicante foi informado pelo Secretário de Segurança Pública do Estado e também pelo Sr. Ruy Estanislau Silveira Mello; e) à época, pesava contra o autor uma denúncia acerca do roubo de cargas, sendo certo que a retratação do denunciante não modifica a veracidade da matéria divulgada; f ) não alterou ela a verdade dos fatos, tendo tomado todas as cautelas para ouvir as pessoas envolvidas no caso. A Corte Estadual, entendendo inexistir no acórdão omissão ou contradição, rejeitou os embargos. Irresignada, a ré manifestou este recurso especial com fulcro na alínea a do permissor constitucional, alegando violação dos arts. 49, 51 a 53 da Lei n. 5.250, de 09.02.1967, e 535, I e II, do Código de Processo Civil. Preliminarmente, argüiu a nulidade do acórdão, uma vez que não foram supridas as omissões e contradições apontadas nos declaratórios, recusando-se a discutir o art. 49 da Lei de Imprensa. Acrescentou não ter alterado a verdade dos fatos, limitando-se a noticiar ocorrências de extrema relevância pública, veiculadas nas declarações de “Zezinho do Ouro”, que apontavam, à época, o autor como integrante do esquema de corrupção. Esclareceu que o Secretário de Segurança Pública foi o responsável pela informação de que todos os envolvidos seriam afastados. Disse mais que, não demonstrado o ilícito, não há falar em indenização. Asseriu, em seguida, aplicarem-se ao caso as disposições da Lei de Imprensa, recepcionadas pela Constituição Federal e defendeu, por conseguinte, a limitação tarifária ali prevista. Assinalou, por fim, que o montante da condenação é absurdo e inaceitável. Oferecidas as contra-razões, o apelo extremo foi admitido na origem, subindo os autos a esta Corte. É o relatório. RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 303 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VOTO O Sr. Ministro Barros Monteiro (Relator): 1. O acórdão recorrido contém a seguinte motivação: Bem provado que o autor não se viu envolvido em qualquer procedimento criminal ou administrativo (fls. 89 e 477), nem tendo sido afastado do cargo (fls. 434 e 585). Não havia, portanto, qualquer respaldo para a notícia publicada pela acionada, máxime quanto ao afastamento daquele. Preferiu ela, entanto, se fiar, exclusivamente, na palavra do ex-informante policial alcunhado de Zezinho do Ouro, que, ao depois, acabou admitindo nada ter presenciado que pudesse comprometer o demandante (fl. 438), a par de tê-lo confundido com seu sobrinho (fls. 502-3 e 585). Essa retratação é importante, à constatação do grave equívoco cometido pela ré, que não procurou coligir maiores elementos antes de noticiar os fatos. Nem mesmo teve o cuidado de verificar se efetivo o afastamento administrativo do ora apelante, o que era muito simples e justificável, inclusive por se tratar de circunstância com forte potencial para emprestar maior credibilidade à denúncia. Assim, agindo, obrou com inegável culpa, onerando, indelevelmente, a honra do acionante, por conta da notícia de seu afastamento por envolvimento em crime de receptação. E não vem em socorro da defensoria o documento de fls. 244-53, que se limita a fazer referência ao depoimento de Zezinho, sem outros acréscimos. Pouco importa, também, tenham veículos outros da imprensa procedido da mesma forma anteriormente, porque tal não afasta, absolutamente, a responsabilidade da ré, que tinha a obrigação de melhor se munir de dados, antes de deflagrar o petardo jornalístico. Demais disso, alguns daqueles veículos vieram a sofrer condenações monocráticas (fls. 135, 313-17 e 465-70). É certo que a imprensa tem o dever-direito de informar, o que não significa, porém, porte ela alvará para denegrir a honra alheia. Deve sim responder pelos atos nefastos que pratica, em agindo com falta de cautela ou dolosamente, o que resulta da lei. Não que se deva condicionar a notícia à certeza dos fatos, mas que haja, ao menos respaldo mínimo aceitável, justamente para que não tenham lugar enganos tão patentes como o ocorrido aqui. A condenação, então, é inafastável. Quanto à indenização, tem-se que deve estar ela em consonância com a classe sócioeconômica do ofendido e demais parâmetros do art. 53, da Lei de Imprensa, 304 SÚMULAS - PRECEDENTES gizado que os lindes indenitórios previstos naquele diploma não prevalecem, porque, do contrário, presente flagrante afronta ao princípio constitucional da isonomia. E sopesados a média intensidade da culpa com que se houve a ofensora, o destaque secundário dado ao informe, a posição social da vítima e sua condição de delegado de polícia, fixa-se a verba indenizatória em cinqüenta mil reais. Esses, ao ver da turma julgadora, o montante condizente com os prejuízos, sem que se propicie o enriquecimento indevido do ofendido. (fl. 696-698). A primeira asserção formulada pela recorrente é a de que o julgado combatido não supriu as omissões e contradições indicadas nos aclaratórios opostos. Acontece que a então embargante - ora recorrente - intentou, através daquela via, exclusivamente, rediscutir os fatos e circunstâncias da causa, procurando evidenciar sobretudo que publicara a matéria jornalística após ampla apuração, com base em elementos concretos e sem alterar a veracidade dos fatos. Tal pretensão, de meramente reabrir o debate sobre os aspectos fáticos da lide, propiciou a que o Tribunal de origem, com inteira razão, rejeitasse os declaratórios, uma vez distorcida a finalidade daquele recurso, que não constitui o remédio hábil à reapreciação do conjunto probatório. A propósito, a contradição, que dá ensejo aos embargos de aclaramento, é aquela interna ao julgado, ou seja, a que emerge das proposições constantes da mesma decisão; não, por conseguinte, o alegado conflito do decisum com os elementos de prova valorizados pela parte. 2. O julgado recorrido reformou a sentença, para julgar procedente a ação, ao entendimento de que não havia respaldo suficiente a amparar a notícia divulgada pela ré no periódico “Folha da Tarde”. Segundo o decisório, a ora recorrente fiou-se apenas na palavra do ex-informante policial “Zezinho do Ouro”, que posteriormente se retratou, deixando à calva o equívoco em que incorrera a demandada. Nem mesmo se dera o afastamento da autoridade policial, aspecto a que a ré emprestara destaque na matéria publicada. A culpa da empresa jornalística terminou por ser reconhecida pelo v. acórdão à consideração de que não coligira ela elementos concretos antes de noticiar os fatos. Reconhecida a prática de ato ilícito a ferir indelevelmente a honra do acionante (fl. 696), impunha-se o decreto condenatório, como ocorreu. Tanto nos embargos de declaração, rejeitados, como agora, em sede de apelo especial, busca a recorrente renovar o debate em torno dos aspectos fatuais da lide com o escopo de forrar-se à condenação, ao argumento de que mais não RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 305 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA fez do que dar ao conhecimento público fatos cônsonos com os acontecimentos da época. Disse que não se arrimou tão-só nas declarações do ex-informante policial “Zezinho do Ouro”, sustentando, ao fim e ao cabo, que o acórdão recorrido decidiu contrariamente ao que estampou a prova colhida. Sabe-se que, em sede recurso especial, esta Corte apanha os fatos e circunstâncias da controvérsia tais como descritos pela instância de origem. Descabido é o revolvimento do quadro probatório a teor do que enuncia a Súmula n. 7-STJ. O simples reexame de matéria fática é o que, em última análise, está a pretender a ora recursante, com o objetivo de evidenciar a inexistência de culpabilidade na difusão da questionada matéria jornalística. Enquanto o v. acórdão assinala que a empresa, por descuido, deixou de coligir maiores elementos concretos antes de noticiar os fatos, fazendo-o, por sinal, com supedâneo em dados fornecidos por pessoa tida como inidônea, a ré defende-se, argüindo ter exercido o seu direito e também dever de informar a população, não se cingindo ao depoimento do citado ex-informante da polícia. Somente com a reapreciação dos elementos de prova é que se poderia atribuir nova configuração aos fatos e, por conseguinte, arredar a culpabilidade imputada à empresa, que explora o meio de informação e divulgação. Tanto isso é certo que, em mais de uma vez, asseverou a recorrente ter o Tribunal a quo decidido em contrariedade com o panorama probatório por ela apresentado. Não há, em suma, afronta ao art. 49 da Lei n. 5.250, de 09.02.1967, por tais motivos. 3. Remanesce, para exame, o ponto concernente à fixação do montante indenizatório a título de danos morais. Segundo a jurisprudência desta Casa, a indenização tarifada prevista pela Lei de Imprensa não foi recepcionada pela Lei Fundamental de 1988. Admissível, pois, a determinação do quantum reparatório acima dos limites ali estabelecidos. No REsp n. 61.922-RS, de que foi Relator o Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, a eg. Terceira Turma proclamou: “Com a Constituição de 1988 (art. 5, V e X) acabou o confinamento da indenização por danos morais nos termos excludentes da Lei de Imprensa, inaplicáveis as limitações nela contidas” (in RSTJ vol. 105, p. 248). Essa questão tivera sido discutida anteriormente, quando da apreciação do REsp n. 103.307-SP, no qual, primeiro o Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito expusera a sua linha de entendimento, in verbis: 306 SÚMULAS - PRECEDENTES O meu pensamento é no sentido contrário à existência dessa limitação da Lei de Imprensa. E é contrário por um fundamento, que, a meu juízo, parece simples: antes da vigência da Constituição de 1988, não havia, no patamar constitucional, o princípio da proporcionalidade no que concerne à resposta a uma determinada ofensa que alcançasse, virulentamente, a honra, a dignidade ou a intimidade da pessoa. Com a Constituição de 1988, que inovou neste particular, não apenas por inserir o princípio da proporcionalidade com relação à ofensa, mas, também, por elevar ao patamar constitucional o dano moral que, antigamente, não existia. Ora, a meu ver, com todo maior respeito aos que examinam a matéria, sem essa perspectiva, admitir a existência da limitação tarifada corresponderia a aceitarmos ou admitirmos a existência de uma interpretação da Constituição, conforme a lei ordinária que lhe é anterior. Mal de resto que Gomes Canotilho, já na última edição do seu Direito Constitucional, reprime, de maneira muito clara, ao acentuar que tal interpretação pode gerar mesmo uma interpretação inconstitucional, o que seria um absurdo. Por sua vez, o Ministro Eduardo Ribeiro, em voto vista proferido no mesmo precedente, anotou: Tenho como certo, como pareceu ao Relator, e já decidiu a colenda Quarta Turma, que a limitação da “Lei de Imprensa” não foi recebida pela vigente Constituição. Prevêem os itens V e X, do artigo 5º da Constituição, indenização por dano material e moral. Parece-me induvidoso que, ao assim disporem, não admitiram pudesse a lei estabelecer que o ressarcimento fosse apenas parcial. Indeniza-se o dano: todo ele, há de entender-se. Só cláusula restritiva, no próprio texto, ou a remessa à disciplina da lei ordinária propiciariam ter-se como bastante reparação tão-só de parcela do dano. Ora, a limitação envolve sempre a possibilidade de que haja dano não indenizado. Certo que, tratando-se de dano moral, aferir-se a respectiva extensão envolve certo subjetivismo. Sua quantificação constitui tem sempre aberto a discussões. De qualquer sorte, entretanto, se, em dada hipótese, entende-se que há de alcançar determinado montante, pena de a reparação ser insuficiente, atender-se a tarifamento importará não fazer integral o ressarcimento. A supracitada orientação pode reputar-se como pacífica nesta Casa, conforme se dessume de vários julgados, não se restringindo àqueles provindo da eg. Terceira Turma. Dentre os arestos prolatados pela c. Quarta Turma, podem ser citados os REsps n. 85.019-RJ, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, n. 213.811-SP, Relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar e n. 148.212RJ, por mim relatado. A Corte paulista arbitrou a indenização em R$ 50.000, 00 (cinqüenta mil reais), ponderados o grau de culpa da ofensora, o destaque secundário do informe, RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 307 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA a posição social da vítima e sua condição de delegado de polícia. A decisão, como se vê, acha-se nesse particular devidamente fundamentada e o montante fixado não se mostra absurdo ou exorbitante em face das peculiaridades que cercam o caso em análise. Este órgão fracionário tem - é verdade - exercido o controle das condenações relativas aos danos morais, mas quando de modo manifesto o valor definido é ínfimo ou, então, de outra parte, exacerbado. O recurso especial sabe-se - não constitui um novo recurso de apelação, de sorte que não cabe aqui simplesmente procurar ajustar-se o importe da condenação segundo um suposto critério de eqüidade ou de justiça. Não havendo excesso ou distorção evidentes no arbitramento, deve ele ser mantido de acordo com o critério adotado no Colegiado de origem. Demais disso, a recorrente cinge-se a defender a observância dos limites estabelecidos na Lei de Imprensa; não invocou, como era de rigor, a contrariedade à norma do art. 159 do Código Civil. Daí a manutenção do valor fixado pelo acórdão recorrido. 4. Do quanto foi exposto, não conheço do recurso. É como voto. VOTO-MÉRITO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: Sr. Presidente, acompanho o voto do Sr. Ministro-Relator, não conhecendo do recurso. Impressiona-me o argumento que a ilustre advogada trouxe da tribuna, no sentido de que dois fatos por ela apresentados e sustentados nos autos não teriam sido objeto de consideração pelo acórdão. Um, a existência de um processo administrativo contra o delegado; o outro, o fato de a informação ter sido obtida do Secretário de Segurança ou de Justiça, o que poderia levar à conclusão de que havia elementos a sustentar a informação noticiada. Como a alegação é de ofensa ao art. 535: não podemos anular o processo para que o Tribunal examine uma prova que já apreciou. De outra parte, não cabe a nós analisar a matéria porque não há alegação de ofensa ao art. 131. VOTO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: Sr. Presidente, acompanho o voto do Sr. Ministro-Relator, inclusive quanto à indenização, porque me parece atender aos parâmetros usualmente fixados por esta Turma em caso semelhante. Não conheço do recurso. 308 SÚMULAS - PRECEDENTES RECURSO ESPECIAL N. 453.703-MT (2002.0087214-6) Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior Recorrente: Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas do Estado do Mato Grosso - STIU-MT Advogado: Ricardo Vidal e outro Recorrente: Orivaldo Ribeiro Advogado: Orivaldo Ribeiro (em causa própria) Recorrido: Os mesmos EMENTA Civil e Processual. Acórdão Estadual. Omissão não configurada. Ação de indenização. Notícia ofensiva publicada em jornal de sindicato profissional. Dano moral. Valor. Razoabilidade. Honorários de sucumbência. CPC, art. 21. Inincidência. I. Não padece de nulidade o acórdão que se acha devidamente fundamentado, apenas contendo conclusões parcialmente desfavoráveis às pretensões das partes autora e ré. II. “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial” - Súmula n. 7-STJ. III. Valor da indenização fixado em parâmetro razoável, pelo que indevidos os pedidos tanto de elevação, como de redução. IV. A tarifação prevista na Lei de Imprensa não mais prevalece após o advento da Constituição Federal de 1988. Precedentes do STJ. V. Dada a multiplicidade de hipóteses em que cabível a indenização por dano moral, aliada à dificuldade na mensuração do valor do ressarcimento, tem-se que a postulação contida na exordial se faz em caráter meramente estimativo, não podendo ser tomada como pedido certo para efeito de fixação de sucumbência recíproca, na hipótese de a ação vir a ser julgada procedente em montante inferior ao assinalado na peça inicial (REsp n. 265.350-RJ, 2ª Seção, unânime, Rel. Min. Ari Pargendler, DJU de 27.08.2001). VI. Recursos especiais não conhecidos. RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 309 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, não conhecer dos recursos, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Barros Monteiro e Fernando Gonçalves. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. Custas, como de lei. Brasília (DF), 21 de outubro de 2003 (data do julgamento). Ministro Aldir Passarinho Junior, Relator DJ 1º.12.2003 RELATÓRIO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: Adoto o relatório de fl. 395, verbis: Contra a sentença que julgou improcedentes os pedidos formulados na ação ordinária de indenização por danos morais, recorre o autor argumentando, em síntese, que a sentença, depois de reconhecer a insensibilidade dos atos praticados pelo apelante, entendeu que o Sindicato apelado apenas se limitou a avisar seus associados da existência da ação cível, quando não seriam necessários maiores esforços para entender que as palavras consignadas na nota em referência seriam capazes de configurar ofensas caluniosas, difamatórias e injuriosas à sua pessoa. Alegou, ainda, que o apelado, quando impediu que pessoas procurassem o apelante, causou-lhe, além de danos morais, reflexos patrimoniais, ínsitos no próprio ato. As contra-razões de fls. 379-383 pugnam pelo improvimento do recurso. O Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso deu provimento à apelação, em acórdão assim ementado (fl. 399): Apelação cível. Danos morais. Publicação. Boletim informativo de circulação interna. Sindicato de classe. Notícia que imputa a advogado conduta inidônea. Ofensa caracterizada. Indenização devida. Recurso provido. Sentença reformada. 310 SÚMULAS - PRECEDENTES O texto publicado pelo sindicato, informando aos associados que o advogado estaria abusando da boa-fé deles, ofende a honra e a dignidade do profissional do direito, mesmo que a publicação esteja inserida em boletim de circulação interna. Opostos embargos declaratórios às fls. 406-411 e 413-416, foram ambos rejeitados pelas decisões de fls. 421-425 e 426-431. O recurso especial do autor é aviado pelas letras a e c do autorizador constitucional, e pede a elevação do quantum da indenização, apontando ofensa ao art. 159 do Código Civil e dissídio jurisprudencial, em face da gravidade da lesão à sua moral. Às fls. 459-470, o réu, Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas do Estado de Mato Grosso - STIU-MT interpõe, pela letra a do art. 105, III, da Constituição Federal, recurso especial sustentando que houve violação aos arts. 159 e 160, I, do Código Civil, 51, 52 e 53 da Lei de Imprensa, 21, 535, I e II, do CPC. Aduz que o Tribunal se omitiu no exame das questões propostas; que há sucumbência recíproca porque a indenização obtida é inferior à postulada; que não houve ofensa moral, porquanto o sentido da notícia, sobre a prática abusiva do advogado autor, era meramente informativa, e que não foram explicitados os critérios para a fixação do valor do ressarcimento, como recomendado na Lei de Imprensa. Contra-razões do autor às fls. 478-481, pugnando pela manutenção do decisum, eis que houve intuito de difamar o causídico e que o valor foi fixado pelo juízo, de acordo com o seu convencimento e avalização, não se configurando vitória da parte ré. Contra-razões do réu às fls. 484-491, dizendo que o sindicato tem poucos filiados e que a repercussão lesiva, se houve, foi mínima. Os recursos especiais foram admitidos na instância de origem pelo despacho presidencial de fls. 501-506 e 510-515. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior (Relator): Trata-se de ação de indenização por danos morais advindos de publicação veiculada em jornal interno do sindicato réu, advertindo seus associados para o procedimento RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 311 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA do advogado autor, que estaria cobrando honorários dos sindicalizados para mover ação de cobrança do FGTS, supostamente já prescrita, muito embora já houvesse uma ajuizada pela própria entidade, “abusando da boa-fé”, em palavras postas na matéria. O Tribunal de Justiça deu provimento à apelação do autor e fixou o valor do ressarcimento em 50 salários mínimos, recorrendo ambas as partes. Inicialmente, rejeito as preliminares de nulidade do acórdão por omissão, já que a matéria foi devidamente enfrentada por aquela Corte, não padecendo, em absoluto, de qualquer vício de omissão, apenas contendo entendimento desfavorável, em parte, à pretensão dos embargantes. A configuração da lesão constitui matéria de fato, de revisão impossível nesta Corte, ao teor da Súmula n. 7 do STJ. Com relação ao recurso do autor, não lhe assiste razão em pretender majorar a indenização, porquanto razoável o valor fixado, notadamente em função da limitada circulação do jornal do sindicato e o porte econômico da entidade. Também não se justifica, por outro lado, a redução do quantum, pelas mesmas razões, anotando-se que a tarifação prevista na Lei de Imprensa não mais prevalece após a Constituição de 1988, consoante a iterativa jurisprudência do STJ, a saber: Civil e Processual. Ação de indenização. Publicação de matéria considerada caluniosa. Decadência afastada. Dano moral. Fixação do montante. Culpa reconhecida. Lei de Imprensa, arts. 51, 52 e 56. Ressarcimento tarifado. Não recepção pela carta de 1988. CC, art. 159. Redução do quantum. I. Guiou-se a jurisprudência das Turmas integrantes da 2ª Seção do STJ, no sentido de que, em face da Constituição de 1988, não mais prevalecem nem o prazo decadencial, nem a tarifação da indenização devida por dano moral, decorrente de publicação considerada ofensiva à honra e a dignidade das pessoas. II. Possível, entretanto, com base na tese argüida no recurso especial, alusiva ao enriquecimento sem causa, apreciar-se, em sede especial, a compatibilidade do valor do ressarcimento com a gravidade da lesão, como no caso dos autos, em que o montante estabelecido nas instâncias ordinárias se revela excessivo, impondo a sua redução para adequação aos parâmetros do Colegiado, notadamente porque, na espécie, a maior parte da notícia retratou fatos verdadeiramente acontecidos, como as imputações feitas ao autor por juiz trabalhista em processo sob sua 312 SÚMULAS - PRECEDENTES condução e a abertura de inquérito administrativo pela Comlurb para apuração dos fatos. III. Recurso especial parcialmente conhecido e provido em parte. (4ª Turma, REsp n. 72.343-RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, por maioria, DJU de 04.02.2002) Responsabilidade civil. Danos morais. Ofensa veiculada pela imprensa. Limitação estabelecida na Lei n. 5.250, de 09.02.1967. Não-recepção pela Carta Política de 1988. Incidência da Súmula n. 7-STJ. - Intento de, em sede de declaratórios, rediscutir fatos e circunstâncias da causa. Inexistência de omissão e contradição do acórdão recorrido. - A limitação estabelecida pela Lei de Imprensa quanto ao montante da indenização não foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988. Admissibilidade da fixação do quantum indenizatório acima dos limites ali previstos. - “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”. (Súmula n. 7-STJ). Recurso especial não conhecido. (4ª Turma, REsp n. 213.188-SP, Rel. Min. Barros Monteiro, unânime, DJU de 12.08.2002) No que tange à verba sucumbencial, é inaplicável à espécie o art. 21 do CPC, eis que o só fato de a indenização ter sido estabelecida em valor inferior ao pretendido na exordial não importa em derrota do autor, já que se entende ser o pedido, justamente pela dificuldade que a parte tem de arbitrá-lo, de caráter meramente estimativo. Nesse sentido: Processo Civil. Sucumbência recíproca. Dano moral. Em princípio, a sentença que defere menos do que foi pedido a título de indenização por dano moral acarreta a sucumbência recíproca, exigindo a aplicação do artigo 21 do Código de Processo Civil. Solução que se afasta, porque, observado esse critério na espécie, a vítima do dano moral pagaria mais à guisa de honorários advocatícios do que receberia por conta do ressarcimento. Recurso especial não conhecido. (2ª Seção, REsp n. 265.350-RJ, Rel. Min. Ari Pargendler, unânime, DJU de 27.08.2001). Ante o exposto, não conheço dos recursos. É como voto. RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 313 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO ESPECIAL N. 513.057-SP (2003.0047523-8) Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira Recorrente: Editora Abril S/A Advogado: Vera Lígia Teixeira Leitão e outro Recorrido: OAS Participações Ltda. e outro Advogado: Márcia Rodrigues Sanches e outro Sustentação oral: Antônio Augusto Nogueira, pela recorrente EMENTA Responsabilidade civil. Lei de Imprensa. Notícia jornalística. Revista Veja. Abuso do direito de narrar. Assertiva constante do aresto recorrido. Impossibilidade de reexame nesta instância. Matéria probatória. Enunciado n. 7 da Súmula-STJ. Dano moral. Responsabilidade tarifada. Inaplicabilidade. Não-recepção pela Constituição de 1988. Precedentes. Quantum. Exagero. Redução. Recurso provido parcialmente. I - Tendo constado do aresto que o jornal que publicou a matéria ofensiva à honra da vítima abusou do direito de narrar os fatos, não há como reexaminar a hipótese nesta instância, por envolver análise das provas, vedada nos termos do Enunciado n. 7 da Súmula-STJ. II - A responsabilidade tarifada da Lei de Imprensa não foi recepcionada pela Constituição de 1988, não se podendo admitir, no tema, a interpretação da lei conforme a Constituição. III - O valor por dano moral sujeita-se ao controle por via de recurso especial e deve ser reduzido quando for arbitrado fora dos parâmetros fixados por esta Corte em casos semelhantes. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial e, nessa parte, dar-lhe parcial provimento. Votaram com o Relator os Ministros 314 SÚMULAS - PRECEDENTES Cesar Asfor Rocha, Fernando Gonçalves e Aldir Passarinho Junior. Ausente, ocasionalmente, o Ministro Barros Monteiro. Presidiu a Sessão o Ministro Aldir Passarinho Junior. Brasília (DF), 18 de setembro de 2003 (data do julgamento). Ministro Aldir Passarinho Junior, Presidente Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Relator DJ 19.12.2003 EXPOSIÇÃO O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: Ajuizaram as recorridas ação de indenização por danos morais e materiais contra a recorrente, alegando que sofreram prejuízos em razão de matéria de capa, intitulada “Por dentro da mala preta da OAS”, publicada na revista “Veja”, editada pela ré. Sustentaram que a notícia imputou a elas acusações infundadas de prática de lavagem de dinheiro, de investimento externo ilícito, de “caixa 2” e de sonegação fiscal. A sentença julgou procedente o pedido, condenando a ré ao pagamento de indenização pelos danos materiais e lucros cessantes, a ser apurada em liquidação de sentença. Os danos morais, de seu turno, foram fixados em dez vezes o valor que venha a ser apurado em liquidação. Rejeitados os embargos de declaração da ré, com aplicação de multa por protelação, adveio apelação da embargante. O Tribunal de Justiça de São Paulo deu provimento ao recurso para anular a sentença, diante de sua precária fundamentação. Interposto recurso especial pelas autores, foi ele inadmitido, restando mantido sua inadmissão, nesta Corte, em razão do não conhecimento do agravo do art. 544, CPC, manifestado pelas recorrentes. Baixados os autos, foi proferida nova sentença, desta vez condenando a ré ao pagamento de 4.000 (quatro mil) salários mínimos por todos os danos sofridos pelas autoras. Apelaram as partes, tendo o Tribunal de origem dado provimento parcial ao recurso da ré, afastando a indenização pelos danos materiais. Em razão disso, fixou o quantum indenizatório em 1.000 (hum mil) salários mínimos, uma vez limitada a condenação apenas nos danos morais. O acórdão, a propósito, recebeu a seguinte ementa: RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 315 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Indenização. Notícias divulgadas por revista de circulação nacional. Alegação de infundadas afirmações de irregularidades que teriam causado prejuízos materiais elevados e dano moral à reputação das empresas. Indenização fixada segundo o Código Civil, afastada a incidência da Lei de Imprensa. Recurso da ré insistindo na incidência da Lei de Imprensa e na ausência de prova de danos materiais e morais. Recurso das autoras pretendendo elevação da indenização. Provimento, em parte, da apelação da ré, improvida a das autoras. Rejeitados os declaratórios das partes, advieram recursos especiais de ambas as embargantes, restando admitido apenas o da ré. Nele, sustenta a recorrente violação do arts. 1º, 51 e 52 da Lei n. 5.250/1967, argumentando que a matéria publicada foi absolutamente lícita e de interesse público, além de questionar o valor da condenação, por não ter observado os limites indenizatórios da Lei de Imprensa. Com as contra-razões, subiram os autos a esta Corte. A decisão que proferi, negando provimento ao agravo do art. 544, CPC, manifestado pelas autoras, foi lançada nestes termos: Cuida-se de agravo contra decisão que negou seguimento ao recurso especial interposto contra acórdão com esta ementa: Indenização. Notícias divulgadas por revista de circulação nacional. Alegação de infundadas afirmações de irregularidades que teriam causado prejuízos materiais elevados e dano moral à reputação das empresas. Indenização fixada segundo o Código Civil, afastada a incidência da Lei de Imprensa. Recurso da ré insistindo na incidência da Lei de Imprensa e na ausência de prova de danos materiais e morais. Recurso das autoras pretendendo elevação da indenização. Provimento, em parte, da apelação da ré, improvida a das autoras. Alegam as recorrentes contrariedade aos arts. 128, 460, 512 e 515, CPC, 159 e 1.059, CC. Sustentam a ocorrência de julgamento extra petita e requerem a elevação do valor dos danos morais. Desacolho o apelo. Não há como acolher o pedido de majoração da indenização, uma vez que o quantum arbitrado (mil salários mínimos) se encontra, inclusive, acima dos valores deferidos por esta Corte, em casos análogos. No mais, a questão da ausência de comprovação dos danos materiais e morais foi devolvida ao Tribunal de origem, através do recurso da ré, tendo sido observado o princípio tantum devolutum quantum appellatum. Pelo exposto, desprovejo o agravo. É o relatório. 316 SÚMULAS - PRECEDENTES VOTO O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira (Relator): 1. Alega a recorrente-ré violação dos arts. 51 e 52 da Lei de Imprensa, em razão da fixação dos danos morais em valor que ultrapassa os limites estabelecidos naquele diploma legal. Na linha da jurisprudência deste Tribunal, no entanto, a responsabilidade tarifada prevista na Lei de Imprensa não foi recepcionada pela Constituição de 1988, de sorte que o valor da indenização por danos morais não está sujeita aos limites nela previstos. Ao votar como relator do REsp n. 85.019-RJ (DJ 18.12.1998), expressei: (...) é de reconhecer-se que a vigente Constituição, ao prever indenização por dano moral por ofensa à honra, pôs fim à responsabilidade tarifada prevista na referida lei especial, que previa um sistema estanque, fechado, de reparabilidade dos danos praticados pela imprensa. Arruda Miranda também se põe com tal posicionamento, sustentando que “a Constituição Federal de 1988 acabou com as limitações de tempo e valor para as ações de reparação de danos materiais e morais, ao dispor, em seu art. 5º, X que ‘são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”’ (op. cit.). Os julgados deste Tribunal também não discrepam desse entendimento, valendo lembrar o REsp n. 52.842-RJ (DJ 27.10.1997), da Terceira Turma, que tem a aqui recorrente também como tal, capitaneado pela seguinte ementa: 1. O dano moral é o efeito não patrimonial da lesão de direito, recebendo da Constituição de 1988, na perspectiva do relator, um tratamento próprio que afasta a reparação dos estreitos limites da lei especial que regula a liberdade de manifestação do pensamento e de informação. De fato, não teria sentido pretender que a regra constitucional que protege amplamente os direitos subjetivos privados nascesse limitada pela lei especial anterior ou, pior ainda, que a regra constitucional autorizasse um tratamento discriminatório. 2. No presente caso, o acórdão recorrido considerou que o ato foi praticado maliciosamente, de forma insidiosa, por interesses mesquinhos, com o que a limitação do invocado art. 52 da Lei de Imprensa não se aplica, na linha de precedente da Corte. 3. Os paradigmas apresentados para enfrentar o acórdão recorrido conflitam, sob todas as luzes, com a assentada jurisprudência da Corte, que RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 317 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA confina a prova do dano moral puro ao ato praticado, no caso, a publicação da notícia. Ao proferir o voto-condutor, assinalou o Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito: De todos os modos, entendo que com a disciplina constitucional de 1988 abre-se o caminho para melhor tratar essas situações que machucam pessoas honradas. A limitação imposta pelo art. 52 da Lei de Imprensa, que restringe a responsabilidade civil da empresa que explora o meio de informação ou divulgação a dez vezes as importâncias fixadas no artigo 51, a meu juízo, não mais está presente. O regime da lei especial impunha a reparação por danos morais e materiais em casos de calúnia, difamação e injúria e, ainda, quando a notícia gerasse desconfiança no sistema bancário ou abalo de crédito de instituições financeiras ou de qualquer empresa, pessoa física ou jurídica, provocasse sensível perturbação na cotação das mercadorias e dos títulos mobiliários no mercado financeiro, ou para obter ou procurar obter, para si ou para outrem, favor, dinheiro ou outra vantagem para não fazer ou impedir que se faça pública transmissão ou distribuição de notícias (v. art. 49, I). E as limitações foram escalonadas em dois salários mínimos no caso de publicação ou transmissão de notícia falsa, ou divulgação de fato verdadeiro truncado ou deturpado (art. 16, II, IV), a cinco salários mínimos nos casos de publicação ou transmissão que ofenda a dignidade ou decoro de alguém, a dez salários mínimos nos casos de fato ofensivo à reputação e, finalmente, a 20 salários mínimos nos casos de falsa imputação de crime a alguém, ou de imputação de crime verdadeiro, nos casos em que a lei não admite a exceção da verdade (art. 49, § 1º). O certo é que o sistema da Lei de Imprensa compunha no seu tempo um cenário excepcional de condenação por danos morais, daí que estritamente regulamentado, alcançando casos concretos especificados no art. 49, I, antes mencionados. A Constituição de 1988 cuidou dos direitos da personalidade, direitos subjetivos privados, ou, ainda, direitos relativos à integridade moral, nos incisos V e X do artigo 5º, assegurando o direito de resposta proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem, declarando, ademais, invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra, a imagem das pessoas, assegurando, também, o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. Na verdade, com essa disciplina clara, a Constituição de 1988 criou um sistema geral de indenização por dano moral decorrente da violação dos agasalhados direitos subjetivos privados. E, nessa medida, submeteu 318 SÚMULAS - PRECEDENTES a indenização por dano moral ao Direito Civil comum e não a qualquer lei especial. Isso quer dizer, concretamente, que não se postula mais a reparação pela violação dos direitos da personalidade, enquanto direitos subjetivos privados, no cenário da lei especial, que regula a liberdade de manifestação do pensamento e de informação. Não teria sentido pretender que a regra constitucional nascesse limitada pela lei especial anterior ou, pior ainda, que a regra constitucional autorizasse tratamento discriminatório. Diante dessa realidade, é inaplicável, até mesmo, a discutida gesetzeskonformen Verfassungsinterpretation, isto é, a interpretação da Constituição em conformidade com a lei ordinária. Dentre os perigos que tal interpretação pode acarretar, Gomes Canotilho aponta o “perigo de a interpretação da Constituição de acordo com as leis ser uma interpretação inconstitucional” (Direito Constitucional, Liv. Almedina, Coimbra, 5ª ed., 1991, p. 242). E tal é exatamente o que aconteceria no presente caso ao se pôr a Constituição de 1988 na estreita regulamentação dos danos morais nos casos tratados pela Lei de Imprensa. Por tais razões, entendo, desde quando ainda tinha assento na 1ª Câmara Cível, período que guardo sempre na melhor das lembranças da minha vida, que a indenização por dano moral, com a Constituição de 1988, é igual para todos, inaplicável o privilégio de limitar o valor da indenização para a empresa que explora o meio de informação ou divulgação, mesmo porque a natureza da regra jurídica constitucional é mais ampla, indo além das estipulações da Lei de Imprensa. E, sendo assim, preciosa é a lição de Sílvio Rodrigues, verbis: Será o juiz, no exame do caso concreto, quem concederá ou não a indenização e a graduará de acordo com a intensidade e duração do sofrimento experimentado pela vítima (Direito Civil, Saraiva, S. Paulo, vol. 4, 7ª ed., 1983, p. 208-209). Nessa mesma linha, pela revogação da responsabilidade tarifada, o REsp n. 39.886 (DJ 03.11.1997), desta Turma, de que fui relator, que constou: Responsabilidade civil. Lei de Imprensa. Dano moral indenizado acima da limitação imposta pelo art. 52 da lei de regência. Revogação da norma em face da Constituição em vigor. No mesmo sentido, mais recentemente, o REsp n. 326.151-RJ (DJ 18.11.2002), relator o Ministro Cesar Asfor Rocha, assim ementado: Direito Civil. Lei de Imprensa. Dano moral. Indenização. Valor. A Constituição de 1988 afastou, para a fixação do valor da reparação do dano moral, as regras referentes aos limites tarifados previstas pela Lei de RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 319 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Imprensa, sobretudo quando as instâncias ordinárias constataram soberana e categoricamente, como no caso, o caráter insidioso da matéria de que decorreu a ofensa. Recurso não conhecido. 2. De outro lado, quando o valor da indenização se mostra manifestamente exagerado, ou irrisório, distanciando-se das finalidades da lei, é possível rever o quantum em sede de recurso especial. A indenização, como se tem assinalado em diversas oportunidades, além do seu escopo reparatório, deve também contribuir para desestimular o ofensor a repetir o ato. Todavia, deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento indevido, com notórios exageros, devendo o arbitramento operar-se com moderação, orientandose o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso. Na espécie, diante das circunstâncias do caso, e considerando os parâmetros fixados por esta Turma em casos semelhantes, tenho como razoável reduzir o valor indenizatório fixado pelo acórdão impugnado pela metade, mais especificamente para 500 (quinhentos) salários mínimos. 3. Por fim, do acórdão impugnado, no caso em tela, colho: A sentença bem apreciou os fundamentos da inicial e da contestação, concluindo que a ré divulgou matéria, em data de 08 de fevereiro de 1995, com destaque na chamada de capa da revista, intitulada “Por dentro da mala preta da OAS”, revestida de sensacionalismo, e atribuindo às autoras a prática de inúmeras irregularidades como lavagem de dinheiro, investimento externo ilícito, utilização do “caixa dois” e crime de sonegação fiscal, tudo com base em acesso a documentos pessoais delas, e com o intuito de conduzir os leitores à conclusão da prática dos alegados ilícitos, mas tudo sem um mínimo de provas e que produziram prejuízos morais e materiais, decorrentes de cancelamentos de contratos, de suspensão de negociações com inúmeras empresas. E concluiu a sentença que, sob o pretexto de informar, a empresa jornalística acabou por denegrir, descredenciar e desconceituar as atividades das empresas autoras, partindo, no entanto, de meros indícios, que não foram depois apurados ou, pelo menos, houve silêncio posterior, certo que a prova documental, especialmente de fls. 214-222 e os depoimentos de testemunhas, confirmam a ocorrência dos danos alegados. 320 SÚMULAS - PRECEDENTES Impõe-se reconhecer e admitir que, apesar da farta alegação de suspeição, em que se baseou a Revista, os fatos não encontraram comprovação posterior, inexistindo qualquer notícia a respeito das conclusões dos procedimentos instaurados, ignorando-se o destino do mencionado inquérito, referido na aludida publicação. Mas, nem por isso, com bem assinala a sentença, aquela publicação deixou de produzir os efeitos negativos que já se haviam feito sentir tão só com a circulação da revista. O dano moral é inquestionável, sobretudo porque a semente da descrença, da dúvida, da suspeição, ainda que não tenha germinado em fonte de prova irrefutável, já foi suficiente para o descrédito, não demonstrado que se tenha limitado apenas ao legítimo direito de informação. Destarte, tendo constado do aresto paulista que o veículo que publicou a matéria ofensiva à honra da vítima abusou do direito de narrar os fatos, não há como reexaminar a matéria nesta instância, por envolver análise das provas, vedada nos termos do Enunciado n. 7 da Súmula-STJ. 4. À vista do exposto, conheço parcialmente do recurso e, nesta parte, dou-lhe provimento parcial, para reduzir o valor indenizatório a 500 (quinhentos) salários mínimos, mantendo-se o acórdão impugnado quanto ao mais, inclusive em relação às verbas de sucumbência. Remetam-se os autos ao Supremo Tribunal Federal para análise do recurso extraordinário admitido na origem. RSSTJ, a. 5, (21): 281-321, agosto 2011 321 Súmula n. 282 SÚMULA N. 282 Cabe a citação por edital em ação monitória. Referência: CPC, art. 1.102b. Precedentes: REsp 173.591-MS (2ª S, 10.05.2000 – DJ 18.09.2000) REsp 297.413-MG (3ª T, 20.03.2001 – DJ 28.05.2001) REsp 297.421-MG (2ª S, 09.05.2001 – DJ 12.11.2001) Segunda Seção, em 28.04.2004 DJ 13.05.2004, p. 201 RECURSO ESPECIAL N. 173.591-MS (98.31903-4) (5.949) Relator: Ministro Carlos Alberto Menezes Direito Recorrente: Copagaz Distribuidora de Gás Ltda. Advogado: Newley A. S. Amarilla Recorrido: Luiz Freitas Tosta EMENTA Ação monitória. Citação por edital. Precedente da Corte. 1. A ação monitória é um remédio processual que substitui, de fato, a ação de cobrança, evitando o processo de conhecimento. O art. 1.102b do Código de Processo Civil não fala em mandado de citação, mas, sim, em mandado de pagamento ou de entrega da coisa no prazo de quinze dias. O que a regra jurídica deseja é que o réu, devedor, receba diretamente o mandado de pagamento. Ora, se tal não ocorre, se o réu não é encontrado, a ação monitória perde substância, não valendo, no caso, a citação ficta exatamente por esse particular aspecto. 2. Recurso especial não conhecido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Senhores Ministros da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, após o voto-vista do Senhor Ministro Ari Pargendler, por maioria, vencidos os Senhores Ministros Cesar Asfor Rocha e Ruy Rosado de Aguiar, não conhecer do recurso. Votaram como o Relator os Senhores Ministros Nilson Naves, Eduardo Ribeiro, Waldemar Zveiter e Ari Pargendler. Ausente, nesta assentada, o Senhor Ministro Eduardo Ribeiro. Não participou do julgamento o Senhor Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. Brasília (DF), 10 de maio de 2000 (data do julgamento). Ministro Barros Monteiro, Presidente Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Relator DJ 18.09.2000 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito: Copagaz Distribuidora de Gás Ltda. interpõe recurso especial com fundamento na alínea a do permissivo constitucional, contra acórdão proferido em agravo de instrumento, pela 2ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, assim ementado: Ementa. Agravo de instrumento. Procedimento monitório. Citação por edital. Incompatibilidade. Recurso improvido. A citação editalícia ou por hora certa é incompatível com o procedimento monitório, porque a apresentação de embargos transforma o procedimento especial em ordinário, tornando a ação monitória sem utilidade alguma para o agravante, pois seu objetivo é obter maior celeridade e efetividade com o uso de tal medida. (fls. 56). Sustenta a recorrente negativa de vigência aos artigos 231, inciso II, 232, inciso I, e 1.102, do Código de Processo Civil, eis que o pedido de citação por edital foi formulado após terem sido feitas diversas tentativas para descobrir o endereço do recorrido, sendo que todas restaram infrutíferas. Além do que, no procedimento monitório, regulado pelo artigo 1.102, letras a, b e c, do Código de Processo Civil, não há restrição “a qualquer modalidade de citação, admitindo, com isso, o acolhimento dos preceitos da Parte Geral do CPC neste tocante” (fls. 62), não havendo, portanto, qualquer razão para o indeferimento da citação por edital. Não oferecidas contra-razões (fls. 72), foi o recurso especial admitido (fls. 73-74). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito (Relator): A recorrente investe contra julgado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul que manteve despacho monocrático que considerou incompatível com a ação monitória a citação por edital. O especial vem com amparo nos artigos 231, II, 232, I, e 1.102 do Código de Processo Civil. Há um precedente da Corte, da relatoria do Senhor Ministro Nilson Naves (AgRgAg n. 166.337-MG, DJ de 31.08.1998), completa a Turma, considerando 328 SÚMULAS - PRECEDENTES impossível a citação por edital na ação monitória, entendendo o voto condutor que a decisão assim tomada não gera ofensa ao art. 231 do Código de Processo Civil. A questão é controvertida na doutrina. Cândido Rangel Dinamarco e Antônio Carlos Marcato entendem que a citação editalícia é possível, não havendo nenhuma restrição no art. 1.102b do Código de Processo Civil que justifique a vedação. Já Carreira Alvim considera que a citação por edital desqualifica a utilidade da ação monitória. No mesmo compasso é o magistério de Ernani Fidélis dos Santos, presente que para a formação do título por omissão de defesa impõe-se a efetiva manifestação de vontade, com o que não sendo possível a citação direta, ao credor cabe seguir para o processo de conhecimento. Como é sabido, a ação monitória é um remédio processual que substitui, de fato, a ação de cobrança, evitando o processo de conhecimento. Adverte Humberto Theodoro Júnior que o “mandado inicial não é de citação para que o réu venha contestar o pedido, mas para que venha solver a dívida demonstrada documentalmente” (Código de Processo Civil Anotado, Forense, 2ª ed., 1996, p. 441). O art. 1.102b não fala em mandado de citação, mas, sim, em mandado de pagamento ou de entrega da coisa no prazo de quinze dias. O que a regra jurídica deseja é que o réu, devedor, receba diretamente o mandado de pagamento. Ora, se tal não ocorre, se o réu não é encontrado, a ação monitória perde substância, não valendo, no caso, a citação ficta exatamente por esse particular aspecto. O objetivo da monitória é o pagamento pelo devedor. Se o devedor não é encontrado e opera-se a citação ficta, o curador especial que pode ser designado não tem condições de cumprir o objetivo da ação, assim o pagamento, mas, apenas, de oferecer embargos. Anote-se que há precedente da 4ª Turma, Relator o Senhor Ministro Ruy Rosado de Aguiar, admitindo a citação por edital (REsp n. 175.090-MG, julgado na sessão de 27.10.1998). Desse modo, na linha do precedente, não encontro as violações apontadas. Não conheço do especial. VOTO O Sr. Ministro Nilson Naves: - Sr. Presidente, na Turma, coube-me a relatoria do agravo regimental a que se referiu o Ministro Menezes Direito. RSSTJ, a. 5, (21): 323-346, agosto 2011 329 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Mantenho a posição ali exposta, pois, se se expede mandado de pagamento ou de entrega da coisa, tal procedimento não me parece compatível com a citação por edital. Não conheço do recurso especial. VOTO-VISTA O Sr. Ministro Eduardo Ribeiro: - O tema, como assinalou o Relator, é dos que mais se expõem a controvérsias. Aderi ao entendimento de que inviável o procedimento em questão, quando a citação haja de ser ficta, e não modifiquei minha opinião após mais refletir sobre o assunto. O que mais me impressiona é a falta de utilidade prática na adoção do procedimento monitório, quando não possa ser o réu citado pessoalmente. Como dificilmente tomará conhecimento do conteúdo do mandado, quase não haverá cogitar da possibilidade de que efetue o pagamento ou proceda à entrega da coisa. Não comparecendo, será necessária, segundo a melhor doutrina, a nomeação de curador para fazer sua defesa. Se até na execução já existe forte corrente, considerando indispensável essa nomeação, mais ainda o será no procedimento em questão como assinala Eduardo Talamini (Tutela Monitória - RT - 1998 - p. 120). O curador não poderá deixar de oferecer embargos, o que levará à incidência do disposto no § 2º do art. 1.102c, ou seja, o procedimento será o ordinário. Nenhuma vantagem, pois. Melhor que se siga, de logo, esse procedimento. Acompanho o Relator, pedindo vênia aos que entendem de modo diverso. VOTO-VISTA O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha: - O r. aresto recorrido manteve despacho monocrático que considerou incompatível com a ação monitória a citação por edital contra o que foi lançado o presente recurso por alegada violação aos arts. 231, II, 232, I, e 1.102a, 1.102b e 1.102c do Código de Processo Civil, ao fundamento de ser possível a citação editalícia. O eminente Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, relator do feito, prestigiou o julgado recorrido. Acompanharam Sua Excelência os eminentes Ministros Nilson Naves e Eduardo Ribeiro. Pedi vista dos autos para melhor examinar a matéria ousando concluir pela possibilidade de referida citação. 330 SÚMULAS - PRECEDENTES A uma, porque embora o art. 1.102b pontifique que “estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá de plano a expedição de mandado de pagamento ou de entrega da coisa no prazo de quinze dias”, sem se reportar, expressamente, que esse mandado é também de citação, nem por isso deixa ele de ter esse efeito, tanto que deve se revestir de todas as formalidades do mandado citatório, inclusive indicando o prazo de defesa (“CPC e legislação processual em vigor”, Theotônio Negrão, 30ª, ed., nota “1c” ao art. 1.102c), que é de quinze dias, sob a feição de embargos, conforme disposto no art. 1.102c. Quando muito poder-se-á dizer que o objetivo primeiro e primordial do mandado é o de convocar o devedor para efetuar, sem os ônus sucumbenciais, o pagamento. Mas sem dúvida que, em tal não ocorrendo, tem ele também, em um segundo momento, o condão de citar, tanto que gera graves efeitos, assim o de constituir, de pleno direito, o título executivo judicial, como preconizado pelo art. 1.102c, já mencionado. A duas, porque a lei não faz nenhuma restrição à possibilidade da citação editalícia no procedimento monitório o que atrai a incidência da regra geral contida no art. 231 e seus incisos da Lei de Ritos, que possibilita a citação por edital quando ignorado o lugar em que o réu se encontra, como na hipótese. A três, por uma razão prática. É que não sendo encontrado o réu e não sendo aceita a citação ficta, teria o autor de desistir da ação monitória para ingressar, valendo-se da mesmíssima documentação, com uma outra de cobrança ordinária, onerando-o com o pagamento de novas custas e contrariando o princípio de aproveitamento dos atos judiciais. Com efeito, com respeitosa vênia, divergindo dos que pensam em contrário, aceito, em linha de princípio, a citação por edital na ação monitória, tal como na espécie, como, aliás, entendem Carreira Alvim, Cândido José Dinamarco, Ada Pellegrini, José Rubens Costa e Humberto Theodoro Jr., sem conferir-lhe os efeitos da revelia. Diante de tais pressupostos, conheço do recurso e lhe dou provimento. VOTO O Sr. Ministro Waldemar Zveiter: - Sr. Presidente, peço licença ao eminente Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha para acompanhar o voto do eminente Sr. Ministro-Relator. RSSTJ, a. 5, (21): 323-346, agosto 2011 331 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VOTO-VOGAL O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: - Sr. Presidente, peço vênia aos demais Colegas para acompanhar o eminente Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha pela sua fundamentação, mesmo porque tenho votado no mesmo sentido de Sua Excelência. VOTO-VISTA O Sr. Ministro Ari Pargendler: - Sr. Presidente, trata-se de questão referente à possibilidade da citação por edital na ação monitória. Acompanho o voto do eminente Relator por entender que a citação por edital teria pouco efeito prático. RECURSO ESPECIAL N. 297.413-MG (2000.0146972-0) Relatora: Ministra Nancy Andrighi Recorrente: Unibanco União de Bancos Brasileiros S/A Advogado: Wania Guimarães Rabello de Almeida e outros Recorrido: Folheados de São Paulo Indústria e Comércio Ltda. Advogado: Maria Luisa Pereira Gomide - Defensor Público EMENTA Processual Civil. Ação monitória. Citação por edital. Possibilidade. O procedimento monitório é uma das formas de desenvolvimento do processo de conhecimento, aplicando-se-lhe, subsidiariamente, as disposições gerais de procedimento ordinário. Assim, inexistindo no procedimento especial da monitoria vedação ao emprego de citação por edital, aplicam-se-lhe as regras do procedimento ordinário para a realização de comunicação das partes. 332 SÚMULAS - PRECEDENTES ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento. Votaram com a Sra. Ministra-Relatora os Srs. Ministros Pádua Ribeiro, Ari Pargendler e Menezes Direito. Brasília (DF), 20 de março de 2001 (data do julgamento). Ministro Ari Pargendler, Presidente Ministra Nancy Andrighi, Relatora DJ 28.05.2001 RELATÓRIO A Sra. Ministra Nancy Andrighi: Cuida-se de ação monitória ajuizada por Unibanco - União de Bancos Brasileiros S/A. face a Folheados de São Paulo Ind. e Com. Ltda., objetivando a constituição de título executivo judicial com base em duplicatas mercantis. Não tendo sido encontrado o recorrido, foi citado por edital. Nomeado Curador e apresentada defesa, o processo foi extinto, por entender o Primeiro Tribunal de Alçada de Minas Gerais ser inviável a citação por edital em ação monitória. Irresignado, interpôs o autor recurso especial, com fulcro no art. 105, inciso III, alíneas a e c, alegando contrariedade aos artigos 1.102, 221, III, e 231, II do CPC. Aberta vista ao recorrido, este não ofertou contra-razões. É o relatório. VOTO A Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relatora): O cerne da controvérsia diz respeito à possibilidade de citação por edital em ação monitória. A questão é assaz controvertida na doutrina. Cândido Rangel Dinamarco e Antônio Carlos Marcato entendem que a citação editalícia é possível, não havendo nenhuma restrição no art. 1.102b que justifique a referida vedação. RSSTJ, a. 5, (21): 323-346, agosto 2011 333 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Em contraposição, manifesta-se Emane Fidélis1, para quem “de alguma forma, para a aceitação da formação de título por omissão de defesa, é mister a efetiva manifestação de vontade, que está além dos poderes de atuação do curador. Este, por outro lado, com a simples missão de se opor em defesa, não pode demonstrar interesse a embargos, que são verdadeira ação. Na impossibilidade, pois, de citação, direta, ao credor só resta a opção do processo do conhecimento.” Igualmente, nesta Corte, a questão ainda não encontrou consenso, havendo precedentes em ambos os sentidos, a saber: 1. A ação monitória é um remédio processual que substitui, de fato, a ação de cobrança, evitando o processo de conhecimento. O art. 1.102b do Código de Processo Civil não fala em mandado de citação, mas, sim, em mandado de pagamento ou de entrega da coisa no prazo de quinze dias. O que a regra jurídica deseja é que o réu, devedor, receba diretamente o mandado de pagamento. Ora, se tal não ocorre, se o réu não é encontrado, a ação monitória perde substância, não valendo, no caso, a citação fida exatamente por esse particular aspecto. 2. Recurso especial não conhecido. (REsp n. 173.591-MS; DJ: 18.09.2000, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito). Ação monitória. Citação por edital. É possível a citação por edital do réu em ação monitória; sendo ele revel, nomear-se-á curador especial para exercer a sua defesa através de embargos (art. 1.102 do CPC). Recurso conhecido e provido. (REsp n. 175.090-MS; DJ: 28.02.2000, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar). A respeito do tema, já me pronunciei quando então Desembargadora do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, na APC n. 5.048.298DF publicada no DJ 09.06.1999, de que fui relatora, profligando a tese de que, estando a ação monitória, inserta no processo de conhecimento, apenas sendo regida por procedimento especial, aplicam-se-lhe por igual as mesmas formas de comunicação das partes, entre as quais encontra-se a citação por edital. Neste sentido, é a abalizada doutrina de Luiz Rodrigues Wambier, Flávio Renato Correia de Almeida e Eduardo Talamini2, a qual pedimos vênia para transcrever: 334 1 Manual de Direito Processual Civil, 6ª edição, SP, 1999, Saraiva, Vol. 3, p. 173. 2 Curso Avançado de Processo Civil, Vol. 3, 2ª Edição, RT, p. 285-286 SÚMULAS - PRECEDENTES A nosso ver, o problema não reside tanto em definir se são admissíveis estas formas de citação no procedimento monitório, pois não há dispositivo legal que vede seu emprego. O cerne da questão está em definir coerentemente as conseqüências do não comparecimento do réu (ausência de pagamento e de embargos), quando ficticiamente citado. No processo comum de conhecimento, quando a citação é “ficta” e o réu revel, nomeia-se curador especial em seu benefício. E depreende-se que nesses casos não haverá o chamado “efeito principal da revelia”: não serão presumidos verdadeiros os fatos narrados na inicial (art. 302, parágrafo único, c.c. o art. 320). Se contra o réu, que foi ficticiamente citado e ficou revel, não se aplica o efeito da revelia, é injustificável que réu citado da mesma forma, ao não interpor embargos ao mandado, sofra o efeito da formação automática do “título executivo” no procedimento monitório, o qual, sob certo aspecto, é té mais grave (afinal, a “presunção” relativa de veracidade advinda da revelia não impõe necessário e automático julgamento contrário ao revel). (...) Apesar de tudo isso, não se pode afirmar que, havendo necessidade de citação ficta, seria incabível o procedimento monitório, eis que: (a) por vezes, a necessidade de citação ficta só é constatada depois que o processo já se iniciou e não é cabível subordinar o processo a um pressuposto que só se define depois de sua instauração; (b) há sempre a chance de que a citação, mesmo se dando por edital, chegue ao efetivo conhecimento do réu, e até, incentivado pela isenção de custas e honorários, opte por cumprir o mandado. Acresça-se em defesa deste entendimento a pertinente observação do em. Ministro Cesar Asfor Rocha no REsp n. 173.591-MG, no sentido da utilidade do acolhimento da citação editalícia no procedimento monitório, pois “(...) não sendo encontrado o réu e não sendo aceita a citação ficta, teria o auto de desistir da ação monitória para ingressar, valendo-se da mesmíssima documentação, com uma outra de cobrança ordinária, onerando-se com o pagamento de novas custas e contrariando o princípio do aproveitamento dos atos processuais”. Forte nestas razões, dou provimento ao recurso, para que o processo prossiga na esteira do devido processo legal. É o voto. RECURSO ESPECIAL N. 297.421-MG (2000.0146985-1) Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira Recorrente: Banco ABN AMRO S/A RSSTJ, a. 5, (21): 323-346, agosto 2011 335 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Den. Ant.: Banco Real S/A Advogado: Edelberto Augusto Gomes Lima e outros Recorrido: Gustavo Souza Filho EMENTA Processo Civil. Procedimento monitório. Citação por edital. Admissibilidade. Precedente da Quarta Turma. Doutrina. Recurso acolhido. - É possível a citação por edital do réu em ação monitória. No caso de revelia, nomear-se-á curador especial para exercer a defesa do réu através de embargos. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Votaram com o Relator os Ministros Cesar Asfor Rocha, Ruy Rosado de Aguiar, Aldir Passarinho Júnior, Nancy Andrighi e Antônio de Pádua Ribeiro. Vencidos os Ministros Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes Direito. Brasília (DF), 09 de maio de 2001 (data do julgamento). Ministro Barros Monteiro, Presidente Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Relator DJ 12.11.2001 EXPOSIÇÃO O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: Contra acórdão do Tribunal de Alçada de Minas Gerais, que entendeu inadmissível a citação por edital em procedimento monitório, interpôs o autor recurso especial. Alega-se, além de dissídio jurisprudencial, violação dos arts. 272 e 1.102-b, CPC. Admitido o recurso, subiram os autos. É o relatório. 336 SÚMULAS - PRECEDENTES VOTO O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira (Relator): 1. O tema não é novo na Segunda Seção deste Tribunal. No REsp n. 173.591-MS (DJ 18.09.2000) restou sufragada, por maioria, orientação pelo descabimento da citação por edital em procedimento monitório. O voto condutor desse precedente, relator o Ministro Menezes Direito, teve a seguinte fundamentação: A recorrente investe contra julgado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul que manteve despacho monocrático que considerou incompatível com a ação monitória a citação por edital. O especial vem com amparo nos artigos 231, II, 232, I, e 1.102 do Código de Processo Civil. Há um precedente da Corte, da relatoria do Senhor Ministro Nilson Naves (AgRgAg n. 166.337-MG, DJ de 31.08.1998), completa a Turma, considerando impossível a citação por edital na ação monitória, entendendo o voto condutor que a decisão assim tomada não gera ofensa ao art. 231 do Código de Processo Civil. A questão é controvertida na doutrina. Cândido Rangel Dinamarco e Antônio Carlos Marcato entendem que a citação editalícia é possível, não havendo nenhuma restrição no art. 1.102b do Código de Processo Civil que justifique a vedação. Já Carreira Alvim considera que a citação por edital desqualifica a utilidade da ação monitória. No mesmo compasso é o magistério de Ernani Fidélis dos Santos, presente que para a formação do título por omissão de defesa impõe-se a efetiva manifestação de vontade, com o que não sendo possível a citação direta, ao credor caber seguir para o processo de conhecimento. Como é sabido, a ação monitória é um remédio processual que substitui, de fato, a ação de cobrança, evitando o processo de conhecimento. Adverte Humberto Teodoro Júnior que o “mandado inicial não é de citação para que o réu venha contestar o pedido, mas para que venha solver a dívida demonstrada documentalmente” (Código de Processo Civil Anotado, Forense, 2ª ed., 1996, p. 441). O art. 1.102b não fala em mandado de citação, mas, sim, em mandado de pagamento ou de entrega da coisa no prazo de quinze dias. O que a regra jurídica deseja é que o réu, devedor, receba diretamente o mandado de pagamento. Ora, se tal não ocorre, se o réu não é encontrado, a ação monitória perde substância, não valendo, no caso, a citação ficta exatamente por esse particular aspecto. O objetivo da monitoria é o pagamento pelo devedor. Se o devedor não é encontrado e opera-se a citação ficta, o curador especial que pode ser designado não tem condições de cumprir o objetivo da ação, assim o pagamento, mas, apenas, de oferecer embargos. RSSTJ, a. 5, (21): 323-346, agosto 2011 337 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA O Ministro Eduardo Ribeiro, de seu turno, assim se expressou: O tema, como assinalou o Relator, é dos que mais se expõem a controvérsias. Aderi ao entendimento de que inviável o procedimento em questão, quando a citação haja de ser ficta, e não modifiquei minha opinião após mais refletir sobre o assunto. O que mais me impressiona é a falta de utilidade prática na adoção do procedimento monitório, quando não possa ser o réu citado pessoalmente. Como dificilmente tomará conhecimento do conteúdo do mandado, quase não haverá cogitar da possibilidade de que efetue o pagamento ou proceda à entrega da coisa. Não comparecendo, será necessária, segundo a melhor doutrina, a nomeação de curador para fazer sua defesa. Se até na execução já existe forte corrente, considerando indispensável essa nomeação, mais ainda o será no procedimento em questão como assinala Eduardo Talamini (Tutela Monitória - RT- 1998 - p. 120). O curado não poderá deixar de oferecer embargos, o que levará à incidência do disposto no § 2º do art. 1.102c, ou seja, o procedimento será o ordinário. Nenhuma vantagem, pois. Melhor que se siga, de logo, esse procedimento. Acompanho o relator, pedindo vênia aos que entendem de modo diverso. O aresto recebeu esta ementa: Ação monitória. Citação por edital. Precedente da Corte. 1. Ação monitória é um remédio processual que substitui, de fato, a ação de cobrança, evitando o processo de conhecimento. O art. 1.102b do Código de Processo Civil não fala em mandado de citação, mas, sim, em mandado de pagamento ou de entrega da coisa no prazo de quinze dias. O que a regra jurídica deseja é que o réu, devedor, receba diretamente o mandado de pagamento. Ora, se tal não ocorre, se o réu não é encontrado, a ação monitória perde substância, não valendo, no caso, a citação ficta exatamente por esse particular aspecto. 2. Recurso especial não conhecido. 2. Tenho que a matéria está a merecer novo exame da Segunda Seção. A uma, porque, naquela oportunidade somente votaram dois dos cinco Ministros (Cesar Asfor Rocha e Ruy Rosado de Aguiar) da Quarta Turma, que, por unanimidade, tem posicionamento contrário à tese que naquele julgado veio a prevalecer. A duas, porque se trata de matéria ainda nova em nosso ordenamento jurídico, que somente agora está chegando ao exame deste Tribunal. A três, porque a própria doutrina tem reformulado, inclusive, anterior entendimento mais radical. 338 SÚMULAS - PRECEDENTES 3. No julgamento do REsp n. 175.090-MS (DJ 28.02.2000), sob a relatoria do Ministro Ruy Rosado de Aguiar, a Quarta Turma, por unanimidade, acolheu entendimento pela possibilidade da citação por edital em procedimento monitório, consoante esta ementa: Ação monitória. Citação por edital. É possível a citação por edital do réu em ação monitória; sendo ele revel, nomear-se-á curador especial para exercer a sua defesa através de embargos (art. 1.102 do CPC). Recurso conhecido e provido. Do voto do seu relator, colho: Trata-se de saber se é cabível a citação por edital na ação monitória. O r. julgado, fundado em lições doutrinárias, entende que a citação por edital leva à necessidade de nomeação de curador especial que, por sua vez, estará obrigado a oferecer embargos, o que transforma o procedimento especial em ordinário, a comprometer as vantagens perseguidas com a efetividade e a celeridade da ação monitória. Penso que a razão está com o recorrente. Como em qualquer outro processo de conhecimento de natureza condenatória, a citação na ação monitória tem os mesmos fins e efeitos dos referidos nos arts. 213 e 219 do CPC. Quando ignorado, incerta ou inacessível o lugar onde se encontra o réu, cabe a sua citação por edital. Assim também na ação monitória: “A citação do réu no processo monitório, com essa injunção a pagar ou entregar e advertência do risco da inércia (e isso se constitui numa intimação acoplada à citação), será feita pelas vias normais, ou seja: correio, oficial de justiça, precatória, edital, etc, conforme o caso (arts. 221, 222, 238: v. supra, nn. 53 ss.). (A Reforma do Código de Processo Civil, Cândido Rangel Dinamarco, 3ª ed., Malheiros, São Paulo, p. 241). (fl. 06) O procedimento adotado na ação monitória não pressupõe o assentimento do réu como requisito para a propositura da ação ou à constituição do título executivo. Se o réu cumprir o mandado, extingue-se o processo; se não embargar, constitui-se, de pleno direito, o título executivo; mas o réu pode embargar, porquanto essa é uma das alternativas que a lei lhe permite e faz parte do sistema inaugurado no art. 1.102 do CPC, o que não significa que a ação era inadequada nem leva à extinção do processo por perda de objeto ou desaparecimento das suas vantagens. Nesse caso, embargada a ação, cumpre-se o disposto no § 2º do referido artigo da Lei Processual. Ora, sendo o réu citado por edital e revel, a ele será nomeado curador especial, que poderá embargar: “Quando este (o executado) for citado por editais e não RSSTJ, a. 5, (21): 323-346, agosto 2011 339 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA comparecer ao processo, a ele deve ser dado curador especial, que poderá opor embargos de devedor” (Nelson Nery e Rosa Maria Nery, Código de Processo Civil, p. 270, n. 17). Se o curador do executado citado por editais e revel pode embargar, com igual razão há de se permitir tal procedimento na ação monitória, que nem por isso se descaracteriza ou inviabiliza. É de ponderar que, muitas vezes, o réu da ação monitória, que tinha endereço certo, pode não mais ser encontrado. Nesse caso, nada justifica a extinção do processo para que outro se inicie, com novas despesas e perda de tempo. Mesmo porque o título executivo, que o credor obteria ao final da ação ordinária de cobrança, poderá, igualmente, ser obtido na via monitória. Posto isso, conheço do recurso, pela alínea a, e lhe dou provimento para deferir a citação por edital da ré, depois de esgotados os meios de o autor indicar o seu endereço. Com respeitosa vênia da Seção, não vejo razão, assim como no precedente da Turma, para deixar de admitir-se a citação por edital no procedimento monitório. Primeiro, porque, uma vez citado o réu por edital, será nomeado, da mesma forma que no procedimento ordinário, curador especial (art. 9º-II, CPC), que deverá apresentar defesa. Segundo, porque, apresentados embargos pelo curador, o processo seguirá o rito ordinário. Assim, não há motivo para anular-se a ação monitória para que outra ação, que também seguirá o procedimento ordinário, seja ajuizada. Terceiro, porque a legislação processual não afasta as modalidades de citações por hora certa e edital no procedimento monitório, sabido que o legislador, quando quis fazer restrição a alguma modalidade de citação, o fez expressamente (v.g, art. 222, CPC). Quarto, porque não se sustenta o argumento de que a conseqüência da revelia no procedimento monitório é mais grave. Da mesma forma que ocorre no procedimento monitório, a revelia no processo de conhecimento também propicia a formação de um título executivo. Quinto, porque o procedimento monitório é até mais benéfico ao devedor do que o ordinário, uma vez nele ausente a previsão do pagamento de despesas processuais e honorários advocatícios, no caso de pagamento voluntário. Sexto, porque também manifesto o predomínio da celeridade, dado que, no monitório a formação do título executivo se dá com muito maior presteza, sem prejuízo do contraditório, uma das razões que têm levado esta Corte, em 340 SÚMULAS - PRECEDENTES julgados recentes, a prestigiar o referido instituto, que se notabilizou no direito estrangeiro. 4. Além de Humberto Theodoro Júnior e das já mencionadas lições de Dinamarco e Marcato, afirma José Rubens Costa: Também entendo possível a citação ficta, por edital ou com hora certa, caso em que, não comparecendo o devedor, não se impõe a conseqüência da revelia, senão nomeia-se curador especial (art. 9º, II, parte final) (Ação Monitória, Saraiva, n. 33, p. 40). Por seu turno, Carreira Alvim, talvez o doutrinador que mais tem se dedicado ao estudo desse instituto recentemente incorporado ao direito brasileiro, e revendo posição anterior, assinala a propósito (Procedimento Monitório, Juruá, 3ª ed., cap. IV, n. 5, p. 78): Doutrina Cândido Dinamarco que a citação do réu no processo monitório, com a injunção de pagar ou entregar e advertência do risco da inércia (e isso se constitui numa intimação acoplada à citação), será feita pelas formas normais, ou seja: pelo correio, oficial de justiça, precatória, edital, etc., conforme o caso (arts. 221, 222, 238). As únicas restrições impostas pelo Código de Processo Civil vêm elencadas no art. 222, que excetua da citação pelo correio; nas ações de estado; quando for ré pessoa incapaz, quando for ré pessoa jurídica de direito público, nos processos de execução, quando o réu residir em local não atendido pela entrega domiciliar de correspondência e quando o autor a requerer de outra forma. Esse sempre foi, também, o meu pensamento, desde o Código de Processo Civil Reformado, quando afirmei: Como a citação do réu se dá através de um ato formal que é a citação, aplica-se ao procedimento monitório o disposto no art. 9º, II, de modo que ao revel, citado por edital ou com hora certa - tanto quanto no processo de execução - dar-se-á curador especial. A necessidade de curador especial, em circunstâncias, é pacificamente reconhecida na jurisprudência (REsp n. 21.573-SP, Rel. Min. Américo Luz, STJ, 2ª T., M., DJ 28.11.1994, p. 32.601), dispondo ele de legitimação para opor embargos do devedor citado por edital (REsp n. 37.66-RJ, Rel. Min. Torreão Braz, STJ, 4ª T., un., DJ 1º.08.1994, p. 18.655). Em pólo oposto, posiciona-se o ilustre Ernane Fidélis dos Santos, nestes termos: A citação ficta, edital e hora certa, não se comporta, porém, no procedimento, porque, de alguma forma, para aceitação da formação de RSSTJ, a. 5, (21): 323-346, agosto 2011 341 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA título por omissão de defesa, há mister efetiva manifestação de vontade, que está além dos poderes de atuação do curador. Este, por outro lado, com a simples missão de se opor em defesa, não pode demonstrar interesse a embargos, que são verdadeira ação. Na impossibilidade, pois, de citação direta, ao credor só resta a opção do processo de conhecimento. O fato de o curador especial não poder demonstrar interesse nos embargos circunstância que o ilustre jurista coloca como empecilho ao manejo da monitória - não se ajusta à jurisprudência que se formou no Supremo Tribunal Federal, que sempre entendeu ser possível e indispensável a nomeação de curador especial ao revel no processo de execução, e, mais recentemente, no Superior Tribunal de Justiça, que expediu a Súmula n. 196 no mesmo sentido (“Ao executado que, citado por edital ou por hora certa, permanecer revel, será nomeado curador especial, com legitimidade para apresentação de embargos”). Portanto, tollitur quaestio. Por outro lado, se restasse ao credor a única opção do processo de conhecimento, ali seria possível a citação por edital ou hora certa, modalidade de ciência presumida, e, sendo revel o citando, ser-lhe-ia dado curador especial com a missão de oferecer defesa. Ademais, na prática, a necessidade da citação por hora certa ou edital só se faz necessária no curso do processo, quando o oficial de justiça tenta a citação pessoal do devedor e não o encontra ou não localiza o seu paradeiro. Daí, e por questão de economia processual, deveria o juiz converter o feito em ordinário, retificar a autuação, e determinar a citação ficta (hora certa ou edital). Como o que justifica a monitória é a provável suposição de que não haverá contestação e que o devedor não oferecerá resistência à pretensão, o que pode acontecer é não haver interesse do edital, sabendo, de antemão, que haverá designação de curador especial e oferecimento de embargos, fazendo o procedimento prosseguir pelo rito ordinário. Mas, nem isso será possível prever com absoluta certeza, porque não são raros os casos em que o citado por edital toma conhecimento da demanda e se faz presente no processo, acudindo ao chamamento judicial para oferecer defesa. Portanto, não vejo incompatibilidade absoluta da citação por hora certa ou por edital com a ação monitória, podendo quando muito não haver utilidade se o credor puder supor, por fundamento razoável, que o devedor não responderá à demanda, dando ensejo à nomeação de curador especial, caso em que o feito seguirá o rito ordinário. Em obra recente, Eduardo Talamini transcreve acórdão da TACivSP, no AgIn n. 690.240-3, 8ª Câm. Cív. j. 25.09.1996, Rel. para o acórdão Franklin Nogueira, cuja ementa é a seguinte: 342 SÚMULAS - PRECEDENTES Monitória. Citação por hora certa. Possibilidade. Recurso provido para admiti-la, desde qu e preenchidos os requisitos legais, por maioria de votos. Em seu voto, assim se expressou o relator, com a maior propriedade: A ação monitória, portanto, tem como objetivo a formação de um título executivo. Não tem, desta forma, natureza jurídica de execução. Trata-se, nitidamente, de uma ação de conhecimento, cuja finalidade é, repita-se, a formação de um título executivo. Tanto que está inserida no capítulo relativo aos procedimentos especiais de jurisdição contenciosa. E o título executivo, sem o qual não se há falar em processo de execução, apenas se constitui se não forem opostos os embargos no prazo legal. Não se lhe aplicam, pois, as restrições inerentes à ação de execução. Por isso, não se justifica a alegada impossibilidade de citação por hora certa. Dando-me a honra da citação, assim ementou o TJPR, n AgIn n. 0052.182-00, a 21ª Câm. Cív., j. 11.12.1996, Rel. Des. Accácio Cambi, acórdão que admitiu a citação por hora certa: Ação monitória. Réu citado com hora certa. Descabimento. Agravo. Decisão cassada. Não havendo qualquer restrição, nos dispositivos que regulam a ação monitória, é possível a citação do réu com hora certa, aplicando-se, assim, as normas processuais previstas no Livro I do CPC (processo de conhecimento). A propósito, assim se manifestou o ilustre relator, verbis: Contudo, deve prevalecer o entendimento majoritário, com apoio na jurisprudência, porque a citação com hora certa é perfeitamente viável na ação monitória - não se alegue que, na ação de execução, é descabida tal modalidade de citação, porque tal entendimento não tem sido acolhido pelo STJ, conforme anota Theotônio Negrão, CPC e legislação processual em vigor, 27, ed., p. 76, ao se referir que “é obrigatória a nomeação de curador à lide ao executado que, citado por edital, não comparece a juízo” - e porque não se pode exigir que o credor, havendo ocultação do devedor, para receber a citação pessoal, tenha que ajuizar ação de cobrança, quando o Estatuto Processual Civil coloca à sua disposição um instrumento mais ágil e eficaz para receber o seu crédito. Nesta condições, impõe-se que seja cassada a decisão impugnada, a fim de que a ação proposta prossiga em seus trâmites normais. RSSTJ, a. 5, (21): 323-346, agosto 2011 343 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Transcreve o mesmo autor, acórdão do TAMG, no AgIn n. 229.148-1, 3ª Câm. Cív., j. em 05.03.1997, Rel. Juiz Duarte de Paula, em que entendeu aquela Corte incabível a citação por edital, como se vê abaixo: Ação monitória. Citação por edital. Impossibilidade. Por se constituir a ação monitória espécie de procedimento que propicia a formação de um título executivo judicial, não comporta a modalidade de citação ficta ou editalícia. Os embargos, através dos quais se defende o devedor, têm natureza declaratória ou constitutiva, sendo mister a efetiva manifestação da vontade do demandado, que ultrapassa os limites dos poderes do Curador Especial, nomeado ao citado por edital. Recurso a que se nega provimento. Data vênia, o fundamento relativo aos poderes do Curador Especial não tem o endosso da jurisprudência, nem no Supremo Tribunal Federal, nem no Superior Tribunal de Justiça, como se viu, e o argumento de que a ação monitória propicia a formação de um título executivo judicial também não convence, porque o mesmo acontece no processo de conhecimento, e nem por isso ele se mostra avesso à citação ficta. Neste caso, não se tratava de pessoa jurídica de direito público, pelo que a jurisprudência do Tribunal de Alçada de Minas Gerais levou mais longe o pensamento do ilustre Ernane Fidélis dos Santos, não admitindo a citação por edital nem mesmo quando o devedor é uma pessoa jurídica de direito privado (no caso, a Boa Vida Assistência à Saúde S/C Ltda.). Aliás, preferindo o procedimento monitório, o credor deixado o réu a faculdade de valer-se do disposto no § 1º do art. 1.102c do CPC, efetuando o pagamento para obter a isenção de custas e honorários advocatícios, o que não acontece com o procedimento ordinário, em que, mesmo reconhecendo a procedência do pedido, está o réu sujeito às verbas decorrentes da sucumbência. Portanto, ao contrário do que parece à primeira vista, o entendimento perfilhado por Ernane Fidélis dos Santos e pelo Tribunal de Alçada de Minas Gerais, é, do ponto de vista procedimental, menos favorável ao devedor do que o procedimento monitório. Ainda do mesmo doutrinador, “Ação Monitória e Temas Polêmicos da Reforma Processual”, Del Rey, 3ª ed., cap. I, n. 25, p. 62-64 e “Código de Processo Civil Reformado”, Del Rey, 4a ed., cap. XXIII, n. 23, p. 432. 5. Por fim, registro que a mesma Terceira Turma deste Tribunal, na sessão de 20 de março último, no REsp n. 297.413-MG, sob a relatoria da Ministra Nancy Andrighi, por unanimidade, presentes os Ministros Pádua Ribeiro, Ari Pargendler e Menezes Direito, ementou: Processual Civil. Ação monitória. Citação por edital. Possibilidade. 344 SÚMULAS - PRECEDENTES O procedimento monitório é uma das formas de desenvolvimento do processo de conhecimento, aplicando-se-lhe, subsidiariamente, as disposições gerais de procedimento ordinário. Assim, inexistindo no procedimento especial da monitória vedação ao emprego de citação por edital, aplicam-se-lhe as regras do procedimento ordinário para a realização de comunicação das partes. 6. À luz do exposto, conheço do recurso e dou-lhe provimento para admitir a citação do réu-recorrido por edital. VOTO VENCIDO O Sr. Ministro Ari Pargendler: Sr. Presidente, creio que já manifestei minha opinião de que, realmente, fica inútil a ação monitória nessa circunstância. O melhor é a parte ajuizar uma ação ordinária. Divirjo do Sr. Ministro Relator. VOTO VENCIDO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito: Senhor Presidente, acompanho o voto divergente do Senhor Ministro Ari Pargendler, reiterando os termos do voto que proferi, como Relator, no REsp n. 173.591-MS (DJ de 18.09.2000), que foi acolhido pela maioria desta Segunda Seção. ANEXO RECURSO ESPECIAL N. 173.591-MS - (5.949) Ementa: Ação monitória. Citação por edital. Precedente da Corte. 1. A ação monitória é um remédio processual que substitui, de fato, a ação de cobrança, evitando o processo de conhecimento. O art. 1.102b do Código de Processo Civil não fala em mandado de citação, mas, sim, em mandado de pagamento ou de entrega da coisa no prazo de quinze dias. O que a regra jurídica deseja é que o réu, devedor, receba diretamente o mandado de pagamento. Ora, se tal não ocorre, se o réu não é encontrado, a ação monitória perde substância, não valendo, no caso, a citação ficta exatamente por esse particular aspecto. 2. Recurso especial não conhecido. VOTO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito (Relator): A recorrente investe contra julgado do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul que RSSTJ, a. 5, (21): 323-346, agosto 2011 345 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA manteve despacho monocrático que considerou incompatível com a ação monitória a citação por edital. O especial vem com amparo nos artigos 231, II, 232, I, e 1.102 do Código de Processo Civil. Há um precedente da Corte, da relatoria do Senhor Ministro Nilson Naves (AgRgAg n. 166.337-MG, DJ de 31.08.1998), completa a Turma, considerando impossível a citação por edital na ação monitória, entendendo o voto condutor que a decisão assim tomada não gera ofensa ao art. 231 do Código de Processo Civil. A questão é controvertida na doutrina. Cândido Rangel Dinamarco e Antônio Carlos Marcato entendem que a citação editalícia é possível, não havendo nenhuma restrição no art. 1.102b do Código de Processo Civil que justifique a vedação. Já Carreira Alvim considera que a citação por edital desqualifica a utilidade da ação monitória. No mesmo compasso é o magistério de Ernani Fidélis dos Santos, presente que para a formação do título por omissão de defesa impõe-se a efetiva manifestação de vontade, com o que não sendo possível a citação direta, ao credor cabe seguir para o processo de conhecimento. Como é sabido, a ação monitória é um remédio processual que substitui, de fato, a ação de cobrança, evitando o processo de conhecimento. Adverte Humberto Theodoro Júnior que o “mandado inicial não é de citação para que o réu venha contestar o pedido, mas para que venha solver a dívida demonstrada documentalmente” (Código de Processo Civil Anotado, Forense, 2ª ed., 1996, p. 441). O art. 1.102b não fala em mandado de citação, mas, sim, em mandado de pagamento ou de entrega da coisa no prazo de quinze dias. O que a regra jurídica deseja é que o réu, devedor, receba diretamente o mandado de pagamento. Ora, se tal não ocorre, se o réu não é encontrado, a ação monitória perde substância, não valendo, no caso, a citação ficta exatamente por esse particular aspecto. O objetivo da monitória é o pagamento pelo devedor. Se o devedor não é encontrado e opera-se a citação ficta, o curador especial que pode ser designado não tem condições de cumprir o objetivo da ação, assim o pagamento, mas, apenas, de oferecer embargos. Anote-se que há precedente da 4ª Turma, Relator o Senhor Ministro Ruy Rosado de Aguiar, admitindo a citação por edital (REsp n. 175.090-MG, julgado na sessão de 27.10.1998). Desse modo, na linha do precedente, não encontro as violações apontadas. Não conheço do especial. 346 Súmula n. 283 SÚMULA N. 283 As empresas administradoras de cartão de crédito são instituições financeiras e, por isso, os juros remuneratórios por elas cobrados não sofrem as limitações da Lei de Usura. Referências: Lei n. 4.595/1964, art. 10, X. Decreto n. 22.626/1933, art. 4º. Súmula n. 596-STF. Precedentes: AgRg no Ag 467.904-SP (4ª T, 19.08.2003 – DJ 22.09.2003) AgRg no Ag 481.127-RS (4ª T, 12.08.2003 – DJ 22.09.2003) AgRg no REsp 518.639-RS (3ª T, 29.10.2003 – DJ 1º.12.2003) REsp 337.332-RS (4ª T, 02.09.2003 – DJ 24.11.2003) REsp 441.932-RS (3ª T, 12.08.2003 – DJ 13.10.2003) REsp 450.453-RS (2ª S, 25.06.2003 – DJ 25.02.2004) Segunda Seção, em 28.04.2004 DJ 13.05.2004, p. 201 AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 467.904-SP (2002.0104933-6) Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior Agravante: Sérgio Mauro Advogado: Rodrigo Barreto Cogo e outros Agravado: Credicard S/A Administradora de Cartões de Crédito Advogado: Elio Antônio Colombo Junior e outro EMENTA Civil e Processual. Acórdão. Nulidade não configurada. Recurso especial. Juros. Capitalização. Matéria fática. Súmulas n. 5 e n. 7-STJ. Administradora de cartão de crédito. Enquadramento como instituição financeira reconhecida pela 2ª Seção do STJ. Juros. Limitação inexistente. Embargos declaratórios recebidos como agravo. Propósito infringente. Improvimento. I. Não há nulidade no acórdão que enfrenta suficientemente as questões essenciais, apenas que com conclusões contrárias ao interesse da parte. II. “A simples interpretação de cláusula contratual não enseja recurso especial” - Súmula n. 5-STJ. III. “A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial” - Súmula n. 7-STJ. IV. As administradoras de cartão de crédito inserem-se na categoria de instituição financeira. V. Agravo improvido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Participaram do julgamento os Srs. Ministros Sálvio de Figueiredo Teixeira e Fernando Gonçalves. Ausentes, ocasionalmente, os Srs. Ministros Barros Monteiro e Cesar Asfor Rocha. Custas, como de lei. Brasília (DF), 19 de agosto de 2003 (data do julgamento). Ministro Aldir Passarinho Junior, Relator DJ 22.09.2003 RELATÓRIO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: Sérgio Mauro interpõe embargos de declaração contra decisão do seguinte teor (fls. 718-721): Trata-se de agravo de instrumento manifestado por Sérgio Mauro contra a inadmissão de dois recursos especiais. Adoto a fundamentação do despacho de fls. 675-678, verbis: Recursos Especiais interpostos contra vv. acórdãos da Egrégia Oitava Câmara (fls. 260-4, 274-5, 370-2 e 383-5). O recurso manifestado contra o v. acórdão da Apelação sustenta ofensa aos arts. 535, incs. I e II, do Código de Processo Civil, 115 do Código Civil, 51, inc. VIII, da Lei n. 8.078/1990 e à Súmula n. 60 do Superior Tribunal de Justiça, bem como dissídio jurisprudencial com o Recurso Especial n. 1.699 e com a Apelação n. 70.000.959.072. O recurso proposto contra o v. acórdão dos Embargos Infringentes aponta negativa de vigência aos arts. 334, inc. III, 530, 535, incs. I e II, 538, parágrafo único, do Código de Processo Civil, 6º, inc. VIII, do Código de Defesa do Consumidor, 4º do Decreto n. 22.626/1933 e à Súmula n. 121 do Supremo Tribunal Federal, bem como divergência jurisprudencial com os Recursos Especiais n. 1.699, n. 284.523, n. 148.652, n. 232.157 e n. 195.217 e com os Embargos de Declaração no Recurso Especial n. 28.727-7. Houve contra-razões (fls. 573-7). Os recursos não prosperam pela alínea a do permissivo constitucional. Não se verifica a pretendida ofensa ao art. 535, incs. I e II, do Código de Processo Civil, porquanto as questões trazidas à baila pelo recorrente foram todas apreciadas pelo v. acórdão atacado, naquilo que à Turma Julgadora pareceu pertinente à apreciação do recurso, com análise e avaliação dos elementos de convicção carreados para os autos. Ademais, conforme anota 352 SÚMULAS - PRECEDENTES Theotônio Negrão in “Código de Processo Civil e legislação processual em vigor”, 30ª ed., Editora Saraiva, Nota 17ª, 1ª parte, ao art. 535, p. 566: É entendimento assente de nossa jurisprudência que o órgão judicial, para expressar a sua convicção, não precisa aduzir comentários sobre todos os argumentos levantados pelas partes. Sua fundamentação pode ser sucinta, pronunciando-se acerca do motivo que, por si só, achou suficiente para a composição do litígio (STJ-1ª Turma, AI n. 169.073-SP-AgRg, Relator Ministro José Delgado, j. 04.06.1998, negaram provimento, v.u., DJU 17.08.1998, p. 44). No atinente à alegação de ilegalidade da cláusula-mandato inserida no contrato relativo a cartão de crédito não procede o reclamo. Isto porque, conforme consignado na v. decisão proferida em sede de embargos declaratórios, a abusividade de referida cláusula pela mandatária não restou comprovada nos autos e, por isso, entendeu-se pela sua legalidade. Assim, incide na espécie a Súmula n. 7 do Colendo Superior Tribunal de Justiça, pois para infirmar-se a exegese adotada pelos doutos Julgadores mister se faz o reexame das circunstâncias fáticas e o conjunto probatório existentes nos autos. No que pertine à limitação dos juros a 12% ao ano, frise-se que o julgamento dos embargos infringentes deu-se com fundamento de ordem constitucional para alcançar a exegese conferida ao caso concreto, hipótese essa estranha à esfera de admissibilidade do recurso especial. Não se vislumbra ofensa ao art. 530 do Código de Processo Civil porquanto conforme ressaltado pela Colenda Câmara em sede de embargos declaratórios, o acórdão dos embargos infringentes limitou-se a enfrentar os temas abarcados pela divergência, qual sejam: a limitação constitucional dos juros e o anatocismo. Nesse passo, as questões relativas aos arts. 4º do Decreto n. 22.626/1933, 6º, inc. VIII, do Código de Defesa do Consumidor e à Súmula n. 121 do Supremo Tribunal Federal não podem ser apreciadas neste estrito âmbito, pelo que incidente na hipótese a Súmula n. 282 do Colendo Supremo Tribunal Federal, adotada pela Corte Superior no Agravo de Instrumento n. 1.617-RJ in DJU de 06.03.1991, p. 2.098. No concernente à multa improcede a alegada vulneração à legislação arrolada, eis que a Corte Superior, a propósito da questão, assim tem apreciado o tema: No tocante ao art. 538, parágrafo único, do Código de Processo Civil, não há se falar em violação, porquanto é defeso em sede de apelo especial o reexame dos fatos e circunstâncias que justificaram RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 353 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA a imposição da referida penalidade. Incidência da Súmula n. 7-STJ. (cf. Agravo de Instrumento n. 176.880-SP, Relator Ministro Barros Monteiro, in DJU de 02.04.1998, p. 57). No mais, não se vislumbra qualquer indício de infringência ao artigo elencado, por parte do v. decisório, já que, mediante o simples cotejo, verifica-se que ao revés do asseverado, respeitou inteiramente o seu teor a Colenda Câmara, conforme se depreende da seguinte transcrição, in verbis: A alegada capitalização de juros não está demonstrada. Com efeito, as articulações elaboradas nesse sentido pelo embargante são absolutamente genéricas e não comprovam, como deveriam, a aplicação de juros sobre juros. É ônus daquele que alega provar o fato constitutivo do seu direito, encargo de que, nem de longe, se desincumbiu o embargante. Seus embargos são superficiais e tratam do tema de maneira aleatória, não demonstrando a ocorrência do alegado anatocismo. Não é possível, também, deixar de consignar a impropriedade da conduta do embargante, que junta a sua impugnação ao cálculo do credor apenas em fase de embargos infringentes. Era dever do devedor instruir devidamente a sua peça inicial, dando, não só ao juiz de primeiro grau, bem como à Turma julgadora da apelação, condições do amplo exame da matéria. Não o fez. Preferiu silenciar, e, em assim sendo, não atendeu ao seu ônus de provar o anatocismo. Dessa forma, está correta a conclusão da maioria. É bom lembrar que, presentes nos autos a forma de cômputo dos encargos e a evolução do débito realizada pelo credor, era encargo do devedor impugná-la especificamente, sob pena de não se desincumbir do ônus da prova que a lei lhe impõe. (fl. 371). Quanto à alínea c, melhor sorte não acolhe a irresignação. Com relação ao Recurso Especial n. 1.699, registre-se que somente diante das peculiaridades de cada caso concreto é que se pode verificar a ocorrência de omissão ou contradição, a ponto de não se justificar tomar-se por base um paradigma, o qual, em face de seus acontecimentos, em nada regula com a hipótese dos autos. No que se refere à Apelação n. 70.000.959.072 versa a jurisprudência arrolada acerca de exegese lastreada em matéria fática, cuja verificação da possível identidade com o caso concreto implicaria reexame da prova produzida, ao arrepio da Súmula n. 7 do Colendo Superior Tribunal de Justiça. 354 SÚMULAS - PRECEDENTES Com efeito, o reconhecimento da nulidade da cláusula-mandato inserta em contrato de adesão relativa a cartão depende da prova de sua abusividade, o que in casu não restou demonstrada. No tocante aos Recursos Especiais n. 284.523, n. 148.652, n. 232.157 e n. 195.217, a divergência jurisprudencial não se mostra configurada, pois as questões fáticas ali tratadas que permitiram extrapolar os limites da divergência não estão presentes no v. acórdão recorrido. Relativamente aos Embargos de Declaração em Recurso Especial n. 28.727-7, não se extrai a necessária identidade de situações, porquanto tanto este como a v. decisão hostilizada decorrem do exame do caso concreto para estipular a multa do art. 538, parágrafo único, do Código de Processo Civil, razão pela qual, também neste aspecto, impõe-se a aplicação da Súmula n. 7 do Colendo Superior Tribunal de Justiça. Posto isso, indefiro os recursos especiais. As teses do recorrente, preliminarmente expostas, também não procedem em relação à cláusula-mandato, nem se afinam com o entendimento da 4ª Turma, no REsp n. 421.371-RS, DJU de 26.08.2002. Pelo exposto, nego provimento ao agravo. Alega o embargante omissão na decisão. Primeiro em relação à capitalização dos juros, afirmando que o Tribunal a quo confundiu a juntada de demonstrativos do débito com taxas, multas e juros cobrados (para fins de comparação com dados que já constavam dos autos) com impugnação tardia aos cálculos do credor, decidindo, assim, ter havido ausência de prova para declaração da ilegalidade do anatocismo (questão que já havia sido apreciada na Primeira Instância), e deixando de julgar a alegada violação ao art. 334, III, do CPC. Segundo em relação à aplicação de multa, vez que os embargos declaratórios não visavam a mudança do julgado, mas sim a correção de erros materiais no aresto e o prequestionamento de artigos para abertura da instância especial. Por fim, requer que seja esclarecido “se é a conclusão do voto vencido ou seu fundamento que dá os limites da divergência nos embargos infringentes” (fl. 731), afirmando que o Tribunal a quo não apreciou os fundamentos dos embargos sob a alegação de que estes não estavam incluídos nos limites da divergência. É o relatório. RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 355 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VOTO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior (Relator): Inicialmente, recebo os embargos como agravo, porquanto o propósito é nitidamente infringente. O recurso não prospera. De efeito, inexiste omissão no acórdão, mas simples decisão contrária à parte na apreciação do contrato e dos elementos fáticos colacionados. Entendeu, por outro lado, o Tribunal, que não havia prova da capitalização dos juros, e não compete ao STJ rever esta assertiva, sob pena de transpor os óbices das Súmulas n. 5 e n. 7. A consideração da sentença a respeito foi feita, inclusive, de forma reflexa, não impedindo a manifestação da Corte Estadual sobre o mesmo tema. No tocante aos juros, o entendimento pacificado na 2ª Seção do STJ é no sentido de que as administradoras de cartão de crédito são instituições financeiras e podem intermediar a busca de financiamento junto ao mercado, não estando adstrito o empréstimo à limitação de juros da Lei de Usura (REsp n. 450.453-RS, por maioria, Rel. p/ Acórdão Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 25.06.2003). Ante o exposto, ratificando, ainda, a fundamentação dos despachos de fls. 675-678 e 718-719, nego provimento ao agravo, destacando que correta a punição imposta pelo Tribunal Estadual, se os temas já haviam sido decididos e a pretensão era infringente do julgado. É como voto. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 481.127-RS (2002.0140882-7) Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior Agravante: Mérlyn Adriana Moraes Brum Advogado: Carmem Talita Brandão Young Agravado: Cartão Unibanco Ltda. Advogado: Clóvis Fraga Sant’anna e outros 356 SÚMULAS - PRECEDENTES EMENTA Civil e Processual. Recurso especial. Prequestionamento. Insuficiência. Cartão de crédito. Administradora. Instituição financeira. Juros. Inincidência da limitação da Lei de Usura. I. A ausência de prequestionamento impede o conhecimento do recurso especial. II. As administradoras de cartão de crédito são instituições financeiras. III. Não se limitam os juros do financiamento à Lei de Usura. IV. Precedentes do STJ. V. Agravo improvido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, negar provimento ao agravo regimental, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha e Fernando Gonçalves. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Barros Monteiro. Custas, como de lei. Brasília (DF), 12 de agosto de 2003 (data do julgamento). Ministro Aldir Passarinho Junior, Relator DJ 22.09.2003 RELATÓRIO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: - Mérlyn Adriana Moraes Brum interpõe agravo regimental contra decisão do seguinte teor (fl. 222): Trata-se de agravo de instrumento manifestado por Mérlyn Adriana Moraes Brum contra decisão que inadmitiu recurso especial, no qual se alega negativa RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 357 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA de vigência aos arts. 3º, 6º, 29, 46, 51 e 54 do CDC, 85, 115, 145, 147, 955 e 1.062 do Código Civil revogado, 1º e 4º do Decreto n. 22.626/1933, além de dissídio jurisprudencial. Salvo o art. 29 do CDC e o Decreto n. 22.626/1933, os demais dispositivos legais não foram ventilados no acórdão recorrido, ausente, assim, o indispensável prequestionamento. Incidem, pois, na espécie, as Súmulas n. 282 e n. 356 do STF. Com relação às disposições legais ressalvadas, não procede a irresignação, porque o art. 29 do CDC, incide nos contratos de cartão de crédito, e os juros não estão limitados pelo Decreto n. 22.626/1933, porque não se aplica a Lei de Usura às instituições financeiras. Pelo exposto, nego provimento ao agravo. Alega a agravante ser suficiente para a admissibilidade do recurso especial que o acórdão recorrido tenha decidido explícita ou implicitamente a incidência das normas legais mencionadas, afirmando que toda a matéria suscitada no apelo especial foi submetida à apreciação nas instâncias ordinárias. Aduz que o acórdão recorrido admitiu a aplicação do Código de Defesa do Consumidor ao caso em tela e não apenas de seu artigo 29, advertindo que a aplicação do Código não exclui artigos, o que dá a entender, portanto, ter havido prequestionamento implícito no que diz respeito aos dispositivos levantados no recurso especial. Assevera que a cláusula de mandato que as administradoras de cartão de crédito incluíram nos contratos com seus clientes é nula, segundo o regramento dos artigos 51, VIII, do CDC e 115 do Código Civil de 1916, alegando não ser necessário que o acórdão tenha citado expressamente tais dispositivos, pois este discutiu a matéria, verificando-se, com isso, o prequestionamento implícito, que é aceito pela jurisprudência do STJ. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior (Relator): O agravo não prospera. De efeito, faltou o prequestionamento da quase totalidade das questões federais suscitadas no especial, incidindo, na espécie, as Súmulas n. 282 e n. 356 do C. STF. Sobejando, apenas prequestionado, o art. 29 do CDC, a sua interpretação escoteira é insuficiente para rebater toda a tese sufragada pela parte. 358 SÚMULAS - PRECEDENTES Mas, já não fora isso, de qualquer sorte o entendimento pacificado na 2ª Seção do STJ é no sentido de que os juros nos cartões de crédito não estão limitados, enquadrando-se as administradoras como instituições financeiras, sendo válida a cláusula que as autoriza a intermediar financiamento. Nesse sentido: Comercial. Cartão de crédito. Administradora. Instituição financeira. Juros. Limitação (12% a.a.). Lei de Usura (Decreto n. 22.626/1933). Não incidência. Aplicação da Lei n. 4.595/1964. Disciplinamento legislativo posterior. Súmula n. 596-STF. Capitalização mensal dos juros. Vedação. Lei de Usura (Decreto n. 22.626/1933). Incidência. Súmula n. 121-STF. I. As administradoras de cartões de crédito inserem-se entre as instituições financeiras regidas pela Lei n. 4.595/1964. II. Não se aplica a limitação de juros de 12% ao ano prevista na Lei de Usura aos contratos de cartão de crédito. III. Nesses mesmos contratos, ainda que expressamente acordada, é vedada a capitalização mensal dos juros, somente admitida nos casos previstos em lei, hipótese diversa dos autos. Incidência do art. 4º do Decreto n. 22.626/1933 e da Súmula n. 121-STF. (REsp n. 450.453-RS, 2ª Seção, por maioria, Rel. p/ acórdão Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 25.06.2003). Ante o exposto, nego provimento ao agravo. É como voto. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL N. 518.639-RS (2003.0028749-1) Relatora: Ministra Nancy Andrighi Agravante: Wanderlei Antônio de Borba e outro Advogado: Fabiana Franco Trindade e outros Agravado: Lojas Renner S/A e outro Advogado: Ricardo Amado Cirne Lima e outros RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 359 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EMENTA Direito Bancário. Agravo no recurso especial. Contrato bancário. Instituições financeiras. Taxa de juros. Não-limitação. Administradoras de cartão de crédito. Inclusão no conceito de instituição financeira. - Não se aplica o limite da taxa de juros aos contratos celebrados com as administradoras de cartão de crédito, pois que são incluídas no conceito de instituição financeira, regidas, portanto, por legislação específica que afasta a “Lei de Usura”. Agravo não provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental. Os Srs. Ministros Castro Filho e Carlos Alberto Menezes Direito votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Ari Pargendler. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito. Brasília (DF), 29 de outubro de 2003 (data do julgamento). Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Presidente Ministra Nancy Andrighi, Relatora DJ 1º.12.2003 RELATÓRIO A Sra. Ministra Nancy Andrighi: - Cuida-se do agravo no recurso especial, interposto por Wanderlei Antônio de Borba e outro contra decisão unipessoal que deu parcial provimento ao recurso interposto com base nas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra acórdão que, por sua vez, deu parcial provimento ao recurso à apelação, em ação revisional de contrato de cartão de crédito proposta pelo recorrente. Assim foi ementado o aresto: 360 SÚMULAS - PRECEDENTES Ação revisional de contrato de cartão de crédito. Preliminares rejeitadas. Caso concreto. Matéria de fato. Interpretação de cláusula contratual. Contrato de cartão de crédito. Tendo em conta as peculiaridades e finalidade dos contratos de cartão de crédito, o titular do cartão ao aderir a contratação e aceitar as normas fixadas pela administradora, tem pleno conhecimento dos juros e demais encargos que incidirão no negócio, caso ele optar pelo pagamento parcial das faturas ou financiar o saldo existente, descabendo a pretensão de revisar o contrato atento ao fato, ainda, de que não se observa a cobrança de encargos e juros abusivos capaz de ensejar a nulidade de cláusulas do contrato. (AC n. 598.259.745). Apelo provido. (fl. 158). Interpostos embargos de declaração, foram estes rejeitados. Inconformado, pois, o recorrente interpôs o presente recurso especial, fundado nas alíneas a e c do permissivo constitucional, alegando violação ao(s): I - art. 535, II, do CPC; II - arts. 1.062 e 1.063 do Código Civil; III - arts. 1º e 13 da Lei de Usura e; IV - art. 52, § 1º do CDC. Aduziu, ainda, dissídio pretoriano. A decisão agravada foi assim ementada: Direito Bancário. Recurso especial. Contrato bancário. Instituições financeiras. Embargos declaratórios. Ausência de omissão, contradição ou obscuridade. Taxa de juros. Não-limitação. Capitalização de juros. Vedação. Multa moratória. Impossibilidade de redução. - Os embargos de declaração são corretamente rejeitados quando o acórdão recorrido aprecia os temas levantados pelas partes, não havendo omissão, contradição ou obscuridade a ser sanada. - Não se aplica o limite da taxa de juros aos contratos celebrados com as administradoras de cartão de crédito, pois que são incluídas no conceito de instituição financeira, regidas, portanto, por legislação específica que afasta a “Lei de Usura”. - É vedada a capitalização dos juros nos contratos firmados junto a administradoras de cartões de crédito. - A redução da multa contratual prevista na Lei n. 9.298/1996 somente atinge os contratos assinados após a sua vigência. Recurso especial parcialmente provido. Ônus sucumbenciais redistribuídos. (fl. 225). No presente agravo, alega-se que o tratamento dado às administradoras de cartão de crédito, figurando-as no conceito de instituição financeira, não é pacífico, merecendo enfrentamento pelo órgão colegiado competente. É o relatório. RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 361 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA VOTO A Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relatora): Limitação dos juros e as administradoras de cartão de crédito. A questão da limitação dos juros remuneratórios em contratos de cartão de crédito já foi apreciada por este STJ no REsp n. 450.453 (Rel. p/ acórdão Min. Aldir Passarinho Junior, j. 25.06.2003), em que se considerou que as administradoras, como intermediárias, inserem-se no conceito de instituição financeira. Desta forma, a despeito da argumentação do agravante, o entendimento já encontra-se pacificado no âmbito deste Tribunal. Assim, por força da Súmula n. 596 do STF, a elas não se aplica o limite da taxa de juros remuneratórios em 12% ao ano previsto na Lei de Usura. Nesse sentido: REsp n. 294.697, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, DJ de 26.08.2002. Forte em tais razões, nego provimento ao agravo no recurso especial. RECURSO ESPECIAL N. 337.332-RS (2001.0095890-3) Relator: Ministro Barros Monteiro Recorrente: BB Administradora de Cartões de Crédito S/A Advogado: Rodrigo Fernandes de Martino e outros Recorrido: Dirceu José Quartiero Advogado: Milton Braz Rubin EMENTA Contrato de abertura de crédito. Taxa de juros. Limitação. Súmula n. 596-STF. - As administradoras de cartões de crédito inserem-se entre as instituições financeiras regidas pela Lei n. 4.595/1964. 362 SÚMULAS - PRECEDENTES - Cuidando-se de operações realizadas por instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, não se aplicam as disposições do Decreto n. 22.626/1933 quanto à taxa de juros. Súmula n. 596-STF. Recurso especial conhecido e provido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas: Decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas precedentes que integram o presente julgado. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Fernando Gonçalves, Aldir Passarinho Junior e Sálvio de Figueiredo Teixeira. Brasília (DF), 02 de setembro de 2003 (data do julgamento). Ministro Barros Monteiro, Relator DJ 24.11.2003 RELATÓRIO O Sr. Ministro Barros Monteiro: “Banco do Brasil - Administradora de Cartões de Crédito S/A” ajuizou ação de cobrança contra Dirceu José Quartiero. Este, de sua vez, propôs ação declaratória revisional contra o “Banco do Brasil S/A”, pretendendo revisar contrato de cartão de crédito. A MMª Juíza de Direito julgou improcedente a ação declaratória revisional e procedente a ação de cobrança. A Sexta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, à unanimidade, deu provimento ao apelo de José Dirceu Quartiero, para limitar a taxa de juros em 12% a.a. e determinar a capitalização anual destes, em acórdão cujos fundamentos se resumem na seguinte ementa: Ação revisional. Cartão de crédito. Limitação de juros. Aplicabilidade das normas do CDC. A correta limitação de juros convencionais em 12% atende à legislação infraconstitucional (Decreto n. 22.626/1933 e art. 1.062 do CC). Os juros devem ser capitalizados anualmente, de acordo com o disposto no art. 4º do Decreto n. 22.626/1933. RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 363 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Aplicação dos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor. Apelação provida. (fl. 89). Inconformada, a “BB Administradora de Cartões de Crédito S.A.” manifestou recurso especial com arrimo nas alíneas a e c do permissor constitucional, apontando violação do art. 4º, IX, da Lei n. 4.595/1964, além de dissídio interpretativo. Asseverando que, em face do disposto na Lei n. 4.595/1964, o Decreto n. 22.626/1933 não se aplica à operações de crédito realizadas por instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, defendeu a legalidade das cláusulas contratuais que fixam a taxa de juros acima de 12% ao ano. De outro lado, sustentou a impertinência do Código de Defesa do Consumidor ao contrato. Sem as contra-razões, o apelo extremo foi admitido na origem, subindo os autos a esta Corte. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Barros Monteiro (Relator): 1. Segundo a regra inserta no art. 3º, parágrafo 2º, da Lei n. 8.078, de 11.09.1990, o Código de Defesa do Consumidor aplica-se às operações de natureza bancária. Entretanto, a invocação do referido diploma legal mostra-se no caso anódina, pois que a decisão recorrida não tece considerações em torno da eventual abusividade da taxa estipulada pelas partes aos juros remuneratórios (cfr. REsps n. 407.097-RS e n. 420.111-RS, Relator designado o Ministro Ari Pargendler). 2. Assiste razão à recorrente quanto à limitação da taxa dos juros remuneratórios. As administradoras de cartões de crédito inserem-se entre as instituições financeiras regidas pela Lei n. 4.595/1964. Assim decidiu esta c. Turma ainda há pouco, quando do julgamento do REsp n. 450.453-RS, Relator para o Acórdão Ministro Aldir Passarinho Junior. Pacificou-se a jurisprudência no sentido da não incidência da Lei de Usura (Decreto n. 22.626, de 07.04.1933) quanto à taxa de juros, nas operações realizadas com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, entendimento cristalizado com a edição da Súmula n. 596 do c. Supremo Tribunal Federal. Confiram-se nesse sentido os julgados insertos nas RTJ’s 77/966 e 79/620. Nos dois precedentes aludidos, a Suprema Corte assentou 364 SÚMULAS - PRECEDENTES que os percentuais das taxas de juros se sujeitam unicamente aos limites fixados pelo Conselho Monetário Nacional. Nesta Casa, tem predominado a mesma orientação: REsps n. 4.285-RJ, Relator Ministro Athos Carneiro; n. 5.212-SP, Relator Ministro Dias Trindade; n. 19.294-SP, n. 26.927-5-RS, n. 29.913-9GO e n. 32.632-5-RS, por mim relatados; n. 158.508-RS, Relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar; n. 122.776-RS, Relator Ministro Costa Leite; n. 124.779RS, Relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito; n. 128.911-RS, Relator Ministro Waldemar Zveiter; n. 130.875-RS, Relator Ministro Cesar Asfor Rocha. Por conseguinte, colhe a propugnação da recorrente pela subsistência da taxa de juros tal como convencionada. Limitando-a ao teto estabelecido na denominada Lei de Usura, o acórdão recorrido não só afrontou o art. 4º, IX, da Lei n. 4.595/1964, como ainda dissentiu do referido Verbete Sumular n. 596. 3. Ante o exposto, conheço do recurso e dou-lhe provimento para determinar a cobrança dos juros na forma como pactuada entre as partes. Ficam restabelecidos os encargos sucumbenciais fixados na sentença (fl. 63), nos termos do art. 21, parágrafo único, do CPC. É o meu voto. RECURSO ESPECIAL N. 441.932-RS (2002.0071393-0) Relator: Ministro Carlos Alberto Menezes Direito Recorrente: Fininvest S/A Administradora de Cartões de Crédito Advogado: Maria Terezinha Romero e outros Recorrente: Patrícia Luz Martins Advogado: André Fernando Pretto Paim e outro Recorrido: Os mesmos EMENTA Contrato de cartão de crédito. Juros. Comissão de permanência. Capitalização. Inscrição em cadastro negativo. Dano moral. RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 365 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 1. Já assentou a Segunda Seção, vencido o relator, que as administradoras de cartão de crédito são consideradas instituições financeiras, aplicando-se a Súmula n. 596 do Supremo Tribunal Federal, válida a cláusula que as autoriza a buscar o financiamento necessário no mercado (REsp n. 450.453-RS, Relator para o acórdão o Ministro Aldir Passarinho Junior, julgado em 25.06.2003). 2. Afirmando a recorrente que o contrato não contém previsão de comissão de permanência e correção monetária, não há razão para cobrá-las. 3. Os juros moratórios podem ser cobrados em até 1% ao mês. 4. Afirmando o acórdão recorrido que a autora utilizou o cartão de crédito sem condições para quitar o débito e que foram remetidos os avisos de cadastramento, não há razão para impor a condenação por dano moral. 5. A capitalização anual é permitida nos termos do art. 4º do Decreto n. 22.626/1933. 6. Recurso da empresa ré conhecido e provido, em parte, e recurso da autora não conhecido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer em parte do recurso especial de Fininvest S.A. Administradora de Cartões de Crédito e, nessa parte, dar-lhe provimento, e não conhecer do recurso de Patrícia Luz Martins. Os Srs. Ministros Nancy Andrighi, Castro Filho, Antônio de Pádua Ribeiro e Ari Pargendler votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília (DF), 12 de agosto de 2003 (data do julgamento). Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Relator DJ 13.10.2003 RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito: Fininvest S.A. Administradora de Cartões de Crédito e Patrícia Luz Martins interpõem 366 SÚMULAS - PRECEDENTES recursos especiais, o primeiro com fundamento na alínea a e o segundo nas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra acórdão da Décima Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, assim ementado: Contratos bancários. Revisão. Juros. Vigora a limitação constitucional e da legislação infraconstitucional. A correção monetária deve ser de acordo com o IGPM. Capitalização de juros conforme entendimento desta Câmara, é anual. A comissão de permanência é inaceitável, por configurar acréscimo estabelecido de forma unilateral. Revisão de contratos encerrados. Extintos contratos anteriores pela renegociação do débito, não é possível revisar o que está liquidado. Devolução de valores pagos. Não é admissível, indemonstrado erro no pagamento. Administradora de cartões de crédito não é instituição financeira. Os encargos eventualmente discutidos, em relação aos contratos bancários, não podem ser exigidos por empresa prestadora de serviços. Apelações desprovidas (fl. 221). Fininvest S.A. Administradora de Cartões de Crédito, primeira recorrente, sustenta contrariedade aos artigos 4º, incisos VI, VIII, IX e XVII, da Lei n. 4.595/1964; 1º e 13 do Decreto n. 22.626/1933; 1.062 e 1.262 do Código Civil e 192, § 3º, da Constituição Federal, aduz não ser possível a limitação dos juros em 12% ao ano, uma vez que os mesmos estão submetidos à disciplina do Conselho Monetário Nacional, bem como ser legal os juros moratórios pactuados. Destaca que, “no que diz respeito a prática do anatocismo, não se pode considerar presente nas operações de cartão de crédito, haja vista que nesta modalidade contratual o que ocorre é o repasse dos encargos decorrentes das operações de financiamento/empréstimo realizadas juntos às instituições financeiras, acrescidos de taxas contratuais, como a remuneração da garantia prestada junto à instituições financeiras quando de financiamentos em nomes dos usuários, operações estas de curtíssimo prazo, com vencimento de 30 (trinta) dias” (fl. 247). Argúi a não-incidência do Código de Defesa do Consumidor aos empréstimos bancários. RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 367 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Afirma, também, “no que se refere à incidência de comissão de permanência e de correção monetária, inicialmente cumpre registrar que inexiste previsão contratual quanto à estas rubricas, entretanto, em considerando que a Recorrente busca recursos no mercado financeiro para atender o interesse de financiamento por parte de seus clientes, por analogia, deve ser levado em conta os encargos decorrentes da mora contratual” (fl. 249). Colaciona julgados de Tribunais e a Súmula n. 596-STF em abono a sua tese. A segunda recorrente, Patrícia Luz Martins, sustenta negativa de vigência ao artigo 4º do Decreto n. 22.626/1933, tendo em vista ser vedada a capitalização dos juros no caso dos autos. Aduz violação dos artigos 6º, inciso VIII, e 333, inciso II e parágrafo único, do Código de Processo Civil, na medida em que a inscrição indevida do nome da recorrente nos serviços de proteção ao crédito gera o dever de indenizá-la pelos danos morais sofridos. Alega, também, que a administradora de cartões de crédito não provou que houve prévia notificação da recorrente de que seu nome seria cadastrado no SPC. Aponta dissídio jurisprudencial, trazendo à colação julgados, também, desta Corte, bem como as Súmulas n. 93-STJ e n. 121-STF. Contra-arrazoados (fls. 288 a 294 e 295 a 301), os recursos especiais (fls. 231 a 251 e 252 a 269) foram admitidos juntamente com o recurso extraordinário interposto pela primeira recorrente (304 a 309). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito (Relator): A segunda recorrente ajuizou ação de revisão de contrato de cartão de crédito cumulada com indenização por danos morais alegando que assinou contrato para a utilização de cartão de crédito administrado pela ré em meados de 1991; que sempre honrou os compromissos assumidos; que em março de 1977 perdeu seu emprego, tendo sua renda reduzida, passando a efetuar o pagamento mínimo previsto no próprio extrato mensal; que diante dos encargos escorchantes, cerca de 15,50% ao mês sobre os débitos vencidos, não teve condições de liquidar o 368 SÚMULAS - PRECEDENTES débito; que, ademais, teve o seu nome incluído no cadastro de inadimplente em janeiro de 1998, sem que houvesse prévia comunicação, como exigido pelo art. 43, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor. A sentença julgou procedente, em parte, o pedido para determinar que os juros sejam de 1% ao mês, com capitalização anual, sem qualquer direito à repetição das parcelas já pagas e sem prejuízo do encargo moratório e daqueles não impugnados, apurado o saldo devedor em liquidação por arbitramento. Ambas as partes apelaram. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul desproveu as apelações. Na apelação da autora, entendeu o Tribunal local que não existe indenização a deferir porque foi usado cartão de crédito sem condições de quitar os débitos e o demandado comprova que foram remetidos os avisos de cadastramento, não demonstrando, ademais, a recorrente os danos causados. Por outro lado, ficou determinado na sentença ser anual a capitalização. Na apelação da administradora, entendeu aplicável o Código de Defesa do Consumidor, sendo os juros constitucionalmente limitados, porque auto-executável o art. 192, § 3º, da Constituição Federal. Para o acórdão recorrido, ademais da limitação constitucional, a Lei n. 4.595/1964 e a Súmula n. 596 do Supremo Tribunal Federal não revogaram o Decreto n. 22.626/1933. Afirma, ainda, que a capitalização é anual, aplicável a Súmula n. 121 do Supremo Tribunal Federal, igualmente limitados os juros moratórios em 1% ao ano. No que concerne ao mandato para que a administradora contratasse o financiamento em nome do titular do cartão, “nada há para ser analisado, pois o magistrado não se manifestou quanto à validade ou à existência de tal mandato, apenas limitou os encargos, no que encontra respaldo na legislação” (fl. 225). Por fim, considerou o acórdão recorrido que a administradora não é instituição financeira, de forma que “os encargos eventualmente discutidos em relação aos contratos bancários, não podem ser exigidos por empresa prestadora de serviços” (fls. 225-226). O especial da administradora de cartão de crédito é no sentido de que tem aplicação a Lei n. 4.595/1964, “que regulamenta o Sistema Financeiro Nacional, em especial no que se refere ao art. 4º, VI, VIII, IX e XVII, que remete a questão de juros no Sistema Financeiro ao Conselho Monetário Nacional, em que pese a ora Recorrente não classificar-se como instituição financeira, como bem identificou o nobre Relator, mas que, em sendo mandatária dos titulares de cartões de crédito, contrata financiamentos em nome da massa de usuários de cartões que optaram RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 369 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA em financiar o saldo de suas faturas” (fl. 234). Combate, também, a incidência do Código de Defesa do Consumidor e afasta a incidência do Decreto n. 22.626/1933, alegando que “sujeita-se ao regramento do mercado financeiro a que recorre em nome e para atender seus clientes” (fl. 234). Menciona, ainda, a capitalização, a comissão de permanência e a correção monetária, afirmando, quanto às duas últimas, expressamente, “que inexiste previsão contratual” (fl. 249), mas a busca de recurso no mercado financeiro permite, “por analogia” (fl. 249), a utilização “dos encargos da mora contratual” (fl. 249). Tenho assentado entendimento no sentido de que não sendo a administradora de cartão de crédito instituição financeira, não tem ela cobertura da Súmula n. 596 do Supremo Tribunal Federal, nem, tampouco, da legislação respectiva. Todavia, fiquei vencido na Segunda Seção que assentou em sentido contrário, ou seja, as administradoras são consideradas como instituições financeiras, aplicando-se a Súmula n. 596 do Supremo Tribunal Federal, válida a cláusula que as autoriza buscar o financiamento necessário no mercado financeiro (REsp n. 450.453-RS, Relator para o acórdão o Senhor Ministro Aldir Passarinho Junior, julgado em 25.06.2003). Dúvida não há sobre a incidência do Código de Defesa do Consumidor em tais casos, presente mesmo um serviço prestado pela administradora ao usuário do seu cartão (REsp n. 71.578-RS, Relator o Senhor Ministro Nilson Naves, DJ de 03.02.1997). Quanto ao financiamento feito com base em mandato outorgado pelo titular do cartão, o acórdão recorrido, expressamente, asseverou que “nada há para ser analisado, pois o magistrado não se manifestou quanto à validade ou à existência de tal mandato, apenas limitou os encargos, no que encontra respaldo na legislação” (fl. 225). Com isso, prevalece o precedente da Segunda Seção diante dos termos do acórdão recorrido. No que concerne à comissão de permanência e à correção monetária, o próprio recurso afirma que não existe previsão contratual, com o que não é possível cobrá-las. Finalmente, em relação aos juros moratórios, sim, tem razão a recorrente. Não é autorizado apenas 1% ao ano, neste caso, mas, até 1% ao mês, se previsto no contrato. Eu conheço do especial da administradora, em parte, e, nessa parte, doulhe provimento para afastar a limitação da taxa de juros e autorizar a cobrança dos juros moratórios em 1% ao mês. 370 SÚMULAS - PRECEDENTES Quanto ao especial da autora, alcançando a capitalização anual e a indenização, entendo que não merece prosperar. Primeiro, não há vedação para que a capitalização seja anual como permitida pelo art. 4º do Decreto n. 22.626/1933, sendo nessa direção a jurisprudência da Corte: REsp n. 302.893-RS, Relator o Senhor Ministro Aldir Passarinho Junior, DJ de 25.06.2001. Segundo, quanto ao dano moral, é preciso considerar que o acórdão recorrido afirmou que houve a utilização de cartão de crédito “sem condições de quitar o débito” (fl. 226) e, ainda, que está comprovada a remessa de avisos de cadastramento. Em conclusão: eu conheço do especial da administradora, em parte, e, nessa parte, dou-lhe provimento para afastar a limitação da taxa de juros e autorizar os juros moratórios de 1% ao mês e não conheço do especial da autora. RECURSO ESPECIAL N. 450.453-RS (2002.0094076-3) Relator: Ministro Carlos Alberto Menezes Direito Relator para o acórdão: Ministro Aldir Passarinho Junior Recorrente: Marcos de Alves Dias Advogado: Gilberto Karoly Lima Recorrido: Banrisul Serviços Ltda. Advogado: Valtencir Marcos Miotto e outros EMENTA Comercial. Cartão de crédito. Administradora. Instituição financeira. Juros. Limitação (12% a.a.). Lei de Usura (Decreto n. 22.626/1933). Não incidência. Aplicação da Lei n. 4.595/1964. Disciplinamento legislativo posterior. Súmula n. 596-STF. Capitalização mensal dos juros. Vedação. Lei de Usura (Decreto n. 22.626/1933). Incidência. Súmula n. 121-STF. I. As administradoras de cartões de crédito inserem-se entre as instituições financeiras regidas pela Lei n. 4.595/1964. RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 371 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA II. Não se aplica a limitação de juros de 12% ao ano prevista na Lei de Usura aos contratos de cartão de crédito. III. Nesses mesmos contratos, ainda que expressamente acordada, é vedada a capitalização mensal dos juros, somente admitida nos casos previstos em lei, hipótese diversa dos autos. Incidência do art. 4º do Decreto n. 22.626/1933 e da Súmula n. 121-STF. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, prosseguindo no julgamento, decide a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, vencidos os Srs. Ministros Relator e Antônio de Pádua Ribeiro, conhecer em parte do recurso e, nesta parte, dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Foram votos vencedores os Srs. Ministros Aldir Passarinho Junior, Nancy Andrighi, Castro Filho, Sálvio de Figueiredo Teixeira, Barros Monteiro, Ari Pargendler e Fernando Gonçalves. Não participou do julgamento o Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha. Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Nancy Andrighi. Custas, como de lei. Brasília (DF), 25 de junho de 2003 (data do julgamento). Ministro Aldir Passarinho Junior, Relator para o acórdão DJ 25.02.2004 RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito: Marcos de Alves Dias interpõe recurso especial, com fundamento nas alíneas a) e c) do permissivo constitucional, contra acórdão da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, assim ementado: Cartões de crédito. Revisão de contrato. Juros. Limitação. Inocorrência. Capitalização. Revisão. Tendo em conta que a administradora de cartões de crédito, para financiar o associado, busca os recursos no mercado financeiro, deverá aquele responder pelas custas de tal captação. Inviabilidade da pretensão de limitar os juros. 372 SÚMULAS - PRECEDENTES Somente no tocante à capitalização, merece ser mantida a sentença. Apelo provido em parte para julgar parcialmente procedente a ação. Voto vencido. (fl. 82). Sustenta o recorrente contrariedade aos artigos 5º, inciso XXXII, e 170, inciso V, da Constituição Federal, 48 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, 115 e 1.062 do Código Civil, 4º, inciso I, 6º, incisos V e VIII, 51, incisos V, VII, IX, X e XI, e 52 da Lei n. 8.078/1990, 10, inciso X, da Lei n. 4.595/1964, 52 da Lei n. 9.298/1996, e ao Decreto n. 22.626/1933, aduzindo a nulidade da cláusula mandato, haja vista que “sendo esta cláusula meramente ou simplesmente potestativa, em face de que dependem da prática de um ato por parte do recorrente, na dependência do exame de circunstâncias que escapam ao controle dele, fica instalada tal cláusula contratual que é totalmente subordinada e de vontade exclusiva da recorrida, face a necessidade momentânea daquele economicamente mais fraco que cedendo às pressões do economicamente mais forte, tendo abstraída sua liberdade de contratar” (fl. 122). Afirma que, por não ser o recorrido agente financeiro, não é possível a cobrança de “juros flutuantes médios de 15% ao mês” (fl. 125), bem como a sua capitalização, sem prévia autorização legal. Aponta dissídio jurisprudencial, colacionando julgados, também, desta Corte, bem como as Súmulas n. 60-STJ e n. 121-STF. Contra-arrazoado (fls. 132 a 138), o recurso especial (fls. 116 a 125) foi admitido (fls. 140-141). É o relatório. VOTO VENCIDO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito (Relator): O recorrente ajuizou ação de revisão de contrato de cartão crédito cumulada com prestação de contas alegando ser vítima de agiotagem, porque cobrados juros de 10% ao mês. Para o autor a empresa ré não está no rol das instituições financeiras, com o que não pode cobrar juros como se fosse uma delas, estando fora do âmbito da Lei n. 4.595/1964. Invoca a proteção do Código de Defesa do Consumidor e pede a declaração de nulidade das cláusulas abusivas. A sentença, afirmando que a administradora de cartão de crédito não é instituição financeira, considerou abusiva e ilegal a cobrança de taxa de juros RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 373 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA superior a 12% ao ano, julgando, então, procedente o pedido para “determinar a revisão do contrato em questão, aplicando-se ao saldo negativo mensal a taxa de juros de 12% ao ano, capitalizada anualmente, ou na quitação, mais a variação mensal do IGP-M, acrescida da multa moratória não superior a 2%, deduzidas, sempre, as parcelas de pagamentos do autor, até o limite em que se compensarem, apurado, então, em liquidação de sentença, eventual saldo credor ou devedor”, mais custas e honorários. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul proveu a apelação. Considerou o Tribunal local que o “possuidor do cartão comprou um serviço e paga por ele, compreendidos aí a taxa, a multa e encargos financeiros”, sendo que, quando faz o pagamento mínimo, “responde por encargos financeiros. Estes dizem com o custo do serviço prestado, seja no repasse de valores ao comércio, seja no financiamento do saldo, quando por este opta a parte. Não há qualquer ilegalidade nessa transferência, sendo da essência do trato negocial em exame”. Para o acórdão recorrido o “mandato concede à empresa prestadora de serviço poderes para obtenção de financiamento no mercado sem a necessidade de justificar, caso a caso, a obtenção dos recursos. Há previsão contratual. Em não concordando o usuário com a taxa, tem este o direito de cancelar o contrato”. Quanto à limitação dos juros aplicou a Súmula n. 596 do Supremo Tribunal Federal, mantendo, ainda, a capitalização, porque entendeu que a Lei n. 4.595/1964 revogou em tal ponto o Decreto n. 22.626/1933. O especial investe postulando a nulidade da cláusula mandato, com base na Súmula n. 60 da Corte, a impossibilidade de ser deferida a capitalização, e mencionando seu caráter de hipossuficiente. O que se está discutindo nestes autos é, primeiro, a validade da cláusula mandato e, segundo, a possibilidade de ser deferida a capitalização. Os dispositivos constitucionais não podem ser objeto de exame em recurso especial. No presente feito, a alegação da abusividade da cláusula que autoriza a administradora de buscar no mercado recursos para fazer face ao financiamento do débito do usuário não foi objeto da decisão, não prequestionados os dispositivos do Código de Defesa do Consumidor. Nem, tampouco, foram prequestionados os dispositivos do Código Civil. Resta examinar a questão sob o prisma da Súmula n. 60 da Corte. E, na minha compreensão, tem razão o recorrente. Nesse sentido, há antigo precedente da Quarta Turma, Relator o Senhor Ministro Cesar Asfor Rocha (REsp n. 374 SÚMULAS - PRECEDENTES 144.375-SP, DJ de 03.11.1998), afirmando o voto condutor não ser possível a emissão de cambial emitida com suporte em cláusula mandato outorgada pelo devedor, no bojo de cartão de crédito, em favor da empresa credora. Tenho que a interpretação oferecida deve prevalecer. Essencialmente, o que a Súmula n. 60 da Corte veda é, exatamente, o que a administradora de cartão de crédito pretende, isto é, assumir a obrigação do financiamento, com a assinatura dos instrumentos correspondentes, em nome do devedor, com base em cláusula mandato. Com isso, os encargos cobrados não podem ser aqueles assumidos em função do compromisso assumido pela empresa administradora em razão da cláusula mandato, mas, sim, limitados os juros a 12% ao ano, reconhecido no acórdão recorrido que as administradoras não são instituições financeiras, como, de fato, não são. Vedada, ainda, a capitalização, nos termos de reiterada jurisprudência da Corte (por todos, REsp n. 302.893-RS, Relator o Senhor Ministro Aldir Passarinho Junior, DJ de 25.06.2001). Em conclusão, eu conheço do especial e lhe dou provimento para decretar a nulidade da cláusula mandato, nos termos da Súmula n. 60 da Corte, e, em conseqüência, limitar os juros compensatórios em 12% ao ano, vedada a capitalização. Custas repartidas e honorários compensados. VOTO-VISTA O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: - Trata-se recurso especial interposto por Marcos de Alves Dias, com fundamento no art. 105, III, a e c da Constituição Federal, cujo relator é o eminente Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, o qual conheceu em parte e deu-lhe provimento para decretar a nulidade da cláusula mandato firmada em contrato de administração de cartão de credito, nos termos da Súmula n. 60-STJ, o qual possibilitava à ré tomar ao mercado financeiro os recursos necessários para cobrir o saldo negativo das despesas geradas pelo contratante. Dessa forma, restou coibida a cobrança de juros à taxa média de 10% ao mês, limitada a 12% ao ano e sem capitalização mensal. Inicialmente, registro que a cláusula mandato, em si, tem sido admitida pela 4ª Turma, verbis: RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 375 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Comercial. Cartão de crédito. Administradora. Juros. Limitação (12% a.a). Lei de Usura (Decreto n. 22.626/1933). Não incidência. Aplicação da Lei n. 4.595/1964. Disciplinamento legislativo posterior. Súmula n. 596-STF. Cláusula mandato. Legitimidade. I. Não se aplica a limitação de juros de 12% ao ano prevista na Lei de Usura aos contratos de cartão de crédito. II. É legítima a cláusula mandato inserida no contrato em questão, que permite à administradora buscar recursos no mercado para financiar o usuário inadimplente. III. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, desprovido. (REsp n. 466.769-RJ, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, unânime, DJU de 24.02.2003). Cartão de crédito. Prestação de contas. Mandato. A administradora deve prestar contas sobre o modo pelo qual exerce o mandato que lhe concedeu o usuário para obter financiamento no mercado a fim de financiar as vendas a prazo. Código Civil e Código de Defesa do Consumidor. Recurso conhecido e provido. (REsp n. 387.581-RS, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, unânime, DJU de 1º.07.2002). Isto posto, passo a apreciar a questão relativa à ostentação ou não da qualidade de instituição financeira pela administradora de cartões de crédito. Estabelece a Lei n. 4.595/1964, em seu art. 17, verbis: Consideram-se instituições financeiras, para os efeitos da legislação em vigor, as pessoas jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custódia de valor de propriedade de terceiros. Parágrafo único. Para os efeitos desta lei e da legislação em vigor, equiparam-se às instituições financeiras as pessoas físicas que exerçam qualquer das atividades referidas neste artigo, de forma permanente ou eventual. Creio que a abrangência do dispositivo insere as empresas administradoras de cartão de crédito entre aquelas submetidas a esse diploma legal. Com efeito, a administradora firma contrato pelo qual assume perante o comerciante ou prestador de serviço o compromisso de honrar o pagamento dos produtos ou serviços adquiridos por seu cliente, titular da conta, até o limite previamente estabelecido e mediante remuneração, normalmente designada de anuidade, concedendo a este último prazo para saldar a dívida, que na hipótese de restar inadimplida, resulta em saldo devedor sobre o qual faz incidir encargos 376 SÚMULAS - PRECEDENTES também anteriormente informados e pactuados. E busca, como intermediária, junto ao mercado, os recursos do financiamento da compra do usuário. Nessas circunstâncias, em face da abrangência do conceito legal, e isto, evidentemente, para impedir operações marginais à fiscalização do Banco Central, tenho que as administradoras de cartões de crédito, como intermediárias, se enquadram como instituições financeiras. A 4ª Turma, julgando precedentes em que se litigava sobre débitos oriundos de idênticos contratos, não levantou qualquer óbice quanto à natureza do credor: Contrato de cartão de crédito. Juros. Limitação. Capitalização. 1. Cuidando-se de operações realizadas por instituição integrante do Sistema Financeiro Nacional, não se aplicam as disposições do Decreto n. 22.626/1933 quanto à taxa de juros. Súmula n. 596-STF. 2. Capitalização de juros. Solução da espécie que envolve o reexame de matéria fática e a análise de estipulações contratuais. Recurso especial não conhecido. (4ª Turma, REsp n. 202.373-RJ, Rel. Min. Barros Monteiro, unânime, DJU de 23.08.1999). Cartão de crédito. Juros. Limitação. Aplicação da Súmula n. 596-STF. Vencido nessa parte o relator. Recurso conhecido parcialmente e provido. (4ª Turma, REsp n. 276.003-SE, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, unânime, DJU de 11.06.2001). Comercial. Cartão de crédito. Juros. Limitação (12% a.a). Lei de Usura (Decreto n. 22.626/1933). Não incidência. Aplicação da Lei n. 4.595/1964. Disciplinamento legislativo posterior. Súmula n. 596-STF. I. Não se aplica a limitação de juros de 12% ao ano prevista na Lei de Usura aos contratos de cartão de crédito. II. Recurso especial conhecido e provido. (4ª Turma, REsp n. 297.500-RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, unânime, DJU de 30.04.2001). Vale, ainda, acrescentar que a recente Lei Complementar n. 105, de 10.01.2001, que trata do sigilo nas operações das instituições financeiras, entre elas arrola, taxativamente, as administradoras de cartões de crédito, a saber: RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 377 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Art. 1º As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados. § 1º São consideradas instituições financeiras, para os efeitos desta Lei Complementar: (...) VI - administradoras de cartões de crédito. Ademais, a se pensar de modo diverso, ter-se-ia o ônus pela administradora da diferença entre o custo efetivo do dinheiro, que é exigido segundo as taxas de mercado, e os 12% de juros ao ano em que ela estaria limitada a repassar ao titular do cartão, a inviabilizar, inteiramente, o crédito e o financiamento ao cliente. II Superadas essas questões iniciais, cabe analisar os encargos incidentes sobre a contratação. Com relação à limitação dos juros, tem-se que o entendimento aqui firmado é no sentido de que com o advento da Lei n. 4.595/1964, diploma que disciplina de forma especial o Sistema Financeiro Nacional e suas instituições, restou afastada a incidência da Lei de Usura no tocante à limitação dos juros, tendo ficado delegado ao Conselho Monetário Nacional poderes normativos para limitar as referidas taxas. É o que reza o art. 4o, IX, litteris: (...) IX - limitar, sempre que necessário as taxas de juros, descontos, comissões e qualquer outra forma de remuneração de operações e serviços bancários ou financeiros, inclusive os prestados pelo Banco Central da República do Brasil (...) Portanto, nesse tópico o recurso deve ser provido, pois as limitações impostas pelo Decreto n. 22.626/1933 não se aplicam às taxas de juros cobradas pelas instituições bancárias ou financeiras em seus negócios jurídicos, cujas balizas encontram-se no contrato e regras de mercado, salvo as exceções legais (v.g. crédito rural, industrial e comercial). A propósito, reza a Súmula n. 596-STF: As disposições do Dec. n. 22.626/1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas que integram o Sistema Financeiro Nacional. 378 SÚMULAS - PRECEDENTES Os acórdãos anteriormente reproduzidos refletem essa mesma orientação. E mesmo que houvesse sido debatida a matéria à luz do CDC, a Segunda Seção desta Corte, em 12.03.2003, no julgamento do REsp n. 407.097-RS, relator para acórdão Ministro Ari Pargendler, sedimentou o entendimento de que o pacto referente à taxa de juros só pode ser alterado se reconhecida sua abusividade em cada hipótese, desinfluente para tal fim a estabilidade inflacionária no período e imprestável o patamar de 12% ao ano, já que sequer a taxa média de mercado, que não é potestativa, se considera excessiva, para efeito de validade da avença. III No tocante à capitalização dos juros, o recurso merece prosperar. A jurisprudência desta Corte firmou que a capitalização mensal dos juros é vedada, mesmo que convencionada, porquanto, na espécie, subsiste o preceito do art. 4º do Decreto n. 22.626/1933, contrário ao anatocismo, redação não revogada pela Lei n. 4.595/1964, somente sendo possível sua aplicação nos casos expressamente previstos em lei, hipótese diversa dos autos. Os acórdãos abaixo refletem essa orientação, a saber: Mútuo bancário. Contrato de abertura de crédito. Taxa de juros. Limitação. Capitalização mensal. Proibição. Precedentes. I - No mútuo bancário vinculado a contrato de abertura de crédito, a taxa de juros remuneratórios não está sujeita ao limite estabelecido pela Lei de Usura (Decreto n. 22.626/1933). II - A capitalização dos juros somente é permitida nos contratos previstos em lei, entre eles as cédulas e notas de créditos rurais, industriais e comerciais, mas não para o contrato de mútuo bancário. III - Precedentes. IV - Recurso conhecido e provido. (3ª Turma, REsp n. 176.322-RS, Rel. Min. Waldemar Zveiter, unânime, DJU de 19.04.1999). Juros. Limite. Capitalização. Contrato de abertura de crédito em conta corrente. Aplicação da Súmula n. 596-STF quanto ao limite dos juros remuneratórios, e da Súmula n. 121-STF tocante à capitalização. Recurso conhecido em parte e, nessa parte, provido. RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 379 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (4ª Turma, REsp n. 189.426-RS, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, unânime, DJU de 15.03.1999). Direitos Comercial e Econômico. Financiamento bancário. Juros. Teto de 12% em razão da Lei de Usura. Inexistência. Lei n. 4.595/1964. Enunciado n. 596 da Súmula-STF. Capitalização mensal. Excepcionalidade. Inexistência de autorização legal. Enunciado n. 282, Súmula-STF. Recurso parcialmente acolhido. I - A Lei n. 4.595/1964, que rege a política econômico-monetária nacional, ao dispor no seu art. 4º, IX, que cabe ao Conselho Monetário Nacional limitar taxas de juros, revogou, nas operações realizadas por instituições do Sistema Financeiro, salvo exceções legais, como nos mútuos rurais, quaisquer outras restrições a limitar o teto máximo daqueles. II - Somente nas hipóteses em que expressamente autorizada por lei específica, a capitalização de juros se mostra admissível. Nos demais casos é vedada, mesmo quando pactuada, não tenho sido revogado pela Lei n. 4.595/1964 o art. 4º do Decreto n. 22.626/1933. O anatocismo, repudiado pelo Verbete n. 121 da Súmula do Supremo Tribunal Federal, não guarda relação com o Enunciado n. 596 da mesma Súmula. III - Ausente o prequestionamento do tema, não há como analisar a insurgência recursal, nos termos do Enunciado n. 282 da Súmula-STF. (4ª Turma, REsp n. 164.935-RS, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, unânime, DJU de 21.09.1998). Comercial. Contrato de mútuo. Correção monetária. TR. Prequestionamento. Ausência. Súmulas n. 282 e n. 356-STF. Juros. Limitação (12% a.a.). Lei de Usura (Decreto n. 22.626/1933). Não incidência. Aplicação da Lei n. 4.595/1964. Disciplinamento legislativo posterior. Súmula n. 596-STF. Capitalização mensal dos juros. Vedação. Lei de Usura (Decreto n. 22.626/1933). Incidência. Súmula n. 121-STF. Comissão de permanência. Correção monetária. Multa. Inacumulação. I. Inadmissível recurso especial em que é debatida questão federal não objetivamente enfrentada no acórdão a quo. II. Não se aplica a limitação de juros de 12% ao ano prevista na Lei de Usura aos contratos de abertura de crédito bancário. III. Nos contratos de mútuo firmados com instituições financeiras, ainda que expressamente acordada, é vedada a capitalização mensal dos juros, somente admitida nos casos previstos em lei, hipótese diversa dos autos. Incidência do art. 4º do Decreto n. 22.626/1933 e da Súmula n. 121-STF. IV. A existência de cláusula permitindo a cobrança de comissão de permanência com suporte na Lei n. 4.595/1964 c.c. a Resolução n. 1.129/86-Bacen, não pode ser afastada para adoção da correção monetária sob o simples enfoque de prejuízo para a parte adversa. Todavia, a concomitante previsão contratual de multa por 380 SÚMULAS - PRECEDENTES inadimplência e juros, reconhecido nas instâncias ordinárias, exclui a comissão de permanência, de acordo com as normas pertinentes à espécie. V. Recurso especial conhecido em parte e parcialmente provido. (4ª Turma, REsp n. 279.022-RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, unânime, DJU de 12.03.2001). Incide, na espécie, a Súmula n. 121 do STF: É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada. Dessa forma, resta reformada conclusão da Corte revisora quanto à periodicidade mensal. Ante o exposto, em conclusão, conheço em parte do recurso e dou-lhe parcial provimento, para reconhecer a qualidade de instituição financeira da recorrente e afastar apenas a capitalização mensal. Custas e verba honorária repartidas igualmente e compensadas. É como voto. VOTO O Sr. Ministro Castro Filho: Sr. Presidente, acompanho o voto da Sra. Ministra Nancy Andrighi. Também entendo que a administradora de cartão de crédito não é instituição financeira, mas a cláusula-mandato é válida. Portanto, os juros não estão limitados, mas a capitalização é vedada. VOTO O Sr. Ministro Antônio de Pádua Ribeiro: Sr. Presidente, data venia, acompanho o voto do Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, conhecendo do recurso especial e dando-lhe provimento. VOTO-VISTA O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: 1. Marcos Alves Dias ajuizou “ação ordinária de revisão contratual e prestação de contas cumulada com pedido de tutela antecipada” contra Banrisul Banco do Estado do Rio Grande do Sul, pleiteando a declaração de nulidade de cláusulas do “contrato de RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 381 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA adesão ao sistema de cartão de crédito Banrisul/Visa”, que estipulariam “juros moratórios e/ou comissões a seus critérios com juros compostos e acima do limite legal de 6% ao ano, multa contratual de 10%, juros compostos sem prévia informação como determina o artigo 52 da Lei n. 8.078/1990”. A sentença julgou procedente o pedido “para, mantida a liminar initio litis deferida, determinar a revisão do contrato em questão, aplicando-se ao saldo negativo mensal a taxa de juros de 12% ao ano, capitalizada anualmente, ou não superior a 2% deduzidas as parcelas de pagamentos do autor, até o limite em que compensarem, apurado, então, em liquidação de sentença, eventual saldo credor ou devedor”. A apelação da ré, apresentada sob a nova denominação Banrisul Serviços Ltda., foi provida pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em acórdão que recebeu esta ementa: Contrato de cartão de crédito. Revisional. Mandato. Encargos. Juros. Limitação constitucional. Multa. Capitalização mensal. Legalidade da cláusula mandato. - É da essência do contrato de cartão de crédito o repasse da administradora ao consumidor dos encargos inerentes à captação de recursos junto ao mercado financeiro. - Não incidência da limitação constitucional de juros e capitalização mensal às instituições pertencentes ao Sistema Financeiro Nacional. Apelo provido. Unânime. O autor-apelado interpôs o recurso especial estribado em alegação de afronta aos arts. 6º- V e VIII, 51-VIII a XI, e 52 da Lei n. 8.078/1990, e 115 do Código Civil, além de divergência jurisprudencial. Contra-arrazoado foi o apelo admitido na origem. A Terceira Turma afetou o feito ao julgamento da Segunda Seção. O Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, relator, concluiu pelo conhecimento do recurso e pelo seu provimento, “para decretar a nulidade da cláusula mandato, nos termos do Enunciado Sumular n. 60 desta Corte, e, em conseqüência, limitar os juros compensatórios em 12% ao ano, vedada a capitalização”. Em voto-vista, concluiu o Ministro Aldir Passarinho Junior por conhecer em parte do recurso e dar-lhe parcial provimento, “para reconhecer a qualidade de instituição financeira da recorrente e afastar apenas a capitalização mensal”. 382 SÚMULAS - PRECEDENTES Acompanharam essa conclusão a Ministra Nancy Andrighi e o Ministro Castro Filho, filiando-se o Ministro Pádua Ribeiro ao entendimento manifestado pelo Relator. Para melhor exame da controvérsia, pedi vista. 2. O ponto essencial da disputa repousa sobre a circunstância de qualificarse ou não como instituição financeira a ré, administradora de cartão de crédito, repousando sobre essa questão a definição do regime jurídico ao qual serão sujeitas suas atividades. As instituições financeiras são caracterizadas pelo art. 17 da Lei n. 4.595/1964, como “pessoas jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros”. As administradoras de cartão de crédito têm por atividade principal o pagamento de uma fatura que lhes for apresentada, em virtude de venda ou de prestação de serviços por terceiro a um cliente seu, sendo remunerada por comissão a cargo do comerciante conveniado e de uma taxa contratual paga pelo cliente. Entretanto, em caráter acessório, quando o cliente não paga o total da despesa efetuada em determinado período, elas financiam o valor da despesa não coberta pelo contratante do cartão. Isso significa que captam dinheiro no mercado, mediante remuneração típica de operações financeiras, a fim de fazer frente à despesa em aberto, que será oportunamente recomposta pelo cliente. Essa atividade acessória constitui tipicamente intermediação financeira, a enquadrar essas entidades no comando abstrato do dispositivo legal acima transcrito. Não se pode olvidar, ademais, que a própria dicção legal inclui, no § 1º do art. 1º da Lei Complementar n. 105/2001, as administradoras de cartão de crédito entre as instituições financeiras abrangidas no âmbito da sua normatividade. Essa norma, aliás, não diz que as administradoras de cartão de crédito se equiparam a instituições financeiras para os seus fins; ao contrário, estabelece que são elas “consideradas instituições financeiras”. Afasta-se, portanto, a pertinência da limitação dos juros imposta pela Lei de Usura. No mesmo sentido, como se viu, a conclusão do Ministro Aldir Passarinho Junior. Impende considerar, ainda, que a adoção de conclusão diversa ensejaria o enriquecimento sem causa do usuário do cartão de crédito em detrimento RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 383 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA das administradoras. Isso porque, querendo ele financiar a aquisição de bens e serviços, em vez de utilizar-se dos instrumentos de crédito direto, disponíveis em profusão, usaria o limite de garantia do seu cartão, sem pagar no vencimento, obrigando a administradora a aplicar recursos próprios ou de terceiros, ao custo do mercado financeiro, para financiar sua operação. Em tese, caberia a revisão das cláusulas com base no Código de Defesa do Consumidor, nos termos em que se manifestou esta Segunda Seção quanto aos contratos bancários, para declaração da abusividade das cláusulas em concreto, ou seja, quando as taxas pactuadas sejam demonstradas superiores ao patamar praticado no mercado. Mas não é o caso em debate na espécie, onde se pretende a limitação dos juros a 12% ao ano, com base na Lei de Usura. 3. Noutro capítulo do tema, tenho por inaplicável na espécie o Verbete n. 60 da Súmula deste Tribunal, quanto à cláusula mandato. Esse enunciado tem a seguinte redação: É nula a obrigação cambial assumida por procurador de mutuário vinculado ao mutuante, no exclusivo interesse deste. É que a cláusula em questão outorga à administradora mandato para buscar no mercado recursos que façam frente às despesas não cobertas no vencimento pelo cliente. O exercício do mandato, por isso, não se dá no interesse exclusivo da administradora, mas, precipuamente, no interesse do cliente. 4. Relativamente à capitalização mensal dos juros, logra ser acolhido o apelo em face da jurisprudência abundante neste Tribunal, no sentido de que somente nos casos em que a lei autoriza especificamente, como nas cédulas de crédito rural, industrial e comercial, é permitida tal capitalização, não se enquadrando o contrato em exame nas hipóteses dessa permissão. 5. Em conclusão, conheço parcialmente do recurso especial, no tocante à capitalização mensal dos juros, para, nessa parte, dar-lhe provimento e declarar incabível a capitalização, acompanhando a divergência iniciada pelo Ministro Aldir Passarinho Junior e seguida pelos Ministros Nancy Andrighi e Castro Filho. VOTO O Sr. Ministro Barros Monteiro: Sr. Presidente, acompanho a divergência na linha da jurisprudência da Quarta Turma, conhecendo em parte do recurso especial e, nessa parte, dando-lhe provimento para excluir a capitalização de juros. 384 SÚMULAS - PRECEDENTES VOTO O Sr. Ministro Fernando Gonçalves: Com a devida vênia, acompanho a divergência, conhecendo em parte do recurso especial e, nessa parte, dando-lhe provimento para excluir a capitalização de juros. ADITAMENTO AO VOTO Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: Sr. Presidente, apenas para frisar que o meu voto é no sentido de considerar instituição financeira as administradoras de cartão de crédito. RSSTJ, a. 5, (21): 347-385, agosto 2011 385 Súmula n. 284 SÚMULA N. 284 A purga da mora, nos contratos de alienação fiduciária, só é permitida quando já pagos pelo menos 40% (quarenta por cento) do valor financiado. Referências: CDC, arts. 6º, VI, e 53. Decreto-Lei n. 911/1969, art. 3º, § 1º. Precedentes: EREsp 129.732-RJ (2ª S, 23.02.2000 – DJ 1º.08.2000) REsp 136.840-GO (4ª T, 15.08.2002 – DJ 18.11.2002) REsp 181.354-SP (4ª T, 29.02.2000 – DJ 08.05.2000) REsp 362.056-MG (3ª T, 09.09.2003 – DJ 29.09.2003) REsp 467.167-MG (4ª T, 20.03.2003 – DJ 19.05.2003) REsp 503.449-DF (3ª T, 21.10.2003 – DJ 19.12.2003) REsp 567.890-MG (4ª T, 18.11.2003 – DJ 16.02.2004) Segunda Seção, em 28.04.2004 DJ 13.05.2004, p. 201 EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL N. 129.732-RJ (99.0048263-8) Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar Relator designado: Ministro Ari Pargendler Embargante: Cláudio Valansi Advogado: Cristiane Andrade da Silva e outro Embargado: Banco ABN AMRO S/A Advogado: Carlos Alexandre da Cunha Lapa e outros EMENTA Civil. Alienação fiduciária. Purgação da mora. Só pode purgar a mora, nos termos do artigo 3º, § 1º, do Decreto-Lei n. 911, de 1969, o devedor que já tiver pago 40% (quarenta por cento) do preço financiado. Embargos de divergência não providos. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Ari Pargendler, por unanimidade, conhecer dos embargos e, por maioria, vencidos os Srs. Ministros Relator, Nilson Naves e Cesar Asfor Rocha, rejeitar os embargos. Foram votos vencedores, os Srs. Ministros Ari Pargendler, Carlos Alberto Menezes Direito, Aldir Passarinho Junior, Eduardo Ribeiro e Barros Monteiro. Lavrará o acórdão o Sr. Ministro Ari Pargendler. Brasília (DF), 23 de fevereiro de 2000 (data do julgamento). Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Presidente Ministro Ari Pargendler, Relator para o acórdão DJ 1º.08.2000 RELATÓRIO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: A decisão que admitiu os embargos de divergência está assim redigida: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 1. Cláudio Valansi, nos autos do agravo de instrumento interposto contra decisão que mantivera o deferimento da liminar de busca e apreensão requerida pelo Banco ABN AMRO S/A, opôs embargos de divergência de v. aresto da eg. Terceira Turma que, por votação unânime, conheceu do REsp n. 129.732-RJ interposto pelo Embargante e, no mérito, por maioria, negou-lhe provimento, em acórdão assim ementado: Alienação fiduciária. Decreto n. 911/1969. Código de Defesa do Consumidor. 1. Não tem apoio a interpretação que dá por revogado o § 1º do art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969 diante da disciplina do Código de Defesa do Consumidor, artigos 6º, VI, e 53. O art. 6º, VI, dispõe que o consumidor tem o direito básico de “efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos”. Ora, essa regra legal não tem nenhuma relação com a purgação da mora em processo sob o regime do Decreto-Lei n. 911/1969. O comando do art. 53, por outro lado, que faz alcançar as alienações fiduciárias, refere-se a cláusulas contratuais sobre a perda das prestações, que são nulas de pleno direito. Mas, aqui não se cuida de cláusula contratual, e, sim, de regra jurídica impondo que, nos casos abrangidos pela lei, lei, portanto, especial, a purgação só será admitida se quitado o percentual indicado. Isso não viola direito algum do consumidor, não sendo razoável concluir pela revogação de uma lei por violar a mens legis de lei posterior, o que, claramente, não existe no direito positivo brasileiro, por conta da Lei de Introdução ao Código Civil. 2. Recurso especial conhecido, mas improvido. (fl. 121). 2. Sustenta que o v. acórdão embargado, ao entender que a regra do § 1º do art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969 não está em conflito com a Lei n. 8.078/1990, dissentiu do entendimento da maioria da eg. Quarta Turma, manifestado no REsp n. 157.688-RJ, sendo relator para o acórdão o em. Min. Cesar Asfor Rocha: Alienação fiduciária em garantia. Emenda da mora. Devedor fiduciante que não chegou a solver 40% do preço financiado. Admissibilidade em face do Código de Defesa do Consumidor. A exigência imposta pelo § 1º do art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969 (pagamento mínimo de 40% do preço financiado) está afastada pelas disposições contidas nos artigos 6º, VI, e 53, caput, do Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/1990). Recurso especial conhecido e provido. (DJU de 29.03.1999). 3. Argumenta que a divergência entre os acórdãos é clara, pois enquanto a eg. Terceira Turma entendeu que o Código de Defesa do Consumidor não afastou a 392 SÚMULAS - PRECEDENTES exigência imposta pelo § 1º do art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969, a Quarta Turma, em julgamento anterior, decidiu contrariamente, ou seja, a exigência do § 1º do art. 3º do citado Decreto-Lei não mais subsiste diante do CDC. 4. Tenho por bem demonstra a divergência, razão pela qual admito os embargos. Vista ao embargado, por quinze dias. 2. Concedida vista ao embargado (art. 267 do RISTJ), o prazo decorreu sem impugnação (certidão de fl. 191 vº). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar (Relator): Trata-se de saber se a exigência de pagamento de 40% do preço financiado em contrato de alienação fiduciária em garantia, prevista no art. 3º, par. 1º, do DL n. 911/1969, é regra que prejudica o alienante fiduciário e, por isso, em confronto com dispositivo do Código de Defesa do Consumidor. O r. acórdão embargado afirmou que o art. 6º, inc. VI, do CDC, não tem nenhuma relação com a purgação da mora regulada no DL n. 911/1969. Data venia, penso que a razão está com o embargante e com a tese acolhida no r. julgado paradigma. Um dos modos mais eficazes para evitar o dano que decorre do descumprimento de um contrato é a purga da mora. É ato socialmente útil, pois por ele se concretiza o contrato; o devedor cumpre com a sua prestação e, assim, atende ao que dele se esperava; o credor vê satisfeita a sua pretensão assim como programada, e, para ele, nada melhor do que isso. Para o devedor, é o meio que a lei lhe faculta de liberar-se dos efeitos danosos que decorrem da inadimplência, que o sujeitariam à execução forçada, multas, sanções administrativas e bancárias, divulgação do seu nome em banco de dados de devedores, restrição ao crédito, etc. Portanto, a regra do art. 3º, par. 1º, do DL n. 911/1969, exigindo o pagamento de 40% do preço financiado (ao qual se há de somar o que já foi pago à vista e não foi financiado), constitui grave obstáculo à prática de um ato que, sendo socialmente útil e conveniente também para o credor, possibilita ao devedor liberar-se dos danos que necessariamente decorrem do rompimento do RSSTJ, a. 5, (21): 387-419, agosto 2011 393 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA contrato. No caso, a perda do bem em ação de busca e apreensão e possibilidade de conversão em ação de depósito. Nos termos do art. 6º, inc. VI, do CDC, é direito básico do consumidor a efetiva prevenção de danos patrimoniais e morais. Tenho para mim que a proibição da purga da mora é causa certa de danos decorrentes da inadimplência, de ordem patrimonial e moral. Prevenir esses danos é um princípio do CDC, porquanto não há nenhuma vantagem social em forçar a inadimplência e impedir que ela seja superada. Logo, há conflito entre o princípio que dificulta sobremaneira a posição do devedor, impedindo-o de superar a situação de inadimplência, e o enunciado que procura evitar e prevenir os danos que decorrem da frustração do contrato. Além disso, o art. 53 do CDC considera nulas as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em contrato de alienação fiduciária. No caso de persistir a mora, cuja purgação o art. 3º, par. 2º, do DL n. 911/1969 proíbe, o bem alienado será vendido no mercado, inexistindo previsão no art. 3º sobre a devolução das prestações pagas. Isso significa que o devedor, impedido de purgar apenas porque ainda não pagou 40% do preço financiado, corre o risco de não receber as prestações pagas embora resolvido o negócio. Por isso, com respeitosa vênia, tenho que os acórdãos estão em confronto e, pelo meu voto, prevalece o julgado paradigma, que tem a seguinte ementa: “A exigência imposta pelo par. 1º, do art. 3º do DL n. 911/1969 (pagamento no mínimo de 40% do preço financiado) está afastada pelas disposições contidas nos arts. 6º, VI, e 53, caput, do CDC (Lei n. 8.078/1990)”. Assim, acolho os embargos. É o voto. VOTO-VISTA O Sr. Ministro Ari Pargendler: - O artigo 3º, § 1º, do Decreto-Lei n. 911, de 1969, dispõe: O proprietário fiduciário ou credor poderá requerer contra o devedor ou terceiro a busca e apreensão do bem alienado fiduciariamente, a qual será concedida liminarmente, desde que comprovada a mora ou o inadimplemento do devedor. § 1º - Despachada a inicial e executada a liminar, o réu será citado para, em três dias, apresentar contestação ou, se já tiver pago 40% (quarenta por cento) do preço financiado, requerer a purgação da mora. 394 SÚMULAS - PRECEDENTES Discute-se, na espécie, se essa regra foi alterada ou pelo artigo 6º, inciso VI, ou pelo artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor, a seguir transcritos: Art. 6º - São direitos básicos do consumidor: VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos. Art. 53 - Nos contratos de compra e venda de móveis ou imóveis mediante pagamento em prestações, bem como nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado. O Ministro Ruy Rosado de Aguiar sustenta que, sim, há conflito entre a regra do Decreto-Lei n. 911, de 1969 e as do Código de Defesa do Consumidor, in verbis: O r. acórdão embargado afirmou que o disposto no art. 6º, inc. VI, do CDC, não tem nenhuma relação com a purgação da mora regulada no DL n. 911/1969. Ora, um dos modos mais eficazes para evitar o dano que decorre do descumprimento de um contrato é a purga da mora. É ato socialmente útil, pois por ele se concretiza o contrato; o devedor cumpre com a sua prestação e, assim, atende ao que dele se esperava; o credor vê satisfeita a sua pretensão assim como programada, e, para ele, nada melhor do que isso. Para o devedor, é o meio que a lei lhe faculta para liberar-se dos efeitos danosos que decorrem da inadimplência, que o sujeitariam à execução forçada, multas, sanções administrativas e bancárias, divulgação do seu nome em banco de dados de devedores, restrição ao crédito, etc. Portanto, a regra do art. 3º, § 1º, do DL n. 911/1969, exigindo o pagamento de 40% do preço financiado (ao qual se há de somar o que já foi pago à vista e não foi financiado), constitui grave obstáculo à prática de um ato que, sendo socialmente útil e conveniente também para o credor, possibilita ao devedor liberar-se dos danos que necessariamente decorrem do rompimento do contrato. No caso, a perda do bem em ação de busca e apreensão e possibilidade de conversão em ação de depósito. Nos termos do art. 6º, inc. VI, do CDC, é direito básico do consumidor a efetiva prevenção de danos patrimoniais e morais. Tenho para mim que a proibição da purga mora é causa certa de danos decorrentes da inadimplência, de ordem patrimonial e moral. Prevenir esses danos é um princípio do CDC, porquanto não há nenhuma vantagem social em forçar a inadimplência e impedir que ela seja superada. Logo, há conflito entre o princípio que dificulta sobremaneira a posição do devedor, impedindo-o de superar a situação de inadimplência, e o enunciado que procura evitar e prevenir os danos que decorrem da frustração do contrato. RSSTJ, a. 5, (21): 387-419, agosto 2011 395 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA A argumentação é brilhante, e tem como reforço sua nobilitante motivação, mas o que, no caso, parece aceitável, pode se revelar inconveniente para o sistema, sendo imprevisíveis os efeitos de reconhecer revogada uma norma especial à base de um preceito genérico, sem delimitação de assunto; diferentemente seria, se se tratasse de uma norma geral a respeito da mesma matéria (Lei de Introdução ao Código Civil, art. 2º, § 1º). Para o Ministro Ruy Rosado de Aguiar, a aplicação do artigo 3º, § 1º, do Decreto-Lei n. 911, de 1969, está ainda prejudicada pelo artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor. “Além disso” - lê-se no seu voto - “o art. 53 do CDC considera nulas as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em contrato de alienação fiduciária. No caso de persistir a mora, cuja purgação o art. 3º, § 2º, do DL n. 911/1969 proíbe, o bem alienado será vendido no mercado, inexistindo previsão no art. 3º sobre a devolução das prestações pagas. Isso significa que o devedor, impedido de purgar apenas porque ainda não pagou 40% do preço financiado, corre o risco de não receber as prestações pagas, embora resolvido o negócio”. Aqui, data venia, a objeção não procede, à evidência, na medida em que o aludido artigo 53 se refere a cláusulas, e aqui se trata de norma legal - que, de resto, não dispõe sobre o destino das prestações pagas. Voto, por isso, no sentido de negar provimento aos embargos de divergência. VOTO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: - Sr. Presidente, também tenho o entendimento de que somente com 40% é possível a purga. A norma é específica e prevalece. Acompanho o voto do Sr. Ministro Ari Pargendler. VOTO O Sr. Ministro Nilson Naves: - Tal o voto que proferi na Turma, acompanho o Relator, data venia. VOTO O Sr. Ministro Barros Monteiro: Sr. Presidente, no aresto paradigma, o Recurso Especial n. 157.688, o voto minoritário, como acabou de assinalar o Sr. Ministro Nilson Naves, foi de minha relatoria. 396 SÚMULAS - PRECEDENTES Rogando vênia, acompanho o pronunciamento do Sr. Ministro Ari Pargendler. VOTO VENCIDO O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha: - Sr. Presidente, o acórdão paradigma é meu. Peço vênia para acompanhar o voto do eminente Ministro-Relator. RECURSO ESPECIAL N. 136.840-GO (97.0042112-0) Relator: Ministro Barros Monteiro Recorrente: Banco ABN AMRO S/A Advogado: Aluízio Ney de Magalhães Ayres Recorrido: Iraci Pereira Lopes Barbosa Advogado: Amazonino Barcelos Nogueira EMENTA Alienação fiduciária em garantia. Emenda da mora. Devedor fiduciante que não chegou a solver 40% do preço financiado. - Ao devedor fiduciante não é dado purgar a mora, se não tiver solvido o equivalente a 40% do preço financiado. Precedente da Segunda Seção. Recurso especial conhecido e provido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas: Decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso, na forma do relatório e notas taquigráficas precedentes que integram o presente julgado. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Ruy Rosado de Aguiar, Aldir Passarinho Junior e Sálvio de Figueiredo Teixeira. RSSTJ, a. 5, (21): 387-419, agosto 2011 397 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Brasília (DF), 15 de agosto de 2002 (data do julgamento). Ministro Cesar Asfor Rocha, Presidente Ministro Barros Monteiro, Relator DJ 18.11.2002 RELATÓRIO O Sr. Ministro Barros Monteiro: O “Banco ABN AMRO S/A” interpôs agravo de instrumento contra a decisão que, nos autos de ação de busca e apreensão de veículo alienado fiduciariamente movida contra Iraci Pereira Lopes Barbosa, deferiu a purgação da mora. A Terceira Turma do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás negou provimento ao agravo, em acórdão cujos fundamentos se resumem na seguinte ementa: Alienação fiduciária. Purgação da mora. Derrogação do § 1º, art. 3º, do Dec.-Lei n. 911/1969. Na alienação fiduciária, a purgação da mora por parte do devedor é ampla, e não se limita à demonstração de ter pago 40% do preço financiado, derrogado que se encontra o § 1º, art. 3º, do Dec.-Lei n. 911/1969, pelas disposições do Código de Defesa do Consumidor. Improvido por unanimidade (fl. 50). Inconformado, o Banco autor manifestou recurso especial com fulcro na alínea a do permissor constitucional, apontando negativa de vigência dos arts. 3º, § 1º, do Decreto-Lei n. 911/1969, e 762, III, do Código Civil. Sustentou a impossibilidade de purgação da mora quando não cumprida a exigência do pagamento de 40% do valor financiado. Contra-arrazoado, o apelo extremo foi admitido na origem, subindo os autos a esta Corte. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Barros Monteiro (Relator): Enfocando o acórdão recorrido tema exclusivamente de direito, tocante à derrogação do art. 3º, § 1º, do 398 SÚMULAS - PRECEDENTES Decreto-Lei n. 911, de 1º.10.1969, pelas normas do Código de Defesa do Consumidor, implicitamente admitiu que a devedora fiduciante não pagou 40% do preço financiado. Esta Quarta Turma perfilhou, de início, a mesma orientação esposada pela decisão recorrida. Dentre outros, confira-se o REsp n. 157.688-RJ, Relator designado o Ministro Cesar Asfor Rocha. No entanto, a eg. Segunda Seção desta Corte firmou diretriz em sentido oposto, qual seja, “só pode purgar a mora, nos termos do artigo 3º, § 1º, do Decreto-Lei n. 911, de 1969, o devedor que já tiver pago 40% (quarenta por cento) do preço financiado” (EREsp n. 129.732-RJ, Relator para o acórdão Ministro Ari Pargendler). Diante de tal precedente, a eg. Quarta Turma modificou a sua primitiva posição, passando a não admitir a emenda da mora quando o devedor fiduciante não tiver solvido o equivalente a 40% do valor financiado (REsp n. 181.354-SP, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira; REsp n. 197.770-ES, Relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar). Do quanto foi exposto, conheço do recurso e dou-lhe provimento, a fim de indeferir o pedido de purgação da mora. É como voto. VOTO O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha (Presidente): Srs. Ministros, acompanho o voto do eminente Ministro-Relator com ressalva do meu entendimento pessoal. Conheço do recurso especial e dou-lhe provimento. VOTO-MÉRITO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: Sr. Presidente, acompanho o voto do Sr. Ministro-Relator com ressalva do meu ponto de vista. Conheço do recurso especial e dou-lhe provimento. VOTO O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: Acompanho o voto do Sr. Ministro-Relator, com ressalva do meu entendimento pessoal, conhecendo do recurso especial e dando-lhe provimento. RSSTJ, a. 5, (21): 387-419, agosto 2011 399 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RECURSO ESPECIAL N. 181.354-SP (98.0049943-1) Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira Recorrente: Banco Martinelli S/A Advogada: Rosemeire Olivo Recorrida: Dalva Alice Coreno Barboza Advogado: Roberto Tadeu de Oliveira EMENTA Alienação fiduciária. Busca e apreensão. Purgação da mora. Limite de 40%. Código de Defesa do Consumidor. Inaplicabilidade. Orientação da Segunda Seção. Ressalva do ponto de vista pessoal. Recurso provido. - A Segunda Seção, ao uniformizar a jurisprudência das Turmas que a compõem, por maioria acabou por optar pelo entendimento segundo o qual as disposições contidas nos arts. 6º, VI e 53 do Código de Defesa do Consumidor não afastaram a limitação de 40% (quarenta por cento) do preço financiado para a purgação da mora nos contratos de alienação fiduciária, de que trata o § 1º do art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Votaram com o Relator os Ministros Barros Monteiro, Cesar Asfor Rocha, Ruy Rosado de Aguiar e Aldir Passarinho Junior. Brasília (DF), 29 de fevereiro de 2000 (data do julgamento). Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Presidente Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Relator DJ 08.05.2000 400 SÚMULAS - PRECEDENTES EXPOSIÇÃO O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: - Julgada procedente a pretensão em ação de busca e apreensão ajuizada pelo recorrente, foi provida a apelação do devedor-recorrido pelo Segundo Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, em acórdão assim ementado: Ação de busca e apreensão - Após a edição da Lei n. 8.078/1990, é possível a purgação da mora pelo devedor, citado em busca e apreensão de veículo, mesmo que não haja quitado 40% do preço da transação fiduciária, uma vez que esse limite não mais subsiste, ante a revogação implícita do art. 3º, § 1º, do Dec.-Lei n. 911/1969, pelos artigos 6º, inciso VI, e 53, do Código de Defesa do Consumidor. Adveio recurso especial do banco, com veiculação de ofensa ao art. 3º, § 1º do Decreto-Lei n. 911/1969. Com as contra-razões, foi o recurso admitido. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira (Relator): - 1. Cinge-se a controvérsia dos autos a respeito da eventual revogação, pelas disposições contidas nos arts. 6º, VI e 53 do Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/1990), do § 1º do art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969, que permite a purgação da mora, nos contratos de alienação fiduciária, quando pago, no mínimo, 40% do preço financiado. 2. A questão já foi examinada por esta Turma, tendo sido sufragado entendimento retratado nesta ementa: Alienação fiduciária em garantia. Emenda da mora. Devedor fiduciante que não chegou a solver 40% do preço financiado. Admissibilidade em face do Código de Defesa do Consumidor. - A exigência imposta pelo § 1º do art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969 (pagamento no mínimo de 40% do preço financiado) está afastada pelas disposições contidas nos arts. 6º, VI, e 53, caput, do Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/1990). O Ministro Cesar Asfor Rocha, no voto condutor do acórdão, assentou: RSSTJ, a. 5, (21): 387-419, agosto 2011 401 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Inicialmente devo destacar que o Código de Defesa do Consumidor alberga normas de caráter nitidamente protecionista ao consumidor, em razão de sua presumida hipossuficiência econômica. Assim, o inciso IV, do seu art. 6º, estabelece que são direitos do consumidor a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos. Por sua vez, pontifica o seu art. 53, no que interessa: Art. 53 - (...) nas alienações fiduciárias em garantia, consideram-se nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam a perda total das prestações pagas em benefício do credor que, em razão do inadimplemento, pleitear a resolução do contrato e a retomada do produto alienado. Já o § 1º, do art. 3º, do Decreto-Lei n. 911/1969, só admite a purgação da mora, nas alienações fiduciárias, se o devedor já tiver pago o percentual mínimo de 40% do preço financiado. A questão consiste em saber se esse obstáculo de purgação da mora veiculado nesse preceito ainda subsiste em razão daquela nova regra. A norma contida no referido art. 53 deve ser interpretada ampliativamente, sempre tendo-se em conta que a sua finalidade está em preservar o consumidor de regras abusivas que importem não só na perda das prestações como do próprio bem, desde que o devedor restabeleça a regularidade dos pagamentos a que se comprometera, para adquiri-lo. Destarte, como salientado pelo recorrente, o Código de Defesa do Consumidor, ao afastar a perda automática das prestações pagas, em razão do inadimplemento do devedor, propicia também a proibição de interpretar dispositivo de lei anteriormente vigente que possa afrontá-lo, em face de um direito individual criado pelo legislador e que objetiva impedir um dano patrimonial, como é o direito à purgação da mora nos contratos de alienação fiduciária. Sendo assim, o obstáculo imposto pelo Decreto-Lei n. 911/1969 para purgação da mora, não mais subsiste ante a norma contida no art. 53 do Código de Defesa do Consumidor, por isso que esta afasta a aplicação daquela. Esta me parece ser a interpretação que mais se compadece com os princípios estabelecidos pelo Código de Defesa do Consumidor. Ao acompanhar esse entendimento, afirmei: Sr. Presidente, vou pedir vênia a V. Exa. para votar com a divergência, iniciada com o Ministro Cesar Asfor Rocha. Entendo que a lei da alienação fiduciária foi editada em um período de características sociais bem diversas de quando foi editada a lei do consumidor, e 402 SÚMULAS - PRECEDENTES que o animus que levou à edição de uma não se identifica com o propósito que motivou a outra. No Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078), nítida é a proteção ao consumidor e à parte mais frágil na relação contratual. No cotejo entre os arts. 6º, IV, do Decreto-Lei n. 911, e o 53, caput, do Código do Consumidor, deve prevalecer a norma posterior, que melhor reflete os interesses sociais. Por isto, com respeitosa vênia, acompanho a divergência. O Ministro Ruy Rosado de Aguiar, por sua vez, registrou: Sr. Presidente, também pelas mesmas razões invocadas pelo Ministro Cesar Asfor Rocha, parece-me que o art. 53 está protegendo o consumidor em todo contrato com pagamento parcelado. Uma vez desfeita a avença, tem o comprador, em princípio, direito à restituição das parcelas adiantadas, indenizado o credor adimplente. No caso da regra do Decreto-Lei n. 911, a exigência de que o devedor tenha pago, no mínimo, 40% do preço significa uma restrição grave ao exercício do direito de purgar a mora. Tal impedimento não está mais em consonância com o sistema introduzido pela Lei n. 8.078, tanto pelo que está disposto no art. 6º, inciso IV, quanto no art. 51, inciso II. Por essas razões, pedindo máxima vênia a V. Exª. conheço do recurso e lhe dou provimento para permitir ao alienante fiduciário, ainda que não tenha pago 40% do preço, o direito de purgar a mora. 3. A Segunda Seção, no entanto, ao uniformizar a jurisprudência das Turmas que abrange, em julgamento no qual não proferi voto, por estar a presidilo, por cinco votos a três (5x3), acabou por optar pelo entendimento da Terceira Turma, retratado, dentre outros, no REsp n. 129.732-RJ (DJ 03.05.1999), da relatoria do Ministro Menezes Direito, com esta ementa: Alienação fiduciária. Decreto-Lei n. 911/1969. Código de Defesa do Consumidor. 1. Não tem apoio a interpretação que dá por revogado o § 1º do art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969 diante da disciplina do Código de Defesa do Consumidor, artigos 6º, VI, e 53. O art. 6º, VI, dispõe que o consumidor tem o direito básico de “efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos”. Ora, essa regra legal não tem nenhuma relação com a purgação da mora em processo sob o regime do Decreto-Lei n. 911/1969. O comando do art. 53, por outro lado, que faz alcançar as alienações fiduciárias, refere-se a cláusulas contratuais sobre a perda das prestações, que são nulas de pleno direito. Mas, aqui não se cuida de cláusula contratual, e, sim, de regra RSSTJ, a. 5, (21): 387-419, agosto 2011 403 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA jurídica impondo que, nos casos abrangidos pela lei, lei, portanto, especial, a purgação só será admitida se quitado o percentual indicado. Isso não viola direito algum do consumidor, não sendo razoável concluir pela revogação de uma lei por violar a mens legis de lei posterior, o que, claramente, não existe no direito positivo brasileiro, por conta da Lei de Introdução ao Código Civil. 2. Recurso especial conhecido, mas improvido. Isso se deu nos EREsp n. 129.732-RJ, julgado em 23.02.2000, sob a relatoria do Ministro Ruy Rosado de Aguiar. 4. Diante do exposto, com a ressalva do ponto de vista pessoal, conheço do recurso e dou-lhe provimento, para restabelecer a sentença. RECURSO ESPECIAL N. 362.056-MG (2001.0116472-4) Relator: Ministro Castro Filho Recorrente: Banco Panamericano S/A Advogado: Sirlei Cristina da Silva e outros Recorrido: Everson Marques de Brito Advogado: Paulo de Oliveira Lopes EMENTA Ação de busca e apreensão. Contrato de alienação fiduciária em garantia. Purgação da mora. Pagamento inferior a 40% do débito. Inadmissibilidade. Comissão de permanência. Substituição. Juros. Limitação. Questões não conhecidas. Súmula n. 284-STF. Confronto analítico dos julgados. Ausência. I - Na linha da orientação majoritária da Segunda Seção deste Superior Tribunal de Justiça (EREsp n. 128.732-RJ, DJ 1º.08.2000), somente poderá purgar a mora, nos termos do artigo 3º, § 1º, do Decreto-Lei n. 911/1969, o devedor que já tiver pago 40% (quarenta por cento) do preço financiado. 404 SÚMULAS - PRECEDENTES II - As questões relativas à substituição da comissão de permanência pela correção monetária e à limitação dos juros não podem ser examinadas na via especial, eis que não foi apontado qualquer dispositivo legal a ser reputado como violado (Súmula n. 284 do STF), nem realizado o confronto analítico entre os julgados apontados como divergentes. Recurso provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, retifica-se a decisão proferida na sessão de 26.06.2003, por unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento. Os Srs. Ministros Antônio de Pádua Ribeiro, Ari Pargendler, Carlos Alberto Menezes Direito e Nancy Andrighi votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília (DF), 09 de setembro de 2003 (data do julgamento). Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Presidente Ministro Castro Filho, Relator DJ 29.09.2003 RELATÓRIO O Sr. Ministro Castro Filho: - Trata-se de recurso especial interposto por Banco Panamericano S/A contra acórdão da Terceira Câmara Civil do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais, que deu provimento à apelação interposta por Everson Marques de Brito, permitindo a purgação da mora por parte do devedor, que ainda não havia pago a percentagem mínima do valor financiado que o permitiria, bem como limitando os juros a 1% (um por cento) ao mês, e substituindo a comissão de permanência pactuada pela correção monetária pelo INPC. O aresto recorrido restou assim ementado, verbis: RSSTJ, a. 5, (21): 387-419, agosto 2011 405 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Busca e apreensão. Alienação fiduciária. Notificação válida. Renovação do parágrafo 1º do art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969. Purgação da mora. Possibilidade. Decreto n. 22.262/1933. Substituição da comissão de permanência pela correção monetária. A notificação da mora é válida desde que enviada para o endereço correto do devedor. “Por representar desvantagem exagerada, ensejando desequilíbrio contratual, acha-se na parte que limita o direito a purga da mora ao financiado, valendo-se o devedor das disposições contidas nos arts. 6º, V e 53 do Código de Defesa do Consumidor”. É de se permitir a emendatio morae, em relação às prestações vencidas, até a formulação de seu correspondente pedido, ou mesmo a inclusão das vincendas até sua consumação, com a exclusão, por óbvio, das que representam a totalidade do contrato, salvo se este for o desejo do mutuário. A comissão de permanência tem a mesma finalidade da correção monetária, ou seja, manter atualizado o valor da dívida, não podendo se apresentar como lucro, ou acréscimo do débito que deverá ser corrigido em virtude da depreciação do valor real da moeda. V.v.: A ação de busca e apreensão e a sua conversão em depósito têm como pressuposto a regular comprovação da mora, com a notificação realizada na pessoa do devedor, não sendo observada a norma, impõe-se a extinção do processo. Os embargos de declaração opostos foram rejeitados. Alega o recorrente que o aresto impugnado afrontou o § 1º do artigo 3º do Decreto-Lei n. 911/1969 e divergiu da jurisprudência de outros Tribunais, no sentido de que, na conformidade do referido dispositivo legal, a purgação da mora só se admite na hipótese em que o devedor tenha quitado, pelo menos, 40% (quarenta por cento) do preço financiado. Ressalta que obteve autorização judicial para venda do veículo objeto do financiamento, sendo impossível sua restituição, acaso permitida a purga da mora. Cita julgados no sentido de que, expressamente pactuada, a comissão de permanência pode ser cobrada, não devendo ser substituída de ofício pela correção monetária, e os juros bancários não se encontram limitados a 12% (doze por cento) ao ano. 406 SÚMULAS - PRECEDENTES Requer a reforma do acórdão, confirmando-se a sentença de fls. 32 e 33. Sem contra-razões (fl. 116), o recurso foi admitido por decisão do vicepresidente do egrégio Tribunal a quo (fls. 117 a 121). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Castro Filho (Relator): - Ao considerar revogado pelo Código de Defesa do Consumidor o § 1º do artigo 3º do Decreto-Lei n. 911/1969, que prevê o pagamento mínimo de 40% do débito para que seja conferido ao devedor o direito de purgar a mora, o aresto impugnado entrou em confronto com a orientação majoritária da Segunda Seção desta egrégia Corte (EREsp n. 129.732-RJ, Rel. p/ acórdão Min. Ari Pargendler, j. 23.02.2000, DJ 1º.08.2000, p. 00188, REVJUR 274/093), segundo a qual somente pode purgar a mora, nos termos do referido dispositivo, o devedor que já tiver pago tal montante. No mesmo sentido, entre outros precedentes, confiram-se: REsp n. 136.840-GO, Rel. Min. Barros Monteiro, j. 15.08.2002, DJ 18.11.2002, p. 00218; REsp n. 420.114-SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 27.06.2002, DJ 02.09.2002, p. 00200; REsp n. 188.451-BA, Rel. Min. Ari Pargendler, j. 15.10.2001, DJ 19.11.2001, p. 00261, LEXSTJ 150/106; REsp n. 264.616-PR, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 05.10.2000, DJ 20.11.2000, p. 00302, JBCC 186/281; REsp n. 197.770-ES, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 25.04.2000, DJ 12.06.2000, p. 00114, RJADCOAS 012/039; e REsp n. 181.354-SP, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, j. 29.02.2000, DJ 08.05.2000, p. 00097. Por sua vez, afastada a possibilidade de purgar a mora, fica prejudicado o exame das questões relativas à substituição da comissão de permanência pela correção monetária e à limitação dos juros nesta via especial, as quais poderão ser discutidas em ação própria. Feitas essas breves considerações, dou provimento ao presente recurso, para restabelecer a sentença de fls. 32 e 33. Arcará o recorrido com as custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 300,00 (trezentos reais), com base no art. 20, § 4º, do CPC. É como voto. RSSTJ, a. 5, (21): 387-419, agosto 2011 407 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA RETIFICAÇÃO DE VOTO O Sr. Ministro Castro Filho (Relator): Sr. Presidente, quero retificar o meu voto proferido na assentada do dia 26.03.2003, que conhecia do recurso especial, e negava-lhe provimento, para conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento. RECURSO ESPECIAL N. 467.167-MG (2002.0107803-7) Relator: Ministro Ruy Rosado de Aguiar Recorrente: BV Financeira S/A - Crédito, Financiamento e Investimento Advogado: Giuliana Aparecida Sartori e outro Recorrido: Marco Antônio do Nascimento Antônio Advogado: Orlando Pedro da Silva EMENTA Alienação fiduciária. Busca e apreensão. Purga da mora. Deve ser deferido o pedido de purga da mora ao devedor que deposita em juízo o valor correspondente a 40% do valor do débito, ainda que não tenha sido cumprido o mandado. Precedentes. Recurso não conhecido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, não conhecer do recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Aldir Passarinho Junior e Barros Monteiro votaram com o Sr. Ministro-Relator. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Fernando Gonçalves. 408 SÚMULAS - PRECEDENTES Brasília (DF), 20 de março de 2003 (data do julgamento). Ministro Aldir Passarinho Junior, Presidente Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Relator DJ 19.05.2003 RELATÓRIO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar: A egrégia Sétima Câmara Cível do TAMG negou provimento ao agravo interposto por BV Financeira S/A Crédito, Financiamento e Investimento, em acórdão assim ementado: Alienação fiduciária. Decreto-Lei n. 911/1969. Purgação da mora. Liminar não cumprida. Depósito do valor de 40% do débito, no curso do procedimento. Deve-se deferir ao réu, em ações de busca e apreensão alicerçadas no DecretoLei n. 911/1969, o pedido de purgação da mora, ainda que o pagamento da quantia correspondente a 40% do total do débito tenha sido realizado no curso da ação. Inexistindo prejuízo para a entidade financeira, não se deve cercear o direito do devedor de purgar a mora (fl. 72). Inconformada, a agravante interpôs recurso especial (art. 105, III, a, da CF). Alega que o acórdão afrontou o DL n. 911/1969, que exige o pagamento de 40% do valor total do contrato cumprido para que o financiado possa purgar a mora. O limite determinado no § 1º do art. 3º do DL n. 911/1969 está em pleno vigor mesmo com o advento do CDC, uma vez que o artigo foi recepcionado pela Constituição Federal e o recorrido não preenche o requisito legal para purgar a mora, pois não efetuou o pagamento de mais de 40% do valor financiado. Afirma que o valor depositado pelo financiado não foi devidamente corrigido de acordo com as taxas e encargos moratórios definidos no contrato e que “temerário é o fato de ter sido deferida a purgação da mora sem mesmo ter sido executada a medida liminar.” Por fim, diz que o valor devido pelo recorrido não é tão-somente o correspondente às prestações vencidas, mas também às vincendas, tendo em vista o vencimento antecipado do contrato. Cita julgados. RSSTJ, a. 5, (21): 387-419, agosto 2011 409 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Admitido o recurso, sem as contra-razões, vieram-me os autos. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar (Relator): A egrégia Segunda Seção firmou o entendimento de que só pode purgar a mora, nos termos do art. 3º, § 1º, do DL n. 911/1969, o devedor que já tiver pago 40% do preço financiado, porque o Código de Defesa do Consumidor não revogou aquele dispositivo. No caso dos autos, consta do acórdão que o devedor, “logo depois, não cumprida a liminar, realizou o depósito do valor referente aos 40% aludidos, mais 10% referentes a honorários advocatícios e requereu a purgação da mora.” Assim, pagos os 40% do preço e porque inexistiu prejuízo para o recorrente, ainda que não cumprida a liminar, a egrégia Câmara admitiu a purga da mora. Esse entendimento não contraria os nossos precedentes e levou em conta as circunstâncias dos autos, vedado o seu reexame por incidência da Súmula n. 7-STJ. A alegação de que o preço não foi devidamente corrigido de acordo com o pactuado esbarra também no óbice da Súmula n. 7-STJ. Por fim, invoco o precedente da egrégia Terceira Turma, relator o em. Min. Ari Pargendler: “Civil. Alienação fiduciária. Busca e apreensão. Pagamentos parciais feitos no curso do processo, não obstante a purga da mora estivesse vedada, porque, à data do ajuizamento da ação de busca e apreensão, o devedor ainda não havia pago 40% do preço financiado. Fato consumado. Recurso especial conhecido e provido em parte” (REsp n. 188.451-BA, DJ 19.11.2001). Quanto à exigência de prévio cumprimento do mandado de busca, lembro precedente desta Quarta Turma, já referido nos autos: Processual Civil. Ação de busca e apreensão. Veículo não encontrado. Liminar não cumprida. Pedido de quitação da totalidade do saldo devedor. Possibilidade. Decreto-Lei n. 911/1969, Art. 3º. I. Constituindo o objetivo mediato da ação de busca e apreensão o recebimento, pela credora, do débito assegurado pelo bem fiduciariamente alienado, possível o deferimento, pelo juízo singular, independentemente do cumprimento da liminar, do pedido de quitação integral das parcelas vencidas e vincendas - as primeiras já pagas em percentual superior a 40% do preço financiado - satisfazendo, por inteiro, a obrigação do consorciado junto ao grupo e à administradora. 410 SÚMULAS - PRECEDENTES II. Recurso especial não conhecido. (REsp n. 79.076-MG, 4ª Turma, rel. o em Min. Aldir Passarinho Junior, DJ 12.02.2001). Isso posto, não conheço do recurso. É o voto. RECURSO ESPECIAL N. 503.449-DF (2002.0171518-3) Relator: Ministro Carlos Alberto Menezes Direito Recorrente: Jair Francisco de Andrade Advogado: Júlio Otsuschi e outros Recorrido: Banco ABN AMRO S/A Advogado: Roucinea de Melo Moreira e outros EMENTA Ação de busca e apreensão. Alienação fiduciária. Purgação da mora. Insubsistência das alegações recursais. Prequestionamento. Precedentes da Segunda Seção sobre juros e comissão de permanência. 1. Já decidiu a Corte que vige o Decreto-Lei n. 911/1969, permitida a purgação da mora apenas quando pagos 40% das prestações. 2. Ao réu foram oferecidas todas as oportunidades possíveis, não havendo substância para qualquer alegação de cerceamento de defesa. 3. Embora apresentada sem fundamentação eficaz, além de apoiada em dispositivos que não foram prequestionados, no que concerne ao alcance da defesa, o certo é que esta Corte já decidiu que a comissão de permanência pode ser cobrada e que os juros não estão limitados a 12% ao ano. 4. A litigância de má-fé não pode ser afastada sem que o especial enfrente objetivamente os fundamentos do Tribunal local para reconhecê-la. 5. Recurso especial não conhecido. RSSTJ, a. 5, (21): 387-419, agosto 2011 411 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso especial. Os Srs. Ministros Castro Filho e Antônio de Pádua Ribeiro votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausentes, ocasionalmente, os Srs. Ministros Nancy Andrighi e Ari Pargendler. Brasília (DF), 21 de outubro de 2003 (data do julgamento). Ministro Antônio de Pádua Ribeiro, Presidente Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Relator DJ 19.12.2003 RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito: Jair Francisco de Andrade interpõe recurso especial, com fundamento na alínea a do permissivo constitucional, contra acórdão da Segunda Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, assim ementado: Busca e apreensão. Alienação fiduciária. Inadimplemento contratual. Procedência do pedido. Adequação da via eleita. Cerceamento de defesa não configurado. Julgamento antecipado da lide. Litigância de má-fé. Caracterização. Verba honorária. 1. A ação de busca e apreensão constitui meio adequado para a retomada de veículo dado em garantia de financiamento, quando vislumbrado o inadimplemento no pagamento das prestações correspondentes. 2. Prescindindo o feito de dilação probatória, não há falar-se em cerceamento de defesa pelo julgamento antecipado da lide. 3. Constatado o descumprimento pelo réu das obrigações assumidas em contrato de financiamento para aquisição de veículo automotor, com cláusula de alienação fiduciária, acolhe-se o pedido de busca e apreensão do bem. 4. Verificado nos autos o nítido intento de uma das partes obstar a marcha regular do feito, correta a imposição de multa por litigância de má-fé. 5. Em não havendo condenação, a verba honorária deve ser arbitrada consoante apreciação eqüitativa do juiz, não merecendo reparo a sua fixação em percentual sobre o valor atribuído à causa. 6. Recurso improvido. Unânime (fls. 160-161). 412 SÚMULAS - PRECEDENTES Opostos embargos de declaração (fls. 172 a 177), foram rejeitados (fls. 183 a 185). Sustenta o recorrente contrariedade aos artigos 297, 300, 303 e 1.220 do Código de Processo Civil, aduzindo ser de 15 (quinze) dias o prazo para oferecer contestação na ação de alienação fiduciária, não de 03 (três) como disposto no artigo 3º, § 1º, do Decreto-Lei n. 911/1969. Alega violação do artigo 115 do Código Civil de 1916, tendo em vista a abusividade dos juros cobrados, bem como da comissão de permanência. Afirma que “o mesmo § 1º do art. 3º, do Decreto-Lei n. 911/1969 (que não é lei processual, mas norma de índole material), condiciona apresentação da defesa na Ação de Busca e Apreensão à comprovação do pagamento de 40% do valor financiado está implicitamente revogado pelo art. 6º, VI, do Codecon, que inclui dentre os direitos básicos do consumidor ‘a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos’” (fl. 193). Argúi negativa de vigência dos artigos 6º, inciso VI, e 53 do Código de Defesa do Consumidor e 146 do Código Civil de 1916, vez que são nulas as cláusulas que estabelecem a perda das parcelas pagas em caso de resolução do contrato. Colaciona julgado desta Corte em abono de sua tese. Sem contra-razões (fl. 200 verso), o recurso especial (fls. 187 a 197) foi admitido (fls. 203-204). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito (Relator): O banco recorrido ajuizou ação de busca e apreensão com base em contrato de financiamento no valor de R$ 8.195,04, a ser pago em 24 parcelas mensais e consecutivas, a primeira com vencimento para 15.02.1998, para aquisição de um automóvel, com alienação fiduciária; que desde a 2ª prestação o réu não cumpre com a obrigação, tendo sido feita notificação extrajudicial para a constituição em mora. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios julgou procedente o pedido, consolidando a posse do carro nas mãos do autor. Para a sentença o contrato é válido e não viola qualquer dispositivo legal tendo o autor prévio RSSTJ, a. 5, (21): 387-419, agosto 2011 413 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA conhecimento das cláusulas e condições, com oportunidade de buscar proposta mais vantajosa. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios, por maioria, deu provimento à apelação. Destacou o voto condutor do Desembargador Silvânio Barbosa que o réu não teve oportunidade de emendar a mora, mencionando precedente do próprio Tribunal sobre a derrogação pelo Código de Defesa do Consumidor da exigência do pagamento de 40% para esse efeito. Retornando os autos ao primeiro grau foi autorizada a purga da mora acrescido o valor dos honorários de advogado de R$ 300,00. Diante da impugnação, os autos foram remetidos ao contador. Nova impugnação do réu ao fundamento da ilegalidade da comissão de permanência, o que foi rejeitado, determinando o Juiz o depósito em cinco dias. Houve agravo de instrumento não conhecido, porque entendeu o Tribunal “que a insurgência contra cláusulas e valores ajustados devem ser deduzidos em ação própria e específica” (fl. 118). Os embargos de declaração foram rechaçados. A sentença julgou procedente o pedido. Afastou o Magistrado a declaração de ofício de nulidade absoluta das cláusulas contratuais abusivas, porque incabível a discussão nos termos do art. 3º, § 2º, do Decreto-Lei n. 911/1969. Rebateu as alegações de que não pagou as prestações atrasadas “pelo excesso do valor acrescido a título de mora de ‘pouco mais de um mês’ e dado às despesas efetuadas para sanar os defeitos mecânicos do veículo objeto da garantia” (fl. 119). Afirmou que a mora não foi emendada e que “o uso abusivo dos recursos judiciais com intenção manifestamente protelatória, já que permaneceu inerte quanto ao depósito, limitando-se a impugnar os valores mesmo ao arrepio de respaldo jurídico” (fl. 120) justifica a imposição da pena por litigância de má-fé, nos termos do art. 17, IV, do Código de Processo Civil. O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios negou provimento à apelação. Primeiro, rejeitou a alegação de não ser a ação a via própria para a pretensão do autor, porque o Decreto-Lei n. 911/1969 não foi recepcionado pela Constituição Federal; segundo, afastou a alegação de cerceamento de defesa diante do julgamento antecipado da lide, porque “a farta documentação permite o conhecimento amplo de todos os fatos de relevo para seu deslinde, não havendo aspectos cuja elucidação comportasse prova oral em audiência, e sendo de direito as questões mais relevantes” (fl. 164), confirmando que o réu dispôs de todas as oportunidades para se contrapor a pretensão do autor; no mérito, destacou que a primeira sentença foi cassada para acolher a postulação 414 SÚMULAS - PRECEDENTES do autor no sentido de purgar a mora, mesmo não tendo pago 40% do valor financiado, mas o réu nada fez, continuando a combater a inclusão da comissão de permanência e a alegar ser o contrato leonino; sobre a litigância de máfé concluiu que “as atitudes adotadas pelo recorrente nos autos nos levam à inarredável conclusão de que o mesmo impediu propositadamente a regular marcha do processo, principalmente quando se observa que a primeira sentença proferida nos autos foi cassada por esta egrégia Corte justamente para que fosse oportunizada ao recorrente a purga da mora. Contudo, retornando os autos, tal providência sequer foi adotada pelo recorrente, que voltou a alegar as mesmas questões antes deduzidas, tais como abusividade do contrato e ilegalidade na cobrança da comissão de permanência” (fl. 166); finalmente, manteve a verba honorária fixada na sentença em 15% sobre o valor final da causa. Os embargos de declaração foram rejeitados. A primeira alegação é sobre a derrogação do Decreto-Lei n. 911/1969 e merece ser repelida. A doutrina e a jurisprudência consideram não haver razão alguma para tanto. A Segunda Seção, por exemplo, firmou entendimento no sentido de que somente “pode purgar a mora, nos termos do artigo 3º, § 1º, do Decreto-Lei n. 911, de 1969, o devedor que já tiver pago 40% (quarenta por cento) do preço financiado”, afastando a alegação de que os artigos 6º, VI, e 53, caput, do Código de Defesa do Consumidor seriam entrave para isso (EREsp n. 129.732-RJ, Relator para o acórdão o Ministro Ari Pargendler, DJ de 1º.08.2000). Somente tal circunstância já desqualificaria a pretensão do réu de purgar a mora, mas o Tribunal local, sem recurso da parte contrária, conferiu-lhe oportunidade para tanto. Em segundo lugar, pretende o autor impugnar o acórdão recorrido no ponto de seu direito amplo à defesa, podendo deduzir qualquer matéria útil ao seu alegado direito, com invocação dos artigos 297 e 300, c.c. o 1.220, do Código de Processo Civil. Mas é insubsistente a argüição como formulada, porque o acórdão recorrido não cuidou dos dispositivos mencionados, que não se casam com a pretensão do réu sobre o tema, ainda mais quando posto no prazo para apresentação de contestação na ação sob o regime do Decreto-Lei n. 911/1969. O terceiro ataque vem pelo flanco da abusividade, mas o recorrente não consegue enfrentar concretamente esse ponto, limitando-se a informar que os encargos alcançam a cifra de 915,17% em momento de deflação. O acórdão recorrido, contudo, passou ao largo do ponto. E, ainda, o único aspecto objetivo da impugnação é com a comissão de permanência, que seria potestativa, ao RSSTJ, a. 5, (21): 387-419, agosto 2011 415 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA abrigo do art. 115 do Código Civil de 1916. Ademais, ainda que assim não fosse, o certo é que esta Corte já assentou que a comissão de permanência não é ilegal, podendo ser cobrada durante o período de inadimplência, não se aplicando aos contratos da espécie a limitação dos juros a 12% ao ano (REsp n. 271.214-RS, de que fui Relator para o acórdão, julgado em 12.03.2003; REsp n. 407.097-RS, Relator para o acórdão o Ministro Ari Pargendler, julgado em 12.03.2003; REsp n. 400.353-RS, Relator o Ministro Aldir Passarinho Junior, DJ de 20.05.2002). O quarto ponto é sobre a exigência de 40% para a purgação da mora, o que já vimos supra, foi decidido pela Segunda Seção. A menção aos artigos 145, V, e 146 do Código Civil de 1916 não tem força alguma, porque não foram os dispositivos tratados pelo acórdão recorrido. O mesmo vale para os artigos 300 a 303 do Código de Processo Civil. Finalmente, sobre a pena pela litigância de má-fé, o recorrente se agasalha no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor e na vulnerabilidade do consumidor, o que, por óbvio, não tem relação alguma com os fundamentos apresentados pelo Tribunal local para reconhecer a litigância de má-fé. Eu não conheço do especial. RECURSO ESPECIAL N. 567.890-MG (2003.0127663-2) Relator: Ministro Aldir Passarinho Junior Recorrente: Banco BMG S/A Advogado: Marcelo Portugal Torres e outros Recorrido: Érika Patrícia Ferreira Carvalho Advogado: Luzia Gomes Zevalhos Del Barco EMENTA Processual Civil. Alienação fiduciária. Purgação da mora. Impossibilidade, quando não pago ao menos 40% do preço financiado. Decreto-Lei n. 911/1969, art. 3º, parágrafo 1º. CDC. 416 SÚMULAS - PRECEDENTES I. Está sedimentado no Superior Tribunal de Justiça o entendimento de que a purgação da mora, em caso de contrato de alienação fiduciária, somente é possível se o devedor já houver pago pelo menos 40% (quarenta por cento) do preço financiado, desinfluentes, na espécie, as disposições do Código de Defesa do Consumidor, que não revogaram o art. 3º, parágrafo 1º, do DecretoLei n. 911/1969. II. Recurso especial conhecido e provido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade, conhecer do recurso especial e dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Barros Monteiro, Cesar Asfor Rocha e Fernando Gonçalves. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. Custas, como de lei. Brasília (DF), 18 de novembro de 2003 (data do julgamento). Ministro Aldir Passarinho Junior, Relator DJ 16.02.2004 RELATÓRIO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior: Banco BMG S.A. interpõe, pelas letras a e c do autorizador constitucional, recurso especial contra acórdão do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais, assim ementado (fl. 66): Agravo de instrumento. Busca e apreensão. Alienação fiduciária. Purgação da mora. Pagamento de menos de 40% do valor do contrato. Admissibilidade. O § 1º, do artigo 3º, do Decreto-Lei n. 911, de 1969, o qual prevê que purgação da mora somente pode ser feita após o pagamento de 40% (quarenta por cento) das prestações, encontra-se revogado pelos artigos 6º, inciso V e 53, do Código de Defesa do Consumidor. RSSTJ, a. 5, (21): 387-419, agosto 2011 417 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Alega o recorrente que o recorrido celebrou contrato de financiamento, com alienação fiduciária de veículo automotor; que a dívida era para ser paga em 36 parcelas, vencendo-se a primeira em setembro/2001 e a última em agosto/2004; que, todavia, desde março/2002 o devedor se acha inadimplente. Movida a ação de busca e apreensão, foi dada liminar, para depósito do bem com o autor e, após, citado o réu para contestar ou, se já pagos 40% do preço financiado, purgar a mora. Houve a apreensão do veículo, porém foi requerida a purgação da mora, inobstante pagos menos de 40% do preço e, apesar disso, o pedido foi atendido. Agravada a decisão, foi ela mantida pela Corte Estadual. Sustenta o recorrente que o acórdão a quo contrariou o art. 3º, parágrafo 1º, do Decreto-Lei n. 911/1969, bem assim os arts. 183 e 473 do CPC, pois o primeiro despacho sobre a purga da mora caso já pagos 40% da dívida restara precluso, daí não poder o juízo proferir, ulteriormente, a decisão para admitir a purgação em situação diversa. Invoca dissídio jurisprudencial. Sem contra-razões (fl. 115). O recurso especial foi admitido na instância de origem, pelo despacho presidencial de fls. 116-119. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Aldir Passarinho Junior (Relator): Trata-se de recurso especial em que se discute sobre a possibilidade de purgação da mora em ação de busca e apreensão, sem que houvesse o pagamento, pelo devedor, à época, de 40% do preço financiado. Independentemente da questão processual igualmente agitada pela recorrente, quanto à eventual preclusão ou não da decisão anterior, que autorizara a purgação condicionada ao pagamento de 40%, a matéria de fundo é pacífica no STJ. Tanto à luz da interpretação dada ao art. 3º, parágrafo 1º, do DecretoLei n. 911/1969, como em julgamento novamente procedido pela 2ª Seção, na oportunidade em que agitada a incidência do CDC, aquele Colegiado ratificou o entendimento anterior, no sentido da tese defendida pela recorrente, como se infere da ementa do REsp n. 129.732-RJ, verbis: 418 SÚMULAS - PRECEDENTES Alienação fiduciária. Decreto-Lei n. 911/1969. Código de Defesa do Consumidor. 1. Não tem apoio a interpretação que dá por revogado o § 1º do art. 3º do Decreto-Lei n. 911/1969 diante da disciplina do Código de Defesa do Consumidor, artigos 6º, VI, e 53. O art. 6º, VI, dispõe que o consumidor tem o direito básico de “efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos”. Ora, essa regra legal não tem nenhuma relação com a purgação da mora em processo sob o regime do Decreto-Lei n. 911/1969. O comando do art. 53, por outro lado, que faz alcançar as alienações fiduciárias, refere-se a cláusulas contratuais sobre a perda das prestações, que são nulas de pleno direito. Mas, aqui não se cuida de cláusula contratual, e, sim, de regra jurídica impondo que, nos casos abrangidos pela lei, lei, portanto, especial, a purgação só será admitida se quitado o percentual indicado. Isso não viola direito algum do consumidor, não sendo razoável concluir pela revogação de uma lei por violar a mens legis de lei posterior, o que, claramente, não existe no direito positivo brasileiro, por conta da Lei de Introdução ao Código Civil. 2. Recurso especial conhecido, mas improvido. (3ª Turma, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, unânime, DJU 03.05.1999). Assim, improcede a pleiteada purgação da mora, sendo desinfluentes, na espécie, os arts. 6º, VI e 53, do Código de Defesa do Consumidor. Ante o exposto, conheço do recurso especial e lhe dou provimento, para afastar a possibilidade de purgação da mora deferida pelas instâncias ordinárias. É como voto. RSSTJ, a. 5, (21): 387-419, agosto 2011 419 Súmula n. 285 SÚMULA N. 285 Nos contratos bancários posteriores ao Código de Defesa do Consumidor incide a multa moratória nele prevista. Referências: CDC, arts. 3º, § 2º, e 52, § 1º. Lei n. 9.298/1996. Decreto n. 22.626/1933. Precedentes: REsp 213.825-RS (4ª T, 22.08.2000 – DJ 27.11.2000) REsp 263.642-RS (3ª T, 30.05.2001 – DJ 20.08.2001) REsp 323.986-RS (3ª T, 28.08.2001 – DJ 1º.10.2001) REsp 388.572-MS (4ª T, 18.11.2003 – DJ 1º.12.2003) REsp 431.951-RS (3ª T, 22.05.2003 – DJ 18.08.2003) REsp 500.011-PR (3ª T, 21.10.2003 – DJ 10.11.2003) Segunda Seção, em 28.04.2004 DJ 13.05.2004, p. 201 RECURSO ESPECIAL N. 213.825-RS (99.0041288-5) Relator: Ministro Barros Monteiro Recorrente(s): Banco Itaú S/A Advogado(s): André Vidigal de Oliveira e outros Recorrido(s): Francisco Mallmann e outro Advogado(s): Maria Helena Ferreira Viegas e outro EMENTA Contrato de financiamento bancário. Nulidade de cláusulas. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor. Disciplina legal diversa quanto à taxa dos juros remuneratórios. - Tratando-se de empréstimo tomado por consumidor final, a operação creditícia realizada pelo banco submete-se às disposições do Código de Defesa do Consumidor, na qualidade de prestador de serviços especialmente contemplado no art. 3º, § 2º, do citado diploma legal. - Diversa é, porém, a disciplina legal tocante à taxa dos juros remuneratórios, área esta regida por legislação específica. Segundo assentou o C. Supremo Tribunal Federal, o Sistema Financeiro Nacional será regulado por lei complementar e, enquanto não advier esta, observar-se-á a legislação anterior à Constituição de 1988 (ADIn n. 4-DF). - Fundamentação distinta expendida a respeito pelos Srs. Ministro Cesar Asfor Rocha e Ruy Rosado de Aguiar. Recurso especial conhecido, em parte, e provido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas: Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha, que decide conhecer em parte do recurso e, nessa parte, dar-lhe provimento, sendo acompanhado pelos Srs. Ministros Ruy Rosado de Aguiar, SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Aldir Passarinho Junior e Sálvio de Figueiredo Teixeira, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, decide por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nessa parte, dar-lhe provimento, na forma do relatório e notas taquigrafias precedentes que integram o presente julgado. Brasília (DF), 22 de agosto de 2000 (data do julgamento). Ministro Ruy Rosado de Aguiar, Presidente Ministro Barros Monteiro, Relator DJ 27.11.2000 RELATÓRIO O Sr. Ministro Barros Monteiro: - Francisco Mallmann e Maria Lúcia Costa Cabral Mallmann ajuizaram ação ordinária de revisão de contrato de financiamento com garantia hipotecária contra o “Banco Itaú S/A”. O MM. Juiz de Direito julgou procedente, em parte, a ação “para declarar aplicável ao contrato de financiamento hipotecário a taxa de juros de 12% a.a., capitalizada anualmente, mais a atualização mensal pela remuneração básica da caderneta de poupança (TR), juros moratórios de 1% a.a., além de multa de 2%”. Declarou, ainda, nula a cláusula que prevê autorização irrevogável para o débito das prestações mensais em conta-corrente. A Décima Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por unanimidade, negou provimento ao apelo do banco em acórdão cujos fundamentos se resumem na seguinte ementa: Contratos bancários. Jurisprudência cimentada desta Câmara no sentido de que: a. o Código de Defesa do Consumidor aplica-se às relações com instituições financeiras; b. os juros estão limitados a 12% ao ano, senão pela autoaplicabilidade do art. 192, p. 3º da CF, em razão da vigência da Lei da Usura; c. salvo nas hipóteses de cédulas de crédito rural, industrial e comercial, regidas por legislação específica, aos demais contratos é vedada a capitalização de juros em periodicidade menor que a anual. Apelo improvido. (fls. 210). Inconformado, o banco manifestou o presente recurso especial com arrimo nas alíneas a e c do permissor constitucional, apontando negativa de vigência dos arts. 2º e 52, § 1º, da Lei n. 8.078/1990, 4º, IX, e 9º da Lei n. 4.595/1964, além 426 SÚMULAS - PRECEDENTES de divergência com a Súmula n. 596-STF, com julgados desta Casa e de outros Tribunais. Defendendo a legalidade da pactuação da taxa de juros acima de 12% ao ano, asseverou que o Dec. n. 22.626/1933 não se aplica às operações de crédito realizadas por instituições financeiras integrantes do Sistema Financeiro Nacional. De outro lado, defendeu a Inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor às referidas operações. Sem as contra-razões, o apelo extremo foi admitido na origem. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Barros Monteiro (Relator): - 1. Impugna a instituição financeira recorrente a aplicação das normas do Código de Defesa do Consumidor às operações bancárias, especificamente ao presente caso, em que se cuida de financiamento concedido a adquirentes de bem imóvel mediante garantia hipotecária. Sustenta o banco que, sendo impertinente à espécie o CDC, hão de prevalecer as cláusulas livremente estipuladas pelas partes, dentre elas: a) a que fixa os juros moratórios; b) a que prevê a multa de 10%; c) a que estabelece autorização para o débito em conta-corrente das prestações mensais. À exceção da temática relativa aos juros moratórios que será objeto de exame ao final deste, ao banco recursante desassiste razão em suas objeções concernentes à incidência do Código de Defesa do Consumidor à hipótese dos autos, motivo pelo qual, sendo este o único fundamento por ele apresentado a respeito, permanecem os comandos editados pela sentença quanto: a) à nulidade da cláusula que prevê autorização irrevogável do mutuário para débito em conta-corrente das parcelas mensais; b) à redução da multa a 2% (art. 52, § 1º, da Lei n. 8.078/1990). Isto porque, em princípio, tratando-se de mutuário que se dirigiu ao estabelecimento bancário a fim de obter financiamento para aquisição de bem imóvel, na qualidade, pois, de consumidor final, os bancos ficam submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor, como prestadores de serviços especialmente contemplados no art. 3º, § 2º, do mesmo diploma legal. Esta, por sinal, a jurisprudência predominante nesta Corte (REsp’s n. 57.974-0-RS, relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar; e n. 142.799-RS, relator Ministro Waldemar Zveiter). Essa, também, a opinião da doutrina. RSSTJ, a. 5, (21): 421-467, agosto 2011 427 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Confira-se o escólio de José Geraldo Brito Filomeno: Resta evidenciado, por outro lado, que as atividades desempenhadas pelas instituições financeiras, quer na prestação de serviços aos seus clientes (por exemplo, cobrança de contas de luz, água e outros serviços, ou então expedição de extratos etc), quer na concessão de mútuos ou financiamentos para a aquisição de bens, inserem-se igualmente no conceito amplo de serviços. Aliás, o Código fala expressamente em atividade de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, aqui se incluindo igualmente os planos de previdência privada em geral, além dos seguros propriamente ditos, de saúde etc. Para Fábio Ulhôa Coelho: “considera-se bancário o contrato cuja função econômica se relaciona com o conceito jurídico de atividade bancária, preceituado no art. 17 da Lei n. 4.595/1964. Por atividade bancária, entende-se a coleta, intermediação em moeda nacional ou estrangeira. Esse conceito abarca uma gama considerável de operações econômicas, ligadas direta ou indiretamente à concessão, circulação ou administração do crédito. Estabelecendo-se paralelo entre a atividade bancária e a industrial, pode-se afirmar que a matéria-prima do banco e o produto que ele oferece ao mercado é o crédito, ou seja, a instituição financeira dedica-se a captar recurso junto a clientes (operações passivas) para emprestá-los a outros clientes (operações ativas)”. E, mais adiante, esclarece que: “O contrato bancário pode ou não se sujeitar ao Código de Defesa do Consumidor, dependendo da natureza do vínculo obrigacional subjacente. O mútuo, por exemplo, será mercantil se o mutuário for exercente de atividade econômica, e os recursos obtidos a partir dele forem empregados na empresa. E será mútuo ao consumidor se o mutuário utilizarse dos recursos emprestados para finalidades particulares, como destinatário final. No desenvolvimento das operações atípicas, isto é, não relacionadas especificamente com o conceito de atividade bancária, como cobrança de títulos e recebimentos de tarifas e impostos, o banco age como prestador de serviços não somente para o cliente credor, mas direcionado a todos que procuram a agência simplesmente para realizar o pagamento. Em relação às operações típicas, como a aceitação de dinheiro em depósito, concessão do empréstimo bancário, aplicação financeira e outras, o banco presta serviço a clientes seus, podendo classificá-los (de acordo com conceitos próprios da atividade bancária, como o da reciprocidade) para fins de liberar tratamento preferencial ou atendimento especial a certas categorias de consumidores”. Também José Reinaldo da Lima Lopes acentua que: “É fora de dúvida que os serviços financeiros, bancários e securitários encontram-se sob as regras do Código de Defesa do Consumidor. Não só existe disposição expressa na Lei n. 8.078/1990 sobre o assunto (art. 3º, § 2º), como a história da defesa do consumidor o confirma, quando verificamos que a proteção aos tomadores de crédito ao consumo foi das primeiras a ser criada. De outro lado, nas relações das instituições financeiras com seus ‘clientes’ podem-se ver duas categorias de agentes: os tomadores de empréstimos (mutuários) e os investidores (depositantes)” (Código 428 SÚMULAS - PRECEDENTES Brasileiro de Defesa do Consumidor - Comentado pelos Autores do Anteprojeto, p. 45-46, 6ª ed.). Compartilham do mesmo pensamento Nelson Nery Júnior e José Cretella Júnior, ambos citados pelo Prof. Arruda Alvim, Thereza Alvim, Eduardo Arruda Alvim e James Marins no seu “Código do Consumidor Comentado”, p. 40, nota n. 28, 2ª ed., 2ª tiragem. Eduardo Gabriel Saad também considera que esse contrato de empréstimo bancário se submete às normas de proteção ao consumidor (Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, p. 107, 4ª ed. - LTr.). Ficam mantidas, portanto, as disposições da sentença, confirmada pelo v. acórdão, referentes aos dois itens supra referidos, atacados pelo recorrente. 2. Diversa é, todavia, a disciplina legal tocante às taxas dos juros remuneratórios, desde que se cuida aí de área regida por legislação própria e específica, não bastasse achar-se a taxa de juros atrelada à política monetária do Poder Executivo Federal. Além disso, essa matéria tratada pelo art. 192, § 3º, da Constituição Federal, está a depender de regulamentação através de lei complementar. É ler-se o decidido a respeito pelo Excelso Pretório quando do julgamento da ADIn n. 4-DF, de que foi relator o em. Ministro Sydney Sanches, no que ora interessa: (...) 6. Tendo a Constituição Federal, no único artigo em que trata do Sistema Financeiro Nacional (art. 192), estabelecido que este será regulado por lei complementar, com observância do que determinou no caput, nos seus incisos e parágrafos, não é de se admitir a eficácia imediata e isolada do disposto em seu parágrafo 3º, sobre taxa de juros reais (12% ao ano), até porque estes não foram conceituados. Só o tratamento global do Sistema Financeiro Nacional, na futura lei complementar, com a observância de todas as normas do caput, dos incisos e parágrafos do art. 192, é que permitirá a incidência da referida norma sobre juros reais e desde que estes também sejam conceituados em tal diploma. 7. Em conseqüência, não são inconstitucionais os atos normativos em questão (parecer da Consultoria-Geral da República, aprovado pela Presidência da República e circular do Banco Central), o primeiro considerando não autoaplicável a norma do parágrafo 3º sobre juros reais de 12% ao ano, e a segunda determinando a observância da legislação anterior à Constituição de 1988, até o advento da lei complementar reguladora do Sistema Financeiro Nacional (RTJ vol. 147, p. 720). RSSTJ, a. 5, (21): 421-467, agosto 2011 429 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Quanto a este aspecto, pacificou-se a jurisprudência no sentido de que não incide a Lei de Usura (Decreto n. 22.626, de 07.04.1933) quanto à taxa de juros, nas operações realizadas com instituições integrantes do sistema financeiro nacional, entendimento este que se cristalizou com a edição da Súmula n. 596 do C. Supremo Tribunal Federal. Confiram-se nesse sentido os julgados insertos nas RTJ’s 77/966 e 79/620. Nos dois julgados aludidos, a Suprema Corte assentou que os percentuais das taxas de juros se sujeitam unicamente aos limites fixados pelo Conselho Monetário Nacional. Nesta Casa, tem predominado a mesma orientação: REsp’s n. 4.285-RJ, relator Ministro Athos Carneiro; n. 5.212-SP, relator Ministro Dias Trindade; n. 19.294-SP, n. 26.9275-RS, n. 29.913-9-GO e n. 32.632-5-RS, por mim relatados; n. 158.508-RS, relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar; n. 122.776-RS, relator Ministro Costa Leite; n. 124.779-RS, relator Ministro Carlos Alberto; n. 128.911-RS, relator Ministro Waldemar Zveiter; n. 130.875-RS, relator Ministro Cesar Asfor Rocha. Assiste razão, por conseguinte, ao recorrente ao propugnar pela subsistência da taxa de juros remuneratórios tal como convencionada. Limitando-a ao teto estabelecido da denominada Lei de Usura, o acórdão recorrido afrontou o art. 4º, IX, da Lei n. 4.595/1964, bem como dissentiu do referido Verbete Sumular n. 596 e dos arestos desta Corte colacionados no REsp interposto. Quanto à taxa de juros moratórios (elevação em até 1% ao ano), não há o que modificar-se em face do disposto no art. 5º do Dec. n. 22.626/1933, conforme, por sinal, já teve ocasião de decidir esta Eg. Turma (REsp n. 169.285RS, de que fui relator). 3. Do quanto foi exposto, conheço, em parte, do recurso e, nessa parte, dou-lhe provimento, a fim de afastar o fundamento infraconstitucional oposto à cobrança dos juros remuneratórios na forma como pactuado entre as partes. Oportunamente, remetam-se os autos ao C. Supremo Tribunal Federal para apreciação do recurso extraordinário. É como voto. VOTO-VISTA Ementa: Recurso especial. Comercial. Instituição financeira. Contrato de financiamento. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos bancários. Juros remuneratórios. Abusividade inexistente. Juros moratórios. Pactuação em 1% a.m. Possibilidade. 430 SÚMULAS - PRECEDENTES - O Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/1990) é aplicável sobre todas as relações e contratos firmados entre as instituições financeiras e seus clientes, inclusive quanto às taxas de juros remuneratórios, desde que pactuada de forma abusiva. - Na hipótese, contudo, não se caracterizou a abusividade, pois a pactuação dos juros remuneratórios em 14,934% ao ano contém-se no círculo da razoabilidade, sem agredir os padrões da conjuntura econômica nacional, não sendo escorchantes para os mutuários. - Nos contratos de financiamento bancário, à míngua de legislação especial limitadora, devem prevalecer as taxas de juros moratórios pactuadas, na forma do artigo 1.062 do Código Civil, podendo alcançar até 1% ao mês. - Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, provido. O Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha: - 01. O eminente Ministro Barros Monteiro assim relatou o feito: Francisco Mallmann e Maria Lúcia Costa Cabral Mallmann ajuizaram ação ordinária de revisão de contrato de financiamento com garantia hipotecária contra o “Banco Itaú S/A”. O MM. Juiz de Direito julgou procedente, em parte, a ação “para declarar aplicável ao contrato de financiamento hipotecário a taxa de juros de 12% a.a., capitalizada anualmente, mais a atualização mensal pela remuneração básica da caderneta de poupança (TR), juros moratórios de 1% a.a., além de multa de 2%”. Declarou, ainda, nula a cláusula que prevê autorização irrevogável para o débito das prestações mensais em conta-corrente. A Décima Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por unanimidade, negou provimento ao apelo do banco em acórdão cujos fundamentos se resumem na seguinte ementa: Contratos bancários. Jurisprudência cimentada desta Câmara no sentido de que: a. o Código de Defesa do Consumidor aplica-se às relações com instituições financeiras; b. os juros estão limitados a 12% ao ano, senão pela auto-aplicabilidade do art. 192, p. 3o da CF, em razão da vigência da Lei da Usura; c. salvo nas hipóteses de cédulas de crédito rural, industrial e comercial, regidas por legislação específica, aos demais contratos é vedada a capitalização de juros em periodicidade menor que a anual. Apelo improvido. (fl. 210). RSSTJ, a. 5, (21): 421-467, agosto 2011 431 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Inconformado, o banco manifestou o presente recurso especial com arrimo nas alíneas a e c do permissor constitucional, apontando negativa de vigência dos arts. 2º e 52, § 1º, da Lei n. 8.078/1990, 4º, IX, e 9º da Lei n. 4.595/1964, além de divergência com a Súmula n. 596-STF, com julgados desta Casa e de outros Tribunais. Defendendo a legalidade da pactuação da taxa de juros acima de 12% ao ano, asseverou que o Dec. n. 22.626/1933 não se aplica às operações de crédito realizadas por instituições financeiras integrantes do Sistema Financeiro Nacional. De outro lado, defendeu a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor às referidas operações. O ilustrado Ministro Relator, em primoroso voto, como de hábito, afastou o conhecimento do recurso pela alegada violação aos arts. 2º e 52, § 1º, da Lei n. 8.078/1990, dele conhecendo parcialmente apenas e, nessa parte, dandolhe provimento, a fim de afastar o fundamento infraconstitucional oposto à cobrança dos juros remuneratórios na forma como pactuado entre as partes. Citando o escólio de renomada doutrina, o eminente Ministro Barros Monteiro entendeu aplicável o Código de Defesa do Consumidor ao contrato de financiamento com garantia hipotecária em exame, fazendo as seguintes judiciosas considerações: À exceção da temática relativa aos juros moratórios que será objeto de exame ao final deste, ao banco recursante desassiste razão em suas objeções concernentes à incidência do Código de Defesa do Consumidor à hipótese dos autos, motivo pelo qual, sendo este o único fundamento por ele apresentado a respeito, permanecem os comandos editados pela sentença quanto: a) à nulidade da cláusula que prevê autorização irrevogável do mutuário para débito em contacorrente das parcelas mensais; b) à redução da multa a 2% (art. 52, § 1º, da Lei n. 8.078/1990). Isto porque, em princípio, tratando-se de mutuário que se dirigiu ao estabelecimento bancário a fim de obter financiamento para aquisição de bem imóvel, na qualidade, pois, de consumidor final, os bancos ficam submetidos às disposições do Código de Defesa do Consumidor, como prestadores de serviços especialmente contemplados no art. 3º § 2º, do mesmo diploma legal. Esta, por sinal, a jurisprudência predominante nesta Corte (REsp’s n. 57.974-0-RS, relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar; e n. 142.799-RS, relator Ministro Waldemar Zveiter). Destarte, o Sr. Ministro Barros Monteiro não conheceu do recurso nos pontos em que o r. aresto recorrido deu pela nulidade da cláusula que prevê a autorização irrevogável do mutuário para débito em conta das parcelas mensais, assim como no que reduziu a multa a 2%, tendo assim, nesses tópicos, por aplicável o Código de Defesa do Consumidor. 432 SÚMULAS - PRECEDENTES De maneira diferente entendeu o insigne Relator quanto às taxas de juros remuneratórios, às quais considerou inaplicáveis as regras da Lei n. 8.078/1990, sob o seguinte fundamento, verbis: Diversa é, todavia, a disciplina legal tocante às taxas dos juros remuneratórios, desde que se cuida aí de campo regido por legislação específica (Lei n. 4.595, de 31.12.1964). Daí por que não se lhe aplicam os preceitos genéricos do Código de Defesa do Consumidor. Nesse aspecto, pacificou-se a jurisprudência no sentido de que não incide a Lei de Usura (Decreto n. 22.626, de 07.04.1933) quanto à taxa de juros, nas operações realizadas com instituições integrantes do Sistema Financeiro Nacional, entendimento este que se cristalizou com a edição da Súmula n. 596 do C. Supremo Tribunal Federal. Confiram-se nesse sentido os julgados insertos nas RTJ’s 77/966 e 79/620. Nos dois julgados aludidos, a Suprema Corte assentou que os percentuais das taxas de juros se sujeitam unicamente aos limites fixados pelo Conselho Monetário Nacional. Nesta Casa, tem predominado a mesma orientação: REsp’s n. 4.285-RJ, relator Ministro Athos Carneiro; n. 5.212-SP, relator Ministro Dias Trindade; n. 19.294-SP, n. 26.927-5-RS, n. 29.913-9-GO e n. 32.6325-RS, por mim relatados; n. 158.508-RS, relator Ministro Ruy Rosado de Aguiar; n. 122.776-RS, relator Ministro Costa Leite; n. 124.779-RS, relator Ministro Carlos Alberto; n. 128.911-RS, relator Ministro Waldemar Zveiter; n. 130.875-RS, relator Ministro Cesar Asfor Rocha. Assiste razão, por conseguinte, ao recorrente ao propugnar pela subsistência da taxa de juros remuneratórios tal como convencionada. Limitando-a ao teto estabelecido da denominada Lei de Usura, o acórdão recorrido afrontou o art. 4o, IX, da Lei n. 4.595/1964, bem como dissentiu do referido Verbete Sumular n. 596 e dos arestos desta Corte colacionados no REsp interposto. Com efeito, o ilustre Ministro Relator deu por válida a pactuacão referente aos juros remuneratórios, que no caso foi à taxa de 14,934% ao ano, entendendo ter aplicação exclusiva a Lei n. 4.595/1964. 02. Pedi vista dos autos para melhor exame da matéria, após o que de logo registro que no tocante à aplicação do Código de Defesa do Consumidor, acompanho Sua Excelência, por entender que aquele diploma legal incide sobre todas as relações e contratos pactuados pelas instituições financeiras e seus clientes e não apenas na parte relativa à expedição de talonários, fornecimento de extratos, cobrança de contas, guarda de bens e outros serviços afins. O próprio Código de Defesa do Consumidor se ocupa em trazer as definições de consumidor, fornecedor, produto e serviço, para efeito de sua incidência nas relações consideradas como de consumo, verbis: RSSTJ, a. 5, (21): 421-467, agosto 2011 433 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo. Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. § 1º Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial. § 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. A lei é suficientemente clara ao definir o que sejam consumidores e fornecedores de produtos e serviços, enquadrando-se perfeitamente nesses conceitos as instituições financeiras. As relações existentes entre os clientes e o banco apresentam nítidos contornos de uma relação de consumo, inclusive nos contratos bancários de financiamento, de forma a se concluir que o Código de Defesa do Consumidor aplica-se a todos os contratos bancários. 03. Como decorrência, ouso dissentir, data maxima venia, tão-somente na parte em que o eminente Relator considerou que as regras genéricas do CDC não se aplicam às taxas dos juros remuneratórios praticadas pelos bancos, porque regida a sua limitação pela Lei n. 4.595/1964, de natureza específica. E o faço com fulcro nos fundamentos a seguir expostos. É ponto pacífico nesta Corte que a limitação das taxas de juros remuneratórios prevista no Decreto n. 22.626/1933 foi revogada com a edição do artigo 4º, inciso IX, da Lei n. 4.595/1964, nas operações realizadas por instituições financeiras, ressalvadas as hipóteses de legislação especial. Todavia, considero que, em face da edição da Resolução n. 1.064/1985, do Bacen, autorizando que “as operações ativas dos bancos comerciais, de investimento e de desenvolvimento serão realizadas a taxas de juros livremente pactuáveis”, a estipulação das taxas de juros remuneratórios ficou a exclusivo critério das instituições financeiras, que estariam absolutamente livres para praticar a cobrança de juros remuneratórios da maneira que melhor lhes aprouver, sujeitando os consumidores ao seu exclusivo arbítrio. 434 SÚMULAS - PRECEDENTES Afirmo que estariam livres porque, a teor do regramento insculpido no art. 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor, toda cláusula que apresente abusividade, trazendo iniqüidade em prejuízo ao consumidor, afigura-se nula de pleno direito. Desta forma, todas as vezes em que a contratação dos juros remuneratórios se apresente excessivamente onerosa, em percentual caracterizadamente abusivo, por extrapolar dos padrões da conjuntura econômica pátria, à qual devemos estar atentos, pode e deve ser aplicada a norma protetora do consumidor, com o fito de coibir-se intoleráveis abusos por parte das instituições financeiras. Assim, a estipulação de aludido percentual não pode ser imposta de forma assim tão desabrida, devendo se estabelecer uma convivência harmônica entre a liberdade conferida pela Lei n. 4.595/1964 e a razoabilidade extraída pelo Código de Defesa do Consumidor, para impedir a cobrança de taxas abusivas. 04. Na presente hipótese, entretanto, restou assentado na r. sentença que os juros remuneratórios foram fixados em 14,934% ao ano, ou 1,2445% ao mês, portanto, dentro de um patamar razoável, apto a remunerar o banco mutuante, sem onerar em demasia o consumidor, razão pela qual o art. 51 do CDC não incide na espécie, apenas quanto aos juros remuneratórios. O caso em análise configura perfeitamente a possibilidade de haver harmoniosa convivência entre a tese pacificamente assentada nesta Corte, de que a limitação dos juros remuneratórios na taxa de 12% ao ano estabelecida pela Lei da Usura não se aplica às operações realizadas pelas instituições do Sistema Financeiro, em face da prevalência da liberdade conferida pela Lei 1º n. 4.595/1964, com a que agora explicitamente externei, de se dar aplicação do CDC sobre todas as relações e contratos pactuados pelas instituições financeiras e seus clientes, inclusive quanto às taxas de juros remuneratórios, porque na hipótese se contém no círculo da razoabilidade a pactuação desses juros em 14,934% ao ano, que não agride os padrões da conjuntura econômica nacional, não sendo escorchantes para os mutuários. Observo que esta é a primeira vez que estou a examinar como pode se dar a convivência do Código de Defesa do Consumidor com a Lei de Usura e a Lei do Sistema Financeiro Nacional (Lei n. 4.595/1964). 05. Por derradeiro, no pertinente aos juros moratórios, o ilustre Min. Barros Monteiro manteve a limitação em 1% ao ano imposta pelo Tribunal de origem, nos seguintes termos, verbis: RSSTJ, a. 5, (21): 421-467, agosto 2011 435 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Quanto à taxa de juros moratórios (elevação em até 1% ao ano), não há o que modificar-se em face do disposto no art. 5º do Dec. n. 22.626/1933, conforme, por sinal, já teve ocasião de decidir esta Eg. Turma (REsp n. 169.285-RS, de que fui relator). Observo, todavia, novamente pedindo a mais respeitosa vênia ao eminente Relator, que o precedente indicado efetivamente limita os juros moratórios em 1% ao ano, com base no que disposto no art. 5º da Lei de Usura, mas o faz levando em consideração que os juros de mora já estavam pactuados em 1% ao ano, havendo, também, a previsão de cobrança da multa moratória e comissão de permanência, após o inadimplemento. Sendo assim, haveria uma tripla penalização do devedor em razão da cumulação das três parcelas, após a mora, o que não se admitiu naquela hipótese. Ademais, no que tange à taxa de juros moratórios, verifico a existência de precedentes de ambas as Turmas componentes da Seção de Direito Privado desta Corte, no sentido de que, à míngua de legislação especial restringindo a elevação das taxas dos juros remuneratórios em caso de mora, a exemplo dos créditos rural, comercial e industrial, devem prevalecer as taxas de juros de mora pactuadas, nos demais contratos de empréstimo bancário, em obediência aos artigos 1.062 e 1.262 do Código Civil, podendo as mesmas alcançar o patamar de 12% ao ano. Confira-se, a propósito, os seguintes acórdãos, cujas ementas transcrevo, no que interessa: Juros moratórios. Contrato de abertura de crédito. Questão dos juros remuneratórios resolvida com fundamento exclusivamente constitucional. Aplicação da Súmula n. 596-STF quanto aos juros moratórios, fixados em 1% a.m., à falta de lei limitadora. Recurso conhecido em parte e nessa parte provido. (REsp n. 169.300-RS, Relator o eminente Ministro Ruy Rosado de Aguiar, DJ 28.09.1998). Recurso especial assentado em dissídio jurisprudencial. Contrato de abertura de crédito. Limitação da taxa de juros. Capitalização dos juros. Juros de mora. Súmulas n. 596 e n. 121-STF. (... omissis ...) 3. No mútuo bancário comum, havendo convenção entre as partes, os juros moratórios podem alcançar 12% ao ano, na forma do artigo 1.062 do Código Civil. 4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, provido. (REsp n. 160.692-RS, relator o eminente Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, DJ de 29.03.1999). No mesmo sentido, os REsps n. 180.275-RS e n. 111.181-SC, Relator o eminente Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, DJs 07.06.1999 e 19.12.1997; 436 SÚMULAS - PRECEDENTES e REsp n. 208.838-RS, Relator o eminente Ministro Ruy Rosado de Aguiar, DJ 07.02.2000. Veja-se, ainda, as recentes decisões monocráticas: REsp n. 218.368-RS, Relator o eminente Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 14.10.1999; REsp n. 232.356-RS, Relator o eminente Ministro Eduardo Ribeiro, DJ 23.11.1999; e REsp n. 219.097, Relator o eminente Ministro Ari Pargendler, DJ 15.10.1999. Extrai-se dos autos que as partes expressamente pactuaram os juros moratórios à taxa de 1% ao mês, de forma que conheço do recurso também nessa parte, para permitir a cobrança na forma em que contratada. Diante de tais pressupostos, conheço parcialmente do recurso e, nessa parte, dou-lhe provimento, a fim de afastar o fundamento infraconstitucional oposto à cobrança dos juros remuneratórios na forma como pactuado entre as partes, isto é, de 14,934% ao ano, por não agredir o Código de Defesa do Consumidor, bem como para permitir a cobrança dos juros moratórios na forma contratada, ou seja, a taxa de 1% ao mês. É como voto. VOTO O Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar (Presidente): - Com a devida vênia, acompanho o voto do Sr. Ministro Relator quanto à sua conclusão, mas pelos fundamentos do Sr. Ministro Cesar Asfor Rocha. VOTO O Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira: Acompanho os votos precedentes, em suas conclusões. RECURSO ESPECIAL N. 263.642-RS (2000.0060244-2) Relator: Ministro Carlos Alberto Menezes Direito Recorrente: Banco Bilbao Vizcaya Brasil S/A - sucessor RSSTJ, a. 5, (21): 421-467, agosto 2011 437 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Advogado: Maria Terezinha Romero e outros Recorrido: Andre Motta Ribeiro Advogado: Silvia Leticia Tormes Prina e outros EMENTA Ação de revisão de cédula de crédito comercial. Alienação fiduciária. Ação de busca e apreensão. Precedentes da Corte. 1. Nas cédulas de crédito comercial a jurisprudência da Corte assentou: a) os juros estão limitados a 12% ao ano, nos termos do art. 5º do Decreto-Lei n. 413/1969; b) é possível a cobrança da comissão de permanência, desde que não cumulada com a correção monetária; c) é permitido o pacto de capitalização dos juros. 2. Não apontado qualquer dispositivo de Lei Federal não se pode examinar a configuração da mora. 3. Não prequestionado o art. 1.058 do Código Civil, não passa o especial na parte da possibilidade de revisão contratual. 4. A jurisprudência da Corte admite a incidência do Código de Defesa do Consumidor em casos como o presente. 5. Recurso especial conhecido e provido, em parte. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso especial e lhe dar parcial provimento. Os Srs. Ministros Nancy Andrighi, Antônio de Pádua Ribeiro e Ari Pargendler votaram com o Sr. Ministro Relator. Brasília (DF), 30 de maio de 2001 (data do julgamento). Ministro Ari Pargendler, Presidente Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Relator DJ 20.08.2001 438 SÚMULAS - PRECEDENTES RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito: Banco Bilbao Vizcaya S/A, sucessor de Banco Excel Econômico S/A interpõe recurso especial, com fundamento na alínea a, do permissivo constitucional, contra Acórdão da 14ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, assim ementado: Alienação fiduciária. Ação de revisão de cláusulas contratuais conexa a ação de busca. Preliminar de cerceamento de defesa afastada. Litigância de má-fé inaplicada. Possibilidade da revisão ante o princípio da relatividade do contrato, prevalecente sobre o princípio do pacta sunt servanda, a fim de assegurar a real concretização dos conceitos norteadores do equilíbrio da relação contratual, como da liberdade e da igualdade entre as partes. LIMITAÇÃO DOS JUROS. Reconhecida a abusividade na cláusula que estabelece juros, em verdadeiro contrato de adesão, é de ser declarada sua nulidade. Inteligência do art. 51, IV, do CDC e de regras legais sobre juros. CAPITALIZAÇÃO. Os juros devem ser capitalizados semestralmente, tratando-se de cédula de crédito comercial (art. 5º da Lei n. 6.840/1980 c.c. o art. 5º do Decreto n. 413/1969). COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. Nula é a cláusula que prevê o pagamento de comissão de permanência, por infringir a regra do art. 115 do Código Civil, devendo ser afastada de ofício. Aplicação do disposto no art. 51, IV, do CDC. AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO. Ante a onerosidade excessiva das cláusulas contratuais, não se constituiu validamente a mora. Carência da ação. 1ª APELAÇÃO PROVIDA PARCIALMENTE. 2a APELAÇÃO PREJUDICADA. (fl. 118). Sustenta o recorrente a legalidade da cobrança da comissão de permanência, pois foi pactuada pelas partes, seguindo os índices do mercado financeiro. RSSTJ, a. 5, (21): 421-467, agosto 2011 439 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Argüiu contrariedade ao art. 1.058 do Código Civil, pois não ocorreu caso fortuito ou força maior para justificar a revisão contratual, devendo ser mantido o pactuado. Alega ser inaplicável o Código de Defesa do Consumidor nas operações bancárias, por não se configurar relação de consumo. Aduz violação ao art. 4º da Lei n. 4.595/1964, haja vista que as taxas de juros praticadas pelas instituições financeiras não estão sujeitas ao limite previsto na Lei de Usura, sendo reguladas pelo Conselho Monetário Nacional. Afirma ser possível a capitalização mensal de juros quando expressamente pactuada, entendimento pacificado pela Súmula n. 93-STJ. Sustenta que o ora recorrido não cumpriu suas obrigações contratuais, estando caracterizada a mora, condição para a ação de busca e apreensão, nos termos do art. 2º, § 2º, do Decreto-Lei n. 911/1969. Aponta dissídio jurisprudencial, trazendo à colação julgados, também, desta Corte. Sem contra-razões (fl. 149), o recurso especial não foi admitido (fls. 156 a 161). Provido agravo de instrumento, determinou-se sua conversão em recurso especial (fls. 174-175). Houve recurso extraordinário (fls. 160 a 165), inadmitido (fls. 156 a 161), tendo sido interposto agravo de instrumento contra esta decisão (fl. 170). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito (Relator): Ação de busca e apreensão ajuizada pelo recorrente, tendo sido deferida a medida liminar, e ação ordinária ajuizada pelo recorrido. A sentença julgou improcedente a ação ordinária e procedente a ação de busca e apreensão. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul inverteu o julgamento ao decidir que os juros são limitados, que a capitalização é semestral, tratando-se de cédula de crédito comercial e que é nula a cláusula que prevê a comissão de permanência. Diante da onerosidade do contrato afastou a mora e julgou o autor da busca e apreensão carecedor da ação. 440 SÚMULAS - PRECEDENTES O acórdão recorrido dá conta que o autor assinou “contrato de operação de crédito, fundada em cédula de crédito comercial, para adquirir um automóvel Hyundai Accent”. Trata-se, portanto, de débito resultante de cédula de crédito comercial subordinada ao Decreto-Lei n. 413/1969. No especial, o recorrente destaca que a sentença assinalou que o bem já havia sido vendido a terceiro, não mais estando na posse do recorrido. O primeiro combate é sobre a comissão de permanência. E tem razão o recorrente. A comissão de permanência não malfere, como pretende o acórdão recorrido o art. 115 do Código Civil. Já assentou a Corte que desde que não cumulada com a correção monetária (Súmula n. 30 da Corte) é possível a sua cobrança: REsp n. 218.030-RS, da minha relatoria, DJ de 26.06.2000; REsp n. 235.378-SP, da minha relatoria, DJ de 05.06.2000; REsp n. 226.752-PR, da minha relatoria, DJ de 27.03.2000. O segundo combate é sobre a possibilidade de revisão contratual, amparado no art. 1.058 do Código Civil. Falta, contudo, o devido prequestionamento no ponto. O terceiro combate é sobre a incidência do Código de Defesa do Consumidor. Mas, não tem razão o recorrente. Trata-se de financiamento para compra de veículo, estando a relação entre o financiado e o financiador, instituição financeira, sob a égide do Código de Defesa do Consumidor. A Corte já afirmou que os bancos são prestadores de serviço e como tal estão ao alcance do art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor: REsp n. 57.974-RS, Relator o Senhor Ministro Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 29.05.1995; REsp n. 142.799-RS, Relator o Senhor Ministro Waldemar Zveiter, DJ de 14.12.1998. Aplica-se, portanto, a Súmula n. 83 da Corte. O que está pendente de pacificação é a incidência do Código nas relações decorrentes da aplicação financeira em caderneta de poupança. O quarto combate é sobre a limitação dos juros. A revisão é da cédula de crédito comercial, figurando no título a taxa de juros de 44,50% ao ano. O recorrente quer a liberação da taxa com apoio na Sumula n. 596 do Supremo Tribunal Federal. Ocorre que a Corte estabeleceu que a taxa de juros nas cédulas de crédito comercial está limitada a 12% ao ano, uniformizando o entendimento no âmbito da 2ª Seção, ao fundamento da falta de autorização do Conselho Monetário Nacional para a cobrança de taxas superiores, nos termos do art. 5º do Decreto-Lei n. 413/1969, afastando a liberação consolidada na Súmula n. 596 do Colendo Supremo Tribunal Federal; REsp n. 111.881-RS, da minha RSSTJ, a. 5, (21): 421-467, agosto 2011 441 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA relatoria, DJ de 16.02.1998; REsp n. 156.785-RS, Relator o Senhor Ministro Cesar Asfor Rocha, DJ de 21.02.2000. Não há, portanto, chance de êxito. Está presente, assim, a Súmula n. 83 da Corte. O quinto combate é sobre a capitalização dos juros. Aqui tem razão o banco recorrente. Já assentou a Corte que nas cédulas de crédito comercial admite-se o pacto de capitalização de juros (Súmula n. 93), não havendo fundamento para a sua limitação semestral: REsp n. 156.785-RS, Relator o Senhor Ministro Cesar Asfor Rocha, DJ de 21.02.2000; REsp n. 100.512-RS, Relator o Senhor Ministro Waldemar Zveiter, DJ de 21.02.2000. Finalmente, apresenta o especial a questão da mora na ação de busca e apreensão. Mas, com todo respeito, neste ponto o especial não apontou qualquer contrariedade a dispositivo de Lei Federal, salvo a genérica afirmação de que a ação de busca e apreensão está “em plena conformidade com os ditames do DL n. 911/1969, motivo pelo qual deve ser mantida a decisão de primeiro grau, que entendeu pela sua total procedência”. Em conclusão: eu conheço do especial, em parte, e, nessa parte, doulhe provimento para autorizar a cobrança da comissão de permanência não cumulada com a correção monetária e a capitalização na forma pactuada. RECURSO ESPECIAL N. 323.986-RS (2001.0060353-9) Relatora: Ministra Nancy Andrighi Recorrente: Banco Fiat S/A Advogado: Adriana Bitencourt Bertollo e outros Recorrido: Ina Helena da Silva Bueno Advogado: José Odilon M Vitola EMENTA Direito Comercial e Econômico. Recurso especial. Alienação fiduciária. CDC. Aplicabilidade. Juros. Limitação. Cédula de crédito industrial. Capitalização. 442 SÚMULAS - PRECEDENTES A atividade bancária de conceder financiamento e obter garantia mediante alienação fiduciária sujeita-se às normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor, no que couber, convivendo este estatuto harmoniosamente com a disciplina do Decreto-Lei n. 911/1969. Às cédulas de crédito comercial aplica-se a limitação de 12% ao ano prevista na Lei de Usura. Se a pretensão do recorrente quanto a capitalização mensal dos juros depende da análise das cláusulas contratuais para atestar sua estipulação, inviável se afigura o Recurso Especial. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, não conhecer do recurso especial. Os Srs. Ministros Antônio de Pádua Ribeiro, Ari Pargendler e Carlos Alberto Menezes Direito votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Ministro Castro Filho. Brasília (DF), 28 de agosto de 2001 (data do julgamento). Ministro Ari Pargendler, Presidente Ministra Nancy Andrighi, Relatora DJ 1º.10.2001 RELATÓRIO A Sra. Ministra Nancy Andrighi: Cuida-se de Recurso Especial interposto por Banco Fiat S/A, com espeque no art. 105, III, alíneas a e c contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande. O ora recorrido propôs ação de conhecimento sob o rito ordinário em face do recorrente, com o fito de revisar cláusulas atinentes a contrato de financiamento garantido por alienação fiduciária, ao argumento de cobrança excessiva de juros e demais encargos. O pedido daquela ação foi julgado procedente para “determinar a revisão do contrato, com a exclusão dos juros que excederem a 12% a.a., com a exclusão RSSTJ, a. 5, (21): 421-467, agosto 2011 443 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA da capitalização e parcelas dela decorrentes, e apuração do saldo devedor, considerados os valores depositados no feito”. Inconformado, o recorrente apelou ao eg. Tribunal a quo. O v. acórdão restou assim ementado: Alienação fiduciária. Ação revisional. Cédula de crédito comercial. Procedência da revisional, com a possibilidade de revisão e aplicação do CDC. A taxa de juros está limitada a 12% ao ano, quer no plano constitucional, quer no infraconstitucional. Capitalização semestral dos juros. A compensação e ou devolução dos valores pagos a maior se impõe, ante a procedência da demanda e reconhecimento da exigência de encargos abusivos ou ilegais. Distribuição dos encargos sucumbenciais mantida. Afirma o recorrente que o acórdão recorrido: a) contrariou o disposto no Decreto-Lei n. 22.626/1933 ao limitar os juros em 12% ao ano; b) hostilizou o art. 4º, inc. IX, da Lei n. 4.595/1964 porque cabe ao Conselho Monetário Nacional limitar as taxas de juros, até que advenha a lei regulamentadora do art. 192, § 3º da CF/1988, norma esta não auto-aplicável; c) divergiu da jurisprudência de outro Tribunal quanto à periodicidade da capitalização de juros; d) afrontou a Lei n. 8.078/1990, por incabível à espécie, o que infirma a revisão contratual, inexistindo valores a serem devolvidos ou compensados; Ressalta que o art. 52 do CDC voltou-se, única e exclusivamente ao crédito direto ao consumo, não abrangendo as atividades bancárias, sendo que apenas a vendedora do veículo poderia ser considerada fornecedora; e) não são abusivos os juros contratados; f ) o STF já sumulou o entendimento de que a limitação instituída pela Lei da Usura é inaplicável às instituições financeiras (Súmula n. 596); g) merece reforma quanto à capitalização dos juros que deve ser mensal e não semestral como determinado; 444 SÚMULAS - PRECEDENTES Requer, por fim, para que sejam invertidos os ônus sucumbenciais. Contra-razões às fls. 183-194. É o relatório. VOTO A Sra. Ministra Nancy Andrighi (Relatora): A insurgência do agravante arrima-se na sujeição das instituições bancárias às disposições do CDC, à limitação da taxa de juros a 12% ao ano e à capitalização semestral dos juros. No que guarda pertinência com a limitação da taxa de juros, a Lei n. 4.595/1964 preceitua, em seu art. 4º, IX, ser da competência do Conselho Monetário Nacional a limitação, sempre que necessário, das taxas de juros, descontos, comissões e qualquer outra forma de remuneração de operações e serviços bancários e financeiros, inclusive os prestados pelo Banco Central do Brasil. Com o advento da referida lei, regulando especialmente o Sistema Financeiro Nacional, afastou-se a incidência do Decreto n. 22.626/1933 no tocante à limitação da taxa de juros a 12% ao ano, conforme dispõe o caput de seu artigo 1º. Dessa forma, a limitação imposta pelo referido decreto não se aplica às taxas de juros cobradas pelas instituições bancárias. As discussões jurídicas acerca do tema, já analisadas pelo Excelso Pretório, foram pacificadas e consubstanciaram-se no Enunciado Sumular n. 596 do Supremo Tribunal Federal, que assim dispõe: “As disposições do Decreto n. 22.626/1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o Sistema Financeiro Nacional”. Este entendimento todavia não se aplica a hipótese de cédula de crédito comercial que é regida por legislação específica. Pelo teor do art. 5º do DL n. 413/1969, e posterior disciplina da Lei n. 6.840/1980, estando a cargo do Conselho Monetário Nacional fixar as taxas de juros aplicáveis aos títulos de crédito comercial mas, omitindo-se este em tal mister, incide a regra do art. 1º da Lei de Usura que detém os juros limitados à 12% a.a. Registrem-se, neste sentido os seguintes julgados: REsp n. 223.746-SP, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ 29.11.1999; REsp n. 120.186-RS, Rel. RSSTJ, a. 5, (21): 421-467, agosto 2011 445 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Min. Aldir Passarinho Júnior, DJ: 20.09.1999: REsp n. 204.856-RS, REsp n. 132.986-SC; DJ: 10.11.1997, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Rel. Min. Barros Monteiro, DJ: 13.09.1999. Este último com a ementa seguinte: Cédula de crédito comercial. Taxa de juros. Limitação. 1. A cédula de crédito comercial, no tocante à limitação dos juros, tem a mesma disciplina da cédula de crédito rural (art. 5º da Lei n. 6.840, de 03.11.1980, c.c. o art. 5º do Dec. Lei n. 413, de 09.01.1969). À míngua de fixação pelo Conselho Monetário Nacional, incide a limitação de 12% ao ano prevista no Dec. n. 22.626/1933 (Lei de Usura). Precedentes da 2ª Seção e da C. Terceira Turma. 2. Inadmite-se a capitalização mensal dos juros, uma vez não expressamente pactuada. É descabida, em sede de recurso especial, a interpretação de cláusula contratual, para daí inferir-se a pactuação da pretendida capitalização mensal dos juros. Recurso especial não conhecido. Portanto, o v. acórdão recorrido, ao limitar a taxa de juros em 12% ao ano em cédula de crédito comercial, ainda que por outro fundamento, decidiu em consonância com a jurisprudência pacífica deste C. STJ. Pela interpretação do art. 3º, § 2º, do CDC, constata-se que as instituições bancárias estão elencadas no rol das pessoas de direito consideradas como fornecedoras, para fim de aplicação do Código de Defesa do Consumidor às relações entre essas e os consumidores, no caso, correntistas e mutuários. Esse é o entendimento assente nesta Corte. Registrem-se, nesse sentido, o Recurso Especial n. 57.974, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 29.05.1995 e o Recurso Especial n. 175.795, Rel. Min. Waldemar Zveiter, DJ de 10.05.1999. A hipótese analisada é de contrato bancário, em que o objeto do consumo é o papel-moeda, o financiamento. Havendo, pois, prestação de serviços realizado pelo banco submete-se às disposições do Código de Defesa do Consumidor (art. 3º, § 2º) naquilo que couber pois, este estatuto tem aplicação harmônica com o Dec. Lei n. 911/1969, que permanece em vigor nas especialidades que encerra. Há que se lembrar, outrossim, que a compra e venda do veículo deu-se gravado com ônus de penhor cedular constituído a favor do Banco Fiat S/A, na forma de cédula de crédito comercial. 446 SÚMULAS - PRECEDENTES ANTÔNIO CARLOS EFING1, em monografia sobre o tema, leciona que: (...) mesmo em se tratando de título de crédito, aplicando-se-lhe as normas de direito cambial comum para as hipóteses de inadimplência, segundo o disposto pelo art. 52 do Decreto-Lei n. 413/1969, não restam dúvidas de que tanto a cédula de crédito como a nota de crédito possuem forma contratual, sendo passível de serem aplicadas as normas do CDC quanto às condições contratadas. Uma vez constatada a existência de cláusula ou condição abusiva, segundo as regras de proteção e defesa do consumidor, poderão ser revistas tais condições, bem como declaradas nulas tais avenças. Podemos destacar, dentre outras condições consideradas abusivas, segundo as regras de proteção e defesa do consumidor, poderão ser revistas tais condições, bem como declaradas nulas tais avenças. Por tal razão, possível é a revisão do contrato de alienação fiduciária à luz das normas consumeristas. Por fim, a Súmula n. 93-STJ prescreve que a “legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial e industrial admite o pacto de capitalização de juros”. Entretanto no que diz respeito à capitalização mensal dos juros haveria necessidade de examinar as cláusulas contratuais para conferir se expressamente pactuada, o que não se coaduna com a Súmula n. 5 do STJ. Forte em tais razões, não conheço do Recurso Especial. É o voto. RECURSO ESPECIAL N. 388.572-MS (2001.0176131-2) Relator: Ministro Fernando Gonçalves Recorrente: Banco do Brasil S/A Advogado: Patrícia Netto Leão e outros Recorrido: Otávio Ferreira Fernandes - firma individual Advogado: Gilmar Garcia Tosta 1 EFING, Antônio Carlos. Contratos e procedimentos bancários à luz do Código de Defesa do Consumidor. São Paulo; RT, 2000, p. 143 RSSTJ, a. 5, (21): 421-467, agosto 2011 447 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA EMENTA Direito Bancário. Cédula de crédito comercial. Capitalização mensal. Possibilidade. Comissão de permanência. Não incidência. Multa moratória. Redução. CDC. 1. A cédula de crédito comercial admite o pacto de capitalização mensal dos juros. Súmula n. 93-STJ. 2. As cédulas de crédito contam com disciplina legislativa específica, perpetrada pelo do Decreto-Lei n. 413/1969, onde inexiste previsão para cobrança da comissão de permanência. Precedentes. 3. As operações realizadas pelas instituições financeiras guardam nítidos contornos de relação de consumo, o que implica na redução da multa moratória para o teto máximo de 2% para os contratos celebrados após o advento da Lei n. 9.298/1996 que alterou a redação do parágrafo primeiro do art. 52 do CDC. Precedentes. 4. Recuso especial parcialmente conhecido e provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer parcialmente do recurso especial e, nessa parte, dar-lhe provimento. Os Ministros Aldir Passarinho Junior, Barros Monteiro e Cesar Asfor Rocha votaram com o Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. Brasília (DF), 18 de novembro de 2003 (data do julgamento). Ministro Fernando Gonçalves, Relator DJ 1º.12.2003 RELATÓRIO O Sr. Ministro Fernando Gonçalves: Trata-se de recurso especial interposto pelo Banco do Brasil S/A, com fundamento nas alíneas a e c, inc. III, art. 105 da Carta Constitucional, tendo como recorrido Otávio Ferreira Fernandes - firma individual. 448 SÚMULAS - PRECEDENTES Insurge-se o recorrente contra a decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul, determinando: a) a impossibilidade de incidência da capitalização mensal dos juros, mesmo se tratando de cédula de crédito comercial; b) a ilegalidade da cobrança da comissão de permanência; c) a redução da multa moratória de 10% para 2% em decorrência da aplicação do Código de Defesa do Consumidor; e d) a divisão dos encargos em decorrência da existência da sucumbência recíproca. Sustenta maltrato ao art. 4º, incisos VI, IX e XVII da Lei n. 4.595/1964, art. 5º do Decreto-Lei n. 413/1969, parágrafo único do art. 21 do Código de Processo Civil, bem como dissenso jurisprudencial. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Fernando Gonçalves (Relator): Em relação à possibilidade de capitalização mensal dos juros razão assiste ao recorrente. O débito exeqüendo origina-se de Cédula de Crédito Comercial, com disciplina legislativa específica, consubstanciada no Decreto-Lei n. 413/1969 que admite o pacto de capitalização mensal, entendimento há muito assentado por este Tribunal, na esteira da Súmula n. 93-STJ, verbis: A legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial e industrial admite o pacto de capitalização de juros. Quanto à irresignação da impossibilidade de incidência de comissão de permanência, sem razão o recorrente. Conforme supra salientado, a legislação específica que disciplina as Cédulas de Crédito não prevê a possibilidade da cobrança da comissão de permanência. Nesta linha, destaco os seguintes precedentes: Civil. Juros remuneratórios. Limitação. Comissão de permanência. Capitalização mensal. Multa. (...) 2 - O Decreto-Lei n. 413/1969, legislação específica, não admite a cobrança de comissão de permanência para a cédula de crédito comercial, parcela que, ao contrário, pode ser aplicada aos contratos de abertura de crédito, para o período de inadimplência, não podendo ser cumulada com correção monetária (Súmula n. 30-STJ) e nem com juros remuneratórios, calculada pela taxa média dos juros RSSTJ, a. 5, (21): 421-467, agosto 2011 449 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, tendo como limite máximo a taxa do contrato. (...) 5 - Recurso especial conhecido e provido em parte. (REsp n. 424.036-GO; Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ de 18.08.2003). Cédula de crédito comercial. Comissão de permanência. Código de Defesa do Consumidor. Prequestionamento. (...) 2. Nas cédulas de crédito comercial, como também assentado em inúmeros precedentes, não é permitida a cobrança da comissão de permanência. (...) 5. Recurso especial conhecido e provido, em parte. (REsp n. 473.853-DF; Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ de 25.08.2003). É pacífico, no âmbito desta Corte, a incidência do Código de Defesa do Consumidor aos contratos celebrados com as instituições financeiras, o que implica na redução da multa moratória de 10% para 2% para as operações realizadas após o advento da Lei n. 9.298/1996 - hipótese dos autos - que alterou a redação do parágrafo primeiro do art. 52 do CDC, conforme inúmeros precedentes: Civil. Juros remuneratórios. Limitação. Comissão de permanência. Capitalização mensal. Multa. (...) 4 - A redução da multa para 2% somente apresenta-se correta para a cédula de crédito comercial, emitida após a edição da Lei n. 9.298/1996, que alterou o CDC. 5 - Recurso especial conhecido e provido em parte. (REsp n. 424.036-GO; Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ de 18.08.2003). Civil. Juros remuneratórios. Limitação. Comissão de permanência. Capitalização mensal. Multa. Revisão de contratos findos. (...) 4 - Tanto para o contrato de abertura de crédito como para a cédula de crédito comercial, emitidos após a edição da Lei n. 9.298/1996, que alterou o CDC, é correta a redução da multa de 10% para 2%. (...) 6 - Recurso conhecido em parte e, nesta extensão, provido. (REsp n. 409.424RS; Rel. Min. Fernando Gonçalves, DJ de 04.08.2003). 450 SÚMULAS - PRECEDENTES Prejudicada, por óbvio, a irresignação quanto ao suposto maltrato ao art. 21 do CPC, diante da sucumbência recíproca, mantido o percentual e forma dos encargos estabelecidos em primeira instância. Pelo exposto, conheço parcialmente do recurso e lhe dou provimento. RECURSO ESPECIAL N. 431.951-RS (2002.0048721-4) Relator: Ministro Carlos Alberto Menezes Direito Recorrente: Banco Cidade S/A Advogados: Rogério Reis de Avelar Francisco Antônio de Oliveira Stockinger e outros Recorrido: Telmo Costa Xavier Advogado: Nilo Leo Kruger EMENTA Recurso especial. Mútuo bancário comum. Instrumento particular de consolidação de dívida. Capitalização mensal. Taxa referencial. Comissão de permanência. Multa contratual. Código de Defesa do Consumidor. Compensação de créditos. Incidência da Súmula n. 7-STJ. Compensação de honorários advocatícios. 1. Incide a vedação quanto à capitalização dos juros estabelecida na Lei de Usura (Decreto n. 22.626/1933), a teor da Súmula n. 121STF. 2. A Taxa Referencial (TR), apenas, quando contratada, pode ser utilizada como índice de correção monetária. Incidência, na hipótese, da Súmula n. 5-STJ quanto à verificação do pacto. 3. A comissão de permanência, por si só, é legal, não cumulada com a correção monetária (Súmula n. 30-STJ), nem com os juros remuneratórios, devendo ser calculada considerando a taxa média do mercado, segundo a espécie de operação, apurada pelo Banco Central do Brasil (REsp n. 271.214-RS, 2ª Seção, julgado em 12.03.2003), limitada à taxa contratada. RSSTJ, a. 5, (21): 421-467, agosto 2011 451 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA 4. O Código de Defesa do Consumidor incide nos contratos bancários em geral, presente relação de consumo entre o cliente e a instituição financeira. 5. Sendo a Lei n. 9.298, de 1º.08.1996, que alterou o art. 52, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor, anterior ao contrato de mútuo, é devida a redução da multa para 2%. 6. Existência de crédito para compensação. Incidência da Súmula n. 7-STJ. 7. Restou pacificada nesta Corte que, havendo sucumbência recíproca, é possível a compensação dos honorários advocatícios. 8. Recurso especial conhecido e provido, em parte. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, conhecer do recurso especial e lhe dar parcial provimento. Os Srs. Ministros Nancy Andrighi, Castro Filho e Antônio de Pádua Ribeiro votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Ari Pargendler. Brasília (DF), 22 de maio de 2003 (data do julgamento). Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, Relator DJ 18.08.2003 RELATÓRIO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito: Banco Cidade S/A interpõe recurso especial, com fundamento nas alíneas a e c do permissivo constitucional, contra Acórdão da 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, assim ementado: Confissão de dívida. Juros. Limitação. Capitalização. Comissão de permanência. Correção monetária. Mora. Juros moratórios. Multa. Repetição de indébito. Não é auto-aplicável a norma do § 3º, do artigo 192 da Constituição Federal, que limita a taxa de juros reais em 12% ao ano. Ainda vigora a Súmula n. 596 452 SÚMULAS - PRECEDENTES do STF. Às entidades integrantes do Sistema Financeiro Nacional se aplicam as disposições da Lei n. 5.495/1964. Prevalência dos juros pactuados no contrato. Impossível a capitalização de juros, pois subsiste “a vedação do artigo 4º do Decreto n. 22.626/1933, no que diz com a capitalização de juros, não afetado pelas disposições da Lei n. 4.595/1964. Excetuam-se as hipóteses previstas em legislação específica, como sucede com as cédulas de crédito rural, industrial e comercial” (precedente do STJ). É vedada a imposição de comissão de permanência vinculada a taxas aleatórias porque retira do devedor a possibilidade de fiscalização eficaz à falta de conhecimento de sua compleição. O IGP-M é o índice que mais justamente repõe o poder aquisitivo da moeda, por isto aplicável nos contratos bancários, substitutivo da TR que carrega componente de remuneração do capital. Considera-se em mora o devedor que não efetuar o pagamento no tempo, lugar e forma convencionados (artigo 955, do Código Civil). É admissível a cobrança de juros de mora de 1% ao mês, desde que prevista a possibilidade no contrato. A cláusula penal de 10% deve ser reduzida a 2% nos contratos firmados após a alteração introduzida no artigo 52 do CDC pela Lei n. 9.298, de 1º.08.1996. É entendimento, não unânime na Câmara, de que a repetição de indébito só se viabiliza se a parte comprovar que pagou em erro, na forma do artigo 965, do Código Civil. Entretanto, considera-se que face ao posicionamento pela não limitação dos juros remuneratórios nada restará, em princípio, a ser devolvido, e a discussão se torna inócua. Apelação provida em parte. (Voto vencido) (fl. 194). Sustenta o recorrente negativa de vigência ao art. 4º do Decreto n. 22.626/1933, bem como às Súmulas n. 93-STJ e n. 596-STF, porque as instituições financeiras podem pactuar juros capitalizados mensalmente. Argúi violação ao art. 115 do Código Civil e à Súmula n. 30-STJ, tendo em vista que é legal a utilização da Taxa Referencial como índice de correção monetária e a cobrança da comissão de permanência às taxas de mercado. Aduz contrariedade ao art. 52, § 1º, da Lei n. 8.078/1990, uma vez que as operações de crédito não configuram relação de consumo, não se aplicando o Código de Defesa do Consumidor. Alega ofensa aos artigos 1.010 do Código Civil e 23 da Lei n. 8.906/1994, por ser indevida a compensação de créditos e de honorários advocatícios. RSSTJ, a. 5, (21): 421-467, agosto 2011 453 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA Contra-arrazoado (fls. 237 a 242), o recurso especial não foi admitido (fls. 244 a 251), tendo seguimento por força de despacho proferido em agravo de instrumento (fls. 262-263). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito (Relator): Ação revisional de contrato bancário proposta pelo recorrido, contra o recorrente, Banco Cidade S/A, julgada parcialmente procedente em primeiro grau para afastar a multa e os juros moratórios; determinar a utilização do IGP-M como indexador; limitar os juros em 12% ao ano, sem capitalização e admitir a compensação de valores. A 18ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul negou provimento à apelação do banco. No recurso especial, a instituição financeira aduz ser legal a cobrança da capitalização mensal de juros; da Taxa Referencial e da comissão de permanência. Alega, ainda, ser indevida a compensação de créditos e de honorários advocatícios e que o Código de Defesa do Consumidor não se aplica ao presente contrato. A razão do recorrente é, apenas, parcial. Quanto à capitalização de juros, permanece em vigor a vedação de sua incidência mensalmente no mútuo comum. Anote-se: REsp n. 255.079-RS, 3ª Turma, de minha relatoria, DJ de 20.11.2000; REsp n. 279.022-RS, 4ª Turma, Relator o Senhor Ministro Aldir Passarinho Junior, DJ de 12.03.2001; REsp n. 180.940-RS, 3ª Turma, Relator o Senhor Ministro Waldemar Zveiter, DJ de 22.02.1999. A Taxa Referencial, de fato, segundo a orientação deste Tribunal, pode ser utilizada como índice de correção monetária quando pactuada. Anote-se: Sub-rogação. Débito decorrente de cédula de crédito rural. Juros. Capitalização. Precedentes da Corte. 1. Como já decidiu a Corte, o “Decreto-Lei n. 167/1967, art. 5º, posterior à