CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA MESTRADO PROFISSIONAL EM GESTÃO SOCIAL, EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL A GESTÃO SOCIAL E A INCLUSÃO PRODUTIVA: Limites e Possibilidades da Ação do Fórum Pró-Trabalho das Pessoas com Deficiência e Reabilitadas MARIA CRISTINA ABREU DOMINGOS REIS Belo Horizonte 2012 MARIA CRISTINA ABREU DOMINGOS REIS A GESTÃO SOCIAL E A INCLUSÃO PRODUTIVA: Limites e Possibilidades da Ação do Fórum Pró-Trabalho das Pessoas com Deficiência e Reabilitadas Dissertação apresentada ao curso de Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre. Área de Concentração: Inovações Sociais, Educação e Desenvolvimento Local. Linha de Pesquisa: Processos Políticos Sociais, Articulações Institucionais e Desenvolvimento Local. Orientador: Prof. Barbosa de Melo. Belo Horizonte Centro Universitário UNA 2012 Dr. Frederico Luiz R375g Reis, Maria Cristina Abreu Domingos A gestão social e a inclusão produtiva: limites e possibilidades da ação do fórum pró-trabalho das pessoas com deficiência e reabilitadas. / Maria Cristina Abreu Domingos Reis. – 2012. 134f.: il. Orientadora: Prof. Dr. Frederico Luiz Barbosa de Melo. Dissertação (Mestrado) – Centro Universitário UNA, 2012. Programa de Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local. Bibliografia f. 113-119. 1. Deficientes - emprego. 2. Educação. I. Melo, Frederico Luiz Barbosa de. II. Centro Universitário UNA. III. Título. CDU: 658.114.8 A Deus, muito presente em minha vida, que me deu força e muita luz para persistir, quando tudo parecia desacreditado; Aos meus amados filhos, Luiza e Fernando, que com carinho, atenção, amor e paciência me apoiaram incondicionalmente, resistindo às muitas ausências e carências; E, de maneira especial, à minha maravilhosa e guerreira mãe, Olga Celso de Abreu, que quase completando um século de idade, com toda garra e determinação, no desejo de agraciar a vida, luta bravamente para presenciar este momento. Por fim, ao meu grande orientador, Frederico Luiz Barbosa de Melo, pela dedicação, entusiasmo, companheirismo, que de maneira incondicional sempre me fez acreditar em minha capacidade. A vocês, meus queridos e eternos, dedico esta vitória! AGRADECIMENTOS A Deus, por me iluminar e dar forças nesse percurso que parecia interminável. Ao professor e orientador Frederico Melo, pela tranquilidade, sabedoria e confiança nos momentos mais difíceis desse percurso. Ao meu pai, Vicente Trindade Domingos, sempre presente em minha memória e lembrança, e ao meu irmão, Euler, pela sua especial e incondicional parceria, amizade e carinho. E às minhas irmãs, Marilia, Lidiana e Fátima, por entenderem minha ausência das reuniões familiares e dos cuidados à nossa mãe. Ao eterno amigo, Secretário de Direitos Humanos e colega de trabalho, João Batista de Oliveira, que me ensinou a ter paixão pela garantia dos direitos humanos. Ao meu grande amigo, Leonardo Mattos, grande líder do movimento, minha referência na luta pelos direitos das pessoas com deficiência e na maneira de conviver com a diversidade. Aos colegas do mestrado, pelos momentos de alegria, parceria, cumplicidade e, em especial, às colegas que me auxiliaram na efetiva disposição em me ajudar: Juliana, Andréa, Roberta. Em especial, agradeço às professoras Rosalina, Matilde, Lucília, Helô Santos, Heloisa Cabral Aloísio e Áurea, que com extremo profissionalismo nos fazem sentir orgulho de nossa formação. E com imenso carinho aos meus fiéis amigos e amigas, que no dia-a-dia, na sua singularidade, me fazem um ser humano melhor: Dalva Anjos, Rosangela Villaça, Rita Silami, Alette Barone, Fátima Pádua, Fátima Brites e Toninho. Ao Secretário, Zito Vieira, e colegas da Secretaria Municipal de Esporte de Belo Horizonte, pelo apoio. Especialmente ao querido Walter Ude, companheiro de todas as horas, que envidou esforços para que eu tivesse tranquilidade para desenvolver este trabalho. E a todas as pessoas com deficiência ou não, que direta ou indiretamente contribuíram para nossas lutas e para que este estudo se concretizasse, o meu eterno obrigada! "A voz e vozes que entoam e ecoam de seus participantes carregados de emoções, pensamentos, desejos, etc. são falas que estiveram caladas e passaram a impulsionador se expressar (carência por algum motivo socioeconômica, direito individual ou coletivo usurpado ou negado, projeto de mudança, demanda não atendida). Ao se expressarem, os atores/sujeitos dos processos de aprendizagem articulam o universo de saberes disponíveis, passados e presentes, no esforço de pensar/ elaborar/ reelaborar sobre a realidade em que vivem. Os códigos culturais são acionados e afloram-se as emoções contidas na subjetividade de cada um”. (Gohn, 2011). RESUMO Este estudo analisou o processo da gestão social e atuação de um fórum participativo. Para tal, pesquisou um fórum intersetorial, não instituído por lei, que visa promover um processo que garanta o cumprimento da Lei de Cotas referente ao emprego de pessoas com deficiência (PCDs) no mercado de trabalho, o Fórum Pró-Trabalho das Pessoas com Deficiência e Reabilitadas (FPT), com atuação na região metropolitana de Belo Horizonte. O objetivo do trabalho constituiu-se em analisar a dinâmica da gestão social, em particular a forma de participação de seus integrantes, indicando possibilidades e limites de sua atuação no contexto da inserção produtiva das PCDs. Utilizou-se a abordagem qualitativa, realizando observação participante,, análise documental do regimento e das atas (de 2008 a 2010), por meio do software Atlas TI, e entrevista semiestruturada com seis participantes e um egresso do fórum. A literatura analisada indicou que há uma tendência a se enfatizar o aspecto quantitativo em detrimento da qualidade do tipo de inserção produtiva realizada. No âmbito da gestão social do FPT, verificou-se que o segmento governamental ocupa maior participação nos debates, conforme registrado nas atas analisadas. Por sua vez, os representantes das empresas apresentaram menor participação ativa, dedicando-se mais a colher informações úteis ao cumprimento da Lei de Cotas. E, curiosamente, as PCDs demonstraram baixo nível de interlocução na tessitura das propostas a serem encaminhadas. Além disso, percebeu-se que o FPT não realiza processos de monitoramento e avaliação quanto ao tipo de inserção produtiva no mundo do trabalho. Isso sugere que ainda prevalecem práticas que podem ser classificadas como procedimentos de inclusão marginal e que a atuação do FPT não se orienta pela concepção de “inclusão produtiva”. Da análise das entrevistas, constatou-se que existem visões diferenciadas sobre os princípios e a finalidade do FPT, mas que ele representa importante lugar de promoção, aprendizagem e instrumentalização para seus participantes. Os participantes compartilham o interesse em defendê-lo como espaço democrático e de articulação de redes, ainda que vejam dificuldades no seu funcionamento (coordenação autoritária para uns, comunicação manipulada para outros, a excessiva dedicação à constituição do Portal da Inclusão e a absorção do Fórum pelo Estado ainda para outros). Identificou-se necessidade de pesquisas que investiguem a qualidade das oportunidades de trabalho para as PCDs, bem como criação de outros espaços sistemáticos entre a sociedade civil e o poder público com características e valores teórico-conceituais da gestão social. Como resultado, foi produzido um instrumento de avaliação da gestão social e da participação em grupos, fóruns, conselhos e colegiados por meio de indicadores. Palavras-chave: Gestão Social. Participação. Inclusão Produtiva. PCD. Lei de Cotas. ABSTRACT This study examined the process of social management and performance of a participatory forum. To this end, it investigated the Pro-Labor Forum of People with Disabilities and Rehabilitated (PLF), an inter sectorial, not imposed by law, forum, operating in the metropolitan region of Belo Horizonte and created to promote a process that ensures compliance of the Quota Law relating to employment of people with disabilities (PWD) in the labor market. The aim of this study was to analyze the dynamics of social management, in particular the form of participation of its members, indicating possibilities and limits of its action in the context of productive insertion of PWD. A qualitative approach was applied, by means of participant observation, documentary analysis of the regiment and minutes (20082010), through the Atlas TI software, and semi structured interviews with six participants and a person that used to join the forum. The literature reviewed indicated that there is a tendency to emphasize the quantitative aspect to the detriment of the quality of the type of productive insertion performed. Within the social management of PLF, it was found that the segment government occupies greater participation in the debates, as recorded in the minutes analyzed. In turn, representatives of business were less active, devoting themselves more to gather relevant information to the fulfillment of the Quota Law. And, curiously, PWD showed a low level of dialogue in the building of proposals to be forwarded. Furthermore, the study found that the PLF does not perform monitoring and evaluation procedures in the type of productive insertion in the work world. This suggests that still prevail practices that can be classified as marginal inclusion and shows that the performance of the PLF is not guided by the concept of "productive inclusion". The analysis of the interviews demonstrated that there are different views on the principles and purpose of PLF, but it represents an important place for promotion, learning and instrumentation for its participants. Participants share a common interest in defending it as a democratic space for the articulation of networks, although they see difficulties in its operation (authoritative coordination for some of them, communication manipulated for others, excessive dedication to the “Portal of Inclusion” and absorption of the PLF by State still for others). The study identified the need for research to investigate the quality of job opportunities for PWD and the usefulness of the creation of other organizations by civil society and government, together, with characteristics and theoretical and conceptual values of social management. As a result, assessment tools of the quality of social management and participation in groups, forums, councils and collegiate, by means of indicators, have been produced. Keywords: Social management. Participation. Productive inclusion. PWD. Quota Law. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura FIGURA 1 - Linha do tempo do Fórum Pró-Trabalho.................................... 75 Gráficos GRÁFICO 1 - Número de atas localizadas do fórum - Belo Horizonte 2000-2010................................................................................................. 69 GRÁFICO 2 - Vocalizações por segmento..................................................... 79 GRÁFICO 3 - Capacidade de proposição...................................................... 80 GRÁFICO 4 - Capacidade de ter suas propostas transformadas em decisões.................................................................................................... 81 GRÁFICO 5 - Assuntos e temáticas por segmentos...................................... 82 Quadros QUADRO 1 – Gestão social em construção.................................................. 36 QUADRO 2 – Perfil dos participantes ativos do FPT entrevistados............... 84 QUADRO 3 – Referencial com opiniões dos entrevistados com referência aos princípios, função e papel do FPT..................................................... 91 LISTA DE TABELAS TABELA 1 - Número de empregados com deficiência declarados e esperados pela Lei de Cotas segundo tamanho e natureza de empresas - Brasil – 2009.......................................................................... 62 TABELA 2 - Número de empregados com deficiência declarados e esperados pela Lei de Cotas, segundo tamanho e natureza de empresas - Minas Gerais – 2009.............................................................. 63 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AFT Auditores Fiscais do Trabalho BPC Benefício de Prestação Continuada CAADE Coordenadoria de Apoio e Assistência à Pessoa Deficiente CIF Classificação Internacional de Funcionalidade CONADE Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência CORDE Coordenadoria Nacional para a Integração de Pessoas Portadoras de Deficiência DIEESE Departamento Intersindical de Estatística Socioeconômicos FIEMG Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais FPT Fórum Pró-Trabalho GS Gestão social IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IEL Instituto Euvaldo Lodi INSS Instituto Nacional de Seguridade Social IP Instituições Participativas IPEA Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada MDS Ministério do Desenvolvimento Social MP Ministério Público MTE Ministério do Trabalho e Emprego OMS Organização Mundial de Saúde ONG Organização Não Governamental ONU Organização das Nações Unidas OSC Organização da Sociedade Civil OSCIP Organização da Sociedade Civil de Interesse Público PCD Pessoa com deficiência PNE Portador de Necessidades Especiais PPD Pessoa Portadora de Deficiência RAIS Relação Anual de Informações Sociais SEADE Secretaria de Estado da Administração e Estudos SEDESE Secretaria de Estado do Desenvolvimento Social SRTE Superintendência Regional do Trabalho TI Tecnologia da Informação SUMÁRIO1 1 INTRODUÇÃO............................................................................................ 2 GESTÃO SOCIAL E INCLUSÃO PRODUTIVA: 14 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES........................................................................................ 26 2.1 Gestão social: muitos conceitos e muitas práticas.................................. 28 2.2 Da exclusão para a inclusão.................................................................... 38 2.3 Alguns aspectos da legislação nacional................................................... 45 2.4 Alguns outros obstáculos à inclusão........................................................ 50 2.5 As ações afirmativas, a Convenção da ONU e o trabalho....................... 52 2.6 Quem são as pessoas com deficiência no mercado de trabalho brasileiro......................................................................................................... 57 3 METODOLOGIA.......................................................................................... 66 3.1 Cenário da investigação........................................................................... 68 3.2 O FPT na linha do tempo......................................................................... 72 4 A INCLUSÃO PRODUTIVA E A GESTÃO SOCIAL NO FPT: O QUE DIZEM OS DOCUMENTOS E OS ENTREVISTADOS.................................. 75 4.1 O que diz o regimento.............................................................................. 75 4.2 Participação e temáticas: o que dizem as atas........................................ 79 4.3 As entrevistas e o que elas informam...................................................... 83 4.3.1 Primeiro eixo - limites e possibilidades da inclusão produtiva na dinâmica do FPT: refletindo sobre as multivisões.......................................... 85 4.3.1 Segundo eixo: a gestão social e os desafios no FPT........................... 89 4.3.1.1 Princípios, função social e papel dos fóruns...................................... 90 4.3.1.2 Os temas em debate o foco na rede de inclusão............................... 95 4.3.1.2 A dinâmica das reuniões e plenárias................................................. 97 4.3.1.3 Algumas tensões e crises evidenciadas no FPT................................ 101 1 Este trabalho foi revisado de acordo com as novas regras ortográficas aprovadas pelo Acordo Ortográfico assinado entre os países que integram a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), em vigor no Brasil desde 2009. E foi formatado de acordo com a ABNT NBR 14724 de 17.04.2011. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................ 104 REFERÊNCIAS.............................................................................................. 113 APÊNDICES E ANEXO.................................................................................. 120 16 1 INTRODUÇÃO A conhecida Lei de Cotas (Lei nº 8.213/91), que determina o emprego de pessoas com deficiência (PCDs) de acordo com o número de trabalhadores da empresa, já conta com mais de duas décadas de vigência no Brasil (BRASIL, 1991a). Ainda assim, há, de um lado, empresas que não atendem os requisitos legais e, de outro, PCDs com interesse e disponibilidade para se empregar e que se encontram sem emprego, ou seja, que estão desempregadas. Constata-se, portanto, que somente a vigência do preceito legal não é suficiente para promover a inserção laboral e, menos ainda, a inclusão social plena e virtuosa desse segmento populacional. A inclusão produtiva de PCD, ou seja, a inclusão social por meio do trabalho regular, remunerado, socialmente reconhecido e legal e sindicalmente protegido pode ser mais eficazmente promovida por meio de fóruns de gestão social (GS). A GS pode representar instância e processos concretos que viabilizem a efetivação das políticas inclusivas e a conquista de mudanças na sociedade, que vão além do prescrito em normas legais, mas em que, sobretudo, prevaleçam os interesses sociais de garantia da diversidade, da participação e do bem comum. Em que pese, porém, o alto número de entidades e fóruns de defesa dos interesses de PCD e de promoção do seu emprego, não se conhece os limites e os avanços da atuação desses grupos. Este estudo se propõe a pesquisar uma organização de defesa dos direitos à ocupação remunerada das PCDs, conforme a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (BRASIL, 2010): [...] aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais em interação com diversas barreiras podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas (BRASIL, 2010, 2 p.22) . 2 Neste texto, será utilizada preferencialmente a expressão “pessoas com deficiência” (e a sigla correspondente, PCD) porque tal é a denominação atualmente adotada pelas organizações representativas dos sujeitos assim identificados e na mencionada Convenção da Organização das Nações Unidas (ONU). No passado, entretanto, outras terminologias foram utilizadas, como 17 A inserção produtiva desse segmento representa uma questão de direitos humanos. Para Marx (1979), o trabalho como atividade define a existência humana, sendo uma necessidade natural do homem em relação à natureza. Inserção no mercado de trabalho ou inserção produtiva, citando Fidalgo e Machado (2000), entende-se como sendo a “forma e resultado do processo de se introduzir, se relacionar, se integrar ao meio social, conhecido como mercado de trabalho. A inserção no mercado de trabalho apresenta formas estratificadas de qualidade muito variável” (FIDALGO; MACHADO, 2000, p. 188). Nesse aspecto, esse conceito contribui em nosso estudo para demonstrar que a inserção produtiva acontece de várias maneiras, propiciando adjetivamente qualidades diversas no tipo de inserção realizada. Todavia, como ponto de partida, na perspectiva da inclusão social torna-se mais adequado utilizar o conceito de inclusão produtiva estabelecido pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), segundo o qual: Compreende-se como inclusão produtiva todo processo conducente à formação de cidadãos integrados ao mundo pelo trabalho e tem como perspectiva a conquista de autonomia para uma vida digna sustentada por parte de todas as pessoas apartadas ou fragilmente vinculadas à produção de renda e riqueza (BRASIL, 2011a). O tema mais geral do trabalho e emprego de PCD constitui-se em uma temática atual de âmbito nacional e internacional. Levando-se em conta a Convenção sobre os Direitos das PCDs, em sua versão comentada (BRASIL, 2008), é conveniente afirmar que: “pessoas com necessidades especiais” ou “pessoas portadoras de deficiência”. Eventualmente, tais termos poderão aparecer no presente trabalho, em citações de outros autores ou de normas legais. 18 Em síntese, a legislação brasileira em favor da pessoa com deficiência no trabalho, é a seguinte: artigo 7º, XXXI, da Constituição Federal, que proíbe discriminação para admissão e remuneração em razão de deficiência, o artigo 37, também da Constituição, que no inciso VIII garante reserva de vagas na administração direta e indireta, além da legislação ordinária expressa pela Lei 7853/89, que assegura no artigo 2º uma política de acesso ao emprego público e privado; a Lei 8112/90, que estabelece a reserva de 5 a 20% dos cargos da administração direta e indireta a pessoas com deficiência; a Lei 8213/91, que no artigo 93 fixa cotas de 2 a 5% de emprego para pessoas habilitadas ou reabilitadas nas empresas com mais de 100 empregados; e finalmente, o Decreto 3298/99 que regulamenta as leis anteriores; além do Decreto 5.296/04, que regulamenta as Leis 10.048 e 10.098, ambas de 2000, para o transporte público adaptado e remoção de barreiras arquitetônicas (BRASIL, 2008, p. 114). Todavia, não se deve ignorar que existe um abismo entre o que a legislação preconiza e a realidade apresentada. Nesse aspecto, Batista (2004) afirma que: [...] as PCDs que estiverem amparadas pelo ordenamento jurídico e mesmo que sejam crescentes movimentos relativos à sua inclusão, é notável a distância entre a promessa igualitária, acenada pela lei, e a realidade cotidiana das desigualdades e discriminações. Existe uma grande defasagem entre o ideal contido na legislação e a realidade (BATISTA, 2004, p. 1). Dessa maneira, tendo em vista esse arcabouço legal e seus impactos na sociedade e nas empresas, esta pesquisa pretendeu analisar como um fórum intersetorial participativo se organiza para promover um processo que garanta a sua finalidade, do ponto de vista da gestão social e da inclusão produtiva. Esse estudo também subsidiou a elaboração de um instrumento de avaliação de fóruns e processos da gestão social. Para atingir esse objetivo, foi necessário conhecer a legislação e as implicações pertinentes à inserção produtiva das PCDs com vistas a confrontar os conteúdos das temáticas discutidas pelos participantes do Fórum Pró-Trabalho da Pessoa com Deficiência e Reabilitada (FPT)3. Cabe ressaltar que também foi importante identificar elementos do funcionamento, princípios e organização do FPT, 3 Deliberado em plenária ordinária, a nomenclatura “reabilitada” foi adicionada à identidade do FPT de PCD, por sugestão dos representantes do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) participantes do Fórum, uma vez que o artigo 93 da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991 refere-se a trabalhadores habilitados e reabilitados (BRASIL, 1991a). Entende-se por reabilitada a pessoa que passou por processo orientado a possibilitar que adquira a partir da identificação de suas potencialidades laborativas o nível suficiente de desenvolvimento profissional para reingresso no mercado de trabalho e participação na vida comunitária (Decreto nº3. 298/99 – BRASIL, 1999). 19 congruentes com a concepção da gestão social e, sobretudo, investigar registros e ações. Foi investigado o FPT, que é uma organização de iniciativa da sociedade civil em parceria com o poder público, com 12 anos de atuação e com a finalidade de unir esforços de instituições implicadas com a promoção da inserção produtiva de PCD na região metropolitana de Belo Horizonte. O FPT constitui um espaço de participação voluntária, não institucionalizado legalmente, sem recursos regulares, com adesão de instituições e de órgãos responsáveis pela fiscalização da Lei 8.213/91: Ministério Público do Trabalho, Superintendências Regionais do Trabalho, assim como sindicatos, universidades, entidades e instituições públicas e privadas, inclusive empresas. A partir desses aspectos, foi necessário buscar diversos autores que pesquisam o tema gestão social, bem como conhecer aspectos que constituem a inserção produtiva. Investigando e analisando o funcionamento do FPT, foi possível chegar a algumas das principais dimensões no campo da GS, visando subsidiar, por um lado, processos participativos de gestão e, por outro lado, ações dedicadas à promoção da ocupação das PCDs no mercado de trabalho na perspectiva da inclusão produtiva. Este estudo buscou analisar, por meio da investigação do FPT (fórum não instituído em lei), a dinâmica da GS em processo, em particular a forma de participação de seus integrantes, indicando limites e possibilidades de sua atuação no contexto da inserção produtiva das PCDs, marcado pela Lei de Cotas. A relevância deste trabalho de pesquisa revela-se, assim, tanto na reflexão sobre limites e possibilidades da atuação de um fórum de GS quanto na investigação sobre princípios que orientam as práticas voltadas para promover a ocupação econômica de PCD. A revisão bibliográfica realizada revela que predomina a concepção de que uma única definição relativa à gestão social se mostra, ainda, inconclusiva. Apesar de 20 existirem muitos conceitos de gestão social, adota-se nesta pesquisa o seguinte conceito, retirado de Gondim, Fischer e Melo (2006, p. 48): [...] um ato relacional capaz de dirigir e regular processos por meio da mobilização ampla de atores na tomada de decisão (agir comunicativo), que resulte de parcerias intra e interorganizacionais, valorizando as estruturas descentralizadas e participativas, tendo como norte o equilíbrio entre a racionalidade instrumental (com relação a fins) e a racionalidade substantiva (em relação a valores), para alcançar, enfim, um bem coletivamente planejado, viável e sustentável a médio e longo prazo. Esse conceito retrata os mecanismos de mobilização correspondentes ao modo de gerenciamento por meio da GS, os quais contemplam aspectos fundamentais de um processo de construção coletiva baseado na participação pautada na condição relacional dos atores. Esses sujeitos da ação, articulados em parcerias intersetoriais, produzem um processo de empoderamento, como salienta Gohn (2001), ou seja, tornam-se força social da participação da comunidade, pela capacidade de produzir ou causar práticas de desenvolvimento autossustentável, para se atingir determinadas finalidades, mediante articulação societária. Nessa direção, a Constituição Brasileira de 1988 garante a participação da sociedade civil no controle público da sociedade sobre as ações dos governos, possibilitando a efetivação de espaços públicos de debate. A conquista desses espaços foi importante para promover a participação de atores sociais em processos de discussão, desenvolvimento e avaliação de políticas públicas. Buscando entender melhor esses efeitos democratizantes vigentes na sociedade atual, pode-se analisar a participação em três etapas, de acordo com as considerações do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) (SILVA; DEBONI, 2012). A primeira etapa destaca a participação como um valor em si, ou seja, a atenção central da análise estava nos processos participativos de institucionalização ainda incipientes e muitas vezes espontâneos da sociedade civil, vistos como positivos em função do caráter intrinsecamente burocrático do Estado e de seu afastamento da sociedade. 21 Já a segunda etapa fundamenta-se em análises empíricas sobre o funcionamento das Instituições Participativas (IP), consolidadas, identificando aspectos negativos no que se refere aos pressupostos da primeira fase, tais como predomínio de poder de agenda do governo em relação à sociedade civil, bem como presença de linguagem demasiadamente técnica nas reuniões e alijamento de segmentos. A terceira fase, ou seja, a mais recente, não ignora esses processos de consolidação das instituições participativas. Busca, entretanto, objetivos mais realistas e sutis. Neste sentido, trata-se de: Buscar entender se e em que condições as IPs produzem resultados positivos, bem como quais seriam os resultados positivos legitimamente esperáveis das IPs em relação às políticas publicas, ao cotidiano das comunidades, à cultura política, entre outros (SILVA; DEBONI, 2012, p. 9). A partir do que foi exposto, é possível perceber que todas essas etapas podem ocorrer tanto em espaços de conselhos, colegiados, como em diversos fóruns ampliados de composição trissetorial de participação da sociedade civil na gestão de políticas e bens públicos. Ressalta-se que este estudo tem como proposta exatamente entender as condições de funcionamento do FPT e seus impactos na sociedade e até mesmo na política pública. Faz isso analisando, por um lado, a participação dos sujeitos do fórum e, por outro lado, a concepção que orienta o conjunto de práticas e ações em busca do alcance de resultado, aqui considerado na concepção de inclusão produtiva das PCDs. Em meio a essas discussões, destaca-se o papel político que orienta a ação do fórum na intenção de exercer o controle social dessa política afirmativa, em determinado território, acompanhando e monitorando ou até mesmo avaliando a concretude da legislação vigente. Em se tratando dos papéis políticos e das ações de fóruns, Avritzer (2010, p. 101) afirma que a “ação política nas sociedades contemporâneas passa a ser, cada 22 vez mais, identificada com o uso das mídias e a capacidade dos atores sociais e políticos de influenciarem a agenda política e participarem dos debates públicos que circunscrevem essas agendas”. O mesmo autor complementa esse pensamento, expressando a relevância de instituições propulsoras de relações mais democráticas e justas, como espaços reais de influência, inclusão e reforma (AVRITZER, 2010). É importante ressaltar que o termo participação representa um conceito central na concepção da gestão social. Nesse âmbito, Souza (2000, p. 82) entende participação no “sentido da criação do homem para o enfrentamento dos desafios sociais” e que tal perspectiva se reflete em determinada realidade com a utilização de mecanismos de conquistas sociais. Destaca, também, que participação é um fenômeno de ampla utilização no campo coletivo, que possibilita conjugação de esforços orientados para fins a serem alcançados e caracterizados para o atendimento às necessidades sociais de diversos grupos. Por outro lado, de acordo com Fischer et al. (2006), no campo da gestão social cabe afirmar que a participação é um processo relevante interligado à mobilização, com estreita relação na arena das ações de defesa e garantia de direitos e controle social, associadas a questões pertinentes aos movimentos sociais. Entretanto, o processo de participação e mobilização não trilha caminhos lineares, já que são marcados por momentos históricos distintos. Nas últimas décadas, por exemplo, pode-se afirmar que este vem se alterando no bojo dos movimentos sociais, conforme Souza (2000). Entre essas alterações, a relevante ascensão da oposição ao poder em 1982, nos estados e municípios, levou à ocorrência de conflitos no interior dos aparelhos estatais, no que se sucederam duas tendências: a primeira representou a institucionalização dos movimentos, com a consequente perda da autonomia; e o segundo fator foi a aprendizagem política dos movimentos sociais no que diz respeito ao entendimento do funcionamento da máquina estatal. 23 Na década de 1990, porém, o processo de participação e mobilização não avançou com a mesma intensidade, conforme ressalta Raichelis (1998, p. 21): A afirmação da hegemonia neoliberal no Brasil, com a redução dos direitos sociais e trabalhistas, desemprego estrutural, as diferentes formas de precarização do trabalho, o desmonte da Previdência Social pública, o sucateamento da saúde e da educação pública, o deslocamento cada vez mais da assistência social para ações compensatórias seletivas de atenção à pobreza tendem a debilitar os espaços de representação coletiva e controle social sobre o Estado, conquistas duramente consolidadas na Constituição de 1988. Essa questão não pode ser deixada de lado, uma vez que o projeto neoliberal afetou as populações mais vulneráveis. Todavia, não se deve desprezar as possibilidades da aproximação dos gestores de políticas sociais com as preocupações e demandas das camadas vulneráveis. Esse quadro, brevemente comentado aqui, reforça o discurso presente das parcerias e transferências das responsabilidades públicas para a iniciativa da sociedade civil (RAICHELIS, 2007). E constitui uma nova configuração do papel do Estado, com crescente deslocamento das responsabilidades públicas para a comunidade, no tocante às entidades assistenciais, famílias, organizações não governamentais (ONGs) ou entidades empresariais, por meio da filantropia corporativa, do voluntariado e da denominada responsabilidade social. Esse é verdadeiramente o cenário onde se instala o debate acerca da gestão social, que no plano do desenvolvimento social também vai identificando caminhos congruentes, bem explicitados por Fischer (2002a). Para essa autora, gestão social refere-se a um processo de mediação social que: Articula múltiplas escalas de poder individual e social; que trabalha a identidade de projeto, refletindo e criando pautas culturais; que coordena interorganizações eficazes; que promove ação e aprendizagem coletiva; que se comunica e difunde resultados; que presta contas à sociedade; que reavalia e recria estratégias processuais (FISCHER, 2002a, p. 12). Nesse aspecto, pode-se inferir que atuar no locus do desenvolvimento social envolve aspectos de transposição de posicionamento da identidade individual para uma identidade coletiva, da organização para a interorganização. Implica também a aprendizagem interacional como construção coletiva e a transparência 24 das ações e do uso dos recursos, em um processo de avaliação e monitoramento constante, base para reconstruir novas estratégias. Agregado a esses aspectos citados, pode-se adiantar que a gestão social apresenta princípios referenciais que se baseiam na orientação participativa, democrática e cidadã. Tais valores são reconhecidos por Maia (2005) como pressupostos da gestão social, identificados pela autora no quadro intitulado “Gestão social em construção”, baseado nas análises de Tenório (1998), Carvalho4 (1999, apud MAIA, 2005), Singer5 (1999, apud MAIA, 2005), Dowbor6 (1999, apud MAIA, 2005) e Fischer (2002b). Além disso, Gohn (2001) afirma que a diversidade do conjunto de grupos organizados com diversos interesses, no formato de redes, torna-os atores coletivos na dinâmica da sociedade. E afirma, ainda, que a mobilização ocorre quando um grupo de pessoas, uma comunidade e uma sociedade decidem e agem com objetivo comum, buscando cotidianamente os resultados desejados por todos (TORO; WERNECK, 2007). Percebeu-se, nas incursões pertinentes ao tema, que a gestão social possui características próprias que ressaltam como prioridade a lógica da inclusão social. Nesse aspecto, este estudo possui questionamentos em relação à qualidade dessa inclusão no tocante aos modos de inserção na sociedade, do ponto de vista econômico e social. O trabalho em uma sociedade capitalista define a condição humana e coloca a pessoa no bojo das representações sociais, definindo o papel e a posição do sujeito nas relações de produção, nas relações sociais e na sociedade. Com o ingresso no mundo do trabalho, a imagem social das PCDs frente à sociedade 4 CARVALHO, Maria do Carmo Brant. Alguns apontamentos para o debate. In: RICO, Elizabeth de Melo; RAICHELIS, Raquel (Orgs.). Gestão social: uma questão em debate. São Paulo: Educ/IEE/PUCSP, 1999.p. 19-29. 5 SINGER, Paul. Alternativas da gestão social diante da crise do trabalho. In: RICO, Elizabeth de Melo; RAICHELIS, Raquel (Orgs.). Gestão social: uma questão em debate. São Paulo: Educ/IEE/PUCSP, 1999.p. 55-66. 6 DOWBOR, Ladislau. A gestão social em busca de paradigma. In: RICO, Elizabeth de Melo; RAICHELIS, Raquel (Orgs.). Gestão social: uma questão em debate. São Paulo: Educ/IEE/PUCSP, 1999. 25 passa por uma ressignificação, uma vez que as consideravam pessoas improdutivas ou que eram tuteladas em suas capacidades de escolhas, autossustento e participação. Todavia, a Declaração Universal dos Direitos Humanos preconizava que toda pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego. Essa afirmação significa que os grupos vulneráveis deverão, necessariamente, ter a proteção e o direito garantidos ao trabalho. Dessa maneira, o que a Declaração destaca é a universalização de oportunidades de trabalho indistintamente a todos os seres humanos, recebendo, portanto, igual tratamento, sem discriminação. Para mais esclarecimento, o artigo 1º da Convenção nº 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT, 2001, p.1) sobre a discriminação em matéria de emprego e profissão define discriminação como sendo “toda distinção, exclusão ou preferência, com base em raça, cor, sexo, religião, opinião política, nacionalidade ou origem social, que tenha por efeito anular ou reduzir a igualdade de oportunidade ou de tratamento no emprego ou profissão”. Fazer com que a sociedade entenda que realmente todas as pessoas podem trabalhar é tarefa importante para os defensores dos direitos humanos de segunda geração7, assim como um fator preponderante para se avançar na conquista da inclusão social. Baseando-se nesses preceitos, sabe-se que existe ainda uma longa distância entre o que a Declaração preconiza e a realidade vivenciada pela população 3 a “Os direitos humanos, nessa concepção anterior à 2 pós-guerra, são definidos de acordo com um paradigma liberal, como direitos de primeira geração ligados, basicamente, à ideia de liberdade. Surgem então os direitos individuais, chamados direitos civis na tradição anglo-saxônica e os direitos políticos enquanto direitos de participação. No final do século XIX e inícios do século XX, surgem os chamados direitos de segunda geração, que seriam os direitos econômicos, sociais e culturais emanados da crítica ao modelo do capitalismo liberal clássico e desenvolvidos a partir da ideia de que, mesmo os direitos ditos de primeira geração, teriam, como condição imprescindível da sua fruição, a garantia de determinadas condições materiais mínimas que permitissem o seu adequado desfrute. E daí se parte para uma concepção mais avançada de direitos de terceira geração, ligados à ideia de um vínculo solidário entre todos os homens, tanto no plano dos estado-nacionais, quanto no plano internacional – e fala-se então em direito ao desenvolvimento, direito ao meio ambiente hígido, direitos à identidade dos povos, direito à paz, etc.” (ORTIZ, 2004, p. 13). 26 brasileira. Apesar da Convenção nº 111 datar de 1960 (BRASIL, 2011b), nesses 52 anos de existência, persiste o fator de discriminação em relação a alguns grupos, entre eles as PCDs. Oportuno também mencionar a Convenção nº 159 (BRASIL, 1991b), ratificada em 1990 por 71 países-membros da OIT, que aborda a readaptação profissional e emprego de pessoas portadoras de deficiência. A Resolução considera que: [...] a Assembleia Geral das Nações Unidas proclamou 1981 como o Ano Internacional das Pessoas Deficientes, com o tema "Participação plena e Igualdade", e que um Programa de Ação Mundial, de grande porte, concernente a pessoas portadoras de deficiência, deve promover medidas eficazes, nos níveis nacional e internacional, com vista à realização dos objetivos de “plena participação” e de plena "igualdade" de pessoas portadoras de deficiência na vida social e no desenvolvimento (grifo nosso) (OIT, 2001, p. 19). Dias e Freire (2002) especificam que tal Convenção determina que a deficiência pode e deve ser superada por meio de uma série de medidas políticas, normas, programas e serviços. Seguindo esse pensamento, os autores abordam que os países que a ratificam devem: Elaborar uma política nacional que assegure a adoção de medidas adequadas de readaptação profissional ao alcance de todas as categorias de pessoas portadoras de deficiência e a promoção de oportunidades iguais de emprego para as pessoas portadoras de deficiência no mercado regular de trabalho (DIAS; FREIRE, 2002, p. 74). Para tentar dialogar com a temática apresentada sobre gestão social e inclusão produtiva, pretendeu-se buscar interlocuções com os autores e obras: Martins (1997), Sawaia et al. (1999), Fidalgo e Machado (2000), Pastore (2000), Souza (2000), Gohn (2001), Fonseca (2008), Batista (2004), Clemente (2004), Sposati (2004), Maia (2005), Sassaki (1999; 2005), Coordenadoria de Apoio e Assistência à Pessoa Deficiente (CAADE/MG, 2005), Morin (1996), Lorentz (2006), Gugel (2007), Tenório (2007), França Filho (2008), Avritzer (2010), Rigo et al. (2010), Fischer (2010), entre outros. Para realizar a investigação dos avanços e limites da atuação do FPT, considerando os conceitos de GS e de inclusão produtiva, utilizaram-se procedimentos diferentes e complementares, como análise documental e 27 entrevistas em profundidade. Foram analisados o regimento, as atas do período de 2008 a 2010 e pautas do FPT, sendo que para a análise das atas recorreu-se ao software Atlas-TI, programa que possibilitou que as falas dos conselheiros fossem codificadas em indicadores. Seus participantes e um ex-participante do FPT foram entrevistados segundo um roteiro semiestruturado. Ou seja, buscou-se ouvir, entre os participantes do FPT, pessoas com e sem deficiência, gestores de programas, profissionais de recursos humanos de empresas que trabalham com a inserção das PCDs no mercado de trabalho em Organizações Governamentais e Não Governamentais, possibilitando, assim, aproximação com os sujeitos. Além desses instrumentos citados, também foi realizada observação participante natural. Os resultados da análise dos documentos, das entrevistas e da observação, apesar de apresentados neste estudo de forma separada, foram confrontados, convergindo na reflexão contida nas considerações finais. A partir da análise documental do regimento, das atas e pautas do FPT e também por meio de entrevistas, acredita-se ter gerado contribuições tanto para orientar as iniciativas na promoção da garantia de direitos das PCDs no âmbito do trabalho, com a discussão conceitual da inclusão produtiva, quanto para avaliar processos e instâncias da gestão social. Ao final da execução do trabalho, o conceito de inclusão produtiva do MDS, já apresentado, foi ampliado por outras contribuições, rediscutido e definido de modo mais concreto, além de, eventualmente, ser mais bem especificado para se adequar à caracterização da inserção econômica e social das PCDs. Dessa maneira, acredita-se que tais considerações, agregadas a estudos existentes, poderão trazer novos conhecimentos e novas maneiras de intervenções na política de gestão de projetos societais inclusivos. Além disso, poderá contribuir na reflexão e nas ações acerca das estratégias da sociedade para a efetivação dos direitos do segmento das PCDs e outros segmentos vulneráveis ao trabalho, na perspectiva da Lei de Cotas, da participação e mobilização social. 28 2 GESTÃO SOCIAL E INCLUSÃO PRODUTIVA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES À luz da Convenção de Direitos das Pessoas com Deficiência, este item pretende levantar algumas questões relativas à temática da inclusão dessas pessoas no mercado de trabalho, buscando subsidiar este estudo e as instituições nas dificuldades de promoção da gestão social voltadas para a inserção profissional desse segmento. O preconceito e a discriminação contra a inserção de PCD no mercado de trabalho é muito forte e antigo. Dessa forma, impõe prejuízos à plena consolidação dos direitos humanos. Exemplifica tal preconceito secular o relato de Marx (1979), o qual descreve o seguinte ponto: Citemos ainda esta passagem do relatório do inspector Leonard Horner de 31 de outubro de 1855: alguns fabricantes falaram-me com uma ligeireza indesculpável de certos acidentes, como a perda de um dedo, que consideram uma bagatela. A vida e o futuro dum operário dependem de tal maneira dos seus dedos que tal perda constitui para ele um acontecimento muito importante. Quando ouço essas palavras absurdas, pergunto: suponham vocês que igualmente competentes, mas um deles sem o polegar ou sem o indicador. Qual deles escolheria? Sem um momento de hesitação, eles escolheriam aquele que tivessem os dedos completos (MARX, 1979, p. 101). Verifica-se ainda, no contexto atual, considerável restrição da sociedade na absorção desse novo paradigma da inclusão ao emprego das PCDs. Esse aspecto tem comprometido os resultados nas políticas públicas referentes a essa questão e gerado baixa eficácia da ação afirmativa. A pesquisa “Prevalência de incapacidades: um estudo da situação”, com base em sete municípios de Minas Gerais, coordenada pelo superintendente da CAADE realizada em 2005, revela que as questões vinculadas às deficiências possuem estreita correlação com a pobreza: 29 A acessibilidade fica apenas restrita a pessoas com melhores condições financeiras, pois ainda se luta pelo essencial à sobrevivência dos pobres. A observação de pessoas vivendo em condições subumanas, arrastando-se pelo chão, sem qualquer atenção do poder público, foi fato gritante em todos os municípios pesquisados (CAADE-MG, 2005 p. 161). Para ressaltar tal afirmação, cita-se Cury, que em 1992 afirmou: “a miséria do sertão quando chega ao papel perde a cor, a dor e o cheiro. Faz parte do imponderável da vida tentar transformá-la em números” (CAADE-MG, 2005, p. 161). Como assinalam Batista et al. (2000, p. 107): Hoje o tema da INCLUSÃO permeia nosso discurso político. E este TEM que ser coerente com nossa prática, tanto em assuntos internos ao movimento como na relação com o público em geral. O PRECONCEITO e a DISCRIMINAÇÃO são conceitos não parciais. Aquele que discrimina um, discrimina todos. O conceito de INCLUSÃO é holístico e só pode ser absorvido e trabalhado em conjunto, porque trata do ser humano como todas suas diferenças e semelhanças, que lhe permitem CONVIVER socialmente. Isto implica crescimento e desenvolvimento humano e pessoal, na direção da TOLERÂNCIA, da aceitação do outro, da solidariedade e, por fim, da cooperação. Vejo que nossa geração e, principalmente, a área da deficiência tiveram o privilégio de ter ajudado a gerar novos paradigmas para o futuro, dentro do universo da diversidade. Como lembra Sassaki (2005), há notícias de que pelo menos desde 1950 se desenvolve a prática de colocação de PCD no mercado de trabalho e durante 30 anos um dos caminhos para a inserção profissional passava pelos centros de reabilitação profissional. Em 1989, houve a edição do Decreto nº 3.298 (BRASIL, 1999), regulamentando a Lei nº 7.853/89 (BRASIL, 1989), o qual traz a conceituação de deficiência e estabelece parâmentros de avaliação das deficiências. Garcia (2010, p. 14) cita a obrigação legal das empresas: Todavia, em que pese a obrigatoriedade legal de as empresas brasileiras, conforme seu porte, contratarem pessoas com deficiência, ainda é latente o grande descumprimento da norma legal, coexistindo, por sua vez, um enorme contigente de pessoas com deficiência que permanecem desempregadas contra a vontade. A bibliografia examinada mostra que essa temática apresentou-se pouco explorada pelos pesquisadores. Nesse âmbito, constata-se que ainda não se tem uma normatização do sistema de gestão social de colocação profissional das PCDs no mercado de trabalho. Isso sustenta a argumentação de alguns setores 30 que afirmam ser esse expediente dispendioso e exige a adoção de critérios e especificidades que sobrecarregariam as empresas. Diferentemente da solução almejada de inclusão das PCDs no mercado de trabalho, destaca-se que existe um movimento empresarial visando à alteração da referida Lei. Dessa forma, a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG) elaborou em 2008 um estudo denominado “Lei de Cotas: um questionamento da base de dados de portadores de necessidades especiais (PNEs)”, no qual dizia que “este será um instrumento para reflexão, avaliação e possível adequação da legislação vigente” (FIEMG, 2008, p. 5). Frente a isso, as referências teóricas para este estudo estão estruturadas nos seguintes itens: “gestão social: muitos conceitos e muitas práticas”; “da exclusão para a inclusão”; “a legislação nacional”; “alguns outros obstáculos à inclusão”; e “as ações afirmativas, a Convenção da ONU e o trabalho”. 2.1 Gestão social: muitos conceitos e muitas práticas As políticas públicas são criadas e implementadas a partir de demandas dos movimentos sociais organizados, de organizações governamentais e não governamentais e organismos internacionais. Expressando essa característica, a própria Constituição de 1988 trouxe benefícios à construção da democracia e das práticas da política de direitos humanos, cidadania, controle social e participação dos cidadãos brasileiros. No entanto, na conjuntura configurada pelo modelo neoliberal pós-Constituição, a inserção das políticas no cenário social enfrentou dificuldades operacionais marcantes na gestão da sua implementação. Tais obstáculos demarcavam-se pela lógica de um Estado Mínimo, que se mostrou ainda menor para ações voltadas para a saúde, educação e assistência social, precarizando e fragilizando os serviços que deveriam ser fornecidos pelo poder público. Esse quadro gerou pseudoimplementações de propostas estatais 31 que não se efetivavam, deixando um vácuo entre o que se pregava nos discursos governamentais e as práticas frágeis de um Estado que procurava se desresponsabilizar da sua destinação. Os estudos acerca da GS surgiram na década de 1990, em um momento histórico em que também se configuram estratégias sociais como a denominada responsabilidade social. Assim, por um lado, a intervenção social do empresariado no Brasil, como tentativa de resgate dos valores democráticos e, por outro lado, a desresponsabilização do Estado e a onda (neo) liberal do “Consenso de Washington”, na defesa de uma lógica do Estado Mínimo, do superávit primário e da não reserva de mercado, levaram a repensar o conceito de gestão pública (TENÓRIO, 2007). Desde então, o debate em torno da temática da gestão social nas organizações e na construção de políticas sociais tem sido constante e contemporâneo. A partir daí, surgiu a concepção da GS caracterizada por gerenciamento participativo, com orientação decisória compartilhada por diferentes sujeitos sociais (SILVA JÚNIOR, 2008). Na abordagem da “gestão social”, França Filho (2008, p. 29-30) concorda com esses aspectos e descreve que: Efetivamente, enquanto problemática da sociedade, a ideia de gestão diz respeito à gestão das demandas e necessidades do social. [...] E também vem sugerir desse modo que, para além do estado, a gestão das demandas e necessidades do social pode se dar via a própria sociedade, através das mais diversas formas e mecanismos de autoorganização, especialmente o fenômeno associativo. França Filho (2008, p. 32), em perspectiva complementar, entende GS como sendo: [...] modo de gestão próprio às organizações atuando num circuito que não originariamente aquele de mercado e do Estado, muito embora estas organizações entretenham, em grande parte dos casos, relações com instituições privadas e públicas, através de variadas formas de parcerias para a consecução de projetos. 32 Os estudiosos que discutem o tema, tais como Fischer (2002a), Maia (2005), Tenório (2007), Rigo et al. (2010) e França Filho (2008), afirmam que a GS está associada à gestão de políticas sociais, de organizações do terceiro setor, de combate à pobreza e, até mesmo, de gestão ambiental. Além disso, gestão social tem alicerçada em seu bojo uma gestão democrática, participativa em um processo gerencial dialógico. Ainda que, conforme esse autor, não se vislumbrem os loci da GS em empresas, as reflexões a respeito levam a considerar que as ações de responsabilidade social das empresas poderão, em médio prazo, propiciar brechas nas administrações mercadocêntricas, à luz de alguns aspectos da GS, na perspectiva de buscar atender algumas demandas específicas do social. Entretanto, considera-se que o maior desafio nessa empreitada será a quebra de paradigma ao se tentar amalgamar processos distintos em sua concepção e capacitar gestores. Maia (2005), em seu estudo precisamente intitulado “Gestão social: reconhecendo e construindo referenciais”, analisa o tema da conceituação e caracterização da gestão social de maneira dedicada e explícita. Depois de identificar uma diversidade de abordagens e concepções acerca de gestão social, Maia (2005, p. 10) apresenta os conceitos de gestão social de cinco autores, como descrito a seguir: [...] Tenório (1998), que a concebe como conjunto dos processos sociais desenvolvidos pela ação gerencial, em vista da articulação entre as suas necessidades administrativas e políticas postas pelas exigências da democracia e cidadania para a potencialização do saber e competência técnica e o poder político da população. [...] Singer (1999), por sua vez, refere que a gestão social diz respeito às ações que intervêm nas diferentes áreas da vida social para a satisfação das necessidades da população [...]. Sua perspectiva é de que a gestão social seja viabilizada através de políticas e práticas sociais articuladas e articuladoras das diversas demandas e organizações populares, universidades, entidades não governamentais e governos. Carvalho (1999) relaciona gestão social à gestão das ações públicas, viabilizadas a partir das necessidades e demandas apontadas pela população [...]. A autora dá ênfase ao protagonismo da sociedade civil, no sentido da identificação das necessidades e demandas, assim como proposição e controle de ações e políticas, a serem assumidas pelo Estado. 33 Dowbor (1999) remete a gestão social à transformação da sociedade, em que a atividade econômica passe a ser o meio e o bem-estar social o fim do desenvolvimento. Para isso, indica a necessidade da construção de um novo paradigma organizacional, a partir da redefinição da relação entre o político, o econômico e o social. [...] Fischer (2002) indica que o campo da gestão social é o campo do desenvolvimento social, que se constitui como um processo social, a partir de múltiplas origens e interesses, mediados por relações de poder, de conflito e de aprendizagem. [...] Nesta perspectiva de gestão social estão especialmente identificados como sujeitos os indivíduos, grupos e coletividades interessadas, mediados por redes ou por interorganizações. Portanto, a GS se apresenta como um novo conceito na contemporaneidade que, apesar das mais variadas versões, em alguns pontos estabelecem certa convergência: todos trazem em seu bojo um modus faciendi pautado na gestão democrática e participativa. Nesse sentido, a etimologia do termo encontra sua congruência, “o adjetivo social junto ao substantivo gestão, e se mostra entendido como o espaço privilegiado de relações sociais onde todos têm direito à fala, sem nenhum tipo de coação” (TENÓRIO, 2007, p. 10). Buscando retratar a metodologia de ação dessa modalidade de gestão, Fischer (2002a, p. 12) traz importantes contribuições ao destacar que gestão social “é um campo em construção, interativo e recursivo na relação prática-teoria-prática”. Ainda complementa que se torna importante “conhecer mais e melhor as organizações orientadas ao desenvolvimento social, bem como mapear os perfis de seus gestores” (FISCHER, 2002a, p. 12.) e questiona a respeito do significado da gestão do desenvolvimento social na agenda contemporânea. Para Fischer (2002a, p. 12), a gestão do desenvolvimento associa-se à gestão da sociedade. Salienta que, numa primeira aproximação, a gestão do desenvolvimento social pode ser vista como: Um processo de mediação social que articula múltiplas escalas de poder individual e social; que trabalha a identidade de projeto, refletindo e criando pautas culturais; que coordena interorganizações eficazes; que promove ação e aprendizagem coletiva; que se comunica e difunde resultados; 34 que presta contas à sociedade; que reavalia e recria estratégias processuais; tendo por processo, alvo e motor o desenvolvimento, considerando dimensões tangíveis e intangíveis, objetivas e subjetivas, que conformam organizações complexas e instituições (FISCHER, 2002a, p. 12). Por se referir aos processos do campo de mediação e à identidade do projeto em um processo de aprendizagem coletiva, os atores sociais encontram-se, segundo Fischer (2002b), na condição de horizontalidade diante do poder com atuação no sentido de criar espaços de governança, sobretudo por meio de uma relação dialógica, em que todos aprendem juntos, realizam a accountablility e, consequentemente, constroem e reconstroem estratégicas pautas culturais. Para vingar essa montagem, necessita da elaboração de meios e formas de governança, com participação efetiva da sociedade envolvida, configurando um “novo modelo de tecer o desenvolvimento social” (FISCHER, 2002b). Importa também comentar que Fischer (2002b), ao refletir sobre questões contundentes vinculadas à gestão do desenvolvimento social, considera-as como sendo aquelas que se referem aos processos e paradoxos destacados em cinco proposições, que conjugam plena sintonia no acorde da gestão social. A primeira proposição descrita pelo autor traz a definição de desenvolvimento social como “um processo de mediação que articula múltiplos níveis de poder individual e social”. Nessa prática de gestão sugere-se fazer algumas indagações importantes para serem avaliadas no campo de atuação: do que deve ser feito, o porquê ser feito, para quem ser feito. Como pano de fundo nesse campo de atuação, a gestão do desenvolvimento social privilegia-se do coletivo de gestores, acrescido das devidas competências para promover as transformações, considerando o protagonismo da participação comunitária, não tutelada. A segunda refere-se à gestão do desenvolvimento social como um local (organizações ou interorganizacionais) onde transitam vários conhecimentos, práticas, percepções, interações contextualizadas no agir dos seres humanos e onde será inevitável encontrar conflitos e tensões, espaço de construção de conhecimento e de aprendizagens. 35 A terceira tece considerações éticas e de valores orientados pela eficácia e pela eficiência. Indica elementos fundamentais na gestão, tais como: fluidez, agilidade, inovação, sustentabilidade, mapeamento de necessidades, delineamento de estratégias, desenvolvimento de planos, gestão de recursos humanos ou financeiros (escassos ou não), promoção da comunicação, divulgação de resultados, construindo, portanto, a identidade e a imagem da organização, prestando contas e avaliando resultados. A quarta envolve a gestão de redes e das relações sociais, que são influenciadas pelas características das pessoas e/ou gestores de acordo com suas subjetividades. A quinta faz considerações aos aspectos culturais, uma vez que a gestão do desenvolvimento social e seus gestores trazem em seu conteúdo as construções das identidades culturais. Tais proposições servem de referência para fazer uma aproximação metodológica quanto ao desejo de gestores na adoção de políticas e processos gerenciais horizontalizados. No que se refere à gestão social, Tenório (2008) apresenta uma perspectiva mais institucional, isto é, que ressalta mais o aspecto da participação social nas definições de políticas no âmbito do Estado. Nesse sentido, destacam-se as observações que Silva Júnior (2008) traduz de Carrion8, ao comentar o conceito de gestão social do autor Fernando Tenório, afirmando que essa atividade se constitui “como aquela que fomenta uma cidadania deliberativa, uma efetivação da participação do indivíduo no espaço público através da ação direta”. Para Tenório (2008 p.41), “[...] a legitimidade das decisões deve ter origem em processos de discussão, orientados pelos princípios da inclusão, do pluralismo, da igualdade participativa, da autonomia e do bem comum”. 8 CARRION, Rosinha da Silva Machado. O desafio de desenvolver competências em gestão social: relato da exeperiência com a residÊncia solidária / UFRG, 2008. 36 O mesmo autor, quanto ao campo de atuação, afirma que o conceito de gestão social “contrapõe-se à gestão estratégica à medida que tenta substituir a gestão tecnocrática, monológica, por um gerenciamento mais participativo, dialógico, no qual o processo decisório é exercido por meio de diferentes sujeitos sociais” (TENÓRIO, 2008, p. 53). Nessa medida, é definidor dizer que a gestão social não apresenta características mercadocêntricas, que priorizam, na gestão, os valores econômicos em detrimento aos valores sociais, mas, sobretudo, características que demarcam processos sociais pedagógicos de ação que propiciem a participação com o exercício coletivo da reflexão e da tomada de decisão na ótica da inclusão social. Nessa perspectiva, Gohn (2001, p. 13-14) afirma que: Ao identificar o entendimento dos processos de participação da sociedade civil e sua presença nas políticas públicas nos conduz ao entendimento do processo de democratização da sociedade brasileira; o resgate do processo de participação leva-nos, portanto, às lutas da sociedade por acesso aos direitos sociais e à cidadania. Nesse sentido, a participação é, também, luta por melhores condições de vida e pelos benefícios da civilização. Dessa forma, pode-se dizer que tais definições elucidam o eixo maior do conceito de gestão social e unem a defesa dessa concepção com base participativa para boa parte dos autores consultados. Sendo assim, constitui uma gestão que se operacionaliza no social e que tem uma posição ideológica, na qual o econômico surge como meio, e não como um fim, e que tem enraizados os princípios democráticos: de igualdade, de cidadania e participação social. Para elucidar ainda mais o objeto desta pesquisa, remete-se ao estudo de Maia (2005), que proporciona subsídios importantes para a análise do processo de gestão do FPT, a partir de suas atas, regimentos, lista de presença, pautas e entrevistas. A autora analisa as concepções de gestão social sob duas perspectivas. A primeira, que ela denomina de gestão contra o social, caracterizada pelo projeto societário do capital; e a segunda, baseada no desenvolvimento da cidadania. A 37 partir de subtemas caracterizadores do processo de gestão social, Maia (2005, p. 11) apresenta os elementos de análise e as respectivas categorias relevantes para investigar as concepções e as práticas de gestão social: a) Valores (axiologia): princípios referenciais que inspiram e dão direção às construções teórico-práticas da gestão social; b) propósitos (teleologia): finalidades ou intencionalidades para onde se quer chegar com a gestão social; c) focos (epistemologia): referências teóricas que dão sustentação à perspectiva explicativa e propositiva da gestão social; d) agentes (ontologia): pessoas e organizações que protagonizam o processo da gestão social; e) locus e metodologia (praxiologia): o locus delimita o território ou o campo de viabilização da gestão social. A metodologia constitui-se do caminho, das ideias e dos instrumentos balizadores para a viabilização da gestão social. Em seguida, Maia (2005, p. 12) elabora um quadro com a síntese das concepções dos autores por ela estudados segundo suas próprias categorias, como visto a seguir: 38 QUADRO 1 - Gestão social em construção Autor TENÓRIO Categoria Valores Democracia Cidadania Convívio resp. diferença PropóImplementar sitos processos sociais para ação gerencial em vista da democracia e cidadania Focos Administração Administração Pública Política Ciências sociais Locus Organizações governamentais e políticas públicas Agentes Trabalhadores da administração pública, População SINGER CARVALHO Vida Democracia Trabalho Direitos de cidadania Equidade Desenvolver ações para o enfrentamento às necessidades da população a partir do trabalho e renda. Economia Administração política Ciências sociais Associativismo/ Cooperativismo/ autogestão Realizar ações sociais públicas para responder as demandas das necessidades da população Ciências sociais Ciência política Economia Serviço Social Políticas econômicas Governos/ Estado Organização de trabalhadores Organizações populares ONGs Universidades Governos Projetos, programas e políticas sociais, Sociedade Estado, Redes Sociedade civil/população usuária Estado, nas diferentes esferas DOWBOR Justiça Bem-estar social Desenv. humano Democracia Transformar o desenvolvimento atividade econômica como meio e bem-estar social, fim do desenvolvimento Economia Administração ciência política teorias da educação ciências sociais Ciência jurídica Ciência tecnológica Paradigma em construção Políticas públicas Organizações estatais empresariais e da sociedade civil FISCHER Ética da responsabilidade Democracia Gerir processos sociais ou processos de desenv. social com relações de poder, conflito e aprendizagem Ciências sociais e Políticas, teoria organiz, pesquisa social História, Psicol. Administração Teorias do des. Proposta préparadigmática epistemológica e praxiológica Espaço local Organizações Interorganizações Redes Empresários Indivíduo, grupos e administradores coletividades, públicos, políticos, Estado, mercado e ONGs, sindicatos, sociedade civil pesquisadores, movimentos sociais, universidades representantes comunitários Metodo- Processos Economia Gestão em Governança Processos sociais logia sociais: solidária e outras rede Política integrada e mediações, poder, articulação estratégias Empoderamento coerente conflito e educaç. entre os atores; autogestionárias parceria Empoderamento Governança técnicas de Políticas públicas Controle Articulação entre Planejamento local gestão Projetos e social e econômico e transescalares programas O público privado, o Financiamento sociais Estado o mercado e a Redes: ações Governança sociedade civil individuais e Intersetorialidade Descentralização coletivas Transparência Negociação Organizações de Publicização aprendizagem Construção de identidade e legitimidade e efetividade social Fonte: Maia (2005, p. 12). 39 As práticas relatadas na literatura a respeito de gestão social indicam que existe uma tendência a destacar mais o seu conteúdo social e a prática de cada um desses processos do que a definição em si mesma, conforme também define França Filho (2008). Nesse aspecto, entende-se que a gestão tem a ver principalmente com a prática vivenciada pelos atores sociais, baseada nos pressupostos democráticos que a sustentam - fator preponderante de sua caracterização. Ao avaliar essas distintas perspectivas, compreende-se que se trata de um conceito que não se apresenta pronto, completo, fixo e acabado. Diante disso, compartilha-se com a concepção de Silva Júnior (2008), o qual destaca que representa: [...] um conceito em construção, emergente e inovador – como uma dimensão das organizações e práticas sociais que articula diferentes variáveis, como: interações e relações de confiança; aprendizagem e conhecimento, pessoas e tecnologias; cultura e comportamento organizacional; cooperação, domesticidade e redistribuição (SILVA JÚNIOR, 2008, p. 24). Diante da revisão realizada, constata-se que gestão social representa uma ideia polissêmica. Contudo, perante esta pesquisa será adotado o referencial construído pelo estudo de Maia (2005, p. 15-16), a qual cria o seu próprio conceito de gestão social: Assim, compreendemos gestão social como um conjunto de processos sociais com potencial viabilizador do desenvolvimento societário emancipatório e transformador. É fundada nos valores, práticas e formação da democracia e da cidadania, em vista do enfrentamento às expressões da questão social, da garantia dos direitos humanos universais e da afirmação dos interesses e espaços públicos como padrões de uma nova civilidade. Construção realizada em pactuação democrática, nos âmbitos local, nacional e mundial; entre os agentes das esferas da sociedade civil, sociedade política e da economia, com efetiva participação dos cidadãos historicamente excluídos dos processos de distribuição das riquezas e do poder. Estes referenciais apontam a práxis da gestão social, enquanto mediação para a cidadania, que se contrapõe à perspectiva instrumental e mercantil que vem sendo dada a este tema. De todo modo, essa conceituação aproxima-se de algo contíguo à utopia que deve ser construída historicamente pelos sujeitos sociais, por meio das 40 possibilidades de um estado democrático de direito. Tal questão é parte integrante das conquistas para a cidadania plena e participativa. Mediante isso, a pesquisadora também procura referenciar o estudo de Gondim, Fischer e Melo (2006, p. 48), que entendem gestão social como: [...] um ato relacional capaz de dirigir e regular processos por meio da mobilização ampla de atores na tomada de decisão (agir comunicativo), que resulte de parcerias intra e interorganizacionais, valorizando as estruturas descentralizadas e participativas, tendo como norte o equilíbrio entre a racionalidade instrumental (com relação a fins) e a racionalidade substantiva (com relação a valores), para alcançar, enfim, um bem coletivamente planejado, viável e sustentável a médio e longo prazo. Esse ato, no aspecto da participação e da mobilização, traduz as demandas e necessidades de grupos que, por meio de parcerias, redes e das relações intra e extraorganizacionais de gestão social, pautam seus objetivos comuns no alcance da inclusão social e sustentável. Ainda no que se refere à questão da participação em conselhos, tal como fóruns, outro aspecto diz respeito à qualidade dessa participação, ressaltando a natureza de articulação entre Estado e sociedade e a tradução de participar em deliberar sobre políticas públicas (AVRITZER, 2010, p. 139). Ou seja, é necessário avaliar o quanto da teoria democrática deliberativa de representação se estabelece nas experiências concretas. Como o FPT dedica-se a promover ações voltadas para a inserção de PCD no mercado de trabalho, torna-se importante estudar como as sociedades lidaram e lidam com esses seres humanos. 2.2 Da exclusão para a inclusão A exclusão, que envolve diferentes processos produtores de preconceito e de segregação aos direitos e à cidadania das PCDs, não fez parte da agenda das 41 políticas públicas no Brasil e no mundo, apesar de as PCD terem os mesmos direitos das pessoas sem deficiência. Como descreve Sassaki (1999), a inclusão social das PCDs é um movimento mundial que se intensificou no Brasil e no mundo a partir da década de 90, tendo a ver com a mudança de entendimento do ponto de vista social, legal, ético, educacional, cultural e dos direitos humanos sobre a diferença e a deficiência. No Brasil, esse processo se materializa com os movimentos organizados “de” e “para” PCDs que buscam a defesa dos seus direitos nos mais diferentes setores da sociedade. Ressalta-se, também, que a “imagem social positiva”9 que se constrói quanto à condição de vida dessas pessoas, o avanço das “ajudas técnicas ou tecnologias assistivas”10, os marcos legais e a democracia participativa instituída no país foram pontos fortes nessa ressignificação. A trajetória histórica dessa temática permite identificar quatro estágios diferenciados em relação à forma como as PCDs eram vistas e tratadas na sociedade. Nesse contexto, Sassaki (1999, p. 16) explica que: A sociedade, em todas as culturas atravessou diversas fases no que se refere às práticas sociais. Ela começou praticando a exclusão social de pessoas que – por causa das condições atípicas – não lhe pareciam pertencer à maioria da população. Em seguida, desenvolveu o atendimento segregado dentro das instituições, passou para a prática da integração social e, recentemente, adotou a filosofia da inclusão social para modificar os sistemas sociais gerais. Embora se tenha certa clareza de que a história não seja linear e evidencie retrocessos, recuos e avanços, pode-se falar de momentos diferenciados, que vão desde a inclusão marginal (MARTINS, 1997) ou abandono dessas pessoas, até diferentes tentativas de inserção social e cidadã. Assim, durante longo período 9 Imagem social positiva: termo utilizado nos movimentos sociais. Tecnologia assistiva ou ajudas técnicas: elementos que permitem compensar uma ou mais limitações funcionais motoras, sensoriais ou mentais da pessoa com deficiência, com objetivo de lhe permitir superar as barreiras da comunicação e da mobilidade e de possibilitar sua plena inclusão social (BRASIL, 2009a). 10 42 predominou o padrão da exclusão. De acordo com Sawaia et al. (1999, p. 9), a exclusão apresenta: [...] processo complexo e multifacetado, uma configuração de dimensões materiais, políticas, relacionais e subjetivas. É um processo sutil e dialético, pois só existe em relação à inclusão como parte constitutiva dela. Não é uma coisa ou estado, é processo que envolve o homem por inteiro e suas relações com os outros. Não tem uma única forma e não é uma falha do sistema, devendo ser combatida como algo que perturba a ordem social, ao contrário, ela é produto do funcionamento do sistema. Em determinadas culturas “arcaicas”, era comum o hábito de abandonar idosos, doentes e deficientes, como uma prática que eliminava pessoas com deficiências físicas e mentais para que não acompanhassem o grupo na luta. Outra atitude verificada diante dessas pessoas foi o cuidado e a proteção, caracterizado como fase da segregação. Nesse aspecto, Aranha (2003, p. 15-16) apresenta os seguintes comentários relativos à segregação: Esse paradigma constituiu prática corrente e corriqueira, em nossa realidade, até a década de 1980, momento em que se iniciou a crítica à instituição e a rejeição da exclusão de minorias diversas. Os efeitos das mudanças nas políticas de saúde após 1964 começaram a se fazer visíveis, abrindo caminho para o paradigma de serviços. A mudança de valores e de ação passou a se manifestar pela quase segregação, representada pela mudança de natureza das instituições já existentes ou pela criação de novas entidades, agora de prestação de serviços. Em seguida, do ponto de vista analítico, emerge a fase nomeada de integração social, na qual imperava o tratamento por meio de centros de reabilitação, procurando prepará-las para se integrar à comunidade. Esse padrão, então, caracteriza-se como modelo médico de caráter funcionalista. E nesse sentido e âmbito, Sassaki (1999, p. 43) esclarece que: Algumas pessoas utilizam as palavras integração e inclusão, já em conformidade com a moderna terminologia da inclusão social, ou seja, com sentidos distintos – a integração significando “inserção da pessoa deficiente preparada para conviver na sociedade” e a inclusão significado “modificação da sociedade como pré-requisito para a pessoa com necessidades especiais buscar seu desenvolvimento e exercer a cidadania”. 43 Contudo, pelo menos como ideal a ser alcançado, na última década vem se consolidando o quarto modelo, o da inclusão social e da garantia de direitos, indicando principalmente a superação das dificuldades que cercam as pessoas com deficiência. Nesse sentido, o mesmo autor conceitua o quarto modelo como [...] “a inclusão social como o processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir, em seus sistemas sociais gerais, pessoas com necessidades especiais e, simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na sociedade” (SASSAKI, 1999, p. 41). Ressalta-se que o modelo da sociedade inclusiva foi lançado em 1981 pela ONU, quando realizou o Ano Internacional das Pessoas com Deficiência. Nessa época oficializou-se o reconhecimento dos direitos das PCDs. Na sequência, destacam-se a proposta da Década das Nações Unidas para as Pessoas Portadoras de Deficiência (1983-1992), a Declaração de Salamanca (1994) e, em 1997, a Conferência Internacional Uma Sociedade para Todos: Inclusão – Participação, realizada na Noruega. Por outro lado, mesmo no que se refere às denominações apostas às PCDs, podem-se observar formas de segregação. Em distintas culturas se verificam várias denominações em relação à PCD. Em geral, foram nomeados por termos desqualificantes, tais como: mancos, pernetas, ceguinhos, descapacitados, pessoa especial, minorado, deficiente, inválidos e excepcionais, inclusive no meio acadêmico, contribuindo negativamente para a imagem e a representação desses sujeitos. A busca dos significados, dos conceitos e a discordância da terminologia faziam com que os movimentos sociais indicassem, claramente, como a visão da sociedade era permeada de conceitos baseados no senso comum. A partir de 22 de fevereiro de 2011, entretanto, o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência (CONADE), por meio da Resolução nº 1, de 15 de outubro de 2010, publicada em 22 de fevereiro de 2011 (BRASIL, 2011c), recomendou oficialmente a substituição da expressão "pessoas portadoras de 44 deficiência" por "pessoas com deficiência", consagrando uma decisão que já vinha sendo consolidada desde o final da década de 1990. Apesar dos conceitos de normalidade e anormalidade frequentemente utilizados, poucas pessoas conseguem claramente indicar os limites do que é normal ou anormal, em distintas culturas. Telford e Sawrey (1988, p. 24) fazem uma importante explanação sobre esses conceitos e destacam os seguintes pontos: O que é normal e o que é anormal no comportamento e desenvolvimento humano? O que determina se um indivíduo é comum ou incomum, normal ou excepcional? Excepcionalidade e anormalidade são conceitos populares, com significados variáveis. Exceto enquanto definidos operacionalmente para alguns fins administrativos ou de pesquisa, terão sempre que ser compreendidos no contexto social específico em que são empregados. A mesma imprecisão dos significados também imperava nas questões sociais, não só no que se refere a esse segmento, mas também a outros, tais como: menor infrator, portador de doenças, entre outros. Rotulações e estigmatizações são fatores preponderantes para que haja discriminação por meio dos mecanismos de linguagem utilizados e que podem produzir significados diversos com dimensões distorcidas da realidade, levando a uma esteriotipia do sujeito, conforme citado a seguir: [...] a categorização e a estereotipização das pessoas são traços universais da intenção social. Os estereótipos têm sido genericamente considerados como males a serem erradicados e são usualmente retratados como "imagens mentais" incorretas, que distorcem a percepção e alimentam relações sociais distorcidas entre as pessoas. As categorias sociais e os estereótipos podem impedir a percepção e conhecimento do outro como indivíduo singular, a ser avaliado por seus méritos, como fica ilustrado pelas profecias autocumpridoras (TELFORD; SAWREY, 1988, p. 62- 63). Entretanto, com a Constituição de 1988 e com o processo democrático que ocorreu no país, paulatinamente os movimentos sociais e a disposição da sociedade foram direcionados para a construção de uma sociedade igualitária, equânime e mais justa para todos. No processo de inserção da PCD na sociedade, modelos integrativos – em que apenas a pessoa se esforça para ser inserida na sociedade – não contemplam 45 satisfatoriamente os direitos das PCDs, uma vez que a integração pouco ou nada exige da sociedade quanto à mudança de atitudes, de espaços físicos e de objetos, ou mesmo de práticas sociais. Segundo Sassaki (1999), essa integração resulta de esforços de indivíduos, não de transformações sociais, pois ocorrem: Pela inserção pura e simples daquelas pessoas com deficiência que conseguiram ou conseguem, por méritos pessoais e profissionais próprios, utilizar os espaços físicos e sociais, bem como seus programas e serviços, sem nenhuma modificação por parte da sociedade, ou seja, da escola comum, da empresa comum, do clube comum, etc. (SASSAKI, 1999, p. 34). Nesse modelo, a sociedade não se propõe como parceira da PCD, no sentido de acolhê-la e de criar-lhe condições, tendo em vista suas características, necessidades e especificidades. Parte-se de uma visão isolacionista (MORIN, 1996) que concebe o indivíduo desconexo da sociedade. Assim, o conceito de PCDs se ressignifica à luz da inclusão e da diversidade como processo social. Mostra que a deficiência não está na pessoa, mas, sobretudo, nas relações sociais e na capacidade de a sociedade se preparar para acolher essas pessoas e principalmente proporcionar-lhes acessibilidade para a construção de uma sociedade para todos, independentemente da identidade de gênero, orientação sexual, raça, etnia, origem, religião, condição de saúde física, mental, condição econômica e de classe social. Conforme a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, versão comentada (BRASIL, 2008, p. 47), todo tipo de preconceito deve ser erradicado: É urgente a erradicação tanto do preconceito quanto do tratamento especial existente para essa parte da população, devendo prevalecer à igualdade. Para isso, é preciso discutir, apresentar e combater os estereótipos, as práticas nocivas em relação às pessoas com deficiência, em todos os espaços da vida. Para ilustrar, em muitos casos é preciso reafirmar que o problema é a porta estreita, a presença da escada, a falta de audiodescrição ou legenda oculta e não a presença daquela pessoa com deficiência. Conforme Lafer (1998 apud CORRÊA, 2002), na abordagem de Arendt, “a condição humana básica – o direito a ter direitos – significa pertencer, pelo 46 vínculo da cidadania, a algum tipo de comunidade juridicamente organizada e viver numa estrutura em que se é julgado por ações e opiniões, por obra do princípio da legalidade” (LAFER, 1998 apud CORRÊA, 2002, p. 219). Essas reflexões e reivindicações indicam que as pessoas realmente devem ter direito a ter direitos. Embora muitos deles ainda não tenham sido garantidos, caminhos estão sendo trilhados e conquistados, sinalizando a promoção, a garantia e mesmo a prospecção desses mesmos direitos a: saúde, educação, trabalho e emprego, lazer, cultura, padrão de vida, proteção social, esporte, acessibilidade, habitação, transporte, privacidade, acesso à justiça, à segurança e à informação, enfim, às condições de igualdade e não discriminação e qualidade de vida independente para uma sobrevivência digna, decente e, sobretudo, inclusiva. Nessa perspectiva, faz-se necessário um novo modelo que, conforme Sassaki (1999, p. 17), corresponde ao: [...] modelo social da deficiência, segundo o qual os problemas da pessoa com deficiência não estão nela tanto quanto estão na sociedade, pois é na sociedade que existem os verdadeiros problemas como, por exemplo: os preconceitos que rejeitam a minoria e todas as formas de diferenças, os ambientes físicos restritivos, os discutíveis padrões de normalidade, os objetos e outros bens fisicamente inacessíveis, os prérequisitos destinados apenas à maioria aparentemente homogênea, a quase total desinformação sobre as deficiências e sobre os direitos e as práticas discriminatórias em praticamente todos os setores da atividade humana. Contudo, a prática social da autora tem demonstrado obstáculos na implementação dessa percepção do problema e é, nesse sentido, que nesta pesquisa se propôs a discutir os limites e as possibilidades de um fórum de entidades públicas e privadas dedicado a subsidiar o emprego de PCD, portanto, com atuação relacionada à política de cotas. Levando em consideração esses padrões ou estágios da abordagem social das PCDs, brevemente assinalados, remete-se à discussão para a legislação nacional recente, lembrando que tais normas legais assentam-se nos modelos de integração e de inclusão social, da classificação de Sassaki (1999). A estrutura 47 legal e normativa condiciona e, no caso de alguns atores, até mesmo impulsiona à participação no FPT. Daí a necessidade de se conhecer minimamente o arcabouço legal do Brasil no que se refere à PCD. 2.3 Alguns aspectos da legislação nacional Muitas foram as leis e normas que demarcaram os direitos, as garantias e a visibilidade das PCDs. Entretanto, destaca-se entre elas a Lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989 (BRASIL, 1989), denominada Política Nacional para as Pessoas com Deficiência. Ela foi o principal documento orientador da “integração social” desse grupo no Brasil e importante ponto de partida na defesa dos direitos das PCDs. Nesse documento são estabelecidas as normas que asseguram os direitos individuais e sociais, reconhecimento da igualdade de tratamento e oportunidade, da justiça social e do respeito à dignidade da pessoa humana. Esses valores, questões contundentes para a garantia de cidadania plena das PCDs, passam a ser asseguradas em Lei. Do ponto de vista legal, possibilita-se a instalação de um novo paradigma, alçando as PCDs de incapacitados e desprovidos de direitos para o patamar de sujeitos de direitos. Além disso, por essa lei, a Coordenadoria Nacional para a Integração de Pessoas Portadoras de Deficiência (CORDE) institui a tutela jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplina a atuação do Ministério Público (MP) e define crimes. Abordando as diversas políticas públicas necessárias para o segmento, destaca-se que essa foi a lei que reconheceu, às pessoas deficientes, o possível e tão almejado status de cidadão. Tal legislação apresenta as possibilidades de apoio às PCDs e sua integração social, ainda que hoje esse conceito esteja ultrapassado e não mais seja válido. Tal razão justifica-se por ter esse modelo vigorado durante as décadas em que se trabalhava em uma perspectiva de inclusão marginal ou precária. 48 No contexto da legislação nacional, outra lei que também foi um divisor de águas na política das PCDs no Brasil foi o Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1989 (BRASIL, 1999), que regulamenta a Lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989 (BRASIL, 1989), e expõe sobre a Política Nacional de Integração da Pessoa com Deficiência, bem como consolida as normas de proteção. Esse decreto de fato contribuiu para impulsionar as ações de colocação profissional da PCD no país e, como consequência, pressionou os órgãos competentes de fiscalização a assumirem de forma mais contundente a responsabilidade fiscalizadora de suas ações. Todavia, a prática social tem demonstrado lacunas na efetivação desses direitos, como se pretende discutir neste trabalho. Já o artigo 93 da Lei nº 8.213 de 24 de julho de 1991 (BRASIL, 1991a) estabelece que: “A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, na seguinte proporção: I - até 200 empregados....................................................................2%; II - de 201 a 500...............................................................................3%; III - de 501 a 1.000...........................................................................4%; IV - de 1.001 em diante. ..................................................................5%. § 1º A dispensa de trabalhador reabilitado ou de deficiente habilitado ao final de contrato por prazo determinado de mais de 90 (noventa) dias, e a imotivada, no contrato por prazo indeterminado, só poderá ocorrer após a contratação de substituto de condição semelhante. § 2º O Ministério do Trabalho e da Previdência Social deverá gerar estatísticas sobre o total de empregados e as vagas preenchidas por reabilitados e deficientes habilitados, fornecendo-as, quando solicitadas, aos sindicatos ou entidades representativas dos empregados” (BRASIL, 1991a). Apesar de datar de 1991, a chamada “Lei de Cotas” permaneceu em larga medida letra morta até a edição do Decreto nº 3.298/1999. O Benefício de Prestação Continuada, denominado BPC, foi instituído por meio da Lei nº 8.742/93 (BRASIL, 1993) e disciplinou a assistência social às pessoas idosas e às pessoas com deficiência. Segundo Sposati (2004, p. 79-80): 49 A Lei nº 8.742/93 disciplinou a assistência social e, em especial, o denominado Benefício de Prestação Continuda, destinado às pessoas idosas e às portadoras de deficiência, na forma que especifica. A natureza jurídica de benefício assistencial impõe que aquele que o recebe não tenha direito a nenhum outro benefício previdenciário, e, em caso de seu falecimento, não haverá direitos à pensão por morte ou auxílio-funeral, prestações que têm natureza previdenciária. E mais, sua natureza jurídica não impede o beneficiário de receber assistência médica no âmbito da seguridade social. A própria Lei nº 8.742/93 e o decreto que regulamentou definem o que seja família, bem como pessoa portadora de deficiência, famílias incapazes de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa. O artigo 20 da referida lei criou duas condições para o recebimento do benefício: para as pessoas com deficiência exigiu que comprovassem a incapacidade para a vida independente e para o trabalho. E para ambos – idosos e portadores de deficiência – estipulou que só tem direito aquele que comprovar renda per capita familiar inferior a um quarto do salário mínimo. A comprovação da idade não acarreta grandes dificuldades. Já com relação à prova da deficiência, a Lei nº 8.742/93 e o decreto que a regulamentou fixaram que o interessado será submetido a uma avaliação por equipe médica, da qual deverá resultar um laudo, que será o documento comprobatório da deficiência. A autora também afirma que “[...] sua natureza jurídica não impede o beneficiário de receber assistência médica no âmbito da seguridade social” (SPOSATI, 2004, p. 80). Ainda ressalta que, no artigo 20, a mesma lei criou condições para o recebimento do benefício por parte das PCDs, exigindo que seja comprovada a incapacidade para a vida independente e para o trabalho. Tanto para os idosos quanto para as PCDs, foi estipulado comprovar renda per capita familiar inferior a um quarto do salário mínimo. Tal legislação deixa claro quem é de fato o beneficiário da assistência, que, a nosso ver, estabeleceu um patamar mínimo de cobertura. Por outro lado, deparase com certa tensão entre a questão de receber ou não o BPC, uma vez que, caso a PCD volte a trabalhar e ser produtiva, tal benefício deve ser cessado, mesmo sem a garantia de que o emprego perdurará ou que outra relação de emprego possa ser conquistada. Alguns empregadores argumentam que esse benefício diminui ainda mais o grupo de trabalhadores disponíveis para a inclusão produtiva. Em 26 de janeiro de 2001, foi regulamentada a Instrução Normativa nº 20, sobre os procedimentos a serem adotados pela fiscalização do trabalho das PCDs, dando finalmente competência aos Auditores Fiscais do Trabalho (AFT) e 50 orientação necessária para a fiscalização do cumprimento da Lei nº 8.213/91 (BRASIL, 1991a). Ainda vinculada à questão da inserção laboral das PCDs, o Decreto nº 3.956 de outubro de 2001 (BRASIL, 2001) promulga a Convenção Interamericana para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas com Deficiência. Esse documento representa importante instrumento que possibilita medidas de proteção contra as mais variadas formas de preconceito e discriminação vivenciadas por esse segmento. Além disso, no que se refere ao princípio de reconhecer o cenário social da deficiência e a sua especificidade, outro aparato legal relevante é o Decreto nº 5.296, de 2 de dezembro de 2004 (BRASIL, 2004), que regulamenta a Lei 10.048, de 8 de novembro de 2000 (BRASIL, 2000a), a qual dá prioridade de atendimento às PCDs. Junto a isso, a Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000 (BRASIL, 2000b), estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das PCDs ou com mobilidade reduzida. O decreto de acessibilidade emancipa a PCD porque, por meio da acessibilidade, o direito de ir e vir lhe é assegurado. Portanto, esse decreto tornou-se a principal ferramenta de efetivação do proposto na Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência – versão comentada (2008), que ressalta a importância de meios. [...] para que as pessoas com deficiência atinjam sua autonomia em todos os aspectos da vida, o que demonstra uma visão atualizada das especificidades dessas pessoas, que buscam participar dos meios mais usuais que a sociedade em geral utiliza para funcionar plenamente nos dias de hoje, não se reduzindo apenas ao meio físico (BRASIL, 2008, p. 50). A Convenção sobre os Direitos das PCDs - fruto da mobilização dos movimentos sociais desse grupo social, apoiados pela Rede Latino-Americana de ONGs de PCD e suas famílias – traz a cabo um novo tratado temático de direitos humanos que inclui esses sujeitos. Durante a Conferência sobre racismo em Durban, 2001, o México adotou esses princípios de enfrentamento a ações discriminatórias contra esse público. 51 Essa convenção foi incorporada no ordenamento jurídico brasileiro como norma constitucional, publicada no Diário Oficial da União de 10/07/2008, por meio do Decreto nº 6.949 de 25 de agosto de 2009 (BRASIL, 2009b), o qual determina que seja cumprida, e traz como propósitos: “promover, proteger e assegurar o exercício pleno e equitativo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência e promover o respeito à dignidade inerente”. A Convenção (BRASIL, 2010, p. 22) traz também um novo conceito de quem são esses sujeitos: [...] aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas (BRASIL, 2010, p. 22). Nesses parâmetros, observa-se que esse instrumento traz alguns avanços nas características pertinentes à vida participativa desse segmento social. Segundo a Convenção: a) O respeito pela dignidade inerente, a autonomia individual, inclusive a liberdade de fazer as próprias escolhas, e a independência das pessoas; b) A não discriminação; c) A plena e efetiva participação e inclusão na sociedade; d) O respeito pela diferença e pela aceitação das pessoas com deficiência como parte da diversidade humana e da humanidade; e) A igualdade de oportunidades; f) A acessibilidade; g) A igualdade entre homem e a mulher; h) O respeito pelo desenvolvimento das capacidades das crianças com deficiência e pelo seu direito de preservar a sua identidade. (BRASIL, 2010, p. 22). Esses princípios balizarão a formatação de políticas públicas no país, contribuindo para uma visão mais responsável da sociedade que irá receber e acolher as PCDs. Esses mesmos princípios também oferecem referências para o debate e a construção da proposta de inclusão produtiva de PCD. O breve percurso histórico apresentado até aqui revela que o Brasil tornou-se signatário de uma legislação atual que não só cria novos direitos, mas, sobretudo, reconhece o panorama social da deficiência e sua particularidade, conferindo materialidade a um arcabouço de direitos até então negados às PCDs. 52 O modelo social da deficiência, no qual a Convenção se apoia, representa um conceito em evolução e resulta da interação entre PCDs e as barreiras encontradas na vida social, as quais impedem a possibilidade e efetiva participação dessas pessoas na sociedade em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. É importante ressaltar que o processo de inclusão social das PCDs depende de corresponsabilidade da sociedade na criação de mecanismos que facilitem a vida da PCD em suas mais diversas características. No entanto, a realidade se confirma de maneira distinta, já que esses sujeitos encontram formas de “inclusão marginal”11 quanto à inserção no mundo do trabalho. 2.4 Alguns outros obstáculos à inclusão O processo de crescente inclusão social das PCDs não ocorre sem percalços. No caso da inserção laboral, constata-se que existem ofertas de emprego para as PCDs das mais diversas categorias profissionais, e que não são preenchidas. Presencia-se, dessa maneira, acentuada exigência das empresas quanto ao nível de escolaridade desse segmento, que viveu, e vive, a exclusão educacional devido às mais variadas barreiras. Conforme afirma Clemente (2003, p. 61): Todas as barreiras para atingir o mercado são formadas por fatores externos. A mais grave delas é também a que está mais diretamente envolvida com o próprio portador de deficiência: a falta de escolaridade. Grande parte das empresas exige, em seu processo de seleção, que os candidatos a qualquer cargo tenham, no mínimo, o Ensino Médio, condição que ainda não foi alcançada pela maioria das pessoas portadoras de deficiência (PPDs). É corrente a cobrança dos empregadores quanto à qualificação desses trabalhadores, conforme Batista (2004, p. 74) assinala: 11 Inclusão marginal: termo utilizado por José de Souza Martins (1997, p. 37). 53 No entanto, a inclusão no trabalho da pessoa portadora de deficiência possui um agravante, que é a falta de qualificação adequada. Os cursos de profissionalização, em sua maioria, foram ofertados pelas organizações da sociedade civil (OSCs) especializadas, mais uma vez para atender à demanda e à falta destes serviços pelo Estado ou pelo mercado. O quadro histórico evidencia que os ambientes segregativos dificultaram e, em certa medida, comprometeram a capacitação profissional desse público. A escola, na perspectiva inclusiva, pode contribuir para a qualificação profissional das PCDs, uma vez que o mercado se configura em quadros de competitividade acentuada. Oliveira (2000) também destaca que: Nesse atual contexto da globalização mundial e suas relações planetárias, em que as mudanças na base tecnológica e do processo produtivo ocorreram numa velocidade astronômica, a educação consolida-se como um vetor estratégico para o desenvolvimento dos povos. A educação torna-se, portanto, como o maior recurso que se dispõe para enfrentar essa nova estruturação mundial. Só através de uma educação de qualidade para todos poder-se-á construir uma sociedade de cidadãos produtivos, participativos e responsáveis, capazes de responder e refletir de maneira autônoma em relação à mudança dessa sociedade contemporânea (OLIVEIRA, 2000, p. 65). Entretanto, a baixa escolaridade representa uma realidade não só das PCDs. Assim, oportunizar cursos de qualificação e capacitação para essa população constitui uma perspectiva favorável para a profissionalização das PCDs. Por outro lado, deve-se considerar Pastore (2000), quando afirma que: A educação sozinha não é garantia de emprego. Mas ela ajuda as pessoas a se empregarem, manterem-se empregadas e a mudarem de emprego. Na grande massa de desempregados da região da Grande São Paulo, onde o desemprego ultrapassou a casa dos 20% no final da década de 1990, pela metodologia do [Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos] DIEESE-SEADE, que leva em conta também a informalidade, havia apenas 3,5% de pessoas formadas em faculdade. Nessa massa, quase 50% dos desempregados não tinham completado o primeiro grau (PASTORE, 2000, p. 79). Todavia, essa realidade de exigências de qualificação às PCDs não se apresenta de maneira linear. Algumas empresas vêm respondendo a esse desafio e 54 realizam com sucesso alguns programas específicos, fazendo coro às práticas de responsabilidade social empresarial12. Segundo Lyth (1973 apud PASTORE, 2000, p. 61), “os empregadores inclinados a contratar portadores costumam recuar quando têm de enfrentar as despesas e os problemas gerados pelo seu emprego em ambientes de não portadores de deficiência, e que nem sempre aceitam bem o trabalho daqueles”. Aqui se verifica uma tensão entre o prescrito na lei e a realidade apresentada. Na verdade, a inclusão produtiva de PCD poderá aliviar as contas da Previdência Social, com a volta de trabalhadores acidentados reabilitados à atividade econômica remunerada, assim como as da assistência que vem oferecendo BPCs a cidadãos que possuem potencial para o trabalho. Em vez de serem classificados na categoria de pessoas incapacitadas para o trabalho, e superado o receio de perder a garantia do benefício de um salário mínimo, a PCD passaria à condição de empregado, auferindo rendimento do trabalho. Tais dados e análises ajudam a entender, em certa medida, como esse problema necessita ser mais debatido e pesquisado no âmbito das políticas públicas. No próximo item, tentar-se-á abordar a relação das ações afirmativas e da Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência com o trabalho e a inserção produtiva. 2.5 As ações afirmativas, a Convenção da ONU e o trabalho O movimento internacional pela promoção dos Direitos Humanos vem envidando esforços no sentido de criar novas condutas e incentivar o fim da discriminação. Prática utilizada no contexto mundial, a ação afirmativa tem origem nos Estados Unidos, nos anos 60, como tema principal na questão da igualdade com vistas à promoção da equidade. 12 Ver Garcia (2010), por exemplo. 55 Também se encontram na literatura pesquisada designações semelhantes e afins, tais como política de cotas, discriminação positiva, reserva de vagas, ação compensatória, entre outros. Nesse curso, com processo de redemocratização no Brasil, a expressão “ação afirmativa” entra no cenário de discussões como forma de enfrentamento às desigualdades de determinados segmentos, em consonância com os objetivos constitucionais. Para Gugel (2007, p. 46; 47), “[...] o direito à igualdade correlaciona a igualdade e a discriminação: ‘veda a discriminação’ quando o resultado do ato gera tratamento desigual; ‘indica a discriminação’ para compensar desigualdades de oportunidade e tratamento”. Nesse sentido, Gugel (2007, p. 55) define ação afirmativa como “[...] a adoção de medidas legais e de políticas públicas que objetivam eliminar as formas e tipos de discriminação que limitam oportunidades de determinados grupos sociais”. Essa definição indica a possibilidade de devolver, ou pelo menos resgatar, a condição de igualdade inerente à pessoa humana. No tocante às PCDs, as políticas de ações afirmativas vêm permitindo o acesso a bens e serviços da comunidade, dos quais foram habitualmente alijadas ao longo da história. Uma primeira norma legal de “discriminação positiva” para o mercado de trabalho, responsável pela reserva de vagas de postos de trabalho na administração pública e privada, destinada às PCDs está prevista na Lei n° 7.853/89 (BRASIL, 1989), conhecida como a Lei da CORDE que estabelece, em seu art.2º. “Ao poder público e seus órgãos cabe assegurar às pessoas portadoras de deficiência o pleno exercícios de seus direitos básicos, inclusive dos direitos à educação e à saúde, ao trabalho, ao lazer, à Previdência Social, ao amparo à infância e à maternidade, e de outros que, decorrentes da Constituição e das leis, propiciem seu bem-estar, social e econômico. [...] d) a adoção de legislação específica que discipline a reserva de mercado de trabalho, em favor das pessoas portadoras de deficiência, nas entidades da administração pública e do setor privado, e que regulamente a organização de oficinas e congêneres integradas ao mercado de trabalho, e a situação, nelas, das pessoas portadoras de deficiência”. 56 Ainda que a referida lei tenha seu atributo compensatório para as PCDs e sua inserção produtiva, Ragazzi (2008) comenta que as normas adotadas tiveram tímidas respostas do mercado de trabalho. Acredita-se que tal situação tenha sido decorrente da ausência de fiscalização e de estímulos a instituições que viabilizassem, de forma efetiva, a habilitação, reabilitação e inserção desses indivíduos no mercado de trabalho. Também estava pouco elucidado o conceito legal de quem era esse sujeito com deficiência a ser inserido no mercado de trabalho. Posteriormente, o Decreto nº 3.298/99 (BRASIL, 1999), em seu artigo 4º, especifica quem é a pessoa considerada com deficiência. “Art. 4º É considerada pessoa portadora de deficiência a que se enquadra nas seguintes categorias: I - deficiência física - alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, amputação ou ausência de membro, paralisia cerebral, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções; II - deficiência auditiva - perda parcial ou total das possibilidades auditivas sonoras, variando de graus e níveis na forma seguinte: a) de 25 a 40 decibéis (DB) - surdez leve; b) de 41 a 55 DB - surdez moderada; c) de 56 a 70 DB - surdez acentuada; d) de 71 a 90 DB - surdez severa; e) acima de 91 DB - surdez profunda; e f) anacusia; III - deficiência visual - acuidade visual igual ou menor que 20/200 no melhor olho, após a melhor correção, ou campo visual inferior a 20º (tabela de Snellen), ou ocorrência simultânea de ambas as situações; IV - deficiência mental - funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como: a) comunicação; b) cuidado pessoal; c) habilidades sociais; d) utilização da comunidade; e) saúde e segurança; f) habilidades acadêmicas; g) lazer; e h) trabalho; V - deficiência múltipla - associação de duas ou mais deficiências”. Ragazzi (2008, p. 7885) ainda descreve que: 57 Ao auditor fiscal incumbe a tarefa de fiscalizar o cumprimento do referido termo. Em não cumprido, deverá encaminhar relatório ao delegado regional do trabalho para remessa ao Ministério Publico do Trabalho e esse passará a um processo investigatório, no que a empresa é convidada a firmar termo de ajuste de conduta com prazo razoável de 1 (um) a 2 (dois), anos para cumprimento de preenchimento de vagas sob pena de multa que será revertida ao fundo de amparo ao trabalhador, fundo este previsto na Lei nº 7.853/89. Na atualidade, no caso da inserção laboral das PCDs, a política de ações afirmativas se materializa por meio da Lei de Cotas, que desde 1991 faz parte de nosso arcabouço legal. No entanto, somente com a implementação da norma regulamentadora em 1999, pelo Decreto nº 3.298 (BRASIL, 1999), passou a ser instituído um forte instrumento de fiscalização para aplicação dessa lei, que vem ampliando espaços para a valorização profissional das PCDs. A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (BRASIL, 2010) traz elementos importantes para se pensar a inclusão produtiva das PCDs. 1. Os Estados-Partes reconhecem o direito das pessoas com deficiência ao trabalho, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas. Esse direito abrange o direito à oportunidade de se manter com um trabalho de sua livre escolha ou aceitação no mercado laboral, em ambiente de trabalho que seja aberto, inclusivo e acessível a pessoas com deficiência. Os Estados-Partes salvaguardarão e promoverão a realização do direito ao trabalho, inclusive daqueles que tiverem adquirido uma deficiência no emprego, adotando medidas apropriadas, incluídas na legislação, com o fim de, entre outros: a) Proibir a discriminação baseada na deficiência com respeito a todas as questões relacionadas com as formas de emprego, inclusive condições de recrutamento, contratação e admissão, permanência no emprego, ascensão profissional e condições seguras e salubres de trabalho; b) Proteger os direitos das pessoas com deficiência, em condições de igualdade com as demais pessoas, às condições justas e favoráveis de trabalho, incluindo iguais oportunidades e igual remuneração por trabalho de igual valor, condições seguras e salubres de trabalho, além de reparação de injustiças e proteção contra o assédio no trabalho; c) Assegurar que as pessoas com deficiência possam exercer seus direitos trabalhistas e sindicais, em condições de igualdade com as demais pessoas; d) Possibilitar às pessoas com deficiência o acesso efetivo a programas de orientação técnica e profissional e a serviços de colocação no trabalho e de treinamento profissional e continuado; e) Promover oportunidades de emprego e ascensão profissional para pessoas com deficiência no mercado de trabalho, bem como assistência na procura, obtenção e manutenção do emprego e no retorno ao emprego; (f) Promover oportunidades de trabalho autônomo, empreendedorismo, desenvolvimento de cooperativas e estabelecimento de negócio próprio; g) Empregar pessoas com deficiência no setor público; 58 h) Promover o emprego de pessoas com deficiência no setor privado, mediante políticas e medidas apropriadas, que poderão incluir programas de ação afirmativa, incentivos e outras medidas; i) Assegurar que adaptações razoáveis sejam feitas para pessoas com deficiência no local de trabalho; j) Promover a aquisição de experiência de trabalho por pessoas com deficiência no mercado aberto de trabalho; k) Promover reabilitação profissional, manutenção do emprego e programas de retorno ao trabalho para pessoas com deficiência. 2. Os Estados-Partes assegurarão que as pessoas com deficiência não serão mantidas em escravidão ou servidão e que serão protegidas, em igualdade de condições com as demais pessoas, contra o trabalho forçado ou compulsório (BRASIL, 2010, p. 37). Para a construção do conceito de inclusão produtiva, devem-se considerar pontos relevantes na convenção, destacados não como privilégios, mas afirmação e proteção de direito ao trabalho para a melhoria da qualidade de vida das PCDs. A Convenção reconhece o direito em igualdade de oportunidades das PCDs ao trabalho. Isso quer dizer trabalhos em ambiente aberto inclusivo e acessível levando-se em consideração a não discriminação, a permanência no emprego, a ascensão profissional, as condições seguras e salubres de trabalho com seus direitos trabalhistas e sindicais em condições de igualdade com as demais pessoas em remuneração com trabalhos de igual valor. Ainda destaca a reparação de injustiças e proteção contra o assédio no trabalho, a possibilidade de acesso a programas de orientação técnica e profissional e serviços de colocação no trabalho, treinamento profissional e continuado. Ainda referencia a promoção do emprego no setor público e privado, incluindo programas de ação afirmativa de incentivos, aquisição de experiência de trabalho no mercado aberto bem como o trabalho autônomo, empreendedorismo, desenvolvimento de cooperativas e estabelecimento de negócio próprio. Confirma-se, assim, que as PCDs não serão mantidas em escravidão ou servidão e serão, portanto, protegidas contra o trabalho forçado. O trabalho em uma sociedade capitalista define a condição humana e coloca a pessoa no bojo das representações sociais, definindo o papel e a posição do sujeito nas relações de produção, nas relações sociais e na sociedade. 59 A imagem social das PCDs frente à sociedade passa por uma ressignificação, uma vez que eram consideradas pessoas improdutivas ou eram tuteladas em suas capacidades de escolhas, autossustento e participação, como ressalta Lopes (2005, p. 117): Antes de se pensar no porquê de as empresas contratarem ou deixarem de contratar pessoas com deficiência, deve-se perceber que a questão é muito mais profunda, passando pela consciência das pessoas, que, na maioria das vezes, não tem uma postura inclusiva, não pensam o ambiente e as relações interpessoais com essa preocupação. A questão é muito mais ampla: existem barreiras invisíveis, de atitude, que fazem com que as pessoas com deficiências fiquem à margem de diversas coisas na sociedade, inclusive do mundo do trabalho. Espanta-me o quanto a gente não percebe a grandiosidade disso tudo. Com o movimento da inclusão, novos conceitos são internalizados, dentro de um novo paradigma. Nessa perspectiva, a ideia de inclusão adota a diversidade como valor humano nas relações sociais, propiciando a criação de oportunidades iguais e respeito à dignidade como parte integrante da promoção da cidadania e dos direitos humanos, assim como a não discriminação, independentemente das características biológicas, culturais ou sociais do indivíduo. 2.6 Quem são as pessoas com deficiência no mercado de trabalho brasileiro Considerando que dados mais desagregados do Censo de 2010 ainda não foram divulgados, constata-se - pelos resultados do censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2000 - que no Brasil aproximadamente 24,5 milhões de pessoas ou 14,5% da população total apresentam algum tipo de incapacidade ou deficiência (CLEMENTE, 2004). São pessoas com alguma dificuldade de enxergar, ouvir, locomover-se, entender o outro ou se expressar, isto é, com determinada condição física ou mental. Nesse grupo, 16,6 milhões de pessoas apresentam algum grau de deficiência visual, sendo que quase 150 mil declararam-se cegos. No que se refere ao grau de deficiência auditiva, foram encontrados 5,7 milhões de brasileiros. Dentre esses, 170 mil eram surdos. Nos dados do IBGE, destaca-se que a proporção de PCD aumenta com a idade, passando de 4,3% nas crianças até 14 anos para 54% do total das pessoas com 60 idade superior a 65 anos. À medida que a população se torna mais envelhecida, a proporção de PCDs aumenta, surgindo um novo elenco de demandas para atender às necessidades específicas desse grupo. Os três dados registrados no censo de 2000 (IBGE) demonstram alguns aspectos relevantes que podem compor a análise dessa temática. No aspecto de relações de gênero, homens predominam em relação à deficiência mental, auditiva, física (especialmente com falta de membro ou parte dele). O resultado mostrou-se compatível com o tipo de atividade desenvolvida por sujeitos masculinos e com os riscos de exposição a acidentes de diversas causas. Além disso, a predominância das mulheres com limitações motoras (incapacidade de caminhar ou subir escadas) ou visuais é coerente com a composição por sexo da população idosa, com predomínio de mulheres a partir dos 60 anos. O conceito utilizado pelo censo para caracterizar as PCDs inclui diversos graus de gravidade na capacidade de enxergar, ouvir e locomover-se, mostrando-se compatível com a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), divulgada em 2001 pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Em relação à inserção das PCDs no mercado de trabalho, verifica-se proporção menor de pessoas ocupadas em relação ao número de PCDs. Segundo Batista (2004, p. 111), a atual conjuntura configura-se da seguinte forma: No Brasil, segundo o censo realizado em 2000 pelo IBGE, existem 24,5 milhões de brasileiros portadores de algum tipo de deficiência; isto significa que 14,5% da população brasileira apresentam alguma deficiência física, mental ou dificuldade de enxergar, ouvir ou locomoverse. Em Minas Gerais são cerca de 2,6 milhões de PPD correspondendo ao mesmo percentual de 14,5% da população. Os dados do censo mostram também que, no total de casos declarados de PPD, 8,3% possuem deficiência mental; 4,1% deficiência física; 22,9% deficiência motora; 48,1% visual e 16,7% auditiva. Entre 16,5 milhões de pessoas com deficiência visual, 159.824 são incapazes de enxergar, e, entre os 5,7 milhões de brasileiros com deficiência auditiva, 176.067 não ouvem. Segundo dados divulgados pelo Instituto Ethos (2002), nove milhões de pessoas com deficiência estão em idade de trabalhar. E desses, um milhão (11,1%) exercem alguma atividade remunerada e 200 mil (2,2%) são empregados com registro em carteira de trabalho. 61 Esses dados são revelados 10 anos depois da lei de reserva de cotas, o que demonstra número relativamente baixo de pessoas contratadas, apesar da exigência legal. A presente pesquisa confirma o número proporcionalmente pequeno de PPD empregado nas empresas e ainda certo desconhecimento por parte do empresariado da legislação pertinente à reserva de cotas. Os dados do Censo de 2000, para ocupação econômica de PCD, diferem dos apurados pelo Instituto Ethos em 2002, mas mostram que, entre os diferentes tipos de deficiência, a pessoa com deficiência mental é a que encontra mais dificuldades de inserção no mercado de trabalho. Segundo Clemente (2003, p. 41), pelos dados do censo do IBGE de 2000, “o tipo de deficiência que mais dificulta a inserção no mercado de trabalho é a mental: somente 19,3% das pessoas que apresentam esse tipo de deficiência estão ocupadas”. Esse dado, apesar de ser uma taxa baixa, assinala equívocos produzidos pelo senso comum quanto à compreensão da competência e da capacidade profissional no que se refere à condição de aprender e desenvolver atividades produtivas, mesmo no caso de pessoa com deficiência mental. Registra-se taxa mais alta de inserção no mercado de trabalho de pessoas com outros tipos de deficiência física ou motora (24,1%), dificuldade na audição (34,0%) e dificuldade para enxergar (40,8%). Por sua vez, para quem não apresenta alguma dessas deficiências, a proporção das pessoas ocupadas sobe para 49,9%. Dessa forma, é indispensável inventar, criar espaços de discussão e ferramentas e novos processos, uma vez que, conforme Paulo Freire (1996), os seres humanos apresentam essa possibilidade de serem cocriadores, a qual os libera de serem meros executores das programações sociais e de ficar subordinados a metodologias bancárias. E somos, sobretudo, capazes de criar novas metodologias, não só para o ensino, mas no conjunto da vida social. 62 No campo do trabalho, portanto, as leis de cotas tornam-se uma forma de enfrentar e superar as dificuldades de inserção produtiva, passando a cumprir o papel de conscientizar e promover o acesso à inclusão produtiva como medida de proteção, promoção e acesso à equiparação de oportunidades. Outra consideração importante a se fazer é sobre a inclusão social que representa tema central na pauta da gestão social e na formulação das políticas sociais. O processo democrático pelo qual o país passou viabilizou a formulação de programas e propostas de promoção dos direitos humanos, de superação das desigualdades, da eliminação da discriminação e da promoção de melhores oportunidades para todos. Nesse aspecto, destacam-se as habilidades práticas dos movimentos sociais para criar espaços de articulação, participação e diálogo, para acordar estratégias que visem efetivar políticas de inclusão, criando, para isso, processos democráticos de participação e avaliação frente aos desafios postos. Seguindo esse pensamento, pode-se recorrer a Avritzer (2010) para melhor compreender que a teoria democrática deliberativa considera que a valorização dos processos de decisão coletiva possibilita diferentes reflexões e debates e, consequentemente, aumenta a qualidade das decisões. As chamadas leis de cotas para o mercado de trabalho, instituídas em diversos países (GARCIA, 2010), correspondem a uma forma de induzir a superação das dificuldades de inserção produtiva como medida de proteção e promoção de oportunidades. Dessa maneira, as ações afirmativas são implementadas para cumprir papel na inclusão social. A Lei nº 8.213/1991 (BRASIL, 1991a) prevê a contratação de PCDs e beneficiários reabilitados no mercado de trabalho e estabelece a contratação de PCDs pelas empresas por cotas, isto é, conforme o número de trabalhadores que possuem. Assim, empresas que possuem 100 a 200 empregados devem contratar 2% de PCDs; 201 a 500 empregados, 3%; entre 501 e 1.000 devem 63 contratar 4%; e aquelas que possuem mais de 1.000 empregados devem contratar 5%. Essa lei ficou conhecida como Lei de Cotas e está em vigor há cerca de 20 anos. Entretanto, apenas em 1999, por meio do Decreto nº 3.298/1999, ela foi regulamentada. Tempo, a nosso ver, suficiente para que as empresas se estruturassem para cumprir tal determinação. Não obstante, apesar de todo esse período, ainda existem PCDs que desejam trabalhar e não são contratadas. Ainda existem muitas empresas que não cumprem a obrigação legal, conforme pode ser visto nos dados de 2009 da TAB. 1, referente ao Brasil, e da TAB. 2, a Minas Gerais. Conforme observado na TAB. 1, pela análise da relação entre os pressupostos legais e os dados da realidade referentes ao ano de 2009 e fornecidos pelos auditores fiscais do Ministério do Trabalho, verifica-se que a inclusão produtiva das PCDs no Brasil mostra-se aquém do previsto na lei. Menos de 40% dos vínculos de emprego que seriam esperados pelas cotas estavam preenchidos em 2009 e, de modo surpreendente, o grau de cumprimento da exigência legal era relativamente mais alto nas menores empresas. Nas “empresas públicas e sociedades de economista mista” com 100 a 200 empregados e de 201 a 500 empregados, constatam-se os mais altos níveis de proporção de cumprimento da lei – de 77,69% no primeiro caso e de 71,73%, no segundo caso. Também as “demais empresas”, categoria que inclui todas as empresas formalizadas do setor privado, as menores (de 100 a 200 e de 201 a 500 empregados) apresentavam mais altos indicadores de cumprimento da lei em relação às suas congêneres maiores. Como se pode observar, as empresas que possuem maior potencial de ocupação das PCDs são as que apresentam mais baixo índice de desempenho quanto a essas prerrogativas legais. 64 TABELA 1 - Número de empregados com deficiência declarados e esperados pela Lei de Cotas segundo tamanho e natureza de empresas - Brasil, 2009 Tipo de natureza jurídica da empresa Administração pública (1) Empr. públ. e soc.ec.mista (2) Demais empresas Nº. de N.º de trab. Diferença Proporção trabalhadores com defic. Total de para de com (aplicado o vínculos alcançar a cumprimento deficiência percentual cota legal da Lei (declarados) legal) Empresas com 100 a 200 empregados 274.768 1.854 ------77,69% 52.127 810 1.043 233 51,07% 2.834.136 28.946 56.683 27.737 Administração pública Empr. públ. e soc.ec.mista Demais empresas 980.724 94.618 3.592.722 Empresas com 201 a 500 empregados 4.185 ----2.036 2.839 803 53.506 107.782 54.276 --71,73% 49,64% Administração pública Empr. públ. e soc.ec.mista Demais empresas 1.170.713 88.025 2.285.445 Empresas com 501 a 1.000 empregados 4.000 ----1.216 3.521 2.305 38.502 91.418 52.916 --34,54% 42,12% Empresas com mais de 1.001 empregados Administração pública Empr. públ. e soc.ec.mista Demais empresas 6.624.663 266.682 4.253.257 15.934 3.886 64.407 --13.334 212.663 --9.448 148.256 Totais (empresas com 100 ou mais empregados) Administração pública 9.050.868 25.973 ----Empr. públ.e soc.ec.mista 501.452 7.948 20.736 12.788 Demais empresas 12.965.560 185.361 468.545 283.184 Empresas sem adm. públ. 13.467.012 193.309 489.281 295.972 Total Geral 22.517.880 219.282 ----Fonte: Brasil (2011d). Obs.: (1) - Empresa Pública e Sociedade de Economia Mista (2) - Empresas com demais tipos de natureza jurídica --29,14% 30,29% --38,33% 39,56% 39,51% --- Assim, uma questão que surge, mas que não será investigada neste estudo, seria: por que as empresas com mais capacidade de gerar empregos demonstram reduzidos níveis de inclusão produtiva para as PCDs? Examinando a TAB. 2, também se constata o baixo cumprimento da lei em Minas Gerais, com taxas semelhantes às do Brasil. No conjunto das empresas com estabelecimentos em Minas Gerais, verifica-se o cumprimento de 38,57% das vagas esperadas pela lei, em comparação com a taxa de 39,51% no Brasil. 65 TABELA 2 - Número de empregados com deficiência declarados e esperados pela Lei de Cotas, segundo tamanho e natureza de empresas Minas Gerais - 2009 Tipo de natureza jurídica da empresa Total de vínculos Nº. de Nº. de trab. trabalhadores com defic. Diferença Proporção com (aplicado o para de deficiência percentual alcançar a cumprimento (declarados) legal) cota legal da Lei Empresas com 100 a 200 empregados 221 ------32,00% 21 66 45 46,83% 2.605 5.563 2.958 Administração pública (1) Empr. públ. e soc.ec.mista (2) Demais empresas 37.396 3.281 278.126 Administração pública Empr. públ. e soc.ec.mista Demais empresas 157.235 7.109 351.689 Empresas com 201 a 500 empregados 520 ----134 213 79 4.877 10.551 5.674 --62,83% 46,22% Administração pública Empr. públ.e soc.ec.mista Demais empresas 112.461 6.717 224.105 Empresas com 501 a 1.000 empregados 632 ----133 269 136 3.863 8.964 5.101 --49,50% 43,09% Administração pública Empr. públ.e soc.ec.mista Demais empresas 611.720 31.505 377.887 Empresas com mais de 1.001 empregados 1.095 ----381 1.575 1.194 5.766 18.894 13.128 --24,19% 30,52% Totais (empresas com 100 ou mais empregados) Administração pública 918.812 2.468 ----Empr. públ.e soc.ec.mista 48.612 669 2.123 1.454 Demais empresas 1.231.807 17.111 43.972 26.861 Empresas sem adm. Públ. 1.280.419 17.780 46.095 28.315 Total Geral 2.199.231 20.248 ----Fonte: Brasil (2011d). Obs.: (1) - Empresa Pública e Sociedade de Economia Mista 2) - Empresas com demais tipos de natureza jurídica. --31,51% 38,91% 38,57% --- Da mesma forma, em Minas Gerais o cumprimento da lei tende a ser mais expressivo nas menores empresas, ainda que as “empresas públicas e sociedades de economia mista” com número de empregados entre 200 e 500 apresentem alta proporção de cumprimento da lei - 62,83%. Quando tais empresas têm entre 100 e 200 trabalhadores, a proporção de cumprimento cai, consideravelmente, para 24,19%. Desse modo, pode-se concluir que o cumprimento da Lei de Cotas se apresenta distante da realidade, conforme dados pesquisados aqui citados. Mas, por outro 66 lado, em 2009, quase 220 mil PCDs no Brasil e 20 mil em Minas Gerais se encontravam empregadas, assalariadas, com carteira assinada ou funcionárias públicas estatutárias (que é o universo pesquisado pela Relação Anual de Informações Sociais – RAIS do Ministério do Trabalho e Emprego (MET), fonte dos dados das TAB. 1 e 2). Desde a entrada da legislação em vigência, muitas foram as tentativas de burlar ou revogar a Lei. Entretanto, órgãos internacionais e nacionais estão atentos e tomando as medidas necessárias para que essa lei seja cumprida. A matéria “multas por cota crescem seis vezes em cinco anos”, publicado no dia 5 de março de 2008 no Jornal Valor Econômico, enfatiza que: A legislação determina a contratação entre 2% e 5% de portadores de deficiência no quadro das empresas com mais de 100 funcionários – acima de 500, o percentual é de 5% dos empregados. A multa, calculada de acordo com o número de deficientes não contratados, varia de R$ 1.195,13 a R$ 119.512,33. Apesar de a lei existir há mais de 10 anos, o rigor do Ministério na fiscalização da norma é mais recente – em 2006, foram 606 multas, 420 a mais do que em 2005. Porém, estes números são bem maiores, já que nem todas as empresas são fiscalizadas pelo Ministério, bem como nem todas as multas são reportadas ao órgão (JORNAL VALOR ECONÔMICO, 2008). Muito se tem debatido a respeito e até mesmo rebatido, no sentido de alterar a referida legislação. Em 2008, o Instituto Euvaldo Lodi (IEL), instituição integrante do Sistema FIEMG, concluiu estudo buscando contribuir para o aprimoramento da Lei 8.213/91. Nela, explicita a necessidade de adequações na legislação e apresenta propostas de revisão dos percentuais de cotas por ela estabelecidos; alteração do conceito de PCDs, de forma a ampliar o número de trabalhadores potenciais; inclusão do trabalhador aprendiz na cota legal (o que, na prática, já vem ocorrendo), assegurando-se a preferência de contratação daqueles que se destacarem; estabelecimento de critérios de regionalização para facilitar a contratação nas proximidades das empresas; mapeamento de risco em áreas nas quais a contratação de PCD não é recomendada, utilizando-se metodologia do próprio Ministério do Trabalho; manutenção dos dispositivos incluídos em projeto de lei de 67 autoria do Senador José Sarney, especialmente nos aspectos ligados à terceirização, programas de profissionalização e contratação das chamadas oficinas protegidas. Esse estudo foi publicado no Jornal Estado de Minas, em 7 de fevereiro de 2008, indicando a intenção da FIEMG de convencer a sociedade para revisão ou ajuste da lei (ESTADO DE MINAS, 2008). Para evitar-se que a inclusão de PCD por meio do trabalho dependa exclusiva ou principalmente da vigência da Lei de Cotas e de sua correta interpretação e implementação é que se faz necessário apoiar a organização e mobilização da sociedade, inclusive em fórum de gestão social, em defesa da inclusão produtiva das PCDs. 68 3 METODOLOGIA A construção teórico-prática profissional do serviço social na qual a autora está inserida possibilitou aproximação e participação junto aos movimentos sociais na luta por garantia de direitos de diversos grupos vulneráveis (pessoas com deficiência, crianças e adolescentes, idosos e mulheres da periferia e comunidades tradicionais e minorias raciais). Esse processo compartilhado nos últimos 15 anos produziu inquietações e questionamentos em relação ao poder, às divergências entre os diversos sujeitos, grupos e setores, às variadas formas de gestão de programas sociais, muitas vezes não democráticas, as quais conduziram à opção por esta pesquisa e sua elaboração, a partir de 2010. Alguns fatores também influenciaram esta investigação, destacando-se o fato de a pesquisadora conhecer alguns sujeitos e ter sido membro participante ativo do FPT desde a sua criação. Esse aspecto facilitou a solicitação do licenciamento para a execução deste trabalho acadêmico, bem como o acesso aos entrevistados e ao acervo de documento para a escolha do objeto de pesquisa. Vale lembrar que esta pesquisa tem como objetivo geral tentar conhecer e explicar, na perspectiva dos direitos humanos e do conceito de inclusão produtiva, os limites e possibilidades da atuação de um fórum de gestão social dedicado a subsidiar e promover o emprego de PCD. Recorrendo ao que se pretende compreender neste estudo, objetiva-se a verificação dos limites e possibilidades de atuação de um fórum de gestão social dedicado a subsidiar e promover o emprego de PCD, no intuito de gerar intervenções pertinentes, do ponto de vista da área de saberes associados à gestão social. Para avançar no conhecimento do funcionamento do FPT, a pesquisadora elegeu, como orientação básica, o paradigma de pesquisa qualitativa, que Oliveira (2010, p.80) caracteriza como um estudo detalhado de determinado grupo social, 69 colhendo informações para se entender a “profundidade, o significado e as características” do assunto pesquisado. A metodologia qualitativa tem contribuído para a compreensão de diversos fenômenos sociais. Portanto, acredita-se que nesta pesquisa científica tal relação de aproximação com os sujeitos foi utilizada como importante instrumento para a coleta de dados fidedignos. Para isso, buscou-se conhecer o universo pesquisado com o levantamento de dados realizado em três etapas, da seguinte forma: a primeira diz respeito à observação participante não estruturada; a segunda à pesquisa documental; e na terceira foi utilizado outro procedimento metodológico, recorrendo-se à pesquisa qualitativa por meio da entrevista semiestruturada. Essa escolha se deu a partir de experiências compartilhadas e da importância de se verificar os fatos além das aparências e, sobretudo, para estabelecer relação direta de acompanhamento em ambiente formal e informal, mantendo um diálogo com o fórum, local privilegiado de participação das entidades no acompanhamento das políticas afirmativas voltadas para as PCDs. A pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética da UNA e contou também com a autorização do coordenador do FPT, que é responsável pela gestão atual e representa uma ONG que trabalha com a defesa de direitos das PCDs. Ao discorrer sobre o estudo de determinado fenômeno, entende-se a necessidade de se aprofundar em áreas desconhecidas do saber. Segundo Lakatos e Marconi (1996, p. 16), a finalidade da pesquisa é realmente “descobrir respostas para questões mediante a aplicação de métodos científicos”. No panorama metodológico, Lakatos e Marconi (1996) retratam que o levantamento de dados é considerado o primeiro passo de qualquer pesquisa científica. As observações visam buscar os fundamentos na análise do meio onde vivem os atores sociais, uma vez que, em pesquisas qualitativas, os dados não podem ser considerados fatos isolados, observados desde que estejam relacionados ao 70 âmbito em suas múltiplas relações. O observador, em vários momentos, foi parte integrante do grupo. “A técnica da observação participante realiza-se através do contato direto do pesquisador com o fenômeno observado, a fim de obter informações sobre a realidade dos atores sociais em seu próprio contexto” (OLIVEIRA, 2010, p. 80). Na observação participante não estruturada, a pesquisadora compareceu a duas reuniões plenárias do FPT no ano de 2011, sendo a primeira para observação no sentido de ter mais aproximação com a dinâmica de funcionamento. Na segunda aproximação foi comunicada em plenária aos seus membros a intenção desta pesquisadora de realizar o estudo, assim como do seu afastamento do FPT durante o período da pesquisa. As primeiras impressões desses contatos diagnosticaram certa tensão entre os membros, entendendo-se que havia uma “crise instalada”. Posteriormente soubese do desligamento da secretária executiva do referido fórum. Quanto à pesquisa documental, esta representa “fonte de coleta de dados restrita a documentos escritos ou não, constituindo o que se denomina de fontes primárias” (LAKATOS; MARCONI, 1996, p. 57). Ainda se pode afirmar que a pesquisa documental caracteriza-se pela busca de informações de documentos que não receberam algum tratamento científico, como relatórios, reportagens de jornais, revistas, cartas, filmes, gravações, fotografias, entre outras matérias de divulgação (LAKATOS; MARCONI, 1996, p. 69). 3.1 Etapas do desenvolvimento da pesquisa Na análise documental foram verificadas atas, regimento interno, listas de presenças, entre outros documentos que constituem a organização do FPT. Essa documentação ainda não foi analisada de maneira científica, assim como a atuação do FPT. 71 As atas foram examinadas pelo software nomeado Atlas-TI, que possibilita identificar elementos nos documentos por meio de codificação, executando a análise das falas e trechos desses documentos, realizando o cruzamento de diversas variáveis. O número de atas produzidas subsidiou informações acerca da organização e do número de plenárias realizadas por meio do cruzamento da quantidade de atas/ano que se encontram arquivadas. A opção pelo período 2007, 2008, 2009 evidenciou-se por representar um período marcado por elevado número de produção de atas e constância nas reuniões, que poderão ser visualizadas por meio do GRÁF. 1: GRÁFICO 1 - Número de atas localizadas do FPT - Belo Horizonte - 2000-2010 12 10 8 6 4 2 0 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 Fonte: Fórum de articulação para promoção do emprego de PCD – Elaborado pela autora. Diante disso, foi feita a análise documental das atas das reuniões plenárias do fórum dos anos de 2008 a 2010, período em que se encontrou mais alto número de documentos (GRÁF. 1). Vale ressaltar que estão previstas 10 reuniões plenárias por ano no regimento do fórum, sendo que todas deveriam resultar em elaboração de ata. Avritzer (2009, p. 271-272), que utilizou metodologia semelhante à deste estudo, destaca que: 72 Na análise documental, as atas das reuniões têm se apresentado como um importante recurso e fonte de dados. Por serem documentos que registram os atos de fala e os discursos políticos produzidos pelos atores no processo deliberativo, que sinalizam posições políticas, conflitos, consensos e propostas, as atas permitem analisar o processo argumentativo, central na teoria deliberativa. [...] Em relação às atas, uma fonte secundária dentro da análise documental, um dos grandes problemas é a incerteza sobre a abrangência de seu conteúdo, que pode muitas vezes não documentar acontecimentos, discussões e ideias que surgem no momento das reuniões. [...] Além disso, elas são documentos oficiais que registram o processo de deliberação e são devidamente aprovadas pelos seus participantes, o que indica que eles concordam com o registro e a forma como foi realizado. As atas possuem formato resumido, apresentando registro pouco detalhado. As mesmas foram analisadas por um software denominado Atlas-TI, que permite a análise de documentos por meio da codificação que permite análise de tipos de participação e de temas das falas (AVRITZER, 2009). Essa metodologia torna possível que se faça: A análise das atas é baseada numa leitura qualitativa da fala de cada ator e codificação das mesmas. [...] Para processamento qualitativo dos dados e codificação, utilizamos um programa de análise qualitativa: Atlas.TI, versão 5.0, que nos auxilia na produção de relatórios estatísticos dos dados. [...] A técnica para o exame dos documentos fundamenta-se na análise de conteúdo, com ênfase na análise temática, que tem por objetivo descobrir os temas que compõem uma comunicação, cuja presença (ou ausência) e frequência de determinado conteúdo significam alguma coisa para os objetivos analíticos visados (AVRITZER, 2009, p. 271-272). A análise específica das atas da entidade investigada teve como objetivo buscar identificar aspectos que possam ou não se relacionar às características da gestão social. Dessa maneira, analisaram-se os seguintes componentes: A forma de participação dos sujeitos nas plenárias, por meio de sua capacidade de vocalização; a capacidade de proposição do fórum; as decisões; os assuntos e temática encaminhados pelo fórum. Após as autorizações, as entrevistas foram agendadas por telefone - uma entrevista diária -, gravadas e realizadas na primeira quinzena de janeiro de 2012. 73 Apenas uma entrevistada faltou à marcação agendada, havendo necessidade de ser remarcada, o que aconteceu com sucesso. Os sujeitos da investigação proposta são membros assíduos que compõem o Fórum Pró-Trabalho das Pessoas com Deficiência e Reabilitadas. A entrevista foi uma alternativa para complementar os aspectos que porventura não ficaram explícitos na análise documental. Foi verificado o número de participantes ativos, entre os quais seis pessoas foram ouvidas. Considerando o interesse pelo estudo e também as condições de acesso e disponibilidade dos entrevistados, optou-se também por ouvir uma pessoa que já participou e hoje não mais participa, para se aproximar ao máximo do princípio da saturação. Os grupos foram assim dispostos: 2 gestores de ONGs 2 gestores de empresas ou instituições públicas 2 gestores de empresa privadas 1 pessoa que participou e não mais participa Os dados foram coletados por meio de entrevista semiestruturada. Triviños (1995, p. 146 apud GONÇALVES, 2005, p. 72) descreve que a entrevista semiestruturada é direcionada para a pesquisa qualitativa, já que, “ao mesmo tempo em que valoriza a presença do investigador, oferece todas as perspectivas possíveis para que o informante alcance a liberdade e a espontaneidade necessárias, enriquecendo a investigação”. A entrevista semiestruturada pode ser entendida como: [...] aquela que parte de certos questionamentos básicos apoiados em teorias e hipóteses, que interessam à pesquisa, e que, em seguida, oferecem amplo campo de interrogativas, fruto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que se recebem as respostas dos informantes. Dessa maneira, o informante, seguindo espontaneamente a linha de seu pensamento e de suas experiências dentro do foco principal colocado pelo investigador, começa a participar na elaboração do conteúdo da pesquisa (TRIVIÑOS, 1995, p. 146, apud GONÇALVES, 2005, p. 72). 74 Além disso, a entrevista permitiu o aprofundamento do tema pesquisado oferecendo mais subsídios para entender-se o problema investigado. 3.2 Cenário da investigação O campo pesquisado, o Fórum Pró-Trabalho das Pessoas com Deficiência e Reabilitadas (FPT), criado em abril de 2000 como órgão consultivo e deliberativo em suas plenárias, não governamental, organizado em comissões, de acordo com o seu regimento interno, tem atuação na região metropolitana de Belo Horizonte. De 2000 até os dias de hoje, constituiu-se o percurso histórico do fórum, gerenciado por cinco gestões de mesa diretora alternada entre o poder público e a sociedade civil, com fases e momentos mais ou menos dinâmicos e organizados. O FPT representa toda a sociedade por meio da mesa diretora, que tem na sua formação a paridade de duas entidades governamentais e duas não governamentais. A mesa é composta de um coordenador, um secretário geral, um primeiro secretário, um segundo secretário e um conselheiro consultivo, todos votados e eleitos, em plenária extraordinária, pelos seus integrantes. Sua estrutura organizacional se estrutura em plenária, mesa diretora, comissões temáticas, secretaria executiva e instituições participantes. Atualmente, possui 44 entidades parceiras permanentes, com presença oscilante nas plenárias. Essa lógica de organização se complementa à sistematização e funcionamento do FPT, a qual se concretiza por meio das comissões de comunicação, legislação e produção científica. Cada comissão atua de forma autônoma, trazendo discussões e ações para serem implantadas pelo FPT junto à sociedade e seus parceiros. Essas comissões constituem uma maneira de estruturar seu funcionamento, segundo suas atribuições e competências. 75 Neste estudo não se tem como foco a análise de cada gestão e suas realizações, por ausência de disponibilização de documentos referenciais. Entretanto, os materiais viabilizados permitiram correlacionar objetivos e ações. Tais ações foram: seminário com o objetivo de destacar a inclusão produtiva do deficiente mental, planejamento estratégico, criação do GT específico para pensar o Projeto Rede de Inclusão, o Termo de Ajustamento de Conduta com o Ministério Público do Trabalho, Jornal Núcleo “Fala Fórum”, relatório de realização de gestão, código de conduta, que norteará o funcionamento da rede de inclusão, como também o manifesto para a sociedade sobre a questão da inclusão no mercado de trabalho distribuído na II Conferência Estadual dos Direitos das PCDs. Todo esse arcabouço documental produzido durante seus 12 anos de funcionamento, em um locus específico que contém um conjunto de realizações, resulta de um campo de mediação que permitiu a gestão compartilhada dessa temática. Desse constructo, identificaram-se conquistas, avanços e caminhos pavimentados de várias densidades. Pode-se confirmar que alguns atributos foram imputados ao FPT, os quais demonstram a transparência, mobilização, comunicação, interação, estratégias, aprendizagem, participação, inter- relacionamento do poder público com a sociedade civil, de interorganizações, sem perder de vista a identidade de seu regimento, documento balizador do FPT. Quanto à situação financeira, o Fórum não apresenta recursos sistemáticos, a não ser a multa destinada às ações pontuais para custear a rede de inclusão e material de escritório para subsidiar-se administrativamente. Administrativamente, a Superintendência Regional do Trabalho (SRTE) oferece algum suporte administrativo, de acordo com a necessidade das ações realizadas de maneira não sistemática. Seu objeto concorre na articulação de entidades e órgãos com a finalidade de organização do ideário de diretrizes para a implantação de estratégias de inclusão 76 da PCD no mercado de trabalho, respeitadas as competências e as atribuições legais dos participantes. O FPT possui a missão de contribuir para a redefinição de políticas públicas que garantam à pessoa com deficiência ou reabilitada a função de ser ator social produtivo. 77 4 A INCLUSÃO PRODUTIVA E A GESTÃO SOCIAL NO FPT: O QUE DIZEM OS DOCUMENTOS E OS ENTREVISTADOS 4.1 O que diz o Regimento Em contato com os diversos documentos produzidos pelo FPT, optou-se em criar um gráfico da linha do tempo no qual se relacionam datas dos acontecimentos marcantes e principais realizações, desde a sua criação até os dias atuais. Analisando a FIG. 1, os documentos consultados revelaram que sua trajetória não se constituiu por meio de uma sequência linear quanto ao movimento de funcionamento e às suas principais realizações, entre outras atividades. Nesse sentido, a dinâmica da sua história produziu continuidades e descontinuidades frente a fatores multidimensionais previsíveis e imprevisíveis em sua gestão. Nesse ponto, Morin (1996) realça a complexidade histórica de um tempo/espaço que se revela de forma cronológica e não cronológica. FIGURA 1 – Linha do tempo do Fórum Pró-Trabalho O primeiro documento localizado após a data de sua criação foi o regimento interno, o qual representa o documento balizador que imputa a referência do objeto, funcionamento, organização, princípios e papel do FPT. A construção do regimento se deu de forma coletiva, sendo iniciada na data da criação do FPT e concretizada no ano de 2001. Segundo o Dicionário Etimológico (CUNHA, 2010), a palavra regimento, do latim regímenes do verbo reger, significa governar, 78 administrar e dirigir. Ou seja, o regimento agrega em seu conjunto uma maneira de funcionamento. Regimentalmente, as suas atribuições e competências abrangem: I- Promover a articulação de órgãos e entidades com interesse no tema, objetivando o estabelecimento de diálogo constante e distribuição da informação entre os órgãos participantes; II- Propor, através de documentação gerada por consenso entre as entidades participantes, medidas legais, educativas e outras que promovam a inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho e que desencorajem a propagação de casos de discriminação; III- Articular com organismos nacionais e /ou internacionais mecanismos de cooperação visando a realização de estudos de diagnóstico e análise dos fatores mais comumente verificados no mercado de trabalho e na sociedade em geral que tratem da inclusão da pessoa com deficiência; IV- Baseado nos estudos ressaltados no inciso III e em estudos sobre o mercado de trabalho, propor medidas de adequação, promoção, extinção, conforme o caso, bem como solicitar procedimento investigatório ao Ministério Público, para ajustamento de conduta na contratação e cumprimento da Lei n° 8.213/91; V- Promover articulação entre as entidades envolvidas e a facilitação de ações de conscientização da sociedade quanto às potencialidades profissionais da pessoa com deficiência; VI- Incentivar, em parceria com entidades que o compõem, a participação de todos os segmentos sociais buscando alternativas para a solução de problemas existentes com relação à inclusão no mercado de trabalho da pessoa com deficiência; VII- Estimular e eventualmente coordenar a cooperação técnica e financeira entre os representantes governamentais e não governamentais, visando garantir a consecução dos seus objetivos; VIII- Coordenar e incentivar a execução e a promoção de ações afirmativas que objetivem a inclusão da pessoa com deficiência no Mercado de Trabalho; IX- Solicitar e socializar dados e informações acerca do tema relativo à pessoa com deficiência, possibilitando a elaboração de propostas e a revisão de legislação pertinente ou a sua regulamentação, quando se fizer necessário; X- Discutir e propor ações para a qualificação profissional para a pessoa com deficiência para geração de trabalho e renda, bem como firmar acordos de cooperação com organismos de capacitação; XI- Pronunciar-se sobre questões de discriminação no mercado de trabalho denunciando-as aos órgãos competentes; XII- Buscar a sistematização das ações de inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho através de orientação e divulgação de ações isoladas de cada uma das entidades participantes; XIII- Contribuir para a redefinição de políticas públicas, garantindo que o indivíduo com deficiência possa tornar-se produtivo, assegurando a este segmento social o direito à cidadania; XIV- Orientar as empresas, entidades patronais e de trabalhadores quanto à obrigatoriedade legal de oferta de trabalho para pessoa com deficiência (Instrução Normativa n° 20 de 26 de janeiro de 2001), bem como quanto às possibilidades na admissão de pessoas com necessidades especiais classificadas como portadoras de deficiência segundo critérios expressos no Decreto nº 3.214 de 20 de dezembro de 1999; 79 XV- Esclarecer empregador quanto aos recursos tecnológicos existentes para a adequação do ambiente de trabalho e das necessidades de tal adequação para cumprimento de disposto decreto supracitados (FPT, REGIMENTO INTERNO, 2001). Em linhas gerais, o regimento afere ao FPT a promoção ao trabalho das PCDs, no intuito de envolver toda a sociedade no acolhimento a esse trabalhador que potencialmente deve ter sua inclusão produtiva garantida na perspectiva do direto humano ao trabalho. Do ponto de vista da natureza, de seu objeto, atribuições e competência, a proposta do FPT é contribuir para minimizar as dificuldades, limites e ampliar as possibilidades, aspectos que permeiam a temática da inclusão produtiva das PCDs. Por outro lado, foi detectado que a atribuição regimental do FPT expressa a intenção de produzir conhecimento sobre a inserção laboral das PCDs, numa dinâmica de trabalho que provoque reflexões e discussões que propiciem a formação de massa crítica desse tema. Essa atividade também contribui para o desenvolvimento social e econômico desses sujeitos, bem como para a sociedade, de maneira que transmita novos saberes para fortalecer a política afirmativa de cotas para as PCDs. A candidatura de ingresso ao FPT, de acordo com o artigo 6°e 7° do regimento, se dá pelo interesse específico ou pontual nos problemas discutidos nas reuniões do fórum e será apreciada em plenário, estando sua aprovação condicionada à maioria simples dos votos dos demais membros efetivos ou “por convite” na condição de membros colaboradores. De acordo com a análise realizada neste estudo em relação ao regimento, pôdese verificar que suas atribuições apresentam quatro categorias de ações: • A articulação, participação e cooperação: denotam elementos fundamentais da concepção de gestão social; 80 • estudos, dados, análises condizem com os aspectos da avaliação de projetos sociais que poderão fornecer subsídios técnicos de avaliação e resultados da política de cotas nos territórios; • esclarecimentos e sistematização estão no campo da comunicação, da interação com a sociedade e, sobretudo, no campo da aprendizagem; • proposta de medidas e mudanças políticas e legais, que remete a proposições que poderão sinalizar transformações e mudanças. As primeiras categorias - articulação, participação e cooperação - são elementos pertencentes à concepção do termo GS, afirmado por Gondim, Fischer e Melo (2006, p. 48): [...] um ato relacional capaz de dirigir e regular processos por meio da mobilização ampla de atores na tomada de decisão (agir comunicativo), que resulte de parcerias intra e Interorganizacionais, valorizando as estruturas descentralizadas e participativas, tendo como norte o equilíbrio entre a racionalidade instrumental (com relação a fins) e a racionalidade substantiva (com relação a valores), para alcançar, enfim, um bem coletivamente planejado, viável e sustentável a médio e longo prazo. A abordagem da GS citada traz certa congruência e coerência com o tipo de grupo social formado pelo FPT, que tem a participação social e a mobilização como condicionantes, bem como a parceria entre as organizações, construindo uma forma de organização coletiva. A segunda retrata a verificação do tema no que diz respeito à realidade no sentido de agregar sistematizações de dados, estudos e pesquisas que possam subsidiar as estratégias e caminhos a serem trilhados para sua atuação. A terceira indica orientações fundamentadas assimiladas das discussões, dos dados, das pesquisas, das ações produzidas que orientam e subsidiam a sociedade diante dessa temática. A quarta tem conotação política e o papel propositivo de sugerir mudanças no âmbito legal, bem como colaborar na eficácia das políticas públicas que dizem respeito a essa matéria. 81 Dessa maneira, o regimento, de modo geral, conseguiu amarrar um mecanismo de gestão que acompanha a política pública e, no conjunto dos atores sociais, possibilita discutir pontos de vista da articulação trissetorial que oportuniza esse locus como espaço de contribuição para o acompanhamento da política de inclusão produtiva em foco. 4.2 Participação e temáticas: o que dizem as atas Os membros do governo que participam do fórum assumem mais participação nos debates da entidade, conforme registrado em atas das reuniões de 2008, 2009, 2010 (GRÁF. 2). Eles representam 46,9% das falas registradas e são seguidas dos representantes da sociedade civil, com 27,5%. Os representantes das empresas respondem por apenas 4,4% das falas registradas nas atas. GRÁFICO 2 - Vocalizações por segmento Fonte: Atas do fórum. Elaborado pela autora. A distribuição da capacidade de propor ações para o fórum é bastante semelhante à distribuição das falas nas reuniões de 2008 a 2010 (GRÁF. 3). A diferença mais marcante diz respeito às proposições oriundas de segmento não 82 identificado, o que dificulta uma análise mais precisa. A capacidade de proposição das organizações da sociedade civil é inferior à sua participação nos debates. Elas respondem apenas por 22,3% das proposições, enquanto as comissões do fórum propõem mais (8,5%) do que falam (7,3%). GRÁFICO 3 - Capacidade de proposição Fonte: Atas do fórum. Elaborado pela autora. A capacidade de transformar suas propostas em decisões, no entanto, revela a grande preponderância do governo no fórum (GRÁF. 4); 76,1% das decisões aprovadas pelo fórum decorreram de iniciativas propositivas do governo. Em seguida, 7,5% foram das organizações da sociedade civil, 4,5% das comissões do fórum e apenas 3,0% das empresas. 83 GRÁFICO 4 - Capacidade de ter suas propostas transformadas em decisões Fonte: Atas do fórum. Elaborado pela autora. Das temáticas tratadas no fórum nos três anos, 37,3% correspondiam a assuntos internos organizativos (GRÁF. 5). Em segundo lugar, 15,4% trataram do Portal Rede de Inclusão e 8,4%, de assuntos referentes à inclusão produtiva. O Portal Rede de Inclusão constitui um projeto que apresenta um mecanismo exclusivamente voltado para a inclusão de trabalhadores com deficiência no mercado de trabalho. Para isso, ele se propõe a organizar uma rede de inclusão, a qual organizará um sistema único de compartilhamento de banco de dados entre instituições parceiras, de cadastramento de trabalhadores com deficiência no estado de Minas Gerais, que pretende facilitar para os atores envolvidos (empresas, instituições governamentais e não governamentais) o cumprimento da Lei de Cotas. O Ministério Público do Trabalho destinou recursos oriundos da multa administrativa imposta a uma instituição mineira vinculada ao fórum, para execução do Projeto Rede de Inclusão, sendo 50% do montante de R$ 339 mil reais destinados à montagem estrutural da rede de inclusão e o restante para o projeto de qualificação e elevação de escolaridade para as PCDs, executado pela 84 CAADE/Secretaria de Estado do Desenvolvimento Social-SEDESE/MG, pessoas as quais após a qualificação passarão a integrar o banco de dados unificado da rede. O documento assinala que a rede de inclusão funcionará na sede da SRTE e estará vinculada ao Núcleo de Igualdade de Oportunidades e ao Balcão de Oportunidades de Emprego, oferecendo suporte a todos aqueles que necessitam do cadastro. GRÁFICO 5 - Assuntos e temáticas por segmentos 80,0 70,0 60,0 50,0 40,0 30,0 20,0 10,0 pr od ut iva po ss /l i bi im lid ite ad s es Aç e di õe fic s u e ld As in ad su clu es nt sã os o no in te fó rn ru os O m /o ut rg ro an s m iz aç od ão os de in clu Jo sã rn o al Po Fa rta la lR Fó ru ed m e de In cl us Pa ão Pa rc c to er ia Co ou le tr a tiv o s in st it u içõ es O ut ro s te m as e sã o In cl. pr od . va nç os In clu pr od ./ a In cl. Ca pa ci ta çã o pa rt. / pa le st ra s/ in fo rm es 0,0 fórum Gov ongs empr comissões mesa não-id Fonte: Atas do fórum. Elaborado pela autora. Já pelo segmento governo, a temática mais abordada foi a referente a assuntos internos e organizativos, mas com mais peso do que para o conjunto do fórum (40,1%). As discussões do Portal (12,8%) e da inclusão produtiva (11,1%) vieram a seguir. Em relação ao governo, as organizações da sociedade civil trataram menos dos assuntos organizativos (34,0%) e mais do Portal (15,0%) e da inclusão (13,5%). Já a participação das empresas se destaca pela importância dada ao Portal (26,5%) e às suas discussões sobre inclusão produtiva (17,6%), assim como pela reduzida importância aos assuntos organizativos (17,6%). A parceria com outras instituições também tem peso importante para as empresas (14,7%). 85 4.3 As entrevistas e o que elas informam Como já adiantado, em complementação à observação participante e à análise de documental optou-se por entrevistar participantes do FPT segundo uma amostra intencional que envolveu sete pessoas, assim distribuídas: uma que frequentou o fórum e não frequenta mais, advinda do setor acadêmico; seis pessoas que frequentam o FPT, sendo duas pertencentes ao grupo de empresas; duas do poder público e duas do terceiro setor, sujeitos com significativo nível de presença e participação nas plenárias. Esses subgrupos são exatamente os principais de setores que compõem o FPT, além de alguns sindicatos e universidades, mas com reduzida presença nas plenárias. A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, Decreto Legislativo nº 6.949/2009, recomenda envolver as PCDs, inclusive criando oportunidades de participação ativa nas decisões, opiniões que lhes dizem respeito diretamente. Dessa forma, 50% dos entrevistados são pessoas com deficiência e 50% pessoas sem deficiência (BRASIL, 2009b). Nesse sentido, com a pretensão de preservar a identidade dos sujeitos participantes desta investigação, elegeu-se denominá-los da seguinte forma: Sujeito pesquisado de empresa, denominado SE1 (PSD): profissional sem deficiência, da área das ciências sociais, que trabalha em uma empresa multinacional que possui programa de inserção da PCD no mercado de trabalho e frequenta o FPT desde 2010 e a empresa há três ou quatro anos. Sujeito pesquisado de empresa, denominado SE2 (PCD): profissional com deficiência, da área das ciências sociais, que trabalha em entidade representativa de setor empresarial, frequenta o FPT desde, aproximadamente, 2002, 2003. Sujeito pesquisado do poder público, denominado SP3 (PSD): profissional sem deficiência, da área das ciências humanas, trabalha em uma instituição pública vinculada ao tema do trabalho, frequenta o FPT desde 2005 e a organização desde a criação do FPT. 86 Sujeito pesquisado do poder público, denominado SP4 (PCD): profissional com deficiência, trabalha no poder público em um setor que atua na defesa de direitos das PCDs e frequenta o FPT desde 2002. Sujeito pesquisado de ONGs, denominado SO5 (PSD): profissional sem deficiência, da área da administração, gestor de uma ONG, que desenvolve projetos vinculados às questões das PCDs, frequenta o FPT desde maio de 2011 e a instituição desde 2006 ou 2005 (não sabendo precisar exatamente a data). Sujeito pesquisado de ONGs, denominado SO6 (PCD): profissional com deficiência, com pós-graduação, gestor de uma ONG, militante social do movimento das PCDs e frequenta o FPT desde 2004 ou 2005 (não sabendo precisar exatamente a data). Sujeito que não frequenta mais o FPT, denominado S7 (PSD): profissional sem deficiência, da área das ciências da saúde e que trabalha como docente em uma Universidade. Frequentou o FPT no durante aproximadamente 10 anos entre idas e vindas. Para melhor visualização da classificação, elaborou-se o QUADRO 2: QUADRO 2 – Perfil dos participantes ativos do FPT entrevistados CATEGORIA INSTITUCIONAL Empresa CARACTERÍSTICA DOS ENTREVISTADOS Sujeito empresa 1, sem deficiência - SE1 Empresa Sujeito empresa 2, com deficiência SE2 Poder público Sujeito de vinculação pública, sem deficiência SP3 Poder público Sujeito de vinculação pública, com deficiência SP4 ONG Sujeito de ONG, sem deficiência SO5 ONG Sujeito de ONG, com deficiência SO6 Professor universitário Sujeito que não frequenta mais o FPT, advindo do setor acadêmico SU7 Para facilitar a identificação dos sujeitos, foi também adotado o seguinte critério: os participantes sem deficiência são números impares e os participantes PCDs, números pares. Também cabe esclarecer que o roteiro das entrevistas está apresentado no APÊNDICE A. 87 A partir da apresentação da codificação dos sujeitos das entrevistas realizadas, no próximo tópico tratar-se-á da análise do que foi pesquisado por meio das entrevistas. A forma de apresentação dos resultados se dará a partir de dois eixos norteadores da investigação, os quais foram assim denominados: o primeiro eixo – limites e possibilidades da inclusão produtiva; e o segundo eixo - a gestão social e seus desafios no FPT. Sendo assim, nos dois subitens seguintes apresentar-seá breve discussão desses eixos. 4.3.1 Primeiro eixo - limites e possibilidades da inclusão produtiva na dinâmica do FPT: refletindo sobre as multivisões Para facilitar a compreensão do leitor, é retomado, da introdução, o conceito de inclusão produtiva, o qual orientará a análise dos resultados no que se refere à capacidade do FPT de propiciar discussões e práticas quanto a essa questão. A concepção do MDS retrata o que se entende nesse âmbito: todo processo conducente à formação de cidadãos integrados ao mundo pelo trabalho tem como perspectiva a conquista de autonomia para uma vida digna sustentada por todas as pessoas apartadas ou fragilmente vinculadas à produção de renda e riqueza (BRASIL, 2011a). Dessa maneira, aqui se concebe a inclusão produtiva, nesses termos citados, como um processo de mudança de patamar dos grupos vulneráveis, possibilitando o deslocamento dos sujeitos da condição de inclusão marginal para uma condição de acesso e ascendência socioeconômica efetiva na sua condição de vida. Isso se dá por meio de atividade produtiva que possa gerar autonomia, empoderamento e cidadania aos sujeitos envolvidos no mundo do trabalho. Nesse sentido, concorda-se com Wanderley (1999), quando este afirma que “o vínculo dominante da inserção na sociedade moderna continua a ser a integração pelo trabalho. E a transformação produtiva adquire preponderância nas trajetórias 88 de exclusão social. No entanto, a inserção marginal [...] representa um fenômeno multidimensional” (WANDERLEY, 1999, p. 23). Em relação a esse aspecto, pretende-se chamar a atenção para o alcance da inclusão produtiva, no sentido da promoção e da garantia do direito ao trabalho na vida sujeito, uma vez que existem muitas armadilhas que podem mascarar tal direito e a própria cidadania. Nesse caso, recorre-se a Demo (2002), que ao abordar as distinções entre cidadania assistida e tutelada diz que: A cidadania assistida, que é problemática, porque tende a definir a pessoa como beneficiária, não como cidadã, e a cidadania tutelada que submete a pessoa ao mercado, transformando esse parâmetro definitivo, inclusive da sobrevivência. Cidadania tutelada é contradição nos termos, já que cidadania significa sempre libertação da tutela, apontando para a gestação da capacidade de autonomia. Na prática, porém, é o que mais comumente ocorre, no sentido de que a cidadania é trocada pela tutela, usando-se nessa transação, sobretudo, formas de assistencialismos. Na cidadania tutelada predomina a falsificação da cidadania, porque é destruída na própria tutela. Na cidadania assistida predomina a farsa, porque se usa a cidadania como isca, para logo a seguir reduzi-la aos trapos dos auxílios oficiais (DEMO, 2002, p. 23). Segundo Sawaia et al. (1999, p. 10), “alguns aceitam o projeto-doença para ter legitimada sua cidadania e certa condição de sobrevivência e, assim, passam a ser incluídos no sistema de seguridade, como pertencendo ao seu disfuncionamento”. Nessa direção, o entrevistado SP4 afirma um aspecto que a autora deste estudo percebe como uma característica dicotômica verificada nesse cenário, uma vez que fragmenta as ações de promoção da política destinada às PCDs: A sociedade vê como trabalho caritativo. Percebem a inclusão para a pessoa com deficiência como uma ocupação psicológica e não como uma ocupação profissional. Mas ainda tem PCD pedindo esmola e querendo favorecimento. E muitas empresas querem driblar. Pedem deficientes, mas é para fazer banco de dados. Burocracia difícil! (SP4). Diante disso, retomando a perspectiva inclusiva, faz-se necessário desconstruir essas concepções assistencialistas e promover a participação cidadã dos sujeitos, como também reavaliar a gestão das políticas públicas setoriais para oferecer subsídio à política do trabalho. 89 Ainda nessa linha de pensamento detectam-se também situações em que a atmosfera de conformismo coloca a exclusão como algo determinante, fazendo com que as PCDs pactuem com situações tais como cita o trecho a seguir. Pessoas estão sendo incluídas no mercado formal, mas essas pessoas estão em casa. Não é uma inclusão de fato. Às vezes atenderam pessoas que querem carteira assinada, mas desejam na verdade é ficar em casa. Pactuam com esse tipo de inclusão (SE2). Contudo, outras situações adversas citadas por SE2 ilustram essa questão: Tem colocação de pessoa qualificada, mas que não é reenquadrada em outro cargo melhor. Tem uma pesquisa atual que mostra que as cotas estão sendo preenchidas, mas com cargos operacionais, aqueles na área de escritório com tarefas mais simples (SE2). Na mesma direção, o SP4 opina afirmando sua percepção: o nível social e o empoderamento têm melhorado por causa da acessibilidade e da Lei 8.213/91 (BRASIL, 1991a), mas os salários são baixos em relação ao de outras pessoas. A esse respeito, destaca-se a contribuição de Martins (1997, p. 20), ao discutir a problemática da exclusão: No Brasil, políticas econômicas atuais, que poderiam chamar-se neoliberais, acabam por provocar, não políticas de exclusão e, sim, políticas de inclusão precária e marginal, ou seja, incluem pessoas nos [...] processos econômicos, na produção e na circulação de bens e serviços estritamente em termos daquilo que é racionalmente conveniente e necessário à mais eficiente (e barata) reprodução do capital. Nesse conjunto, as mais variadas situações se apresentam, e persistem, apesar de ser indicada uma mudança, ainda que lenta e gradativa, conforme declara SP4: “na sociedade eu tô vendo, tá melhorando devagar. Não por desconhecimento, mas por interesse. Todo mundo sabe que tem que favorecer a inclusão do mercado de trabalho para a PCD” (SP4). Existem indicativos que demonstram mudança no paradigma, conforme declara SE2: 90 Tem também pessoas que não pactuam, querem sair dessa condição. Daí surgem denúncias em todas as áreas, educação, comércio, indústria, universidade, entidades religiosas que são fiscalizadas Temos colocações legais de quem cumpre a lei. [...] A rede bancária já descobriu uma saída [...] desenvolveu recrutamento e, além disso, oferece salário melhor e também está elevando a escolaridade das PCDs. Temos empresas estatais também dando oportunidades. As pessoas com deficiência estão fazendo concursos públicos, estão mais informadas de seus direitos, inclusive de fazer concurso público (SE2). Por outro lado, os participantes apresentaram postura crítica diante desses problemas, tal como foi abordado nas entrevistas quanto à avaliação da evolução da inserção das PCDs no trabalho no Brasil, quando se observa o seguinte depoimento: Hoje estamos num momento superpositivo. O MP e o MTE foram agressivos e alavancaram. Cobrou mais quem tem potencial para incluir mais. Não é só inserir. Tem que pensar em acessibilidade, capacitação e acolher devidamente, sensibilizar o funcionário para a inclusão dessas pessoas. Começar para daqui a alguns anos, colher frutos melhores. Empresas estão com dificuldade e PCD com dificuldade devido ao perfil dele. Mercado está aquecido. Hoje estão disputando salário e não perfil, quem paga mais eles estão indo. Na maturidade ela, a PCD, vai para onde se sentir melhor e também se identificar com perfil da empresa, daí sim é inclusão [...]. Pelo trabalho se inclui mais rápido. Se não tem a renda, depende de outra pessoa [...] dinheiro gera isso, dinheiro gera autonomia (SE1). Os fragmentos citados e recorrentemente afirmados nas entrevistas realizadas corroboram e conduzem à aproximação com as considerações e afirmações de Demo (2002) de que na sociedade atual observa-se certa predominância da inclusão tutelada que não trabalha na perspectiva emancipatória. Quanto à inclusão produtiva de fato, a que gera autonomia e empoderamento e independência para o cidadão com deficiência, essa ainda também não se consolidou, havendo um longo caminho a percorrer para tornar-se realidade. Os efeitos da visão assistencialista da participação das PCDs no mundo do trabalho aparecem quando se analisa o tipo de oportunidades que estão sendo criadas. Do ponto de vista do tipo de inserção desse público no mercado de trabalho, os participantes desta pesquisa foram unânimes ao responder que as inserções ainda se caracterizam como cargo de pouca qualificação e baixa remuneração, tal como ressalta a manifestação de SP3, que não os considera 91 subempregados por se tratar de vínculos empregatícios formais, como se a mera formalização do vínculo o descaracterizasse como subemprego. Abordagem reflexiva pode ser levantada nesse âmbito ao avaliar até que ponto a oportunidade de trabalho formal, com registro em carteira, garante à PCD a condição de empregado, já que na maioria dos casos se caracteriza como subemprego. Esse ponto merece mais discussões no campo dos direitos trabalhistas. Entretanto, foi destacado pelos respondentes que a oferta de subempregos pode vincular-se ao preconceito e ao estigma de que as PCDs constituem-se como indivíduos que não possuem capital laboral. Nesse aspecto, o implemento da fiscalização para o cumprimento da cobertura de cotas não tem avaliado a qualidade da inserção e do tipo predominante de oportunidade ao trabalho atualmente oferecido a essa população. Entende-se que os empregadores realmente contratam obrigados pela lei, o que caracteriza um processo de tutela, uma vez que, se não existisse a Lei de Cotas, não haveria emprego, ainda que as condições de emprego para PCDs estejam melhores. Dessa forma, o conceito de inclusão produtiva não parece orientar as ações do fórum, como também a diferenciação do conceito de inserção produtiva e inclusão produtiva. No próximo subitem será abordado o funcionamento de um dos espaços que, no meio de tantas contradições, desde a década de 1990, vão sendo conquistados pelos movimentos sociais como estratégia de enfrentamento das questões socais de grupos vulneráveis, tais como os das PCDs 4.3.1 Segundo eixo: a gestão social e os desafios no FPT Como desdobramento da Constituição Cidadã de 1988, a sociedade civil, por meio dos movimentos sociais, conquista espaços na esfera pública para mediar políticas públicas e afirmar seu controle social frente às políticas de saúde, educação e assistência social e oportunidades de trabalho e emprego. 92 Esse cenário gerou diversas organizações sociais, vinculadas aos mais variados movimentos e, entre eles, o movimento de PCD, que se mobilizou em torno da defesa do direito do trabalho, como, por exemplo, por meio do FPT. Nesse aspecto, Gohn (2001, p. 64) destaca que: [...] o exercício da democracia em nome da cidadania de todos é um processo, não uma engenharia de regras. Como tal, ele demanda tempo, é construído por etapas e aproximações sucessivas, em que o erro (ou deveria ser) é tão pedagógico quanto o acerto. Desenhar espaços participativos é construir a institucionalidade correspondente, de forma que respeite a diversidade, seja plural, aberta às identidades de cada grupo/organização/movimento, exige articulações políticas que superem os facciosismos e costurem alianças objetivando atingir determinadas metas. 4.3.1.1 Princípios, função social e papel dos fóruns Partindo do que se propõe o FPT, será apresentado o ponto de vista de seus participantes entrevistados sobre os princípios e função do FPT. Para isso, optouse por sintetizar os registros dos entrevistados por meio de um quadro de análise que possibilitou melhor visualização dos olhares coletados para posterior análise. Como se verifica na fala dos entrevistados, dois atores sociais responderam não saber quais são os princípios que norteiam o fórum. Outros dois mencionaram aglutinar pessoas envolvidas e comentam que essa instância fomenta a inclusão, mas afirmam não terem clareza sobre isso. Nos relatos destaca-se que três entrevistados disseram que o FPT representa um lugar de defesa dos direitos da PCD. Dois ressaltaram como princípios do FPT alguns elementos como ética, transparência, dedicação, voluntariado, promoção da dignidade e o exercício da cidadania no mercado de trabalho. 93 QUADRO 3 - Referencial com opiniões dos entrevistados com referência aos princípios, função e papel do FPT Princípios Função social S.E1 Não sei. Deveria ser. Era de realmente auxiliar na inclusão da PCD. S.E2 Seria o somatório das Não sei falar, ele tem uma discussões com o objetivo função igual conselho, de facilitar e fomentar a coordena atores públicos inclusão das PCDs. e privados. S.P3 A diretriz política do FPT é Contribuir para erradicar a a defesa dos direitos das PCDs, não toleramos nada que não seja para cumprir esse viés. discriminação. E há preocupação com a garantia da dignidade e promover a vida humana. Cumprimento do Papel Esse ano não. Não cumpre. Sim, ele busca cumprir. S.P4 A ética, a transparência, Manter a sociedade Cumpre, apesar dedicação e o voluntariado informada e a rede de de todas as mesmo. Você vai por amor inclusão em harmonia, dificuldades. à causa, senão não vai... atualizada, informada sobre o mercado de trabalho, empresa recebendo informação quanto à PCD no trabalho. S.O5 Não sei. Promover a autonomia da Pouco, tem que PCD avançar. S.O6 Envolver. Promover a Inclusão da PCD, Procura dignidade, o exercício da promoção da dignidade, cumprir. cidadania no mercado de erradicação da pobreza trabalho e em todos os da PCD. Tem-se outra espaços em que esteja. coisa... Não sei. Esse tem sido o que temos procurado proporcionar e trazer ferramentas para mostrar para as empresas como deve ser feito. S.O7 Não tenho claro aglutinar De grande alcance. Ele tenta, mas pessoas envolvidas, PCDs não consegue. e entidades. Elas deveriam ser abertas às famílias. Adquire mais força. Fonte: Elaboração da autora. Outro ponto abordado e apresentado no quadro refere-se à função do fórum. Quatro entrevistados associaram a função do fórum à promoção de uma vida digna ao falar em promoção da dignidade da vida humana e/ou da autonomia e 94 inclusão das PCDs. Dois ressaltaram sua função de informar às empresas sobre o emprego de PCDs. Um dos entrevistados deixou explícita a semelhança dos espaços dessa natureza em relação aos conselhos, entre outras formas de organização social. No que se refere à manifestação dos entrevistados quanto ao ponto de vista das características do fórum, a maioria destaca o FPT como um lugar de encontro de atores para debate e troca de experiências e informações. Espaço de discussão e inserção, mas para incluir mesmo (SE1). É um encontro de entidades públicas, ONGs, Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs), a sociedade como um todo em busca de ações para fomentar e somar esforços para indiretamente discutir e levar informações para a inclusão no mercado de trabalho (SE2). É dialógico por excelência. Uma esfera pública de debate (SP3). Principal, única e exclusiva: colocar PCD no mercado de trabalho (SP4). Representar a PCD (SO5). Diversidade das entidades que têm envolvimento na área da PCD (SO6). É um fórum de troca de queixas, poliqueixas, experiências e tentativa de busca de solução (SU7). Dessa maneira, as concepções acerca do significado do fórum e sua atuação na sociedade são caracterizadas por processos dinâmicos e dialógicos e contraditórios que perpassam por interações que se complementam e se antagonizam, produzindo, com isso, correlação com o entendimento de Tenório (2007, p. 10) “sobre gestão social como um processo dialógico no qual a autoridade decisória é compartilhada entre os participantes da ação”. Apresentam-se a seguir algumas falas para complementar as percepções dos participantes acerca das características do FPT no tocante às suas finalidades. Nos depoimentos coletados constata-se certo consenso quanto à formulação de políticas e ao acesso ao mercado de trabalho para PCD. 95 Elo de informação e divulgação. Teria papel de formulação políticopública e aglutinar entidades e integralizá-los e divulgar (SU7). PCDs possam ser incluídas não só no mercado de trabalho, com dignidade e competindo de forma igual e com qualidade de vida por meio do trabalho. (SE1). Fomentar a articulação entre diversos atores empregabilidade das PCDs e reabilitadas (SO5). em prol da Isso coincide com o que Toro e Werneck (2007) enfatizam a respeito do processo de mobilização, o qual se inicia quando uma pessoa, um grupo ou uma instituição decide iniciar um movimento para compartilhar um imaginário e o esforço para alcançá-lo. O respondente SE1 relata que o fórum é um espaço de participação e escuta com poder decisório democrático. A comunicação é comprometida pela baixa assiduidade dos seus frequentadores; a interação apresenta divergências; e a relação com a sociedade foi citada como mínima. Por outro lado, apesar das lacunas apresentadas, representa um lugar em que se estabelecem processos de aprendizagem, os quais contribuem muito para a formação dos seus participantes: “Até no meio da crise, ensinou a atuar” (SE2). SE2 afirma que a coordenação é democrática, ética e trabalha com bom senso e tranquilidade. Na sua perspectiva, a comunicação e a interação entre os membros foram avaliadas como boas: “Minha entidade tem boa interação com o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) e com a SRTE”. Por outro lado, a gestão de projetos, segundo o respondente, não se efetiva, como também um trabalho em rede, demandando articulação entre distintos setores da sociedade. Isso revela as contradições da dinâmica de um fórum social. Ainda no requisito coordenação, SP3 afirma que essa instância deve ter espírito de luta, persistência, engajamento e militância aguerrida. Entretanto, considera que a gestão atual tende a defender os interesses institucionais, não se constituindo como uma liderança democrática, pois desrespeita as deliberações da plenária. A comunicação, para esse entrevistado, “tornou-se tumultuada e manipulada para inviabilizar o processo da construção da rede de inclusão”. Em 96 relação à sociedade, a comunicação “passou a ficar tênue, porque pessoas passaram a desacreditar no processo. Veja a interação que é de mão dupla”. Na perspectiva de SP4, o gestor da coordenação mostra-se com perfil autoritário e a comunicação entre os membros se reduz a e-mails, sendo que a interação e comunicação com a sociedade foram avaliadas como fracas. O trabalho em redes “não vê” a sua dimensão em termos de amplitude e a gestão de projetos é definida em plenária. Para o entrevistado SO5: A coordenação estava fragilizada, entrei para apagar incêndio. A comunicação se dá no debate, com desrespeito e indelicadeza. A interação é baixa entre os membros, assim como com a sociedade. A aprendizagem que tiro é que cada dia quero ser mais mediador e conciliador. A gestão de projetos não existe. O FPT faz gestão das plenárias. Sobre questão de estar integrado a redes, somos convidados a participar de audiências públicas pelo nosso profissionalismo. De maneira geral, detectam-se diversos paradoxos e diferenças nas falas dos entrevistados, devido à complexidade da organização social de um fórum que articula distintos sujeitos de diferenciadas instituições e representatividades. Isso mostra que, conforme citações de alguns autores mencionados, a dinâmica de um fórum não constitui um sistema linear e harmônico, como muitas vezes idealizam algumas visões tecnicistas. Por outro lado, ficou muito evidenciado que o FPT representa lugar importante de promoção de aprendizagem e instrumentalização para seus participantes. Esse aparente caos reconstrói e organiza saberes que potencializam os gestores que compartilham esse tipo de experiência. Todavia, entende-se que esses espaços necessitam melhorar sua capacidade de comunicação, articulação, mobilização e escuta, com o objetivo e ampliar e fortalecer suas ações. Além disso, identifica-se que são necessárias outras instâncias formadoras, como a oferta de formação continuada para seus membros. 97 4.3.1.2 Os temas em debate o foco na rede de inclusão Como dito anteriormente, as observações participantes foram realizadas nas plenárias ordinárias mensais do FPT. Nesse aspecto, a temática central apurada referiu-se exclusivamente ao lançamento do Projeto Rede de Inclusão, o qual apareceu também denominado, em alguns documentos, pelos componentes, como Portal e Site da Rede de Inclusão. As discussões concentraram-se especificamente quanto ao lançamento e migração dos dados das instituições parceiras para a rede. Embora o FPT tenha a finalidade de implantar estratégias de inclusão de PCDs no mercado de trabalho, suas discussões nos últimos anos, segundo as entrevistas e na análise das atas, estiveram dedicadas à constituição, nos últimos anos, da rede de inclusão. Isso demonstra relevante conexão entre essas duas dimensões: a articulação das parcerias e a gestão social. Além disso, o fórum concentrou-se em assuntos correlatos à dinâmica de funcionamento do Portal e da logística do lançamento e da edição de um jornal nomeado Trabalho & Inclusão, substituindo o jornal Fala Núcleo, o qual teve apenas duas edições, lançadas em 2006. No período pesquisado, a temática da inclusão produtiva não se constituiu como assunto central. Entretanto, nas sete entrevistas realizadas, todos os participantes ouvidos citaram que o projeto da rede vem alterando a pauta, sendo que a finalidade maior do fórum, que se apresenta como ideário de diretrizes para a implantação de estratégias de inclusão da PCD no mercado de trabalho, não tem representado uma prioridade das discussões. Nesse aspecto, como revelou um dos participantes da entrevista: “Nos últimos tempos ficamos presos a questões dos problemas que impediram a construção da rede de inclusão” (SP3). Diante disso, cabe avaliar se esse Portal funciona ou não como estratégia para a inclusão produtiva. Nesse sentido, para melhor entendimento, consultou-se o 98 Projeto Rede de Inclusão, no intuito de avaliar o que está prescrito no documento e o que ocorre na prática dessa instância analisada. Trata-se de um projeto que apresenta um mecanismo exclusivamente voltado para o registro compartilhado de candidatos com deficiência a vagas no mercado de trabalho. Para isso, propõe-se a organizar uma rede de inclusão, a qual organizará um sistema único de compartilhamento de banco de dados entre instituições parceiras, de cadastramento de trabalhadores com deficiência no estado de Minas Gerais, que pretendem facilitar aos atores envolvidos (empresas, instituições governamentais e não governamentais) no cumprimento da Lei de Cotas. A ideia de criação da rede foi apresentada e referendada no Seminário Igualdade de Oportunidades e Combate à Discriminação, realizado em novembro de 2006, em Belo Horizonte, na sede do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura, pelo Núcleo de Combate à Discriminação em parceria como Fórum Pró-Trabalho. Para execução do Projeto Rede de Inclusão, o Ministério Público do Trabalho destinou os recursos oriundos da multa administrativa imposta a uma instituição mineira vinculada ao fórum, montante de R$ 339 mil reais destinados para a montagem estrutural da rede e o restante para o projeto de qualificação e elevação de escolaridade para as pessoas com deficiência, executado pela CAADE/SEDESE/MG, pessoas as quais após a qualificação passarão a integrar o banco de dados unificado da Rede. O documento assinala que a rede de inclusão funcionará na sede da SRTE e estará vinculada ao Núcleo de Igualdade de Oportunidades e ao Balcão de Oportunidades de Emprego, oferecendo suporte a todos aqueles que necessitam do cadastro. Por outro lado, destaca-se, na análise realizada, que essa temática tem sido um elemento de tensão e conflito entre integrantes. Alguns membros do fórum, por exemplo, ainda discutem sobre o projeto da rede, demonstrando dúvidas sobre a relação dela com o FPT, como foi observado nas entrevistas, conforme a seguinte 99 afirmação: “Pra mim tá misturado. É um órgão consultivo. O FPT é da sociedade civil. Com a rede confundiu tudo” (SE2). 4.3.1.2 A dinâmica das reuniões e plenárias A participação, ampla e livre (isto é, não obstruída) e a coordenação democrática são condições necessárias para a efetivação de processos genuínos de gestão social. Avritzer (2010, p. 149) salienta que, em espaços de organização social, a inclusão de atores sociais com experiência e proximidade com os problemas diários da população, adquirida na prática participativa, é um dos elementos que dinamizam a representação política nos conselhos e oferece condições para uma relação democrática. Quanto a isso, Demo (2002, p. 93) descreve que as relações mais democráticas fortalecem a participação e as lutas pela transformação social e a democracia ”não é algo que é automático, mas é fundamental para o desenvolvimento’’. Essa ideia é debatida por Gohn (2001, p. 94) ao afirmar que: O exercício da democracia em nome da cidadania de todos é um processo, não uma engenharia de regras. Como tal, ele demanda tempo, é construído por etapas de aproximações sucessivas, em que o erro é (ou deveria ser) tão pedagógico quanto o acerto. Toro e Werneck (2007) discorrem sobre a circulação de informações como aspecto fundamental para o funcionamento e aumento de uma rede, evidenciando com destaque essa função para aqueles que promovem e lideram uma ação de mobilização. Nesse nível se constituem essencialmente como facilitadores de intercomunicação e não dirigentes, fomentadores e coordenadores de rede. Podese concluir que a comunicação em processos de grupos, conselhos, fóruns e redes representa elemento preponderante para fortalecê-los, visando atingir fronteiras emancipatórias e empoderativas, nos processos que se identificam com a gestão social. 100 Para ilustrar essa questão, no tocante à participação, tema vinculado à GS, os integrantes chamaram a atenção para as últimas plenárias, já que estavam demonstrando certo nível de esvaziamento exemplificado conforme declara SO5: “eu estava fora e pude perceber poucas pessoas com mais frequência. Já teve 50 pessoas, hoje são 10”. No que se refere à liderança da mesa diretora, ficou evidente que os membros demonstraram certa dependência dessa instância para o funcionamento do fórum. Esse aspecto dificulta a dinamização das pautas e encaminhamentos das questões a serem debatidas. A citação de SE1 pode exemplificar essa situação: “A mesma pessoa que coordenava, apesar de tudo também tentava ter voz ativa”. Assim também se pode confirmar com o que SP3 diz: [...] na verdade todo mundo fala, mas normalmente o coordenador conduz o trabalho; deveriam ser respeitadas as decisões da plenária que é soberana... Como vou dizer... entre a plenária e a mesa diretora, o diálogo é desigual por causa da manipulação da gestão atual. Apesar disso, de acordo com os participantes, as distintas manifestações são expressas livremente, sem qualquer tipo de verticalidade ou cooptação, tal como mostra o entrevistado: “Todos colocam suas opiniões. Tem discussões quentes e calorosas e pesadas” (SO6). Contudo, na observação participante, verificou-se certa desorganização quanto à participação dos sujeitos e suas falas, havendo expressão de um ou mais integrante de maneira concomitante, não havendo sistematização das inscrições nas respectivas falas. Foi possível perceber que a matéria rede de inclusão e todas as implicações que envolvem seu funcionamento tomam todo o espaço de discussão, fazendo com que a temática da inserção laboral e/ou inclusão produtiva permaneça afastada da zona central das discussões. Essa afirmação pode ser confirmada com o 101 seguinte depoimento: “Nos últimos tempos ficamos presos a questões dos problemas que impediram a construção da rede de inclusão” (SP3). Além desses problemas citados, em relação a essas participações foi constatado por meio das entrevistas que a pessoa com deficiência apresenta reduzida participação: “são os que menos participam. Segmento historicamente discriminado é isso mesmo. Como vou dizer... é complicado. Pessoas, atores mais importantes da luta estão ausentes (SP3). Por outro lado, outro componente do fórum afirma com mais detalhes que: Eles são ausentes. Aí o nó da questão. Temos mais PCD representando as entidades. Eles não estão protagonistas! Mas alguém que tem a deficiência fala pela instituição que representa, geralmente é vinculado a uma instituição pública ou privada (SE2). Dando continuidade ao debate acerca dessa questão, o setor empresarial, segundo os entrevistados, apresentou a seguinte perspectiva: As empresas, mais ouvem do que falam (SP.4). Empresas participam com o objetivo de colocar PCD. Poucas permanecem, após entendimento, saem. Absorvem o conhecimento e sai. Participação não plena (SE2). Nesse quadro, Pateman (1992 apud GOHN, 2001, p. 20) define três tipos de situação de participação: “a pseudoparticipação (quando há somente consulta a um assunto por parte das autoridades); a participação parcial (muitos tomam parte no processo, mas só uma parte decide o fato); e a participação total, situação em que cada grupo de indivíduo tem igual influência na decisão final”. Nesse ponto, ainda manifesta nessa mesma sequência: “deveria ter mais empresas participando do FPT” (SE1). E relata que, em conjunto com uma ONG participante do FPT, estão criando uma rede de empresas inclusivas. A participação do segmento governamental mostrou-se de forma diferenciada diante das entidades privadas e ONGs, destacando-se, na opinião de outro entrevistado, SP3, como também no depoimento a seguir: “é diferente, muito 102 diferente. O poder público, manifestam com mais intensidade, conhecem a legislação. As empresas mais ouvem do que falam e as ONGs falam muito” (SP.4). Outra verificação refere-se à participação dos representantes do INSS. Esse órgão público, hoje, tem forte influência nos encaminhamentos e deliberações do FPT, ao levar para as pautas as questões das pessoas reabilitadas, o que garantiu a alteração da nomenclatura do Fórum Pró-Trabalho da Pessoa com Deficiência e Reabilitada, acrescentado o termo “reabilitada” à sua identidade e incorporando esse segmento ao escopo das ações do FPT. Da mesma forma, o respondente SP6 revelou que o poder público é disponível e oferece ferramenta e espaço sem ônus, mas as opiniões são pouco explícitas. De todo modo, mostram-se colaborativos. Rigo et al. (2010, p. 66) consideram que: A noção de gestão social indica e fortalece um novo modelo de relações entre o estado e a sociedade para o enfrentamento dos desafios contemporâneos. Um modelo no qual o Estado revê sua suposta primazia na condução de processos de transformação social e assume a complexidade de atores e de interesse em jogo como definidora dos próprios processos de definição e construção de bens públicos. Segundo Rigo et al. (2010. p. 57), “o conceito de gestão social seria desnecessário se tanto o agente público como o econômico praticassem uma gestão republicana: uma gestão preocupada com a justiça social, com o interesse pelo bem comum e não com interesses privados”. Dessa maneira, pôde-se observar que a defesa de direitos das PCDs ao trabalho por meio do fórum não se dá de forma linear. Entretanto, o que destaca são diversos fatores e limitações que envolvem a participação, como a baixa frequência às plenárias, condução autoritária de algumas lideranças e a reduzida presença de PCDs que representam exclusivamente o segmento. Enfim, são diversos os interesses que movem esses atores e, sobretudo, o protagonismo exacerbado do setor público. 103 4.3.1.3 Algumas tensões e crises evidenciadas no FPT Tensões e crises são processos inerentes a todo sistema vivo, pela dinamicidade que lhe é própria (MORIN, 1996). Nesse sentido, crise, aqui, não é considerada algo negativo ou pejorativo. Pelo contrário, representa a possibilidade dessa organização dialogar e reconstruir suas pautas e reivindicações, bem como reconfigurar seu projeto político e participativo. Desse modo, percebeu-se de maneira não velada a existência de uma denominada “crise”. Entretanto, constata-se, conforme Gohn (2010, p. 113), que: A voz e vozes que entoam e ecoam de seus participantes carregadas de emoções, pensamentos, desejos etc. são falas que estiveram caladas e passaram a se expressar por algum motivo impulsionador (carência socioeconômica, direito individual ou coletivo usurpado ou negado, projeto de mudança, demanda não atendida). Ao se expressar, os atores/sujeitos dos processos de aprendizagem articulam o universo de saberes disponíveis, passados e presentes, no esforço de pensar/elaborar/reelaborar sobre a realidade em que vivem. Os códigos culturais são acionados e afloram as emoções contidas na subjetividade de cada um. Dessa maneira, na observação participante, o que os sujeitos avaliam como processo atual do grupo como “estado de crise”, a autora opta em avaliar por outro olhar, percebendo o fórum como um sistema vivo, com sua dinamicidade processual de discussão e reconstrução coletiva de grupos sociais comprometidos. Estes, ao deparar com dúvidas e discussões carregadas de emoções, possuem a riqueza de identificar equívocos, desconexões e apontamentos que revelam momentos de “crise”, mas que, muitas vezes, podem levar à busca de adequações e novos caminhos. Partindo dessa ideia, Soares, Tassara e Ude (2010, p. 88) comentam que “um paradigma inclusivo reconhece a impossibilidade de mudar o todo sem mudar as partes e de mudar as partes sem alterar o todo, ou seja, ninguém se torna conflituoso com o meio se o próprio meio não possibilita diálogos, negociações e denúncias”. As situações de conflito são explicitadas nas seguintes manifestações: “Diante do atrito no ano fiquei neutra” (SE1). 104 Assim como também manifesta SP5: “entrei para o fórum mais para ajudar a tratar as divergências. O ideal é ter no fórum pessoas mais mediadoras [...] A crise do fórum e a identidade têm sido os pontos mais discutidos”. As divergências fazem parte da dinâmica de fóruns, conselhos e outros espaços de associação e discussão; todavia, faz-se necessário construir abertura para diálogos por meio da mediação de conflitos. Pontos convergentes e divergentes em reuniões e plenárias de grupos sociais fazem parte de sua dinâmica. E a garantia do caráter democrático representa a premissa básica para o implemento de uma sociedade mais inclusiva, oportunizando mecanismos de consenso para que tal fenômeno não produza descrédito institucional e, sobretudo, fragmentação do grupo, a qual pode gerar evasão de seus membros. Nesse sentido, a rede de inclusão tornou-se um projeto importante para o fórum, mas sua implantação foi complexa, por diversos fatores, entre eles: os recursos para sua implantação não eram administrados diretamente por ele; as plenárias passaram a ter apenas a rede de inclusão como pauta, com consequente esvaziamento nas plenárias; os gestores do fórum, participantes da mesa diretora composta paritariamente desintenderam-se, entre ocasionado a sociedade a saída civil da e o secretária poder público, executiva e, sequencialmente, do representante do poder público. Não se sabe o rumo que o FPT com sua problemática terá, mas acredita-se que serão necessárias mediação e nova mobilização para resgatar a participação e operacionalizar tanto o Projeto Rede de Inclusão como a missão maior do fórum, de controle social da política de inserção laboral das PCDs no trabalho. Destaca-se a relevância do fórum como espaço de participação democrática onde sociedade civil (representada pelas OSCIPs e ONGs, muitas vezes prestadoras de serviços do poder público), empresas e poder público se relacionam, instituindo novo padrão entre sociedade e Estado. As divergências e dissensos 105 devem conduzir a um constructo a ser aprimorado, uma vez que nesse espaço também há lutas políticas. Concluiu-se, recorrendo a Demo (2000, p. 80), “que é ingênuo interpretar a sociedade de fora do conflito. É ainda mais ingênuo acreditar que o conflito é a impossibilidade de conviver”. 106 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao analisar uma organização de defesa dos direitos à ocupação remunerada das PCDs, denominado Fórum Pró-Trabalho das Pessoas com Deficiência e Reabilitadas (FPT), que se mobiliza em torno da defesa do direito ao trabalho por meio da Lei de Cotas, foi possível observar fatores, de sua práxis, relacionados à inserção produtiva e à gestão social, em especial quanto à participação dos sujeitos participantes. A pesquisa evidenciou a capacidade do movimento social em se mobilizar por meio de um fórum baseado numa gestão compartilhada entre distintos setores sociais, de maneira democrática e dialógica, contribuindo para o alcance de seus objetivos, apesar das condições precárias de manutenção das estruturas que sustentam esse tipo de organização. Do ponto de vista da mobilização de atores sociais, foi possível perceber a contribuição desse espaço como local de controle social no acompanhamento da política pública, possibilitando o fomento em prol da real situação de emprego para as PCDs e de sua efetiva “inclusão social pelo trabalho”. O que se destaca nessa temática é a importância de se ocuparem arenas nas quais a sociedade civil tenha a capacidade de articulação e mobilização como estratégia de promoção da cidadania. Como o FPT promove ações relacionadas à Lei de Cotas, foi necessário conhecer essa política afirmativa instituída para garantir direitos ainda não afirmados na sociedade e suas implicações do ponto de vista da maneira como vem sendo cumprida a legislação. Foi constatado que o fórum apresenta limites em sua atuação. Ele não possui um processo de acompanhamento e monitoramento que possa dar a conhecer em profundidade os tipos de ocupação que estão sendo oferecidas às PCDs, ou mesmo um mapeamento, monitoramento e avaliação da qualidade de inserção realizada ou a própria consequência dessa inserção para a vida dos sujeitos com deficiência. 107 O pensamento a respeito do tema inserção produtiva foi estudado no intuito de verificar se existe alguma avaliação do FPT quanto ao tipo de inserção real no mundo do trabalho. Nesta investigação partiu-se da concepção de inclusão produtiva tal como conceitua o MDS: Todo processo conducente à formação de cidadãos integrados ao mundo pelo trabalho tem como perspectiva a conquista de autonomia para uma vida digna sustentada por parte de todas as pessoas apartadas ou fragilmente vinculadas à produção de renda e riqueza (BRASIL, 2011a). Revendo esse conceito, essa inserção refere-se à condição social e econômica do sujeito que, por meio do trabalho, adquire acesso e mobilidade social para atingir um patamar que lhe propicie autonomia e melhoria na sua situação de vida. As entrevistas foram realizadas com seis membros participantes do FPT e um exparticipante. O roteiro abordou variáveis que contribuíram para melhor compreender questões referentes ao seu grau de institucionalização, aos princípios que os orienta, suas finalidades, limites e possibilidades da inclusão produtiva e quanto à questão da gestão (gerenciamento). As entrevistas realizadas neste estudo contribuíram para ajudar a compreender como a inserção produtiva vem sendo praticada e que não é uma prática que se aproxima do conceito de inclusão produtiva, que possibilita a mudança real do patamar de condição socioeconômica na vida do sujeito. Assim, foi possível compreender que o tipo de inserção produtiva que vem sendo realizada nesta avaliação está caracterizado como uma inclusão marginal e/ou precária, segundo Martins (1997). A diversidade de procedimentos utilizados - constituída de observação participante não estruturada, entrevista e análise documental - proporcionou a triangulação de técnicas na identificação dos temas mais recorrentes do estudo realizado, sendo esse um dos apontamentos encontrados. 108 Na análise documental, priorizou-se analisar o regimento e as atas referentes a 2008, 2009 e 2010. Esse período destaca-se pela sistematização regular dos registros, apesar da constatação de que as atas não são descritivas na íntegra e não possuem regularidade descritiva nas suas transcrições. Ainda assim, por ser uma organização não instituída por lei, a análise das atas oportunizou recolher dados significativos para o estudo. Como recurso metodológico para a análise das atas, utilizou-se o software Atlas TI. Tal recurso metodológico também foi utilizado nos estudos de Avritzer (2010) e é orientado para a análise de conteúdo, neste caso com ênfase na comunicação dos participantes nas plenárias. Isso permitiu analisar a capacidade de vocalização dos sujeitos, na perspectiva setorial (poder público, setor empresarial ou as entidades de organizações não governamentais), quem fala mais, a capacidade de proposição, destacando nesse campo o papel preponderante do poder público. Os elementos de análise, portanto, demonstraram forte poder de vocalização do poder público em um fórum essencialmente com característica de “não institucionalizado por lei” (distinto de conselhos de políticas públicas, por exemplo), que se estrutura pelas necessidades e demanda social do segmento social de PCD. O peso do governo no funcionamento do fórum parece ser inquestionável, tanto na viabilização de espaço e em alguns períodos e eventos com recursos financeiros. Quanto à proposição e aprovação de propostas de ação, as diversas instâncias governamentais representadas parecem efetivar uma liderança inconteste no Fórum. Entretanto, deve-se atentar para que não gere relações hegemônicas por parte do poder público frente às demais. As entrevistas revelaram certo receio de participantes da sociedade civil em relação ao controle do FPT pelo Estado. Essa informação foi também confirmada nas entrevistas. Tanto nas entrevistas quanto na análise das atas destaca-se que as empresas que dele participam parecem estar mais interessadas em ouvir, trocar experiência e buscar conhecimento sobre a temática. Ademais, podem estar mobilizadas a 109 participar da entidade (FPT), que já possui certo reconhecimento institucional e que conta com a forte presença de representantes de instituições governamentais encarregadas de fiscalizar a aplicação das leis e, no caso de não cumprimento, impor multas. Esse fator amplia as possibilidades do fórum como também legitima seu espaço de rede articulada nessa temática e ressalta as possibilidades do FPT como um lugar de interação e aprendizagem. Outro interesse das empresas participantes parece buscar implantar instrumentos que facilitem a elas o cumprimento das exigências legais para emprego de PCD, o que é demonstrado pela importância que dão à discussão do Portal Rede de Inclusão. Dessa maneira, pode-se observar que a defesa de direitos das pessoas com deficiência não se dá de forma linear e homogênea do ponto de vista setorial (governo, ONGs e empresas) na participação. A participação das PCDs nos vários campos de diálogo e discussão e espaços democráticos com o FPT poderá ser repensada de forma que o próprio sujeito se envolva, defenda e garanta seu direito. Ou seja, conforme Pateman (1992, apud GOHN, 2001), espera-se que assumam “participação total” nas situações que tenham correspondência com sua realidade. Portanto, a participação é um elemento preponderante em organizações de gestão social, tal como o Fórum, que por seu caráter democrático tornam as pessoas realmente parte integrante desse locus. Nesse sentido, é oportuno reafirmar que a prática paradigmática fundamentada na participação, parceria e interação dos sujeitos na vida social possibilita a aquisição de conhecimento, aprendizagem, estímulos e oportunidades, substituindo ambientes segregatórios e discriminatórios. Percebe-se que está em formação uma nova visão da sociedade sobre as PCDs, substituindo paulatinamente o paradigma anterior marcado por visões preconceituosas e práticas assistencialistas e caritativas destinadas aos indivíduos com deficiência. Nesse aspecto, o marco legal, por meio da Convenção dos Direitos das PCDs recentemente adotada no Brasil, reforça as legislações anteriores e avança no combate à discriminação contra a PCD quanto a questões 110 relacionadas a formas de emprego, em todas as etapas e condições de trabalho, tais como seleção, recrutamento, contratação, admissão, permanência no emprego, ascensão profissional e condições seguras e salubres de trabalho e mesmo o trabalho forçado ou compulsório. Destaca-se também a proteção ao direito trabalhista em igual condição aos demais trabalhadores, com seus devidos direitos e consequente deveres, com igual remuneração por trabalho de igual valor, além da reparação de injustiças e assédio moral. Às PCDs também deve-se garantir condições de acesso à orientação profissional técnica e profissional, reabilitação profissional, oportunidade de trabalho autônomo, empreendedorismo, oportunidade de emprego em órgãos públicos e privados. Ressalta-se assegurar as adaptações razoáveis, não se desprezando a importante e contundente implementação da acessibilidade, o que em nossa percepção deverá contemplar os aspectos arquitetônicos, programáticos, metodológicos e das comunicações, entre outros, colaborando com as condições ajustáveis para que o trabalhador com deficiência possa, portanto, ser incluído de maneira adequada nas suas especificidades. Esse rol de exigências são alguns elementos balizadores que o Ministério do Trabalho e Emprego e o Ministério Público do Trabalho, por meio de suas publicações, orientações e apoio a grupos organizados, vem esclarecendo, conscientizando, ouvindo os sujeitos e ONGs e fiscalizando e realizando um trabalho profícuo, com o compromisso de que essas diretrizes para promoção do emprego remunerado para as PCDs sejam cumpridas (BRASIL, 2000c). Dessa maneira, pode-se afirmar que as conquistas das PCDs caminham para a inclusão produtiva e da cidadania não tutelada (DEMO, 2002), na perspectiva da autonomia, empoderamento, emancipação socioeconômica das PCDs. Todavia, apesar dos estudos defenderem a perspectiva da inclusão produtiva, ainda prevalece a inclusão marginal ou precária e tutelada, uma vez que no debate atual e nas próprias entrevistas a qualidade da inserção realizada não tem destaque privilegiado nas discussões do fórum. 111 Os pontos listados a seguir muitas vezes são identificados como impeditivos para o avanço da inserção produtiva das PCDs e podem constituir-se como um diagnóstico de características e particularidades que deverão ser gerenciadas para o pleno emprego das PCDs na sociedade no momento histórico atual: As PCDs possuem baixo índice de escolaridade, em função da exclusão vivenciada nos sistemas educacionais. As PCDs não estão qualificadas. O nível de exigência de escolaridade das empresas é elevado. Há competição do benefício de prestação continuada e do benefício da Previdência com a remuneração do trabalho da PCD. Boa parte das pessoas acaba desistindo do trabalho em função da parca estabilidade oferecida pela lei. Devido ao preconceito e discriminação, as PCDs relatam dificuldades em acreditar nas suas potencialidades, inclusive a laboral. As entidades não possuem cadastro de PCDs aptas para o mercado de trabalho. As PCDs não sabem onde procurar oportunidades de trabalho. As empresas às vezes até desejam empregar PCD, mas não sabem onde encontrá-la. As empresas não possuem conhecimento sobre as especificidades desse público. As empresas não estão dispostas a investir em acessibilidade, impossibilitando o acesso de pessoas com certas deficiências ao posto de trabalho. A maioria das empresas não está disposta a fazer concessões e/ou adequações específicas para as PCDs. Os órgãos fiscalizadores atuam de forma ainda muito tímida. Os órgãos fiscalizadores nem sempre possuem conhecimento específicos sobre a questão, aceitando as justificativas apresentadas pelas empresas pelo não cumprimento da cota. As empresas não percebem o emprego de PCDs como exigência de cumprimento da legislação, mas como uma benesse ou como ação de responsabilidade social. 112 Faltam campanhas de sensibilização no meio empresarial. Deve-se envolver as famílias na fase que antecede os programas de capacitação e inclusão laboral, possibilitando conhecimento e segurança aos familiares, no sentido de evitar posturas de superproteção ou tutela junto às PCDs. Esta dissertação não investigou diretamente esses impedimentos, reais e alegados, ao emprego de PCD, ainda que a busca de identificação do conceito de “inclusão produtiva” nas práticas do FPT tangenciasse alguns deles. Assim, cabe uma postura crítica no intuito de desconstruir as abordagens assistencialistas que desconsideram o propósito da inclusão e da cidadania autônoma e que não contribuem para a emancipação dos sujeitos. A sugestão que se pode fazer, nesse aspecto, refere-se à busca de transpor esses obstáculos por meio de tecnologias sociais, que podem significar, todavia, ponto de partida para outros estudos (BRASIL, 2005). Entretanto, a partir desta pesquisa, a principal ferramenta que se apresenta relaciona-se ao desafio dos gestores para a implantação de programas dessa natureza na perspectiva da gestão social. Da análise das entrevistas realizadas neste estudo com os participantes, constatou-se que eles têm visões diferenciadas sobre os princípios e a finalidade do FPT. Por outro lado, ficou evidenciado que o FPT representa a possibilidade de ser lugar de promoção, aprendizagem e instrumentalização para seus participantes. Os participantes compartilham o interesse em defendê-lo como espaço democrático e de articulação de redes, ainda que vejam dificuldades no seu funcionamento (coordenação autoritária para uns, comunicação manipulada para outros, a excessiva dedicação à constituição do Portal da Inclusão e a absorção do Fórum pelo Estado ainda para outros). Muitas vezes, um aparente caos, identificado em momentos de crises, exige que se reconstruam e organizem saberes e que se compartilhem experiências. Entende-se que esses espaços apresentam limitações e necessitam melhorar a sua capacidade de comunicação, articulação, mobilização e escuta, com o 113 objetivo de ampliar e fortalecer suas ações. Além disso, detectou-se a necessidade da oferta de instâncias formadoras, como oferta de formação continuada para seus membros. A GS representa um “modo de fazer” complexo, em que se emaranham distintos fatores, atribuições, interesses e trajetórias. Mas a práxis do FPT se aproxima da caracterização do modelo inclusivo e sinaliza a convergência com os conceitos de GS do ponto de vista de suas características, finalidades e funções. Nesse contexto, resgata-se o conceito de GS de Maia (2005, p. 15-16): Assim, compreendemos gestão social como um conjunto de processos sociais com potencial viabilizador do desenvolvimento societário emancipatório e transformador. É fundada nos valores, práticas e formação da democracia e da cidadania, em vista do enfrentamento às expressões da questão social, da garantia dos direitos humanos universais e da afirmação dos interesses e espaços públicos como padrões de uma nova civilidade. Construção realizada em pactuação democrática, nos âmbitos local, nacional e mundial; entre os agentes das esferas da sociedade civil, sociedade política e da economia, com efetiva participação dos cidadãos historicamente excluídos dos processos de distribuição das riquezas e do poder. Tal definição pode parecer utópica em uma sociedade capitalista, mas parece, sobretudo, estar mais próxima e adequada, apresentando a possibilidade de pavimentar o caminho para se alcançar uma gestão que atenda às necessidades e demandas específicas para situações sociais mais injustas e de grupos historicamente vulneráveis, tais como as das PCDs. A contribuição deste estudo destaca a riqueza de fóruns dessa natureza, composto pela diversidade de seus componentes e a sua característica intersetorial e dialógica. O campo de gestão social ou de gestão do desenvolvimento social apresenta-se como uma grande possibilidade, um reflexo das práticas e do multiconhecimento construído por múltiplas disciplinas, delineando-se uma proposta multiparadigmática, de natureza interdisciplinar. As organizações sociais estão sempre redefinindo as suas práticas e adquirindo novos conhecimentos. Portanto, se reorganizam e se ressignificam de acordo com o momento histórico, político e social. Todavia, a obrigatoriedade do 114 cumprimento das cotas apresenta essa característica peculiar de exigir a superação de obstáculos, o que possibilitará inovação, busca de ajudas técnicas e até mesmo desenvolvimento local nos territórios vulneráveis. São novas práticas que, ao se realizarem, adquirem significados e formas para subsidiar o alcance da tão necessária justiça pela inclusão social. Dessa maneira, do ponto de vista de limites e possibilidades, a inclusão produtiva necessita, em primeiro lugar, ser entendida como um conceito permeado de valores emancipatórios do sujeito em sua vida econômica social e cultural, mais bem desenvolvida em um contexto de GS. Por outro lado, o FPT, no período estudado, demonstrou mais preocupação com a racionalidade instrumental (relacionada aos fins) em detrimento da racionalidade substantiva (em relação aos seus valores), ao centrar suas discussões e debates na Rede de Inclusão. Tal encaminhamento não invalida seu campo de organização e possibilidades, que se materializa pela prática de construção e decisão coletiva dos atores envolvidos em prol da inclusão social. No caso das políticas públicas para as PCDs, justifica-se a criação de espaços sistemáticos de construção coletiva, com orientação teórico-prática entre a sociedade civil e o poder público, com características e valores teórico-conceituais da gestão social, necessários para propiciar espaço de participação, mobilização e diversidade, proposição, aprendizagem, promoção de valores, busca de finalidades, reflexão, comunicação e ações estratégicas de enfrentamento que, para além das cotas legais, desconstruam paradigmas, preconceitos e discriminações. 115 REFERÊNCIAS ARANHA, Maria Salete Fábio. Trabalho e emprego: instrumento de construção da identidade pessoal e social. São Paulo: SORRI-BRASIL; Brasília: CORDE, v. 9, 2003. 36 p. (Série Coleção Estudos e Pesquisas na Área da Deficiência). 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Belo Horizonte: Autêntica, 2007. WANDERLEY, Mariangela Belfiore. Refletindo sobre a noção de exclusão. In: SAWAIA, Bader et al. As artimanhas da exclusão: análise psicossocial e ética da desigualdade social. Petrópolis: Vozes, 1999.155 p. 122 APÊNDICES E ANEXO Apêndice A – Roteiro de entrevista 1) Quanto à Constituição do FPT: a) Há quanto tempo você frequenta o FPT? b) Como você passou a fazer parte do FPT? E sua entidade? c) Existe algum critério para o ingresso no FPT? Como os participantes ingressam no FPT? d) Você é assíduo às reuniões? E os outros membros? Quem é mais assíduo? e) Qual a principal característica do FPT? f) No seu entendimento, qual a finalidade do FPT? g) Qual a identidade do FPT? Como você reconhece o FPT? Como ele é reconhecido frente à sociedade? 2) Quanto ao funcionamento e organização: a) Como o FPT funciona no dia-a-dia? Por meio de que eventos (plenárias, reuniões, seminários)? b) Como é feito o monitoramento do funcionamento? c) Qual a frequência dos encontros? Como são convocados? d) Qual o problema mais comum, isto é, mais frequente quanto ao funcionamento do FPT? O FPT conversa e discute isso? e) Quais as principais atividades do FPT? f) Quais são as ações mais importantes? g) Como são organizadas as pautas? h) Quais têm sido os pontos mais discutidos recentemente? i) As pautas contemplam aspectos de promoção para o emprego de PCD? Como? j) Relate uma reunião típica. k) Como são tratadas as divergências quanto às atividades e funções do FPT? 123 l) Quais os maiores êxitos da atuação do FPT em sua opinião? m) Quais as principais dificuldades para uma atuação mais efetiva do FPT? Essa dificuldade já foi ponto de pauta de debates no FPT? 3) Quanto aos princípios: a) Quais os princípios que norteiam as ações do FPT? b) Qual a função social do FPT? Qual a maior preocupação do FPT? c) Qual a função social na perspectiva dos direitos humanos? d) O FPT cumpre seu papel e/ou sua função social nessa perspectiva? e) No que diz respeito à ocupação econômica de PCD, quais os princípios que norteiam o FPT? f) Como são encaminhadas as deliberações? g) Como se dá a participação dos membros nas reuniões? h) Quem coordena? É sempre a mesma pessoa? Quem fala mais? i) O FPT trabalha de forma integrada com outras entidades (empresas, instituições, outros fóruns, conselhos etc.)? Trabalha em redes de forma articulada? 4) Quanto às finalidades, limites e possibilidades da inclusão produtiva (ações): a) Como você avalia a evolução da inserção das PCDs no trabalho no Brasil? E na sociedade? b) Como estão sendo desenvolvidas as ações voltadas para a ocupação econômica de PCD? O FPT visa só à promoção do emprego ou também da auto-ocupação e geração de renda? c) Quais são as intencionalidades da promoção da ocupação econômica das PCDs? Quais são as ações? Quais você considera principais ações? Existem parcerias para executar essas ações? Quais são? d) Como você classifica o tipo de inserção de PCD no mercado de trabalho? Trabalho qualificado ( ) Subemprego ( ) Trabalho precário ( ) Por quê? e) O FPT segue ou sugere alguma metodologia de ação para inserção das PCDs no mercado de trabalho? Existe acompanhamento dos casos encaminhados? f) Quais as dificuldades encontradas? alguma metodologia de 124 g) O que pode ser feito para melhorar a situação? h) O FPT avalia o tipo de ocupação econômica que está sendo promovido por sua atuação? Como é avaliado? Qual é o tipo de ocupação? (Se não há informação do FPT, descreva o que você imagina ser o tipo de ocupação criada pela atuação do FPT). 5) Quanto à gestão? a) Quais as instituições que participam do FPT? Quais não estão e que deveriam estar? b) Como se dá a participação dos membros do FPT? (Poder público, entidades privadas, ONGs)? E do sujeito com deficiência? c) Como se dá a coordenação do FPT? Como é escolhida? d) Para você, como quais características a coordenação do FPT deve ter? e) Como você qualifica as características principais do gestor atual do FPT? f) Em sua avaliação, qual é o perfil do gestor ou da liderança: democrática ( ) autoritária ( ) centralizadora ( ) Não centralizadora ( ) Por quê? g) Como se faz a gestão dos projetos do FPT? h) Quanto às deliberações, como deveriam ser encaminhadas? i) Quanto ao poder decisório, como deveria ser? j) Como se dá a comunicação entre os membros? E a interação? k) E com a sociedade, como é a comunicação? E a interação? l) Quais têm sido os principais dilemas quanto à gestão do FPT? Isso foi discutido no FPT? m) Qual a fonte de recursos para funcionamento do FPT? n) Qual importância do software para você? O que tem a ver com a função principal do FPT? o) O FPT proporciona alguma aprendizagem? Que aprendizagem a sua participação no FPT proporciona? p) O próprio FPT mudou sua forma de funcionar, de se gerir, de pensar a inserção da PCD no mercado de trabalho ao longo do tempo? Como? Por quê? 125 Apêndice B - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido Título da Pesquisa: “Inclusão produtiva da pessoa com deficiência por meio da gestão social: um estudo acerca do Fórum-Pró-Trabalho”. Nome do pesquisador principal ou orientador(a): Frederico Luiz Barbosa de Melo. Nome da pesquisadora assistente/aluna: Maria Cristina Abreu Domingos Reis. 1. Natureza da pesquisa: o sr.(a.) está sendo convidado(a) a participar desta pesquisa, que tem como finalidade analisar limites e possibilidades do processo de um fórum voltado para subsidiar e promover o emprego de PCD nos marcos da Lei de Cotas, sob a perspectiva dos direitos humanos e da gestão social. 2. Participantes da pesquisa: serão sete participantes do Fórum-Pró-Trabalho, sendo dois gestores de ONGs, dois gestores de empresas ou instituições públicas, dois gestores de empresa privadas e uma pessoa que participou e não participa mais do fórum. 3. Envolvimento na pesquisa: ao participar deste estudo, o sr. (a) permitirá que a pesquisadora, Sra. Maria Cristina Abreu Domingos Reis, realize entrevista com o(a) Sr.(a) O (o) Sr. (a.) tem liberdade de se recusar a participar e a continuar participando em qualquer fase da pesquisa, sem qualquer prejuízo para o Sr.(a). Sempre que quiser poderá pedir mais informações sobre a pesquisa pelo telefone da pesquisadora do projeto e, se necessário, pelo telefone do Comitê de Ética em Pesquisa. 4. Sobre as entrevistas (se houver, especificar como serão realizadas): as entrevistas serão conduzidas pela mestranda e pesquisadora Maria Cristina Abreu Domingos Reis, que seguirá um roteiro específico previamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UNA. As entrevistas serão gravadas para posterior análise. 5. Riscos e desconforto: a participação nesta pesquisa não traz complicações legais. As questões podem gerar alguma dúvida ou desconforto relacionados ao conhecimento ou desconhecimento sobre questões abordadas. As entrevistas não geram qualquer tipo de risco para qualquer um dos entrevistados. Os. procedimentos adotados nesta pesquisa obedecem aos Critérios da Ética em Pesquisa com Seres Humanos, conforme Resolução no. 126 196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Nenhum dos procedimentos usados oferece riscos à sua dignidade. 6. Confidencialidade: todas as informações coletadas neste estudo são estritamente confidenciais. Somente a pesquisadora e o(a) orientador(a) terão conhecimento dos dados. 7. Benefícios: ao participar desta pesquisa, o Sr.(a) não terá qualquer benefício direto. Entretanto, esperamos que este estudo traga informações importantes sobre (.......), de forma que o conhecimento que será construído a partir desta pesquisa possa (........), comprometendo-se a pesquisadora a divulgar os resultados obtidos. 8. Pagamento: o Sr.(a) não terá algum tipo de despesa para participar desta pesquisa, bem como nada será pago por sua participação. Após esses esclarecimentos, solicitamos o seu consentimento de forma livre para participar desta pesquisa. Preencha, por favor, os itens que se seguem. Obs: Não assine este termo se ainda tiver dúvida a respeito. Consentimento Livre e Esclarecido Tendo em vista os itens aqui apresentados, eu, de forma livre e esclarecida, manifesto meu consentimento em participar da pesquisa. Declaro que recebi cópia deste termo de consentimento e autorizo a realização da pesquisa e a divulgação dos dados obtidos neste estudo. Nome do Participante da Pesquisa Assinatura do Participante da Pesquisa Assinatura do Pesquisador Assinatura do Orientador Pesquisador Principal: Frederico Luiz Barbosa de Melo – 9904-9579 Demais pesquisadores: Maria Cristina Abreu Domingos Reis – 9975-0015 Comitê de Ética em Pesquisa: Rua Guajajaras, 175, 4º andar – Belo Horizonte/MG Contato: email: [email protected] 127 Apêndice C – Produto final Instrumento de avaliação de fóruns de gestão social Como consequência do estudo “A gestão social e a inclusão produtiva: limites e possibilidade da experiência do Fórum Pró-Trabalho das Pessoas com Deficiência”, construiu-se um instrumento de avaliação do funcionamento de instâncias de participação da sociedade civil (tais como fóruns, colegiados, redes), contemplando variáveis da participação e da gestão social (GS). Seu objetivo é aprimorar os mecanismos de organização e compromissos assumidos de uma mobilização com viés na democratização e participação da sociedade civil organizada, na elaboração, implementação, monitoramento e avaliação das políticas públicas. São propostos dois indicadores, com os respectivos diagramas por dimensões: um para a qualidade da participação e outro para a qualidade da GS. Com a Constituição Cidadã de 1988, a participação da sociedade civil tornou-se uma realidade constante na dinâmica da sociedade. Os grupos sociais vulneráveis, na busca de conquista de seus espaços e também de políticas públicas que atendam a seus anseios, encontraram ambiente propício à mobilização por meio de conselhos e fóruns. Essas organizações possuem pautas, reuniões sistemáticas e estratégias de gestão das políticas públicas para alcançar as suas finalidades. Nesse sentido, compreendendo a importância dessas iniciativas políticas da sociedade, torna-se necessário de maneira concreta avaliar o percurso dessas organizações para cada vez mais aprimorar intenções e ações. Portanto, a contribuição que ora se apresenta refere-se, de maneira simplificada, à avaliação de aspectos que envolvem a gestão desses grupos. Do ponto de vista conceitual, essa ferramenta possui grande afinidade com a denominada GS, elemento mais adequado às características desses movimentos sociais. 128 Para melhor explicitar o que se propõe, remete-se ao conceito de GS de Maia (2005): Assim, compreendemos gestão social como um conjunto de processos sociais com potencial viabilizador do desenvolvimento societário emancipatório e transformador. É fundada nos valores, práticas e formação da democracia e da cidadania, em vista do enfrentamento às expressões da questão social, da garantia dos direitos humanos universais e da afirmação dos interesses e espaços públicos como padrões de uma nova civilidade. Construção realizada em pactuação democrática, nos âmbitos local, nacional e mundial; entre os agentes das esferas da sociedade civil, sociedade política e da economia, com efetiva participação dos cidadãos historicamente excluídos dos processos de distribuição das riquezas e do poder (MAIA, 2005, p. 15-16). Como também ao conceito de Fischer, denominando a GS como aquela que: Articula múltiplas escalas de poder individual e social; que trabalha a identidade de projeto, refletindo e criando pautas culturais; que coordena interorganizações eficazes; que promove ação e aprendizagem coletiva; que se comunica e difunde resultados; que presta contas à sociedade; que reavalia e recria estratégias processuais (FISCHER, 2002, p.12). A ferramenta criada é de um diagrama composto de 10 variáveis que irão considerar o bom desempenho de uma GS e, em específico, de participação social nas instâncias de GS. Esse instrumento foi inspirado no mapa criado por Ude (2008), o qual avalia os vínculos externos de uma rede institucional, com o intuito de identificar fragilidades, potencialidades e vulnerabilidades que configuram o campo intersetorial a ser pesquisado. A ideia é: Cada pessoa implicada na avaliação dá uma nota para as 10 dimensões; as alternativas de notas são: 1 (péssimo), 2 (ruim), 3 (satisfatório), 4 (bom) e 5 (ótimo); tiram-se as médias de cada dimensão (aqui há duas alternativas: a) faz-se o cálculo da média total das médias de cada dimensão; ou b) dá-se peso maior para uma ou outra dimensão e calcula-se a média ponderada (por esses pesos) das médias de cada dimensão; chega-se a um indicador de “boa participação” e outro de "boa gestão social" (ou má)! 129 Esses critérios foram elaborados como ferramenta de avaliação de fóruns e/ou conselhos de direitos, na perspectiva de determinar pontos frágeis e fortes na organização de um grupo social, que de maneira sistemática se organiza por meio de objetivos comuns para acompanhar e realizar o controle social de algum tema vinculado a políticas públicas. 1.1 Instrumento da avaliação da participação dos membros de um fórum de gestão social 1.1.1 Participação Considera-se que “participação” é uma característica central e definidora das instâncias de GS. Ou seja, não se concebe um fórum ou conselho de GS que não seja composto por indivíduos e representantes de entidades distintas (do Estado, da sociedade civil, das empresas, de organizações não governamentais, etc.) e em que não ocorra interação entre eles e a formulação de contribuições de diversas origens para alcançar seus objetivos. 1.1.2 Dimensões para avaliação da participação O QUADRO 1 mostra o significado dos termos empregados nessa dimensão. 130 QUADRO 1 – Dimensões da participação em fóruns de GS e respectivos significados Termo 1-Assiduidade Significado Presença dos participantes às reuniões, plenárias, e eventos. 2-Durabilidade Tempo de participação instituição no fórum. 3-Diversidade da pessoa e/ou da Pluralidade de segmentos e pessoas, de todos os grupos sociais com interesse no tema, presentes no fórum. 4-Diálogo e vocalização Expressão e manifestação de opiniões numa lógica dialógica em que todos têm direito à voz e à expressão de ideias e opiniões. 5-Proposição Capacidade de apresentar propostas que são acatadas. 6-Processos deliberativos Ação de decidir mediante discussão e decisão coletiva. 7-Aprendizagem Conjunto de processos de construção de conhecimento a partir de experiências que implicam interações de reciprocidade . 8-Construção coletiva Elaboração (de proposta ou de ação) que compreende ou abrange muitas pessoas ou um grupo. 9-Coordenação Pessoa ou grupo que organiza o trabalho de um grupo, cujos elementos têm autonomia para organizar seu próprio trabalho. 10-Mobilização Capacidade dos membros do fórum em arregimentar pessoas e entidades que não fazem parte do fórum, para suas ações e para a realização de seus objetivos. 131 FIGURA 1 – Instrumento de avaliação da participação em fóruns e conselhos 1.2 Instrumento de avaliação da atuação de um fórum de GS Esse instrumento diz respeito à qualidade da atuação dos fóruns de GS, desdobrando-se em dimensões que os estudos acerca de processos de GS ressaltam como componentes importantes em instâncias de participação social voltadas para diferentes formas de contribuição e intervenção em políticas sociais ou problemas afins. 1.2.1 Dimensões para avaliação da GS No QUADRO 2 ressalta-se o significado dos termos nessa dimensão. 132 QUADRO 2 – Dimensões da GS e respectivos significados Termo 1-Participação 2-Valores 3-Finalidades/ propósitos 4-Orientação teórica para a prática 5-Articulação de redes 6-Monitoramento 7-Comunicação (externa) 8-Resultados (eficácia e efetividade) 9-Recursos 10-Organização Significado É a tomada de parte pela pessoa em algo exterior a si mesma, visando à consecução de um objetivo compartilhado com outros. Conjunto de princípios, ideias e julgamentos que orientam a ação. Fim a que se destina, metas e objetivos. Clareza nas referências teóricas, que orienta a execução concreta de uma ação e a busca da finalidade, segundo os valores que fundam o fórum . Integração das ações do fórum nas políticas, programas e articulação de grupos e pessoas na perspectiva da intersetorialidade. Acompanhamento da realização das ações do fórum referentes a seus objetivos. Estabelecimento de relação entre pessoas, grupos, organizações mediante o emprego de diversos tipos de linguagem, em um tipo de interação em que sempre estão presentes um emissor, um canal, um receptor e uma mensagem. Análise dos produtos de uma ação. Eficácia diz respeito ao alcance dos objetivos pretendidos, se estão sendo verificados ou não, enquanto efetividade remete à geração de resultados mais amplos, não diretamente pretendidos. Elementos e meios necessários para a execução de um trabalho ou de uma ação. Modo ou forma que se dispõe a funcionar. Observe-se que a nota referente ao item ”participação” poderá ser levantada por meio do instrumento anterior proposto. Ou seja, o resultado final do primeiro instrumento (para avaliação da participação) poderá ser trazido para esse instrumento de avaliação da GS. 133 FIGURA 2 – Instrumento de avaliação da GS Referências FISCHER, Tânia. A Gestão do desenvolvimento social: agenda em aberto e propostas de qualificação. 2002. Disponível em <http://unpan1.un.org/intradoc/groups/public/documents/clad/clad0044559.pdf> Acesso em: 21/01/2011. Maia (2005) MAIA, Marilene. Gestão Social: reconhecendo e construindo referenciais. Revista Virtual Textos & Contextos. nº 4, dez. 2005. UDE MARQUES, Walter Ernesto. Enfrentamento da violência sexual infantojuvenil e construção de redes sociais: produção de indicadores e possibilidades de intervenção. In: CUNHA, Edite da Penha et al. (orgs). Enfrentamento à violência sexual infanto-juvenil: expansão do PAIR em Minas Gerais. Belo Horizonte: UFMG, 2008. 134 Anexo A – Parecer ético 135 ANEXO B – Regimento Interno do Fórum Pró-Trabalho REGIMENTO INTERNO CAPÍTULO I – DA DEFINIÇÃO Artigo 1º - O presente regimento regula as atividades e atribuições do O FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA, criado pela plenária de instituições governamentais e não governamentais reunidas no auditório do Instituto São Rafael, no dia 10 de abril de 2000. CAPÍTULO II – DA NATUREZA E FUNCIONAMENTO Artigo 2º - O FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA, órgão consultivo, atuará, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, por tempo indeterminado, conforme as disposições deste Regimento. CAPÍTULO III – DO OBJETO Artigo 3º - O FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA tem por objeto a articulação de entidades e órgãos com interesse no tema, com a finalidade de organização do ideário de Diretrizes para a implantação de estratégias de inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho, respeitadas as competências e as atribuições legais dos órgãos participantes. CAPÍLO IV – DAS ATRIBUIÇÕES E COMPETÊNCIAS DO FORUM Artigo 4º - Compete ao FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA: I. Promover a articulação de órgãos e entidades com interesse no tema, objetivando o estabelecimento de diálogo constante e distribuição da informação entre os órgãos participantes; II. Propor, através de documentação gerada por consenso entre as entidades participantes, medidas legais, educativas e outras que promovam a inclusão da pessoa com deficiência no Mercado de 136 Trabalho e que desencorajem a propagação de casos de discriminação; III. Articular com organismos nacionais e/ou internacionais mecanismos de cooperação visando a realização de estudos de diagnóstico e análise dos fatores mais comumente verificados no Mercado de Trabalho e na sociedade em geral que tratem da inclusão da pessoa com deficiência. IV. Baseado nos estudos ressaltados no inciso III e em estudos sobre o Mercado de Trabalho, propor medidas de adequação, promoção, extinção, conforme o caso, bem como solicitar procedimento investigatório ao Ministério Público do Trabalho, para ajustamento de conduta na contratação e cumprimento da lei n.º 8213/91; V. Promover articulação entre as entidades envolvidas e a facilitação de ações de conscientização da sociedade quanto às potencialidades profissionais da pessoa com deficiência; VI. Incentivar, em parceria com entidades que a compõe a participação de todos os segmentos sociais buscando alternativas para solução de problemas existentes com relação a inclusão no Mercado de Trabalho da pessoa com deficiência; VII. Estimular e eventualmente coordenar a cooperação técnica e financeira entre os representantes governamentais e não governamentais, visando garantir a consecução dos seus objetivos; VIII. Coordenar e incentivar a execução e a promoção de ações afirmativas que objetivem a inclusão da pessoa com deficiência no Mercado de Trabalho; IX. Solicitar e socializar dados e informações acerca do tema relativo à pessoa com deficiência, possibilitando a elaboração de propostas e a revisão da legislação pertinente ou a sua regulamentação, quando se fizer necessário; X. Discutir e propor ações para qualificação profissional para pessoa com deficiência para geração de trabalho e renda, bem como firmar acordos de cooperação com organismos de capacitação; XI. Pronunciar-se sobre as questões de discriminação no Mercado de Trabalho denunciando-as aos órgãos competentes; XII. Buscar a sistematização das ações de inclusão da pessoa com deficiência no Mercado de Trabalho através da orientação e divulgação de ações isoladas de cada uma das entidades participantes; 137 XIII. Contribuir para a redefinição de políticas públicas, garantindo que o indivíduo com deficiência possa tornar-se produtivo, assegurando a este segmento social o direito a cidadania; XIV. Orientar as empresas, entidades patronais e de trabalhadores quanto a obrigatoriedade legal de oferta de trabalho para pessoa com deficiência ( Instrução Normativa n.º 20 de 26 de Janeiro de 2001), bem como quanto às possibilidades na admissão de pessoas com necessidades especiais, classificadas como Portadoras de Deficiência, segundo critérios expressos no decreto n.º 3214 de 20 de Dezembro de 1999; XV. Esclarecer o empregador quanto aos recursos tecnológicos existentes para adequação do ambiente de trabalho e da necessidade de tal adequação para cumprimento do disposto Decreto supra citados. CAPÍTULO V – DA COMPOSIÇÃO Art. 5º - Integram O FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA, como membros efetivos, os órgãos e entidades presentes na plenária de 10 de Abril de 2000, constante da ata da reunião de 10/04. Parágrafo único – Cada um dos membros efetivos indicará, por escrito seu representante em respectivo suplente. Art. 6º - A participação de outros órgãos e entidades, que tenham interesses específicos ou pontuais nos problemas discutidos nas reuniões do FÓRUM, será apreciada em plenário, estando sua aprovação condicionada à maioria simples dos votos dos demais membros efetivos. Art. 7º - Outros órgãos e entidades, que tenham interesses específicos e pontuais nos problemas discutidos nas reuniões do FÒRUM, poderão ser convidados a delas participar, na condição de membros colaboradores. Art. 8º - A saída ou afastamento de qualquer membro efetivo deverá ser comunicada por escrito à mesa diretora do FÒRUM, com a indicação dos motivos que o(a) determinaram. Parágrafo único – A coordenação dará ciência do ato e de seus motivos determinantes aos demais membros do FÓRUM, na plenária imediatamente subsequente. 138 Art. 9º - Considera-se excluído o membro que, sem justificativa, faltar a três (03) reuniões consecutivas ou cinco (05) reuniões alternadas pelo período de doze (12) meses. Parágrafo 1º - As justificativas deverão ser encaminhadas por escrito. Parágrafo 2º - Ocorrendo a hipótese prevista no caput, a Coordenação do FÒRUM fará a comunicação por escrito do membro excluído. Art. 10º - Somente terão direito a voto os membros efetivos, pelos seus representantes, e, na ausência desses, dos respectivos suplentes. CAPÍTULO VI – DA ESTRUTURA DO FUNCIONAMENTO Art. 11º - O FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA é constituído por: I. II. III. IV. Plenário Mesa Diretora Comissões Permanentes Comissões Provisórias Sessão I – Do Plenário Art. 12º - O Plenário é a instância deliberativa do FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA, constituindo-se pela reunião ordinária ou extraordinária dos seus membros. Art. 13º - O FÓRUM reunir-se ordinariamente mensalmente, por convoção de seu coordenador, ou extraordinariamente, mediante convocação de seu coordenador ou de 10 (dez) de seus membros, observado, em ambos os casos, o prazo mínimo, de 05 (cinco) dias corridos para a realização da reunião. Parágrafo único – Qualquer membro poderá solicitar à Mesa Diretora convocação de Reunião extraordinária, devendo esta ser avaliada. Art. 14º – Nas reuniões ordinárias, poderá o Plenário discutir e deliberar sobre matérias estranhas à ordem do dia desde que aprovada pela maioria simples dos presentes. Art. 15 – Cabe ao Plenário: I. Deliberar sobre os assuntos de sua competência e os encaminhados para a apreciação e deliberação do FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA; 139 II. III. IV. V. VI. Aprovar a criação e a dissolução das Comissões, Grupos de Estudo e/ou de Trabalho e suas respectivas competências, composições, procedimentos e prazos de duração; Acompanhar as ações de atendimento desenvolvidas por entidades governamentais ou não governamentais, orientar e/ou solicitar o reordenamento de programas, projetos e serviços ás entidades responsáveis; Acompanhar a execução de planos e a aplicação de recursos existentes pelas entidades do setor público ou da sociedade civil – desde que os fundos sejam originados dos cofres públicos – destinados à área de assistência, qualificação e inclusão da pessoa com deficiência; Alterar ou modificar o Regimento Interno, com quorum de 2/3 de seus membros, em reunião especialmente convocada; Eleger a Mesa do O FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA; Parágrafo 1º - As Assembleias Gerais serão instaladas, em primeira convocação, com a presença da maioria simples de seus membros e, em Segunda chamada após 15 minutos, com a presença de qualquer número, salvo quando se tratar de matéria relacionada a regulamento interno, quando o quorum mínimo será de 2/3 (dois terços) de seus membros. Parágrafo 2º - A matéria em pauta, não deliberada, permanece nas pautas das reuniões subsequentes até a sua deliberação. Parágrafo 3º - O Plenário será presidido pelo Coordenador do FÓRUM PRÓTRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊCIA, que em sua falta ou impedimento será substituído por seu suplente e na falta deste pelo Secretário-Geral, ou 2ºSecretário, nesta ordem. Parágrafo 4º - As deliberações serão tomadas por maioria simples, salvo nos casos definidos em contrário; Parágrafo 5º - As votações poderão ser abertas ou secretas, tendo cada membro titular direito a um voto. Parágrafo 6º - Os votos divergentes poderão ser expressos na ata da reunião, a pedido do membro que o proferiu, sendo optativa sua declaração. Parágrafo 7º - As reuniões do FÓRUM serão públicas. Parágrafo 8º - Em caso de empate e esgotada todas as alternativas de discussão será feita nova votação e persistindo o empate o Coordenador decidirá pelo voto Minerva. 140 Art. 16 – AS manifestações do FÓRUM se darão por meio de resoluções, deliberações e recomendações. Parágrafo único – as recomendações do FÓRUM serão aprovadas pela maioria simples dos votos dos presentes membros a elas vinculados, respeitadas as competências dos órgãos participantes. Art. 17 – Os trabalhos do Plenário obedecerão a: I. Verificação do quorum para instalação dos trabalhos; II. Leitura, apreciação e votação da ata da reunião plenária anterior; III. Leitura da carta convocatória, discussão e aprovação da agenda; IV. Espaço para aviso, comunicações, registro de fatos, apresentação de proposições, correspondência e outros documentos de interesse do plenário; V. Relatos de comissões; VI. Espaço para critério do plenário e mediante inscrição prévia, serem debatidos ou levados a conhecimento assuntos referentes ao objeto do FÓRUM; VII. Encaminhamentos VIII. Encerramento Art. 18 – A cada reunião será lavrada uma ata com a exposição dos trabalhos, conclusões e deliberações, a qual será assinada pela Mesa Diretora, constando a data de sua aprovação pelo Plenário e posteriormente arquivada na Secretaria do Fórum. Parágrafo Único – A assinatura de todos os membros presentes á reunião deverá constar de livros ou lista de presença. Art. 19 – As datas de realização das reuniões ordinárias do FÓRUM serão estabelecidas em cronograma e sua duração será a julgada necessária, podendo as mesmas serem interrompidas para prosseguimento em data e hora e serem estabelecidas pelos presentes. Art. 20 – Os membros integrantes do FÓRUM deverão ser informados dos assuntos da ordem do dia, mediante correspondência visual e braile, com antecedência mínima de 07 (sete) dias. SEÇÃO II – DA MESA DIRETORA Art. 21 – A Mesa Diretora, para mandato de 02 (dois) anos, é composta pelos seguintes cargos: I. II. Coordenador Secretário-Geral 141 III. IV. 1º Secretário 2º Secretário Parágrafo primeiro – O membro efetivo ocupante de qualquer cargo na Mesa Diretora poderá ser reeleito uma única vez, por igual período, qualquer que seja o cargo ocupado neste novo período. Parágrafo segundo: Obrigatoriamente a mesa diretora será composta por uma pessoa com deficiência com direito à voz e voto, convidada com antecedência na plenária anterior. Parágrafo terceiro: A pessoa convidada deverá participar da reunião da mesa diretora anterior para organização da plenária. Art. 22 – A eleição da Mesa Diretora dar-se-á na última sessão plenária conduzida pela Mesa Diretora com mandato findo e observará na sua formação a paridade de 02 (duas) entidades governamentais e 02 (duas) não-governamentais. Art. 23 – A eleição dar-se-á por meio de inscrição do membros efetivo ao cargo pleiteado. Parágrafo 1º - A eleição será secreta e individualizada por cargo. Parágrafo 2º - A apuração será imediata, com a posse dos eleitos. Art. 24 – Á Mesa Diretora, na função de coordenação das ações políticoadministrativas do FÓRUM, compete: I. II. III. Dispor sobre as normas e atos relativos ao funcionamento administrativo do FÓRUM; Verificar a existência de quorum; Tomar decisão em caráter de urgência “ad referendum” do Plenário, em assuntos administrativos e/ou assuntos deliberados pelo Plenário. Subseção Única – DAS ATRIBUIÇÕES Art. 25 – Ao Coordenador do FÓRUM compete: I. II. III. IV. V. representar judicial e extrajudicialmente o FÓRUM; convocar e presidir as reuniões e plenárias do FÓRUM; submeter a pauta do dia à aprovação da Plenária do FÓRUM; assinar as decisões do FÓRUM; homologar os nomes das instituições e os respectivos titulares e suplentes; 142 VI. VII. VIII. IX. X. delegar competência, desde que previamente aprovada em PLENÁRIO; submeter ao PLENÁRIO ou a Mesa Diretora os convites para representar o FÓRUM em eventos municipais, estaduais, nacionais, e internacionais, e apresentar formalmente o nome do membro escolhido; divulgar assuntos deliberados pelo FÓRUM; decidir sobre questões de ordem; desenvolver as articulações necessárias para o cumprimento das atividades da Mesa Diretora; Parágrafo Único – Caso o coordenador não cumpra o disposto no art. 25, o Plenário se reunirá com quorum de 2/3 e por maioria absoluta decidirá sobre a cassação do mandato. Art. 26 – Ao Secretário-Geral compete: I. II. III. substituir o coordenador em seus impedimentos ou ausências; auxiliar o coordenador no cumprimento de suas atribuições/ exercer as atribuições definidas pelo plenário. Parágrafo Único – O Scretario-geral completara o mandato do coordenador em caso de vacância. Art. 27 – Ao 1º Secretário compete I. II. III. IV. V. VI. VII. VIII. IX. Secretariar as reuniões da Mesa Diretora responsabilizar-se pelas atas das sessões e proceder a sua leitura Secretariar as Plenárias do Fórum Responsabilizar-se pelas atas das Plenárias e proceder a sua leitura Substituir o Secretario-Geral nos seus impedimentos e o Coordenador na falta de ambos, ou no caso de vacância ate que o FÓRUM eleja os novos titulares Elaborar a pauta das reuniões da Mesa Diretora e das Plenárias Assinar, juntamente com o Coordenador, os documentos do FÓRUM Responsabilizar-se pela guarda de documentos e pela recepção e expedição de documentos Sediar a Secretaria do FÓRUM Art. 28 – Ao 2º Secretário compete I. II. Substituir o 1º Secretario em seus impedimentos ou ausências com todas as atribuições inerentes ao cargo Substituir o 1º Secretário nos casos em que tenha que substituir o Secretário-Geral ou o Coordenador 143 III. Completar o mandato do 1º Secretário em caso de vacância SECAO III – DAS COMISSOES Art. 29 – O FÓRUM poderá substituir, e definir a competência, de Comissões ou de Grupos de Trabalho por decisão do PLENÁRIO. Art. 30 – As comissões e sua composição serão definidas pelo plenário e constituídas por seus próprios membros, representados por seus titulares ou suplentes. Art. 31 – Ao Coordenador da Comissão compete I. II. Coordenar a reunião da Comissão Assinar as atas das reuniões e encaminhá-las ao 1º Secretário do FORUM Art. 32 – O FÓRUM poderá convidar entidades, autoridades, cientistas e técnicos para colaborarem nos estudos ou participarem das Comissões instituídas. Art. 33 – As comissões poderão ser convocadas para assessoras a Mesa Diretora e as do Plenário e para se pronunciar, quando solicitadas, pelo Coordenador de Mesa Diretora CAPITULO VII – DAS DISPOSIÇÕES GERAIS Art. 34 – O presente regimento poderá ser alterado parcial ou totalmente, através de proposta expressa de qualquer membro do FÓRUM Art. 35 – As propostas de alteração total ou parcial deste Regimento deverão ser apreciadas em reunião extraordinária do Plenário, convocado por escrito para este fim, com antecedência mínima de 05 (cinco) dias úteis e aprovadas por 2/3 (dois terços) dos presentes. Parágrafo único – As propostas de alteração deverão ser encaminhadas a Mesa Diretora, por escrito, com antecedência de 10 (dez) dias úteis, da reunião extraordinária. Art. 36 – Os casos omissos deste Regimento serão resolvidos pelo Plenário do FÓRUM Art. 37 – Este regimento entrará em vigor na data de sua aprovação pelo Plenário do FÓRUM.