CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA
MESTRADO PROFISSIONAL EM GESTÃO SOCIAL,
EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL
A GESTÃO SOCIAL E A INCLUSÃO PRODUTIVA:
Limites e Possibilidades da Ação do Fórum Pró-Trabalho
das Pessoas com Deficiência e Reabilitadas
MARIA CRISTINA ABREU DOMINGOS REIS
Belo Horizonte
2012
MARIA CRISTINA ABREU DOMINGOS REIS
A GESTÃO SOCIAL E A INCLUSÃO PRODUTIVA:
Limites e Possibilidades da Ação do Fórum Pró-Trabalho
das Pessoas com Deficiência e Reabilitadas
Dissertação apresentada ao curso de
Mestrado em Gestão Social, Educação e
Desenvolvimento Local do Centro
Universitário UNA, como requisito parcial
para obtenção do título de Mestre.
Área de Concentração: Inovações
Sociais, Educação e Desenvolvimento
Local.
Linha de Pesquisa: Processos Políticos
Sociais, Articulações Institucionais e
Desenvolvimento Local.
Orientador: Prof.
Barbosa de Melo.
Belo Horizonte
Centro Universitário UNA
2012
Dr.
Frederico
Luiz
R375g
Reis, Maria Cristina Abreu Domingos
A gestão social e a inclusão produtiva: limites e possibilidades da ação do
fórum pró-trabalho das pessoas com deficiência e reabilitadas. / Maria Cristina
Abreu Domingos Reis. – 2012.
134f.: il.
Orientadora: Prof. Dr. Frederico Luiz Barbosa de Melo.
Dissertação (Mestrado) – Centro Universitário UNA, 2012. Programa de
Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local.
Bibliografia f. 113-119.
1. Deficientes - emprego. 2. Educação. I. Melo, Frederico Luiz Barbosa de. II.
Centro Universitário UNA. III. Título.
CDU: 658.114.8
A Deus,
muito presente em minha vida,
que me deu força e muita luz para persistir,
quando tudo parecia desacreditado;
Aos meus amados filhos, Luiza e Fernando,
que com carinho, atenção, amor e paciência
me apoiaram incondicionalmente,
resistindo às muitas ausências e carências;
E, de maneira especial, à minha maravilhosa e guerreira mãe,
Olga Celso de Abreu,
que quase completando um século de idade,
com toda garra e determinação, no desejo de agraciar a vida,
luta bravamente para presenciar este momento.
Por fim, ao meu grande orientador,
Frederico Luiz Barbosa de Melo,
pela dedicação, entusiasmo, companheirismo,
que de maneira incondicional
sempre me fez acreditar em minha capacidade.
A vocês, meus queridos e eternos, dedico esta vitória!
AGRADECIMENTOS
A Deus, por me iluminar e dar forças nesse percurso que parecia
interminável.
Ao professor e orientador Frederico Melo, pela tranquilidade, sabedoria e
confiança nos momentos mais difíceis desse percurso.
Ao meu pai, Vicente Trindade Domingos, sempre presente em minha
memória e lembrança, e ao meu irmão, Euler, pela sua especial e incondicional
parceria, amizade e carinho. E às minhas irmãs, Marilia, Lidiana e Fátima, por
entenderem minha ausência das reuniões familiares e dos cuidados à nossa mãe.
Ao eterno amigo, Secretário de Direitos Humanos e colega de trabalho,
João Batista de Oliveira, que me ensinou a ter paixão pela garantia dos direitos
humanos.
Ao meu grande amigo, Leonardo Mattos, grande líder do movimento,
minha referência na luta pelos direitos das pessoas com deficiência e na maneira
de conviver com a diversidade.
Aos colegas do mestrado, pelos momentos de alegria, parceria,
cumplicidade e, em especial, às colegas que me auxiliaram na efetiva disposição
em me ajudar: Juliana, Andréa, Roberta.
Em especial, agradeço às professoras Rosalina, Matilde, Lucília, Helô
Santos, Heloisa Cabral Aloísio e Áurea, que com extremo profissionalismo nos
fazem sentir orgulho de nossa formação.
E com imenso carinho aos meus fiéis amigos e amigas, que no dia-a-dia,
na sua singularidade, me fazem um ser humano melhor: Dalva Anjos, Rosangela
Villaça, Rita Silami, Alette Barone, Fátima Pádua, Fátima Brites e Toninho.
Ao Secretário, Zito Vieira, e colegas da Secretaria Municipal de Esporte de
Belo Horizonte, pelo apoio.
Especialmente ao querido Walter Ude, companheiro de todas as horas,
que envidou esforços para que eu tivesse tranquilidade para desenvolver este
trabalho.
E a todas as pessoas com deficiência ou não, que direta ou indiretamente
contribuíram para nossas lutas e para que este estudo se concretizasse, o meu
eterno obrigada!
"A voz e vozes que entoam e ecoam de seus
participantes carregados de emoções, pensamentos,
desejos, etc. são falas que estiveram caladas e
passaram
a
impulsionador
se
expressar
(carência
por
algum
motivo
socioeconômica,
direito
individual ou coletivo usurpado ou negado, projeto de
mudança, demanda não atendida). Ao se expressarem,
os atores/sujeitos dos processos de aprendizagem
articulam o universo de saberes disponíveis, passados
e presentes, no esforço de pensar/ elaborar/ reelaborar
sobre a realidade em que vivem. Os códigos culturais
são acionados e afloram-se as emoções contidas na
subjetividade de cada um”.
(Gohn, 2011).
RESUMO
Este estudo analisou o processo da gestão social e atuação de um fórum
participativo. Para tal, pesquisou um fórum intersetorial, não instituído por lei, que
visa promover um processo que garanta o cumprimento da Lei de Cotas referente
ao emprego de pessoas com deficiência (PCDs) no mercado de trabalho, o Fórum
Pró-Trabalho das Pessoas com Deficiência e Reabilitadas (FPT), com atuação na
região metropolitana de Belo Horizonte. O objetivo do trabalho constituiu-se em
analisar a dinâmica da gestão social, em particular a forma de participação de
seus integrantes, indicando possibilidades e limites de sua atuação no contexto
da inserção produtiva das PCDs. Utilizou-se a abordagem qualitativa, realizando
observação participante,, análise documental do regimento e das atas (de 2008 a
2010), por meio do software Atlas TI, e entrevista semiestruturada com seis
participantes e um egresso do fórum. A literatura analisada indicou que há uma
tendência a se enfatizar o aspecto quantitativo em detrimento da qualidade do tipo
de inserção produtiva realizada. No âmbito da gestão social do FPT, verificou-se
que o segmento governamental ocupa maior participação nos debates, conforme
registrado nas atas analisadas. Por sua vez, os representantes das empresas
apresentaram menor participação ativa, dedicando-se mais a colher informações
úteis ao cumprimento da Lei de Cotas. E, curiosamente, as PCDs demonstraram
baixo nível de interlocução na tessitura das propostas a serem encaminhadas.
Além disso, percebeu-se que o FPT não realiza processos de monitoramento e
avaliação quanto ao tipo de inserção produtiva no mundo do trabalho. Isso sugere
que ainda prevalecem práticas que podem ser classificadas como procedimentos
de inclusão marginal e que a atuação do FPT não se orienta pela concepção de
“inclusão produtiva”. Da análise das entrevistas, constatou-se que existem visões
diferenciadas sobre os princípios e a finalidade do FPT, mas que ele representa
importante lugar de promoção, aprendizagem e instrumentalização para seus
participantes. Os participantes compartilham o interesse em defendê-lo como
espaço democrático e de articulação de redes, ainda que vejam dificuldades no
seu funcionamento (coordenação autoritária para uns, comunicação manipulada
para outros, a excessiva dedicação à constituição do Portal da Inclusão e a
absorção do Fórum pelo Estado ainda para outros). Identificou-se necessidade de
pesquisas que investiguem a qualidade das oportunidades de trabalho para as
PCDs, bem como criação de outros espaços sistemáticos entre a sociedade civil e
o poder público com características e valores teórico-conceituais da gestão social.
Como resultado, foi produzido um instrumento de avaliação da gestão social e da
participação em grupos, fóruns, conselhos e colegiados por meio de indicadores.
Palavras-chave: Gestão Social. Participação. Inclusão Produtiva. PCD. Lei de
Cotas.
ABSTRACT
This study examined the process of social management and performance of a
participatory forum. To this end, it investigated the Pro-Labor Forum of People with
Disabilities and Rehabilitated (PLF), an inter sectorial, not imposed by law, forum,
operating in the metropolitan region of Belo Horizonte and created to promote a
process that ensures compliance of the Quota Law relating to employment of
people with disabilities (PWD) in the labor market. The aim of this study was to
analyze the dynamics of social management, in particular the form of participation
of its members, indicating possibilities and limits of its action in the context of
productive insertion of PWD. A qualitative approach was applied, by means of
participant observation, documentary analysis of the regiment and minutes (20082010), through the Atlas TI software, and semi structured interviews with six
participants and a person that used to join the forum. The literature reviewed
indicated that there is a tendency to emphasize the quantitative aspect to the
detriment of the quality of the type of productive insertion performed. Within the
social management of PLF, it was found that the segment government occupies
greater participation in the debates, as recorded in the minutes analyzed. In turn,
representatives of business were less active, devoting themselves more to gather
relevant information to the fulfillment of the Quota Law. And, curiously, PWD
showed a low level of dialogue in the building of proposals to be forwarded.
Furthermore, the study found that the PLF does not perform monitoring and
evaluation procedures in the type of productive insertion in the work world. This
suggests that still prevail practices that can be classified as marginal inclusion and
shows that the performance of the PLF is not guided by the concept of "productive
inclusion". The analysis of the interviews demonstrated that there are different
views on the principles and purpose of PLF, but it represents an important place
for promotion, learning and instrumentation for its participants. Participants share a
common interest in defending it as a democratic space for the articulation of
networks, although they see difficulties in its operation (authoritative coordination
for some of them, communication manipulated for others, excessive dedication to
the “Portal of Inclusion” and absorption of the PLF by State still for others). The
study identified the need for research to investigate the quality of job opportunities
for PWD and the usefulness of the creation of other organizations by civil society
and government, together, with characteristics and theoretical and conceptual
values of social management. As a result, assessment tools of the quality of social
management and participation in groups, forums, councils and collegiate, by
means of indicators, have been produced.
Keywords: Social management. Participation. Productive inclusion. PWD. Quota
Law.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura
FIGURA 1 - Linha do tempo do Fórum Pró-Trabalho....................................
75
Gráficos
GRÁFICO 1 - Número de atas localizadas do fórum - Belo Horizonte 2000-2010................................................................................................. 69
GRÁFICO 2 - Vocalizações por segmento..................................................... 79
GRÁFICO 3 - Capacidade de proposição......................................................
80
GRÁFICO 4 - Capacidade de ter suas propostas transformadas em
decisões....................................................................................................
81
GRÁFICO 5 - Assuntos e temáticas por segmentos...................................... 82
Quadros
QUADRO 1 – Gestão social em construção..................................................
36
QUADRO 2 – Perfil dos participantes ativos do FPT entrevistados............... 84
QUADRO 3 – Referencial com opiniões dos entrevistados com referência
aos princípios, função e papel do FPT.....................................................
91
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 - Número de empregados com deficiência declarados e
esperados pela Lei de Cotas segundo tamanho e natureza de
empresas - Brasil – 2009..........................................................................
62
TABELA 2 - Número de empregados com deficiência declarados e
esperados pela Lei de Cotas, segundo tamanho e natureza de
empresas - Minas Gerais – 2009.............................................................. 63
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AFT
Auditores Fiscais do Trabalho
BPC
Benefício de Prestação Continuada
CAADE
Coordenadoria de Apoio e Assistência à Pessoa Deficiente
CIF
Classificação Internacional de Funcionalidade
CONADE
Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência
CORDE
Coordenadoria Nacional para a Integração de Pessoas Portadoras
de Deficiência
DIEESE
Departamento
Intersindical
de
Estatística
Socioeconômicos
FIEMG
Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais
FPT
Fórum Pró-Trabalho
GS
Gestão social
IBGE
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IEL
Instituto Euvaldo Lodi
INSS
Instituto Nacional de Seguridade Social
IP
Instituições Participativas
IPEA
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
MDS
Ministério do Desenvolvimento Social
MP
Ministério Público
MTE
Ministério do Trabalho e Emprego
OMS
Organização Mundial de Saúde
ONG
Organização Não Governamental
ONU
Organização das Nações Unidas
OSC
Organização da Sociedade Civil
OSCIP
Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
PCD
Pessoa com deficiência
PNE
Portador de Necessidades Especiais
PPD
Pessoa Portadora de Deficiência
RAIS
Relação Anual de Informações Sociais
SEADE
Secretaria de Estado da Administração
e
Estudos
SEDESE
Secretaria de Estado do Desenvolvimento Social
SRTE
Superintendência Regional do Trabalho
TI
Tecnologia da Informação
SUMÁRIO1
1 INTRODUÇÃO............................................................................................
2
GESTÃO
SOCIAL
E
INCLUSÃO
PRODUTIVA:
14
ALGUMAS
CONSIDERAÇÕES........................................................................................
26
2.1 Gestão social: muitos conceitos e muitas práticas..................................
28
2.2 Da exclusão para a inclusão....................................................................
38
2.3 Alguns aspectos da legislação nacional................................................... 45
2.4 Alguns outros obstáculos à inclusão........................................................
50
2.5 As ações afirmativas, a Convenção da ONU e o trabalho.......................
52
2.6 Quem são as pessoas com deficiência no mercado de trabalho
brasileiro.........................................................................................................
57
3 METODOLOGIA.......................................................................................... 66
3.1 Cenário da investigação........................................................................... 68
3.2 O FPT na linha do tempo.........................................................................
72
4 A INCLUSÃO PRODUTIVA E A GESTÃO SOCIAL NO FPT: O QUE
DIZEM OS DOCUMENTOS E OS ENTREVISTADOS..................................
75
4.1 O que diz o regimento..............................................................................
75
4.2 Participação e temáticas: o que dizem as atas........................................
79
4.3 As entrevistas e o que elas informam......................................................
83
4.3.1 Primeiro eixo - limites e possibilidades da inclusão produtiva na
dinâmica do FPT: refletindo sobre as multivisões.......................................... 85
4.3.1 Segundo eixo: a gestão social e os desafios no FPT...........................
89
4.3.1.1 Princípios, função social e papel dos fóruns......................................
90
4.3.1.2 Os temas em debate o foco na rede de inclusão............................... 95
4.3.1.2 A dinâmica das reuniões e plenárias.................................................
97
4.3.1.3 Algumas tensões e crises evidenciadas no FPT................................ 101
1
Este trabalho foi revisado de acordo com as novas regras ortográficas aprovadas pelo Acordo
Ortográfico assinado entre os países que integram a Comunidade de Países de Língua
Portuguesa (CPLP), em vigor no Brasil desde 2009. E foi formatado de acordo com a ABNT NBR
14724 de 17.04.2011.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................
104
REFERÊNCIAS..............................................................................................
113
APÊNDICES E ANEXO.................................................................................. 120
16
1 INTRODUÇÃO
A conhecida Lei de Cotas (Lei nº 8.213/91), que determina o emprego de pessoas
com deficiência (PCDs) de acordo com o número de trabalhadores da empresa, já
conta com mais de duas décadas de vigência no Brasil (BRASIL, 1991a). Ainda
assim, há, de um lado, empresas que não atendem os requisitos legais e, de
outro, PCDs com interesse e disponibilidade para se empregar e que se
encontram sem emprego, ou seja, que estão desempregadas. Constata-se,
portanto, que somente a vigência do preceito legal não é suficiente para promover
a inserção laboral e, menos ainda, a inclusão social plena e virtuosa desse
segmento populacional.
A inclusão produtiva de PCD, ou seja, a inclusão social por meio do trabalho
regular, remunerado, socialmente reconhecido e legal e sindicalmente protegido
pode ser mais eficazmente promovida por meio de fóruns de gestão social (GS).
A GS pode representar instância e processos concretos que viabilizem a
efetivação das políticas inclusivas e a conquista de mudanças na sociedade, que
vão além do prescrito em normas legais, mas em que, sobretudo, prevaleçam os
interesses sociais de garantia da diversidade, da participação e do bem comum.
Em que pese, porém, o alto número de entidades e fóruns de defesa dos
interesses de PCD e de promoção do seu emprego, não se conhece os limites e
os avanços da atuação desses grupos.
Este estudo se propõe a pesquisar uma organização de defesa dos direitos à
ocupação remunerada das PCDs, conforme a Convenção sobre os Direitos das
Pessoas com Deficiência (BRASIL, 2010):
[...] aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais em interação com diversas
barreiras podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdades de condições com as demais pessoas (BRASIL, 2010,
2
p.22) .
2
Neste texto, será utilizada preferencialmente a expressão “pessoas com deficiência” (e a sigla
correspondente, PCD) porque tal é a denominação atualmente adotada pelas organizações
representativas dos sujeitos assim identificados e na mencionada Convenção da Organização das
Nações Unidas (ONU). No passado, entretanto, outras terminologias foram utilizadas, como
17
A inserção produtiva desse segmento representa uma questão de direitos
humanos. Para Marx (1979), o trabalho como atividade define a existência
humana, sendo uma necessidade natural do homem em relação à natureza.
Inserção no mercado de trabalho ou inserção produtiva, citando Fidalgo e
Machado (2000), entende-se como sendo a “forma e resultado do processo de se
introduzir, se relacionar, se integrar ao meio social, conhecido como mercado de
trabalho. A inserção no mercado de trabalho apresenta formas estratificadas de
qualidade muito variável” (FIDALGO; MACHADO, 2000, p. 188).
Nesse aspecto, esse conceito contribui em nosso estudo para demonstrar que a
inserção produtiva acontece de várias maneiras, propiciando adjetivamente
qualidades diversas no tipo de inserção realizada.
Todavia, como ponto de partida, na perspectiva da inclusão social torna-se mais
adequado utilizar o conceito de inclusão produtiva estabelecido pelo Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), segundo o qual:
Compreende-se como inclusão produtiva todo processo conducente à
formação de cidadãos integrados ao mundo pelo trabalho e tem como
perspectiva a conquista de autonomia para uma vida digna sustentada
por parte de todas as pessoas apartadas ou fragilmente vinculadas à
produção de renda e riqueza (BRASIL, 2011a).
O tema mais geral do trabalho e emprego de PCD constitui-se em uma temática
atual de âmbito nacional e internacional. Levando-se em conta a Convenção
sobre os Direitos das PCDs, em sua versão comentada (BRASIL, 2008), é
conveniente afirmar que:
“pessoas com necessidades especiais” ou “pessoas portadoras de deficiência”. Eventualmente,
tais termos poderão aparecer no presente trabalho, em citações de outros autores ou de normas
legais.
18
Em síntese, a legislação brasileira em favor da pessoa com deficiência
no trabalho, é a seguinte: artigo 7º, XXXI, da Constituição Federal, que
proíbe discriminação para admissão e remuneração em razão de
deficiência, o artigo 37, também da Constituição, que no inciso VIII
garante reserva de vagas na administração direta e indireta, além da
legislação ordinária expressa pela Lei 7853/89, que assegura no artigo
2º uma política de acesso ao emprego público e privado; a Lei 8112/90,
que estabelece a reserva de 5 a 20% dos cargos da administração direta
e indireta a pessoas com deficiência; a Lei 8213/91, que no artigo 93 fixa
cotas de 2 a 5% de emprego para pessoas habilitadas ou reabilitadas
nas empresas com mais de 100 empregados; e finalmente, o Decreto
3298/99 que regulamenta as leis anteriores; além do Decreto 5.296/04,
que regulamenta as Leis 10.048 e 10.098, ambas de 2000, para o
transporte público adaptado e remoção de barreiras arquitetônicas
(BRASIL, 2008, p. 114).
Todavia, não se deve ignorar que existe um abismo entre o que a legislação
preconiza e a realidade apresentada. Nesse aspecto, Batista (2004) afirma que:
[...] as PCDs que estiverem amparadas pelo ordenamento jurídico e
mesmo que sejam crescentes movimentos relativos à sua inclusão, é
notável a distância entre a promessa igualitária, acenada pela lei, e a
realidade cotidiana das desigualdades e discriminações. Existe uma
grande defasagem entre o ideal contido na legislação e a realidade
(BATISTA, 2004, p. 1).
Dessa maneira, tendo em vista esse arcabouço legal e seus impactos na
sociedade e nas empresas, esta pesquisa pretendeu analisar como um fórum
intersetorial participativo se organiza para promover um processo que garanta a
sua finalidade, do ponto de vista da gestão social e da inclusão produtiva. Esse
estudo também subsidiou a elaboração de um instrumento de avaliação de fóruns
e processos da gestão social.
Para atingir esse objetivo, foi necessário conhecer a legislação e as implicações
pertinentes à inserção produtiva das PCDs com vistas a confrontar os conteúdos
das temáticas discutidas pelos participantes do Fórum Pró-Trabalho da Pessoa
com Deficiência e Reabilitada (FPT)3. Cabe ressaltar que também foi importante
identificar elementos do funcionamento, princípios e organização do FPT,
3
Deliberado em plenária ordinária, a nomenclatura “reabilitada” foi adicionada à identidade do FPT
de PCD, por sugestão dos representantes do Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS)
participantes do Fórum, uma vez que o artigo 93 da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991 refere-se a
trabalhadores habilitados e reabilitados (BRASIL, 1991a). Entende-se por reabilitada a pessoa que
passou por processo orientado a possibilitar que adquira a partir da identificação de suas
potencialidades laborativas o nível suficiente de desenvolvimento profissional para reingresso no
mercado de trabalho e participação na vida comunitária (Decreto nº3. 298/99 – BRASIL, 1999).
19
congruentes com a concepção da gestão social e, sobretudo, investigar registros
e ações.
Foi investigado o FPT, que é uma organização de iniciativa da sociedade civil em
parceria com o poder público, com 12 anos de atuação e com a finalidade de unir
esforços de instituições implicadas com a promoção da inserção produtiva de
PCD na região metropolitana de Belo Horizonte.
O FPT constitui um espaço de participação voluntária, não institucionalizado
legalmente, sem recursos regulares, com adesão de instituições e de órgãos
responsáveis pela fiscalização da Lei 8.213/91: Ministério Público do Trabalho,
Superintendências Regionais do Trabalho, assim como sindicatos, universidades,
entidades e instituições públicas e privadas, inclusive empresas. A partir desses
aspectos, foi necessário buscar diversos autores que pesquisam o tema gestão
social, bem como conhecer aspectos que constituem a inserção produtiva.
Investigando e analisando o funcionamento do FPT, foi possível chegar a
algumas das principais dimensões no campo da GS, visando subsidiar, por um
lado, processos participativos de gestão e, por outro lado, ações dedicadas à
promoção da ocupação das PCDs no mercado de trabalho na perspectiva da
inclusão produtiva.
Este estudo buscou analisar, por meio da investigação do FPT (fórum não
instituído em lei), a dinâmica da GS em processo, em particular a forma de
participação de seus integrantes, indicando limites e possibilidades de sua
atuação no contexto da inserção produtiva das PCDs, marcado pela Lei de Cotas.
A relevância deste trabalho de pesquisa revela-se, assim, tanto na reflexão sobre
limites e possibilidades da atuação de um fórum de GS quanto na investigação
sobre princípios que orientam as práticas voltadas para promover a ocupação
econômica de PCD.
A revisão bibliográfica realizada revela que predomina a concepção de que uma
única definição relativa à gestão social se mostra, ainda, inconclusiva. Apesar de
20
existirem muitos conceitos de gestão social, adota-se nesta pesquisa o seguinte
conceito, retirado de Gondim, Fischer e Melo (2006, p. 48):
[...] um ato relacional capaz de dirigir e regular processos por meio da
mobilização ampla de atores na tomada de decisão (agir comunicativo),
que resulte de parcerias intra e interorganizacionais, valorizando as
estruturas descentralizadas e participativas, tendo como norte o
equilíbrio entre a racionalidade instrumental (com relação a fins) e a
racionalidade substantiva (em relação a valores), para alcançar, enfim,
um bem coletivamente planejado, viável e sustentável a médio e longo
prazo.
Esse conceito retrata os mecanismos de mobilização correspondentes ao modo
de gerenciamento por meio da GS, os quais contemplam aspectos fundamentais
de um processo de construção coletiva baseado na participação pautada na
condição relacional dos atores.
Esses sujeitos da ação, articulados em parcerias intersetoriais, produzem um
processo de empoderamento, como salienta Gohn (2001), ou seja, tornam-se
força social da participação da comunidade, pela capacidade de produzir ou
causar
práticas
de
desenvolvimento
autossustentável,
para
se
atingir
determinadas finalidades, mediante articulação societária.
Nessa direção, a Constituição Brasileira de 1988 garante a participação da
sociedade civil no controle público da sociedade sobre as ações dos governos,
possibilitando a efetivação de espaços públicos de debate.
A conquista desses espaços foi importante para promover a participação de
atores sociais em processos de discussão, desenvolvimento e avaliação de
políticas públicas. Buscando entender melhor esses efeitos democratizantes
vigentes na sociedade atual, pode-se analisar a participação em três etapas, de
acordo com as considerações do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(IPEA) (SILVA; DEBONI, 2012). A primeira etapa destaca a participação como um
valor em si, ou seja, a atenção central da análise estava nos processos
participativos de institucionalização ainda incipientes e muitas vezes espontâneos
da sociedade civil, vistos como positivos em função do caráter intrinsecamente
burocrático do Estado e de seu afastamento da sociedade.
21
Já a segunda etapa fundamenta-se em análises empíricas sobre o funcionamento
das Instituições Participativas (IP), consolidadas, identificando aspectos negativos
no que se refere aos pressupostos da primeira fase, tais como predomínio de
poder de agenda do governo em relação à sociedade civil, bem como presença
de linguagem demasiadamente técnica nas reuniões e alijamento de segmentos.
A terceira fase, ou seja, a mais recente, não ignora esses processos de
consolidação das instituições participativas. Busca, entretanto, objetivos mais
realistas e sutis.
Neste sentido, trata-se de:
Buscar entender se e em que condições as IPs produzem resultados
positivos, bem como quais seriam os resultados positivos legitimamente
esperáveis das IPs em relação às políticas publicas, ao cotidiano das
comunidades, à cultura política, entre outros (SILVA; DEBONI, 2012, p.
9).
A partir do que foi exposto, é possível perceber que todas essas etapas podem
ocorrer tanto em espaços de conselhos, colegiados, como em diversos fóruns
ampliados de composição trissetorial de participação da sociedade civil na gestão
de políticas e bens públicos.
Ressalta-se que este estudo tem como proposta exatamente entender as
condições de funcionamento do FPT e seus impactos na sociedade e até mesmo
na política pública. Faz isso analisando, por um lado, a participação dos sujeitos
do fórum e, por outro lado, a concepção que orienta o conjunto de práticas e
ações em busca do alcance de resultado, aqui considerado na concepção de
inclusão produtiva das PCDs.
Em meio a essas discussões, destaca-se o papel político que orienta a ação do
fórum na intenção de exercer o controle social dessa política afirmativa, em
determinado território, acompanhando e monitorando ou até mesmo avaliando a
concretude da legislação vigente.
Em se tratando dos papéis políticos e das ações de fóruns, Avritzer (2010, p. 101)
afirma que a “ação política nas sociedades contemporâneas passa a ser, cada
22
vez mais, identificada com o uso das mídias e a capacidade dos atores sociais e
políticos de influenciarem a agenda política e participarem dos debates públicos
que circunscrevem essas agendas”. O mesmo autor complementa esse
pensamento, expressando a relevância de instituições propulsoras de relações
mais democráticas e justas, como espaços reais de influência, inclusão e reforma
(AVRITZER, 2010).
É importante ressaltar que o termo participação representa um conceito central na
concepção da gestão social. Nesse âmbito, Souza (2000, p. 82) entende
participação no “sentido da criação do homem para o enfrentamento dos desafios
sociais” e que tal perspectiva se reflete em determinada realidade com a
utilização de mecanismos de conquistas sociais. Destaca, também, que
participação é um fenômeno de ampla utilização no campo coletivo, que
possibilita conjugação de esforços orientados para fins a serem alcançados e
caracterizados para o atendimento às necessidades sociais de diversos grupos.
Por outro lado, de acordo com Fischer et al. (2006), no campo da gestão social
cabe afirmar que a participação é um processo relevante interligado à
mobilização, com estreita relação na arena das ações de defesa e garantia de
direitos e controle social, associadas a questões pertinentes aos movimentos
sociais.
Entretanto, o processo de participação e mobilização não trilha caminhos lineares,
já que são marcados por momentos históricos distintos. Nas últimas décadas, por
exemplo, pode-se afirmar que este vem se alterando no bojo dos movimentos
sociais, conforme Souza (2000). Entre essas alterações, a relevante ascensão da
oposição ao poder em 1982, nos estados e municípios, levou à ocorrência de
conflitos no interior dos aparelhos estatais, no que se sucederam duas
tendências: a primeira representou a institucionalização dos movimentos, com a
consequente perda da autonomia; e o segundo fator foi a aprendizagem política
dos movimentos sociais no que diz respeito ao entendimento do funcionamento
da máquina estatal.
23
Na década de 1990, porém, o processo de participação e mobilização não
avançou com a mesma intensidade, conforme ressalta Raichelis (1998, p. 21):
A afirmação da hegemonia neoliberal no Brasil, com a redução dos
direitos sociais e trabalhistas, desemprego estrutural, as diferentes
formas de precarização do trabalho, o desmonte da Previdência Social
pública, o sucateamento da saúde e da educação pública, o
deslocamento cada vez mais da assistência social para ações
compensatórias seletivas de atenção à pobreza tendem a debilitar os
espaços de representação coletiva e controle social sobre o Estado,
conquistas duramente consolidadas na Constituição de 1988.
Essa questão não pode ser deixada de lado, uma vez que o projeto neoliberal
afetou as populações mais vulneráveis. Todavia, não se deve desprezar as
possibilidades da aproximação dos gestores de políticas sociais com as
preocupações e demandas das camadas vulneráveis.
Esse quadro, brevemente comentado aqui, reforça o discurso presente das
parcerias e transferências das responsabilidades públicas para a iniciativa da
sociedade civil (RAICHELIS, 2007). E constitui uma nova configuração do papel
do Estado, com crescente deslocamento das responsabilidades públicas para a
comunidade, no tocante às entidades assistenciais, famílias, organizações não
governamentais (ONGs) ou entidades empresariais, por meio da filantropia
corporativa, do voluntariado e da denominada responsabilidade social.
Esse é verdadeiramente o cenário onde se instala o debate acerca da gestão
social, que no plano do desenvolvimento social também vai identificando
caminhos congruentes, bem explicitados por Fischer (2002a). Para essa autora,
gestão social refere-se a um processo de mediação social que:
Articula múltiplas escalas de poder individual e social; que trabalha a
identidade de projeto, refletindo e criando pautas culturais; que coordena
interorganizações eficazes; que promove ação e aprendizagem coletiva;
que se comunica e difunde resultados; que presta contas à sociedade;
que reavalia e recria estratégias processuais (FISCHER, 2002a, p. 12).
Nesse aspecto, pode-se inferir que atuar no locus do desenvolvimento social
envolve aspectos de transposição de posicionamento da identidade individual
para uma identidade coletiva, da organização para a interorganização. Implica
também a aprendizagem interacional como construção coletiva e a transparência
24
das ações e do uso dos recursos, em um processo de avaliação e monitoramento
constante, base para reconstruir novas estratégias.
Agregado a esses aspectos citados, pode-se adiantar que a gestão social
apresenta princípios referenciais que se baseiam na orientação participativa,
democrática e cidadã. Tais valores são reconhecidos por Maia (2005) como
pressupostos da gestão social, identificados pela autora no quadro intitulado
“Gestão social em construção”, baseado nas análises de Tenório (1998),
Carvalho4 (1999, apud MAIA, 2005), Singer5 (1999, apud MAIA, 2005), Dowbor6
(1999, apud MAIA, 2005) e Fischer (2002b).
Além disso, Gohn (2001) afirma que a diversidade do conjunto de grupos
organizados com diversos interesses, no formato de redes, torna-os atores
coletivos na dinâmica da sociedade. E afirma, ainda, que a mobilização ocorre
quando um grupo de pessoas, uma comunidade e uma sociedade decidem e
agem com objetivo comum, buscando cotidianamente os resultados desejados
por todos (TORO; WERNECK, 2007).
Percebeu-se, nas incursões pertinentes ao tema, que a gestão social possui
características próprias que ressaltam como prioridade a lógica da inclusão social.
Nesse aspecto, este estudo possui questionamentos em relação à qualidade
dessa inclusão no tocante aos modos de inserção na sociedade, do ponto de vista
econômico e social.
O trabalho em uma sociedade capitalista define a condição humana e coloca a
pessoa no bojo das representações sociais, definindo o papel e a posição do
sujeito nas relações de produção, nas relações sociais e na sociedade. Com o
ingresso no mundo do trabalho, a imagem social das PCDs frente à sociedade
4
CARVALHO, Maria do Carmo Brant. Alguns apontamentos para o debate. In: RICO, Elizabeth de
Melo; RAICHELIS, Raquel (Orgs.). Gestão social: uma questão em debate. São Paulo:
Educ/IEE/PUCSP, 1999.p. 19-29.
5
SINGER, Paul. Alternativas da gestão social diante da crise do trabalho. In: RICO, Elizabeth de
Melo; RAICHELIS, Raquel (Orgs.). Gestão social: uma questão em debate. São Paulo:
Educ/IEE/PUCSP, 1999.p. 55-66.
6
DOWBOR, Ladislau. A gestão social em busca de paradigma. In: RICO, Elizabeth de Melo;
RAICHELIS, Raquel (Orgs.). Gestão social: uma questão em debate. São Paulo:
Educ/IEE/PUCSP, 1999.
25
passa por uma ressignificação, uma vez que as consideravam pessoas
improdutivas ou que eram tuteladas em suas capacidades de escolhas,
autossustento e participação.
Todavia, a Declaração Universal dos Direitos Humanos preconizava que toda
pessoa tem direito ao trabalho, à livre escolha do emprego, a condições justas e
favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego. Essa afirmação
significa que os grupos vulneráveis deverão, necessariamente, ter a proteção e o
direito garantidos ao trabalho. Dessa maneira, o que a Declaração destaca é a
universalização de oportunidades de trabalho indistintamente a todos os seres
humanos, recebendo, portanto, igual tratamento, sem discriminação.
Para mais esclarecimento, o artigo 1º da Convenção nº 111 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT, 2001, p.1) sobre a discriminação em matéria de
emprego e profissão define discriminação como sendo “toda distinção, exclusão
ou preferência, com base em raça, cor, sexo, religião, opinião política,
nacionalidade ou origem social, que tenha por efeito anular ou reduzir a igualdade
de oportunidade ou de tratamento no emprego ou profissão”.
Fazer com que a sociedade entenda que realmente todas as pessoas podem
trabalhar é tarefa importante para os defensores dos direitos humanos de
segunda geração7, assim como um fator preponderante para se avançar na
conquista da inclusão social.
Baseando-se nesses preceitos, sabe-se que existe ainda uma longa distância
entre o que a Declaração preconiza e a realidade vivenciada pela população
3
a
“Os direitos humanos, nessa concepção anterior à 2 pós-guerra, são definidos de acordo com
um paradigma liberal, como direitos de primeira geração ligados, basicamente, à ideia de
liberdade. Surgem então os direitos individuais, chamados direitos civis na tradição anglo-saxônica
e os direitos políticos enquanto direitos de participação. No final do século XIX e inícios do século
XX, surgem os chamados direitos de segunda geração, que seriam os direitos econômicos, sociais
e culturais emanados da crítica ao modelo do capitalismo liberal clássico e desenvolvidos a partir
da ideia de que, mesmo os direitos ditos de primeira geração, teriam, como condição
imprescindível da sua fruição, a garantia de determinadas condições materiais mínimas que
permitissem o seu adequado desfrute. E daí se parte para uma concepção mais avançada de
direitos de terceira geração, ligados à ideia de um vínculo solidário entre todos os homens, tanto
no plano dos estado-nacionais, quanto no plano internacional – e fala-se então em direito ao
desenvolvimento, direito ao meio ambiente hígido, direitos à identidade dos povos, direito à paz,
etc.” (ORTIZ, 2004, p. 13).
26
brasileira. Apesar da Convenção nº 111 datar de 1960 (BRASIL, 2011b), nesses
52 anos de existência, persiste o fator de discriminação em relação a alguns
grupos, entre eles as PCDs.
Oportuno também mencionar a Convenção nº 159 (BRASIL, 1991b), ratificada em
1990 por 71 países-membros da OIT, que aborda a readaptação profissional e
emprego de pessoas portadoras de deficiência. A Resolução considera que:
[...] a Assembleia Geral das Nações Unidas proclamou 1981 como o Ano
Internacional das Pessoas Deficientes, com o tema "Participação plena e
Igualdade", e que um Programa de Ação Mundial, de grande porte,
concernente a pessoas portadoras de deficiência, deve promover
medidas eficazes, nos níveis nacional e internacional, com vista à
realização dos objetivos de “plena participação” e de plena
"igualdade" de pessoas portadoras de deficiência na vida social e
no desenvolvimento (grifo nosso) (OIT, 2001, p. 19).
Dias e Freire (2002) especificam que tal Convenção determina que a deficiência
pode e deve ser superada por meio de uma série de medidas políticas, normas,
programas e serviços. Seguindo esse pensamento, os autores abordam que os
países que a ratificam devem:
Elaborar uma política nacional que assegure a adoção de medidas
adequadas de readaptação profissional ao alcance de todas as
categorias de pessoas portadoras de deficiência e a promoção de
oportunidades iguais de emprego para as pessoas portadoras de
deficiência no mercado regular de trabalho (DIAS; FREIRE, 2002, p. 74).
Para tentar dialogar com a temática apresentada sobre gestão social e inclusão
produtiva, pretendeu-se buscar interlocuções com os autores e obras: Martins
(1997), Sawaia et al. (1999), Fidalgo e Machado (2000), Pastore (2000), Souza
(2000), Gohn (2001), Fonseca (2008), Batista (2004), Clemente (2004), Sposati
(2004), Maia (2005), Sassaki (1999; 2005), Coordenadoria de Apoio e Assistência
à Pessoa Deficiente (CAADE/MG, 2005), Morin (1996), Lorentz (2006), Gugel
(2007), Tenório (2007), França Filho (2008), Avritzer (2010), Rigo et al. (2010),
Fischer (2010), entre outros.
Para realizar a investigação dos avanços e limites da atuação do FPT,
considerando os conceitos de GS e de inclusão produtiva, utilizaram-se
procedimentos diferentes e complementares, como análise documental e
27
entrevistas em profundidade. Foram analisados o regimento, as atas do período
de 2008 a 2010 e pautas do FPT, sendo que para a análise das atas recorreu-se
ao software Atlas-TI, programa que possibilitou que as falas dos conselheiros
fossem codificadas em indicadores. Seus participantes e um ex-participante do
FPT foram entrevistados segundo um roteiro semiestruturado. Ou seja, buscou-se
ouvir, entre os participantes do FPT, pessoas com e sem deficiência, gestores de
programas, profissionais de recursos humanos de empresas que trabalham com a
inserção das PCDs no mercado de trabalho em Organizações Governamentais e
Não Governamentais, possibilitando, assim, aproximação com os sujeitos. Além
desses instrumentos citados, também foi realizada observação participante
natural. Os resultados da análise dos documentos, das entrevistas e da
observação, apesar de apresentados neste estudo de forma separada, foram
confrontados, convergindo na reflexão contida nas considerações finais.
A partir da análise documental do regimento, das atas e pautas do FPT e também
por meio de entrevistas, acredita-se ter gerado contribuições tanto para orientar
as iniciativas na promoção da garantia de direitos das PCDs no âmbito do
trabalho, com a discussão conceitual da inclusão produtiva, quanto para avaliar
processos e instâncias da gestão social. Ao final da execução do trabalho, o
conceito de inclusão produtiva do MDS, já apresentado, foi ampliado por outras
contribuições, rediscutido e definido de modo mais concreto, além de,
eventualmente, ser mais bem especificado para se adequar à caracterização da
inserção econômica e social das PCDs.
Dessa maneira, acredita-se que tais considerações, agregadas a estudos
existentes, poderão trazer novos conhecimentos e novas maneiras de
intervenções na política de gestão de projetos societais inclusivos.
Além disso, poderá contribuir na reflexão e nas ações acerca das estratégias da
sociedade para a efetivação dos direitos do segmento das PCDs e outros
segmentos vulneráveis ao trabalho, na perspectiva da Lei de Cotas, da
participação e mobilização social.
28
2 GESTÃO SOCIAL E INCLUSÃO PRODUTIVA: ALGUMAS
CONSIDERAÇÕES
À luz da Convenção de Direitos das Pessoas com Deficiência, este item pretende
levantar algumas questões relativas à temática da inclusão dessas pessoas no
mercado de trabalho, buscando subsidiar este estudo e as instituições nas
dificuldades de promoção da gestão social voltadas para a inserção profissional
desse segmento.
O preconceito e a discriminação contra a inserção de PCD no mercado de
trabalho é muito forte e antigo. Dessa forma, impõe prejuízos à plena
consolidação dos direitos humanos. Exemplifica tal preconceito secular o relato de
Marx (1979), o qual descreve o seguinte ponto:
Citemos ainda esta passagem do relatório do inspector Leonard Horner
de 31 de outubro de 1855: alguns fabricantes falaram-me com uma
ligeireza indesculpável de certos acidentes, como a perda de um dedo,
que consideram uma bagatela. A vida e o futuro dum operário dependem
de tal maneira dos seus dedos que tal perda constitui para ele um
acontecimento muito importante. Quando ouço essas palavras absurdas,
pergunto: suponham vocês que igualmente competentes, mas um deles
sem o polegar ou sem o indicador. Qual deles escolheria? Sem um
momento de hesitação, eles escolheriam aquele que tivessem os dedos
completos (MARX, 1979, p. 101).
Verifica-se ainda, no contexto atual, considerável restrição da sociedade na
absorção desse novo paradigma da inclusão ao emprego das PCDs. Esse
aspecto tem comprometido os resultados nas políticas públicas referentes a essa
questão e gerado baixa eficácia da ação afirmativa.
A pesquisa “Prevalência de incapacidades: um estudo da situação”, com base em
sete municípios de Minas Gerais, coordenada pelo superintendente da CAADE
realizada em 2005, revela que as questões vinculadas às deficiências possuem
estreita correlação com a pobreza:
29
A acessibilidade fica apenas restrita a pessoas com melhores condições
financeiras, pois ainda se luta pelo essencial à sobrevivência dos pobres.
A observação de pessoas vivendo em condições subumanas,
arrastando-se pelo chão, sem qualquer atenção do poder público, foi fato
gritante em todos os municípios pesquisados (CAADE-MG, 2005 p. 161).
Para ressaltar tal afirmação, cita-se Cury, que em 1992 afirmou: “a miséria do
sertão quando chega ao papel perde a cor, a dor e o cheiro. Faz parte do
imponderável da vida tentar transformá-la em números” (CAADE-MG, 2005, p.
161). Como assinalam Batista et al. (2000, p. 107):
Hoje o tema da INCLUSÃO permeia nosso discurso político. E este TEM
que ser coerente com nossa prática, tanto em assuntos internos ao
movimento como na relação com o público em geral. O PRECONCEITO
e a DISCRIMINAÇÃO são conceitos não parciais. Aquele que discrimina
um, discrimina todos. O conceito de INCLUSÃO é holístico e só pode ser
absorvido e trabalhado em conjunto, porque trata do ser humano como
todas suas diferenças e semelhanças, que lhe permitem CONVIVER
socialmente. Isto implica crescimento e desenvolvimento humano e
pessoal, na direção da TOLERÂNCIA, da aceitação do outro, da
solidariedade e, por fim, da cooperação. Vejo que nossa geração e,
principalmente, a área da deficiência tiveram o privilégio de ter ajudado a
gerar novos paradigmas para o futuro, dentro do universo da
diversidade.
Como lembra Sassaki (2005), há notícias de que pelo menos desde 1950 se
desenvolve a prática de colocação de PCD no mercado de trabalho e durante 30
anos um dos caminhos para a inserção profissional passava pelos centros de
reabilitação profissional. Em 1989, houve a edição do Decreto nº 3.298 (BRASIL,
1999), regulamentando a Lei nº 7.853/89 (BRASIL, 1989), o qual traz a
conceituação de deficiência e estabelece parâmentros de avaliação das
deficiências. Garcia (2010, p. 14) cita a obrigação legal das empresas:
Todavia, em que pese a obrigatoriedade legal de as empresas
brasileiras, conforme seu porte, contratarem pessoas com deficiência,
ainda é latente o grande descumprimento da norma legal, coexistindo,
por sua vez, um enorme contigente de pessoas com deficiência que
permanecem desempregadas contra a vontade.
A bibliografia examinada mostra que essa temática apresentou-se pouco
explorada pelos pesquisadores. Nesse âmbito, constata-se que ainda não se tem
uma normatização do sistema de gestão social de colocação profissional das
PCDs no mercado de trabalho. Isso sustenta a argumentação de alguns setores
30
que afirmam ser esse expediente dispendioso e exige a adoção de critérios e
especificidades que sobrecarregariam as empresas.
Diferentemente da solução almejada de inclusão das PCDs no mercado de
trabalho, destaca-se que existe um movimento empresarial visando à alteração da
referida Lei. Dessa forma, a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais
(FIEMG) elaborou em 2008 um estudo denominado “Lei de Cotas: um
questionamento da base de dados de portadores de necessidades especiais
(PNEs)”, no qual dizia que “este será um instrumento para reflexão, avaliação e
possível adequação da legislação vigente” (FIEMG, 2008, p. 5).
Frente a isso, as referências teóricas para este estudo estão estruturadas nos
seguintes itens: “gestão social: muitos conceitos e muitas práticas”; “da exclusão
para a inclusão”; “a legislação nacional”; “alguns outros obstáculos à inclusão”; e
“as ações afirmativas, a Convenção da ONU e o trabalho”.
2.1 Gestão social: muitos conceitos e muitas práticas
As políticas públicas são criadas e implementadas a partir de demandas dos
movimentos sociais organizados, de organizações governamentais e não
governamentais e organismos internacionais. Expressando essa característica, a
própria Constituição de 1988 trouxe benefícios à construção da democracia e das
práticas da política de direitos humanos, cidadania, controle social e participação
dos cidadãos brasileiros.
No entanto, na conjuntura configurada pelo modelo neoliberal pós-Constituição, a
inserção das políticas no cenário social enfrentou dificuldades operacionais
marcantes na gestão da sua implementação.
Tais obstáculos demarcavam-se pela lógica de um Estado Mínimo, que se
mostrou ainda menor para ações voltadas para a saúde, educação e assistência
social, precarizando e fragilizando os serviços que deveriam ser fornecidos pelo
poder público. Esse quadro gerou pseudoimplementações de propostas estatais
31
que não se efetivavam, deixando um vácuo entre o que se pregava nos discursos
governamentais e as práticas frágeis de um Estado que procurava se
desresponsabilizar da sua destinação.
Os estudos acerca da GS surgiram na década de 1990, em um momento histórico
em que também se configuram estratégias sociais como a denominada
responsabilidade social.
Assim, por um lado, a intervenção social do empresariado no Brasil, como
tentativa
de
resgate
dos
valores
democráticos
e,
por
outro
lado,
a
desresponsabilização do Estado e a onda (neo) liberal do “Consenso de
Washington”, na defesa de uma lógica do Estado Mínimo, do superávit primário e
da não reserva de mercado, levaram a repensar o conceito de gestão pública
(TENÓRIO, 2007).
Desde então, o debate em torno da temática da gestão social nas organizações e
na construção de políticas sociais tem sido constante e contemporâneo. A partir
daí, surgiu a concepção da GS caracterizada por gerenciamento participativo,
com orientação decisória compartilhada por diferentes sujeitos sociais (SILVA
JÚNIOR, 2008).
Na abordagem da “gestão social”, França Filho (2008, p. 29-30) concorda com
esses aspectos e descreve que:
Efetivamente, enquanto problemática da sociedade, a ideia de gestão diz
respeito à gestão das demandas e necessidades do social. [...] E
também vem sugerir desse modo que, para além do estado, a gestão
das demandas e necessidades do social pode se dar via a própria
sociedade, através das mais diversas formas e mecanismos de autoorganização, especialmente o fenômeno associativo.
França Filho (2008, p. 32), em perspectiva complementar, entende GS como
sendo:
[...] modo de gestão próprio às organizações atuando num circuito que
não originariamente aquele de mercado e do Estado, muito embora
estas organizações entretenham, em grande parte dos casos, relações
com instituições privadas e públicas, através de variadas formas de
parcerias para a consecução de projetos.
32
Os estudiosos que discutem o tema, tais como Fischer (2002a), Maia (2005),
Tenório (2007), Rigo et al. (2010) e França Filho (2008), afirmam que a GS está
associada à gestão de políticas sociais, de organizações do terceiro setor, de
combate à pobreza e, até mesmo, de gestão ambiental. Além disso, gestão social
tem alicerçada em seu bojo uma gestão democrática, participativa em um
processo gerencial dialógico.
Ainda que, conforme esse autor, não se vislumbrem os loci da GS em empresas,
as reflexões a respeito levam a considerar que as ações de responsabilidade
social das empresas poderão, em médio prazo, propiciar brechas nas
administrações mercadocêntricas, à luz de alguns aspectos da GS, na
perspectiva de buscar atender algumas demandas específicas do social.
Entretanto, considera-se que o maior desafio nessa empreitada será a quebra de
paradigma ao se tentar amalgamar processos distintos em sua concepção e
capacitar gestores.
Maia (2005), em seu estudo precisamente intitulado “Gestão social: reconhecendo
e construindo referenciais”, analisa o tema da conceituação e caracterização da
gestão social de maneira dedicada e explícita. Depois de identificar uma
diversidade de abordagens e concepções acerca de gestão social, Maia (2005, p.
10) apresenta os conceitos de gestão social de cinco autores, como descrito a
seguir:
[...] Tenório (1998), que a concebe como conjunto dos processos sociais
desenvolvidos pela ação gerencial, em vista da articulação entre as suas
necessidades administrativas e políticas postas pelas exigências da
democracia e cidadania para a potencialização do saber e competência
técnica e o poder político da população. [...]
Singer (1999), por sua vez, refere que a gestão social diz respeito às
ações que intervêm nas diferentes áreas da vida social para a satisfação
das necessidades da população [...]. Sua perspectiva é de que a gestão
social seja viabilizada através de políticas e práticas sociais articuladas e
articuladoras das diversas demandas e organizações populares,
universidades, entidades não governamentais e governos.
Carvalho (1999) relaciona gestão social à gestão das ações públicas,
viabilizadas a partir das necessidades e demandas apontadas pela
população [...]. A autora dá ênfase ao protagonismo da sociedade civil,
no sentido da identificação das necessidades e demandas, assim como
proposição e controle de ações e políticas, a serem assumidas pelo
Estado.
33
Dowbor (1999) remete a gestão social à transformação da sociedade,
em que a atividade econômica passe a ser o meio e o bem-estar social o
fim do desenvolvimento. Para isso, indica a necessidade da construção
de um novo paradigma organizacional, a partir da redefinição da relação
entre o político, o econômico e o social. [...]
Fischer (2002) indica que o campo da gestão social é o campo do
desenvolvimento social, que se constitui como um processo social, a
partir de múltiplas origens e interesses, mediados por relações de poder,
de conflito e de aprendizagem. [...] Nesta perspectiva de gestão social
estão especialmente identificados como sujeitos os indivíduos, grupos e
coletividades
interessadas,
mediados
por
redes
ou
por
interorganizações.
Portanto, a GS se apresenta como um novo conceito na contemporaneidade que,
apesar das mais variadas versões, em alguns pontos estabelecem certa
convergência: todos trazem em seu bojo um modus faciendi pautado na gestão
democrática e participativa.
Nesse sentido, a etimologia do termo encontra sua congruência, “o adjetivo social
junto ao substantivo gestão, e se mostra entendido como o espaço privilegiado de
relações sociais onde todos têm direito à fala, sem nenhum tipo de coação”
(TENÓRIO, 2007, p. 10).
Buscando retratar a metodologia de ação dessa modalidade de gestão, Fischer
(2002a, p. 12) traz importantes contribuições ao destacar que gestão social “é um
campo em construção, interativo e recursivo na relação prática-teoria-prática”.
Ainda complementa que se torna importante “conhecer mais e melhor as
organizações orientadas ao desenvolvimento social, bem como mapear os perfis
de seus gestores” (FISCHER, 2002a, p. 12.) e questiona a respeito do significado
da gestão do desenvolvimento social na agenda contemporânea.
Para Fischer (2002a, p. 12), a gestão do desenvolvimento associa-se à gestão da
sociedade.
Salienta
que,
numa
primeira
aproximação,
a
gestão
do
desenvolvimento social pode ser vista como:
Um processo de mediação social
 que articula múltiplas escalas de poder individual e social;
 que trabalha a identidade de projeto, refletindo e criando pautas
culturais;
 que coordena interorganizações eficazes;
 que promove ação e aprendizagem coletiva;
 que se comunica e difunde resultados;
34
 que presta contas à sociedade;
 que reavalia e recria estratégias processuais;
tendo por processo, alvo e motor o desenvolvimento, considerando
dimensões tangíveis e intangíveis, objetivas e subjetivas, que conformam
organizações complexas e instituições (FISCHER, 2002a, p. 12).
Por se referir aos processos do campo de mediação e à identidade do projeto em
um processo de aprendizagem coletiva, os atores sociais encontram-se, segundo
Fischer (2002b), na condição de horizontalidade diante do poder com atuação no
sentido de criar espaços de governança, sobretudo por meio de uma relação
dialógica, em que todos aprendem juntos, realizam a accountablility e,
consequentemente, constroem e reconstroem estratégicas pautas culturais.
Para vingar essa montagem, necessita da elaboração de meios e formas de
governança, com participação efetiva da sociedade envolvida, configurando um
“novo modelo de tecer o desenvolvimento social” (FISCHER, 2002b).
Importa também comentar que Fischer (2002b), ao refletir sobre questões
contundentes vinculadas à gestão do desenvolvimento social, considera-as como
sendo aquelas que se referem aos processos e paradoxos destacados em cinco
proposições, que conjugam plena sintonia no acorde da gestão social.
A primeira proposição descrita pelo autor traz a definição de desenvolvimento
social como “um processo de mediação que articula múltiplos níveis de poder
individual e social”. Nessa prática de gestão sugere-se fazer algumas indagações
importantes para serem avaliadas no campo de atuação: do que deve ser feito, o
porquê ser feito, para quem ser feito. Como pano de fundo nesse campo de
atuação, a gestão do desenvolvimento social privilegia-se do coletivo de gestores,
acrescido das devidas competências para promover as transformações,
considerando o protagonismo da participação comunitária, não tutelada.
A segunda refere-se à gestão do desenvolvimento social como um local
(organizações ou interorganizacionais) onde transitam vários conhecimentos,
práticas, percepções, interações contextualizadas no agir dos seres humanos e
onde será inevitável encontrar conflitos e tensões, espaço de construção de
conhecimento e de aprendizagens.
35
A terceira tece considerações éticas e de valores orientados pela eficácia e pela
eficiência. Indica elementos fundamentais na gestão, tais como: fluidez, agilidade,
inovação, sustentabilidade, mapeamento de necessidades, delineamento de
estratégias, desenvolvimento de planos, gestão de recursos humanos ou
financeiros (escassos ou não), promoção da comunicação, divulgação de
resultados, construindo, portanto, a identidade e a imagem da organização,
prestando contas e avaliando resultados.
A quarta envolve a gestão de redes e das relações sociais, que são influenciadas
pelas características das pessoas e/ou gestores de acordo com suas
subjetividades.
A quinta faz considerações aos aspectos culturais, uma vez que a gestão do
desenvolvimento social e seus gestores trazem em seu conteúdo as construções
das identidades culturais.
Tais proposições servem de referência para fazer uma aproximação metodológica
quanto ao desejo de gestores na adoção de políticas e processos gerenciais
horizontalizados.
No que se refere à gestão social, Tenório (2008) apresenta uma perspectiva mais
institucional, isto é, que ressalta mais o aspecto da participação social nas
definições de políticas no âmbito do Estado. Nesse sentido, destacam-se as
observações que Silva Júnior (2008) traduz de Carrion8, ao comentar o conceito
de gestão social do autor Fernando Tenório, afirmando que essa atividade se
constitui “como aquela que fomenta uma cidadania deliberativa, uma efetivação
da participação do indivíduo no espaço público através da ação direta”.
Para Tenório (2008 p.41), “[...] a legitimidade das decisões deve ter origem em
processos de discussão, orientados pelos princípios da inclusão, do pluralismo,
da igualdade participativa, da autonomia e do bem comum”.
8
CARRION, Rosinha da Silva Machado. O desafio de desenvolver competências em gestão
social: relato da exeperiência com a residÊncia solidária / UFRG, 2008.
36
O mesmo autor, quanto ao campo de atuação, afirma que o conceito de gestão
social “contrapõe-se à gestão estratégica à medida que tenta substituir a gestão
tecnocrática, monológica, por um gerenciamento mais participativo, dialógico, no
qual o processo decisório é exercido por meio de diferentes sujeitos sociais”
(TENÓRIO, 2008, p. 53).
Nessa medida, é definidor dizer que a gestão social não apresenta características
mercadocêntricas, que priorizam, na gestão, os valores econômicos em
detrimento aos valores sociais, mas, sobretudo, características que demarcam
processos sociais pedagógicos de ação que propiciem a participação com o
exercício coletivo da reflexão e da tomada de decisão na ótica da inclusão social.
Nessa perspectiva, Gohn (2001, p. 13-14) afirma que:
Ao identificar o entendimento dos processos de participação da
sociedade civil e sua presença nas políticas públicas nos conduz
ao entendimento do processo de democratização da sociedade
brasileira; o resgate do processo de participação leva-nos,
portanto, às lutas da sociedade por acesso aos direitos sociais e à
cidadania. Nesse sentido, a participação é, também, luta por
melhores condições de vida e pelos benefícios da civilização.
Dessa forma, pode-se dizer que tais definições elucidam o eixo maior do conceito
de gestão social e unem a defesa dessa concepção com base participativa para
boa parte dos autores consultados. Sendo assim, constitui uma gestão que se
operacionaliza no social e que tem uma posição ideológica, na qual o econômico
surge como meio, e não como um fim, e que tem enraizados os princípios
democráticos: de igualdade, de cidadania e participação social.
Para elucidar ainda mais o objeto desta pesquisa, remete-se ao estudo de Maia
(2005), que proporciona subsídios importantes para a análise do processo de
gestão do FPT, a partir de suas atas, regimentos, lista de presença, pautas e
entrevistas.
A autora analisa as concepções de gestão social sob duas perspectivas. A
primeira, que ela denomina de gestão contra o social, caracterizada pelo projeto
societário do capital; e a segunda, baseada no desenvolvimento da cidadania. A
37
partir de subtemas caracterizadores do processo de gestão social, Maia (2005, p.
11) apresenta os elementos de análise e as respectivas categorias relevantes
para investigar as concepções e as práticas de gestão social:
a) Valores (axiologia): princípios referenciais que inspiram e dão direção
às construções teórico-práticas da gestão social;
b) propósitos (teleologia): finalidades ou intencionalidades para onde se
quer chegar com a gestão social;
c) focos (epistemologia): referências teóricas que dão sustentação à
perspectiva explicativa e propositiva da gestão social;
d) agentes (ontologia): pessoas e organizações que protagonizam o
processo da gestão social;
e) locus e metodologia (praxiologia): o locus delimita o território ou o
campo de viabilização da gestão social. A metodologia constitui-se do
caminho, das ideias e dos instrumentos balizadores para a
viabilização da gestão social.
Em seguida, Maia (2005, p. 12) elabora um quadro com a síntese das
concepções dos autores por ela estudados segundo suas próprias categorias,
como visto a seguir:
38
QUADRO 1 - Gestão social em construção
Autor
TENÓRIO
Categoria
Valores
Democracia
Cidadania
Convívio
resp. diferença
PropóImplementar
sitos
processos
sociais para
ação gerencial
em vista da
democracia e
cidadania
Focos
Administração
Administração
Pública
Política
Ciências
sociais
Locus
Organizações
governamentais
e políticas
públicas
Agentes
Trabalhadores
da
administração
pública,
População
SINGER
CARVALHO
Vida
Democracia
Trabalho
Direitos de
cidadania
Equidade
Desenvolver
ações para o
enfrentamento às
necessidades da
população a
partir do trabalho
e renda.
Economia
Administração
política
Ciências sociais
Associativismo/
Cooperativismo/
autogestão
Realizar ações
sociais públicas
para responder
as demandas
das
necessidades
da população
Ciências
sociais
Ciência política
Economia
Serviço Social
Políticas
econômicas
Governos/
Estado
Organização de
trabalhadores
Organizações
populares
ONGs
Universidades
Governos
Projetos,
programas e
políticas sociais,
Sociedade
Estado, Redes
Sociedade
civil/população
usuária
Estado, nas
diferentes
esferas
DOWBOR
Justiça
Bem-estar social
Desenv. humano
Democracia
Transformar o
desenvolvimento
atividade
econômica como
meio e bem-estar
social, fim do
desenvolvimento
Economia
Administração
ciência política
teorias da
educação
ciências sociais
Ciência jurídica
Ciência tecnológica
Paradigma em
construção
Políticas públicas
Organizações
estatais
empresariais e da
sociedade civil
FISCHER
Ética da
responsabilidade
Democracia
Gerir processos
sociais ou
processos de
desenv. social com
relações de poder,
conflito e
aprendizagem
Ciências sociais e
Políticas, teoria
organiz, pesquisa
social
História, Psicol.
Administração
Teorias do des.
Proposta préparadigmática
epistemológica e
praxiológica
Espaço local
Organizações
Interorganizações
Redes
Empresários
Indivíduo, grupos e
administradores
coletividades,
públicos, políticos,
Estado, mercado e
ONGs, sindicatos,
sociedade civil
pesquisadores,
movimentos sociais,
universidades
representantes
comunitários
Metodo- Processos
Economia
Gestão em
Governança
Processos sociais
logia
sociais:
solidária e outras rede
Política integrada e mediações, poder,
articulação
estratégias
Empoderamento coerente
conflito e educaç.
entre os atores; autogestionárias
parceria
Empoderamento
Governança
técnicas de
Políticas públicas Controle
Articulação entre
Planejamento local
gestão
Projetos e
social e econômico e transescalares
programas
O público privado, o Financiamento
sociais
Estado o mercado e a Redes: ações
Governança
sociedade civil
individuais e
Intersetorialidade Descentralização
coletivas
Transparência
Negociação
Organizações de
Publicização
aprendizagem
Construção de
identidade e
legitimidade e
efetividade social
Fonte: Maia (2005, p. 12).
39
As práticas relatadas na literatura a respeito de gestão social indicam que existe
uma tendência a destacar mais o seu conteúdo social e a prática de cada um
desses processos do que a definição em si mesma, conforme também define
França Filho (2008).
Nesse aspecto, entende-se que a gestão tem a ver principalmente com a prática
vivenciada pelos atores sociais, baseada nos pressupostos democráticos que a
sustentam - fator preponderante de sua caracterização.
Ao avaliar essas distintas perspectivas, compreende-se que se trata de um
conceito que não se apresenta pronto, completo, fixo e acabado. Diante disso,
compartilha-se com a concepção de Silva Júnior (2008), o qual destaca que
representa:
[...] um conceito em construção, emergente e inovador – como uma
dimensão das organizações e práticas sociais que articula diferentes
variáveis, como: interações e relações de confiança; aprendizagem e
conhecimento, pessoas e tecnologias; cultura e comportamento
organizacional; cooperação, domesticidade e redistribuição (SILVA
JÚNIOR, 2008, p. 24).
Diante da revisão realizada, constata-se que gestão social representa uma ideia
polissêmica. Contudo, perante esta pesquisa será adotado o referencial
construído pelo estudo de Maia (2005, p. 15-16), a qual cria o seu próprio
conceito de gestão social:
Assim, compreendemos gestão social como um conjunto de processos
sociais com potencial viabilizador do desenvolvimento societário
emancipatório e transformador. É fundada nos valores, práticas e
formação da democracia e da cidadania, em vista do enfrentamento às
expressões da questão social, da garantia dos direitos humanos
universais e da afirmação dos interesses e espaços públicos como
padrões de uma nova civilidade. Construção realizada em pactuação
democrática, nos âmbitos local, nacional e mundial; entre os agentes das
esferas da sociedade civil, sociedade política e da economia, com efetiva
participação dos cidadãos historicamente excluídos dos processos de
distribuição das riquezas e do poder. Estes referenciais apontam a práxis
da gestão social, enquanto mediação para a cidadania, que se contrapõe
à perspectiva instrumental e mercantil que vem sendo dada a este tema.
De todo modo, essa conceituação aproxima-se de algo contíguo à utopia que
deve ser construída historicamente pelos sujeitos sociais, por meio das
40
possibilidades de um estado democrático de direito. Tal questão é parte
integrante das conquistas para a cidadania plena e participativa.
Mediante isso, a pesquisadora também procura referenciar o estudo de Gondim,
Fischer e Melo (2006, p. 48), que entendem gestão social como:
[...] um ato relacional capaz de dirigir e regular processos por meio da
mobilização ampla de atores na tomada de decisão (agir comunicativo),
que resulte de parcerias intra e interorganizacionais, valorizando as
estruturas descentralizadas e participativas, tendo como norte o
equilíbrio entre a racionalidade instrumental (com relação a fins) e a
racionalidade substantiva (com relação a valores), para alcançar, enfim,
um bem coletivamente planejado, viável e sustentável a médio e longo
prazo.
Esse ato, no aspecto da participação e da mobilização, traduz as demandas e
necessidades de grupos que, por meio de parcerias, redes e das relações intra e
extraorganizacionais de gestão social, pautam seus objetivos comuns no alcance
da inclusão social e sustentável.
Ainda no que se refere à questão da participação em conselhos, tal como fóruns,
outro aspecto diz respeito à qualidade dessa participação, ressaltando a natureza
de articulação entre Estado e sociedade e a tradução de participar em deliberar
sobre políticas públicas (AVRITZER, 2010, p. 139). Ou seja, é necessário avaliar
o quanto da teoria democrática deliberativa de representação se estabelece nas
experiências concretas.
Como o FPT dedica-se a promover ações voltadas para a inserção de PCD no
mercado de trabalho, torna-se importante estudar como as sociedades lidaram e
lidam com esses seres humanos.
2.2 Da exclusão para a inclusão
A exclusão, que envolve diferentes processos produtores de preconceito e de
segregação aos direitos e à cidadania das PCDs, não fez parte da agenda das
41
políticas públicas no Brasil e no mundo, apesar de as PCD terem os mesmos
direitos das pessoas sem deficiência.
Como descreve Sassaki (1999), a inclusão social das PCDs é um movimento
mundial que se intensificou no Brasil e no mundo a partir da década de 90, tendo
a ver com a mudança de entendimento do ponto de vista social, legal, ético,
educacional, cultural e dos direitos humanos sobre a diferença e a deficiência.
No Brasil, esse processo se materializa com os movimentos organizados “de” e
“para” PCDs que buscam a defesa dos seus direitos nos mais diferentes setores
da sociedade.
Ressalta-se, também, que a “imagem social positiva”9 que se constrói quanto à
condição de vida dessas pessoas, o avanço das “ajudas técnicas ou tecnologias
assistivas”10, os marcos legais e a democracia participativa instituída no país
foram pontos fortes nessa ressignificação.
A trajetória histórica dessa temática permite identificar quatro estágios
diferenciados em relação à forma como as PCDs eram vistas e tratadas na
sociedade. Nesse contexto, Sassaki (1999, p. 16) explica que:
A sociedade, em todas as culturas atravessou diversas fases no que se
refere às práticas sociais. Ela começou praticando a exclusão social de
pessoas que – por causa das condições atípicas – não lhe pareciam
pertencer à maioria da população. Em seguida, desenvolveu o
atendimento segregado dentro das instituições, passou para a prática
da integração social e, recentemente, adotou a filosofia da inclusão
social para modificar os sistemas sociais gerais.
Embora se tenha certa clareza de que a história não seja linear e evidencie
retrocessos, recuos e avanços, pode-se falar de momentos diferenciados, que
vão desde a inclusão marginal (MARTINS, 1997) ou abandono dessas pessoas,
até diferentes tentativas de inserção social e cidadã. Assim, durante longo período
9
Imagem social positiva: termo utilizado nos movimentos sociais.
Tecnologia assistiva ou ajudas técnicas: elementos que permitem compensar uma ou mais
limitações funcionais motoras, sensoriais ou mentais da pessoa com deficiência, com objetivo de
lhe permitir superar as barreiras da comunicação e da mobilidade e de possibilitar sua plena
inclusão social (BRASIL, 2009a).
10
42
predominou o padrão da exclusão. De acordo com Sawaia et al. (1999, p. 9), a
exclusão apresenta:
[...] processo complexo e multifacetado, uma configuração de dimensões
materiais, políticas, relacionais e subjetivas. É um processo sutil e
dialético, pois só existe em relação à inclusão como parte constitutiva
dela. Não é uma coisa ou estado, é processo que envolve o homem por
inteiro e suas relações com os outros. Não tem uma única forma e não é
uma falha do sistema, devendo ser combatida como algo que perturba a
ordem social, ao contrário, ela é produto do funcionamento do sistema.
Em determinadas culturas “arcaicas”, era comum o hábito de abandonar idosos,
doentes e deficientes, como uma prática que eliminava pessoas com deficiências
físicas e mentais para que não acompanhassem o grupo na luta.
Outra atitude verificada diante dessas pessoas foi o cuidado e a proteção,
caracterizado como fase da segregação. Nesse aspecto, Aranha (2003, p. 15-16)
apresenta os seguintes comentários relativos à segregação:
Esse paradigma constituiu prática corrente e corriqueira, em nossa
realidade, até a década de 1980, momento em que se iniciou a crítica à
instituição e a rejeição da exclusão de minorias diversas. Os efeitos das
mudanças nas políticas de saúde após 1964 começaram a se fazer
visíveis, abrindo caminho para o paradigma de serviços. A mudança de
valores e de ação passou a se manifestar pela quase segregação,
representada pela mudança de natureza das instituições já existentes ou
pela criação de novas entidades, agora de prestação de serviços.
Em seguida, do ponto de vista analítico, emerge a fase nomeada de integração
social, na qual imperava o tratamento por meio de centros de reabilitação,
procurando prepará-las para se integrar à comunidade.
Esse padrão, então, caracteriza-se como modelo médico de caráter funcionalista.
E nesse sentido e âmbito, Sassaki (1999, p. 43) esclarece que:
Algumas pessoas utilizam as palavras integração e inclusão, já em
conformidade com a moderna terminologia da inclusão social, ou seja,
com sentidos distintos – a integração significando “inserção da pessoa
deficiente preparada para conviver na sociedade” e a inclusão significado
“modificação da sociedade como pré-requisito para a pessoa com
necessidades especiais buscar seu desenvolvimento e exercer a
cidadania”.
43
Contudo, pelo menos como ideal a ser alcançado, na última década vem se
consolidando o quarto modelo, o da inclusão social e da garantia de direitos,
indicando principalmente a superação das dificuldades que cercam as pessoas
com deficiência. Nesse sentido, o mesmo autor conceitua o quarto modelo como
[...] “a inclusão social como o processo pelo qual a sociedade se adapta para
poder incluir, em seus sistemas sociais gerais, pessoas com necessidades
especiais e, simultaneamente, estas se preparam para assumir seus papéis na
sociedade” (SASSAKI, 1999, p. 41).
Ressalta-se que o modelo da sociedade inclusiva foi lançado em 1981 pela ONU,
quando realizou o Ano Internacional das Pessoas com Deficiência. Nessa época
oficializou-se o reconhecimento dos direitos das PCDs.
Na sequência, destacam-se a proposta da Década das Nações Unidas para as
Pessoas Portadoras de Deficiência (1983-1992), a Declaração de Salamanca
(1994) e, em 1997, a Conferência Internacional Uma Sociedade para Todos:
Inclusão – Participação, realizada na Noruega.
Por outro lado, mesmo no que se refere às denominações apostas às PCDs,
podem-se observar formas de segregação. Em distintas culturas se verificam
várias denominações em relação à PCD. Em geral, foram nomeados por termos
desqualificantes, tais como: mancos, pernetas, ceguinhos, descapacitados,
pessoa especial, minorado, deficiente, inválidos e excepcionais, inclusive no meio
acadêmico, contribuindo negativamente para a imagem e a representação desses
sujeitos.
A busca dos significados, dos conceitos e a discordância da terminologia faziam
com que os movimentos sociais indicassem, claramente, como a visão da
sociedade era permeada de conceitos baseados no senso comum.
A partir de 22 de fevereiro de 2011, entretanto, o Conselho Nacional dos Direitos
da Pessoa com Deficiência (CONADE), por meio da Resolução nº 1, de 15 de
outubro de 2010, publicada em 22 de fevereiro de 2011 (BRASIL, 2011c),
recomendou oficialmente a substituição da expressão "pessoas portadoras de
44
deficiência" por "pessoas com deficiência", consagrando uma decisão que já
vinha sendo consolidada desde o final da década de 1990.
Apesar dos conceitos de normalidade e anormalidade frequentemente utilizados,
poucas pessoas conseguem claramente indicar os limites do que é normal ou
anormal, em distintas culturas. Telford e Sawrey (1988, p. 24) fazem uma
importante explanação sobre esses conceitos e destacam os seguintes pontos:
O que é normal e o que é anormal no comportamento e desenvolvimento
humano? O que determina se um indivíduo é comum ou incomum,
normal ou excepcional? Excepcionalidade e anormalidade são conceitos
populares, com significados variáveis. Exceto enquanto definidos
operacionalmente para alguns fins administrativos ou de pesquisa, terão
sempre que ser compreendidos no contexto social específico em que
são empregados.
A mesma imprecisão dos significados também imperava nas questões sociais,
não só no que se refere a esse segmento, mas também a outros, tais como:
menor infrator, portador de doenças, entre outros. Rotulações e estigmatizações
são fatores preponderantes para que haja discriminação por meio dos
mecanismos de linguagem utilizados e que podem produzir significados diversos
com dimensões distorcidas da realidade, levando a uma esteriotipia do sujeito,
conforme citado a seguir:
[...] a categorização e a estereotipização das pessoas são traços
universais da intenção social. Os estereótipos têm sido genericamente
considerados como males a serem erradicados e são usualmente
retratados como "imagens mentais" incorretas, que distorcem a
percepção e alimentam relações sociais distorcidas entre as pessoas. As
categorias sociais e os estereótipos podem impedir a percepção e
conhecimento do outro como indivíduo singular, a ser avaliado por seus
méritos, como fica ilustrado pelas profecias autocumpridoras (TELFORD;
SAWREY, 1988, p. 62- 63).
Entretanto, com a Constituição de 1988 e com o processo democrático que
ocorreu no país, paulatinamente os movimentos sociais e a disposição da
sociedade foram direcionados para a construção de uma sociedade igualitária,
equânime e mais justa para todos.
No processo de inserção da PCD na sociedade, modelos integrativos – em que
apenas a pessoa se esforça para ser inserida na sociedade – não contemplam
45
satisfatoriamente os direitos das PCDs, uma vez que a integração pouco ou nada
exige da sociedade quanto à mudança de atitudes, de espaços físicos e de
objetos, ou mesmo de práticas sociais.
Segundo Sassaki (1999), essa integração resulta de esforços de indivíduos, não
de transformações sociais, pois ocorrem:
Pela inserção pura e simples daquelas pessoas com deficiência que
conseguiram ou conseguem, por méritos pessoais e profissionais
próprios, utilizar os espaços físicos e sociais, bem como seus programas
e serviços, sem nenhuma modificação por parte da sociedade, ou seja,
da escola comum, da empresa comum, do clube comum, etc. (SASSAKI,
1999, p. 34).
Nesse modelo, a sociedade não se propõe como parceira da PCD, no sentido de
acolhê-la e de criar-lhe condições, tendo em vista suas características,
necessidades e especificidades. Parte-se de uma visão isolacionista (MORIN,
1996) que concebe o indivíduo desconexo da sociedade.
Assim, o conceito de PCDs se ressignifica à luz da inclusão e da diversidade
como processo social. Mostra que a deficiência não está na pessoa, mas,
sobretudo, nas relações sociais e na capacidade de a sociedade se preparar para
acolher essas pessoas e principalmente proporcionar-lhes acessibilidade para a
construção de uma sociedade para todos, independentemente da identidade de
gênero, orientação sexual, raça, etnia, origem, religião, condição de saúde física,
mental, condição econômica e de classe social. Conforme a Convenção sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência, versão comentada (BRASIL, 2008, p. 47),
todo tipo de preconceito deve ser erradicado:
É urgente a erradicação tanto do preconceito quanto do tratamento
especial existente para essa parte da população, devendo prevalecer à
igualdade. Para isso, é preciso discutir, apresentar e combater os
estereótipos, as práticas nocivas em relação às pessoas com deficiência,
em todos os espaços da vida. Para ilustrar, em muitos casos é preciso
reafirmar que o problema é a porta estreita, a presença da escada, a
falta de audiodescrição ou legenda oculta e não a presença daquela
pessoa com deficiência.
Conforme Lafer (1998 apud CORRÊA, 2002), na abordagem de Arendt, “a
condição humana básica – o direito a ter direitos – significa pertencer, pelo
46
vínculo da cidadania, a algum tipo de comunidade juridicamente organizada e
viver numa estrutura em que se é julgado por ações e opiniões, por obra do
princípio da legalidade” (LAFER, 1998 apud CORRÊA, 2002, p. 219).
Essas reflexões e reivindicações indicam que as pessoas realmente devem ter
direito a ter direitos. Embora muitos deles ainda não tenham sido garantidos,
caminhos estão sendo trilhados e conquistados, sinalizando a promoção, a
garantia e mesmo a prospecção desses mesmos direitos a: saúde, educação,
trabalho e emprego, lazer, cultura, padrão de vida, proteção social, esporte,
acessibilidade, habitação, transporte, privacidade, acesso à justiça, à segurança e
à informação, enfim, às condições de igualdade e não discriminação e qualidade
de vida independente para uma sobrevivência digna, decente e, sobretudo,
inclusiva.
Nessa perspectiva, faz-se necessário um novo modelo que, conforme Sassaki
(1999, p. 17), corresponde ao:
[...] modelo social da deficiência, segundo o qual os problemas da
pessoa com deficiência não estão nela tanto quanto estão na sociedade,
pois é na sociedade que existem os verdadeiros problemas como, por
exemplo: os preconceitos que rejeitam a minoria e todas as formas de
diferenças, os ambientes físicos restritivos, os discutíveis padrões de
normalidade, os objetos e outros bens fisicamente inacessíveis, os prérequisitos destinados apenas à maioria aparentemente homogênea, a
quase total desinformação sobre as deficiências e sobre os direitos e as
práticas discriminatórias em praticamente todos os setores da atividade
humana.
Contudo,
a
prática
social
da
autora
tem
demonstrado
obstáculos
na
implementação dessa percepção do problema e é, nesse sentido, que nesta
pesquisa se propôs a discutir os limites e as possibilidades de um fórum de
entidades públicas e privadas dedicado a subsidiar o emprego de PCD, portanto,
com atuação relacionada à política de cotas.
Levando em consideração esses padrões ou estágios da abordagem social das
PCDs, brevemente assinalados, remete-se à discussão para a legislação nacional
recente, lembrando que tais normas legais assentam-se nos modelos de
integração e de inclusão social, da classificação de Sassaki (1999). A estrutura
47
legal e normativa condiciona e, no caso de alguns atores, até mesmo impulsiona
à participação no FPT. Daí a necessidade de se conhecer minimamente o
arcabouço legal do Brasil no que se refere à PCD.
2.3 Alguns aspectos da legislação nacional
Muitas foram as leis e normas que demarcaram os direitos, as garantias e a
visibilidade das PCDs. Entretanto, destaca-se entre elas a Lei nº 7.853, de 24 de
outubro de 1989 (BRASIL, 1989), denominada Política Nacional para as Pessoas
com Deficiência. Ela foi o principal documento orientador da “integração social”
desse grupo no Brasil e importante ponto de partida na defesa dos direitos das
PCDs. Nesse documento são estabelecidas as normas que asseguram os direitos
individuais e sociais, reconhecimento da igualdade de tratamento e oportunidade,
da justiça social e do respeito à dignidade da pessoa humana. Esses valores,
questões contundentes para a garantia de cidadania plena das PCDs, passam a
ser asseguradas em Lei.
Do ponto de vista legal, possibilita-se a instalação de um novo paradigma,
alçando as PCDs de incapacitados e desprovidos de direitos para o patamar de
sujeitos de direitos. Além disso, por essa lei, a Coordenadoria Nacional para a
Integração de Pessoas Portadoras de Deficiência (CORDE) institui a tutela
jurisdicional de interesses coletivos ou difusos dessas pessoas, disciplina a
atuação do Ministério Público (MP) e define crimes. Abordando as diversas
políticas públicas necessárias para o segmento, destaca-se que essa foi a lei que
reconheceu, às pessoas deficientes, o possível e tão almejado status de cidadão.
Tal legislação apresenta as possibilidades de apoio às PCDs e sua integração
social, ainda que hoje esse conceito esteja ultrapassado e não mais seja válido.
Tal razão justifica-se por ter esse modelo vigorado durante as décadas em que se
trabalhava em uma perspectiva de inclusão marginal ou precária.
48
No contexto da legislação nacional, outra lei que também foi um divisor de águas
na política das PCDs no Brasil foi o Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1989
(BRASIL, 1999), que regulamenta a Lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989
(BRASIL, 1989), e expõe sobre a Política Nacional de Integração da Pessoa com
Deficiência, bem como consolida as normas de proteção.
Esse decreto de fato contribuiu para impulsionar as ações de colocação
profissional da PCD no país e, como consequência, pressionou os órgãos
competentes de fiscalização a assumirem de forma mais contundente a
responsabilidade fiscalizadora de suas ações. Todavia, a prática social tem
demonstrado lacunas na efetivação desses direitos, como se pretende discutir
neste trabalho.
Já o artigo 93 da Lei nº 8.213 de 24 de julho de 1991 (BRASIL, 1991a) estabelece
que:
“A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a
preencher 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos
com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência,
habilitadas, na seguinte proporção:
I - até 200 empregados....................................................................2%;
II - de 201 a 500...............................................................................3%;
III - de 501 a 1.000...........................................................................4%;
IV - de 1.001 em diante. ..................................................................5%.
§ 1º A dispensa de trabalhador reabilitado ou de deficiente habilitado ao
final de contrato por prazo determinado de mais de 90 (noventa) dias, e a
imotivada, no contrato por prazo indeterminado, só poderá ocorrer após
a contratação de substituto de condição semelhante.
§ 2º O Ministério do Trabalho e da Previdência Social deverá gerar
estatísticas sobre o total de empregados e as vagas preenchidas por
reabilitados e deficientes habilitados, fornecendo-as, quando solicitadas,
aos sindicatos ou entidades representativas dos empregados” (BRASIL,
1991a).
Apesar de datar de 1991, a chamada “Lei de Cotas” permaneceu em larga
medida letra morta até a edição do Decreto nº 3.298/1999.
O Benefício de Prestação Continuada, denominado BPC, foi instituído por meio
da Lei nº 8.742/93 (BRASIL, 1993) e disciplinou a assistência social às pessoas
idosas e às pessoas com deficiência. Segundo Sposati (2004, p. 79-80):
49
A Lei nº 8.742/93 disciplinou a assistência social e, em especial, o
denominado Benefício de Prestação Continuda, destinado às pessoas
idosas e às portadoras de deficiência, na forma que especifica. A
natureza jurídica de benefício assistencial impõe que aquele que o
recebe não tenha direito a nenhum outro benefício previdenciário, e, em
caso de seu falecimento, não haverá direitos à pensão por morte ou
auxílio-funeral, prestações que têm natureza previdenciária. E mais, sua
natureza jurídica não impede o beneficiário de receber assistência
médica no âmbito da seguridade social. A própria Lei nº 8.742/93 e o
decreto que regulamentou definem o que seja família, bem como pessoa
portadora de deficiência, famílias incapazes de prover a manutenção da
pessoa portadora de deficiência ou idosa. O artigo 20 da referida lei criou
duas condições para o recebimento do benefício: para as pessoas com
deficiência exigiu que comprovassem a incapacidade para a vida
independente e para o trabalho. E para ambos – idosos e portadores de
deficiência – estipulou que só tem direito aquele que comprovar renda
per capita familiar inferior a um quarto do salário mínimo. A comprovação
da idade não acarreta grandes dificuldades. Já com relação à prova da
deficiência, a Lei nº 8.742/93 e o decreto que a regulamentou fixaram
que o interessado será submetido a uma avaliação por equipe médica,
da qual deverá resultar um laudo, que será o documento comprobatório
da deficiência.
A autora também afirma que “[...] sua natureza jurídica não impede o beneficiário
de receber assistência médica no âmbito da seguridade social” (SPOSATI, 2004,
p. 80). Ainda ressalta que, no artigo 20, a mesma lei criou condições para o
recebimento do benefício por parte das PCDs, exigindo que seja comprovada a
incapacidade para a vida independente e para o trabalho. Tanto para os idosos
quanto para as PCDs, foi estipulado comprovar renda per capita familiar inferior a
um quarto do salário mínimo.
Tal legislação deixa claro quem é de fato o beneficiário da assistência, que, a
nosso ver, estabeleceu um patamar mínimo de cobertura. Por outro lado, deparase com certa tensão entre a questão de receber ou não o BPC, uma vez que,
caso a PCD volte a trabalhar e ser produtiva, tal benefício deve ser cessado,
mesmo sem a garantia de que o emprego perdurará ou que outra relação de
emprego possa ser conquistada. Alguns empregadores argumentam que esse
benefício diminui ainda mais o grupo de trabalhadores disponíveis para a inclusão
produtiva.
Em 26 de janeiro de 2001, foi regulamentada a Instrução Normativa nº 20, sobre
os procedimentos a serem adotados pela fiscalização do trabalho das PCDs,
dando finalmente competência aos Auditores Fiscais do Trabalho (AFT) e
50
orientação necessária para a fiscalização do cumprimento da Lei nº 8.213/91
(BRASIL, 1991a).
Ainda vinculada à questão da inserção laboral das PCDs, o Decreto nº 3.956 de
outubro de 2001 (BRASIL, 2001) promulga a Convenção Interamericana para
Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas com
Deficiência. Esse documento representa importante instrumento que possibilita
medidas de proteção contra as mais variadas formas de preconceito e
discriminação vivenciadas por esse segmento.
Além disso, no que se refere ao princípio de reconhecer o cenário social da
deficiência e a sua especificidade, outro aparato legal relevante é o Decreto nº
5.296, de 2 de dezembro de 2004 (BRASIL, 2004), que regulamenta a Lei 10.048,
de 8 de novembro de 2000 (BRASIL, 2000a), a qual dá prioridade de atendimento
às PCDs. Junto a isso, a Lei nº 10.098, de 19 de dezembro de 2000 (BRASIL,
2000b), estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da
acessibilidade das PCDs ou com mobilidade reduzida.
O decreto de acessibilidade emancipa a PCD porque, por meio da acessibilidade,
o direito de ir e vir lhe é assegurado. Portanto, esse decreto tornou-se a principal
ferramenta de efetivação do proposto na Convenção sobre os Direitos da Pessoa
com Deficiência – versão comentada (2008), que ressalta a importância de meios.
[...] para que as pessoas com deficiência atinjam sua autonomia em
todos os aspectos da vida, o que demonstra uma visão atualizada das
especificidades dessas pessoas, que buscam participar dos meios mais
usuais que a sociedade em geral utiliza para funcionar plenamente nos
dias de hoje, não se reduzindo apenas ao meio físico (BRASIL, 2008, p.
50).
A Convenção sobre os Direitos das PCDs - fruto da mobilização dos movimentos
sociais desse grupo social, apoiados pela Rede Latino-Americana de ONGs de
PCD e suas famílias – traz a cabo um novo tratado temático de direitos humanos
que inclui esses sujeitos. Durante a Conferência sobre racismo em Durban, 2001,
o México adotou esses princípios de enfrentamento a ações discriminatórias
contra esse público.
51
Essa convenção foi incorporada no ordenamento jurídico brasileiro como norma
constitucional, publicada no Diário Oficial da União de 10/07/2008, por meio do
Decreto nº 6.949 de 25 de agosto de 2009 (BRASIL, 2009b), o qual determina
que seja cumprida, e traz como propósitos: “promover, proteger e assegurar o
exercício pleno e equitativo de todos os direitos humanos e liberdades
fundamentais por todas as pessoas com deficiência e promover o respeito à
dignidade inerente”. A Convenção (BRASIL, 2010, p. 22) traz também um novo
conceito de quem são esses sujeitos:
[...] aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas
barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade
em igualdades de condições com as demais pessoas (BRASIL, 2010, p.
22).
Nesses parâmetros, observa-se que esse instrumento traz alguns avanços nas
características pertinentes à vida participativa desse segmento social. Segundo a
Convenção:
a) O respeito pela dignidade inerente, a autonomia individual, inclusive a
liberdade de fazer as próprias escolhas, e a independência das
pessoas;
b) A não discriminação;
c) A plena e efetiva participação e inclusão na sociedade;
d) O respeito pela diferença e pela aceitação das pessoas com
deficiência como parte da diversidade humana e da humanidade;
e) A igualdade de oportunidades;
f) A acessibilidade;
g) A igualdade entre homem e a mulher;
h) O respeito pelo desenvolvimento das capacidades das crianças com
deficiência e pelo seu direito de preservar a sua identidade. (BRASIL,
2010, p. 22).
Esses princípios balizarão a formatação de políticas públicas no país, contribuindo
para uma visão mais responsável da sociedade que irá receber e acolher as
PCDs. Esses mesmos princípios também oferecem referências para o debate e a
construção da proposta de inclusão produtiva de PCD.
O breve percurso histórico apresentado até aqui revela que o Brasil tornou-se
signatário de uma legislação atual que não só cria novos direitos, mas, sobretudo,
reconhece o panorama social da deficiência e sua particularidade, conferindo
materialidade a um arcabouço de direitos até então negados às PCDs.
52
O modelo social da deficiência, no qual a Convenção se apoia, representa um
conceito em evolução e resulta da interação entre PCDs e as barreiras
encontradas na vida social, as quais impedem a possibilidade e efetiva
participação dessas pessoas na sociedade em igualdade de oportunidades com
as demais pessoas.
É importante ressaltar que o processo de inclusão social das PCDs depende de
corresponsabilidade da sociedade na criação de mecanismos que facilitem a vida
da PCD em suas mais diversas características.
No entanto, a realidade se confirma de maneira distinta, já que esses sujeitos
encontram formas de “inclusão marginal”11 quanto à inserção no mundo do
trabalho.
2.4 Alguns outros obstáculos à inclusão
O processo de crescente inclusão social das PCDs não ocorre sem percalços. No
caso da inserção laboral, constata-se que existem ofertas de emprego para as
PCDs das mais diversas categorias profissionais, e que não são preenchidas.
Presencia-se, dessa maneira, acentuada exigência das empresas quanto ao nível
de escolaridade desse segmento, que viveu, e vive, a exclusão educacional
devido às mais variadas barreiras. Conforme afirma Clemente (2003, p. 61):
Todas as barreiras para atingir o mercado são formadas por fatores
externos. A mais grave delas é também a que está mais diretamente
envolvida com o próprio portador de deficiência: a falta de escolaridade.
Grande parte das empresas exige, em seu processo de seleção, que os
candidatos a qualquer cargo tenham, no mínimo, o Ensino Médio,
condição que ainda não foi alcançada pela maioria das pessoas
portadoras de deficiência (PPDs).
É corrente a cobrança dos empregadores quanto à qualificação desses
trabalhadores, conforme Batista (2004, p. 74) assinala:
11
Inclusão marginal: termo utilizado por José de Souza Martins (1997, p. 37).
53
No entanto, a inclusão no trabalho da pessoa portadora de deficiência
possui um agravante, que é a falta de qualificação adequada. Os cursos
de profissionalização, em sua maioria, foram ofertados pelas
organizações da sociedade civil (OSCs) especializadas, mais uma vez
para atender à demanda e à falta destes serviços pelo Estado ou pelo
mercado.
O quadro histórico evidencia que os ambientes segregativos dificultaram e, em
certa medida, comprometeram a capacitação profissional desse público.
A escola, na perspectiva inclusiva, pode contribuir para a qualificação profissional
das PCDs, uma vez que o mercado se configura em quadros de competitividade
acentuada. Oliveira (2000) também destaca que:
Nesse atual contexto da globalização mundial e suas relações
planetárias, em que as mudanças na base tecnológica e do processo
produtivo ocorreram numa velocidade astronômica, a educação
consolida-se como um vetor estratégico para o desenvolvimento dos
povos. A educação torna-se, portanto, como o maior recurso que se
dispõe para enfrentar essa nova estruturação mundial. Só através de
uma educação de qualidade para todos poder-se-á construir uma
sociedade de cidadãos produtivos, participativos e responsáveis,
capazes de responder e refletir de maneira autônoma em relação à
mudança dessa sociedade contemporânea (OLIVEIRA, 2000, p. 65).
Entretanto, a baixa escolaridade representa uma realidade não só das PCDs.
Assim, oportunizar cursos de qualificação e capacitação para essa população
constitui uma perspectiva favorável para a profissionalização das PCDs. Por outro
lado, deve-se considerar Pastore (2000), quando afirma que:
A educação sozinha não é garantia de emprego. Mas ela ajuda as
pessoas a se empregarem, manterem-se empregadas e a mudarem de
emprego. Na grande massa de desempregados da região da Grande
São Paulo, onde o desemprego ultrapassou a casa dos 20% no final da
década de 1990, pela metodologia do [Departamento Intersindical de
Estatística e Estudos Socioeconômicos] DIEESE-SEADE, que leva em
conta também a informalidade, havia apenas 3,5% de pessoas formadas
em faculdade. Nessa massa, quase 50% dos desempregados não
tinham completado o primeiro grau (PASTORE, 2000, p. 79).
Todavia, essa realidade de exigências de qualificação às PCDs não se apresenta
de maneira linear. Algumas empresas vêm respondendo a esse desafio e
54
realizam com sucesso alguns programas específicos, fazendo coro às práticas de
responsabilidade social empresarial12.
Segundo Lyth (1973 apud PASTORE, 2000, p. 61), “os empregadores inclinados
a contratar portadores costumam recuar quando têm de enfrentar as despesas e
os problemas gerados pelo seu emprego em ambientes de não portadores de
deficiência, e que nem sempre aceitam bem o trabalho daqueles”.
Aqui se verifica uma tensão entre o prescrito na lei e a realidade apresentada. Na
verdade, a inclusão produtiva de PCD poderá aliviar as contas da Previdência
Social, com a volta de trabalhadores acidentados reabilitados à atividade
econômica remunerada, assim como as da assistência que vem oferecendo BPCs
a cidadãos que possuem potencial para o trabalho. Em vez de serem
classificados na categoria de pessoas incapacitadas para o trabalho, e superado
o receio de perder a garantia do benefício de um salário mínimo, a PCD passaria
à condição de empregado, auferindo rendimento do trabalho.
Tais dados e análises ajudam a entender, em certa medida, como esse problema
necessita ser mais debatido e pesquisado no âmbito das políticas públicas. No
próximo item, tentar-se-á abordar a relação das ações afirmativas e da
Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência com o trabalho e a
inserção produtiva.
2.5 As ações afirmativas, a Convenção da ONU e o trabalho
O movimento internacional pela promoção dos Direitos Humanos vem envidando
esforços no sentido de criar novas condutas e incentivar o fim da discriminação.
Prática utilizada no contexto mundial, a ação afirmativa tem origem nos Estados
Unidos, nos anos 60, como tema principal na questão da igualdade com vistas à
promoção da equidade.
12
Ver Garcia (2010), por exemplo.
55
Também se encontram na literatura pesquisada designações semelhantes e afins,
tais como política de cotas, discriminação positiva, reserva de vagas, ação
compensatória, entre outros.
Nesse curso, com processo de redemocratização no Brasil, a expressão “ação
afirmativa” entra no cenário de discussões como forma de enfrentamento às
desigualdades de determinados segmentos, em consonância com os objetivos
constitucionais. Para Gugel (2007, p. 46; 47), “[...] o direito à igualdade
correlaciona a igualdade e a discriminação: ‘veda a discriminação’ quando o
resultado do ato gera tratamento desigual; ‘indica a discriminação’ para
compensar desigualdades de oportunidade e tratamento”.
Nesse sentido, Gugel (2007, p. 55) define ação afirmativa como “[...] a adoção de
medidas legais e de políticas públicas que objetivam eliminar as formas e tipos de
discriminação que limitam oportunidades de determinados grupos sociais”. Essa
definição indica a possibilidade de devolver, ou pelo menos resgatar, a condição
de igualdade inerente à pessoa humana.
No tocante às PCDs, as políticas de ações afirmativas vêm permitindo o acesso a
bens e serviços da comunidade, dos quais foram habitualmente alijadas ao longo
da história.
Uma primeira norma legal de “discriminação positiva” para o mercado de trabalho,
responsável pela reserva de vagas de postos de trabalho na administração
pública e privada, destinada às PCDs está prevista na Lei n° 7.853/89 (BRASIL,
1989), conhecida como a Lei da CORDE que estabelece, em seu art.2º.
“Ao poder público e seus órgãos cabe assegurar às pessoas portadoras
de deficiência o pleno exercícios de seus direitos básicos, inclusive dos
direitos à educação e à saúde, ao trabalho, ao lazer, à Previdência
Social, ao amparo à infância e à maternidade, e de outros que,
decorrentes da Constituição e das leis, propiciem seu bem-estar, social e
econômico. [...]
d) a adoção de legislação específica que discipline a reserva de mercado
de trabalho, em favor das pessoas portadoras de deficiência, nas
entidades da administração pública e do setor privado, e que
regulamente a organização de oficinas e congêneres integradas ao
mercado de trabalho, e a situação, nelas, das pessoas portadoras de
deficiência”.
56
Ainda que a referida lei tenha seu atributo compensatório para as PCDs e sua
inserção produtiva, Ragazzi (2008) comenta que as normas adotadas tiveram
tímidas respostas do mercado de trabalho. Acredita-se que tal situação tenha sido
decorrente da ausência de fiscalização e de estímulos a instituições que
viabilizassem, de forma efetiva, a habilitação, reabilitação e inserção desses
indivíduos no mercado de trabalho.
Também estava pouco elucidado o conceito legal de quem era esse sujeito com
deficiência a ser inserido no mercado de trabalho. Posteriormente, o Decreto nº
3.298/99 (BRASIL, 1999), em seu artigo 4º, especifica quem é a pessoa
considerada com deficiência.
“Art. 4º É considerada pessoa portadora de deficiência a que se
enquadra nas seguintes categorias:
I - deficiência física - alteração completa ou parcial de um ou mais
segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da
função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia paraparesia,
monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia, triplegia, triparesia,
hemiplegia, hemiparesia, amputação ou ausência de membro, paralisia
cerebral, membros com deformidade congênita ou adquirida, exceto as
deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o
desempenho de funções;
II - deficiência auditiva - perda parcial ou total das possibilidades
auditivas sonoras, variando de graus e níveis na forma seguinte:
a) de 25 a 40 decibéis (DB) - surdez leve;
b) de 41 a 55 DB - surdez moderada;
c) de 56 a 70 DB - surdez acentuada;
d) de 71 a 90 DB - surdez severa;
e) acima de 91 DB - surdez profunda; e f) anacusia;
III - deficiência visual - acuidade visual igual ou menor que 20/200 no
melhor olho, após a melhor correção, ou campo visual inferior a 20º
(tabela de Snellen), ou ocorrência simultânea de ambas as situações;
IV - deficiência mental - funcionamento intelectual significativamente
inferior à média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações
associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como:
a) comunicação;
b) cuidado pessoal;
c) habilidades sociais;
d) utilização da comunidade;
e) saúde e segurança;
f) habilidades acadêmicas;
g) lazer; e
h) trabalho;
V - deficiência múltipla - associação de duas ou mais deficiências”.
Ragazzi (2008, p. 7885) ainda descreve que:
57
Ao auditor fiscal incumbe a tarefa de fiscalizar o cumprimento do referido
termo. Em não cumprido, deverá encaminhar relatório ao delegado
regional do trabalho para remessa ao Ministério Publico do Trabalho e
esse passará a um processo investigatório, no que a empresa é
convidada a firmar termo de ajuste de conduta com prazo razoável de 1
(um) a 2 (dois), anos para cumprimento de preenchimento de vagas sob
pena de multa que será revertida ao fundo de amparo ao trabalhador,
fundo este previsto na Lei nº 7.853/89.
Na atualidade, no caso da inserção laboral das PCDs, a política de ações
afirmativas se materializa por meio da Lei de Cotas, que desde 1991 faz parte de
nosso arcabouço legal. No entanto, somente com a implementação da norma
regulamentadora em 1999, pelo Decreto nº 3.298 (BRASIL, 1999), passou a ser
instituído um forte instrumento de fiscalização para aplicação dessa lei, que vem
ampliando espaços para a valorização profissional das PCDs.
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (BRASIL, 2010) traz
elementos importantes para se pensar a inclusão produtiva das PCDs.
1. Os Estados-Partes reconhecem o direito das pessoas com deficiência
ao trabalho, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.
Esse direito abrange o direito à oportunidade de se manter com um
trabalho de sua livre escolha ou aceitação no mercado laboral, em
ambiente de trabalho que seja aberto, inclusivo e acessível a pessoas
com deficiência. Os Estados-Partes salvaguardarão e promoverão a
realização do direito ao trabalho, inclusive daqueles que tiverem
adquirido uma deficiência no emprego, adotando medidas apropriadas,
incluídas na legislação, com o fim de, entre outros:
a) Proibir a discriminação baseada na deficiência com respeito a todas
as questões relacionadas com as formas de emprego, inclusive
condições de recrutamento, contratação e admissão, permanência no
emprego, ascensão profissional e condições seguras e salubres de
trabalho;
b) Proteger os direitos das pessoas com deficiência, em condições de
igualdade com as demais pessoas, às condições justas e favoráveis de
trabalho, incluindo iguais oportunidades e igual remuneração por
trabalho de igual valor, condições seguras e salubres de trabalho, além
de reparação de injustiças e proteção contra o assédio no trabalho;
c) Assegurar que as pessoas com deficiência possam exercer seus
direitos trabalhistas e sindicais, em condições de igualdade com as
demais pessoas;
d) Possibilitar às pessoas com deficiência o acesso efetivo a programas
de orientação técnica e profissional e a serviços de colocação no
trabalho e de treinamento profissional e continuado;
e) Promover oportunidades de emprego e ascensão profissional para
pessoas com deficiência no mercado de trabalho, bem como assistência
na procura, obtenção e manutenção do emprego e no retorno ao
emprego;
(f) Promover oportunidades de trabalho autônomo, empreendedorismo,
desenvolvimento de cooperativas e estabelecimento de negócio próprio;
g) Empregar pessoas com deficiência no setor público;
58
h) Promover o emprego de pessoas com deficiência no setor privado,
mediante políticas e medidas apropriadas, que poderão incluir
programas de ação afirmativa, incentivos e outras medidas;
i) Assegurar que adaptações razoáveis sejam feitas para pessoas com
deficiência no local de trabalho;
j) Promover a aquisição de experiência de trabalho por pessoas com
deficiência no mercado aberto de trabalho;
k) Promover reabilitação profissional, manutenção do emprego e
programas de retorno ao trabalho para pessoas com deficiência.
2. Os Estados-Partes assegurarão que as pessoas com deficiência não
serão mantidas em escravidão ou servidão e que serão protegidas, em
igualdade de condições com as demais pessoas, contra o trabalho
forçado ou compulsório (BRASIL, 2010, p. 37).
Para a construção do conceito de inclusão produtiva, devem-se considerar pontos
relevantes na convenção, destacados não como privilégios, mas afirmação e
proteção de direito ao trabalho para a melhoria da qualidade de vida das PCDs.
A Convenção reconhece o direito em igualdade de oportunidades das PCDs ao
trabalho. Isso quer dizer trabalhos em ambiente aberto inclusivo e acessível
levando-se em consideração a não discriminação, a permanência no emprego, a
ascensão profissional, as condições seguras e salubres de trabalho com seus
direitos trabalhistas e sindicais em condições de igualdade com as demais
pessoas em remuneração com trabalhos de igual valor.
Ainda destaca a reparação de injustiças e proteção contra o assédio no trabalho,
a possibilidade de acesso a programas de orientação técnica e profissional e
serviços de colocação no trabalho, treinamento profissional e continuado. Ainda
referencia a promoção do emprego no setor público e privado, incluindo
programas de ação afirmativa de incentivos, aquisição de experiência de trabalho
no mercado aberto bem como o trabalho autônomo, empreendedorismo,
desenvolvimento de cooperativas e estabelecimento de negócio próprio.
Confirma-se, assim, que as PCDs não serão mantidas em escravidão ou servidão
e serão, portanto, protegidas contra o trabalho forçado.
O trabalho em uma sociedade capitalista define a condição humana e coloca a
pessoa no bojo das representações sociais, definindo o papel e a posição do
sujeito nas relações de produção, nas relações sociais e na sociedade.
59
A imagem social das PCDs frente à sociedade passa por uma ressignificação,
uma vez que eram consideradas pessoas improdutivas ou eram tuteladas em
suas capacidades de escolhas, autossustento e participação, como ressalta
Lopes (2005, p. 117):
Antes de se pensar no porquê de as empresas contratarem ou deixarem
de contratar pessoas com deficiência, deve-se perceber que a questão é
muito mais profunda, passando pela consciência das pessoas, que, na
maioria das vezes, não tem uma postura inclusiva, não pensam o
ambiente e as relações interpessoais com essa preocupação. A questão
é muito mais ampla: existem barreiras invisíveis, de atitude, que fazem
com que as pessoas com deficiências fiquem à margem de diversas
coisas na sociedade, inclusive do mundo do trabalho. Espanta-me o
quanto a gente não percebe a grandiosidade disso tudo.
Com o movimento da inclusão, novos conceitos são internalizados, dentro de um
novo paradigma. Nessa perspectiva, a ideia de inclusão adota a diversidade como
valor humano nas relações sociais, propiciando a criação de oportunidades iguais
e respeito à dignidade como parte integrante da promoção da cidadania e dos
direitos humanos, assim como a não discriminação, independentemente das
características biológicas, culturais ou sociais do indivíduo.
2.6 Quem são as pessoas com deficiência no mercado de trabalho brasileiro
Considerando que dados mais desagregados do Censo de 2010 ainda não foram
divulgados, constata-se - pelos resultados do censo do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) de 2000 - que no Brasil aproximadamente 24,5
milhões de pessoas ou 14,5% da população total apresentam algum tipo de
incapacidade ou deficiência (CLEMENTE, 2004). São pessoas com alguma
dificuldade de enxergar, ouvir, locomover-se, entender o outro ou se expressar,
isto é, com determinada condição física ou mental. Nesse grupo, 16,6 milhões de
pessoas apresentam algum grau de deficiência visual, sendo que quase 150 mil
declararam-se cegos. No que se refere ao grau de deficiência auditiva, foram
encontrados 5,7 milhões de brasileiros. Dentre esses, 170 mil eram surdos.
Nos dados do IBGE, destaca-se que a proporção de PCD aumenta com a idade,
passando de 4,3% nas crianças até 14 anos para 54% do total das pessoas com
60
idade superior a 65 anos. À medida que a população se torna mais envelhecida, a
proporção de PCDs aumenta, surgindo um novo elenco de demandas para
atender às necessidades específicas desse grupo.
Os três dados registrados no censo de 2000 (IBGE) demonstram alguns aspectos
relevantes que podem compor a análise dessa temática. No aspecto de relações
de gênero, homens predominam em relação à deficiência mental, auditiva, física
(especialmente com falta de membro ou parte dele). O resultado mostrou-se
compatível com o tipo de atividade desenvolvida por sujeitos masculinos e com os
riscos de exposição a acidentes de diversas causas.
Além disso, a predominância das mulheres com limitações motoras (incapacidade
de caminhar ou subir escadas) ou visuais é coerente com a composição por sexo
da população idosa, com predomínio de mulheres a partir dos 60 anos.
O conceito utilizado pelo censo para caracterizar as PCDs inclui diversos graus de
gravidade na capacidade de enxergar, ouvir e locomover-se, mostrando-se
compatível com a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e
Saúde (CIF), divulgada em 2001 pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
Em relação à inserção das PCDs no mercado de trabalho, verifica-se proporção
menor de pessoas ocupadas em relação ao número de PCDs. Segundo Batista
(2004, p. 111), a atual conjuntura configura-se da seguinte forma:
No Brasil, segundo o censo realizado em 2000 pelo IBGE, existem 24,5
milhões de brasileiros portadores de algum tipo de deficiência; isto
significa que 14,5% da população brasileira apresentam alguma
deficiência física, mental ou dificuldade de enxergar, ouvir ou locomoverse. Em Minas Gerais são cerca de 2,6 milhões de PPD correspondendo
ao mesmo percentual de 14,5% da população. Os dados do censo
mostram também que, no total de casos declarados de PPD, 8,3%
possuem deficiência mental; 4,1% deficiência física; 22,9% deficiência
motora; 48,1% visual e 16,7% auditiva. Entre 16,5 milhões de pessoas
com deficiência visual, 159.824 são incapazes de enxergar, e, entre os
5,7 milhões de brasileiros com deficiência auditiva, 176.067 não ouvem.
Segundo dados divulgados pelo Instituto Ethos (2002), nove milhões de
pessoas com deficiência estão em idade de trabalhar. E desses, um
milhão (11,1%) exercem alguma atividade remunerada e 200 mil (2,2%)
são empregados com registro em carteira de trabalho.
61
Esses dados são revelados 10 anos depois da lei de reserva de cotas, o
que demonstra número relativamente baixo de pessoas contratadas,
apesar da exigência legal. A presente pesquisa confirma o número
proporcionalmente pequeno de PPD empregado nas empresas e ainda
certo desconhecimento por parte do empresariado da legislação
pertinente à reserva de cotas.
Os dados do Censo de 2000, para ocupação econômica de PCD, diferem dos
apurados pelo Instituto Ethos em 2002, mas mostram que, entre os diferentes
tipos de deficiência, a pessoa com deficiência mental é a que encontra mais
dificuldades de inserção no mercado de trabalho.
Segundo Clemente (2003, p. 41), pelos dados do censo do IBGE de 2000, “o tipo
de deficiência que mais dificulta a inserção no mercado de trabalho é a mental:
somente 19,3% das pessoas que apresentam esse tipo de deficiência estão
ocupadas”.
Esse dado, apesar de ser uma taxa baixa, assinala equívocos produzidos pelo
senso comum quanto à compreensão da competência e da capacidade
profissional no que se refere à condição de aprender e desenvolver atividades
produtivas, mesmo no caso de pessoa com deficiência mental.
Registra-se taxa mais alta de inserção no mercado de trabalho de pessoas com
outros tipos de deficiência física ou motora (24,1%), dificuldade na audição
(34,0%) e dificuldade para enxergar (40,8%). Por sua vez, para quem não
apresenta alguma dessas deficiências, a proporção das pessoas ocupadas sobe
para 49,9%.
Dessa forma, é indispensável inventar, criar espaços de discussão e ferramentas
e novos processos, uma vez que, conforme Paulo Freire (1996), os seres
humanos apresentam essa possibilidade de serem cocriadores, a qual os libera
de serem meros executores das programações sociais e de ficar subordinados a
metodologias
bancárias.
E
somos,
sobretudo,
capazes de criar novas
metodologias, não só para o ensino, mas no conjunto da vida social.
62
No campo do trabalho, portanto, as leis de cotas tornam-se uma forma de
enfrentar e superar as dificuldades de inserção produtiva, passando a cumprir o
papel de conscientizar e promover o acesso à inclusão produtiva como medida de
proteção, promoção e acesso à equiparação de oportunidades.
Outra consideração importante a se fazer é sobre a inclusão social que
representa tema central na pauta da gestão social e na formulação das políticas
sociais. O processo democrático pelo qual o país passou viabilizou a formulação
de programas e propostas de promoção dos direitos humanos, de superação das
desigualdades, da eliminação da discriminação e da promoção de melhores
oportunidades para todos.
Nesse aspecto, destacam-se as habilidades práticas dos movimentos sociais para
criar espaços de articulação, participação e diálogo, para acordar estratégias que
visem efetivar políticas de inclusão, criando, para isso, processos democráticos
de participação e avaliação frente aos desafios postos.
Seguindo esse pensamento, pode-se recorrer a Avritzer (2010) para melhor
compreender que a teoria democrática deliberativa considera que a valorização
dos processos de decisão coletiva possibilita diferentes reflexões e debates e,
consequentemente, aumenta a qualidade das decisões.
As chamadas leis de cotas para o mercado de trabalho, instituídas em diversos
países (GARCIA, 2010), correspondem a uma forma de induzir a superação das
dificuldades de inserção produtiva como medida de proteção e promoção de
oportunidades. Dessa maneira, as ações afirmativas são implementadas para
cumprir papel na inclusão social.
A Lei nº 8.213/1991 (BRASIL, 1991a) prevê a contratação de PCDs e
beneficiários reabilitados no mercado de trabalho e estabelece a contratação de
PCDs pelas empresas por cotas, isto é, conforme o número de trabalhadores que
possuem. Assim, empresas que possuem 100 a 200 empregados devem
contratar 2% de PCDs; 201 a 500 empregados, 3%; entre 501 e 1.000 devem
63
contratar 4%; e aquelas que possuem mais de 1.000 empregados devem
contratar 5%.
Essa lei ficou conhecida como Lei de Cotas e está em vigor há cerca de 20 anos.
Entretanto, apenas em 1999, por meio do Decreto nº 3.298/1999, ela foi
regulamentada. Tempo, a nosso ver, suficiente para que as empresas se
estruturassem para cumprir tal determinação.
Não obstante, apesar de todo esse período, ainda existem PCDs que desejam
trabalhar e não são contratadas. Ainda existem muitas empresas que não
cumprem a obrigação legal, conforme pode ser visto nos dados de 2009 da TAB.
1, referente ao Brasil, e da TAB. 2, a Minas Gerais.
Conforme observado na TAB. 1, pela análise da relação entre os pressupostos
legais e os dados da realidade referentes ao ano de 2009 e fornecidos pelos
auditores fiscais do Ministério do Trabalho, verifica-se que a inclusão produtiva
das PCDs no Brasil mostra-se aquém do previsto na lei. Menos de 40% dos
vínculos de emprego que seriam esperados pelas cotas estavam preenchidos em
2009 e, de modo surpreendente, o grau de cumprimento da exigência legal era
relativamente mais alto nas menores empresas. Nas “empresas públicas e
sociedades de economista mista” com 100 a 200 empregados e de 201 a 500
empregados, constatam-se os mais altos níveis de proporção de cumprimento da
lei – de 77,69% no primeiro caso e de 71,73%, no segundo caso.
Também as “demais empresas”, categoria que inclui todas as empresas
formalizadas do setor privado, as menores (de 100 a 200 e de 201 a 500
empregados) apresentavam mais altos indicadores de cumprimento da lei em
relação às suas congêneres maiores.
Como se pode observar, as empresas que possuem maior potencial de ocupação
das PCDs são as que apresentam mais baixo índice de desempenho quanto a
essas prerrogativas legais.
64
TABELA 1 - Número de empregados com deficiência declarados e esperados pela
Lei de Cotas segundo tamanho e natureza de empresas - Brasil, 2009
Tipo de natureza jurídica
da empresa
Administração pública
(1)
Empr. públ. e soc.ec.mista
(2)
Demais empresas
Nº. de
N.º de trab.
Diferença
Proporção
trabalhadores com defic.
Total de
para
de
com
(aplicado o
vínculos
alcançar a cumprimento
deficiência
percentual
cota legal
da Lei
(declarados)
legal)
Empresas com 100 a 200 empregados
274.768
1.854
------77,69%
52.127
810
1.043
233
51,07%
2.834.136
28.946
56.683
27.737
Administração pública
Empr. públ. e soc.ec.mista
Demais empresas
980.724
94.618
3.592.722
Empresas com 201 a 500 empregados
4.185
----2.036
2.839
803
53.506
107.782
54.276
--71,73%
49,64%
Administração pública
Empr. públ. e soc.ec.mista
Demais empresas
1.170.713
88.025
2.285.445
Empresas com 501 a 1.000 empregados
4.000
----1.216
3.521
2.305
38.502
91.418
52.916
--34,54%
42,12%
Empresas com mais de 1.001 empregados
Administração pública
Empr. públ. e soc.ec.mista
Demais empresas
6.624.663
266.682
4.253.257
15.934
3.886
64.407
--13.334
212.663
--9.448
148.256
Totais (empresas com 100 ou mais empregados)
Administração pública
9.050.868
25.973
----Empr. públ.e soc.ec.mista
501.452
7.948
20.736
12.788
Demais empresas
12.965.560
185.361
468.545
283.184
Empresas sem adm. públ.
13.467.012
193.309
489.281
295.972
Total Geral
22.517.880
219.282
----Fonte: Brasil (2011d).
Obs.: (1) - Empresa Pública e Sociedade de Economia Mista
(2) - Empresas com demais tipos de natureza jurídica
--29,14%
30,29%
--38,33%
39,56%
39,51%
---
Assim, uma questão que surge, mas que não será investigada neste estudo,
seria: por que as empresas com mais capacidade de gerar empregos
demonstram reduzidos níveis de inclusão produtiva para as PCDs?
Examinando a TAB. 2, também se constata o baixo cumprimento da lei em Minas
Gerais, com taxas semelhantes às do Brasil. No conjunto das empresas com
estabelecimentos em Minas Gerais, verifica-se o cumprimento de 38,57% das
vagas esperadas pela lei, em comparação com a taxa de 39,51% no Brasil.
65
TABELA 2 - Número de empregados com deficiência declarados e esperados
pela Lei de Cotas, segundo tamanho e natureza de empresas Minas Gerais - 2009
Tipo de natureza jurídica
da empresa
Total de
vínculos
Nº. de
Nº. de trab.
trabalhadores
com defic.
Diferença
Proporção
com
(aplicado o
para
de
deficiência
percentual
alcançar a cumprimento
(declarados)
legal)
cota legal
da Lei
Empresas com 100 a 200 empregados
221
------32,00%
21
66
45
46,83%
2.605
5.563
2.958
Administração pública
(1)
Empr. públ. e soc.ec.mista
(2)
Demais empresas
37.396
3.281
278.126
Administração pública
Empr. públ. e soc.ec.mista
Demais empresas
157.235
7.109
351.689
Empresas com 201 a 500 empregados
520
----134
213
79
4.877
10.551
5.674
--62,83%
46,22%
Administração pública
Empr. públ.e soc.ec.mista
Demais empresas
112.461
6.717
224.105
Empresas com 501 a 1.000 empregados
632
----133
269
136
3.863
8.964
5.101
--49,50%
43,09%
Administração pública
Empr. públ.e soc.ec.mista
Demais empresas
611.720
31.505
377.887
Empresas com mais de 1.001 empregados
1.095
----381
1.575
1.194
5.766
18.894
13.128
--24,19%
30,52%
Totais (empresas com 100 ou mais empregados)
Administração pública
918.812
2.468
----Empr. públ.e soc.ec.mista
48.612
669
2.123
1.454
Demais empresas
1.231.807
17.111
43.972
26.861
Empresas sem adm. Públ.
1.280.419
17.780
46.095
28.315
Total Geral
2.199.231
20.248
----Fonte: Brasil (2011d).
Obs.: (1) - Empresa Pública e Sociedade de Economia Mista
2) - Empresas com demais tipos de natureza jurídica.
--31,51%
38,91%
38,57%
---
Da mesma forma, em Minas Gerais o cumprimento da lei tende a ser mais
expressivo nas menores empresas, ainda que as “empresas públicas e
sociedades de economia mista” com número de empregados entre 200 e 500
apresentem alta proporção de cumprimento da lei - 62,83%. Quando tais
empresas têm entre 100 e 200 trabalhadores, a proporção de cumprimento cai,
consideravelmente, para 24,19%.
Desse modo, pode-se concluir que o cumprimento da Lei de Cotas se apresenta
distante da realidade, conforme dados pesquisados aqui citados. Mas, por outro
66
lado, em 2009, quase 220 mil PCDs no Brasil e 20 mil em Minas Gerais se
encontravam empregadas, assalariadas, com carteira assinada ou funcionárias
públicas estatutárias (que é o universo pesquisado pela Relação Anual de
Informações Sociais – RAIS do Ministério do Trabalho e Emprego (MET), fonte
dos dados das TAB. 1 e 2).
Desde a entrada da legislação em vigência, muitas foram as tentativas de burlar
ou revogar a Lei. Entretanto, órgãos internacionais e nacionais estão atentos e
tomando as medidas necessárias para que essa lei seja cumprida.
A matéria “multas por cota crescem seis vezes em cinco anos”, publicado no dia 5
de março de 2008 no Jornal Valor Econômico, enfatiza que:
A legislação determina a contratação entre 2% e 5% de portadores de
deficiência no quadro das empresas com mais de 100 funcionários –
acima de 500, o percentual é de 5% dos empregados. A multa, calculada
de acordo com o número de deficientes não contratados, varia de R$
1.195,13 a R$ 119.512,33. Apesar de a lei existir há mais de 10 anos, o
rigor do Ministério na fiscalização da norma é mais recente – em 2006,
foram 606 multas, 420 a mais do que em 2005. Porém, estes números
são bem maiores, já que nem todas as empresas são fiscalizadas pelo
Ministério, bem como nem todas as multas são reportadas ao órgão
(JORNAL VALOR ECONÔMICO, 2008).
Muito se tem debatido a respeito e até mesmo rebatido, no sentido de alterar a
referida legislação. Em 2008, o Instituto Euvaldo Lodi (IEL), instituição integrante
do Sistema FIEMG, concluiu estudo buscando contribuir para o aprimoramento da
Lei 8.213/91.
Nela, explicita a necessidade de adequações na legislação e apresenta propostas
de revisão dos percentuais de cotas por ela estabelecidos; alteração do conceito
de PCDs, de forma a ampliar o número de trabalhadores potenciais; inclusão do
trabalhador aprendiz na cota legal (o que, na prática, já vem ocorrendo),
assegurando-se a preferência de contratação daqueles que se destacarem;
estabelecimento de critérios de regionalização para facilitar a contratação nas
proximidades das empresas; mapeamento de risco em áreas nas quais a
contratação de PCD não é recomendada, utilizando-se metodologia do próprio
Ministério do Trabalho; manutenção dos dispositivos incluídos em projeto de lei de
67
autoria do Senador José Sarney, especialmente nos aspectos ligados à
terceirização, programas de profissionalização e contratação das chamadas
oficinas protegidas. Esse estudo foi publicado no Jornal Estado de Minas, em 7 de
fevereiro de 2008, indicando a intenção da FIEMG de convencer a sociedade para
revisão ou ajuste da lei (ESTADO DE MINAS, 2008).
Para evitar-se que a inclusão de PCD por meio do trabalho dependa exclusiva ou
principalmente da vigência da Lei de Cotas e de sua correta interpretação e
implementação é que se faz necessário apoiar a organização e mobilização da
sociedade, inclusive em fórum de gestão social, em defesa da inclusão produtiva
das PCDs.
68
3 METODOLOGIA
A construção teórico-prática profissional do serviço social na qual a autora está
inserida possibilitou aproximação e participação junto aos movimentos sociais na
luta por garantia de direitos de diversos grupos vulneráveis (pessoas com
deficiência, crianças e adolescentes, idosos e mulheres da periferia e
comunidades tradicionais e minorias raciais).
Esse processo compartilhado nos últimos 15 anos produziu inquietações e
questionamentos em relação ao poder, às divergências entre os diversos sujeitos,
grupos e setores, às variadas formas de gestão de programas sociais, muitas
vezes não democráticas, as quais conduziram à opção por esta pesquisa e sua
elaboração, a partir de 2010.
Alguns fatores também influenciaram esta investigação, destacando-se o fato de
a pesquisadora conhecer alguns sujeitos e ter sido membro participante ativo do
FPT desde a sua criação. Esse aspecto facilitou a solicitação do licenciamento
para a execução deste trabalho acadêmico, bem como o acesso aos
entrevistados e ao acervo de documento para a escolha do objeto de pesquisa.
Vale lembrar que esta pesquisa tem como objetivo geral tentar conhecer e
explicar, na perspectiva dos direitos humanos e do conceito de inclusão produtiva,
os limites e possibilidades da atuação de um fórum de gestão social dedicado a
subsidiar e promover o emprego de PCD. Recorrendo ao que se pretende
compreender neste estudo, objetiva-se a verificação dos limites e possibilidades
de atuação de um fórum de gestão social dedicado a subsidiar e promover o
emprego de PCD, no intuito de gerar intervenções pertinentes, do ponto de vista
da área de saberes associados à gestão social.
Para avançar no conhecimento do funcionamento do FPT, a pesquisadora elegeu,
como orientação básica, o paradigma de pesquisa qualitativa, que Oliveira (2010,
p.80) caracteriza como um estudo detalhado de determinado grupo social,
69
colhendo informações para se entender a “profundidade, o significado e as
características” do assunto pesquisado.
A metodologia qualitativa tem contribuído para a compreensão de diversos
fenômenos sociais. Portanto, acredita-se que nesta pesquisa científica tal relação
de aproximação com os sujeitos foi utilizada como importante instrumento para a
coleta de dados fidedignos.
Para isso, buscou-se conhecer o universo pesquisado com o levantamento de
dados realizado em três etapas, da seguinte forma: a primeira diz respeito à
observação participante não estruturada; a segunda à pesquisa documental; e na
terceira foi utilizado outro procedimento metodológico, recorrendo-se à pesquisa
qualitativa por meio da entrevista semiestruturada.
Essa escolha se deu a partir de experiências compartilhadas e da importância de
se verificar os fatos além das aparências e, sobretudo, para estabelecer relação
direta de acompanhamento em ambiente formal e informal, mantendo um diálogo
com
o
fórum,
local
privilegiado
de
participação
das
entidades
no
acompanhamento das políticas afirmativas voltadas para as PCDs.
A pesquisa foi submetida ao Comitê de Ética da UNA e contou também com a
autorização do coordenador do FPT, que é responsável pela gestão atual e
representa uma ONG que trabalha com a defesa de direitos das PCDs.
Ao discorrer sobre o estudo de determinado fenômeno, entende-se a necessidade
de se aprofundar em áreas desconhecidas do saber. Segundo Lakatos e Marconi
(1996, p. 16), a finalidade da pesquisa é realmente “descobrir respostas para
questões mediante a aplicação de métodos científicos”. No panorama
metodológico, Lakatos e Marconi (1996) retratam que o levantamento de dados é
considerado o primeiro passo de qualquer pesquisa científica.
As observações visam buscar os fundamentos na análise do meio onde vivem os
atores sociais, uma vez que, em pesquisas qualitativas, os dados não podem ser
considerados fatos isolados, observados desde que estejam relacionados ao
70
âmbito em suas múltiplas relações. O observador, em vários momentos, foi parte
integrante do grupo. “A técnica da observação participante realiza-se através do
contato direto do pesquisador com o fenômeno observado, a fim de obter
informações sobre a realidade dos atores sociais em seu próprio contexto”
(OLIVEIRA, 2010, p. 80).
Na observação participante não estruturada, a pesquisadora compareceu a duas
reuniões plenárias do FPT no ano de 2011, sendo a primeira para observação no
sentido de ter mais aproximação com a dinâmica de funcionamento. Na segunda
aproximação foi comunicada em plenária aos seus membros a intenção desta
pesquisadora de realizar o estudo, assim como do seu afastamento do FPT
durante o período da pesquisa.
As primeiras impressões desses contatos diagnosticaram certa tensão entre os
membros, entendendo-se que havia uma “crise instalada”. Posteriormente soubese do desligamento da secretária executiva do referido fórum.
Quanto à pesquisa documental, esta representa “fonte de coleta de dados restrita
a documentos escritos ou não, constituindo o que se denomina de fontes
primárias” (LAKATOS; MARCONI, 1996, p. 57).
Ainda se pode afirmar que a pesquisa documental caracteriza-se pela busca de
informações de documentos que não receberam algum tratamento científico,
como relatórios, reportagens de jornais, revistas, cartas, filmes, gravações,
fotografias, entre outras matérias de divulgação (LAKATOS; MARCONI, 1996, p.
69).
3.1 Etapas do desenvolvimento da pesquisa
Na análise documental foram verificadas atas, regimento interno, listas de
presenças, entre outros documentos que constituem a organização do FPT. Essa
documentação ainda não foi analisada de maneira científica, assim como a
atuação do FPT.
71
As atas foram examinadas pelo software nomeado Atlas-TI, que possibilita
identificar elementos nos documentos por meio de codificação, executando a
análise das falas e trechos desses documentos, realizando o cruzamento de
diversas variáveis. O número de atas produzidas subsidiou informações acerca da
organização e do número de plenárias realizadas por meio do cruzamento da
quantidade de atas/ano que se encontram arquivadas.
A opção pelo período 2007, 2008, 2009 evidenciou-se por representar um período
marcado por elevado número de produção de atas e constância nas reuniões, que
poderão ser visualizadas por meio do GRÁF. 1:
GRÁFICO 1 - Número de atas localizadas do FPT - Belo Horizonte - 2000-2010
12
10
8
6
4
2
0
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
Fonte: Fórum de articulação para promoção do emprego de PCD – Elaborado pela autora.
Diante disso, foi feita a análise documental das atas das reuniões plenárias do
fórum dos anos de 2008 a 2010, período em que se encontrou mais alto número
de documentos (GRÁF. 1). Vale ressaltar que estão previstas 10 reuniões
plenárias por ano no regimento do fórum, sendo que todas deveriam resultar em
elaboração de ata.
Avritzer (2009, p. 271-272), que utilizou metodologia semelhante à deste estudo,
destaca que:
72
Na análise documental, as atas das reuniões têm se apresentado como
um importante recurso e fonte de dados. Por serem documentos que
registram os atos de fala e os discursos políticos produzidos pelos atores
no processo deliberativo, que sinalizam posições políticas, conflitos,
consensos e propostas, as atas permitem analisar o processo
argumentativo, central na teoria deliberativa. [...] Em relação às atas,
uma fonte secundária dentro da análise documental, um dos grandes
problemas é a incerteza sobre a abrangência de seu conteúdo, que pode
muitas vezes não documentar acontecimentos, discussões e ideias que
surgem no momento das reuniões. [...] Além disso, elas são documentos
oficiais que registram o processo de deliberação e são devidamente
aprovadas pelos seus participantes, o que indica que eles concordam
com o registro e a forma como foi realizado.
As atas possuem formato resumido, apresentando registro pouco detalhado. As
mesmas foram analisadas por um software denominado Atlas-TI, que permite a
análise de documentos por meio da codificação que permite análise de tipos de
participação e de temas das falas (AVRITZER, 2009).
Essa metodologia torna possível que se faça:
A análise das atas é baseada numa leitura qualitativa da fala de cada
ator e codificação das mesmas. [...] Para processamento qualitativo dos
dados e codificação, utilizamos um programa de análise qualitativa:
Atlas.TI, versão 5.0, que nos auxilia na produção de relatórios
estatísticos dos dados. [...] A técnica para o exame dos documentos
fundamenta-se na análise de conteúdo, com ênfase na análise temática,
que tem por objetivo descobrir os temas que compõem uma
comunicação, cuja presença (ou ausência) e frequência de determinado
conteúdo significam alguma coisa para os objetivos analíticos visados
(AVRITZER, 2009, p. 271-272).
A análise específica das atas da entidade investigada teve como objetivo buscar
identificar aspectos que possam ou não se relacionar às características da gestão
social. Dessa maneira, analisaram-se os seguintes componentes:

A forma de participação dos sujeitos nas plenárias, por meio de sua
capacidade de vocalização;

a capacidade de proposição do fórum;

as decisões;

os assuntos e temática encaminhados pelo fórum.
Após as autorizações, as entrevistas foram agendadas por telefone - uma
entrevista diária -, gravadas e realizadas na primeira quinzena de janeiro de 2012.
73
Apenas uma entrevistada faltou à marcação agendada, havendo necessidade de
ser remarcada, o que aconteceu com sucesso.
Os sujeitos da investigação proposta são membros assíduos que compõem o
Fórum Pró-Trabalho das Pessoas com Deficiência e Reabilitadas. A entrevista foi
uma alternativa para complementar os aspectos que porventura não ficaram
explícitos na análise documental.
Foi verificado o número de participantes ativos, entre os quais seis pessoas foram
ouvidas. Considerando o interesse pelo estudo e também as condições de acesso
e disponibilidade dos entrevistados, optou-se também por ouvir uma pessoa que
já participou e hoje não mais participa, para se aproximar ao máximo do princípio
da saturação.
Os grupos foram assim dispostos:
2 gestores de ONGs
2 gestores de empresas ou instituições públicas
2 gestores de empresa privadas
1 pessoa que participou e não mais participa
Os dados foram coletados por meio de entrevista semiestruturada. Triviños (1995,
p.
146
apud
GONÇALVES,
2005, p. 72) descreve
que
a
entrevista
semiestruturada é direcionada para a pesquisa qualitativa, já que, “ao mesmo
tempo em que valoriza a presença do investigador, oferece todas as perspectivas
possíveis para que o informante alcance a liberdade e a espontaneidade
necessárias, enriquecendo a investigação”.
A entrevista semiestruturada pode ser entendida como:
[...] aquela que parte de certos questionamentos básicos apoiados em
teorias e hipóteses, que interessam à pesquisa, e que, em seguida,
oferecem amplo campo de interrogativas, fruto de novas hipóteses que
vão surgindo à medida que se recebem as respostas dos informantes.
Dessa maneira, o informante, seguindo espontaneamente a linha de seu
pensamento e de suas experiências dentro do foco principal colocado
pelo investigador, começa a participar na elaboração do conteúdo da
pesquisa (TRIVIÑOS, 1995, p. 146, apud GONÇALVES, 2005, p. 72).
74
Além disso, a entrevista permitiu o aprofundamento do tema pesquisado
oferecendo mais subsídios para entender-se o problema investigado.
3.2 Cenário da investigação
O campo pesquisado, o Fórum Pró-Trabalho das Pessoas com Deficiência e
Reabilitadas (FPT), criado em abril de 2000 como órgão consultivo e deliberativo
em suas plenárias, não governamental, organizado em comissões, de acordo com
o seu regimento interno, tem atuação na região metropolitana de Belo Horizonte.
De 2000 até os dias de hoje, constituiu-se o percurso histórico do fórum,
gerenciado por cinco gestões de mesa diretora alternada entre o poder público e
a sociedade civil, com fases e momentos mais ou menos dinâmicos e
organizados.
O FPT representa toda a sociedade por meio da mesa diretora, que tem na sua
formação a paridade de duas entidades governamentais e duas não
governamentais.
A mesa é composta de um coordenador, um secretário geral, um primeiro
secretário, um segundo secretário e um conselheiro consultivo, todos votados e
eleitos, em plenária extraordinária, pelos seus integrantes.
Sua estrutura organizacional se estrutura em plenária, mesa diretora, comissões
temáticas, secretaria executiva e instituições participantes. Atualmente, possui 44
entidades parceiras permanentes, com presença oscilante nas plenárias.
Essa lógica de organização se complementa à sistematização e funcionamento
do FPT, a qual se concretiza por meio das comissões de comunicação, legislação
e produção científica. Cada comissão atua de forma autônoma, trazendo
discussões e ações para serem implantadas pelo FPT junto à sociedade e seus
parceiros. Essas comissões constituem uma maneira de estruturar seu
funcionamento, segundo suas atribuições e competências.
75
Neste estudo não se tem como foco a análise de cada gestão e suas realizações,
por ausência de disponibilização de documentos referenciais. Entretanto, os
materiais viabilizados permitiram correlacionar objetivos e ações.
Tais ações foram: seminário com o objetivo de destacar a inclusão produtiva do
deficiente mental, planejamento estratégico, criação do GT específico para pensar
o Projeto Rede de Inclusão, o Termo de Ajustamento de Conduta com o Ministério
Público do Trabalho, Jornal Núcleo “Fala Fórum”, relatório de realização de
gestão, código de conduta, que norteará o funcionamento da rede de inclusão,
como também o manifesto para a sociedade sobre a questão da inclusão no
mercado de trabalho distribuído na II Conferência Estadual dos Direitos das
PCDs.
Todo esse arcabouço documental produzido durante seus 12 anos de
funcionamento, em um locus específico que contém um conjunto de realizações,
resulta de um campo de mediação que permitiu a gestão compartilhada dessa
temática. Desse constructo, identificaram-se conquistas, avanços e caminhos
pavimentados de várias densidades. Pode-se confirmar que alguns atributos
foram imputados ao FPT, os quais demonstram a transparência, mobilização,
comunicação,
interação,
estratégias,
aprendizagem,
participação,
inter-
relacionamento do poder público com a sociedade civil, de interorganizações, sem
perder de vista a identidade de seu regimento, documento balizador do FPT.
Quanto à situação financeira, o Fórum não apresenta recursos sistemáticos, a
não ser a multa destinada às ações pontuais para custear a rede de inclusão e
material de escritório para subsidiar-se administrativamente.
Administrativamente, a Superintendência Regional do Trabalho (SRTE) oferece
algum suporte administrativo, de acordo com a necessidade das ações realizadas
de maneira não sistemática.
Seu objeto concorre na articulação de entidades e órgãos com a finalidade de
organização do ideário de diretrizes para a implantação de estratégias de inclusão
76
da PCD no mercado de trabalho, respeitadas as competências e as atribuições
legais dos participantes.
O FPT possui a missão de contribuir para a redefinição de políticas públicas que
garantam à pessoa com deficiência ou reabilitada a função de ser ator social
produtivo.
77
4 A INCLUSÃO PRODUTIVA E A GESTÃO SOCIAL NO FPT: O
QUE DIZEM OS DOCUMENTOS E OS ENTREVISTADOS
4.1 O que diz o Regimento
Em contato com os diversos documentos produzidos pelo FPT, optou-se em criar
um gráfico da linha do tempo no qual se relacionam datas dos acontecimentos
marcantes e principais realizações, desde a sua criação até os dias atuais.
Analisando a FIG. 1, os documentos consultados revelaram que sua trajetória não
se constituiu por meio de uma sequência linear quanto ao movimento de
funcionamento e às suas principais realizações, entre outras atividades. Nesse
sentido, a dinâmica da sua história produziu continuidades e descontinuidades
frente a fatores multidimensionais previsíveis e imprevisíveis em sua gestão.
Nesse ponto, Morin (1996) realça a complexidade histórica de um tempo/espaço
que se revela de forma cronológica e não cronológica.
FIGURA 1 – Linha do tempo do Fórum Pró-Trabalho
O primeiro documento localizado após a data de sua criação foi o regimento
interno, o qual representa o documento balizador que imputa a referência do
objeto, funcionamento, organização, princípios e papel do FPT. A construção do
regimento se deu de forma coletiva, sendo iniciada na data da criação do FPT e
concretizada no ano de 2001. Segundo o Dicionário Etimológico (CUNHA, 2010),
a palavra regimento, do latim regímenes do verbo reger, significa governar,
78
administrar e dirigir. Ou seja, o regimento agrega em seu conjunto uma maneira
de funcionamento.
Regimentalmente, as suas atribuições e competências abrangem:
I- Promover a articulação de órgãos e entidades com interesse no tema,
objetivando o estabelecimento de diálogo constante e distribuição da
informação entre os órgãos participantes;
II- Propor, através de documentação gerada por consenso entre as
entidades participantes, medidas legais, educativas e outras que
promovam a inclusão da pessoa com deficiência no mercado de trabalho
e que desencorajem a propagação de casos de discriminação;
III- Articular com organismos nacionais e /ou internacionais mecanismos
de cooperação visando a realização de estudos de diagnóstico e análise
dos fatores mais comumente verificados no mercado de trabalho e na
sociedade em geral que tratem da inclusão da pessoa com deficiência;
IV- Baseado nos estudos ressaltados no inciso III e em estudos sobre o
mercado de trabalho, propor medidas de adequação, promoção,
extinção, conforme o caso, bem como solicitar procedimento
investigatório ao Ministério Público, para ajustamento de conduta na
contratação e cumprimento da Lei n° 8.213/91;
V- Promover articulação entre as entidades envolvidas e a facilitação de
ações de conscientização da sociedade quanto às potencialidades
profissionais da pessoa com deficiência;
VI- Incentivar, em parceria com entidades que o compõem, a
participação de todos os segmentos sociais buscando alternativas para a
solução de problemas existentes com relação à inclusão no mercado de
trabalho da pessoa com deficiência;
VII- Estimular e eventualmente coordenar a cooperação técnica e
financeira
entre os
representantes governamentais e não
governamentais, visando garantir a consecução dos seus objetivos;
VIII- Coordenar e incentivar a execução e a promoção de ações
afirmativas que objetivem a inclusão da pessoa com deficiência no
Mercado de Trabalho;
IX- Solicitar e socializar dados e informações acerca do tema relativo à
pessoa com deficiência, possibilitando a elaboração de propostas e a
revisão de legislação pertinente ou a sua regulamentação, quando se
fizer necessário;
X- Discutir e propor ações para a qualificação profissional para a pessoa
com deficiência para geração de trabalho e renda, bem como firmar
acordos de cooperação com organismos de capacitação;
XI- Pronunciar-se sobre questões de discriminação no mercado de
trabalho denunciando-as aos órgãos competentes;
XII- Buscar a sistematização das ações de inclusão da pessoa com
deficiência no mercado de trabalho através de orientação e divulgação
de ações isoladas de cada uma das entidades participantes;
XIII- Contribuir para a redefinição de políticas públicas, garantindo que o
indivíduo com deficiência possa tornar-se produtivo, assegurando a este
segmento social o direito à cidadania;
XIV- Orientar as empresas, entidades patronais e de trabalhadores
quanto à obrigatoriedade legal de oferta de trabalho para pessoa com
deficiência (Instrução Normativa n° 20 de 26 de janeiro de 2001), bem
como quanto às possibilidades na admissão de pessoas com
necessidades especiais classificadas como portadoras de deficiência
segundo critérios expressos no Decreto nº 3.214 de 20 de dezembro de
1999;
79
XV- Esclarecer empregador quanto aos recursos tecnológicos existentes
para a adequação do ambiente de trabalho e das necessidades de tal
adequação para cumprimento de disposto decreto supracitados (FPT,
REGIMENTO INTERNO, 2001).
Em linhas gerais, o regimento afere ao FPT a promoção ao trabalho das PCDs,
no intuito de envolver toda a sociedade no acolhimento a esse trabalhador que
potencialmente deve ter sua inclusão produtiva garantida na perspectiva do direto
humano ao trabalho.
Do ponto de vista da natureza, de seu objeto, atribuições e competência, a
proposta do FPT é contribuir para minimizar as dificuldades, limites e ampliar as
possibilidades, aspectos que permeiam a temática da inclusão produtiva das
PCDs.
Por outro lado, foi detectado que a atribuição regimental do FPT expressa a
intenção de produzir conhecimento sobre a inserção laboral das PCDs, numa
dinâmica de trabalho que provoque reflexões e discussões que propiciem a
formação de massa crítica desse tema.
Essa atividade também contribui para o desenvolvimento social e econômico
desses sujeitos, bem como para a sociedade, de maneira que transmita novos
saberes para fortalecer a política afirmativa de cotas para as PCDs.
A candidatura de ingresso ao FPT, de acordo com o artigo 6°e 7° do regimento,
se dá pelo interesse específico ou pontual nos problemas discutidos nas reuniões
do fórum e será apreciada em plenário, estando sua aprovação condicionada à
maioria simples dos votos dos demais membros efetivos ou “por convite” na
condição de membros colaboradores.
De acordo com a análise realizada neste estudo em relação ao regimento, pôdese verificar que suas atribuições apresentam quatro categorias de ações:
•
A articulação, participação e cooperação: denotam elementos fundamentais
da concepção de gestão social;
80
•
estudos, dados, análises condizem com os aspectos da avaliação de
projetos sociais que poderão fornecer subsídios técnicos de avaliação e
resultados da política de cotas nos territórios;
•
esclarecimentos e sistematização estão no campo da comunicação, da
interação com a sociedade e, sobretudo, no campo da aprendizagem;
•
proposta de medidas e mudanças políticas e legais, que remete a
proposições que poderão sinalizar transformações e mudanças.
As primeiras categorias - articulação, participação e cooperação - são elementos
pertencentes à concepção do termo GS, afirmado por Gondim, Fischer e Melo
(2006, p. 48):
[...] um ato relacional capaz de dirigir e regular processos por meio da
mobilização ampla de atores na tomada de decisão (agir comunicativo),
que resulte de parcerias intra e Interorganizacionais, valorizando as
estruturas descentralizadas e participativas, tendo como norte o
equilíbrio entre a racionalidade instrumental (com relação a fins) e a
racionalidade substantiva (com relação a valores), para alcançar, enfim,
um bem coletivamente planejado, viável e sustentável a médio e longo
prazo.
A abordagem da GS citada traz certa congruência e coerência com o tipo de
grupo social formado pelo FPT, que tem a participação social e a mobilização
como condicionantes, bem como a parceria entre as organizações, construindo
uma forma de organização coletiva.
A segunda retrata a verificação do tema no que diz respeito à realidade no sentido
de agregar sistematizações de dados, estudos e pesquisas que possam subsidiar
as estratégias e caminhos a serem trilhados para sua atuação.
A terceira indica orientações fundamentadas assimiladas das discussões, dos
dados, das pesquisas, das ações produzidas que orientam e subsidiam a
sociedade diante dessa temática.
A quarta tem conotação política e o papel propositivo de sugerir mudanças no
âmbito legal, bem como colaborar na eficácia das políticas públicas que dizem
respeito a essa matéria.
81
Dessa maneira, o regimento, de modo geral, conseguiu amarrar um mecanismo
de gestão que acompanha a política pública e, no conjunto dos atores sociais,
possibilita discutir pontos de vista da articulação trissetorial que oportuniza esse
locus como espaço de contribuição para o acompanhamento da política de
inclusão produtiva em foco.
4.2 Participação e temáticas: o que dizem as atas
Os membros do governo que participam do fórum assumem mais participação
nos debates da entidade, conforme registrado em atas das reuniões de 2008,
2009, 2010 (GRÁF. 2). Eles representam 46,9% das falas registradas e são
seguidas dos representantes da sociedade civil, com 27,5%. Os representantes
das empresas respondem por apenas 4,4% das falas registradas nas atas.
GRÁFICO 2 - Vocalizações por segmento
Fonte: Atas do fórum. Elaborado pela autora.
A distribuição da capacidade de propor ações para o fórum é bastante
semelhante à distribuição das falas nas reuniões de 2008 a 2010 (GRÁF. 3). A
diferença mais marcante diz respeito às proposições oriundas de segmento não
82
identificado, o que dificulta uma análise mais precisa. A capacidade de proposição
das organizações da sociedade civil é inferior à sua participação nos debates.
Elas respondem apenas por 22,3% das proposições, enquanto as comissões do
fórum propõem mais (8,5%) do que falam (7,3%).
GRÁFICO 3 - Capacidade de proposição
Fonte: Atas do fórum. Elaborado pela autora.
A capacidade de transformar suas propostas em decisões, no entanto, revela a
grande preponderância do governo no fórum (GRÁF. 4); 76,1% das decisões
aprovadas pelo fórum decorreram de iniciativas propositivas do governo. Em
seguida, 7,5% foram das organizações da sociedade civil, 4,5% das comissões do
fórum e apenas 3,0% das empresas.
83
GRÁFICO
4
-
Capacidade
de
ter
suas
propostas
transformadas em decisões
Fonte: Atas do fórum. Elaborado pela autora.
Das temáticas tratadas no fórum nos três anos, 37,3% correspondiam a assuntos
internos organizativos (GRÁF. 5). Em segundo lugar, 15,4% trataram do Portal
Rede de Inclusão e 8,4%, de assuntos referentes à inclusão produtiva.
O Portal Rede de Inclusão constitui um projeto que apresenta um mecanismo
exclusivamente voltado para a inclusão de trabalhadores com deficiência no
mercado de trabalho. Para isso, ele se propõe a organizar uma rede de inclusão,
a qual organizará um sistema único de compartilhamento de banco de dados
entre instituições parceiras, de cadastramento de trabalhadores com deficiência
no estado de Minas Gerais, que pretende facilitar para os atores envolvidos
(empresas, instituições governamentais e não governamentais) o cumprimento da
Lei de Cotas. O Ministério Público do Trabalho destinou recursos oriundos da
multa administrativa imposta a uma instituição mineira vinculada ao fórum, para
execução do Projeto Rede de Inclusão, sendo 50% do montante de R$ 339 mil
reais destinados à montagem estrutural da rede de inclusão e o restante para o
projeto de qualificação e elevação de escolaridade para as PCDs, executado pela
84
CAADE/Secretaria de Estado do Desenvolvimento Social-SEDESE/MG, pessoas
as quais após a qualificação passarão a integrar o banco de dados unificado da
rede. O documento assinala que a rede de inclusão funcionará na sede da SRTE
e estará vinculada ao Núcleo de Igualdade de Oportunidades e ao Balcão de
Oportunidades de Emprego, oferecendo suporte a todos aqueles que necessitam
do cadastro.
GRÁFICO 5 - Assuntos e temáticas por segmentos
80,0
70,0
60,0
50,0
40,0
30,0
20,0
10,0
pr
od
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0,0
fórum
Gov
ongs
empr
comissões
mesa
não-id
Fonte: Atas do fórum. Elaborado pela autora.
Já pelo segmento governo, a temática mais abordada foi a referente a assuntos
internos e organizativos, mas com mais peso do que para o conjunto do fórum
(40,1%). As discussões do Portal (12,8%) e da inclusão produtiva (11,1%) vieram
a seguir. Em relação ao governo, as organizações da sociedade civil trataram
menos dos assuntos organizativos (34,0%) e mais do Portal (15,0%) e da inclusão
(13,5%). Já a participação das empresas se destaca pela importância dada ao
Portal (26,5%) e às suas discussões sobre inclusão produtiva (17,6%), assim
como pela reduzida importância aos assuntos organizativos (17,6%). A parceria
com outras instituições também tem peso importante para as empresas (14,7%).
85
4.3 As entrevistas e o que elas informam
Como já adiantado, em complementação à observação participante e à análise de
documental optou-se por entrevistar participantes do FPT segundo uma amostra
intencional que envolveu sete pessoas, assim distribuídas: uma que frequentou o
fórum e não frequenta mais, advinda do setor acadêmico; seis pessoas que
frequentam o FPT, sendo duas pertencentes ao grupo de empresas; duas do
poder público e duas do terceiro setor, sujeitos com significativo nível de presença
e participação nas plenárias. Esses subgrupos são exatamente os principais de
setores que compõem o FPT, além de alguns sindicatos e universidades, mas
com reduzida presença nas plenárias.
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, Decreto Legislativo
nº 6.949/2009, recomenda envolver as PCDs, inclusive criando oportunidades de
participação ativa nas decisões, opiniões que lhes dizem respeito diretamente.
Dessa forma, 50% dos entrevistados são pessoas com deficiência e 50% pessoas
sem deficiência (BRASIL, 2009b).
Nesse sentido, com a pretensão de preservar a identidade dos sujeitos
participantes desta investigação, elegeu-se denominá-los da seguinte forma:

Sujeito pesquisado de empresa, denominado SE1 (PSD): profissional sem
deficiência, da área das ciências sociais, que trabalha em uma empresa
multinacional que possui programa de inserção da PCD no mercado de
trabalho e frequenta o FPT desde 2010 e a empresa há três ou quatro
anos.

Sujeito pesquisado de empresa, denominado SE2 (PCD): profissional com
deficiência, da área das ciências sociais, que trabalha em entidade
representativa
de
setor
empresarial,
frequenta
o
FPT
desde,
aproximadamente, 2002, 2003.

Sujeito pesquisado do poder público, denominado SP3 (PSD): profissional
sem deficiência, da área das ciências humanas, trabalha em uma
instituição pública vinculada ao tema do trabalho, frequenta o FPT desde
2005 e a organização desde a criação do FPT.
86

Sujeito pesquisado do poder público, denominado SP4 (PCD): profissional
com deficiência, trabalha no poder público em um setor que atua na defesa
de direitos das PCDs e frequenta o FPT desde 2002.

Sujeito pesquisado de ONGs, denominado SO5 (PSD): profissional sem
deficiência, da área da administração, gestor de uma ONG, que
desenvolve projetos vinculados às questões das PCDs, frequenta o FPT
desde maio de 2011 e a instituição desde 2006 ou 2005 (não sabendo
precisar exatamente a data).

Sujeito pesquisado de ONGs, denominado SO6 (PCD): profissional com
deficiência, com pós-graduação, gestor de uma ONG, militante social do
movimento das PCDs e frequenta o FPT desde 2004 ou 2005 (não
sabendo precisar exatamente a data).

Sujeito que não frequenta mais o FPT, denominado S7 (PSD): profissional
sem deficiência, da área das ciências da saúde e que trabalha como
docente
em
uma
Universidade.
Frequentou
o
FPT
no
durante
aproximadamente 10 anos entre idas e vindas.
Para melhor visualização da classificação, elaborou-se o QUADRO 2:
QUADRO 2 – Perfil dos participantes ativos do FPT entrevistados
CATEGORIA
INSTITUCIONAL
Empresa
CARACTERÍSTICA DOS ENTREVISTADOS
Sujeito empresa 1, sem deficiência -
SE1
Empresa
Sujeito empresa 2, com deficiência
SE2
Poder público
Sujeito de vinculação pública, sem deficiência
SP3
Poder público
Sujeito de vinculação pública, com deficiência
SP4
ONG
Sujeito de ONG, sem deficiência
SO5
ONG
Sujeito de ONG, com deficiência
SO6
Professor universitário Sujeito que não frequenta mais o FPT, advindo do
setor acadêmico
SU7
Para facilitar a identificação dos sujeitos, foi também adotado o seguinte critério: os participantes
sem deficiência são números impares e os participantes PCDs, números pares. Também cabe
esclarecer que o roteiro das entrevistas está apresentado no APÊNDICE A.
87
A partir da apresentação da codificação dos sujeitos das entrevistas realizadas,
no próximo tópico tratar-se-á da análise do que foi pesquisado por meio das
entrevistas.
A forma de apresentação dos resultados se dará a partir de dois eixos
norteadores da investigação, os quais foram assim denominados: o primeiro eixo
– limites e possibilidades da inclusão produtiva; e o segundo eixo - a gestão social
e seus desafios no FPT. Sendo assim, nos dois subitens seguintes apresentar-seá breve discussão desses eixos.
4.3.1 Primeiro eixo - limites e possibilidades da inclusão produtiva na
dinâmica do FPT: refletindo sobre as multivisões
Para facilitar a compreensão do leitor, é retomado, da introdução, o conceito de
inclusão produtiva, o qual orientará a análise dos resultados no que se refere à
capacidade do FPT de propiciar discussões e práticas quanto a essa questão. A
concepção do MDS retrata o que se entende nesse âmbito: todo processo
conducente à formação de cidadãos integrados ao mundo pelo trabalho tem como
perspectiva a conquista de autonomia para uma vida digna sustentada por todas
as pessoas apartadas ou fragilmente vinculadas à produção de renda e riqueza
(BRASIL, 2011a).
Dessa maneira, aqui se concebe a inclusão produtiva, nesses termos citados,
como um processo de mudança de patamar dos grupos vulneráveis,
possibilitando o deslocamento dos sujeitos da condição de inclusão marginal para
uma condição de acesso e ascendência socioeconômica efetiva na sua condição
de vida. Isso se dá por meio de atividade produtiva que possa gerar autonomia,
empoderamento e cidadania aos sujeitos envolvidos no mundo do trabalho.
Nesse sentido, concorda-se com Wanderley (1999), quando este afirma que “o
vínculo dominante da inserção na sociedade moderna continua a ser a integração
pelo trabalho. E a transformação produtiva adquire preponderância nas trajetórias
88
de exclusão social. No entanto, a inserção marginal [...] representa um fenômeno
multidimensional” (WANDERLEY, 1999, p. 23).
Em relação a esse aspecto, pretende-se chamar a atenção para o alcance da
inclusão produtiva, no sentido da promoção e da garantia do direito ao trabalho na
vida sujeito, uma vez que existem muitas armadilhas que podem mascarar tal
direito e a própria cidadania. Nesse caso, recorre-se a Demo (2002), que ao
abordar as distinções entre cidadania assistida e tutelada diz que:
A cidadania assistida, que é problemática, porque tende a definir a
pessoa como beneficiária, não como cidadã, e a cidadania tutelada que
submete a pessoa ao mercado, transformando esse parâmetro definitivo,
inclusive da sobrevivência. Cidadania tutelada é contradição nos termos,
já que cidadania significa sempre libertação da tutela, apontando para a
gestação da capacidade de autonomia. Na prática, porém, é o que mais
comumente ocorre, no sentido de que a cidadania é trocada pela tutela,
usando-se nessa transação, sobretudo, formas de assistencialismos. Na
cidadania tutelada predomina a falsificação da cidadania, porque é
destruída na própria tutela. Na cidadania assistida predomina a farsa,
porque se usa a cidadania como isca, para logo a seguir reduzi-la aos
trapos dos auxílios oficiais (DEMO, 2002, p. 23).
Segundo Sawaia et al. (1999, p. 10), “alguns aceitam o projeto-doença para ter
legitimada sua cidadania e certa condição de sobrevivência e, assim, passam a
ser
incluídos
no
sistema
de
seguridade,
como
pertencendo
ao
seu
disfuncionamento”.
Nessa direção, o entrevistado SP4 afirma um aspecto que a autora deste estudo
percebe como uma característica dicotômica verificada nesse cenário, uma vez
que fragmenta as ações de promoção da política destinada às PCDs:
A sociedade vê como trabalho caritativo. Percebem a inclusão para a
pessoa com deficiência como uma ocupação psicológica e não como
uma ocupação profissional. Mas ainda tem PCD pedindo esmola e
querendo favorecimento. E muitas empresas querem driblar. Pedem
deficientes, mas é para fazer banco de dados. Burocracia difícil! (SP4).
Diante disso, retomando a perspectiva inclusiva, faz-se necessário desconstruir
essas concepções assistencialistas e promover a participação cidadã dos
sujeitos, como também reavaliar a gestão das políticas públicas setoriais para
oferecer subsídio à política do trabalho.
89
Ainda nessa linha de pensamento detectam-se também situações em que a
atmosfera de conformismo coloca a exclusão como algo determinante, fazendo
com que as PCDs pactuem com situações tais como cita o trecho a seguir.
Pessoas estão sendo incluídas no mercado formal, mas essas pessoas
estão em casa. Não é uma inclusão de fato. Às vezes atenderam
pessoas que querem carteira assinada, mas desejam na verdade é ficar
em casa. Pactuam com esse tipo de inclusão (SE2).
Contudo, outras situações adversas citadas por SE2 ilustram essa questão:
Tem colocação de pessoa qualificada, mas que não é reenquadrada em
outro cargo melhor. Tem uma pesquisa atual que mostra que as cotas
estão sendo preenchidas, mas com cargos operacionais, aqueles na
área de escritório com tarefas mais simples (SE2).
Na mesma direção, o SP4 opina afirmando sua percepção: o nível social e o
empoderamento têm melhorado por causa da acessibilidade e da Lei 8.213/91
(BRASIL, 1991a), mas os salários são baixos em relação ao de outras pessoas.
A esse respeito, destaca-se a contribuição de Martins (1997, p. 20), ao discutir a
problemática da exclusão:
No Brasil, políticas econômicas atuais, que poderiam chamar-se
neoliberais, acabam por provocar, não políticas de exclusão e, sim,
políticas de inclusão precária e marginal, ou seja, incluem pessoas nos
[...] processos econômicos, na produção e na circulação de bens e
serviços estritamente em termos daquilo que é racionalmente
conveniente e necessário à mais eficiente (e barata) reprodução do
capital.
Nesse conjunto, as mais variadas situações se apresentam, e persistem, apesar
de ser indicada uma mudança, ainda que lenta e gradativa, conforme declara
SP4:
“na
sociedade
eu
tô
vendo,
tá
melhorando
devagar.
Não
por
desconhecimento, mas por interesse. Todo mundo sabe que tem que favorecer a
inclusão do mercado de trabalho para a PCD” (SP4).
Existem indicativos que demonstram mudança no paradigma, conforme declara
SE2:
90
Tem também pessoas que não pactuam, querem sair dessa condição.
Daí surgem denúncias em todas as áreas, educação, comércio,
indústria, universidade, entidades religiosas que são fiscalizadas Temos
colocações legais de quem cumpre a lei. [...] A rede bancária já
descobriu uma saída [...] desenvolveu recrutamento e, além disso,
oferece salário melhor e também está elevando a escolaridade das
PCDs. Temos empresas estatais também dando oportunidades. As
pessoas com deficiência estão fazendo concursos públicos, estão mais
informadas de seus direitos, inclusive de fazer concurso público (SE2).
Por outro lado, os participantes apresentaram postura crítica diante desses
problemas, tal como foi abordado nas entrevistas quanto à avaliação da evolução
da inserção das PCDs no trabalho no Brasil, quando se observa o seguinte
depoimento:
Hoje estamos num momento superpositivo. O MP e o MTE foram
agressivos e alavancaram. Cobrou mais quem tem potencial para incluir
mais. Não é só inserir. Tem que pensar em acessibilidade, capacitação e
acolher devidamente, sensibilizar o funcionário para a inclusão dessas
pessoas. Começar para daqui a alguns anos, colher frutos melhores.
Empresas estão com dificuldade e PCD com dificuldade devido ao perfil
dele. Mercado está aquecido. Hoje estão disputando salário e não perfil,
quem paga mais eles estão indo. Na maturidade ela, a PCD, vai para
onde se sentir melhor e também se identificar com perfil da empresa, daí
sim é inclusão [...]. Pelo trabalho se inclui mais rápido. Se não tem a
renda, depende de outra pessoa [...] dinheiro gera isso, dinheiro gera
autonomia (SE1).
Os fragmentos citados e recorrentemente afirmados nas entrevistas realizadas
corroboram e conduzem à aproximação com as considerações e afirmações de
Demo (2002) de que na sociedade atual observa-se certa predominância da
inclusão tutelada que não trabalha na perspectiva emancipatória. Quanto à
inclusão produtiva de fato, a que gera autonomia e empoderamento e
independência para o cidadão com deficiência, essa ainda também não se
consolidou, havendo um longo caminho a percorrer para tornar-se realidade.
Os efeitos da visão assistencialista da participação das PCDs no mundo do
trabalho aparecem quando se analisa o tipo de oportunidades que estão sendo
criadas. Do ponto de vista do tipo de inserção desse público no mercado de
trabalho, os participantes desta pesquisa foram unânimes ao responder que as
inserções ainda se caracterizam como cargo de pouca qualificação e baixa
remuneração, tal como ressalta a manifestação de SP3, que não os considera
91
subempregados por se tratar de vínculos empregatícios formais, como se a mera
formalização do vínculo o descaracterizasse como subemprego.
Abordagem reflexiva pode ser levantada nesse âmbito ao avaliar até que ponto a
oportunidade de trabalho formal, com registro em carteira, garante à PCD a
condição de empregado, já que na maioria dos casos se caracteriza como
subemprego. Esse ponto merece mais discussões no campo dos direitos
trabalhistas. Entretanto, foi destacado pelos respondentes que a oferta de
subempregos pode vincular-se ao preconceito e ao estigma de que as PCDs
constituem-se como indivíduos que não possuem capital laboral. Nesse aspecto,
o implemento da fiscalização para o cumprimento da cobertura de cotas não tem
avaliado a qualidade da inserção e do tipo predominante de oportunidade ao
trabalho atualmente oferecido a essa população.
Entende-se que os empregadores realmente contratam obrigados pela lei, o que
caracteriza um processo de tutela, uma vez que, se não existisse a Lei de Cotas,
não haveria emprego, ainda que as condições de emprego para PCDs estejam
melhores. Dessa forma, o conceito de inclusão produtiva não parece orientar as
ações do fórum, como também a diferenciação do conceito de inserção produtiva
e inclusão produtiva.
No próximo subitem será abordado o funcionamento de um dos espaços que, no
meio de tantas contradições, desde a década de 1990, vão sendo conquistados
pelos movimentos sociais como estratégia de enfrentamento das questões socais
de grupos vulneráveis, tais como os das PCDs
4.3.1 Segundo eixo: a gestão social e os desafios no FPT
Como desdobramento da Constituição Cidadã de 1988, a sociedade civil, por
meio dos movimentos sociais, conquista espaços na esfera pública para mediar
políticas públicas e afirmar seu controle social frente às políticas de saúde,
educação e assistência social e oportunidades de trabalho e emprego.
92
Esse cenário gerou diversas organizações sociais, vinculadas aos mais variados
movimentos e, entre eles, o movimento de PCD, que se mobilizou em torno da
defesa do direito do trabalho, como, por exemplo, por meio do FPT. Nesse
aspecto, Gohn (2001, p. 64) destaca que:
[...] o exercício da democracia em nome da cidadania de todos é um
processo, não uma engenharia de regras. Como tal, ele demanda tempo,
é construído por etapas e aproximações sucessivas, em que o erro (ou
deveria ser) é tão pedagógico quanto o acerto. Desenhar espaços
participativos é construir a institucionalidade correspondente, de forma
que respeite a diversidade, seja plural, aberta às identidades de cada
grupo/organização/movimento, exige articulações políticas que superem
os facciosismos e costurem alianças objetivando atingir determinadas
metas.
4.3.1.1 Princípios, função social e papel dos fóruns
Partindo do que se propõe o FPT, será apresentado o ponto de vista de seus
participantes entrevistados sobre os princípios e função do FPT. Para isso, optouse por sintetizar os registros dos entrevistados por meio de um quadro de análise
que possibilitou melhor visualização dos olhares coletados para posterior análise.
Como se verifica na fala dos entrevistados, dois atores sociais responderam não
saber quais são os princípios que norteiam o fórum. Outros dois mencionaram
aglutinar pessoas envolvidas e comentam que essa instância fomenta a inclusão,
mas afirmam não terem clareza sobre isso.
Nos relatos destaca-se que três entrevistados disseram que o FPT representa um
lugar de defesa dos direitos da PCD. Dois ressaltaram como princípios do FPT
alguns elementos como ética, transparência, dedicação, voluntariado, promoção
da dignidade e o exercício da cidadania no mercado de trabalho.
93
QUADRO 3 - Referencial com opiniões dos entrevistados com referência aos
princípios, função e papel do FPT
Princípios
Função social
S.E1 Não sei.
Deveria ser. Era de
realmente
auxiliar
na
inclusão da PCD.
S.E2 Seria o somatório das Não sei falar, ele tem uma
discussões com o objetivo função igual conselho,
de facilitar e fomentar a coordena atores públicos
inclusão das PCDs.
e privados.
S.P3 A diretriz política do FPT é Contribuir para erradicar a
a defesa dos direitos das
PCDs, não toleramos nada
que não seja para cumprir
esse viés.
discriminação.
E
há
preocupação
com
a
garantia da dignidade e
promover a vida humana.
Cumprimento
do Papel
Esse ano não.
Não cumpre.
Sim, ele busca
cumprir.
S.P4 A ética, a transparência, Manter
a
sociedade Cumpre, apesar
dedicação e o voluntariado informada e a rede de
de todas as
mesmo. Você vai por amor inclusão em harmonia,
dificuldades.
à causa, senão não vai...
atualizada,
informada
sobre o mercado de
trabalho,
empresa
recebendo
informação
quanto à PCD no trabalho.
S.O5 Não sei.
Promover a autonomia da Pouco, tem que
PCD
avançar.
S.O6 Envolver.
Promover
a Inclusão
da
PCD,
Procura
dignidade, o exercício da promoção da dignidade,
cumprir.
cidadania no mercado de erradicação da pobreza
trabalho e em todos os da PCD. Tem-se outra
espaços em que esteja.
coisa... Não sei. Esse tem
sido
o
que
temos
procurado proporcionar e
trazer ferramentas para
mostrar para as empresas
como deve ser feito.
S.O7 Não tenho claro aglutinar De grande alcance.
Ele tenta, mas
pessoas envolvidas, PCDs
não consegue.
e entidades. Elas deveriam
ser abertas às famílias.
Adquire mais força.
Fonte: Elaboração da autora.
Outro ponto abordado e apresentado no quadro refere-se à função do fórum.
Quatro entrevistados associaram a função do fórum à promoção de uma vida
digna ao falar em promoção da dignidade da vida humana e/ou da autonomia e
94
inclusão das PCDs. Dois ressaltaram sua função de informar às empresas sobre
o emprego de PCDs. Um dos entrevistados deixou explícita a semelhança dos
espaços dessa natureza em relação aos conselhos, entre outras formas de
organização social.
No que se refere à manifestação dos entrevistados quanto ao ponto de vista das
características do fórum, a maioria destaca o FPT como um lugar de encontro de
atores para debate e troca de experiências e informações.
Espaço de discussão e inserção, mas para incluir mesmo (SE1).
É um encontro de entidades públicas, ONGs, Organização da
Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs), a sociedade como um
todo em busca de ações para fomentar e somar esforços para
indiretamente discutir e levar informações para a inclusão no mercado
de trabalho (SE2).
É dialógico por excelência. Uma esfera pública de debate (SP3).
Principal, única e exclusiva: colocar PCD no mercado de trabalho (SP4).
Representar a PCD (SO5).
Diversidade das entidades que têm envolvimento na área da PCD
(SO6).
É um fórum de troca de queixas, poliqueixas, experiências e tentativa de
busca de solução (SU7).
Dessa maneira, as concepções acerca do significado do fórum e sua atuação na
sociedade são caracterizadas por processos dinâmicos e dialógicos e
contraditórios que perpassam por interações que se complementam e se
antagonizam, produzindo, com isso, correlação com o entendimento de Tenório
(2007, p. 10) “sobre gestão social como um processo dialógico no qual a
autoridade decisória é compartilhada entre os participantes da ação”.
Apresentam-se a seguir algumas falas para complementar as percepções dos
participantes acerca das características do FPT no tocante às suas finalidades.
Nos depoimentos coletados constata-se certo consenso quanto à formulação de
políticas e ao acesso ao mercado de trabalho para PCD.
95
Elo de informação e divulgação. Teria papel de formulação políticopública e aglutinar entidades e integralizá-los e divulgar (SU7).
PCDs possam ser incluídas não só no mercado de trabalho, com
dignidade e competindo de forma igual e com qualidade de vida por
meio do trabalho. (SE1).
Fomentar a articulação entre diversos atores
empregabilidade das PCDs e reabilitadas (SO5).
em
prol
da
Isso coincide com o que Toro e Werneck (2007) enfatizam a respeito do processo
de mobilização, o qual se inicia quando uma pessoa, um grupo ou uma instituição
decide iniciar um movimento para compartilhar um imaginário e o esforço para
alcançá-lo.
O respondente SE1 relata que o fórum é um espaço de participação e escuta com
poder decisório democrático. A comunicação é comprometida pela baixa
assiduidade dos seus frequentadores; a interação apresenta divergências; e a
relação com a sociedade foi citada como mínima. Por outro lado, apesar das
lacunas apresentadas, representa um lugar em que se estabelecem processos de
aprendizagem, os quais contribuem muito para a formação dos seus
participantes: “Até no meio da crise, ensinou a atuar” (SE2).
SE2 afirma que a coordenação é democrática, ética e trabalha com bom senso e
tranquilidade. Na sua perspectiva, a comunicação e a interação entre os membros
foram avaliadas como boas: “Minha entidade tem boa interação com o Instituto
Nacional de Seguridade Social (INSS) e com a SRTE”. Por outro lado, a gestão
de projetos, segundo o respondente, não se efetiva, como também um trabalho
em rede, demandando articulação entre distintos setores da sociedade. Isso
revela as contradições da dinâmica de um fórum social.
Ainda no requisito coordenação, SP3 afirma que essa instância deve ter espírito
de luta, persistência, engajamento e militância aguerrida. Entretanto, considera
que a gestão atual tende a defender os interesses institucionais, não se
constituindo como uma liderança democrática, pois desrespeita as deliberações
da plenária. A comunicação, para esse entrevistado, “tornou-se tumultuada e
manipulada para inviabilizar o processo da construção da rede de inclusão”. Em
96
relação à sociedade, a comunicação “passou a ficar tênue, porque pessoas
passaram a desacreditar no processo. Veja a interação que é de mão dupla”.
Na perspectiva de SP4, o gestor da coordenação mostra-se com perfil autoritário
e a comunicação entre os membros se reduz a e-mails, sendo que a interação e
comunicação com a sociedade foram avaliadas como fracas. O trabalho em redes
“não vê” a sua dimensão em termos de amplitude e a gestão de projetos é
definida em plenária.
Para o entrevistado SO5:
A coordenação estava fragilizada, entrei para apagar incêndio. A
comunicação se dá no debate, com desrespeito e indelicadeza. A
interação é baixa entre os membros, assim como com a sociedade. A
aprendizagem que tiro é que cada dia quero ser mais mediador e
conciliador. A gestão de projetos não existe. O FPT faz gestão das
plenárias. Sobre questão de estar integrado a redes, somos convidados a
participar de audiências públicas pelo nosso profissionalismo.
De maneira geral, detectam-se diversos paradoxos e diferenças nas falas dos
entrevistados, devido à complexidade da organização social de um fórum que
articula distintos sujeitos de diferenciadas instituições e representatividades. Isso
mostra que, conforme citações de alguns autores mencionados, a dinâmica de um
fórum não constitui um sistema linear e harmônico, como muitas vezes idealizam
algumas visões tecnicistas.
Por outro lado, ficou muito evidenciado que o FPT representa lugar importante de
promoção de aprendizagem e instrumentalização para seus participantes. Esse
aparente caos reconstrói e organiza saberes que potencializam os gestores que
compartilham esse tipo de experiência. Todavia, entende-se que esses espaços
necessitam melhorar sua capacidade de comunicação, articulação, mobilização e
escuta, com o objetivo e ampliar e fortalecer suas ações. Além disso, identifica-se
que são necessárias outras instâncias formadoras, como a oferta de formação
continuada para seus membros.
97
4.3.1.2 Os temas em debate o foco na rede de inclusão
Como dito anteriormente, as observações participantes foram realizadas nas
plenárias ordinárias mensais do FPT. Nesse aspecto, a temática central apurada
referiu-se exclusivamente ao lançamento do Projeto Rede de Inclusão, o qual
apareceu também denominado, em alguns documentos, pelos componentes,
como Portal e Site da Rede de Inclusão. As discussões concentraram-se
especificamente quanto ao lançamento e migração dos dados das instituições
parceiras para a rede.
Embora o FPT tenha a finalidade de implantar estratégias de inclusão de PCDs
no mercado de trabalho, suas discussões nos últimos anos, segundo as
entrevistas e na análise das atas, estiveram dedicadas à constituição, nos últimos
anos, da rede de inclusão. Isso demonstra relevante conexão entre essas duas
dimensões: a articulação das parcerias e a gestão social.
Além disso, o fórum concentrou-se em assuntos correlatos à dinâmica de
funcionamento do Portal e da logística do lançamento e da edição de um jornal
nomeado Trabalho & Inclusão, substituindo o jornal Fala Núcleo, o qual teve
apenas duas edições, lançadas em 2006.
No período pesquisado, a temática da inclusão produtiva não se constituiu como
assunto central. Entretanto, nas sete entrevistas realizadas, todos os participantes
ouvidos citaram que o projeto da rede vem alterando a pauta, sendo que a
finalidade maior do fórum, que se apresenta como ideário de diretrizes para a
implantação de estratégias de inclusão da PCD no mercado de trabalho, não tem
representado uma prioridade das discussões.
Nesse aspecto, como revelou um dos participantes da entrevista: “Nos últimos
tempos ficamos presos a questões dos problemas que impediram a construção da
rede de inclusão” (SP3).
Diante disso, cabe avaliar se esse Portal funciona ou não como estratégia para a
inclusão produtiva. Nesse sentido, para melhor entendimento, consultou-se o
98
Projeto Rede de Inclusão, no intuito de avaliar o que está prescrito no documento
e o que ocorre na prática dessa instância analisada.
Trata-se de um projeto que apresenta um mecanismo exclusivamente voltado
para o registro compartilhado de candidatos com deficiência a vagas no mercado
de trabalho. Para isso, propõe-se a organizar uma rede de inclusão, a qual
organizará um sistema único de compartilhamento de banco de dados entre
instituições parceiras, de cadastramento de trabalhadores com deficiência no
estado de Minas Gerais, que pretendem facilitar aos atores envolvidos (empresas,
instituições governamentais e não governamentais) no cumprimento da Lei de
Cotas.
A ideia de criação da rede foi apresentada e referendada no Seminário Igualdade
de Oportunidades e Combate à Discriminação, realizado em novembro de 2006,
em Belo Horizonte, na sede do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura,
pelo Núcleo de Combate à Discriminação em parceria como Fórum Pró-Trabalho.
Para execução do Projeto Rede de Inclusão, o Ministério Público do Trabalho
destinou os recursos oriundos da multa administrativa imposta a uma instituição
mineira vinculada ao fórum, montante de R$ 339 mil reais destinados para a
montagem estrutural da rede e o restante para o projeto de qualificação e
elevação de escolaridade para as pessoas com deficiência, executado pela
CAADE/SEDESE/MG, pessoas as quais após a qualificação passarão a integrar o
banco de dados unificado da Rede.
O documento assinala que a rede de inclusão funcionará na sede da SRTE e
estará vinculada ao Núcleo de Igualdade de Oportunidades e ao Balcão de
Oportunidades de Emprego, oferecendo suporte a todos aqueles que necessitam
do cadastro.
Por outro lado, destaca-se, na análise realizada, que essa temática tem sido um
elemento de tensão e conflito entre integrantes. Alguns membros do fórum, por
exemplo, ainda discutem sobre o projeto da rede, demonstrando dúvidas sobre a
relação dela com o FPT, como foi observado nas entrevistas, conforme a seguinte
99
afirmação: “Pra mim tá misturado. É um órgão consultivo. O FPT é da sociedade
civil. Com a rede confundiu tudo” (SE2).
4.3.1.2 A dinâmica das reuniões e plenárias
A participação, ampla e livre (isto é, não obstruída) e a coordenação democrática
são condições necessárias para a efetivação de processos genuínos de gestão
social. Avritzer (2010, p. 149) salienta que, em espaços de organização social, a
inclusão de atores sociais com experiência e proximidade com os problemas
diários da população, adquirida na prática participativa, é um dos elementos que
dinamizam a representação política nos conselhos e oferece condições para uma
relação democrática.
Quanto a isso, Demo (2002, p. 93) descreve que as relações mais democráticas
fortalecem a participação e as lutas pela transformação social e a democracia
”não é algo que é automático, mas é fundamental para o desenvolvimento’’.
Essa ideia é debatida por Gohn (2001, p. 94) ao afirmar que:
O exercício da democracia em nome da cidadania de todos é um
processo, não uma engenharia de regras. Como tal, ele demanda tempo,
é construído por etapas de aproximações sucessivas, em que o erro é
(ou deveria ser) tão pedagógico quanto o acerto.
Toro e Werneck (2007) discorrem sobre a circulação de informações como
aspecto fundamental para o funcionamento e aumento de uma rede, evidenciando
com destaque essa função para aqueles que promovem e lideram uma ação de
mobilização. Nesse nível se constituem essencialmente como facilitadores de
intercomunicação e não dirigentes, fomentadores e coordenadores de rede. Podese concluir que a comunicação em processos de grupos, conselhos, fóruns e
redes representa elemento preponderante para fortalecê-los, visando atingir
fronteiras emancipatórias e empoderativas, nos processos que se identificam com
a gestão social.
100
Para ilustrar essa questão, no tocante à participação, tema vinculado à GS, os
integrantes chamaram a atenção para as últimas plenárias, já que estavam
demonstrando certo nível de esvaziamento exemplificado conforme declara SO5:
“eu estava fora e pude perceber poucas pessoas com mais frequência. Já teve 50
pessoas, hoje são 10”.
No que se refere à liderança da mesa diretora, ficou evidente que os membros
demonstraram certa dependência dessa instância para o funcionamento do fórum.
Esse aspecto dificulta a dinamização das pautas e encaminhamentos das
questões a serem debatidas.
A citação de SE1 pode exemplificar essa situação: “A mesma pessoa que
coordenava, apesar de tudo também tentava ter voz ativa”.
Assim também se pode confirmar com o que SP3 diz:
[...] na verdade todo mundo fala, mas normalmente o coordenador
conduz o trabalho; deveriam ser respeitadas as decisões da plenária que
é soberana... Como vou dizer... entre a plenária e a mesa diretora, o
diálogo é desigual por causa da manipulação da gestão atual.
Apesar disso, de acordo com os participantes, as distintas manifestações são
expressas livremente, sem qualquer tipo de verticalidade ou cooptação, tal como
mostra o entrevistado: “Todos colocam suas opiniões. Tem discussões quentes e
calorosas e pesadas” (SO6).
Contudo, na observação participante, verificou-se certa desorganização quanto à
participação dos sujeitos e suas falas, havendo expressão de um ou mais
integrante de maneira concomitante, não havendo sistematização das inscrições
nas respectivas falas.
Foi possível perceber que a matéria rede de inclusão e todas as implicações que
envolvem seu funcionamento tomam todo o espaço de discussão, fazendo com
que a temática da inserção laboral e/ou inclusão produtiva permaneça afastada
da zona central das discussões. Essa afirmação pode ser confirmada com o
101
seguinte depoimento: “Nos últimos tempos ficamos presos a questões dos
problemas que impediram a construção da rede de inclusão” (SP3).
Além desses problemas citados, em relação a essas participações foi constatado
por meio das entrevistas que a pessoa com deficiência apresenta reduzida
participação:
“são
os
que
menos
participam.
Segmento
historicamente
discriminado é isso mesmo. Como vou dizer... é complicado. Pessoas, atores
mais importantes da luta estão ausentes (SP3).
Por outro lado, outro componente do fórum afirma com mais detalhes que:
Eles são ausentes. Aí o nó da questão. Temos mais PCD representando
as entidades. Eles não estão protagonistas! Mas alguém que tem a
deficiência fala pela instituição que representa, geralmente é vinculado a
uma instituição pública ou privada (SE2).
Dando continuidade ao debate acerca dessa questão, o setor empresarial,
segundo os entrevistados, apresentou a seguinte perspectiva:
As empresas, mais ouvem do que falam (SP.4).
Empresas participam com o objetivo de colocar PCD. Poucas
permanecem, após entendimento, saem. Absorvem o conhecimento e
sai. Participação não plena (SE2).
Nesse quadro, Pateman (1992 apud GOHN, 2001, p. 20) define três tipos de
situação de participação: “a pseudoparticipação (quando há somente consulta a
um assunto por parte das autoridades); a participação parcial (muitos tomam
parte no processo, mas só uma parte decide o fato); e a participação total,
situação em que cada grupo de indivíduo tem igual influência na decisão final”.
Nesse ponto, ainda manifesta nessa mesma sequência: “deveria ter mais
empresas participando do FPT” (SE1). E relata que, em conjunto com uma ONG
participante do FPT, estão criando uma rede de empresas inclusivas.
A participação do segmento governamental mostrou-se de forma diferenciada
diante das entidades privadas e ONGs, destacando-se, na opinião de outro
entrevistado, SP3, como também no depoimento a seguir: “é diferente, muito
102
diferente. O poder público, manifestam com mais intensidade, conhecem a
legislação. As empresas mais ouvem do que falam e as ONGs falam muito”
(SP.4).
Outra verificação refere-se à participação dos representantes do INSS. Esse
órgão público, hoje, tem forte influência nos encaminhamentos e deliberações do
FPT, ao levar para as pautas as questões das pessoas reabilitadas, o que
garantiu a alteração da nomenclatura do Fórum Pró-Trabalho da Pessoa com
Deficiência e Reabilitada, acrescentado o termo “reabilitada” à sua identidade e
incorporando esse segmento ao escopo das ações do FPT.
Da mesma forma, o respondente SP6 revelou que o poder público é disponível e
oferece ferramenta e espaço sem ônus, mas as opiniões são pouco explícitas. De
todo modo, mostram-se colaborativos. Rigo et al. (2010, p. 66) consideram que:
A noção de gestão social indica e fortalece um novo modelo de relações
entre o estado e a sociedade para o enfrentamento dos desafios
contemporâneos. Um modelo no qual o Estado revê sua suposta
primazia na condução de processos de transformação social e assume a
complexidade de atores e de interesse em jogo como definidora dos
próprios processos de definição e construção de bens públicos.
Segundo Rigo et al. (2010. p. 57), “o conceito de gestão social seria
desnecessário se tanto o agente público como o econômico praticassem uma
gestão republicana: uma gestão preocupada com a justiça social, com o interesse
pelo bem comum e não com interesses privados”.
Dessa maneira, pôde-se observar que a defesa de direitos das PCDs ao trabalho
por meio do fórum não se dá de forma linear. Entretanto, o que destaca são
diversos fatores e limitações que envolvem a participação, como a baixa
frequência às plenárias, condução autoritária de algumas lideranças e a reduzida
presença de PCDs que representam exclusivamente o segmento. Enfim, são
diversos os interesses que movem esses atores e, sobretudo, o protagonismo
exacerbado do setor público.
103
4.3.1.3 Algumas tensões e crises evidenciadas no FPT
Tensões e crises são processos inerentes a todo sistema vivo, pela dinamicidade
que lhe é própria (MORIN, 1996). Nesse sentido, crise, aqui, não é considerada
algo negativo ou pejorativo. Pelo contrário, representa a possibilidade dessa
organização dialogar e reconstruir suas pautas e reivindicações, bem como
reconfigurar seu projeto político e participativo. Desse modo, percebeu-se de
maneira não velada a existência de uma denominada “crise”. Entretanto,
constata-se, conforme Gohn (2010, p. 113), que:
A voz e vozes que entoam e ecoam de seus participantes carregadas de
emoções, pensamentos, desejos etc. são falas que estiveram caladas e
passaram a se expressar por algum motivo impulsionador (carência
socioeconômica, direito individual ou coletivo usurpado ou negado,
projeto de mudança, demanda não atendida). Ao se expressar, os
atores/sujeitos dos processos de aprendizagem articulam o universo de
saberes disponíveis, passados e presentes, no esforço de
pensar/elaborar/reelaborar sobre a realidade em que vivem. Os códigos
culturais são acionados e afloram as emoções contidas na subjetividade
de cada um.
Dessa maneira, na observação participante, o que os sujeitos avaliam como
processo atual do grupo como “estado de crise”, a autora opta em avaliar por
outro olhar, percebendo o fórum como um sistema vivo, com sua dinamicidade
processual
de
discussão
e
reconstrução
coletiva
de
grupos
sociais
comprometidos. Estes, ao deparar com dúvidas e discussões carregadas de
emoções, possuem a riqueza de identificar equívocos, desconexões e
apontamentos que revelam momentos de “crise”, mas que, muitas vezes, podem
levar à busca de adequações e novos caminhos.
Partindo dessa ideia, Soares, Tassara e Ude (2010, p. 88) comentam que “um
paradigma inclusivo reconhece a impossibilidade de mudar o todo sem mudar as
partes e de mudar as partes sem alterar o todo, ou seja, ninguém se torna
conflituoso com o meio se o próprio meio não possibilita diálogos, negociações e
denúncias”.
As situações de conflito são explicitadas nas seguintes manifestações: “Diante do
atrito no ano fiquei neutra” (SE1).
104
Assim como também manifesta SP5: “entrei para o fórum mais para ajudar a
tratar as divergências. O ideal é ter no fórum pessoas mais mediadoras [...] A
crise do fórum e a identidade têm sido os pontos mais discutidos”.
As divergências fazem parte da dinâmica de fóruns, conselhos e outros espaços
de associação e discussão; todavia, faz-se necessário construir abertura para
diálogos por meio da mediação de conflitos.
Pontos convergentes e divergentes em reuniões e plenárias de grupos sociais
fazem parte de sua dinâmica. E a garantia do caráter democrático representa a
premissa básica para o implemento de uma sociedade mais inclusiva,
oportunizando mecanismos de consenso para que tal fenômeno não produza
descrédito institucional e, sobretudo, fragmentação do grupo, a qual pode gerar
evasão de seus membros.
Nesse sentido, a rede de inclusão tornou-se um projeto importante para o fórum,
mas sua implantação foi complexa, por diversos fatores, entre eles: os recursos
para sua implantação não eram administrados diretamente por ele; as plenárias
passaram a ter apenas a rede de inclusão como pauta, com consequente
esvaziamento nas plenárias; os gestores do fórum, participantes da mesa diretora
composta
paritariamente
desintenderam-se,
entre
ocasionado
a
sociedade
a
saída
civil
da
e
o
secretária
poder
público,
executiva
e,
sequencialmente, do representante do poder público.
Não se sabe o rumo que o FPT com sua problemática terá, mas acredita-se que
serão necessárias mediação e nova mobilização para resgatar a participação e
operacionalizar tanto o Projeto Rede de Inclusão como a missão maior do fórum,
de controle social da política de inserção laboral das PCDs no trabalho.
Destaca-se a relevância do fórum como espaço de participação democrática onde
sociedade civil (representada pelas OSCIPs e ONGs, muitas vezes prestadoras
de serviços do poder público), empresas e poder público se relacionam,
instituindo novo padrão entre sociedade e Estado. As divergências e dissensos
105
devem conduzir a um constructo a ser aprimorado, uma vez que nesse espaço
também há lutas políticas.
Concluiu-se, recorrendo a Demo (2000, p. 80), “que é ingênuo interpretar a
sociedade de fora do conflito. É ainda mais ingênuo acreditar que o conflito é a
impossibilidade de conviver”.
106
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao analisar uma organização de defesa dos direitos à ocupação remunerada das
PCDs, denominado Fórum Pró-Trabalho das Pessoas com Deficiência e
Reabilitadas (FPT), que se mobiliza em torno da defesa do direito ao trabalho por
meio da Lei de Cotas, foi possível observar fatores, de sua práxis, relacionados à
inserção produtiva e à gestão social, em especial quanto à participação dos
sujeitos participantes.
A pesquisa evidenciou a capacidade do movimento social em se mobilizar por
meio de um fórum baseado numa gestão compartilhada entre distintos setores
sociais, de maneira democrática e dialógica, contribuindo para o alcance de seus
objetivos, apesar das condições precárias de manutenção das estruturas que
sustentam esse tipo de organização. Do ponto de vista da mobilização de atores
sociais, foi possível perceber a contribuição desse espaço como local de controle
social no acompanhamento da política pública, possibilitando o fomento em prol
da real situação de emprego para as PCDs e de sua efetiva “inclusão social pelo
trabalho”. O que se destaca nessa temática é a importância de se ocuparem
arenas nas quais a sociedade civil tenha a capacidade de articulação e
mobilização como estratégia de promoção da cidadania.
Como o FPT promove ações relacionadas à Lei de Cotas, foi necessário conhecer
essa política afirmativa instituída para garantir direitos ainda não afirmados na
sociedade e suas implicações do ponto de vista da maneira como vem sendo
cumprida a legislação.
Foi constatado que o fórum apresenta limites em sua atuação. Ele não possui um
processo de acompanhamento e monitoramento que possa dar a conhecer em
profundidade os tipos de ocupação que estão sendo oferecidas às PCDs, ou
mesmo um mapeamento, monitoramento e avaliação da qualidade de inserção
realizada ou a própria consequência dessa inserção para a vida dos sujeitos com
deficiência.
107
O pensamento a respeito do tema inserção produtiva foi estudado no intuito de
verificar se existe alguma avaliação do FPT quanto ao tipo de inserção real no
mundo do trabalho. Nesta investigação partiu-se da concepção de inclusão
produtiva tal como conceitua o MDS:
Todo processo conducente à formação de cidadãos integrados ao
mundo pelo trabalho tem como perspectiva a conquista de autonomia
para uma vida digna sustentada por parte de todas as pessoas
apartadas ou fragilmente vinculadas à produção de renda e riqueza
(BRASIL, 2011a).
Revendo esse conceito, essa inserção refere-se à condição social e econômica
do sujeito que, por meio do trabalho, adquire acesso e mobilidade social para
atingir um patamar que lhe propicie autonomia e melhoria na sua situação de
vida.
As entrevistas foram realizadas com seis membros participantes do FPT e um exparticipante. O roteiro abordou variáveis que contribuíram para melhor
compreender questões referentes ao seu grau de institucionalização, aos
princípios que os orienta, suas finalidades, limites e possibilidades da inclusão
produtiva e quanto à questão da gestão (gerenciamento).
As entrevistas realizadas neste estudo contribuíram para ajudar a compreender
como a inserção produtiva vem sendo praticada e que não é uma prática que se
aproxima do conceito de inclusão produtiva, que possibilita a mudança real do
patamar de condição socioeconômica na vida do sujeito. Assim, foi possível
compreender que o tipo de inserção produtiva que vem sendo realizada nesta
avaliação está caracterizado como uma inclusão marginal e/ou precária, segundo
Martins (1997).
A diversidade de procedimentos utilizados - constituída de observação
participante não estruturada, entrevista e análise documental - proporcionou a
triangulação de técnicas na identificação dos temas mais recorrentes do estudo
realizado, sendo esse um dos apontamentos encontrados.
108
Na análise documental, priorizou-se analisar o regimento e as atas referentes a
2008, 2009 e 2010. Esse período destaca-se pela sistematização regular dos
registros, apesar da constatação de que as atas não são descritivas na íntegra e
não possuem regularidade descritiva nas suas transcrições. Ainda assim, por ser
uma organização não instituída por lei, a análise das atas oportunizou recolher
dados significativos para o estudo.
Como recurso metodológico para a análise das atas, utilizou-se o software Atlas
TI. Tal recurso metodológico também foi utilizado nos estudos de Avritzer (2010) e
é orientado para a análise de conteúdo, neste caso com ênfase na comunicação
dos participantes nas plenárias. Isso permitiu analisar a capacidade de
vocalização dos sujeitos, na perspectiva setorial (poder público, setor empresarial
ou as entidades de organizações não governamentais), quem fala mais, a
capacidade de proposição, destacando nesse campo o papel preponderante do
poder público.
Os elementos de análise, portanto, demonstraram forte poder de vocalização do
poder público em um fórum essencialmente com característica de “não
institucionalizado por lei” (distinto de conselhos de políticas públicas, por
exemplo), que se estrutura pelas necessidades e demanda social do segmento
social de PCD. O peso do governo no funcionamento do fórum parece ser
inquestionável, tanto na viabilização de espaço e em alguns períodos e eventos
com recursos financeiros.
Quanto à proposição e aprovação de propostas de ação, as diversas instâncias
governamentais representadas parecem efetivar uma liderança inconteste no
Fórum. Entretanto, deve-se atentar para que não gere relações hegemônicas por
parte do poder público frente às demais. As entrevistas revelaram certo receio de
participantes da sociedade civil em relação ao controle do FPT pelo Estado. Essa
informação foi também confirmada nas entrevistas.
Tanto nas entrevistas quanto na análise das atas destaca-se que as empresas
que dele participam parecem estar mais interessadas em ouvir, trocar experiência
e buscar conhecimento sobre a temática. Ademais, podem estar mobilizadas a
109
participar da entidade (FPT), que já possui certo reconhecimento institucional e
que conta com a forte presença de representantes de instituições governamentais
encarregadas de fiscalizar a aplicação das leis e, no caso de não cumprimento,
impor multas. Esse fator
amplia as possibilidades do fórum como também
legitima seu espaço de rede articulada nessa temática e ressalta as
possibilidades do FPT como um lugar de interação e aprendizagem.
Outro interesse das empresas participantes parece buscar implantar instrumentos
que facilitem a elas o cumprimento das exigências legais para emprego de PCD,
o que é demonstrado pela importância que dão à discussão do Portal Rede de
Inclusão. Dessa maneira, pode-se observar que a defesa de direitos das pessoas
com deficiência não se dá de forma linear e homogênea do ponto de vista setorial
(governo, ONGs e empresas) na participação.
A participação das PCDs nos vários campos de diálogo e discussão e espaços
democráticos com o FPT poderá ser repensada de forma que o próprio sujeito se
envolva, defenda e garanta seu direito. Ou seja, conforme Pateman (1992, apud
GOHN, 2001), espera-se que assumam “participação total” nas situações que
tenham correspondência com sua realidade.
Portanto, a participação é um elemento preponderante em organizações de
gestão social, tal como o Fórum, que por seu caráter democrático tornam as
pessoas realmente parte integrante desse locus. Nesse sentido, é oportuno
reafirmar que a prática paradigmática fundamentada na participação, parceria e
interação dos sujeitos na vida social possibilita a aquisição de conhecimento,
aprendizagem, estímulos e oportunidades, substituindo ambientes segregatórios e
discriminatórios.
Percebe-se que está em formação uma nova visão da sociedade sobre as PCDs,
substituindo
paulatinamente
o
paradigma
anterior
marcado
por
visões
preconceituosas e práticas assistencialistas e caritativas destinadas aos
indivíduos com deficiência. Nesse aspecto, o marco legal, por meio da Convenção
dos Direitos das PCDs recentemente adotada no Brasil, reforça as legislações
anteriores e avança no combate à discriminação contra a PCD quanto a questões
110
relacionadas a formas de emprego, em todas as etapas e condições de trabalho,
tais como seleção, recrutamento, contratação, admissão, permanência no
emprego, ascensão profissional e condições seguras e salubres de trabalho e
mesmo o trabalho forçado ou compulsório.
Destaca-se também a proteção ao direito trabalhista em igual condição aos
demais trabalhadores, com seus devidos direitos e consequente deveres, com
igual remuneração por trabalho de igual valor, além da reparação de injustiças e
assédio moral. Às PCDs também deve-se garantir condições de acesso à
orientação
profissional
técnica
e
profissional,
reabilitação
profissional,
oportunidade de trabalho autônomo, empreendedorismo, oportunidade de
emprego em órgãos públicos e privados. Ressalta-se assegurar as adaptações
razoáveis, não se desprezando a importante e contundente implementação da
acessibilidade, o que em nossa percepção deverá contemplar os aspectos
arquitetônicos, programáticos, metodológicos e das comunicações, entre outros,
colaborando com as condições ajustáveis para que o trabalhador com deficiência
possa, portanto, ser incluído de maneira adequada nas suas especificidades.
Esse rol de exigências são alguns elementos balizadores que o Ministério do
Trabalho e Emprego e o Ministério Público do Trabalho, por meio de suas
publicações, orientações e apoio a grupos organizados, vem esclarecendo,
conscientizando, ouvindo os sujeitos e ONGs e fiscalizando e realizando um
trabalho profícuo, com o compromisso de que essas diretrizes para promoção do
emprego remunerado para as PCDs sejam cumpridas (BRASIL, 2000c).
Dessa maneira, pode-se afirmar que as conquistas das PCDs caminham para a
inclusão produtiva e da cidadania não tutelada (DEMO, 2002), na perspectiva da
autonomia, empoderamento, emancipação socioeconômica das PCDs.
Todavia, apesar dos estudos defenderem a perspectiva da inclusão produtiva,
ainda prevalece a inclusão marginal ou precária e tutelada, uma vez que no
debate atual e nas próprias entrevistas a qualidade da inserção realizada não tem
destaque privilegiado nas discussões do fórum.
111
Os pontos listados a seguir muitas vezes são identificados como impeditivos para
o avanço da inserção produtiva das PCDs e podem constituir-se como um
diagnóstico de características e particularidades que deverão ser gerenciadas
para o pleno emprego das PCDs na sociedade no momento histórico atual:

As PCDs possuem baixo índice de escolaridade, em função da exclusão
vivenciada nos sistemas educacionais.

As PCDs não estão qualificadas.

O nível de exigência de escolaridade das empresas é elevado.

Há competição do benefício de prestação continuada e do benefício da
Previdência com a remuneração do trabalho da PCD. Boa parte das
pessoas acaba desistindo do trabalho em função da parca estabilidade
oferecida pela lei.

Devido ao preconceito e discriminação, as PCDs relatam dificuldades em
acreditar nas suas potencialidades, inclusive a laboral.

As entidades não possuem cadastro de PCDs aptas para o mercado de
trabalho.

As PCDs não sabem onde procurar oportunidades de trabalho.

As empresas às vezes até desejam empregar PCD, mas não sabem onde
encontrá-la.

As empresas não possuem conhecimento sobre as especificidades desse
público.

As
empresas
não
estão
dispostas a
investir
em
acessibilidade,
impossibilitando o acesso de pessoas com certas deficiências ao posto de
trabalho.

A maioria das empresas não está disposta a fazer concessões e/ou
adequações específicas para as PCDs.

Os órgãos fiscalizadores atuam de forma ainda muito tímida.

Os órgãos fiscalizadores nem sempre possuem conhecimento específicos
sobre a questão, aceitando as justificativas apresentadas pelas empresas
pelo não cumprimento da cota.

As empresas não percebem o emprego de PCDs como exigência de
cumprimento da legislação, mas como uma benesse ou como ação de
responsabilidade social.
112

Faltam campanhas de sensibilização no meio empresarial.

Deve-se envolver as famílias na fase que antecede os programas de
capacitação e inclusão laboral, possibilitando conhecimento e segurança
aos familiares, no sentido de evitar posturas de superproteção ou tutela
junto às PCDs.
Esta dissertação não investigou diretamente esses impedimentos, reais e
alegados, ao emprego de PCD, ainda que a busca de identificação do conceito de
“inclusão produtiva” nas práticas do FPT tangenciasse alguns deles. Assim, cabe
uma postura crítica no intuito de desconstruir as abordagens assistencialistas que
desconsideram o propósito da inclusão e da cidadania autônoma e que não
contribuem para a emancipação dos sujeitos.
A sugestão que se pode fazer, nesse aspecto, refere-se à busca de transpor
esses obstáculos por meio de tecnologias sociais, que podem significar, todavia,
ponto de partida para outros estudos (BRASIL, 2005). Entretanto, a partir desta
pesquisa, a principal ferramenta que se apresenta relaciona-se ao desafio dos
gestores para a implantação de programas dessa natureza na perspectiva da
gestão social.
Da análise das entrevistas realizadas neste estudo com os participantes,
constatou-se que eles têm visões diferenciadas sobre os princípios e a finalidade
do FPT. Por outro lado, ficou evidenciado que o FPT representa a possibilidade
de ser
lugar de promoção, aprendizagem e instrumentalização para seus
participantes. Os participantes compartilham o interesse em defendê-lo como
espaço democrático e de articulação de redes, ainda que vejam dificuldades no
seu funcionamento (coordenação autoritária para uns, comunicação manipulada
para outros, a excessiva dedicação à constituição do Portal da Inclusão e a
absorção do Fórum pelo Estado ainda para outros).
Muitas vezes, um aparente caos, identificado em momentos de crises, exige que
se reconstruam e organizem saberes e que se compartilhem experiências.
Entende-se que esses espaços apresentam limitações e necessitam melhorar a
sua capacidade de comunicação, articulação, mobilização e escuta, com o
113
objetivo de ampliar e fortalecer suas ações. Além disso, detectou-se a
necessidade da oferta de instâncias formadoras, como oferta de formação
continuada para seus membros.
A GS representa um “modo de fazer” complexo, em que se emaranham distintos
fatores, atribuições, interesses e trajetórias. Mas a práxis do FPT se aproxima da
caracterização do modelo inclusivo e sinaliza a convergência com os conceitos de
GS do ponto de vista de suas características, finalidades e funções.
Nesse contexto, resgata-se o conceito de GS de Maia (2005, p. 15-16):
Assim, compreendemos gestão social como um conjunto de processos
sociais com potencial viabilizador do desenvolvimento societário
emancipatório e transformador. É fundada nos valores, práticas e
formação da democracia e da cidadania, em vista do enfrentamento às
expressões da questão social, da garantia dos direitos humanos universais
e da afirmação dos interesses e espaços públicos como padrões de uma
nova civilidade. Construção realizada em pactuação democrática, nos
âmbitos local, nacional e mundial; entre os agentes das esferas da
sociedade civil, sociedade política e da economia, com efetiva participação
dos cidadãos historicamente excluídos dos processos de distribuição das
riquezas e do poder.
Tal definição pode parecer utópica em uma sociedade capitalista, mas parece,
sobretudo, estar mais próxima e adequada, apresentando a possibilidade de
pavimentar o caminho para se alcançar uma gestão que atenda às necessidades
e demandas específicas para situações sociais mais injustas e de grupos
historicamente vulneráveis, tais como as das PCDs.
A contribuição deste estudo destaca a riqueza de fóruns dessa natureza,
composto pela diversidade de seus componentes e a sua característica
intersetorial e dialógica. O campo de gestão social ou de gestão do
desenvolvimento social apresenta-se como uma grande possibilidade, um reflexo
das práticas e do multiconhecimento construído por múltiplas disciplinas,
delineando-se uma proposta multiparadigmática, de natureza interdisciplinar.
As organizações sociais estão sempre redefinindo as suas práticas e adquirindo
novos conhecimentos. Portanto, se reorganizam e se ressignificam de acordo
com o momento histórico, político e social. Todavia, a obrigatoriedade do
114
cumprimento das cotas apresenta essa característica peculiar de exigir a
superação de obstáculos, o que possibilitará inovação, busca de ajudas técnicas
e até mesmo desenvolvimento local nos territórios vulneráveis. São novas
práticas que, ao se realizarem, adquirem significados e formas para subsidiar o
alcance da tão necessária justiça pela inclusão social.
Dessa maneira, do ponto de vista de limites e possibilidades, a inclusão produtiva
necessita, em primeiro lugar, ser entendida como um conceito permeado de
valores emancipatórios do sujeito em sua vida econômica social e cultural, mais
bem desenvolvida em um contexto de GS. Por outro lado, o FPT, no período
estudado, demonstrou mais preocupação com a racionalidade instrumental
(relacionada aos fins) em detrimento da racionalidade substantiva (em relação
aos seus valores), ao centrar suas discussões e debates na Rede de Inclusão. Tal
encaminhamento não invalida seu campo de organização e possibilidades, que se
materializa pela prática de construção e decisão coletiva dos atores envolvidos
em prol da inclusão social.
No caso das políticas públicas para as PCDs, justifica-se a criação de espaços
sistemáticos de construção coletiva, com orientação teórico-prática entre a
sociedade civil e o poder público, com características e valores teórico-conceituais
da gestão social, necessários para propiciar espaço de participação, mobilização
e diversidade, proposição, aprendizagem, promoção de valores, busca de
finalidades, reflexão, comunicação e ações estratégicas de enfrentamento que,
para além das cotas legais, desconstruam paradigmas, preconceitos e
discriminações.
115
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122
APÊNDICES E ANEXO
Apêndice A – Roteiro de entrevista
1) Quanto à Constituição do FPT:
a) Há quanto tempo você frequenta o FPT?
b) Como você passou a fazer parte do FPT? E sua entidade?
c) Existe algum critério para o ingresso no FPT? Como os participantes
ingressam no FPT?
d) Você é assíduo às reuniões? E os outros membros? Quem é mais assíduo?
e) Qual a principal característica do FPT?
f) No seu entendimento, qual a finalidade do FPT?
g) Qual a identidade do FPT? Como você reconhece o FPT? Como ele é
reconhecido frente à sociedade?
2) Quanto ao funcionamento e organização:
a) Como o FPT funciona no dia-a-dia? Por meio de que eventos (plenárias,
reuniões, seminários)?
b) Como é feito o monitoramento do funcionamento?
c) Qual a frequência dos encontros? Como são convocados?
d) Qual o problema mais comum, isto é, mais frequente quanto ao
funcionamento do FPT? O FPT conversa e discute isso?
e) Quais as principais atividades do FPT?
f) Quais são as ações mais importantes?
g) Como são organizadas as pautas?
h) Quais têm sido os pontos mais discutidos recentemente?
i) As pautas contemplam aspectos de promoção para o emprego de PCD?
Como?
j) Relate uma reunião típica.
k) Como são tratadas as divergências quanto às atividades e funções do FPT?
123
l) Quais os maiores êxitos da atuação do FPT em sua opinião?
m) Quais as principais dificuldades para uma atuação mais efetiva do FPT?
Essa dificuldade já foi ponto de pauta de debates no FPT?
3) Quanto aos princípios:
a) Quais os princípios que norteiam as ações do FPT?
b) Qual a função social do FPT? Qual a maior preocupação do FPT?
c) Qual a função social na perspectiva dos direitos humanos?
d) O FPT cumpre seu papel e/ou sua função social nessa perspectiva?
e) No que diz respeito à ocupação econômica de PCD, quais os princípios que
norteiam o FPT?
f) Como são encaminhadas as deliberações?
g) Como se dá a participação dos membros nas reuniões?
h) Quem coordena? É sempre a mesma pessoa? Quem fala mais?
i) O FPT trabalha de forma integrada com outras entidades (empresas,
instituições, outros fóruns, conselhos etc.)? Trabalha em redes de forma
articulada?
4) Quanto às finalidades, limites e possibilidades da inclusão produtiva
(ações):
a) Como você avalia a evolução da inserção das PCDs no trabalho no Brasil?
E na sociedade?
b) Como estão sendo desenvolvidas as ações voltadas para a ocupação
econômica de PCD? O FPT visa só à promoção do emprego ou também
da auto-ocupação e geração de renda?
c) Quais são as intencionalidades da promoção da ocupação econômica das
PCDs? Quais são as ações? Quais você considera principais ações?
Existem parcerias para executar essas ações? Quais são?
d) Como você classifica o tipo de inserção de PCD no mercado de trabalho?
Trabalho qualificado ( ) Subemprego ( ) Trabalho precário ( ) Por quê?
e) O FPT segue ou sugere alguma metodologia de ação para inserção das
PCDs
no
mercado
de
trabalho?
Existe
acompanhamento dos casos encaminhados?
f) Quais as dificuldades encontradas?
alguma
metodologia
de
124
g) O que pode ser feito para melhorar a situação?
h) O FPT avalia o tipo de ocupação econômica que está sendo promovido por
sua atuação? Como é avaliado? Qual é o tipo de ocupação? (Se não há
informação do FPT, descreva o que você imagina ser o tipo de ocupação
criada pela atuação do FPT).
5) Quanto à gestão?
a) Quais as instituições que participam do FPT? Quais não estão e que
deveriam estar?
b) Como se dá a participação dos membros do FPT? (Poder público,
entidades privadas, ONGs)? E do sujeito com deficiência?
c) Como se dá a coordenação do FPT? Como é escolhida?
d) Para você, como quais características a coordenação do FPT deve ter?
e) Como você qualifica as características principais do gestor atual do FPT?
f) Em sua avaliação, qual é o perfil do gestor ou da liderança: democrática ( )
autoritária ( ) centralizadora ( ) Não centralizadora ( ) Por quê?
g) Como se faz a gestão dos projetos do FPT?
h) Quanto às deliberações, como deveriam ser encaminhadas?
i) Quanto ao poder decisório, como deveria ser?
j) Como se dá a comunicação entre os membros? E a interação?
k) E com a sociedade, como é a comunicação? E a interação?
l) Quais têm sido os principais dilemas quanto à gestão do FPT? Isso foi
discutido no FPT?
m) Qual a fonte de recursos para funcionamento do FPT?
n) Qual importância do software para você? O que tem a ver com a função
principal do FPT?
o) O FPT proporciona alguma aprendizagem? Que aprendizagem a sua
participação no FPT proporciona?
p) O próprio FPT mudou sua forma de funcionar, de se gerir, de pensar a
inserção da PCD no mercado de trabalho ao longo do tempo? Como? Por
quê?
125
Apêndice B - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Título da Pesquisa: “Inclusão produtiva da pessoa com deficiência por meio da
gestão social: um estudo acerca do Fórum-Pró-Trabalho”.
Nome do pesquisador principal ou orientador(a): Frederico Luiz Barbosa de Melo.
Nome da pesquisadora assistente/aluna: Maria Cristina Abreu Domingos Reis.
1. Natureza da pesquisa: o sr.(a.) está sendo convidado(a) a participar desta
pesquisa, que tem como finalidade analisar limites e possibilidades do
processo de um fórum voltado para subsidiar e promover o emprego de PCD
nos marcos da Lei de Cotas, sob a perspectiva dos direitos humanos e da
gestão social.
2. Participantes da pesquisa: serão sete participantes do Fórum-Pró-Trabalho,
sendo dois gestores de ONGs, dois gestores de empresas ou instituições
públicas, dois gestores de empresa privadas e uma pessoa que participou e
não participa mais do fórum.
3. Envolvimento na pesquisa: ao participar deste estudo, o sr. (a) permitirá que
a pesquisadora, Sra. Maria Cristina Abreu Domingos Reis, realize entrevista
com o(a) Sr.(a) O (o) Sr. (a.) tem liberdade de se recusar a participar e a
continuar participando em qualquer fase da pesquisa, sem qualquer prejuízo
para o Sr.(a). Sempre que quiser poderá pedir mais informações sobre a
pesquisa pelo telefone da pesquisadora do projeto e, se necessário, pelo
telefone do Comitê de Ética em Pesquisa.
4. Sobre as entrevistas (se houver, especificar como serão realizadas): as
entrevistas serão conduzidas pela mestranda e pesquisadora Maria Cristina
Abreu Domingos Reis, que seguirá um roteiro específico previamente
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UNA. As entrevistas serão
gravadas para posterior análise.
5. Riscos e desconforto: a participação nesta pesquisa não traz complicações
legais. As questões podem gerar alguma dúvida ou desconforto relacionados
ao conhecimento ou desconhecimento sobre questões abordadas. As
entrevistas não geram qualquer tipo de risco para qualquer um dos
entrevistados. Os. procedimentos adotados nesta pesquisa obedecem aos
Critérios da Ética em Pesquisa com Seres Humanos, conforme Resolução no.
126
196/96 do Conselho Nacional de Saúde. Nenhum dos procedimentos usados
oferece riscos à sua dignidade.
6. Confidencialidade: todas as informações coletadas neste estudo são
estritamente confidenciais. Somente a pesquisadora e o(a) orientador(a) terão
conhecimento dos dados.
7. Benefícios: ao participar desta pesquisa, o Sr.(a) não terá qualquer benefício
direto. Entretanto, esperamos que este estudo traga informações importantes
sobre (.......), de forma que o conhecimento que será construído a partir desta
pesquisa possa (........), comprometendo-se a pesquisadora a divulgar os
resultados obtidos.
8. Pagamento: o Sr.(a) não terá algum tipo de despesa para participar desta
pesquisa, bem como nada será pago por sua participação.
Após esses esclarecimentos, solicitamos o seu consentimento de forma
livre para participar desta pesquisa. Preencha, por favor, os itens que se seguem.
Obs: Não assine este termo se ainda tiver dúvida a respeito.
Consentimento Livre e Esclarecido
Tendo em vista os itens aqui apresentados, eu, de forma livre e
esclarecida, manifesto meu consentimento em participar da pesquisa. Declaro
que recebi cópia deste termo de consentimento e autorizo a realização da
pesquisa e a divulgação dos dados obtidos neste estudo.
Nome do Participante da Pesquisa
Assinatura do Participante da Pesquisa
Assinatura do Pesquisador
Assinatura do Orientador
Pesquisador Principal: Frederico Luiz Barbosa de Melo – 9904-9579
Demais pesquisadores: Maria Cristina Abreu Domingos Reis – 9975-0015
Comitê de Ética em Pesquisa: Rua Guajajaras, 175, 4º andar – Belo
Horizonte/MG
Contato: email: [email protected]
127
Apêndice C – Produto final
Instrumento de avaliação de fóruns de gestão social
Como consequência do estudo “A gestão social e a inclusão produtiva: limites e
possibilidade da experiência do Fórum Pró-Trabalho das Pessoas com
Deficiência”, construiu-se um instrumento de avaliação do funcionamento de
instâncias de participação da sociedade civil (tais como fóruns, colegiados,
redes), contemplando variáveis da participação e da gestão social (GS). Seu
objetivo é aprimorar os mecanismos de organização e compromissos assumidos
de uma mobilização com viés na democratização e participação da sociedade civil
organizada, na elaboração, implementação, monitoramento e avaliação das
políticas públicas. São propostos dois indicadores, com os respectivos diagramas
por dimensões: um para a qualidade da participação e outro para a qualidade da
GS.
Com a Constituição Cidadã de 1988, a participação da sociedade civil tornou-se
uma realidade constante na dinâmica da sociedade. Os grupos sociais
vulneráveis, na busca de conquista de seus espaços e também de políticas
públicas que atendam a seus anseios, encontraram ambiente propício à
mobilização por meio de conselhos e fóruns. Essas organizações possuem
pautas, reuniões sistemáticas e estratégias de gestão das políticas públicas para
alcançar as suas finalidades.
Nesse sentido, compreendendo a importância dessas iniciativas políticas da
sociedade, torna-se necessário de maneira concreta avaliar o percurso dessas
organizações para cada vez mais aprimorar intenções e ações. Portanto, a
contribuição que ora se apresenta refere-se, de maneira simplificada, à avaliação
de aspectos que envolvem a gestão desses grupos.
Do ponto de vista conceitual, essa ferramenta possui grande afinidade com a
denominada GS, elemento mais adequado às características desses movimentos
sociais.
128
Para melhor explicitar o que se propõe, remete-se ao conceito de GS de Maia
(2005):
Assim, compreendemos gestão social como um conjunto de processos
sociais com potencial viabilizador do desenvolvimento societário
emancipatório e transformador. É fundada nos valores, práticas e
formação da democracia e da cidadania, em vista do enfrentamento às
expressões da questão social, da garantia dos direitos humanos
universais e da afirmação dos interesses e espaços públicos como
padrões de uma nova civilidade. Construção realizada em pactuação
democrática, nos âmbitos local, nacional e mundial; entre os agentes das
esferas da sociedade civil, sociedade política e da economia, com efetiva
participação dos cidadãos historicamente excluídos dos processos de
distribuição das riquezas e do poder (MAIA, 2005, p. 15-16).
Como também ao conceito de Fischer, denominando a GS como aquela que:
Articula múltiplas escalas de poder individual e social; que trabalha a
identidade de projeto, refletindo e criando pautas culturais; que coordena
interorganizações eficazes; que promove ação e aprendizagem coletiva;
que se comunica e difunde resultados; que presta contas à sociedade;
que reavalia e recria estratégias processuais (FISCHER, 2002, p.12).
A ferramenta criada é de um diagrama composto de 10 variáveis que irão
considerar o bom desempenho de uma GS e, em específico, de participação
social nas instâncias de GS.
Esse instrumento foi inspirado no mapa criado por Ude (2008), o qual avalia os
vínculos externos de uma rede institucional, com o intuito de identificar
fragilidades, potencialidades e vulnerabilidades que configuram o campo
intersetorial a ser pesquisado. A ideia é:

Cada pessoa implicada na avaliação dá uma nota para as 10 dimensões;

as alternativas de notas são: 1 (péssimo), 2 (ruim), 3 (satisfatório), 4 (bom)
e 5 (ótimo);

tiram-se as médias de cada dimensão (aqui há duas alternativas: a) faz-se
o cálculo da média total das médias de cada dimensão; ou b) dá-se peso
maior para uma ou outra dimensão e calcula-se a média ponderada (por
esses pesos) das médias de cada dimensão;

chega-se a um indicador de “boa participação” e outro de "boa gestão
social" (ou má)!
129
Esses critérios foram elaborados como ferramenta de avaliação de fóruns e/ou
conselhos de direitos, na perspectiva de determinar pontos frágeis e fortes na
organização de um grupo social, que de maneira sistemática se organiza por meio
de objetivos comuns para acompanhar e realizar o controle social de algum tema
vinculado a políticas públicas.
1.1 Instrumento da avaliação da participação dos membros de um fórum de
gestão social
1.1.1 Participação
Considera-se que “participação” é uma característica central e definidora das
instâncias de GS. Ou seja, não se concebe um fórum ou conselho de GS que não
seja composto por indivíduos e representantes de entidades distintas (do Estado,
da sociedade civil, das empresas, de organizações não governamentais, etc.) e
em que não ocorra interação entre eles e a formulação de contribuições de
diversas origens para alcançar seus objetivos.
1.1.2 Dimensões para avaliação da participação
O QUADRO 1 mostra o significado dos termos empregados nessa dimensão.
130
QUADRO 1 – Dimensões da participação em fóruns de GS e respectivos
significados
Termo
1-Assiduidade
Significado
Presença dos participantes às reuniões, plenárias,
e eventos.
2-Durabilidade
Tempo de participação
instituição no fórum.
3-Diversidade
da
pessoa
e/ou
da
Pluralidade de segmentos e pessoas, de todos os
grupos sociais com interesse no tema, presentes
no fórum.
4-Diálogo e vocalização
Expressão e manifestação de opiniões numa lógica
dialógica em que todos têm direito à voz e à
expressão de ideias e opiniões.
5-Proposição
Capacidade de apresentar propostas que são
acatadas.
6-Processos deliberativos Ação de decidir mediante discussão e decisão
coletiva.
7-Aprendizagem
Conjunto de processos de construção de
conhecimento a partir de
experiências
que
implicam interações de reciprocidade .
8-Construção coletiva
Elaboração (de proposta ou de ação) que
compreende ou abrange muitas pessoas ou um
grupo.
9-Coordenação
Pessoa ou grupo que organiza o trabalho de um
grupo, cujos elementos têm autonomia para
organizar seu próprio trabalho.
10-Mobilização
Capacidade dos membros do fórum em
arregimentar pessoas e entidades que não fazem
parte do fórum, para suas ações e para a
realização de seus objetivos.
131
FIGURA 1 – Instrumento de avaliação da participação em fóruns e conselhos
1.2 Instrumento de avaliação da atuação de um fórum de GS
Esse instrumento diz respeito à qualidade da atuação dos fóruns de GS,
desdobrando-se em dimensões que os estudos acerca de processos de GS
ressaltam como componentes importantes em instâncias de participação social
voltadas para diferentes formas de contribuição e intervenção em políticas sociais
ou problemas afins.
1.2.1 Dimensões para avaliação da GS
No QUADRO 2 ressalta-se o significado dos termos nessa dimensão.
132
QUADRO 2 – Dimensões da GS e respectivos significados
Termo
1-Participação
2-Valores
3-Finalidades/ propósitos
4-Orientação teórica para a
prática
5-Articulação de redes
6-Monitoramento
7-Comunicação (externa)
8-Resultados (eficácia e
efetividade)
9-Recursos
10-Organização
Significado
É a tomada de parte pela pessoa em algo
exterior a si mesma, visando à consecução de
um objetivo compartilhado com outros.
Conjunto de princípios, ideias e julgamentos
que orientam a ação.
Fim a que se destina, metas e objetivos.
Clareza nas referências teóricas, que orienta a
execução concreta de uma ação e a busca da
finalidade, segundo os valores que fundam o
fórum .
Integração das ações do fórum nas políticas,
programas e articulação de grupos e pessoas
na perspectiva da intersetorialidade.
Acompanhamento da realização das ações do
fórum referentes a seus objetivos.
Estabelecimento de relação entre pessoas,
grupos, organizações mediante o emprego de
diversos tipos de linguagem, em um tipo de
interação em que sempre estão presentes um
emissor, um canal, um receptor e uma
mensagem.
Análise dos produtos de uma ação. Eficácia diz
respeito ao alcance dos objetivos pretendidos,
se estão sendo verificados ou não, enquanto
efetividade remete à geração de resultados
mais amplos, não diretamente pretendidos.
Elementos e meios necessários para a
execução de um trabalho ou de uma ação.
Modo ou forma que se dispõe a funcionar.
Observe-se que a nota referente ao item ”participação” poderá ser levantada por
meio do instrumento anterior proposto. Ou seja, o resultado final do primeiro
instrumento (para avaliação da participação) poderá ser trazido para esse
instrumento de avaliação da GS.
133
FIGURA 2 – Instrumento de avaliação da GS
Referências
FISCHER, Tânia. A Gestão do desenvolvimento social: agenda em aberto e
propostas
de
qualificação.
2002.
Disponível
em
<http://unpan1.un.org/intradoc/groups/public/documents/clad/clad0044559.pdf>
Acesso em: 21/01/2011. Maia (2005)
MAIA, Marilene. Gestão Social: reconhecendo e construindo referenciais. Revista
Virtual Textos & Contextos. nº 4, dez. 2005.
UDE MARQUES, Walter Ernesto. Enfrentamento da violência sexual infantojuvenil e construção de redes sociais: produção de indicadores e possibilidades
de intervenção. In: CUNHA, Edite da Penha et al. (orgs). Enfrentamento à
violência sexual infanto-juvenil: expansão do PAIR em Minas Gerais. Belo
Horizonte: UFMG, 2008.
134
Anexo A – Parecer ético
135
ANEXO B – Regimento Interno do Fórum Pró-Trabalho
REGIMENTO INTERNO
CAPÍTULO I – DA DEFINIÇÃO
Artigo 1º - O presente regimento regula as atividades e atribuições do
O FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA, criado pela
plenária de instituições governamentais e não governamentais reunidas no
auditório do Instituto São Rafael, no dia 10 de abril de 2000.
CAPÍTULO II – DA NATUREZA E FUNCIONAMENTO
Artigo 2º - O FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM
DEFICIÊNCIA, órgão consultivo, atuará, na Região Metropolitana de Belo
Horizonte, por tempo indeterminado, conforme as disposições deste Regimento.
CAPÍTULO III – DO OBJETO
Artigo 3º - O FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM
DEFICIÊNCIA tem por objeto a articulação de entidades e órgãos com interesse
no tema, com a finalidade de organização do ideário de Diretrizes para a
implantação de estratégias de inclusão da pessoa com deficiência no mercado de
trabalho, respeitadas as competências e as atribuições legais dos órgãos
participantes.
CAPÍLO IV – DAS ATRIBUIÇÕES E COMPETÊNCIAS DO FORUM
Artigo 4º - Compete ao FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM
DEFICIÊNCIA:
I.
Promover a articulação de órgãos e entidades com interesse no
tema, objetivando o estabelecimento de diálogo constante e
distribuição da informação entre os órgãos participantes;
II.
Propor, através de documentação gerada por consenso entre as
entidades participantes, medidas legais, educativas e outras que
promovam a inclusão da pessoa com deficiência no Mercado de
136
Trabalho e que desencorajem a propagação de casos de
discriminação;
III.
Articular com organismos nacionais e/ou internacionais mecanismos
de cooperação visando a realização de estudos de diagnóstico e
análise dos fatores mais comumente verificados no Mercado de
Trabalho e na sociedade em geral que tratem da inclusão da pessoa
com deficiência.
IV.
Baseado nos estudos ressaltados no inciso III e em estudos sobre o
Mercado de Trabalho, propor medidas de adequação, promoção,
extinção, conforme o caso, bem como solicitar procedimento
investigatório ao Ministério Público do Trabalho, para ajustamento de
conduta na contratação e cumprimento da lei n.º 8213/91;
V.
Promover articulação entre as entidades envolvidas e a facilitação
de ações de conscientização da sociedade quanto às
potencialidades profissionais da pessoa com deficiência;
VI.
Incentivar, em parceria com entidades que a compõe a participação
de todos os segmentos sociais buscando alternativas para solução
de problemas existentes com relação a inclusão no Mercado de
Trabalho da pessoa com deficiência;
VII.
Estimular e eventualmente coordenar a cooperação técnica e
financeira entre
os representantes governamentais e não
governamentais, visando garantir a consecução dos seus objetivos;
VIII.
Coordenar e incentivar a execução e a promoção de ações
afirmativas que objetivem a inclusão da pessoa com deficiência no
Mercado de Trabalho;
IX.
Solicitar e socializar dados e informações acerca do tema relativo à
pessoa com deficiência, possibilitando a elaboração de propostas e
a revisão da legislação pertinente ou a sua regulamentação, quando
se fizer necessário;
X.
Discutir e propor ações para qualificação profissional para pessoa
com deficiência para geração de trabalho e renda, bem como firmar
acordos de cooperação com organismos de capacitação;
XI.
Pronunciar-se sobre as questões de discriminação no Mercado de
Trabalho denunciando-as aos órgãos competentes;
XII.
Buscar a sistematização das ações de inclusão da pessoa com
deficiência no Mercado de Trabalho através da orientação e
divulgação de ações isoladas de cada uma das entidades
participantes;
137
XIII.
Contribuir para a redefinição de políticas públicas, garantindo que o
indivíduo com deficiência possa tornar-se produtivo, assegurando a
este segmento social o direito a cidadania;
XIV.
Orientar as empresas, entidades patronais e de trabalhadores
quanto a obrigatoriedade legal de oferta de trabalho para pessoa
com deficiência ( Instrução Normativa n.º 20 de 26 de Janeiro de
2001), bem como quanto às possibilidades na admissão de pessoas
com necessidades especiais, classificadas como Portadoras de
Deficiência, segundo critérios expressos no decreto n.º 3214 de 20
de Dezembro de 1999;
XV.
Esclarecer o empregador quanto aos recursos tecnológicos
existentes para adequação do ambiente de trabalho e da
necessidade de tal adequação para cumprimento do disposto
Decreto supra citados.
CAPÍTULO V – DA COMPOSIÇÃO
Art. 5º - Integram O FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA,
como membros efetivos, os órgãos e entidades presentes na plenária de 10 de
Abril de 2000, constante da ata da reunião de 10/04.
Parágrafo único – Cada um dos membros efetivos indicará, por escrito seu
representante em respectivo suplente.
Art. 6º - A participação de outros órgãos e entidades, que tenham interesses
específicos ou pontuais nos problemas discutidos nas reuniões do FÓRUM, será
apreciada em plenário, estando sua aprovação condicionada à maioria simples
dos votos dos demais membros efetivos.
Art. 7º - Outros órgãos e entidades, que tenham interesses específicos e pontuais
nos problemas discutidos nas reuniões do FÒRUM, poderão ser convidados a
delas participar, na condição de membros colaboradores.
Art. 8º - A saída ou afastamento de qualquer membro efetivo deverá ser
comunicada por escrito à mesa diretora do FÒRUM, com a indicação dos motivos
que o(a) determinaram.
Parágrafo único – A coordenação dará ciência do ato e de seus motivos
determinantes aos demais membros do FÓRUM, na plenária imediatamente
subsequente.
138
Art. 9º - Considera-se excluído o membro que, sem justificativa, faltar a três (03)
reuniões consecutivas ou cinco (05) reuniões alternadas pelo período de doze
(12) meses.
Parágrafo 1º - As justificativas deverão ser encaminhadas por escrito.
Parágrafo 2º - Ocorrendo a hipótese prevista no caput, a Coordenação do
FÒRUM fará a comunicação por escrito do membro excluído.
Art. 10º - Somente terão direito a voto os membros efetivos, pelos seus
representantes, e, na ausência desses, dos respectivos suplentes.
CAPÍTULO VI – DA ESTRUTURA DO FUNCIONAMENTO
Art. 11º - O FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊNCIA é
constituído por:
I.
II.
III.
IV.
Plenário
Mesa Diretora
Comissões Permanentes
Comissões Provisórias
Sessão I – Do Plenário
Art. 12º - O Plenário é a instância deliberativa do FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA
PESSOA COM DEFICIÊNCIA, constituindo-se pela reunião ordinária ou
extraordinária dos seus membros.
Art. 13º - O FÓRUM reunir-se ordinariamente mensalmente, por convoção de seu
coordenador, ou extraordinariamente, mediante convocação de seu coordenador
ou de 10 (dez) de seus membros, observado, em ambos os casos, o prazo
mínimo, de 05 (cinco) dias corridos para a realização da reunião.
Parágrafo único – Qualquer membro poderá solicitar à Mesa Diretora convocação
de Reunião extraordinária, devendo esta ser avaliada.
Art. 14º – Nas reuniões ordinárias, poderá o Plenário discutir e deliberar sobre
matérias estranhas à ordem do dia desde que aprovada pela maioria simples dos
presentes.
Art. 15 – Cabe ao Plenário:
I.
Deliberar sobre os assuntos de sua competência e os encaminhados
para a apreciação e deliberação do FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA
PESSOA COM DEFICIÊNCIA;
139
II.
III.
IV.
V.
VI.
Aprovar a criação e a dissolução das Comissões, Grupos de Estudo
e/ou de Trabalho e suas respectivas competências, composições,
procedimentos e prazos de duração;
Acompanhar as ações de atendimento desenvolvidas por entidades
governamentais ou não governamentais, orientar e/ou solicitar o
reordenamento de programas, projetos e serviços ás entidades
responsáveis;
Acompanhar a execução de planos e a aplicação de recursos
existentes pelas entidades do setor público ou da sociedade civil –
desde que os fundos sejam originados dos cofres públicos –
destinados à área de assistência, qualificação e inclusão da pessoa
com deficiência;
Alterar ou modificar o Regimento Interno, com quorum de 2/3 de
seus membros, em reunião especialmente convocada;
Eleger a Mesa do O FÓRUM PRÓ-TRABALHO DA PESSOA COM
DEFICIÊNCIA;
Parágrafo 1º - As Assembleias Gerais serão instaladas, em primeira convocação,
com a presença da maioria simples de seus membros e, em Segunda chamada
após 15 minutos, com a presença de qualquer número, salvo quando se tratar de
matéria relacionada a regulamento interno, quando o quorum mínimo será de 2/3
(dois terços) de seus membros.
Parágrafo 2º - A matéria em pauta, não deliberada, permanece nas pautas das
reuniões subsequentes até a sua deliberação.
Parágrafo 3º - O Plenário será presidido pelo Coordenador do FÓRUM PRÓTRABALHO DA PESSOA COM DEFICIÊCIA, que em sua falta ou impedimento
será substituído por seu suplente e na falta deste pelo Secretário-Geral, ou
2ºSecretário, nesta ordem.
Parágrafo 4º - As deliberações serão tomadas por maioria simples, salvo nos
casos definidos em contrário;
Parágrafo 5º - As votações poderão ser abertas ou secretas, tendo cada membro
titular direito a um voto.
Parágrafo 6º - Os votos divergentes poderão ser expressos na ata da reunião, a
pedido do membro que o proferiu, sendo optativa sua declaração.
Parágrafo 7º - As reuniões do FÓRUM serão públicas.
Parágrafo 8º - Em caso de empate e esgotada todas as alternativas de discussão
será feita nova votação e persistindo o empate o Coordenador decidirá pelo voto
Minerva.
140
Art. 16 – AS manifestações do FÓRUM se darão por meio de resoluções,
deliberações e recomendações.
Parágrafo único – as recomendações do FÓRUM serão aprovadas pela maioria
simples dos votos dos presentes membros a elas vinculados, respeitadas as
competências dos órgãos participantes.
Art. 17 – Os trabalhos do Plenário obedecerão a:
I.
Verificação do quorum para instalação dos trabalhos;
II.
Leitura, apreciação e votação da ata da reunião plenária anterior;
III. Leitura da carta convocatória, discussão e aprovação da agenda;
IV. Espaço para aviso, comunicações, registro de fatos, apresentação de
proposições, correspondência e outros documentos de interesse do
plenário;
V.
Relatos de comissões;
VI. Espaço para critério do plenário e mediante inscrição prévia, serem
debatidos ou levados a conhecimento assuntos referentes ao objeto
do FÓRUM;
VII. Encaminhamentos
VIII. Encerramento
Art. 18 – A cada reunião será lavrada uma ata com a exposição dos trabalhos,
conclusões e deliberações, a qual será assinada pela Mesa Diretora, constando a
data de sua aprovação pelo Plenário e posteriormente arquivada na Secretaria
do Fórum.
Parágrafo Único – A assinatura de todos os membros presentes á reunião deverá
constar de livros ou lista de presença.
Art. 19 – As datas de realização das reuniões ordinárias do FÓRUM serão
estabelecidas em cronograma e sua duração será a julgada necessária, podendo
as mesmas serem interrompidas para prosseguimento em data e hora e serem
estabelecidas pelos presentes.
Art. 20 – Os membros integrantes do FÓRUM deverão ser informados dos
assuntos da ordem do dia, mediante correspondência visual e braile, com
antecedência mínima de 07 (sete) dias.
SEÇÃO II – DA MESA DIRETORA
Art. 21 – A Mesa Diretora, para mandato de 02 (dois) anos, é composta pelos
seguintes cargos:
I.
II.
Coordenador
Secretário-Geral
141
III.
IV.
1º Secretário
2º Secretário
Parágrafo primeiro – O membro efetivo ocupante de qualquer cargo na Mesa
Diretora poderá ser reeleito uma única vez, por igual período, qualquer que seja o
cargo ocupado neste novo período.
Parágrafo segundo: Obrigatoriamente a mesa diretora será composta por uma
pessoa com deficiência com direito à voz e voto, convidada com antecedência na
plenária anterior.
Parágrafo terceiro: A pessoa convidada deverá participar da reunião da mesa
diretora anterior para organização da plenária.
Art. 22 – A eleição da Mesa Diretora dar-se-á na última sessão plenária conduzida
pela Mesa Diretora com mandato findo e observará na sua formação a paridade
de 02 (duas) entidades governamentais e 02 (duas) não-governamentais.
Art. 23 – A eleição dar-se-á por meio de inscrição do membros efetivo ao cargo
pleiteado.
Parágrafo 1º - A eleição será secreta e individualizada por cargo.
Parágrafo 2º - A apuração será imediata, com a posse dos eleitos.
Art. 24 – Á Mesa Diretora, na função de coordenação das ações políticoadministrativas do FÓRUM, compete:
I.
II.
III.
Dispor sobre as normas e atos relativos ao funcionamento
administrativo do FÓRUM;
Verificar a existência de quorum;
Tomar decisão em caráter de urgência “ad referendum” do Plenário,
em assuntos administrativos e/ou assuntos deliberados pelo
Plenário.
Subseção Única – DAS ATRIBUIÇÕES
Art. 25 – Ao Coordenador do FÓRUM compete:
I.
II.
III.
IV.
V.
representar judicial e extrajudicialmente o FÓRUM;
convocar e presidir as reuniões e plenárias do FÓRUM;
submeter a pauta do dia à aprovação da Plenária do FÓRUM;
assinar as decisões do FÓRUM;
homologar os nomes das instituições e os respectivos titulares e
suplentes;
142
VI.
VII.
VIII.
IX.
X.
delegar competência, desde que previamente aprovada em
PLENÁRIO;
submeter ao PLENÁRIO ou a Mesa Diretora os convites para
representar o FÓRUM em eventos municipais, estaduais, nacionais,
e internacionais, e apresentar formalmente o nome do membro
escolhido;
divulgar assuntos deliberados pelo FÓRUM;
decidir sobre questões de ordem;
desenvolver as articulações necessárias para o cumprimento das
atividades da Mesa Diretora;
Parágrafo Único – Caso o coordenador não cumpra o disposto no art. 25, o
Plenário se reunirá com quorum de 2/3 e por maioria absoluta decidirá sobre a
cassação do mandato.
Art. 26 – Ao Secretário-Geral compete:
I.
II.
III.
substituir o coordenador em seus impedimentos ou ausências;
auxiliar o coordenador no cumprimento de suas atribuições/
exercer as atribuições definidas pelo plenário.
Parágrafo Único – O Scretario-geral completara o mandato do coordenador em
caso de vacância.
Art. 27 – Ao 1º Secretário compete
I.
II.
III.
IV.
V.
VI.
VII.
VIII.
IX.
Secretariar as reuniões da Mesa Diretora
responsabilizar-se pelas atas das sessões e proceder a sua leitura
Secretariar as Plenárias do Fórum 
Responsabilizar-se pelas atas das Plenárias e proceder a sua
leitura
Substituir o Secretario-Geral nos seus impedimentos e o
Coordenador na falta de ambos, ou no caso de vacância ate que o
FÓRUM eleja os novos titulares
Elaborar a pauta das reuniões da Mesa Diretora e das Plenárias 
Assinar, juntamente com o Coordenador, os documentos do
FÓRUM
Responsabilizar-se pela guarda de documentos e pela recepção e
expedição de documentos
Sediar a Secretaria do FÓRUM
Art. 28 – Ao 2º Secretário compete
I.
II.
Substituir o 1º Secretario em seus impedimentos ou ausências com
todas as atribuições inerentes ao cargo
Substituir o 1º Secretário nos casos em que tenha que substituir o
Secretário-Geral ou o Coordenador
143
III.
Completar o mandato do 1º Secretário em caso de vacância
SECAO III – DAS COMISSOES
Art. 29 – O FÓRUM poderá substituir, e definir a competência, de Comissões ou
de Grupos de Trabalho por decisão do PLENÁRIO.
Art. 30 – As comissões e sua composição serão definidas pelo plenário e
constituídas por seus próprios membros, representados por seus titulares ou
suplentes.
Art. 31 – Ao Coordenador da Comissão compete
I.
II.
Coordenar a reunião da Comissão
Assinar as atas das reuniões e encaminhá-las ao 1º Secretário do FORUM
Art. 32 – O FÓRUM poderá convidar entidades, autoridades, cientistas e técnicos
para colaborarem nos estudos ou participarem das Comissões instituídas.
Art. 33 – As comissões poderão ser convocadas para assessoras a Mesa Diretora
e as do Plenário e para se pronunciar, quando solicitadas, pelo Coordenador de
Mesa Diretora
CAPITULO VII – DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 34 – O presente regimento poderá ser alterado parcial ou totalmente, através
de proposta expressa de qualquer membro do FÓRUM
Art. 35 – As propostas de alteração total ou parcial deste Regimento deverão ser
apreciadas em reunião extraordinária do Plenário, convocado por escrito para
este fim, com antecedência mínima de 05 (cinco) dias úteis e aprovadas por 2/3
(dois terços) dos presentes.
Parágrafo único – As propostas de alteração deverão ser encaminhadas a Mesa
Diretora, por escrito, com antecedência de 10 (dez) dias úteis, da reunião
extraordinária.
Art. 36 – Os casos omissos deste Regimento serão resolvidos pelo Plenário do
FÓRUM
Art. 37 – Este regimento entrará em vigor na data de sua aprovação pelo Plenário
do FÓRUM.
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REIS, Maria Cristina Abreu Domingos. A GESTÃO SOCIAL E A