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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL - UFMS
CAMPUS DE NOVA ANDRADINA - CPNA
CURSO DE HISTÓRIA
MARIA EUNICE ALVES DE CARVALHO
DAS FALSAS PROMESSAS ÀS NOVAS ESPERANÇAS:
A PRESENÇA INDÍGENA OFAYÉ NO MATO GROSSO DO SUL
Nova Andradina
2010
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MARIA EUNICE ALVES DE CARVALHO
DAS FALSAS PROMESSAS ÀS NOVAS ESPERANÇAS:
A PRESENÇA INDÍGENA OFAYÉ NO MATO GROSSO DO SUL
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como
requisito parcial para a obtenção do título de
Licenciada em História pela Universidade Federal
de Mato Grosso do Sul/ Campus de Nova
Andradina.
Orientador: Prof. Dr. Giovani José da Silva
Nova Andradina
2010
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TERMO DE APROVAÇÃO
Maria Eunice Alves de Carvalho
DAS FALSAS PROMESSAS ÀS NOVAS ESPERANÇAS:
A PRESENÇA INDÍGENA OFAYÉ NO MATO GROSSO DO SUL
COMISSÃO EXAMINADORA
_____________________________________________
Presidente: Prof. Dr. Giovani José da Silva
____________________________________________
Arguidor I: Prof. MSc. Carlos Alberto dos Santos Dutra
____________________________________________
Arguidor II: Profª. Drª. Vanderléia Paes Leite Mussi
____________________________________________
Suplente: Profª. MSc. Vânia Perrotti Pires Graziato
Nova Andradina, _________ de _______________ de 2010.
4
A minha família pela força e paciência
que tiveram comigo,
em tantos momentos que
precisei ficar ausente.
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AGRADECIMENTOS
A Deus que, em sua bondade e misericórdia, me deu força para prosseguir nesta longa
jornada.
À minha família: Osmar (esposo), Aline e Cássia (filhas) e Isabelle (netinha).
Aos meus pais, Jovenita e José, pelo amor e orações e aos meus irmãos.
Aos colegas e amigos do Curso, em especial, Márcia, Claudinei, Susi, Tânia e Ivone,
sem os quais seria mais difícil chegar até o final.
Ao meu orientador, Prof. Dr. Giovani José da Silva.
Ao Professor Leandro Baller, Coordenador do Curso de História, que sempre me
auxiliou quando necessitei.
Ao bibliotecário da UFMS/ CPNA, Adilson Campos, pelas muitas vezes que me
ajudou
Aos demais professores do Curso: Ezio, Paulo, Alexandre, Darcy, Marcelino e
Ângelo, que terão sempre um lugar especial em minhas lembranças.
Aos participantes de minha banca, que de pronto aceitaram ler o meu trabalho, Carlos
Alberto Dutra, Vanderléia Paes Leite Mussi e Vânia Perrotti Pires Graziato.
A todos o meu muito obrigada!
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Raiz da injustiça
A raiz da injustiça
já se espalhou no mundo inteiro,
onde nasce o fruto da miséria,
onde a esperança se envenena
e se encontra com a fatalidade.
Essa sorte de injustiça
cai na esperança do índio (brasileiro),
o dono da natureza,
o dono da simplicidade.
Deus tem o seu compromisso
de abençoar o seu povo.
Deus derrama lágrimas
ao ver as suas obras destruídas;
Como o índio, ele chora
ao ver a sua terra dominada
pela sociedade branca,
onde conservam a raiz da injustiça
contra este índio sofrido.
Seria tão importante a união de todos
para acabar com esse regime de sacrifício.
A poesia é de autoria de Xehitâ-ha, Athaíde Francisco Rodrigues, ex-cacique Ofayé e atual
Presidente da Associação Indígena Ofayé. Fonte: Dutra, Carlos Alberto dos Santos. Ofaié,
morte e vida de um povo. Campo Grande: Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do
Sul, 1996.
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Resumo
Este trabalho de pesquisa tem a finalidade de fazer um breve estudo sobre os índios Ofayé, no
atual Estado de Mato Grosso do Sul, hábeis caçadores e coletores que habitaram a região do
Vale do Ivinhema. Esta pesquisa está baseada em fontes documentadas por antropólogos e
historiadores, tais como Manuela Carneiro da Cunha, John Manuel Monteiro, Curt
Nimuendaju, Darcy Ribeiro, Gilson Rodolfo Martins, Carlos Alberto dos Santos Dutra e
Mirtes Cristiane Borgonha. A partir das contribuições teóricas , a pesquisa mostrará ao leitor,
como e onde eles viveram, além de suas lutas, as fugas necessárias, o abandono e o quase
extermínio. Mostrará, também, como sobreviveram e como vivem hoje em uma aldeia no
município de Brasilândia.
Palavras Chaves: Ofayé, Mato Grosso do Sul, Vale do Ivinhema.
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Sumário
Introdução................................................................................................................................ 10
1. A presença Ofayé no atual Mato Grosso do Sul.................................................................. 14
2. Os Ofayé ontem e as falsas promessas................................................................................. 22
3. Os Ofayé hoje e as novas esperanças................................................................................... 27
Conclusão................................................................................................................................. 35
Referências............................................................................................................................... 37
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Lista de Figuras
Figura 1: Mapa Etnográfico do Brasil................................................................................. 15
Figura 2: Mapa do Território Ofayé.................................................................................... 16
Figura 3: Aldeamentos Ofayé em Nova Andradina. .......................................................... 17
Figura 4: Antiga Aldeia Ofayé ........................................................................................... 20
Figura 5: Mapa apontando o caminho percorrido até a reserva Kadiwéu............................23
Figura 6: Mapa com a localização do Municipio de Brasilândia..........................................25
Figura 7: Entrada da Reserva em Brasilândia ......................................................................29
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Introdução
O objetivo deste trabalho é fazer um breve estudo sobre a história dos índios Ofayé,
que viveram e ainda vivem hoje no território que corresponde ao Estado de Mato Grosso do
Sul. Consideramos este, um trabalho relevante para entender um pouco mais sobre a história
indígena em nossa região. Meu intuito é levar ao conhecimento dos leitores como viveu este
povo indígena antes de o Vale do Ivinhema ser colonizado.
As informações que compõem este trabalho foram retiradas de textos já publicados,
como também de narrativas recebidas de pessoas que tiveram e tem contato com os Ofayé.
Meu interesse em pesquisar este grupo se deu através do Prof. Dr. Giovani José da Silva, que
nos instigava sempre a questionarmos o que sabíamos sobre a história regional, chamandonos sempre a atenção para os indígenas que estiveram aqui, antes da chegada dos
colonizadores. Este trabalho é uma pequena parte do muito que ainda há de se fazer a respeito
dos índios Ofayé, que lutam até os dias de hoje para serem reconhecidos como cidadãos, para
terem seu espaço em uma sociedade que prefere excluí-los.
Uma das etapas desta pesquisa foi realizar o levantamento bibliográfico de alguns
autores que, ao longo de anos de trabalho, se dedicaram ao estudo da vida dos índios no
Brasil. Um deles, Manuela Carneiro da Cunha, professora da Universidade de Chicago e
professora aposentada da Universidade de São Paulo USP, é antropóloga e suas obras ajudam
a rever pontos importantes da história dos índios do Brasil, tão pouca conhecida, a autora
aponta que eles têm importância na história nacional e que é necessário reintegrar estas
sociedades indígenas a historiografia do país.
Em seu livro História dos índios no Brasil, faz um levantamento de fontes e
referências de como viveram e como vivem os índios em diferentes regiões do país. E aponta
que é possível compreender que as sociedades indígenas são agentes e não meras vítimas de
um destino traçado pelo colonizador, e que é necessário saber como se organizam, se
articulam e são influenciados. Para a antropóloga, é necessário se pensar num todo e aumentar
o conhecimento que se tem a respeito da história dos índios.
Carneiro da Cunha afirma que quase não há registros sobre o período exato da chegada
dos índios neste território ou quantos eram. Sabe-se, contudo, que eram muitos milhares, mas
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não se sabe ao certo quantos, pois a história deste território só começou a ser contada com a
chegada dos colonizadores ou dos “descobridores” não indígenas: “Sabe-se pouco da historia
indígena: nem a origem, nem as cifras de população são seguras, muito menos o que
realmente aconteceu. Mas progrediu-se, no entanto; hoje está mais clara, pelo menos, a
extensão do que não se sabe” (CARNEIRO DA CUNHA, 2008, p. 11).
Esta grande lacuna a ser preenchida, da História sobre os povos nativos que aqui
viveram e vivem, mostra que há, ainda, um longo caminho a se percorrer, principalmente por
historiadores e antropólogos.
Dos milhares de povos nativos que habitavam estas terras, antes da chegada dos
portugueses, são poucas centenas denominados indígenas, compondo atualmente 0,4% da
população brasileira, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística),
em 2001. Esse contingente populacional está muito reduzido, pois muitas foram às tragédias
ocasionadas por colonizadores que se abateram sobre a vida dos povos originários:
escravidão, guerras, doenças, massacres, genocídios e outros males que por pouco não os
eliminaram.
As epidemias são normalmente tidas como o principal agente da depopulação indígena [...]. A
barreira epidemiológica era, com efeito, favorável aos europeus, na América, e era-lhes
desfavorável na África. Na África, os europeus morriam como moscas; aqui eram os índios que
morriam: agentes patogênicos da varíola, do sarampo, da coqueluhe, da catapora, do tifo, da
difteria, da gripe, da peste bubônica, possivelmente a malária, provocaram no Novo Mundo o
que Dobns chamou de “um dos maiores cataclismos biológicos do mundo” (CARNEIRO DA
CUNHA, 2008, p.12-13).
Estes, porém, não foram os únicos fatores que contribuíram para o desaparecimento de
grande parte desta população. Os europeus pretendiam dominá-los tanto economicamente nas
disputas territoriais, como culturalmente, trazendo-lhes um outro estilo de vida. Isso sem
contar que queriam escravizá-los, domesticá-los para fazer deles servos obedientes e poderem
explorar tanto a mão de obra, como suas riquezas que eram abundantes, além de incitarem as
guerras que havia entre grupos rivais, de maneira a utilizar as diferenças e os confritos entre
as etnias como elemento de dominação.
Quando os conquistadores e colonos portugueses chegaram a esta terra, os índios
estavam espalhados por todo o território em grande número, em diferentes grupos étnicos. No
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processo de colonização e dominação do atual território brasileiro, etnias inteiras foram
massacradas, dizimadas ou escravizadas, explícita ou disfarçadamente. Morreram de doenças
trazidas pelos europeus ou de fome, depois que suas terras foram tomadas e seus meios de
sobrevivência destruídos.
John Manuel Monteiro (1995) relata uma grande preocupação pela falta de interesse
com que os historiadores têm tratado a questão indígena, ao se referirem a estas populações
como meros pobres sobreviventes de um passado cada vez mais distante, sem perceber uma
consciência histórica, em que os índios são sujeitos e não apenas vítimas. Antes vistos como
seres negligentes, apáticos e incapazes de contribuir para o desenvolvimento destas terras,
hoje os indígenas são enxergados, antes de tudo, como seres humanos que lutaram por suas
vidas, seres pensantes que também se defendiam e se defendem. Cada povo indígena reagiu
aos contatos a partir do seu próprio dinamismo e criatividade. Inúmeras práticas de resistência
foram empreendidas ao longo dos anos de colonização como, por exemplo, fugas individuais
e coletivas; suicídios; assassinatos de senhores e colonos; destruição de fazendas de gado e de
plantações; estupros; furtos de alimentos; casamentos com não indígenas. Os preconceitos
têm na ignorância e no desconhecimento sobre o mundo indígena suas principais causas e
origens e precisam ser superados.
São bem conhecidas as conseqüências deste suporte teórico para a política
indigenista no país: posto na prática redundava no deslocamento de populações, na
imposição de sistemas de trabalho que desagregavam as comunidades, na
assimilação forçada, na descaracterização étnica e, em episódios de triste memória,
até na violência premeditada e no extermínio físico (MONTEIRO, 1995, p. 222).
É possível afirmar que a presença indígena é marcante na história, na cultura e no
cotidiano, base da qual se formou a população brasileira. Ao longo de toda a história de
colonização, os povos indígenas estiveram presentes como mão-de-obra para servir aos
europeus, como guerreiros para expulsar outros invasores e até mesmo como guias à frente de
entradas e bandeiras.
O principal pesquisador dos Ofayé é o historiador Carlos Alberto dos Santos Dutra,
um forte aliado na luta deste povo. Dutra é graduado em Ciências Sociais, Direito, Teologia e
possui mestrado em História. Trabalhou no Cimi (Conselho Indigenista Missionário), no
momento em que os Ofayé estiveram na reserva dos Kadiwéu em Porto Murtinho, na Serra da
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Bodoquena. Em 1996, publicou o livro Ofaié: morte e vida de um povo, fazendo uma
descrição etno-histórica do grupo. Em 2004, defendeu sua dissertação na área de História,
intitulada O território Ofaié pelos caminhos da história: reencontro e trajetória de um povo,
analisando os deslocamentos territoriais Ofayé até a primeira metade do século XX.
Estudos e trabalhos realizados mostram que os Ofayé, antes um grande grupo, com os
inúmeros percalços que enfrentaram ao longo do século, foram praticamente dizimados,
reduzindo-se apenas a poucas pessoas, que vivem hoje em uma reserva no município de
Brasilândia, praticamente à margem de uma sociedade que lhes tirou tudo: terra, alimento e
dignidade:
Nenhum povo que passasse por isso como sua rotina de vida, através de séculos,
sairia dela sem ficar marcado indelevelmente. Todos nós, brasileiros, somos carne
da carne daqueles pretos e índios supliciados. Todos nós brasileiros somos, por
igual, a mão possessa que os supliciou. A doçura mais terna e a crueldade mais atroz
aqui se conjugaram para fazer de nós a gente sentida e sofrida que somos e a gente
insensível e brutal, que também somos. Descendentes de escravos e de senhores de
escravos seremos sempre servos da marginalidade destilada e instalada em nós, tanto
pelo sentimento da dor intencionalmente produzida para doer mais, quanto pelo
exercício da brutalidade sobre homens, sobre mulheres, sobre crianças convertidas
em pasto de nossa fúria (RIBEIRO, 1996, p. 120).
Este trabalho está dividido em três capítulos: no primeiro capítulo, a pesquisa inicia-se
abordando uma parte do histórico dos Ofayé, dizendo quem são, onde eles viviam e
pontuando mais especificamente a região do Vale do Ivinhema. No segundo capítulo, relato o
abandono a que foram submetidos, quais as providência tomadas pelo órgão responsável pelos
mesmos e das promessas feitas e não cumpridas pela Funai. No terceiro capítulo, trata-se da
decisão que os mesmo tiveram de lutar pelo direito a terra e como continuam a luta pela
própria sobrevivência até os dias de hoje.
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Capítulo 1
A presença Ofayé no atual Mato Grosso do Sul
A história dos povos indígenas, no Estado de Mato Grosso do Sul, não foi diferente do
restante do país, pois há vários documentos que afirmam a presença de diferentes povos em
vários lugares do Estado. A região servia de passagem de grupos indígenas, que seguindo o
curso fluvial, migravam pelo interior do continente. Martins, em seu livro Breve painel
Étnico-Histórico de Mato Grosso do Sul relata:
Quando os colonizadores europeus chegaram nesta região, nas primeiras décadas do
século XVI, encontraram aqui um conjunto de sociedades indígenas, composto por
etnias representantes de três de quatro troncos lingüísticos que formam o universo
étnico- lingüístico brasileiro (MARTINS, 2002, p. 11).
No século XVI, as terras localizadas no atual Estado de Mato Grosso do Sul foram
motivo de disputas entre Portugal e Espanha. Houve o interesse em se penetrar no interior das
mesmas, pois era necessário demarcar o território, ocupar os espaços, e assim impedir que
outros adentrassem e ocupassem estas terras. Neste período, viviam aqui milhares de índios,
de diferentes etnias que foram perseguidos e expulsos de seu lugar de origem, sendo
obrigados a fugir ou se deixar escravizar:
A história deste povo, [...] é a historia da expansão capitalista pelo Centro-Oeste
brasileiro. Expansão que adentrou Mato Grosso como um vulcão branco cheio de
ódio, como escreveu o índio Xehitâ-há [...]. Ao constituir-se em núcleo de um
processo civilizatório, este vulcão branco se lançou sobre os índios em ondas
sucessivas de violência, de cobiça, de opressão. O impacto expansionista,
dominador e insaciável que fulminou os campos por onde perambulavam livres e
nus os Ofaié, foi tão profundo e conseqüente, que deixou marcas irreparáveis neste
povo, ainda assim, alegre e gentil (DUTRA, 1996, p. 84; itálicos no original).
No que diz respeito aos Ofayé, as primeiras notícias registradas sobre os índios foram
obra do etnógrafo Curt Nimuendaju, após sua expedição pelo sul do então Estado de Mato
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Grosso, no início do século XX. No Mapa Etnográfico do Brasil abaixo, organizado pelo
indigienista da Fundação Nacional do Índio-funai localiza os Ofayé na região a partir de 1710.
Figura 1: Mapa Etnográfico do Brasil.
Nimuendaju manteve contato e conviveu com quatro agrupamentos, indicando que os
mesmos tiveram contatos entre si e aponta que a região dos Campos da Vacaria constituía-se
no ponto central de localização do grupo. De acordo com o etnólogo, “Lá, nos Campos da
Vacaria, era justamente o centro da tribo, que daí se estendia até a margem direita do alto
Paraná e à esquerda do rio Yvinhema. De lá a divisa seguia pelos rios Brilhante e Dourado”
(DUTRA, 1996, p. 89).
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É necessário que se compreenda de quais Ofayé se está falando, pois como nos indica
o trabalho de Dutra, “muitos são os grupos Ofaié e muitos são os territórios apontados como
tradicionais e pertencentes a esse povo” (2004). É baseado nestas pesquisas que se faz
necessário compreendemos e distinguirmos o grupo aqui referido:
O critério utilizado para essa divisão foi o do aparente continuum manifestado pela
presença dessa etnia, ao longo de determinados períodos, ocupando áreas
geográficas distintas. De certa forma é como se houvesse um parentesco social que
unia pequenos grupos Ofayé pela língua e pelos costumes, dentro de uma mesma
circunscrição geográfica e ao mesmo tempo, inseridos dentro de contextos mais
amplos e inscritos dentro de um mesmo espaço e períodos da história. (DUTRA,
2004, p. 27).
No mapa que se segue vê-se apontados territórios e os aldeamentos Ofayé, nas
margens do rio Verde, no Porto Aroeira, no córrego Agachi, no rio Pardo, nas Águas do
Peixinho, no rio Vacaria, no rio Taboco, no rio Negro, no rio Taquaruçu, junto ao Porto
Tibiriçá, próximo ao Ribeirão das Marrecas, no rio Paraná, no rio Laranjalzinho, no ribeirão
Ivypiranga, no ribeirão Coqueiro Grande, no ribeirão Orelha de Onça, no rio Ivinhema no
ribeirão Santa Bárbara, no Porto XV de Novembro, no córrego Santa Ana, no rio Samambaia,
rio Água Limpa, no ribeirão Boa Esperança, no rio Herval, entre outros.
Figura 2: Território e Aldeamentos Ofayé (Fonte: Atlas MR-MS, 1990. Adap. Dutra, 2004)
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É possível afirmar que os Ofayé viveram na região atualmente conhecida como Vale
do Ivinhema, localizada ao sudeste do Estado de Mato Grosso do Sul. Esta região é formada
por dez municípios: sendo Anaurilândia, Angélica, Bataguassu, Batayporã, Brasilândia,
Ivinhema, Nova Andradina, Novo Horizonte do Sul, Santa Rita do Pardo e Taquarussu. Em
sua maior parte, esses municípios são resultados de uma ocupação relativamente recente,
considerando-se os últimos sessenta anos.
A segunda metade do século marcada pela chegada e a fixação de Fazendeiros
Paulistas, Mineiros e Gaúchos nos Campos de Vacaria, ocupando as regiões de
campos dos Ofaiés que aos poucos foram sendo dizimados, sob as alegações de que
seriam ladrões de gado, e que abatiam as rêses como se fossem veados ou porcos
selvagens. O certo é que nenhum esforço foi feito pelos civilizados para se
acercarem desses índios; os criadores de gado simplesmente faziam chacinar cada
grupo descoberto, quando um novo retiro de criação era fundado (RIBEIRO, 1996,
p. 102).
Houve varios vestigios da presença dos indios Ofayé nesta região do Vale do
Ivinhema, no mapa abaixo observa-se que no município de Nova Andradina havia
aldeamentos, em terras pertencentes a Domingos Barbosa Martins conhecido por muitos
como Gato Preto, que era um dos grandes proprietários de terras deste município.
Figura 3: Aldeamentos Ofayé em Nova Andradina. (Fonte: DUTRA, 2004 (IBGE, 1978)).
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Os Ofayé enfrentaram perseguições diversas. Sendo índios coletores, estavam sempre
a vagar por grandes extensões de terras, tendo o cuidado de não permanecerem por muito
tempo na mesma área. Assim, o nomadismo era um elemento importante para combater a
escassez de recursos. Viviam em pequenos grupos e isso, além de facilitar o deslocamento,
era uma das maneiras de continuarem vivos, em constante luta pela própria sobrevivência.
Denominavam a si próprios e a coletividade por Opaié e sua presença foi registrada às
margens dos rios Tietê, Pardo e Inhanduí, até o rio Aquidauana.
Dutra relata:
A partir de meados de 1880, quando fazendeiros deslocaram-se para a Reserva de
Maracaju e se estabeleceram nas vertentes do Paraná e dos campos de Vacaria, a
intensidade da ocupação obrigou os Ofayé a abandonarem suas terras, indo para o
sul do Estado, junto ao rio Samambaia, nas proximidades de Batayporã. Os Ofayé
que permaneceram as margens do Samambaia e do Ivinhema migraram para as
margens do Córrego Boa Esperança, que mais tarde passariam a integrar a fazenda
Boa Esperança, em Brasilândia. Segundo Curt Nimuendaju, “os campos de Vacaria
eram justamente o centro da tribo, que daí se estendia até a divisa, seguindo pelos
rios Brilhante e Dourados. A uns 60 km da barra deste rio, a divisa subia o espigão
divisor entre ele e o Santa Maria (DUTRA, 1996, p. 85).
Estes registros dão conta de que eram aproximadamente cinco mil índios que viviam
sempre em pequenos grupos perambulando por grandes extensões:
Cronologicamente, a referencia oficial mais antiga que se tem noticia sobre a
presença desses índios na margem direita do rio Paraná é o Mapa Etnográfico do
Brasil, organizado pelo indigenista da fundação nacional do índio - Funai, João
Américo Peret, que localiza os Ofayé nesta região já a partir de 1710 (DUTRA,
1996, p.87).
Há várias representações ortográficas utilizadas para nomeá-los: Ofaié (s), Ofayé (s),
Opaié (s), Opayé (s), Xavante (s), Chavante (s), Ofaié Xavante, Opaié Xavante, Faés, Opaie,
Faiá, dentre outras.
O uso do etnômio Xavante (ou Chavante) relaciona-se ao modo de vida do grupo,
que geralmente se estabelecia em regiões geograficamente caracterizadas pelos
campos (Savanas dai Savantes ou Shavantes) do Centro-Oeste brasileiro (RIBEIRO,
1980 [1951]).
Eles dividiam, ao norte, terras com os Kayapó, habitantes do chamado “Sertão do
Camapuã”, no alto rio Inhanduí, além dos rios Pardo e Verde. Era comum atravessarem o
Paraná, na barra do rio Santo Anastácio, para caçadas. O rio Paraná separava os territórios
daqueles índios e dos Kaingang, seus inimigos. Curt Nimuendaju, aponta quatro
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agrupamentos nas seguintes localizações:
[...] no rincão pantanoso entre o Ivinhema e o Paraná, dos dois lados do Samambaia
e ao sul do rio Pardo. Constitui-se de dois grupos que juntos perfazem
aproximadamente 100 pessoas. [...] O grupo do Vacaria, umas 30 pessoas, entre o
rio Brilhante e o Vacaria. [...] O grupo do Tabôco, nos pântanos do curso superior
do afluente esquerdo do rio Negro, denominado também Tabôco (que desemboca
abaixo de Corumbá no Paraguai). [...] umas 40 pessoas [...] O grupo do rio Verde,
aproximadamente 40 pessoas, estendia-se na ocasião da minha primeira visita, desde
a foz do Tietê até o rio Pardo e mantinha um estreito contato com os dois grupos do
sul deste último rio (Nimuendaju, 1993 [1932], p. 52-53).
De acordo com as informações de Nimuendaju, entre o final do século XIX e o início
do XX, os grupos Ofayé das proximidades dos Campos da Vacaria até o rio Paraná estavam
estabelecidos em territórios vizinhos e/ ou mantinham relações de contato com outras
sociedades indígenas, dentre elas os Guarani, os Kayapó, os Guaikuru ou Mbayá e os
Kaingang. As relações entre os Ofayé e este último grupo, desde os tempos mais remotos, não
foram amistosas, pois havia incursões de parte a parte, assaltos e raptos de mulheres e
crianças:Costumavam os Ofaié atravessar o Paraná para as suas caçadas na margem esquerda,
mas como nesta época os Kaingang já não freqüentavam mais as margens do rio Paraná não
me consta ter havido encontro algum entre as duas nações (NIMENDAJU, 1993 [1913], p.
102).
O primeiro contato pacífico que tiveram com os não índios provavelmente é o que se
tem registrado, em 1903, pelo General Rondon, quando os mesmos eram estimados em 2.000
indivíduos:
Ao descer aquele rio, depois de uma curva muito fechada, deparou com um grande
acampamento de caça destes índios, todos fugiram e ele pode observar detidamente
os fogos em que assavam a carne de veado e caititu; esteve, então, com dois deles
que, embora cheios de terror, atenderam aos seus insistentes chamamentos. Dias
depois atraídos pelo bom trato e pelos presentes recebidos pelos dois companheiros,
um grupo numeroso de homens visitou o acampamento da comissão ficando um
deles com o General Rondon até o termino do trabalho no rio Negro (RIBEIRO,
1976, p. 88).
Quando se iniciou por estas regiões a ocupação de terras para formação de fazendas de
gado, que viria transformar a economia do país, os índios desta região foram forçados a
abandonar suas terras. Com a chegada de fazendeiros, eles foram obrigados a deixar esta
região, abandonar seu próprio território, pois não eram benquistos e tiveram que fugir, se não
quisessem morrer nas mãos dos funcionários a mando dos “novos” senhores da terra:
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A crescente ocupação econômica do tipo pastoril, cada vez mais se interessa por
novos pastos para seus rebanhos, e isso acaba agindo de maneira decisiva sobre a
economia e os povos indígenas do sul do Estado. A região é praticamente tomada de
assalto, resultando para os Ofaié verdadeiro ciclo de forçadas migrações. Sobretudo
com o surgimento das fazendas, já com feições modernas e constituídas de pastos
delimitados por cerca de arame farpado. Cercas que, se por um lado se tornavam
indispensáveis à contenção dos rebanhos, por outro, eram o maior impedimento ao
livre trânsito dos índios e motivo para persegui-los (DUTRA, 1996, p. 94).
Sendo obrigados a deixarem estas terras, os Ofayé se dividiram em grupos indo cada
grupo para uma direção diferente, lutando por sua sobrevivência. Por muitos anos, não se
ouviu falar deles, e foi neste momento que Darcy Ribeiro encontrou um pequeno grupo.
Passei quatro semanas então com o que restava dos índios Ofaié. Era um grupo
mínimo, representado por duas famílias de dois irmãos... Viviam em dois ranchos
pegados um no outro à margem esquerda do ribeirão Samambaia, pouco antes de sua
desembocadura no Ivinhema. Vestiam-se, cultivavam a terra, criavam porcos, galinhas
e patos do mesmo modo que os vizinhos neobrasileiros mais pobres. Saíam às vezes
para trabalhar como peões, lenhadores e lavradores nas fazendas vizinhas. Assim,
conseguiam algum dinheiro para comprar panos, remédios, sal, fósforos e poucos
artigos mais (RIBEIRO, 1976, p. 85).
Figura 4: Foto aérea da área adquirida em 1997. (autor desconhecido, s/d)
Os Ofayé tiveram tempos dificeis em decorrencia da perda de terra e também devido a
escassez de alimentos que foi provocada pela exploração dos colonizadores e o abandono de
autoridades, que tinham a obrigação de protegê-los. Sem terra para caçar e para fazer suas
coletas, sem espaço para continuar vivendo da própria natureza, foram obrigados a se adequar
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às condições de vida que lhes foram impostas, como trabalhar num regime de servidão em
péssimas condições de subsistência, recebendo em troca somente alimentos básicos para a
continuidade de suas vidas e morando de favor em terras que antes eram deles.
Perdido o controle físico do grupo por parte do órgão oficial, por vinte anos não se
ouve mais falar em Ofayé. Convivendo com esta idéia, a sociedade civil mais
esclarecida acaba também por esquecê-los. A anônima resistência de um pequeno
grupo que não soçobrou, entretanto os mantém unidos na língua e nos costumes.
Desafiam de maneira admirável a imposição cultural que lhes é imposta,
preservando um mínimo de seu modus vivendi. [...] Darcy Ribeiro, em 1970,
considera-os extintos como entidade étnica. Também o órgão tutor, cômoda e
interesseiramente, sugere o extermínio como solução para o problema da
expropriação da terra do povo Ofayé (DUTRA, 1996, p. 129).
Lutando pela sobrevivência, um grupo de índios Ofayé veio para o sudeste do Estado
de Mato Grosso do Sul perto do rio Samambaia, próximo a Batayporã, permanecendo nesta
região entre os rios Samambaia e Ivinhema. Não compreendendo e não aceitando esta
situação, passaram a mendigar pelas ruas da cidade de Brasilândia, onde estão enterrados seus
ancestrais. Eram homens, mulheres, velhos e crianças mendigando por um pouco de alimento.
Vivendo por muitos anos nesta situação, o jornal O Estado de São Paulo rompeu a lógica do
silêncio e apresentou ao Brasil a “redescoberta” do povo Ofayé.
O referido jornal1, em 1976, por meio do jornalista Luiz Carlos Lopes, escreveu que
um grupo de Ofayé com apenas 24 remanescentes viviam em profundo estado de miséria.
Segundo o jornalista,
Depois de formarem um grupamento que no final da década de 40 contava com mais
de 200 habitantes, os índios Xavantes, da Aldeia Esperança, em Brasilândia-MT,
estão em extinção: o sarampo, a varicela e a catapora contraídas nos primeiros
contatos com os brancos e que provocaram dezenas de mortes, foram substituídas
pela tuberculose, anemia e pelo alcoolismo. Os 24 remanescentes da tribo continuam
morrendo e num ritmo cada vez mais intenso, o que fatalmente provocará seu total
desaparecimento nos próximos anos, caso não sejam adotadas urgentes providências
para sua proteção (apud DUTRA, 1996. p. 141-144).
Apesar das denúncias, naquele momento nada foi feito para tentar minimizar o
sofrimento daquela gente e, somente em 1978, a Funai decidiu procurá-los e propôs a
transferência deles para a região da Serra da Bodoquena.
1
Doenças Dizimam Grupo de Xavante de Mato Grosso (Da Regional de Marília. O Estado de São Paulo,
06.08.76). Publicado em DUTRA, Carlos Alberto dos Santos. Ofaié: morte e vida de um povo. Campo Grande:
Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul, 1996.
22
Capítulo 2
Os Ofayé ontem e as falsas promessas
Acampados na Fazenda Boa Esperança, num total abandono, sem alimentos, sem
trabalho e entregues ao vício da bebida alcoólica, que se tornara para eles um refúgio para
tentar esquecer um pouco do sofrimento que este grupo sempre enfrentou ao longo de séculos,
os Ofayé estavam mais uma vez abandonados, suportando muitas diversidades como algumas
doenças favorecidas pelo próprio ambiente a que estavam submetidos, bem como a
tuberculose que afetava tanto adultos como crianças.
Nas palavras de um dos entrevistados pelo O Estado de São Paulo, devido ao
sofrimento que seu povo vinha sendo submetido, os Ofayé estavam abandonando suas
tradições e sua cultura material, revelada na fabricação das próprias armas, tais como o arco e
a flecha. Onde estavam vivendo não tinham como cultivar o próprio alimento e sobrevivendo
neste completo abandono nem a Funai se responsabilizava pelos mesmos, simplesmente eles
estavam ali, à própria sorte.
Mesmo com a publicação da reportagem que alertava a todos sobre o fato de que
aquele povo corria o risco de deixar de existir, quase nada foi feito de fato para mudar a
situação, eles estavam à mercê de uma sociedade que os ignorava. Contavam somente com
uma pequena ajuda da prefeitura municipal de Brasilândia e de um grupo religioso que
procurava amenizar um pouco todo aquele sofrimento. Viviam nestas condições precárias e
adversas a qualquer ser humano, à espera que solucionassem ou amenizassem toda aquela
amargura.
O indígena Ofayé Ataíde Francisco - Xehitâ-há narra que:
Somente no final de 1977 a Funai esteve presente na área, através de seu funcionário
de nome Jamiro. Pois o sr. Jamiro sentou no chão e olhou para os índios dos pés a
cabeça. Depois começou a falar que os Ofayé tinham que sair daquele lugar, caso
23
contrário iriam morrer todos ali. “Vocês precisam sair daqui, vocês vão morrer junto
destas vacas. Vamos para uma reserva que só tem índio” (DUTRA, 1996, p. 44).
Por não terem outra opção, a proposta feita pela Funai de transferi-los para a Reserva
Indígena Kadiwéu trouxe a eles uma nova esperança, a de que poderiam finalmente ter a
chance de viver em um lugar que pudessem chamar de seu, pudessem morar, plantar, colher,
criar seus filhos e viver em paz. Não obstante, teriam a oportunidade de uma vida melhor para
seu povo. Enchendo-se de novas esperanças e acreditando nesta oportunidade, decidiram
tentar em outras terras um novo recomeço:
O caminhão chegou para levar os índios acompanhado de outros carros pequenos.
Tinham muita gente interessada na nossa transferência, principalmente os
fazendeiros. Todos os Ofaié logo estava pronto para a mudança. Os seus, aliás, os
nossos pertences estavam sendo colocados numa picape (DUTRA, 1996, p. 48).
Um longo caminho foi percorrido por eles até a reserva Kadiwéu, neste mapa podemos
ver qual trajeto feito por eles.
Figura
5:
Mapa
(BORGONHA, 2006 p.58)
apontando
o
caminho
percorrido
até
a
reserva
Kadiwéu
24
Após dias de longa viagem, chegaram à reserva e descobriram que, infelizmente, a
realidade era outra, pois eram falsas as promessas iniciais que foram feitas. Além dos índios
Kadiwéu que viviam na reserva, estavam ali também muitos posseiros, que disputavam a área
com os demais, gerando discórdia e violência. Foi neste momento difícil que os Ofayé
chegaram à aldeia e se viram no meio de uma grande briga, entre os posseiros, a Funai e os
índios Kadiwéu.
Devido aos atritos que ocorriam no local, os Ofayé não foram recebidos com
cordialidade e sim com hostilidade, já que eram mais pessoas com quem os Kadiwéu teriam
que dividir as terras. E foi assim que aqueles índios foram deixados ali, desamparados, numa
terra desconhecida e vistos como intrusos. Questionando o órgão responsável por sua
transferência, foi lhes dito que teriam que ter paciência, expulsar os posseiros e aguardar até
que os problemas fossem solucionados. Naquele local, receberam ameaças e foram
humilhados.
Ali, durante oito anos os Ofayé tiveram que suportar toda sorte de desespero e
miséria. Para não passar fome tivemos que trabalhar para os brancos. O pessoal da
Funai se negava a ajudar os Ofayé a plantar alguma coisa. O pessoal da Funai dizia
que os Ofayé poderiam ter o direito de escolher uma área melhor com a saída dos
posseiros (Ataíde Francisco-Xehitâ-há, testemunha do massacre apud DUTRA,
1996, p. 53).
Foram vários os desmandos contra os Ofayé na reserva, visto que, do que havia sido
prometido, nada fora cumprido e eles não tinham a quem reivindicar qualquer auxílio.
Sem morada, sem alimento, sem remédios, os ofayé estavam ali, não como índios.
Não sei como o que, enganados pela Funai. Tinham que pedir raiz de mandioca para
os posseiros. E muitos dele aliviaram o sofrimento dos Ofayé, enquanto a Funai
continuava omissa. (Ataíde Francisco-Xehitâ-há apud DUTRA, 1996, p. 50).
Já no ano de 1985 os Ofayé receberam um aliado na Reserva, que devolveu a eles um
novo ânimo, fazendo renascer neles a esperança.
Através do missionário Carlos Alberto Dutra, de lá para cá, o CIMI esteve sempre
presente junto aos Ofaié, animando a comunidade, divulgando sua causa, fazendo
novos aliados e, junto com os índios, empreendendo a luta para atingir o objetivo
maior: reconquistar o território Ofaié que possibilitará a sobrevivência física e
cultural desse povo (MANGOLIM, 1993, p. 41).
Com forças renovadas, eles tentavam superar todo o sofrimento que enfrentaram neste
período, tentavam resistir e conseguir ter de volta o seu território na esperança de que dias
25
melhores viriam, e que seriam finalmente reconhecidos como pessoas humanas e tratados com
dignidade. Entretanto, naquele momento histórico, os dias passavam e nada mudava.
O desrespeito contra os Ofayé era revoltante. Até mesmo pelos funcionários da
Funai. Os mesmos traziam muita pinga para embriagar os Ofayé e depois se
aproveitavam de suas mulheres. Foram estupradas três meninas Ofayé: uma de nove
anos, outra de onze e outra de quinze anos. Os estupradores foram dois índios e um
branco (Ataíde Francisco-Xehitâ-há apud DUTRA, 1996, p. 53).
Dessa forma, viveram por oito anos na reserva, sendo subjugados, humilhados e
enfrentando várias dificuldades. Sem ter quem pudesse socorrê-los, sem ter mais esperanças
que ali as coisas iriam melhorar, eles decidiram voltar para Brasilândia. No ano de 1986
fizeram o caminho de volta e, sem o apoio da Funai, percorreram parte do trajeto a pé,
praticamente fugidos, deixando para trás algumas poucas coisas que conseguiram ter ao longo
dos anos em que lá viveram. Retornaram para o local onde parte de seus antepassados havia
sido enterrada: Saímos todos revoltados. Não com os kadiwéu, mas com a Funai que não deu
nenhuma satisfação. Por isso que nos não a procuramos. Porque nos acreditávamos que ela
não iria fazer nada por nós (DUTRA, 1996, p. 59).
Mapa identificando a localização do Município de Brasilândia
Figura 6: Mapa com a localização do Municipio de Brasilândia.
26
Quando chegaram à Brasilândia, município destacado no mapa acima eles acamparam
à margem direita do rio Paraná, em um total de 61 indivíduos, dos quais 46 eram Ofayé,
sendo 13 adultos do sexo feminino, 17 adultos do sexo masculino e 16 crianças de ambos os
sexos. Convivendo com os Ofayé, encontravam-se, também, cinco Guarani-Ñandeva, seis
Guarani-Kaiowá e quatro não índios, casados com Ofayé. Ao retornarem, estavam decididos a
lutar para terem de volta as terras a que tinham direito.
Em 1987 teve início a campanha “Ofaié Xavante – ainda estamos vivos” (liderada
pelo cacique Ataíde Francisco, Cimi, UFMS, CPT, PT-MS, UNI-MS, entre outros)
em prol da demarcação de suas terras, que culminou na identificação de uma área de
quase 2 mil ha em 1991, a qual, no entanto, estava tomada por fazendeiros. As
denúncias sobre as más condições de vida dos Ofaié (que incluíam até trabalho
escravo em algumas fazendas) levaram a que vereadores de Brasilândia-MS e alguns
municípios do Oeste paulista também enviassem moções de apoio aos Ofaié,
pedindo à Funai uma solução para o desterro dos Ofaié. A Funai de Campo GrandeMS, em parceria com o Cimi, conseguiu então da parte do Sr. Luiggi Cantoni,
proprietário da Fazenda Olympia, do Grupo Cisalpina, o arrendamento em regime
de comodato de 110 hectares dentro das terras da fazenda Cisalpina para que o
grupo, que nessa época contabilizava 70 pessoas, se reunisse. No entanto, em alguns
anos essa área seria inundada para a formação da represa da Usina Hidrelétrica
Engenheiro Sérgio Motta (ex-Porto Primavera), de propriedade da Companhia
Energética de São Paulo (CESP). 2
Eles conseguiram uma área provisória às margens do Rio Paraná, próxima ao
município de Brasilândia. Com a construção da Usina Hidrelétrica de Porto Primavera, os
índios Ofayé se viram novamente obrigados a abandonar o local. Devido à inundação da
referida área, foram transferidos para um novo local, uma área adquirida pela Cesp, como
parte da indenização a qual tinham direito.
2
http://dutracarlito.vilabol.uol.com.br. Acesso em 10 junho de 2010.
27
Capítulo 3
Os Ofayé hoje e as novas esperanças
Ao voltarem para Brasilândia, após decidirem que não mais ficariam na reserva
Kadiwéu (pois entenderam que ali nunca poderiam considerar de fato como seu lugar), os
Ofayé iniciaram uma intensa luta pela própria terra. Com a decisão tomada, renasceram novas
esperanças para aqueles índios e para conseguirem seus objetivos, resolveram que deveriam
lutar por seus direitos, pois só assim conseguiriam conquistar o tão desejado território
tradicional. Dessa maneira, perceberam que não mais deveriam acreditar em falsas promessas,
que não foram cumpridas. Na reserva Kadiwéu, não haviam recebido apoio ou estrutura que
dessem a eles condições de terem ali uma vida digna:
Ataíde foi uma liderança atuante e decisiva no regresso ao território que os Ofayé
consideravam ancestral. Ele fala... “como cacique eu já enfrentei de tudo. Eu trouxe
esse povo, trouxe não, eu vim também junto, né, ai nois viemos para Brasilândia”
(Ataíde, Comunidade indígena Ofayé, 2005). Com o apoio do CIMI, alguns Ofayé
conseguiram empregar-se em fazendas e outros foram instalando-se em áreas
provisórias no município de Brasilândia. Apesar da dispersão do grupo, Ataíde
continuou atuando para a demarcação de uma área para os Ofayé, tornando-se um
mediador intercultural por excelência (BORGONHA, 2006, p. 47-48).
Ao retornarem, perceberam que até mesmo a área em que tinham seu acampamento
anteriormente, havia sido tomada por não índios; em entrevista a Borgonha o índio Ofayé José
diz.
Aí nós se agrupamos todos lá [na área arrendada da fazenda Sezalpina]. Até as
famílias que tava na fazenda, né, foram pra lá. Aí foi, a população se uniu e criou a
comunidade de verdade. [...] lá na Sezalpina [...] então, nós ficamos lá esperando. O
que plantava lá, colhia, lá pra nós era um sucesso, né. Tinha peixe, a gente pescava.
Aí, mais ou menos em 90, aí, nós tivemos informações que toda a barragem do Rio
Paraná ia sê inundada, ia sê inundada pela águas do Rio Paraná. Aí, a gente ouve
esse comentário, daí, a gente quase não acredito. Aí mais tarde veio informações que
a CESP ia tirá tudinho os civis daí, da barranca do Rio Paraná, e dá propriedade em
outro lugar. Aí, a CESP começou a fazê o levantamento. Passou lá na nossa aldeia
também, fez o levantamento também com nós e com todos os ribeirinho que
moravam, toda a população que morava na beira do rio, os pescadores, os oleiro, e
nós. Aí o [...] começo a trabalhá com a gente. Acho que achou a população indígena
mais complicada, daí eles tiveram contato com a Funai, e também com a igreja
católica, com o CIMI também em todo esse processo. Mas como a Funai é a tutela
28
do índio, é, tomou a frente da questão, nessa questão de mudança, de transferência
de uma área pra outra. Aí foi feito várias discussões, o pessoal da CESP conversou
um monte com os índios, o que que eles queriam, qual que era o futuro deles se eles
saísse dali. Aí mais uma vez, a gente tava, a gente não entendia nada. A gente não
pedia nada pra eles, a gente não sabia que o que a gente solicitasse ela podia dá.
Bom, aí a gente pediu a terra (BORGONHA, 2005, p. 65).
Após anos de luta e espera pela terra, atualmente, os Ofayé vivem em uma reserva
localizada no município de Brasilândia, área recebida como parte da indenização a qual
tinham direito e que conseguiram após longas demandas judiciais.
Em razão da inundação da área ocupada pelo Ofayé, a Cesp, a título de indenização
aos indígenas e com a intermediação do Cimi, firmou convênio com a Funai e
comprometeu-se a financiar a demarcação da Terra Indígena Ofayé, incluindo a
retirada dos fazendeiros, e empreender outras medidas compensatórias, entre as
quais a recuperação ambiental da área identificada, que estava num estado avançado
de degradação. 3
Com as lutas encabeçadas na época pelo cacique Ataíde Francisco, e que contaram
com o apoio de algumas instituições, tais como a prefeitura municipal de Brasilândia, a Funai,
a Igreja e membros da comunidade que se solidarizaram pela causa, somente em 1994 eles
receberam a primeira parte da terra a que tinham direito. Em 1997, conseguiram efetivamente
ser transferidos para a área atual, que está localizada próximo ao território imemorial dos
Ofayé, antes identificado pela Funai:
A primeira coisa que eles [CESP] fizeram, é, compraram essa terra aqui, de 484
hectare. Aí foi feito alguma estrutura, como a escola, a rede de energia elétrica, o
posto de saúde também foi implantado e aí, e as casas que foi feito aqui. [...] o
primeiro passo que a empresa fez foi esse. Primeiro foi a compra da terra e o
segundo foi a estrutura. Aí o terceiro foi a nossa transferência pra cá. Aí houve uma
polêmica porque no convênio foi pedido o projeto de agricultura, pecuária,
piscicultura, e só que todo o projeto que tava no convênio firmado com a Funai não
iria ser implantado aqui. Era pra ser implantado na área onde tava sub judice, que
tava na justiça. Era pra ser implantado tudo lá. Aí no convênio também a Funai
pediu para que a empresa arcasse, com as despesas de toda a benfeitoria das
fazendas onde foi reconhecido como área indígena. “E pagasse isso pra eles sair de
lá da propriedade e liberar a área pros índio. E aí deu toda aquela polêmica. Como
é que a CESP vai tirar nós daqui, não, a nossa terra é aqui, a gente não vai sair’, os
fazendeiros alegaram isso. Aí não teve acordo” (José, Comunidade Indígena Ofayé
Xavante, 2005) (BORGONHA, 2006, p. 68).
Sobre a questão destas terras, Dutra escreveu na página eletrônica do Instituto
Socioambiental que:
3
http// merciogomes.blogspot.com/ Acessado em 15/10/2008.
29
Além dos 1,6 milhão utilizados para o pagamento das indenizações das terras, eles
receberam recursos que foram repassados ao Governo do Estado destinados a
diversos projetos agropecuários, como aquisição de materiais, implementos
agrícolas, animais de tração, preparo e correção de solo, plantio de mandioca, arroz,
milho, feijão, cana de açúcar, napier, fruticultura, gado leiteiro, avicultura, aquisição
de eqüinos, suínos, ovinos e construção de tanques de piscicultura. 4
Entrada da reserva em Brasilândia
Figura 7: Entrada da Reserva em Brasilândia
Em projeto, também ficou acertada a construção de novas casas para dar aos índios
uma melhor condição de moradia, com água encanada e luz elétrica. Na imagem acima é
possível ver a entrada da reserva, os Ofayé contam com um posto de saúde para atendimento
médico e odontológico, realizado duas vezes por semana, uma escola de ensino básico que
atende as crianças nos primeiros anos do Ensino Fundamental.
Os Ofayé não mais ensinavam as suas crianças à língua materna e para reverter esta
situação puderam contar com o trabalho da professora e funcionária da Funai, a Pankararu
Maria das Graças de Oliveira, sendo ela a primeira indígena brasileira a obter o título de
Doutora na academia. Ela elaborou sua tese em Linguística junto ao povo Ofayé, com o
interesse em registrar a língua que já estava em desuso por grande parte dos mesmos.
4
http://dutracarlito.vilabol.uol.com.br. Acesso em 15/08/2010.
30
Para desenvolver este trabalho, Oliveira conviveu com os Ofayé por certo período,
contribuindo diretamente para preservar a cultura deste povo. Quando fez sua tese, havia
somente onze pessoas falantes da língua Ofayé, que estava seriamente ameaçada de
desaparecer. Os próprios índios não tinham mais interesse em ensinar a seus filhos a língua
materna, considerando o sofrimento e discriminação, além do preconceito que enfrentavam
por parte do não índio, não queriam que seus filhos enfrentassem mais uma barreira: a de falar
outra língua.
Na aldeia vivem juntamente com os Ofayé alguns índios Guarani que se uniram em
matrimônio e vieram juntos da reserva dos Kadiwéu, quando lá viveram. Também há os não
índios que também se casaram e vivem na aldeia. As famílias recebem, mensalmente, cestas
básicas doadas pelo governo do Estado, algumas famílias plantam feijão, mandioca, laranja,
abacaxi, dentre outros alimentos, para o próprio consumo e o excedente vendem na cidade
para ajudar na renda.
Muito das antigas tradições dos índios se perderam, sendo que algumas permanecem
apenas nas lembranças e histórias que contam aos seus filhos, tais como as grandes pescas e
caças que seus pais e avós faziam por terras do Estado, as grandes festas que havia no centro
da aldeia e que serviam para celebrar datas importantes como o nascimento, festas religiosas
dentre outras. Em compensação, eles mantêm vivos entre eles o amor pela família, a alegria
de viver, a simplicidade no modo de ser, o artesanato que ainda fazem e seus cantos que
entoam.
Em entrevista a um Blog Carlos Alberto dos Santos Dutra, diz que a qualidade de vida
dos índios melhorou apenas para duas ou três famílias que se mudaram para os 605 hectares,
produzindo e criando gado. A grande beneficiada com a área, segundo ele, foi a Associação
Indígena Ofayé que arrendou quase a totalidade da área para os fazendeiros colocarem gado.
“Só que o dinheiro do arrendamento não chega a todos na aldeia, pois ele é controlado por
dois indígenas que acabam gastando todo o recurso em bebida alcoólica e despesas pessoais”,
denuncia. Dutra observa que falar das necessidades dos índios hoje, seria falar da sociedade
envolvente, pois na verdade as necessidades dos Ofayé nascem da própria dificuldade que o
grupo encontra em prover o seu sustento de forma planejada, o que os órgãos públicos nunca
buscaram organizar. As famílias que plantaram feijão, por exemplo, com a alta do preço,
conseguiram vender bem o produto. Mas a maioria não plantou, vendeu a semente mesmo
antes de plantar e fez opção por receber cestas básicas:
31
A maioria compra carros velhos e os encostam no fundo do quintal. Nesse aspecto
eles não são muito diferentes de nós capitalistas e nossa sociedade de consumo.
Poucos Ofaié saem para trabalhar. Os kaiowá saem mais, para trabalhar em
carvoarias e fazendas. Os Ofaié mais jovens hoje vivem da mendicância pelas ruas
[...]. 5
Vivem na aldeia Ofayé, 72 pessoas, em 21 moradias de alvenaria, compostas por
quatro cômodos, com água encanada e energia elétrica. Estas novas casas foram construídas
pelo governo do Estado, fazendo parte do Projeto Casa do Índio Ofayé – Xavante –
Brasilândia – MS, construídas com recursos do Programa Novo Habitar. Destas 21 casas, 18
ficam na primeira área de 485 hectares e as demais estão localizadas na área imemorial de 605
hectares, que estão com uma certa vantagem junto aos demais, por ser uma terra de melhor
qualidade.
Entre os moradores da área indígena, 45 pessoas são Ofayé, 19 são filhos de um
indivíduo Ofayé com um indivíduo Guarani, 7 são filhos de um indivíduo Ofayé
com um indivíduo não-índio e os demais se consideram filhos de pai e mãe Ofayé;
26 pessoas são Guarani (entre eles há Guarani Kaiowá e Guarani Nhandéva) e 4
pessoas são não-índias. As distintas identidades aparecem bem marcadas no
convívio e na co-residência, distinção também presente em seus discursos de autoafirmação étnica [...]. Outra característica da população da aldeia é que essa oscila
constantemente. A variação demográfica está relacionada, em especial, aos
deslocamentos e às mudanças de residência dos Guarani, que vêm das aldeias do sul
de Mato Grosso do Sul para a área indígena Ofayé. No início do trabalho de campo
(fevereiro de 2005) moravam na aldeia 71 pessoas, as quais estavam distribuídas em
19 residências. Em junho de 2005, a população da aldeia era de 75 pessoas,
habitando 21 residências. No mesmo período, ocorreram dois novos casamentos e a
vinda de uma família Guarani (BORGONHA, 2006, p. 70).
Neste local foi perfurado um poço semi-artesiano de água, além da construção de um
posto de saúde, uma escola, um barracão comunitário, e passaram receber cestas básicas
durante um ano. Como não havia córregos no local, os Ofayé continuaram a reivindicar suas
terras tradicionais, pois naquele local o solo era impróprio para qualquer tipo de lavoura e por
nove anos os índios dependeram do fornecimento de cestas básicas para sobreviver.
Assim, é possível sugerir que fora dado a estes índios um território, certa condição
para sobreviverem. Contudo, é imprescindível salientar a necessidade de haver um
fortalecimento cultural, haja vista que a sobrevivência de uma etnia não corresponde apenas a
terra e ao alimento, mas à cultura, à arte e às condições de desenvolvimento. Enfim, o
trabalho de reconstrução histórica de um povo vai além de minúcias, precisa ser solidificado,
5
http// merciogomes.blogspot.com/ Acessado em 15/10/2008.
32
precisa que permaneça nas crenças, nos mitos, nas lendas, na viagem ao passado daqueles que
desejam permanecer no presente e no futuro.
33
Conclusão
Este trabalho procurou realizar um breve estudo sobre a história do povo Ofayé, que
viveu e vive hoje no atual Estado de Mato Grosso do Sul. Resistiu aos momentos em que
quase liquidaram sua cultura, seus saberes ancestrais, suas religiosidades e crenças, seus mitos
e lendas, sua língua materna e arrasaram seus espaços de vida, acabaram com seus meios de
sobrevivência levando-os à quase extinção. Os Ofayé, porém, resistiram mesmo contra todo o
uso de discriminação e violência que sofreram ao longo de sua história. Hoje, continuando
vivos, lutam por dias melhores e desejam serem respeitados e reconhecidos como seres
humanos que são.
Esta é uma pesquisa de relevância histórica, implica no conhecimento a respeito deste
povo sofrido, batalhador, uma trajetória de resistência e persistência, adaptando-se a novos
locais nos quais reaprenderam a viver. Mesmo quando tiveram suas terras invadidas, quando
acabaram com seus campos de caça, quando lhes impuseram outra religião, permaneceram
com suas antigas crenças. Enfim o homem “civilizado” desejou destruí-los, física e
moralmente, contudo não conseguiu, pois eles permanecem vivos e vivos em todos os
sentidos.
Outro aspecto importante deste trabalho foi o de reunir informações que possam servir
de referencial, ou ponto de partida, para professores e alunos da Educação Básica do
município de Nova Andradina, que desejam estudar e conhecer a história local. Não obstante,
seja também referência para outros que desejam continuar a pesquisar, estes que estiveram
nesta região e no passado foram considerados “uma grande nação”, mas que, infelizmente,
muitos não tinham este conhecimento. É possível perceber esta falta de informação, quando,
em pesquisa de campo, as pessoas relataram não conhecer este trecho da história regional,
quase esquecida.
Infelizmente, em Nova Andradina e no Estado de Mato Grosso do Sul, poucos tem
conhecimento sobre os Ofayé, desconhecem que muitos deles próprios são descendentes dos
índios que viveram na região do Vale do Ivinhema e que habitaram estas terras antes da
chegada dos “colonizadores”, e estiveram presentes na história deste Estado, como
sobreviventes que não perderam a esperança e lutam até os dias atuais para que seus direitos
34
sejam respeitados e sua cultura preservada, desejando levar para a posteridade suas heranças,
cultural e material.
Dentre toda a cultura material Ofayé legada pelos antepassados, destaca-se a música e
a fabricação de arcos e flechas. Infelizmente, ambos estão praticamente perdidos nas
lembranças dos índios que vivem atualmente em Brasilândia. Apesar disso, renovam-se as
esperanças de que dias melhores virão, pois, afinal, eles sobreviveram...
35
Referências
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do Centro Oeste brasileiro. 2006 Dissertação (Mestrado em Antropologia social). Ufsc,
Florianópolis, 2006.
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Estudos e Ação Social, nº 121, p. 31-40, maio/jun. 1989.
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36
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_____________. O Povo Brasileiro: A formação e o sentido do Brasil. 2º ed., São Paulo:
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A presença indígena Ofayé no Mato Grosso do Sul