ACOPLAMENTO MOLECULAR E MODELAGEM FARMACOFÓRICA DE
DERIVADOS NUCLEOSÍDICOS CANDIDATOS A INIBIDORES DA UDP-NACETILGLICOSAMINA PIROFOSFORILASE DO FUNGO Moniliophthora
perniciosa
Genilson Costa Santos1; Manoelito Coelho dos Santos Júnior2.
1. Bolsista PROBIC, Graduando em Ciências Farmacêutica, Universidade Estadual de Feira de Santana, e-mail:
[email protected]
2. Orientador, Departamento de Saúde, Universidade Estadual de Feira de Santana, e-mail: [email protected]
PALAVRAS-CHAVE: UDP-N-acetilglicosamina pirofosforilase, acoplamento molecular,
modelagem farmacofórica.
INTRODUÇÃO
O cacaueiro (Theombroma cacau L.) é uma planta pertencente à família
Esterculiaceae, provavelmente originada da Bacia Amazônica e cultivada nas regiões
tropicais do mundo. O interesse de cultivo desta espécie está no aproveitamento de suas
sementes (amêndoas) para a produção de manteiga de cacau e chocolate (ALVES, 2002). A
cultura do cacau marcou época na economia brasileira, sendo uma das principais fontes
geradoras de divisas da década de 70. Nesta época, cerca de 90% da produção era destinada à
exportação (BASTOS, 1987).
A partir de 1989, ocorreu uma queda da produção de cacau, o que, em parte, pode ser
explicado pelo surgimento e desenvolvimento do fungo Moniliophthora perniciosa, que é
responsável por uma praga conhecida como vassoura-de-bruxa do cacaueiro (PEREIRA et al.,
1990). Esta praga é uma enfermidade responsável por danos que compreendem efeitos
econômicos e sociais, além do impacto agronômico imediato, e devido à mesma o Brasil
passou a importar o cacau (COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA, 2002).
Vários compostos químicos vêm sendo testados com o objetivo de prevenir ou
erradicar a vassoura-de-bruxa, porém os resultados não têm sido satisfatórios (OLIVEIRA;
LUZ, 2005). Inibidores da biossíntese da parede celular bacteriana como as penicilinas e
cefalosporinas, têm apresentado bons resultados no controle de infecções bacterianas. De
forma similar, a parede celular dos fungos é um bom alvo para o desenvolvimento de potentes
antifúngicos (GRIFFITH; TRACY, 2002). Na busca por um controle efetivo da vassoura-debruxa, escolheu-se a rota metabólica que leva a síntese da quitina, principal componente da
parede celular fúngica.
Este projeto teve como tema o desenvolvimento de inibidores para a UDP-Nacetilglicosamina pirofosforilase (UNAcP), enzima envolvida no ciclo da quitina,
empregando-se para esse fim estudos de acoplamento molecular e modelagem farmacofórica,
tendo como base derivados nucleosídicos, uma vez que os compostos que podem ser
reconhecidos pela pirofosforilase apresentam tal grupamento em sua estrutura (PENEEF et
al., 2001; MARUYAMA et al., 2007). O trabalho justifica-se no interesse socioeconômico,
pois a inibição da enzima pode ser uma forma de controle da vassoura-de-bruxa, o que pode
contribuir para o aumento da produtividade dos estados produtores de cacau.
METODOLOGIA
Um núcleo nucleosídeo foi construído, tendo como base azotada a uracila e a pentose
sendo a desoxirribose. Utilizando o seu Simplified Molecular-Input Line-Entry System
(SMILE), esse composto foi submetido ao Zinc12 data base (IRWIN et al, 2012), utilizando
como critério de seleção o valor de similaridade de 90%. Os compostos encontrados nessa
busca foram subsequentemente otimizados no programa GAUSSIAN 9W utilizando o método
semi-empírico PM6 (STEWART, 2007).
O estudo de acoplamento molecular foi realizado no programa AUTODOCK VINA
1.1.2, que utiliza o algoritmo Iterated Local Search Global Optimizer para busca estocástica
(TROTT; OLSON, 2010), esta etapa foi realizada em triplicata. Para o acoplamento foi
utilizada a proteína modelo construída por Santos Junior e colaboradores (2013). O modelo
utilizado possui dois substratos em seu sitio ativo, sendo assim, foram construídas três caixas
de ancoragem, sendo uma envolvendo a acetilglicosamina-1-fosfato (SA1), outra no UTP
(SA2), e por fim, uma que agrupasse tanto a acetilglicosamina-1-fosfato quanto o UTP (SA3).
SA1 foi definida como um cubo com centro geométrico na acetilglicosamina-1-fosfato,
possuindo dimensões de 10 x 10 x 10 Å, espaçamento de pontos de 1Å e coordenadas X, Y e
Z de -53.716, -15.923 e 77.297, respectivamente. SA2 foi definida como um cubo com centro
geométrico no UTP, possuindo dimensões de 14 x 10 x 6 Å, espaçamento de pontos de 1Å e
coordenadas X, Y e Z de –61.543, -20.034 e 77.297, respectivamente. SA3 foi definida como
um cubo com centro geométrico entre a acetilglicosamina-1-fosfato e o UTP, possuindo
dimensões de 18 x 14 x 16 Å, espaçamento de pontos de 1Å e coordenadas X, Y e Z de 58.323, -18.926 e 79.633, respectivamente.
Os resultados foram organizados de acordo com a energia de afinidade e as geometrias
foram utilizadas para a modelagem farmacofórica, sendo utilizado para isso o programa
LigandScolt 3.0. Para geração do consenso farmacofórico, o LigandScolt possui um módulo
capaz de importar para um único campo diversos mapas de interação e em seguida realiza o
alinhamento estrutural dos ligantes presentes nos mapas. Este alinhamento visa identificar
pontos comuns nas diversas moléculas estudadas e, portanto, sítios comuns de interação. O
resultado final é uma multiestrutura contendo os pontos e os tipos de interação comum à série
molecular estudada (BOYD, 2006).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados encontrados após a submissão da desoxiuridina planejada (Figura 1)
apontou 69 compostos químicos com 90% de similaridade estrutural.
Figura 1: Estrutura da Desoxiuridina.
Como foram definidas 3 caixas de acoplamento, inicialmente foi padronizado qual das
mesmas seria utilizada no desenvolvimento do trabalho, assim, dez ligantes foram escolhidos
aleatoriamente e acoplados juntamente com os substratos da enzima (UTP e
acetilglicosamina-1-fosfato [AcGlnP]) nas três caixas. Os resultados se encontram no gráfico
1, no qual é possível visualizar que a SA3 apresenta uniformemente os melhores (menores)
valores para a energia de afinidade e, por isso, utilizado na construção dos mapas e modelo
farmacofórico, como se segue.
O ligante 48, figura 2A, denominado pela nomenclatura IUPAC de 1-[(2R,4S,5R)-4hydroxy-5-methyloxolan-2-yl]-5-methyl-1,2,3,4-tetrahydropyrimidine-2,4-dione apresentou
energia de afinidade de -7,1 kcal/mol (sendo que para a AcGlnP foi de -5,8 kcal/mol e para e
UTP -7,3 kcal/mol), constituindo-se, portanto, um candidato promissor a alterações químicas
(com base no consenso farmacofórico gerado por este trabalho) que possam aumentar sua
afinidade pela UNAcP.
Energia de Afinidade
(Kcal/mol)
8,0
6,0
4,0
2,0
0,0
-2,0
-4,0
-6,0
-8,0
7
15
23
30
38
48
51
59
SA1 -6,4
SA2 -2,7
-5,8
-6,5
-6,3
-6,0
-5,7
-7,0
-6,7
-5,8
AcGln
UTP
P
-6,4 -5,1 -4,1
-3,6
-1,4
-3,5
-3,7
-2,0
-1,4
-1,6
4,7
-4,3
-2,7
5,5
SA3 -6,8
-6,2
-6,6
-6,7
-6,3
-6,3
-7,1
-6,6
-6,4
-6,6
-5,8
-7,3
3
69
GRÁFICO 1: RESULTADO DO ACOPLAMENTO COMPARATIVO
O ligante 48 faz as seguintes interações com a UNAcP: interações de hidrogênio com
resíduos Ser327 e Val293, interação hidrofóbica da metila do grupamento tetrahidrofurano
com Ile329. Na figura 2B está representada a configuração espacial desse complexo formado,
sendo os vetores vermelhos indicativos da ligação de hidrogênio, a esfera amarela a região de
contato hidrofóbico e as esferas cinzas as zonas de exclusão, regiões em que podem ocorrer
impedimentos estéricos.
A
B
FIGURA 2: Mapa de interações (A) e mapa farmacofórico (B) para o complexo ligante
48-UNAcP.
Com base no alinhamento estrutural dos mapas de interações gerados para todo o
banco de dados o programa LigandScount constrói um mapa consensual, como mostrado na
figura 3. Nesse mapa é possível observar os pontos comuns de interação da série estudada
com base na sobreposição de suas estruturas. Determinar os pontos comuns de interação de
uma série de compostos possibilita conhecer os sítios essenciais de interação (pontos
mantidos) e, portanto, o conhecimento das características que efetivamente são indispensáveis
na busca e desenvolvimento de um inibidor (neste caso).
Figura 3: Consenso farmacofórico gerado.
O consenso gerado (figura 3) demonstra que um ligante para ser reconhecido pelo
modelo da enzima UNAcP deve possuir como núcleo básico a desoxiuridina (possibilitando a
distância ótima entre os pontos de interação, a conformação e a rigidez estrutural necessária) e
os substituintes deste grupo devem possibilitar: a formação de duas Ligações de Hidrogênio
do tipo Aceptora (LHA) nas posições meta e para do anel uridina e um sítio aceptor/doador de
ligações de hidrogênio (LHA/LHD) na posição 3 da pentose. O núcleo básico possibilita
também a formação de interações π-π (interação hidrofóbica entre anéis aromáticos), bem
como possibilita um ponto de ligação doadora de hidrogênio (nitrogênio aromático).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo demonstrou resultados satisfatórios uma vez todos os compostos utilizados
mostraram afinidade pela enzima. O estudo de acoplamento mostrou melhores resultados de
afinidade para a caixa de acoplamento que engloba tanto a zona da UTP quanto a da
acetilglicosamina-1-fosfato (SA3). O ligante 48 (com energia de afinidade de -7,1 kcal/mol)
mostrou resultados promissores.
Os resultados apontam para o benefício da conservação do núcleo desoxiuridina e da
inserção de substituintes que preservem características de propiciar interações eletrostáticas
do tipo ligação de hidrogênio (aceptoras e doadoras) e de promover interações hidrofóbicas
(hidrofóbicas e π-π). Tais características estão, logicamente, relacionadas com o perfil de
resíduos do sítio ativo da UNAcP. As características do farmacofóro apontadas pelo estudo
dos mapas de interação e pelo consenso farmacofórico gerado apontam os aspectos
fundamentais da interação micromolécula-enzima e poderá ser utilizada para propor
moléculas com maior perfil de interação.
REFERÊNCIAS
ALVEZ, S. A. M. Epidemiologia da vassoura-de-bruxa Crinepillis perniciosa (STHAEL)
SINGER em cacaueiros exertados em Uruçuca-Ba. 2002. 70 f. Dissertação (Mestrado em
Agronomia) Piracicaba, 2002.
BASTOS, E. Cacau: a riqueza agrícola da América. São Paulo: Ícone, 1987. 130p.
BODY, Susan. LigandScout, a review. RSC, 2006. Disponível em:
<http://www.rsc.org/chemistryworld/Issues/2006/September/LigandScout.asp>. Acesso em 12 de
maio de 2013.
COMPANHIA DAS DOCAS DO ESTADO DA BAHIA, 2002. Apresenta em estatística os
principais produtos movimentados. Disponível em: http://www.cobeda.com.br/portoilheus. Acesso
em: 25 jan. 2005.
GRIFFITH, R.; TRACY, T. Antifungal drugs. In: WILLIANS, D. A.; LEMKE, L. Foye’s principles
of medicinal chemistry. 5. ed. Philadelphia. Lippincott Williams & Wilkins, 2002, p. 891-903.
IRVIN, J. J. et al. ZINC: A Free Tool to Discover Chemistry for Biology. J. Chem. Inf. Model. n52
(7), p. 1757–1768, 2012.
MARUYAMA, D. et al. Crystal structure of Uridine-diphospho-N-acetylglucosamine
pyrophosphorylase from Candida albicans and catalytic reaction mechanism. J. of Biol. Chem., v.
282, n. 23, p. 17221–17230, 2007.
OLIVEIRA, M. L.; LUZ, E.D.M.N. 2005. Identificação e manejo das principais doenças do
cacaueiro no Brasil. Ilhéus, CEPLAC/CEPEC/SEFIT. 132p.
PEREIRA, J. L. et al. First occurence of witches’broom disease in the principal cocoagrowins region
of Brazil. Tropical Agriculture, v. 67, n. 2, p. 188-189, 1990.
SANTOS JUNIOR, M. C. et al. . Structure-based drug design studies of UDP-N-acetylglucosamine
pyrophosphosrylase, a key enzyme for the control of witches' broom disease. Chem. Cent. J., v. 7, p.
48, 2013.
STEWART. J. J. P. J. Mol. Model. n. 13, 1173-1213, 2007.
TROTT, O.; OLSON, A.J. AutoDockVina: improvising the speed and accuracy of docking with a new
scoring function, efficient optimization and multithreading. J. of Comp. Chem. n. 31, p. 455-461,
2010.
Download

acoplamento molecular e modelagem farmacofórica