VARIEDADES 18 — DOMINGO, 27 de junho de 2004 CORREIO DO POVO SOCIEDADE Eduardo Conill FOTOS ABELARDO MARQUES PA I N E L CP MEMÓRIA Luiza Moreira e Ariane Heineck Eva Sopher dirige o Theatro desde 1975 Theatro São Pedro: 20 anos de cultura O Theatro São Pedro completa 20 anos de sua reabertura com uma noite de festa que terá como atração um show do Tangos e Tragédias e música com a Orquestra de Câmara Theatro São Pedro, nesta segundafeira, às 21h. Para a data, o espectador que for prestigiar o evento, ao adquirir o ingresso, receberá uma manta personalizada de recordação. Com uma vida muito longa, o Theatro foi fundado em 1858, mas teve que fechar em 1973 por causa das precárias condições de segurança e mau estado de conservação. Em 1975, Eva Sopher foi convidada pelo secretário de Educação e Cultura para coordenar as obras de restauração do prédio, que duraram nove anos. Foi somente em 1984 que a instituição reabriu suas portas oferecendo um espaço equipado com todos os recursos modernos, equipamentos cênicos, serviços hidrossanitários e um moderno sistema de iluminação. Um mês depois, o governador do Estado Jair Soares assinava uma portaria autorizando o tombamento do prédio. Desde o seu surgimento até os dias de hoje, já passaram pelo palco do Theatro centenas de personalidades. Entre outros, Arthur Rubinstein, Cacilda Becker, Olavo Bilac, Eugène Ionesco, Villa-Lobos, Marce Marceau, Paulo Autran, Tônia Carreira, Fernanda Montenegro e Regina Duarte. Norinha Teixeira e Julia Coufal Debutantes O baile de debutantes do Country, há muitos anos o mais tradicional e exclusivo do Estado, apresentará 18 garotas na edição deste ano, que acontecerá na noite de 27 de agosto, sexta-feira, em vestidos longos e gravatas pretas, com as mesas todas, tanto do salão principal como do Bar Inglês, inteiramente ocupadas. A direção do clube, Paulita Nesralla e Carmem Cabeda, apresentarão as garotas Adrianne Rahde Bischoff, Alice da Rocha Silveiro, Alice Lang Silva, Ariane Heineck Krapf, Audrey Victória Randon, Fernanda Jahn Verri, Giuliana Hohemberger, Julia Teixeira Coufal, Katherine Ling, Laura Bertaso Mason, Luana Bernardes Germano, Luiza Linhares Moreira, Mariana Sanchez Gomes Ferreira, Marjana Reis Lima, Rafaella Polese Weber, Renata Hess Weinstein, Thuani de Oliveira Lindemann e Vivian Faraco Ramos. Luana Germano e Mariana Ferreira Café A descolada Melissa Nonenmacher, gaúcha que vivia no Rio e retornou a Porto Alegre, instalou o Starlite Café, um espaço charmoso e cheio de bossa, no andar térreo da Mega Store Manlec, no Centro da cidade. Quiches, calzones e tarteletes, preparados pela própria Melissa, acompanham cafés, chás e chocolates quentes. Tudo elogiadíssimo. Moda Dia 10 de agosto, no Country, o desfile conjunto de Elenita Lewin & Vitor Raskin, leia-se Griffe & Riccardi, em benefício das obras da Wizo. Elenita está toda faceira, foi em sua loja Griffe que as cantoras líricas Luiza Francescone e Claudia Riccitelli escolheram os modelos de gala para as apresentações da 9a Sinfonia de Beethoven. E não foi apenas um, fizeram guarda-roupa completo. Rafaella Weber e Marjana Lima JUREMIR MACHADO E-mail:[email protected] DA S I LVA E-mail: [email protected] O homem que assassinou Machado de Assis riosvaldo Ramos era mulato, homossexual, poeta e anarquista. Politicamente correto até o mondongo. Foi o introdutor em Palomas da noção de direito das minorias. A história que interessa aqui aconteceu num momento estranho da vida política palomense, quando os patrões lutaram pelo aumento do salário mínimo para 275 contos e o partido dos trabalhadores conseguiu fixá-lo em 260. Desde aquele dia, fatídico, Ariosvaldo não foi mais o mesmo. Emagreceu, não bebeu mais, largou o truco e partiu para o tudo ou nada. Trocou Maria Callas por Teixeirinha e Bakunin por Honório Lemes. Deu para estudar técnicas industriais de degola. Radicalizou as suas posições. Em praça pública, confessou ser discípulo de Policarpo Quaresma e declarou guerra à língua inglesa, ao império americano, ao que sobrou do comunismo e a todas as formas imagináveis de “murismo”, que definiu como a arte de não to- A mar partido em favor de um só partido, o da oligarquia branca, hipócrita e escrava do FMI. Começou por não ir a um show de Caetano Veloso por considerar de um provincianismo atroz um brasileiro cantando num inglês macarrônico. Exigia reciprocidade. Que americaARTE SID MONZA nos cantassem em português de feijoada? A lo menos, a lo menos, dizia, caso não pudessem cantar Gildo de Freitas em português de Camões. A la pucha! Criou uma ONG, Filhos da Égua, em defesa do coice contra o murismo. Quando lhe pediram exemplos da aplicação das suas idéias, respondeu sem vacilar: ação direta e retroativa. Capar! Adaptou, inacreditavelmente, uma frase de Osvaldo Aranha como lema: “Não existem direitos adquiridos contra a humanidade”. Armou-se até os dentes, trancou-se no galpão e releu os clássicos da literatura brasileira. Saiu dali decidido a acertar contas com o nosso patrimônio cultural. Lançou um mani- festo multicultural gaudério contra a dominação dos machos brancos. Começava mais ou menos assim: “Os críticos vivem para adorar o passado, detestar o presente, impedir o futuro e morrer de tédio ou de hemorróidas”. Pedia providências. Elegeu três escritores como alvo da sua fúria politicamente correta retroativa: Machado de Assis, Guimarães Rosa e Nelson Rodrigues. Condenou o primeiro como “negro em cima do muro racial”. Ignorou a obra e fulminou o autor: “Mulato que era, devia ter sido um abolicionista escancarado e não foi. Ficou só remanchando, dando voltas em torno do cocho. Foi ainda mais impiedoso com Guimarães Rosa. “Escreveu um faroeste sertanejo, tentando ser um Joyce da caatinga, e não teve coragem de levar até o fim que aquilo era o amor de duas bibas (Ariosvaldo não tinha preconceito com as palavras). Ou alguém pode acreditar que um jagunço com a cara da Bruna Lombardi, quando ela ainda dava 16 em terra lavrada, na ponta dos cascos, podia andar no meio do machirio, disfalçada de homem, fazendo xixi agachada nas macegas, e não ser descoberta?”. Fedeu a zorrilho! Nelson Rodrigues apanhou de relho: reacionário, velhaco, tarado, lambedor de botas de milico, chato, guru por antecipação do udenismo petista. Foi aí que vomitou a frase que o perde- ria: “Quando Nelson Rodrigues se torna uma referência nacional nem o Sobrenatural de Almeida pode explicar a nossa queda”. Ninguém entendeu. Disseram-lhe na cara que a frase era ruim. O Gumercindo cuspiu no chão e vociferou: “Neguinho invejoso”. Ataliba só riu: “Veadinho no feijão”. Lindolfo ensinou: “Manda quem pode, obedece quem precisa”. Aquilo o revoltou como nunca. Jurou vingança. Montou num alazão e desapareceu no meio da noite. Ao nascer do sol, numa manhã que se anunciava perfumada, reapareceu nas bandas do Passo da Cruz. O alazão vinha ao passo. Cabeça baixa, rédea frouxa. Ariosvaldo, feito um sonâmbulo, contemplava a lâmina da sua faca. Havia um fio vermelho sobre o aço reluzente. O velho Borges, da janela, o sentiu se aproximar. Meteu a cabeça para fora e gritou: “Que se passa, compadre?” Ariosvaldo, sem tirar os olhos da faca, balbuciou: “Dei cabo do Machado, dom Borges”. Era o único que o tratava assim. Para os outros, Borges era o bruxo, o feiticeiro, o cego. “Que Machado, compadre, o da venda do meio, o da Virgilina?” Ariosvaldo sorriu. Pobre velho ignorante, pensou. “O Machado de Assis, Dom Borges, o da Capitu”. Foi a vez de Borges sorrir.