Universidade Federal da Bahia
Escola de Medicina Veterinária
Mestrado em Ciência Animal nos Trópicos
INVESTIGAÇÃO DE Hammondia heydorni E PARASITOS RELACIONADOS
(Neospora caninum E Toxoplasma gondii) EM BOVINOS DE CORTE
SARA LIMA SANTOS
Salvador – Bahia
2009
ii
SARA LIMA SANTOS
INVESTIGAÇÃO DE Hammondia heydorni E PARASITOS RELACIONADOS
(Neospora caninum E Toxoplasma gondii) EM BOVINOS DE CORTE
Dissertação apresentada à Escola de
Medicina Veterinária da Universidade
Federal da Bahia, como requisito para a
obtenção do título de Mestre em Ciência
Animal nos Trópicos, na área de Saúde
Animal.
Orientador: Prof. Dr. Luis Fernando Pita Gondim
Salvador – Bahia
2009
iii
FICHA CATALOGRÁFICA
SANTOS, Sara Lima
Investigação de Hammondia heydorni e parasitos relacionados (Neospora caninum
e Toxoplasma gondii) em bovinos de corte/Sara Lima Santos. – Salvador,
20/03/2009. 64p. Dissertação (Mestrado em Ciência Animal nos Trópicos) Escola de Medicina Veterinária da Universidade Federal da Bahia, 2009.
Professor Orientador – Prof. Dr. Luis Fernando Pita Gondim
Palavras-chave – Hammondia; Neospora; Toxoplasma; Diagnóstico molecular,
Bovinos.
1 - Santos, Sara Lima 2 - Coccidiose 3 – Diagnóstico molecular I- Investigação de
Hammondia heydorni e parasitos relacionados (Neospora caninum e Toxoplasma
gondii) em bovinos de corte.
iv
INVESTIGAÇÃO DE Hammondia heydorni E PARASITOS RELACIONADOS
(Neospora caninum E Toxoplasma gondii) EM BOVINOS DE CORTE.
SARA LIMA SANTOS
Dissertação defendida e aprovada para obtenção do grau de Mestre em Ciência Animal
nos Trópicos.
Salvador, 20 de março de 2009.
Comissão Examinadora:
____________________________________
Prof. Dr. Luis Fernando Pita Gondim - UFBA
Orientador
___________________________________
Prof . Dra. Maria Angela Ornelas de Almeida - UFBA
a
____________________________________
Prof. Dr. George Rêgo Albuquerque
Universidade Estadual de Santa Cruz - UESC
v
Ao meu pai, Gilberto (in
memorian), meu porto seguro
sempre, exemplo de perseverança e
coragem, e à minha mãe, Ana
Lúcia, por me permitir prosseguir e
sonhar.
vi
AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador Prof. Luís Fernando Pita Gondim pelo incentivo, entusiasmo e
nobreza em multiplicar conhecimento;
Aos Professores do Laboratório de Parasitoses dos Animais (LDPA), especialmente a
Profa. Maria Angela Ornelas de Almeida, pelos ensinamentos de dedicação e coragem;
Aos amigos Katty, Rosinha, Mari, Lea, Ilka e Alan pelo auxílio fundamental para a
realização deste trabalho e por fazer do ambiente de trabalho uma extensão do meu lar;
A todos os funcionários e estudantes do Laboratório das Parasitoses dos Animais
(LDPA) em especial às futuras mestrandas Débora, Yuki, Rose e Geise pela
colaboração nas coletas e realização da pesquisa;
À Profa. Dra. Kiyoko Abe Sandes, do ICS-UFBA, pela colaboração para a realização do
seqüenciamento das amostras de DNA;
Ao Prof. Dr. Rodrigo Soares, da USP, pela concessão do controle positivo de H.
heydorni e contribuição para a padronização da técnica de PCR nested;
Ao Prof. Cláudio Roberto Madruga por não poupar esforços nos esclarecimentos de
dúvidas;
Ao Médico Veterinário Dr. Enos Rocha Fraga,do Serviço de Inspeção Federal, pelo
apoio nas aquisições das amostras;
A todos os magarefes e agentes de inspeção do Abatedouro Frigorífico – UNIFRIGO,
pela solidariedade e cavalheirismo nas coletas das amostras, em especial ao agente de
inspeção Paulo Maurício Keijock;
vii
Aos meus pais, Gilberto e Ana Lúcia, e irmãs, Érica e Aline, pela compreensão, amor e
estímulos que me fizeram acreditar que seria possível;
As amigas irmãs Lari e Erika pela ausência de palavras capazes de explicar o amor e
cumplicidade que me fazem lembrar diariamente o quanto sou privilegiada;
Aos amigos Camilla, Luiz Fernando e Claus cujos abraços, palavras doces e silêncios
confortantes, nos momentos certos, me fizeram perceber que a distância era somente
física;
Aos colegas do Laboratório de Infectologia Veterinária Babi, Dani, Adriano e Sabrina
pelas demonstrações de companheirismo;
Ao Colegiado de Pós-Graduação da Escola de Medicina Veterinária da Universidade
Federal da Bahia;
À FAPESB pela concessão da bolsa de mestrado e auxílio dissertação;
Por fim, a todos que contribuíram para a realização desse trabalho.
viii
“Para ser grande, sê inteiro: nada
Teu exagera ou exclui. Sê todo em
cada coisa
Põe quanto és. No mínimo que
fazes
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive”
(Fernando Pessoa)
ix
ÍNDICE
LISTA DE TABELAS................................................................................................ X
LISTA DE FIGURAS ...............................................................................................XI
LISTA DE ABREVIATURAS ................................................................................ XII
RESUMO................................................................................................................ XIII
SUMMARY ............................................................................................................ XIV
1 INTRODUÇÃO GERAL ........................................................................................ 1
2 REVISÃO DE LITERATURA ................................................................................ 4
2.1 HISTÓRICO DE HAMMONDIA HEYDORNI ....................................................................................... 4
2.2 HISTÓRICO DE NEOSPORA CANINUM ............................................................................................ 6
2.3 BIOLOGIA DE HAMMONDIA HEYDORNI ......................................................................................... 8
2.3.1 Formas evolutivas de Hammondia heydorni .......................................................................... 9
2.3.2 Transmissão ....................................................................................................................... 11
2.4 ALTERAÇÕES CLÍNICAS POR INFECÇÃO POR HAMMONDIA HEYDORNI E COCCÍDIOS
RELACIONADOS ............................................................................................................................... 13
2.4.1 Cães ................................................................................................................................... 13
2.4.2 Bovinos e outras espécies animais ...................................................................................... 14
2.5 CULTIVO CELULAR DE HAMMONDIA HEYDORNI E COCCÍDIOS RELACIONADOS........................... 16
2.6 DIAGNÓSTICO DE INFECÇÃO POR HAMMONDIA HEYDORNI ......................................................... 18
2.6.1 Diagnóstico histopatológico .............................................................................................. 18
2.6.2 - Análises coprológicas....................................................................................................... 19
2.6.3 - Diagnóstico Molecular ..................................................................................................... 19
2.7 FILOGENIA ................................................................................................................................ 20
2.8 DIVERSIDADE GENÉTICA ENTRE HAMMONDIA HEYDORNI .......................................................... 26
3 ARTIGO CIENTÍFICO ......................................................................................... 29
4 CONSIDERAÇÕES GERAIS ..................................................................................41
5 REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 43
x
LISTA DE TABELAS
TABELA 1 – Results of a nested PCR followed by sequencing for detection of
Toxoplasmatinae parasites and IFAT for detection of anti-Neospora caninum and antiToxoplasma gondii antibodies………………………………………………………….35
xi
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 – Oocisto esporulado de protozoário Toxoplasmatinae medindo
aproximadamente 10-14 µm ...........................................................................................10
FIGURA 2 – Ciclo de transmissão de Hammondia heydorni e Neospora caninum.
Canídeos excretam oocistos esporulados após ingestão de tecidos contendo cistos
teciduais. Oocistos esporulados infectam espécies de herbívoros ................................. 11
FIGURA 3 – Diagrama sobre as unidades repetidas do DNA ribossômico (rDNA),
inclui os genes 18S, 5.8S e 28S, um espaço não transcrito (NTS), um espaço externo
transcrito (ETS), e dois espaços internos transcritos (ITS) ........................................... 22
xii
LISTA DE ABREVIATURAS
pb - Pares de bases
ELISA - Enzyme Linked Immunosorbent Assay
ETS - Espaçador Externo Transcrito
Hsp70 - Proteína do Choque Térmico de 70 kDa
IFAT - Indirect Imunofluorescent Antibody Test
IFI - Imunofluorescência Indireta
ITS1 - Espaçador não codificante interno 1
ITS2 - Espaçador não codificante interno 2
NTS - Espaçador não Transcrito
LSU – Subunidade maior
PCR - Reação de Polimerase em Cadeia
PCR-RFLP - Polymerase Chain Reaction coupled with Restriction Fragment Length
Polymorphism
RAPD-PCR - Random-Amplified Polymorphic DNA Polymerase Chain Reaction
rDNA - DNA Ribossômico
rRNA - RNA Ribossômico
SSU – Subunidade menor
RFLP-PCR - Restriction fragment length polymorphism
SSCP-PCR - Single strand conformation polymorphism
xiii
SANTOS, S.L. Investigação de Hammondia heydorni e parasitos relacionados
(Neospora caninum e Toxoplasma gondii) em bovinos de corte. Salvador, Bahia,
2009. 64p. Dissertação (Mestrado em Medicina Veterinária Tropical) - Escola de
Medicina Veterinária, Universidade Federal da Bahia, 2009.
RESUMO
Hammondia heydorni é um protozoário coccídio que possui cães e raposas como
hospedeiros definitivos, e estreitamente relacionado filogeneticamente a parasitos da
sub-família Toxoplasmatinae como Neospora caninum, Toxoplasma gondii e H.
hammondi. As espécies do gênero Hammondia não estão associadas com doença nos
animais, porém, N. caninum é conhecido por induzir perdas neonatais em rebanhos
bovinos e T. gondii por causar doenças congênitas em humanos e animais. A escassez
de informações acerca do ciclo de vida de H. heydorni, direcionou o presente trabalho a
investigar a freqüência molecular deste parasito em bovinos e compará-los com N.
caninum e T. gondii. Amostras de coração, cérebro e sangue de 100 bovinos de corte
foram obtidas em um abatedouro frigorífico no município de Simões Filho – BA e
testadas por meio de uma Reação em Cadeia da Polimerase Nested (PCR- nested)
específica para o Espaço Transcrito Interno (ITS-1) do DNA ribossômico da subfamília
Toxoplasmatinae, com os primers JS4/CT2b e CT1/CT2. Após o sequenciamento das
amostras positivas na PCR, verificou-se que 5% dos animais (5/100) eram positivos
para N. caninum, 2% (2/100) foram positivos para T. gondii e nenhuma amostra positiva
para H. heydorni. Foram também pesquisados anticorpos IgG anti-N. caninum e anti-T.
gondii nos animais, através da técnica de imunofluorescência indireta, sendo que 20% e
26% dos animais apresentaram anticorpos para N. caninum e T. gondii,
respectivamente.
Palavras-chave: Bovinos; Hammondia; Neospora; Reação de Polimerase em Cadeia
Nested; Toxoplasmatinae
xiv
SANTOS, S.L. Investigation of Hammondia heydorni and related parasite
(Neospora caninum and Toxoplasma gondii) in beef cattle. Salvador, Bahia, 2009.
64p. Dissertation (Master of Science in Tropical Veterinary Medicine) - School of
Veterinary Medicine, Federal University of Bahia, 2009.
SUMMARY
Hammondia heydorni is a protozoan coccidian that has dogs and foxes as definitive
hosts, and is closely related to Toxoplasmatinae parasites such as Neospora caninum,
Toxoplasma gondii and H. hammondi. Hammondia species have not been associated
with disease in animals, but N. caninum is known to induce losses in bovine herds, and
T. gondii causes congenital desease in humans and animals. The lack of information
about the life cycle of H. heydorni encouraged the present study to investigate the
molecular frequency of this parasite in cattle and to compare with the frequencies of N.
caninum and T. gondii. Samples of hearts, brain and blood of 100 beef cattle were
obtained in a slaughterhouse in Simões Filho County, Bahia, and tested by a nested
polymerase chain reaction (PCR-nested) to the Internal Transcribed Space 1 region
(ITS-1) of the ribosomal DNA of the subfamily Toxoplasmatinae using the primers
JS4/CT2b and CT1/CT2. After sequencing of the positive samples, 5% of the animals
(5/100) were positive for N. caninum, 2% were positive for T. gondii and no sample was
positive for H. heydorni. IgG antibodies to N. caninum and to T. gondii were also
investigated in the animals by immunofluorescent antibody tests, resulting in 20% and
26% of seropositive animals to N. caninum and T. gondii, respectively.
Keywords – Cattle; Hammondia; Neospora; Nested-Polymerase Chain Reaction;
Toxoplasmatinae
1
1 INTRODUÇÃO GERAL
Hammondia heydorni é um protozoário coccídio de canídeos, atualmente classificado
como pertencente à sub-família Toxoplasmatinae, que inclui os parasitos Hammondia
hammondi, Neospora caninum, Toxoplasma gondii e Besnoitia sp. O parasito foi
descrito, primeiramente, em 1891, e desde então, com o decorrer dos estudos, foi
denominado como Coccidium bigeminum, Isospora bigemina e Isospora heydorni
(Dubey, 1976; Tadros & Laarman, 1982). Posteriormente, foi inserido no gênero
Hammondia por possuir ciclo de vida obrigatoriamente heteroxeno (Dubey, 1977).
A ausência de patogenicidade do parasito H. heydorni nos animais resultou na escassez
de estudos que buscassem elucidar seu ciclo de vida (Blagburn et al., 1988; Slapeta et
al., 2002b). Após a descrição de N. caninum em 1988 (Dubey et al., 1988a), agente
causador de perdas econômicas por induzir abortamentos em bovinos (Dubey, 2003;
Thilsted & Dubey, 1989) e, posteriormente, a descoberta do cão como hospedeiro final
de N. caninum, cujos oocistos eram semelhantes aos de H. heydorni, tornou-se
necessária a diferenciação destas duas espécies (McAllister et al., 1998; Slapeta et al.,
2002a).
H. heydorni e N. caninum possuem algumas espécies de canídeos como hospedeiros
definitivos. Cães e raposas são os únicos canídeos identificados até o momento como
hospedeiros definitivos de H. heydorni (Schares et al., 2002; Mohammed et al., 2003;
Dubey et al., 2004), enquanto que para N. caninum, somente cães e coiotes foram
identificados como hospedeiros (McAllister et al., 1998; Gondim, et al., 2004b).
Outras espécies animais são reconhecidas como hospedeiros intermediários desses
parasitos, sobretudo espécies herbívoras como caprinos, ovinos, gazelas e cervídeos
(Zayed & El Ghaysh, 1998; Dubey et al., 2002a; Mohammed et al., 2003; Dubey et al.,
2004).
A classificação de N. caninum como um novo gênero, gerou discordância entre alguns
autores, os quais consideravam a nomenclatura deste parasito como errônea, devendo
2
este ser classificado como uma forma virulenta de H. heydorni (Dubey et al., 2002b;
Heydorn & Mehlhorn, 2002). Contudo, estudos moleculares que buscavam elucidar as
relações evolutivas entre as espécies da sub-família Toxoplasmatinae e esclarecer
dúvidas com relação a taxonomia destas espécies, revelaram que H. heydorni e N.
caninum são espécies geneticamente distintas (Ellis et al., 1999; Mugridge et al., 1999;
Monteiro et al., 2007).
Em bovinos a infecção por N. caninum está associada à ocorrência de abortamentos pela
morte do feto no útero. Pode ocorrer ainda natimortalidade e nascimento de bezerros
infectados com ou sem sintomatologia (Anderson et al., 2000; Innes et al., 2005).
Diversas técnicas moleculares foram desenvolvidas para atender às necessidades de
estudos das espécies de coccídios relacionados, sendo que a PCR passou a ser uma
ferramenta diagnóstica
imprescindível
para
a diferenciação
destes parasitos
morfologicamente semelhantes, e de estudos para inferir relações filogenéticas
(Mugridge et al., 1999; Sreekumar et al., 2003; Sreekumar et al., 2004).
Dentre os alvos para o desenvolvimento destes estudos, o rDNA demonstrou ser
bastante útil para estudos moleculares destes coccídios por possuir regiões repetidas no
genoma celular que evoluem em proporções diferentes umas das outras (Hillis & Dixon,
1991; Luton et al., 1995; Marsh et al., 1995; Holmdahl & Mattsson, 1996; Payne &
Ellis, 1996; Homan et al., 1997; Ellis et al., 1999; Jenkins et al., 1999; Mugridge et al.,
1999; Schares et al., 2002; Sreekumar et al., 2003; Sreekumar et al., 2004). Dentre estas
seqüências, regiões altamente conservadas, que permitem estudos de eventos
evolutivamente antigos, e regiões variáveis, que permitem estudos de eventos evolutivos
relativamente recentes, e consequentemente, de organismos próximos (Hillis & Dixon,
1991; Jenkins et al., 1999).
Os estudos que investigaram as relações filogenéticas dos coccídios Toxoplasmatinae
revelaram que H. heydorni é mais próximo filogeneticamente de N. caninum do que de
H. hammondi, e que este, por sua vez, é mais próximo de T. gondii, no qual ambos
possuem felinos como hospedeiros definitivos (Mugridge et al., 1999).
3
Embora os estudos epidemiológicos de N. caninum e T. gondii sejam amplamente
difundidos entre as espécies animais, em parte, devido à facilidade em se obter estes
parasitos em bioensaios e cultivos celulares, são limitadas as informações acerca dos
parasitos do gênero Hammondia, pois não se conseguiu a manutenção desses
organismos em cultura celular, impossibilitando o desenvolvimento de testes
sorológicos (Speer et al., 1988; Riahi et al., 1995; Mugridge et al., 1999).
Apesar da proximidade genética dos organismos H. heydorni e N. caninum, é
desconhecido se H. heydorni é capaz de induzir imunidade cruzada para N. caninum
como, observado entre H. hammondi e T. gondii (Riahi et al., 1998; Riahi et al., 1999).
Também são escassos os estudos sobre a ocorrência dos parasitos do gênero
Hammondia em tecidos animais (Barratt et al., 2008; Silva et al., 2009). Os estudos que
buscavam elucidar o ciclo de vida de H. heydorni e as espécies animais envolvidas eram
baseados somente em características morfológicas. É possível que durante estudos sobre
H. heydorni, anteriores a classificação de N. caninum, tenham ocorrido falhas na
identificação da espécie do parasito. Assim, espécies descritas nesses trabalhos como
hospedeiras de H. heydorni devem ser reavaliadas (Schares et al., 2001).
Diante da necessidade em diferenciar as duas espécies de parasitos estreitamente
relacionados, H. heydorni e N. caninum, e testar se a espécie bovina é hospedeiro
intermediário de H. heydorni, o objetivo do presente trabalho foi investigar H. heydorni
e parasitos Toxoplasmatinae relacionados (N. caninum e T. gondii) em bovinos de corte
abatidos no estado da Bahia.
4
2 REVISÃO DE LITERATURA
2.1 Histórico de Hammondia heydorni
Os primeiros relatos de Isospora bigemina ocorreram em 1891, os quais descreviam
oocistos que possuíam dois esporocistos e foram identificados no tecido intestinal de
cães. Inicialmente, esses oocistos foram denominados de Coccidium bigeminum. No
mesmo ano, foi proposto que este parasito proveniente de cães fosse designado como C.
bigeminum var. cani, para diferenciá-los de parasitos semelhantes provenientes de
gatos, que, por sua vez, foram denominados C. bigeminum var. cati (Dubey, 1976;
Tadros & Laarman, 1976).
Em 1906, o nome Isospora bigemina foi usado indiscriminadamente para referenciar
qualquer coccídio de cão e gato excretado na forma esporulada e não esporulada,
nomenclatura esta que tornou confusa a classificação destes parasitos (Wenyon, 1926;
Tadros & Laarman, 1982).
Dois tipos de I. bigemina que se diferenciavam em tamanho foram relatados em cães. A
forma menor, cujos oocistos possuíam tamanho entre 10-14 µm por 7,5 -9 µm e que se
desenvolviam nas células epiteliais do intestino, e a forma maior, que mediam entre 1820 µm por 14-16 µm e que se desenvolviam na lâmina própria do intestino. A forma
menor de I. bigemina era eliminada no ambiente na forma não esporulada, enquanto a
forma maior era eliminada na forma esporulada (Wenyon, 1926; Dubey, 1976).
No Brasil, Costa, em 1956, no estado da Bahia, relatou pela primeira vez a ocorrência
de um parasito morfologicamente semelhante a I. bigemina proveniente de um cão com
alterações clínicas. Devido a discretas diferenças em tamanhos dos oocistos citados em
outros trabalhos, este autor sugeriu que se tratava de uma nova variedade que
denominou de Isospora bigemina var. bahiensis.
5
Em 1972, Heydorn e Rommel, ao estudarem espécies de Sarcocystis que infectam
bovinos, isolaram esporocistos e oocistos não esporulados das fezes de cães que foram
alimentados com carne bovina crua. Após esporolução, estes oocistos apresentavam
morfologia e tamanho semelhantes aos oocistos da forma menor de I. bigemina de cão
descritos por Wenyon (1926). Este autor observou estas formas nas fezes de dois
filhotes que excretaram grande quantidade de oocistos, sendo que um destes apresentava
diarréia persistente (Heydorn & Mehlhorn, 2002; Wenyon, 1926).
A partir do isolado descrito em 1972 (I. bigemina – isolado Berlin-1971) foi
determinado que esta espécie possuía o cão como hospedeiro definitivo, com o ciclo de
vida heteroxeno e que herbívoros, e também o cão, desempenhavam papel de
hospedeiros intermediários, sem apresentarem alterações clínicas (Heydorn &
Mehlhorn, 2002).
Em 1975, um novo gênero de coccídio, Hammondia, foi descrito por Frenkel e Dubey,
assim denominado em homenagem ao Professor Datus M. Hammond. Este parasito
identificado em felino possuía bradizoítos similares aos do gênero Toxoplasma e seus
estágios de multiplicação sexuada ocorriam no intestino, sendo os oocistos liberados
não esporulados. Além disso, camundongos inoculados com o parasito exibiam baixos
títulos de anticorpos anti-T. gondii (Frenkel & Dubey, 1975).
Apesar da biologia semelhante a T. gondii, foi sugerido que se tratava de uma nova
espécie, pois os cistos em camundongos foram encontrados predominantemente na
musculatura esquelética, enquanto cistos de T. gondii localizavam-se, em sua maioria,
no SNC. Além disso, foi demonstrado que o parasito necessitava obrigatoriamente de
dois hospedeiros para que completasse seu ciclo, pois felinos, ao ingerirem oocistos
esporulados, não produziam oocistos; esta característica, comum dos membros da
família Sarcocystidae, também era observada na forma menor de I. bigemina (Frenkel &
Dubey, 1975).
Dubey, em 1976, sugeriu que o nome da forma menor de I. bigemina passasse a ser
Isospora wallacei, em homenagem ao Dr. G. D. Wallace, pela contribuição de suas
6
pesquisas sobre parasitos semelhantes a Toxoplasma, uma vez que a forma maior de I.
bigemina tivera sido classificada como uma espécie de Sarcocystis. No mesmo ano,
Tadros e Laarman, revendo estudos de parasitos coccídios, propuseram que o nome I.
bigemina passasse a ser I. heydorni, em homenagem ao Dr. A. O. Heydorn, que
elucidou em seus trabalhos, o ciclo de vida deste parasito (Dubey, 1976).
Em 1977, Dubey propôs que o parasito fosse transferido ao gênero Hammondia, por
possuir ciclo de vida heteroxeno, pois as espécies de Isospora geralmente possuem ciclo
de vida monoxeno (Dubey, 1977). Assim, o nome Hammondia heydorni passou a ser
aceito pela comunidade científica, contudo I. bigemina e I. heydorni ainda são utilizados
(Heydorn & Mehlhorn, 2002).
2.2 Histórico de Neospora caninum
Em 1984, foi identificado um parasito formador de cisto, diferente de T. gondii, no
sistema nervoso central e musculatura esquelética de cães que apresentavam
encefalomielite e miosite severas (Bjerkas et al., 1984; Hilali et al., 1986). Logo depois,
foi observada encefalomielite em bezerros associada a um protozoário semelhante a T.
gondii, porém sem detecção de anticorpos contra este parasito (O'Toole & Jeffrey,
1987; Parish et al., 1987).
N. caninum foi classificado como um novo gênero e espécie de parasito coccídeo
pertencente ao filo Apicomplexa em um estudo realizado por Dubey et al. (1988a), a
partir de amostras conservadas de tecidos de 23 cães que receberam diagnóstico de
toxoplasmose. Após análises ultra-estruturais do parasito e ausência de reação em testes
imunoistoquímicos para T. gondii, o parasito foi identificado em dez dos 23 cães
analisados, sendo que estes cães apresentavam sinais neurológicos e de miosite mais
intensos que os encontrados na toxoplasmose em cães.
No mesmo ano, Dubey et al. (1988b), após diagnosticarem N. caninum em cães que
apresentavam as mesmas alterações clínicas descritas anteriormente (Dubey et al.
7
1988a), isolaram pela primeira vez o parasito utilizando cultura celular e bioensaios em
camundongos e cães.
Em 1989, Thilsted e Dubey, após investigarem um surto de abortamentos em uma
propriedade de bovinos leiteiros, identificaram o parasito N. caninum em amostras de
cérebro de dois dos nove fetos abortados que foram necropsiados (Thilsted & Dubey,
1989). Desde então, o parasito passou a ser reconhecido como um das principais causas
de abortamentos em bovinos em todo o mundo (Dubey, 2003).
No Brasil, o primeiro relato de neosporose bovina ocorreu em 1999 e, no mesmo ano,
foi realizado o primeiro estudo de soroprevalência em bovinos, no estado da Bahia, no
qual foram detectados anticorpos anti-N. caninum em 14, 09% (63/447) das amostras
(Gondim, et al., 1999a; Gondim, et al., 1999b). Em 2001, N. caninum foi isolado e
cultivado pela primeira vez no país por Gondim et al., a partir de um cão que
apresentava sinais de incoordenação e paresia de membros posteriores. Amostras de
cérebro desse animal revelaram grande quantidade de cistos teciduais de N. caninum,
confirmados por exame imunoistoquímico e moleculares (Gondim, et al., 2001).
Em 1998, foi demonstrado que cães são hospedeiros definitivos de N. caninum, pois
estes
foram
capazes
de
excretar
oocistos
após
ingerirem
camundongos
experimentalmente infectados pelo parasito (McAllister et al., 1998).
O coccídio H. heydorni despertou relativamente pouca atenção desde a sua descoberta,
por não causar doença em seus hospedeiros, até a descrição de N. caninum como
causador de doenças em cães e, principalmente, abortamentos e perdas neonatais em
bovinos (Blagburn et al., 1988; Slapeta et al., 2002b). Desde a observação de que
oocistos de N. caninum eram morfologicamente semelhantes aos de H. heydorni,
tornaram-se imprescindíveis análises ultra-estruturais e moleculares para a diferenciação
entre oocistos de H. heydorni e outros coccídios, uma vez que H. hammondi e T. gondii
podem ser transmitidos mecanicamente por cães quando apresentam hábitos de
coprofagia (Schares et al., 2005). Desta forma, estudos anteriores que identificavam
oocistos de H. heydorni através somente de observações morfológicas, passaram a ser
8
desconsiderados quanto a real identidade do parasito (Dubey et al., 2002a; Slapeta et al.,
2002b).
O primeiro relato da infecção por N. caninum em animais silvestres ocorreu em 1994,
quando N. caninum foi identificado em amostras de tecidos de cervídeo (Odocoileus
hemionus columbianus) encontrado morto na Califórnia (Woods et al., 1994). Em 2004,
foi confirmado experimentalmente o ciclo de transmissão entre animais silvestres e
domésticos, quando cães eliminaram oocistos de N. caninum após consumirem cérebro
de cervídeos naturalmente infectados, e o parasita oriundo de cervídeo induziu infecção
em um bezerro (Gondim, et al., 2004c).
Investigou-se, também, a possibilidade de outros canídeos silvestres desempenharem
papel de hospedeiros definitivos e participarem na epidemiologia da neosporose.
Gondim et al. (2004a), ao alimentarem filhotes de coiotes (Canis latrans) com tecidos
de bovinos infectados com N. caninum, identificaram oocistos deste coccídio,
determinando-se o papel de coiotes como hospedeiros definitivos no ciclo de vida deste
parasito (Gondim, et al., 2004b).
2.3 Biologia de Hammondia heydorni
H. heydorni é classificado como pertencente ao Filo Apicomplexa, família
Sarcocystidae e sub-família Toxoplasmatinae, a qual inclui os gêneros Besnoitia,
Hammondia, Neospora e Toxoplasma. Membros deste grupo dividem características em
comum, como reprodução por endodiogenia em hospedeiros intermediários,
endopoligenia precedendo gametogonia em hospedeiros definitivos, gametogonia no
epitélio intestinal de hospedeiros definitivos e esporogonia no ambiente (Tenter et al.,
2002).
Nos Toxoplasmatinae, o desenvolvimento assexuado nos hospedeiros intermediários
consiste em duas fases de endodiogenia. Na primeira fase, taquizoítos se multiplicam
rapidamente em várias células hospedeiras. Na segunda fase, bradizoítos se multiplicam
9
lentamente dentro de cistos teciduais e podem permanecer em estado de latência. Se
ingeridos pelo hospedeiro definitivo, os bradizoítos iniciam outra fase proliferativa
(endopoligenia) nas células epiteliais do intestino delgado. No término dessa fase,
inicia-se a fase sexuada do ciclo, com gametogonia e formação de oocistos que são, por
sua vez, eliminados no ambiente pelas fezes. A esporogonia ocorre no meio ambiente
(Mugridge et al., 1999).
2.3.1 Formas evolutivas de Hammondia heydorni
As três formas evolutivas conhecidas de H. heydorni são morfologicamente e
ultraestrututalmente semelhantes a outras espécies de coccídios Toxoplasmatinae; cistos
contendo bradizoítos, taquizoítos e oocistos contendo esporozoítos. Bradizoítos,
taquizoítos e esporozoítos são as três formas infectantes do parasito, sendo que as duas
primeiras são encontradas em hospedeiros intermediários e a última somente nos
hospedeiros definitivos (Dubey et al., 1977).
Oocistos destas espécies de coccídios são morfologicamente semelhantes e resultam da
reprodução sexuada no intestino de hospedeiros definitivos (Figura 1). Os oocistos
correspondem às formas resistentes destes parasitos no ambiente e são excretados não
esporulados nas fezes. Esporulam entre 12 a 72 h e passam a conter dois esporocistos,
cada um com quatro esporozoítos, tornando-se infectantes. Oocistos de H. heydorni,
assim como os de N. caninum, são excretados em pouca quantidade por canídeos.
Quando não esporulados, apresentam formato esférico a sub-esférico com cerca de 10,6
x 13,2 μm (McAllister et al., 1998; Mohammed et al., 2003; Dubey et al., 2004).
Quando esporulados medem entre 10-12 x 12-14 µm. Os esporocistos, por sua vez,
medem de 6-8 x 4-6 µm e cada esporozoíto em torno de 6 x 2 µm (Speer et al., 1988).
10
Figura 1.
Oocisto esporulado de protozoário
Toxoplasmatinae medindo cerca de
10-14 µm
Os taquizoítos são as formas de multiplicação rápida do parasito e localizam-se dentro
de vacúolos parasitóforos no citoplasma da célula hospedeira. São observados poucos
dias após a penetração dos esporozoítos nas células dos hospedeiros intermediários.
Possuem formato lunar a ovóide, a depender do estágio de desenvolvimento, e medem
aproximadamente 6 x 2 µm (Dubey, 1977; Speer et al., 1988).
Com o desenvolver da infecção, surgem as formas de multiplicação lenta do parasito
conhecidas como bradizoítos. Estes se desenvolvem dentro de cistos teciduais formados
de componentes celulares do hospedeiro. Bradizoítos medem aproximadamente 6 x 2
µm e a espessura da parede do cisto pode variar entre 0,05 e 0,2 µm, a depender do
tempo de infecção. Taquizoítos e bradizoitos de H. heydorni e H. hammondi, ao
contrário de N. caninum e T. gondii, são incapazes de infectar hospedeiros
intermediários (Riahi et al., 1995; Schares et al., 2003).
11
2.3.2 Transmissão
Os bovinos foram os primeiros hospedeiros intermediários naturais descritos de H.
heydorni (Heydorn & Mehlhorn, 2002). Posteriormente, outras espécies foram relatadas
como hospedeiros intermediários, naturalmente ou experimentalmente infectados:
porquinhos da índia, caprinos, ovinos, búfalos, alce, cavalos, camelos e espécies de
cervídeos. Os cães, raposas e coiotes foram identificados como hospedeiros definitivos,
quando tecidos de animais inoculados ou naturalmente infectados induziram excreção
de oocistos por esses canídeos (Figura 2) (Dubey & Fayer, 1976; Dubey, 1977;
Dissanaike & Kan, 1977; Dubey & Williams, 1980; Matsui, 1991; Matsui et al., 1986;
Hilali et al., 1995; Zayed & El Ghaysh, 1998; Schares et al., 2002; Mohammed et al.,
2003; Dubey et al., 2004;). Os estudos sobre H. heydorni eram baseados em descrições
morfológicas, sendo que somente um isolado de cão descrito por Blagbur em 1988 foi
analisado posteriormente e sua identidade comprovada (Ellis et al., 1999).
Cistos teciduais em
hospedeiros
intermediários
Hospedeiros Definitivos
Oocistos excretados por
hospedeiros definitivos
Hospedeiros Intermediários
Figura 2.
Ciclo de transmissão de Hammondia heydorni e Neospora caninum.
Canídeos excretam oocistos esporulados após ingestão de tecidos
contendo cistos teciduais. Oocistos esporulados infectam espécies de
herbívoros (Adaptado de Gondim, 2006)
12
Até o momento, estágios teciduais de H. heydorni não foram identificados em
hospedeiros intermediários. Há somente um relato sobre a presença de cistos teciduais
em cérebros de porquinhos da índia inoculados com oocistos de H. heydorni, contudo a
identidade destes cistos não foi confirmada por meio de testes moleculares ou ultraestruturais. Em adição, nenhum hospedeiro experimentalmente infectado com oocistos
desenvolveu alterações clínicas (Dubey et al., 2002b; Matsui, 1991).
Estágios do parasito que ocorrem nos tecidos de caninos, após a ingestão de tecidos
infectados, ainda não foram comprovadamente identificados, contudo ressalta-se que o
cão pode também desempenhar o papel de hospedeiro intermediário (Dubey, 1977;
Dubey et al., 2002a).
Os oocistos excretados pelas fezes de canídeos tornam-se esporulados após 12-72 horas
e contém dois esporocistos, cada um com quatro esporozoítos. Os oocistos esporulados
são capazes de infectar cães, porém, não induzem formação de oocistos por estes
animais, além disso, o parasito não é transmitido por inoculação de tecidos infectados
em hospedeiros intermediários, o que caracteriza um ciclo de vida obrigatoriamente
heteroxeno (Dubey, 1976; Dubey, 1977; Dubey et al., 2002b; Schares et al., 2002;
Mohammed et al., 2003).
O período em que o hospedeiro definitivo começa a eliminar oocistos após ingerir
tecidos infectados parece variar conforme as espécies envolvidas, assim como a duração
de eliminação desses parasitos nas fezes. Um de quatro cães que foram alimentados com
corações de cervídeos (Odocoileus virginianus) eliminou oocistos nas fezes 10-12 dias
após a ingestão destes tecidos (Dubey et al., 2004). Oocistos de H. heydorni podem ser
eliminados por canídeos após curto período de tempo ao consumirem tecidos infectados.
Raposas foram capazes de eliminar oocistos semelhantes a H. heydorni (H. heydornilike) de 5 - 27 dias após a ingestão de cistos em tecidos de caprinos e ovinos, ao passo
que cães eliminaram oocistos de 6 – 13 dias (Schares et al., 2002).
Raposas que ingeriram esôfago, músculo esquelético, língua, diafragma e coração de
gazelas naturalmente infectadas, eliminaram oocistos de H. heydorni seis dias após a
13
ingestão dos tecidos (Mohammed et al., 2003). Diferentes autores sugerem que a
quantidade de parasitos nos tecidos de hospedeiros intermediários é pequena, ou não
uniformemente distribuída, e com maior tropismo por células musculares do que
qualquer outro órgão, ou ainda, que possivelmente, cistos em outros tecidos são
possivelmente em número pequeno e de difícil detecção (Blagburn et al., 1988;
Mohammed et al., 2003).
Schares et al (2001) sugerem que muitos estudos sobre a biologia de H. heydorni,
baseados em descrições morfológicas conduzidos antes da descoberta de N. caninum,
não devem ser citados para discutir diferenças entre os dois parasitos, ao menos que as
amostras de oocistos, DNA ou soros tenham sido utilizadas em experimentos
posteriores, pois é desconhecido se a descrição inicial de H. heydorni foi conduzida com
a mistura de duas ou mais espécies de coccídios morfologicamente semelhantes
(Schares et al., 2001).
2.4 Alterações Clínicas por infecção por Hammondia heydorni e coccídios
relacionados
2.4.1 Cães
Alterações clínicas relacionadas à infecção por H. heydorni são raras e os que
apresentaram sintomatologia estão relacionados à falha da resposta imune (Abel et al.,
2006; Blagburn et al., 1988).
Na infecção por H. heydorni, cães apresentavam quadro de diarréia persistente com
excreção de grande quantidade do parasito nas fezes. Nestes relatos, os cães estavam
sendo submetidos à terapia por corticóide, eram filhotes ou, como observado em um
caso, apresentou anorexia, sugerindo que estes animais não manifestavam resposta
imunológica adequada para limitar o desenvolvimento do parasito, uma vez que este
14
normalmente é excretado em pouca quantidade (Blagburn et al., 1988; Schares et al.,
2005; Abel et al., 2006).
Embora H. heydorni não esteja associado à doença na espécie canina, N. caninum e T.
gondii podem causar encefalomielite e miosite, quando ocorre a multiplicação
assexuada destes parasitos em tecidos cerebrais e musculares. Além destas alterações,
N. caninum pode causar pneumonia, cardiopatia e dermatopatias em cães (Dubey et al.,
1988a; Dubey, 2003).
Sinais clínicos de neosporose podem ocorrer em cães de idades variadas, contudo, casos
mais severos são encontrados em cães filhotes com infecção congênita (Dubey, 2003).
Dermatites intensas podem ocorrer nesses animais envolvendo grande número de
parasitos. Porém, as lesões neurológicas são as mais comuns e os sinais clínicos variam
conforme o local envolvido do sistema nervoso central (Buxton et al., 2002; Dubey,
2003; Dubey & Lindsay, 1996). Também são observadas paresia de membros
posteriores, com progressão para paralisia, paralisia da mandíbula, flacidez e atrofia
muscular, e insuficiência cardíaca (Dubey, 2003).
2.4.2 Bovinos e outras espécies animais
Em nenhuma espécie animal utilizada para inoculação de oocistos de H. heydorni foram
observadas alterações clínicas associadas à infecção (Blugburn, 1988; Dubey &
Williams, 1980). Animais naturalmente infectados, cujos tecidos foram fornecidos a
canídeos para observar eliminação de oocistos de H. heydorni, também não
apresentavam alterações relacionadas ao parasito (Zayed, 1998).
O parasito N. caninum tem sido identificado como uma das principais causas de
abortamentos em bovinos em todo o mundo, os quais ocorrem principalmente no terço
médio da gestação (Anderson et al., 2000; Dubey, 2003). A neosporose bovina pode
acarretar perda fetal, natimortalidade e nascimento de bezerros infectados com ou sem
sintomatologia de neosporose (Anderson et al., 2000; Innes et al., 2005). Além de
15
acometer principalmente bovinos e cães, a neosporose ocasionalmente acomete outras
espécies domésticas como bubalinos, ovinos, caprinos e equinos (Dubey & Lindsay,
1996; Dubey, 2003).
Ao contrário de H. heydorni, a infecção por N. caninum pode ocorrer por via
transplacentária, sendo esta uma importante via de transmissão em bovinos, gerando
principalmente abortamentos, que ocorrem como conseqüência de uma infecção letal do
feto (ou embrião) após uma parasitemia materna. Isto ocorre quando a matriz torna-se
infectada pela primeira vez através da ingestão de oocistos, ou quando há uma
recrudescência de uma infecção prévia (Hemphill & Gottstein, 2000).
Quando N. caninum invade as células do útero bovino, multiplica-se causando
destruição focal de tecidos fetais e maternos, iniciando uma resposta inflamatória. O
parasito então penetra a vasculatura fetal e invade outros tecidos, principalmente o
sistema nervoso central (SNC). Uma vez no SNC, a multiplicação do parasito dependerá
da capacidade do feto em combatê-lo. Assim, em fetos com idade mais avançada, a
multiplicação do parasito é mais restrita, associada a uma intensa resposta inflamatória
que pode ocorrer tanto no SNC como em outros tecidos tais como coração, fígado,
pulmão e músculo esquelético (Buxton et al., 2002).
Bezerros congenitamente infectados por N. caninum podem apresentar alterações
clínicas que são menos comuns, como estarem abaixo do peso, serem incapazes de se
levantar, ou terem membros posteriores, anteriores ou ambos flexionados ou
hiperestendidos. Exames neurológicos podem revelar ataxia, decréscimo de reflexo
patelar e perda da consciência de propriocepção. Os animais podem apresentar
exoftalmia ou aparência assimétrica dos olhos, hidrocefalia ou estreitamento medular
(Dubey & Lindsay, 1996; Dubey, 2003).
T. gondii, que possui felinos como hospedeiros definitivos, ocasiona lesões semelhantes
à neosporose nos animais, é causador de doenças congênitas, abortamentos, dentre
outras alterações em humanos. Pode infectar diversas espécies animais incluindo
mamíferos e aves. A infecção deste protozoário em ovinos, caprinos e suínos é comum e
16
de preocupação para a saúde pública. Raramente é associado à doenças em bovinos e
em cães, porém, é de maior importância para ovinos por induzir abortamentos, como na
neosporose em bovinos (Dubey et al., 2002a).
Há uma importante diferença entre neosporose em bovinos e toxoplasmose em ovinos,
apesar de N. caninum e T. gondii serem protozoários próximos filogeneticamente.
Quando ovinos são infectados por T. gondii durante a prenhez, a ovelha desenvolve
anticorpos contra o parasito, podendo ocorrer infecção fetal e/ou abortamento. Em
gestações subseqüentes, a ovelha será resistente à infecção. Na neosporose, vacas que
abortam um feto infectado são susceptíves a repetir a infecção fetal em gestações
seguintes (Anderson et al., 2000).
2.5 Cultivo celular de Hammondia heydorni e coccídios relacionados
As formas evolutivas de H. heydorni que ocorrem nos hospedeiros, bem como as de H.
hammondi, ainda são pouco estudadas devido à dificuldade em manter estes parasitos
em cultivos celulares. Estágios de H. heydorni nunca foram conclusivamente
identificados em hospedeiros intermediários, e estágios intestinais identificados em
canídeos, em estudos anteriores a classificação de N. caninum, tornaram-se
inconclusivos devido à ausência de descrição das formas intestinais de N. caninum que
possam ser comparados às descrições de H. heydorni (Dubey et al., 2002a).
Ao contrário de N. caninum e T. gondii, há poucos relatos de cultura celular para H.
heydorni e H. hammondi.
Em todos os cultivos parcialmente bem sucedidos das
espécies de Hammondia, foram utilizados esporozoítos e não houve continuidade de
desenvolvimento em passagens sucessivas em células (Speer et al., 1988; Schares et al.,
2003).
A primeira tentativa de se estabelecer cultivo de H. heydorni ocorreu em 1988 a partir
de esporocistos em cultivos de células bovinas e ovinas. Os esporozoítos penetraram nas
17
células, porém, a multiplicação do parasito cessou em aproximadamente oito dias e não
foi possível a transferência de zoítos a outras culturas (Speer et al., 1988).
Mesmo com o insucesso da manutenção em cultivo, estágios de desenvolvimento de
Hammondia sp classificados como “H. heydorni-like”, que se mantiveram por curto
período em culturas de células, possibilitaram estudos ultra-estruturais e comparativos
com espécies de H. hammondi, N. caninum e T. gondii (Speer & Dubey, 1989). Em
outra tentativa de estabelecimento de cultivo deste coccídio, foram utilizadas diferentes
linhagens celulares infectadas por esporocistos. Com o desenvolvimento do parasito,
foram identificados cistos dentro de vacúolos parasitóforos. Após três meses, observouse uma diminuição significativa na quantidade de vacúolos parasitóforos, de forma
semelhante ao relatado em estudos prévios para se estabelecer cultivo celular para H.
heydorni e H. hammondi (Schares et al., 2003).
Todas as culturas celulares para as espécies de Hammondia desenvolveram cistos
contendo bradizoítos antes de cessar a multiplicação dos parasitos. Não se sabe se nestes
cultivos havia fatores que predispunham à formação destes estágios para estes parasitos
ou se alguma exigência específica para o desenvolvimento destas espécies era
desconhecida. Sabe-se que determinadas condições de estresse em cultivo podem
favorecer a formação de cistos em culturas de parasitos coccídios, como, por exemplo,
concentração de ácido nítrico, pH alcalino, condições ácidas, aumento de temperatura e
INF-γ, porém, nenhum destes componentes estava presente nas culturas das espécies de
Hammondia (Speer et al., 1988; Riahi et al., 1995; Schares et al., 2003).
Portanto, a produção de cistos de Hammondia em cultura pode ser uma importante
ferramenta para estudos sobre a biologia destes parasitos, além de permitir estudos
sorológicos que possibilitem a diferenciação entre as espécies deste gênero e as de
outros coccídios relacionados, uma vez que o isolamento a partir de tecidos é difícil,
pela baixa concentração nos músculos e quase ausência em cérebro (Riahi et al., 1995).
18
2.6 Diagnóstico de infecção por Hammondia heydorni
Diferentes técnicas têm sido empregadas no diagnóstico de Hammondia sp com o
intuito de responder questões ainda desconhecidas sobre o ciclo de vida desses
protozoários, e principalmente, para diferenciá-los do parasito N. caninum (Ellis et al.,
1999; Slapeta et al., 2002; Schares et al., 2003). Até o momento, o diagnóstico para as
espécies de Hammondia limitam-se à identificação morfológica de oocistos em fezes de
canídeos seguida de identificação por diferentes técnicas de biologia molecular, além de
pesquisa do parasito nos tecidos animais (Dubey et al., 2002b; Slapeta et al., 2002a).
Desta forma, as ferramentas diagnósticas utilizadas para avaliação de infecção por H.
heydorni incluem análises coprológicas, testes histopatológicos e moleculares (Dubey et
al., 2002b; Slapeta et al., 2002a).
Embora testes sorológicos sejam amplamente explorados nas investigações de N.
caninum nos animais, estes são indisponíveis para H. heydorni (Speer et al., 1988;
Mugridge et al., 1999; Schares et al., 2003). Inexistem estudos sorológicos que
comparem epidemiologicamente N. caninum e H. heydorni. Apesar de não ter sido
observada reatividade entre soro de cão anti-H. heydorni e dois antígenos recombinantes
de N. caninum no ELISA (Nishikawa et al., 2002), informações são escassas acerca da
possibilidade de H. heydorni induzir imunidade cruzada e gerar resultados duvidosos
nos levantamentos sorológicos para N. caninum, como ocorrem entre H. hammondi e T.
gondii (Dubey, 1981; Riahi et al., 1999).
2.6.1 Diagnóstico histopatológico
As tentativas de identificar estágios teciduais de H. heydorni em tecidos de seus
hospedeiros fracassaram. O único relato que descreve a ocorrência de cistos em tecidos
não foi comprovado com utilização de outros métodos (Matsui, 1991). Todavia, o
exame histopatológico é uma ferramenta necessária para o diagnóstico da neosporose,
pois lesões não-supurativas nos tecidos podem ser sugestivas de infecção por este
19
parasito, porém, não patognomônicas, pois há outros protozoários que se assemelham
morfologicamente com N. caninum (Pereira-Bueno et al., 2003).
Em bovinos o número de cistos de N. caninum nos tecidos é baixo quando comparado
aos cães e, em ambos, é difícil a observação de taquizoítos em amostras coradas
convencionalmente por H&E (Dubey & Schares, 2006). O exame imunoistoquímico
utilizando anticorpos específicos (policlonais ou monoclonais), auxilia a visualização de
formas do parasito nos tecidos (Riahi et al., 1999; Riahi et al., 2000; Schares et al.,
2002; Schares et al., 2003; Dubey & Schares, 2006).
2.6.2 - Análises coprológicas
A pesquisa de oocistos em fezes de canídeos, seguida de análises morfológicas, foram
os primeiros recursos empregados para a identificação e classificação de H. heydorni.
Desde a descrição de N. caninum e sua associação como causador de doenças e perdas
econômicas, tornou-se necessário o diagnóstico de oocistos eliminados por canídeos,
contudo, esta prática deve ser vinculada à técnicas moleculares, devido à
impossibilidade de diferenciação destes com oocistos dos demais coccídios
Toxoplasmatinae (N. caninum, T. gondii, H. hammondi) (Slapeta et al., 2002a).
A detecção dos oocistos nas fezes se dá pela técnica de flutuação, utilizando soluções
hipersaturadas de sais (NaCl ou ZnCl2) ou açúcar, seguido de exame microscópico.
Após a identificação de oocistos, estes são purificados por centrifugação e estocados em
soluções que favoreçam sua esporulação, geralmente dicromato de potássio a 2,5% ou
ácido clorídrico ou sulfúrico a 2%, e os protejam de contaminações por fungos e
bactérias, auxiliando no processo de conservação (Slapeta et al., 2002a; Slapeta et al.,
2002b; Mohammed et al., 2003; Schares et al., 2005).
2.6.3 - Diagnóstico Molecular
Técnicas moleculares vêm sendo utilizadas no diagnóstico das coccidioses e a Reação
em Cadeia da Polimerase (PCR) consiste em uma das principais técnicas para a
20
detecção de DNA de diversos parasitos, incluindo Hammondia sp. Os aprimoramentos e
adaptações da PCR permitiram um avanço na utilização da técnica e proporcionaram o
rápido desenvolvimento de protocolos sem a exigência de conhecimento prévio do
genoma do parasito (Ellis, 1998; Sreekumar et al., 2003). É possível detectar
quantidades mínimas de DNA dos parasitos em fluidos corpóreos, excrementos e
amostras de tecidos; no caso particular de H. heydorni, a técnica possibilita a sua
diferenciação de oocistos de outros coccídios morfologicamente semelhantes (Ellis,
1998; Slapeta et al., 2002a).
Diferentes regiões do genoma dos parasitos servem como alvo para o desenvolvimento
de primers objetivando diversos tipos de análises. Na ausência de conhecimento de
genes específicos de um determinado organismo, o DNA ribossomal (rDNA) se torna
um dos principais alvos para desenvolvimento da PCR, pois possui sequências repetidas
no genoma dos organismos, e dentre estas, sequências altamente conservadas e
sequências variáveis, permitindo estudos que elucidem a biologia e a evolução de
populações e espécies (Ellis, 1998; Payne & Ellis, 1996).
Por causa do caráter repetitivo das regiões do rDNA dos organismos Toxoplasmatinae e
da especificidade do gene pNc5 de N. caninum, ambos têm sido bastante utilizados
como alvos para a PCR (Payne & Ellis, 1996; Dubey & Schares, 2006; Yamage et al.,
1996)
2.7 Filogenia
Os critérios inicialmente utilizados para a classificação de organismos da subfamília
Toxoplasmatinae incluíram principalmente características fenotípicas, tais como a
especificidade por hospedeiro, o padrão de ciclo de vida, o tipo de célula hospedeira
parasitada, a morfologia e a localização de cisto tecidual. Essas classificações tornaramse problemáticas, pois ainda são desconhecidas algumas informações acerca do ciclo de
vida das espécies que compõem essa subfamília, e consequentemente, as características
utilizadas para a designação desses gêneros são limitadas em seus conteúdos de
21
informação filogenética, o que as tornam altamente subjetivas e controversas (Mugridge
et al., 1999; Mehlhorn & Heydorn, 2000; Tenter et al., 2002).
O sequenciamento de DNA para análises filogenéticas dos organismos provê um
importante marcador para investigar as relações entre espécies; baseado nas variações
de seqüências de nucleotídeos, diversos genes com funções bioquímicas fundamentais,
que são encontradas na maioria dos organismos, podem ser sequenciados, alinhados e
analisados (Hillis & Dixon, 1991; Mugridge et al., 2000).
Os genes do RNA ribossomal e as regiões de espaços associados, que compõem juntos
o DNA ribossomal, são moléculas úteis para análises filogenéticas porque detêm certas
vantagens para tais estudos, visto que permitem análises de uma gama de eventos, que
vão desde a origem da vida a outros evolucionários relativamente recentes. Isso se deve
ao fato de que as regiões de suas unidades repetidas se desenvolvem em diferentes
proporções com o decorrer do tempo (Hillis & Dixon, 1991).
O rDNA do genoma nuclear de eucariotos contém centenas de cópias repetidas de
unidades transcritas e espaços não transcritos. Os rRNA são freqüentemente
caracterizados em unidade de velocidade de sedimentação (S, para Svedburg). São
compostos por uma subunidade maior de rRNA (LSU – do inglês - large subunit) , em
genomas nucleares eucariotos essa subunidade é composta por mais de 28S (mais de
4000 nucleotídeos), uma pequena sub-unidade 5,8S rRNA (aproximadamente 160
nucleotídeos) e uma subunidade menor rRNA (SSU – do inglês – small subunit), acima
de 18S (aproximadamente 1800 nucleotídeos), que são separadas por espaços transcritos
internos (ITS-1 e ITS-2), espaço transcrito externo (ETS) e espaço não transcrito (NTS)
conhecida também como espaço intergênico (IGS) (Figura 3) (Hillis & Dixon, 1991).
Estas repetições são frequentemente transcritas por uma RNA polimerase 1 para
produzir um pré-rRNA e , no nucléolo, são removidas as regiões dos espaços transcritos
internos (ITS) e regiões intergênicas (IGS) (Payne & Ellis, 1996).
22
Figura 3.
Diagrama sobre as unidades repetidas do DNA ribossômico (rDNA), inclui os
genes 18S, 5.8S e 28S, um espaço não transcrito (NTS), um espaço externo
transcrito (ETS), e dois espaços internos transcritos (ITS)
A subunidade mais amplamente explorada dos genes rRNA é a sub-unidade menor 18S.
É o gene mais lentamente desenvolvido nos organismos e tem sido utilizado
principalmente para analisar eventos evolucionários antigos. Em adição, a lenta taxa de
mudança permite a construção de muitos primers quase universais, que facilitam a
avaliação de grupos nunca estudados anteriormente (Hillis & Dixon, 1991).
No princípio, as pesquisas filogenéticas em coccídios formadores de cistos foram
baseadas na subunidade menor 18S do rDNA, sobretudo devido a facilidade em se obter
sequências mais curtas. Estes estudos permitiram concluir que coccídios formadores de
cistos formam um grupo monofilético, separado de organismos monoxenos, como os
gêneros Eimeria e Cryptosporidium (Jenkins et al., 1999).
Foi demonstrado que sequências do gene 18S rRNA podem variar entre cepas virulentas
e avirulentas de T. gondii entre 0,06-1,04% (Luton et al., 1995). Análises moleculares
comparativas, empregando esta seqüência entre organismos Apicomplexas, concluíram
que N. caninum e T. gondii são mais relacionados evolutivamente do esperado com base
em comparações fenotípicas. Essa conclusão se baseou no alto grau de homologia entre
os genes 18S destes coccídios, que apresentaram diferenças em quatro nucleotídeos
específicos, e que estas espécies divergiram recentemente uma da outra (Luton et al.,
1995; Marsh et al., 1995). Além disso, esta seqüência demonstrou o que evidências
fenotípicas sugeriam de que H. hammondi e T. gondii são monofiléticos (Jenkins et al.,
1999).
23
Estes trabalhos demonstraram que o uso deste gene é limitado, pois o nível de
divergências entre as seqüências de genes de coccídios formadores de cistos é muito
pequeno para resolver as questões sobre as relações filogenéticas entre estes parasitos,
porém, é possível a utilização desse gene para diferenciação dessas espécies (Luton et
al., 1995; Marsh et al., 1995).
O gene 5.8S rRNA de eucariotos é similar à sub-unidade menor em sua extensão
filogenética, porém, seu pequeno tamanho limita sua efetividade em estudos que
envolvem grande escala de tempo (Hillis & Dixon, 1991). O tamanho do gene 5.8S
rRNA de N. caninum é de 158pb, sendo que comparações com T. gondii revelaram uma
similaridade de 99%. (Payne & Ellis, 1996).
A subunidade maior 28S tem muitos domínios divergentes que são úteis para reconstruir
eventos relativamente recentes (Hillis & Dixon, 1991). O tamanho do gene varia
consideravelmente entre filos, podendo ser quase duas vezes maior que a subunidade
menor 18S rRNA, possuindo assim, mais informações e garantindo uma conclusão mais
segura sobre a filogenia destes parasitos (Mugridge et al., 1999; Mugridge et al., 2000).
Reconstruções filogenéticas baseadas nesse gene distinguiram duas linhagens dentre os
coccídios formadores de cistos; uma que inclui os gêneros Toxoplasma, Hammondia
Neospora e Besnoitia, e outra que inclui os gêneros Sarcocystis e Frenkelia, devendo
este último ser transferido para o gênero Sarcocystis (Tenter et al., 2002).
Estudos baseados na sequência inteira desse gene das espécies N. caninum, T. gondii, H.
hammondi e H. heydorni suportaram a hipótese de características fenotípicas, no qual N.
caninum é mais próximo de H. heydorni, e T. gondii é mais próximo de H. hammondi
(Ellis et al., 1999; Mugridge et al., 1999). A estreita relação entre T. gondii e H.
hammondi é evidenciada pela pequena distância entre estes dois parasitos (0,0013 e
0,0022), distâncias essas que se aproximam da observada entre as duas cepas ME 49 e
RH de T. gondii (0,0016) (Mugridge et al., 1999). Em adição, as distâncias observadas
entre as espécies dos gêneros Hammondia, Neospora e Toxoplasma são suficientemente
24
pequenas (0,0013-0,0069) ao ponto destas espécies serem agrupadas dentro do gênero
Toxoplasma (Mugridge et al., 1999).
As regiões de espaços entre os genes rRNA vem sendo alvo de estudos entre
organismos estreitamente relacionados, pois evoluem mais rapidamente do que os genes
conservados que os intercalam facilitando identificação de cepas, estudos de
hibridização e servindo como marcadores genéticos de populações. Dentre os espaços,
as regiões ITS-1 e ITS-2 são relativamente mais conservados que o NTS, e a utilização
dos espaços internos pela técnica de PCR é facilitada por serem ancorados por regiões
mais estáveis evolutivamente (Hillis & Dixon, 1991).
A região do ITS-1 do rRNA de coccídios estreitamente relacionados como N. caninum,
H. heydorni, T. gondii e H. hammondi vem sendo amplamente sequenciada. Além disso,
sua localização entre regiões altamente conservadas permite que este segmento seja um
bom alvo para o desenvolvimento de PCR, tanto para diferenciação entre espécies que
compartilham mesmos hospedeiros, como para estabelecer as relações de proximidade
(Holmdahl & Mattsson, 1996; Payne & Ellis, 1996; Homan et al., 1997; Ellis et al.,
1999).
N. caninum e T. gondii divergiram em tamanho de ITS-1, 421 pb e 392 pb,
respectivamente. Comparações entre essas sequências divergiram em duas inserções e
78 substituições, com similaridades próximas a 80% (Holmdahl & Mattsson, 1996;
Payne & Ellis, 1996; Holmdahl et al., 1997; Homan et al., 1997). O ITS-2 de N.
caninum mostrou ser similar em 94% ao ITS-2 de T. gondii, diferindo somente em 20
substituições entre as duas sequências. As similaridades entre os espaços transcritos
internos entre diferentes cepas de T. gondii (P, Sailie, RH e ME49) demonstraram que
estas sequências são altamente conservadas (Payne & Ellis, 1996).
Após analise de 20 isolados (incluindo cepas virulentas e não virulentas) de T. gondii
baseadas na seqüência do ITS-1 e parte do gene 5.8S rRNA, observou-se que em todos
os isolados as sequências eram similares em 100%. Foi possível concluir que o ITS-1 é
25
altamente conservado dentro da espécie T. gondii, porém, difere de N. caninum o
suficiente para servir de marcador para diferenciação das espécies (Homan et al., 1997).
Quando analisada a seqüência do ITS-1 de um isolado de N. caninum do Brasil (NCBahia) com a de outros isolados, foi observado um grande número de bases ambíguas e
12 nucleotídeos diferentes. Na tentativa de encontrar explicações para o possível erro,
foi realizada uma nova corrida em um gel de poliacrilamida, que possui maior
capacidade de resolução, sendo possível a visualização de duas bandas distintas em
todos os isolados de N. caninum testados. Quando sequenciadas as distintas bandas de
cada isolado e alinhadas com as seqüências dos mesmos isolados disponíveis no
GenBank, foram observadas diferenças e ambiguidades das sequências depositadas,
demonstrando variações de ITS-1 entre cepas, além de revelar problemas de
sequenciamento. Em adição, o mesmo padrão de corrida foi testado em duas cepas de T.
gondii, sendo que somente uma única banda foi observada (Gondim, et al., 2004a).
Outras sequências de genes como o da α-tubulina (Siverajah et al., 2003) e da proteína
de choque-térmico (HSP-70) (Monteiro et al., 2008) foram utilizadas para inferir
relações filogenéticas entre membros da sub-família Toxoplasmatinae. O gene da αtubulina mostrou ser suficientemente diferente entre H. heydorni, N. caninum e T.
gondii para identificar estas espécies como geneticamente distintas, porém, a distância
genética entre H. heydorni e N. caninum foi maior do que entre T. gondii e N. caninum.
Apesar desse gene ser altamente expresso nos organismos, o gene da α-tubulina em N.
caninum pareceu não ser abundante nesta espécie. Uma análise do gene HSP-70 entre
isolados de H. heydorni, N. caninum, T. gondii e H. hammondi demonstrou que H.
hammondi forma um grupo monofilético juntamente com T. gondii e que H. hammondi
e H. heydorni formam um grupo parafilético, como demonstrado em outros trabalhos
com rDNA. Além disso, N. caninum pareceu estar mais relacionado ao grupo formado
por H. hammondi e T. gondii do que o formado pelos isolados de H. heydorni (Monteiro
et al., 2007).
26
2.8 Diversidade Genética entre Hammondia heydorni
Com o desenvolvimento de estudos para identificação de H. heydorni/N. caninum em
hospedeiros definitivos, foi possível observar diferenças genéticas entre isolados
semelhantes a espécie H. heydorni (Schares et al., 2002; Sreekumar et al., 2003;
Sreekumar et al., 2004).
Ao investigarem o papel de raposas vermelhas (Vulpes vulpes) como hospedeiros
definitivos de N. caninum, foram oferecidos a esses animais e, paralelamente a cães,
tecidos de caprinos e ovinos infectados com N. caninum. Os cães excretaram oocistos
de N. caninum enquanto nas raposas os oocistos eram maiores, e no estudo molecular as
sequências do ITS-1 eram semelhantes as sequências de H. heydorni. Não foi gerado
produto de PCR com a utilização de primers específicos para N. caninum e os domínios
da subunidade LSU do rDNA apresentaram diferenças quando comparados as
sequências de H. heydorni. Quando essas mesmas sequências foram comparadas a T.
gondii e N. caninum, observou-se diferenças nas mesmas posições, sugerindo que esses
isolados de raposa podem ser biologicamente distintos de H. heydorni de cão (Schares
et al., 2002).
No isolamento de oocistos de fezes de cães que se assemelhavam a H. heydorni/N.
caninum foi possível obter dois isolados cujos ITS-1 se assemelhavam aos ITS-1 de
outras sequências de H. heydorni disponíveis em banco de dados (GenBank). Contudo,
as sequências do ITS-1 destes isolados diferiram em duas posições umas das outras, e
quando comparadas com uma sequência utilizada como padrão, diferiram em cinco e
sete posições (Slapeta et al., 2002a).
Análises dos domínios D2/D3 do LSU rDNA entre um dos isolados de H. heydorni-like
de cão proveniente do referido estudo (Slapeta et al., 2002a), juntamente com mais
sequências conhecidas de H. heydorni de dois isolados de cães, foram alinhadas
parcialmente com um novo isolado oriundo de raposa vermelha, da Arábia, que
ingeriram tecidos infectados de gazela (Gazella gazella), e mais uma sequência de um
isolado de H. heydorni-like de raposa. O alinhamento das cinco sequências parciais
27
mostrou que estas são altamente semelhantes até quatro posições de nucleotídeos, sendo
que as sequências de cães concordaram umas com as outras assim como as sequências
dos isolados de raposas, o que sugeriu populações geneticamente distintas de H.
heydorni (Mohammed et al., 2003).
Com o objetivo de desenvolver uma PCR para diferenciar eficazmente H. heydorni-like
de N. caninum, foram desenvolvidos primers a partir de duas seqüências polimórficas
únicas, obtidas pela RAPD-PCR (Random-amplified polymorphic DNA-polymerase
chain reaction), de um isolado reconhecido como H. heydorni. Após padronização da
técnica de PCR com a utilização desses novos primers, estes foram utilizados para
analisar cinco isolados reconhecidos como H. heydorni por estudos fenotípicos e
genéticos. Foram observadas amplificações somente em três dos cinco isolados
analisados. Da mesma forma, primers específicos para a região ITS-1 de H. heydorni,
anteriormente descritos (Slapeta et al., 2002a), foram utilizados paralelamente, e os
resultados concordaram com os obtidos para os novos primers. Entretanto, os primers
para a região comum do ITS-1 dos Toxoplasmatinae N. caninum, T. gondii e
Hammondia sp., amplificaram todos os isolados, o que indicou que uma outra espécie
pode estar presente em cães (Sreekumar et al., 2003).
Após essas observações (Sreekumar et al., 2003), foi delineado um estudo para analisar
a diversidade genética de 14 isolados de cães provenientes dos Estados Unidos,
Argentina e Brasil. Para elucidar maiores detalhes de diferenças genéticas entre estes
isolados, foram utilizadas as técnicas de PCR RFLP (Restriction fragment length
polymorphism) e SSCP (Single strand conformation polymorphism) em adição aos
produtos obtidos com primers para a região comum do ITS-1 dos membros
Toxoplasmatinae e os primers novos que foram descritos anteriormente (HhAP7F/HhAP7-R e HhAP10-F/ HhAP10-R) (Sreekumar et al., 2003). Houve amplificações
do ITS-1 de todos os isolados, não observando-se polimorfismo desta região após
análises por PCR RFLP e SSCP. Contudo, foram observadas amplificações em seis dos
14 isolados analisados, sendo quatro da Argentina e dois dos Estados Unidos com
microheterogeneidade entre os seis isolados com diferença em até 17 nucleotídeos. O
polimorfismo somado as análises de seqüências de ITS-1 de isolados de diferentes
28
origens, parecem não estar restritas a barreiras geográficas e biológicas (Sreekumar et
al., 2004).
Oocistos de H. heydorni eliminados por cães após ingestão de tecidos de cervídeos
(Odocoileus virginianus) apresentaram sequência parcial e total de ITS-1 idêntica a de
alguns isolados de cães e raposas, o que confirma observações feitas anteriormente de
que populações geneticamente similares podem estar presentes em várias espécies de
canídeos (Dubey et al., 2004; Sreekumar et al., 2004). Entretanto, como a região ITS-1
parece variar pouco entre os organismos “H. heydorni-like”, análises de outros genes
são necessárias para que resultados mais seguros sejam avaliados em conjunto
(Monteiro et al., 2007).
Posteriormente, diferentes populações de oocistos de cães e raposas foram analisadas
por PCR, seguido de seqüenciamento, utilizando primers conhecidos do gene da αtubulina (Siverajah et al., 2003) e do ITS-1 do rDNA (Payne & Ellis, 1996). DNA de
oocistos de um novo isolado de cão, mais dois isolados de raposa e dois de cão,
previamente reconhecidos como H. heydorni, foram amplificados com os primers
específicos para ambos os segmentos de DNA de H. heydorni e permitiu identificar o
novo isolado como sendo este parasito. Em adição, observou-se que os isolados de
raposa continham nove inserções de pares de bases e, utilizando essas inserções como
alvos, foram desenhados novos primers que amplificaram exclusivamente os isolados de
raposas, confirmando essas inserções e sugerindo que essas populações são
geneticamente distintas (Abel et al., 2006).
As diferenças genéticas observadas entre diferentes isolados de H. heydorni
estimularam alguns autores a especularem sobre a existência de outras espécies dentro
do gênero Hammondia (Schares et al., 2001; Sreekumar et al., 2003; Monteiro et al.,
2007). Uma nova espécie de Neospora (N. hughesi) foi classificada, em parte, devido a
detecção de sete nucleotídeos diferentes no ITS-1 do rDNA, diferenças estas
numericamente inferiores àquelas encontradas para H. heydorni (Marsh et al., 1998).
29
3 ARTIGO CIENTÍFICO
Investigation of Neospora caninum, Hammondia heydorni and Toxoplasma gondii
in slaughtered beef cattle from Bahia, Brazil
SANTOS1, Sara Lima; COSTA1, Kattyanne de Souza; GONDIM1, Leane Queiroz;
SILVA1, Mariana Sampaio Anares da; UZÊDA1, Rosângela Soares; ABE-SANDES2,
Kiyoko; GONDIM1*, Luis Fernando Pita.
1
Universidade Federal da Bahia, Escola de Medicina Veterinária, Departamento de
Patologia e Clínicas, Avenida Ademar de Barros, 500, Ondina, Salvador, Bahia, Brazil
40170-110
2
*
Universidade Estadual da Bahia - UNEB
Corresponding author (GONDIM, Luis Fernando Pita) - E-mail: [email protected]
Summary
Neospora caninum, Hammondia heydorni and Toxoplasma gondii are coccidian
parasites which have morphological and genetical similarities. N. caninum is an
important abortive agent of cattle, while H. heydorni apparently does not induce disease
in animals. Toxoplasma gondii is a well known disease of animals and humans. The aim
of this study was to investigate the frequency of Hammondia sp, N. caninum and T.
gondii in beef cattle using a nested PCR for Toxoplasmatinae DNA, followed by
sequencing of the PCR products. A total of 100 beef cattle were tested for
Toxoplasmatinae parasites using heart and brain tissues from each animal. PCR-positive
results were observed in 7% of the animals. No positive reactions were found in heart
tissues. ITS-1 sequences of the amplicons were obtained and subjected to a BLAST
search. Five sequences matched with N. caninum (identities of 98-100%) and two
matched with T. gondii (identities of 97 and 100%) after comparisons with sequences
30
deposited in public database. Antibodies to N. caninum were found in 20% of serum
samples with titers of 1:200 (9 animals); 1:400 (6) and 1: 800 (5), while antibodies to T.
gondii were found in 26% of animals with titers of 1:50 (1 animal); 1:100 (9) and 1: 200
(16). The confirmation of N. caninium and the absence of H. heydorni in the tested
animals is suggestive that cattle are not efficient intermediate hosts of H. heydorni,
however further studies need to be performed using a greater variety of tissues and a
higher sample size. The detection of T. gondii DNA in bovine tissues reinforces the
potential risk of transmission of this parasite to humans and other animal species
through the consumption of bovine meat.
Keywords – Hammondia heydorni, Neospora caninum, Toxoplasma gondii, Cattle,
PCR.
Introduction
Neospora caninum, Hammondia heydorni, and Toxoplasma gondii are closely related
cyst-forming coccidia with heteroxenous life cycles. Neospora caninum and T. gondii
are known as pathogenic for a great variety of animal species. The first is responsible
for significant economic losses caused by abortion in cattle world-wide (Dubey, 2003).
The second has become an issue of public health because it induces congenital disease
in humans, and also causes abortion in sheep and goats (Tenter et al., 2000).
Hammondia sp. is considered to be non-pathogenic for animals or humans (Dubey et al.,
2002; Dubey, 2003).
Comparisons among these coccidia revealed that N. caninum and H. heydorni are
phylogenetically more closely related than between N. caninum and T. gondii (Ellis et
al., 1999; Mugridge et al., 1999; Siverajah et al., 2003). N. caninum and H. heydorni
have canids as definitive hosts and many species, mostly herbivores, as intermediate
hosts, while T. gondii and H. hammondi have felids as definitive hosts (Dubey et al.,
2002).
31
Many questions regarding the life cycle of N. caninum remain unknown and some
authors consider this species to be H. heydorni (Heydorn & Mehlhorn, 2002). However,
phylogenetic studies proved that they are distinct species (Ellis et al., 1999; Monteiro et
al., 2007).
The oocysts of these parasites are morphologically similar (Schares et al., 2001; Slapeta
et al., 2002). Studies about H. heydorni prior to the classification of N. caninum should
be interpreted with caution, because no tests were available to differentiate the two
parasites at that time (Schares et al., 2001; Slapeta et al., 2002).
Among the molecular techniques, PCR offers great possibilities to solve the difficulties
on studies of Toxoplasmatinae organisms because it is highly sensitive and specific
(Payne & Ellis, 1996). The ITS-1 of rDNA has been a target of development of primers
that can differentiate sequences between these closely related coccidia. Analysis of the
ITS-1 sequence has allowed the classification of new parasite species as well as
variations inside the species H. heydorni (Marsh et al., 1998; Schares et al., 2002;
Slapeta et al., 2002; Sreekumar et al., 2003; Abel et al., 2006).
Although many serological studies have been done with N. caninum in a diversity of
species, it is not clear whether H. heydorni induces cross-reaction in serological tests
with N. caninum as observed between T. gondii and H. hammondi. Epidemiologic
studies of Hammondia species are scarce because theses parasites could not be
maintained in cell culture and serological tests have not been developed for them (Speer
et al., 1988; Riahi et al., 1995; Mugridge et al., 1999; Schares et al., 2003).
N. caninum and T. gondii are widespread among several animal species throughout
Brazil. N. caninum is recognized as an important cause of bovine abortion in the country
(Gondim, et al., 1999b; Corbellini et al., 2006) and there are several serological
evidences that it is present in different climatic regions (Gondim, L. F. et al., 1999a;
Corbellini et al., 2002; de Souza et al., 2002; Guimaraes et al., 2004; Aguiar et al.,
2006; Corbellini et al., 2006; Melo et al., 2006; Munhoz et al., 2006; Oshiro et al., 2007;
de Moraes et al., 2008). T. gondii is not commonly associated with disease in cattle,
32
however, the consumption of infected bovine meat may cause infection in humans and
other animal species (Tenter et al., 2000).
Previous studies indicated cattle as intermediate hosts of H. heydorni; dogs fed with
bovine tissues shed oocysts (reviewed by Heydorn & Mehlhorn, 2002), however the
time the studies were done N. caninum had not been described, so it is unclear the actual
identity of the observed oocysts (Heydorn & Mehlhorn, 2002; Slapeta et al., 2002).
Materials and Methods
Samples of blood, brain and heart were collected from 100 beef cattle (Nelore and
mixed breed) at a commercial slaughterhouse in Salvador metropolitan region, Bahia –
Brazil, between March and November, 2008. The animals were from different counties
(Itapetinga, Itajú do Colônia, Ipirá, Marcionílio Souza, Fátima, and Macajuba) which
are located between 200 and 600 km from Salvador.
The sera were separated and stored at – 20o C until the execution of the serological tests.
The entire brains and hearts were individually packaged, refrigerated and transported to
Universidade Federal da Bahia.
About one-third of brain and 200-250 g of different segments of heart were collected
and stored at – 20o C until DNA isolation. All materials used in between each tissue
collection were decontaminated with sodium hypochlorite solution (2.5%) followed by
dH2O to prevent DNA cross-contamination.
The serum samples were diluted at 1:200 and 1:50 for N. caninum and T. gondii
immunofluorescent antibody tests (IFAT), respectively. Tachyzoites of N. caninum
(NC-Bahia strain) and T. gondii (RH strain) were used as antigens in each test. A
fluorescein isothiocyanate labeled anti-mouse IgG was used as a secondary antibory
(Sigma, St. Louis, Missouri, USA). Positive sera were two-fold diluted until the end
point.
33
A total of 200 samples, (100 from brains and 100 from hearts) were homogenized with
pestle and mortar in liquid nitrogen, and in each procedure, the same DNA
decontamination protocol described before was used in the implements. DNA extraction
was performed using an Easy-DNATM kit (Invintrogen, São Paulo, Brazil).
A Nested-PCR was performed for detection of Toxoplasmatinae DNA. The primers JS4
that anneals to the 3’ conserved region of the SSU rRNA gene (Slapeta et al., 2002) and
CT2b that anneals the 5.8S rRNA (Monteiro et al., 2007) were selected as external
primers (~500 bp of band size), while CT1/CT2 (Sreekumar et al., 2003) were
employed as internal primers for the ITS-1 sequences (~400 bp of band size) of N.
caninum, Hammondia sp. and T. gondii.
Reactions were run in a GeneAmp PCR System 9700 (Applied Biosystems, Foster City,
CA, USA) thermal cycler. In each step of PCR, reactions were performed in 12.5 µL
volumes containing 0.25 µL of each primer, 6.5 µL of PCR Master Mix (50 U/ml
TaqDNA polymerase in a proprietary reaction buffer, pH 8.5, 400 lM each
deoxynucleoside triphosphate and 3 mM MgCl2) (Promega, USA), 5,25 µL of ultrapure water and 0.5 µL of DNA template.
The first PCR reaction (JS4/CT2b) was done under the following conditions: 1 cycle at
94oC for 5 min; 40 cycles of 94oC for 1 min, 60oC for 1 min; 72oC for 1 min followed
by 72oC for 7 min. The conditions of the second PCR reaction (CT1/CT2) were the
same as the first, except for the annealing temperature that was 55oC. PCR products
were analyzed after the second reaction by electrophoresis on 2% agarose gel stained
with blue green (LGC) and visualized under ultraviolet light. DNA from H. heydorni
oocysts obtained from a naturally infected dog (Monteiro et al., 2007) was used as a
positive control and ultra-pure water as a negative control.
When amplicons were visualized, the reactions were repeated for a total volume of 50
µL, and 30 µL of each positive sample was again subject to electrophoresis in 1%
agarose for amplicon isolation. The amplicons were extracted from the gel using the
34
Wizard SV Gel and PCR Clean-Up System (Promega, Madison, WI, USA) kit
according with the manufacturer’s instructions.
The PCR products were directly sequenced in the forward and reverse directions using
the Big Dye terminator system, version 3.1 (Applied Biosystems, Foster City, CA,
USA) and an ABI 3100 sequencer (AME Bioscience). The sequence chromatograms
were edited using BioEdit Sequence Alignment Editor version 7.0.9.0 (Ibis Biosciences,
Carlsbad, CA, USA). BLAST searches were performed in order to compare the
sequences with those in the public database (http://www.ncbi.nlm.nih.gov).
Results
A total of 100 beef cattle were tested for N. caninum, Hammondia sp. and T. gondii
using brain and heart tissues. PCR-positive results were observed in 7% of the tested
animals. Positive reactions were only detected in the brain. ITS-1 sequences of the
amplicons were obtained for the seven samples, and subject to a BLAST search to
obtain the best score. Five sequences matched with N. caninum (GenBankTM accession
numbers: FJ966043, FJ966044, FJ966045, FJ966046, FJ966047) and 2 matched with T.
gondii (GenBankTM accession numbers: FJ966048, FJ966049). The sequences of each
identified species shared 97-100% identity with sequences from other strains of these
coccidia present in GenBank (AF432123, AY582110, U16161, AY665718.1,
AF432123.1).
Antibodies to N. caninum were found in 20% of serum samples with titers of 1:200 (9
animals); 1:400 (6) and 1: 800 (5), while antibodies to T. gondii were found in 26% of
animals with titers of 1:50 (1 animal); 1:100 (9) and 1: 200 (16). In a total of 20 positive
serum samples for N. caninum, 14 sera reacted solely with N. caninum and six sera
reacted with both N. caninum and T. gondii. Most of PCR positive animals were
seronegative for N. caninum or T. gondii (Table 1).
35
Table 1.
Results of a nested PCR followed by sequencing for detection of
Toxoplasmatinae parasites and Immunonfluorescent Antibody Test (IFAT) for detection
of antibodies to Neospora caninum and Toxoplasma gondii.
Animal ID
Tissue IFAT for N. caninum IFAT for T. gondii Sequencing result
04
Brain
Negative
Negative
Neospora caninum
09
Brain
Positive (1:400)
Positive (1:200)
Neospora caninum
46
Brain
Negative
Negative
Toxoplasma gondii
63
Brain
Negative
Negative
Toxoplasma gondii
67
Brain
Negative
Positive (1:50)
Neospora caninum
75
Brain
Negative
Negative
Neospora caninum
80
Brain
Negative
Negative
Neospora caninum
Discussion
Infections by N. caninum and T. gondii have been confirmed in beef cattle using a
nested PCR for Toxoplasmatinae DNA followed by sequencing of the amplified
fragments. H. heydorni has not been detected in the tested animals. In a recent study
using 102 slaughtered goats in Bahia, a higher number of H. heydorni-infected animals
was detected when compared to N. caninum-infected ones, and H. heydorni DNA was
mostly found in the heart (Silva et al., in press). In the present report, the detection of N.
caninum in 5% of animals and the absence of H. heydorni is suggestive that cattle are
less susceptible to H. heydorni infection when compared with N. caninum.
In a previous review (Heydorn & Mehlhorn, 2002), the authors mentioned a study from
1972 reporting that dogs fed with cattle tissues shed H. heydorni oocysts. However,
studies about H. heydorni oocysts performed before the description of N. caninum
(Dubey et al., 1988) should be interpreted with caution, because it is not possible to be
certain about the identity of the oocysts without molecular differentiation (Ellis et al.,
1999).
36
It is important to note that in different experiments using cattle or buffaloes to induce
excretion of N. caninum oocysts in dogs (Dijkstra et al., 2002; Gondim, et al., 2002;
Rodrigues et al., 2004), H. heydorni has not been detected. Shedding of H. heydorni
oocysts has been reported in dogs fed with other non-bovine ruminants (Mohammed et
al., 2003; Schares et al., 2001b; Dubey et al., 2004) or in dogs with spontaneous
shedding without a clear history of consuming any specific meal (Slapeta et al., 2002b).
Despite the phylogenetical and morphological similarities between H. heydorni and N.
caninum, it is possible that the susceptibility of cattle for these parasites is different.
In a recent study (Soares et al., in press) two Brazilian foxes (Cerdocyon thous) shed H.
heydorni oocysts after consuming a pool of masseter muscle and brain from two adult
cattle which had titers of 100 for N. caninum; the foxes used in this study had consumed
commercial dog food, and raw meat from chicken and cattle for six months, however,
30 days before the beginning of the experiment the foxes were fed with commercial dog
food, and their feces were negative for oocysts by daily examination. The shedding of
H. heydorni oocysts by the two foxes after consumption of bovine tissues (Soares et al.,
inpress) seems to be the unique confirmation of cattle as intermediate host of the
parasite, however the previuos history of ingestion of raw chicken by the two foxes
raises some questions whether these oocysts were shed because of the consumption of
raw meat from chickens.
The finding of T. gondii DNA in 2% of beef cattle in the present study enhances the
potential risk of transmission of this parasite through bovine meat for humans and other
animal species. The animals used in this study were raised extensively and are supposed
to be less exposed to parasite oocysts than dairy cattle or intensively cared beef cattle
are.
The frequencies of antibodies to N. caninum and T. gondii detected by IFAT were 26%
and 20%, respectively. The frequency of N. caninum-seropositive animals was similar
to a previous report in Bahia (Gondim et al., 1999a), however the seropositivity
observed for T. gondii was higher than previously reported in the same region (Gondim
et al., 1999b), suggesting an increase in the exposure of cattle to this parasite. The
37
nested PCR resulted in a lower number of infected animals than the serology, what may
be explained by the reduced number of tissues used for PCR and because only a portion
of brain and heart (not the entire organs) was used in the DNA extraction.
In a similar study performed with 102 goats, the use of heart and brain allowed the
detection of H. heydorni, T. gondii and N. caninum (Silva et al., in press).However,
more studies on H. heydorni infection need to be performed using a greater variety of
bovine tissues and a higher number of animals.
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41
4 CONSIDERAÇÕES GERAIS
Devido à estreita relação filogenética e semelhanças morfológicas entre H. heydorni e
N. caninum, é necessário o emprego de testes que permitam a diferenciação entre as
duas espécies.
Existem poucas informações sobre o ciclo de vida de H. heydorni baseados em estudos
moleculares. Estes estudos se tornam necessários pela ausência de testes sorológicos
para H. heydorni que permitam a realização de levantamentos epidemiológicos sobre o
parasito. A freqüência da infecção por H. heydorni em bovinos de corte no estado da
Bahia foi determinada com a utilização de uma PCR nested específica para parasitos da
subfamília Toxoplasmatinae, seguida pelo sequenciamento das amostras positivas. Não
foi detectado DNA do parasito nos tecidos dos animais testados.
A detecção de N. caninum nos animais testados e a ausência de H. heydorni, que
também possui cães como hospedeiros definitivos, é sugestivo de que bovinos não são
hospedeiros eficientes de H. heydorni. Nos trabalhos iniciais apontando bovinos como
hospedeiros intermediários de H. heydorni, realizados antes da descoberta de N.
caninuim, não houve a confirmação molecular da identidade do parasito. Portanto, ainda
é desconhecido se bovinos são hospedeiros de H. heydorni.
Foram determinadas as freqüências moleculares de N. caninum e T. gondii em bovinos
abatidos no estado da Bahia, sendo que foram identificados animais infectados para os
dois parasitos. A observação de DNA de T. gondii nos animais destinados ao consumo
humano reforça o potencial de transmissão da toxoplasmose por meio do consumo de
carne bovina. A confirmação de N. caninum nos tecidos dos bovinos, embora inédita no
estado da Bahia, era esperada, uma vez que diferentes estudos sorológicos já indicavam
um alto grau de exposição dessa espécie ao parasito.
42
Mais estudos devem ser conduzidos em bovinos utilizando uma maior variedade de
tecidos e um número mais representativo de animais, a fim de confirmar a
susceptibilidade dos bovinos à infecção por H. heydorni.
43
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Sara Lima Santos - Pós-Graduação em Ciência Animal nos Trópicos