APRENDENDO A ALFABETIZAR CIENTIFICAMENTE: A EXPERIÊNCIA DO PIBID - LICENCIATURA EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS DO IFSULDEMINAS – CÂMPUS INCONFIDENTES. Autores: Raquel de Cássia Nogueira Góes (EE Horácio Narciso de Góes. PIBID IFSULDEMINAS – câmpus Inconfidentes), Maria Helena Barbosa (EE Horácio Narciso de Góes. PIBID IFSULDEMINAS – câmpus Inconfidentes) e Débora Ribeiro Costa (Licenciatura em Ciências Biológicas. PIBID IFSULDEMINAS – câmpus Inconfidentes) Resumo O trabalho relata a experiência do PIBID – Licenciatura em Ciências Biológicas do IFSULDEMINAS – Câmpus Inconfidentes. O projeto tem como objetivo formar professores de Ciências capazes de trabalhar a partir da perspectiva da alfabetização científica, o movimento de professores, educadores e pesquisadores que defende um ensino de Ciências comprometido com a formação de cidadãos capazes de compreender o que é a Ciência, de que forma ela afeta a vida cotidiana e de tomar decisões, individuais e coletivas, fundamentadas em conhecimentos científicos e tecnológicos (CACHAPUZ et al, 2005). O projeto iniciou-se em março de 2014 e conta com vinte e seis bolsistas de iniciação à docência e quatro professoras supervisoras que atuam em duas escolas de nível fundamental do município de Ouro Fino, MG. O processo formativo do projeto fundamenta-se no conceito de comunidade de aprendizagem da docência e adota como referência teórica o paradigma da racionalidade prática (MIZUKAMI et all, 2002). As ações do projeto envolvem a leitura e a discussão sobre a Ciência e seus desdobramentos sociais e também a elaboração de intervenções didáticas junto a alunos do ensino fundamental. Os resultados do projeto, ainda que preliminares, apontam a precária formação científica nos cursos de licenciatura e algumas potencialidades da proposta no sentido de instrumentalizar os licenciados com um conjunto de conhecimentos e de repertório de ações capazes de desencadear processos de ensino de Ciência que se aproximem dos princípios da alfabetização científica. Palavras-chave: alfabetização científica, PIBID, formação de professores de Ciências. APOIO FINANCEIRO: CAPES e IFSULDEMINAS 2 Introdução “Insanidade é fazer as mesmas coisas várias vezes esperando obter resultados diferentes", diz uma famosa frase atribuída ao físico Albert Einstein (1879-1955). O PIBID é um programa do Ministério da Educação, gerenciado pela CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), cujo objetivo maior é o incentivo à formação de professores para a educação básica e a elevação da qualidade da escola pública. O programa concede bolsas a alunos de licenciatura participantes de projetos de iniciação à docência desenvolvidos por Instituições de Educação Superior (IES) em parceria com escolas de educação básica da rede pública de ensino (BRASIL, 2013). Os projetos devem promover a inserção dos licenciandos no contexto das escolas públicas desde o início da sua formação acadêmica para que desenvolvam atividades didático-pedagógicas sob a orientação de um docente da licenciatura e de um professor da escola. Os principais objetivos do projeto são incentivar a formação qualificada de docentes para atuação na educação básica, promover a integração entre as escolas e as instituições formadoras de professores, estimular experiências metodológicas de caráter inovador e interdisciplinar e criar condições para a articulação teoria e prática (Brasil, 2013). O PIBID Licenciatura em Ciências Biológicas do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sul de Minas Gerais (IFSULDEMINAS), câmpus Inconfidentes, tem como tema a alfabetização científica, entendida como estratégia capaz de contribuir com as mudanças que são necessárias no ensino de Ciências na educação básica brasileira. A proposta de uma renovação do ensino de ciências visa formar uma nova geração de professores de Ciências, mais preparados para lidar com os desafios que o ensino desta área enfrenta hoje no Brasil. Tal proposta visa a ir além da tradicional transmissão de conhecimentos científicos favorecendo a participação dos cidadãos na tomada fundamentada de decisões (CACHAPUZ et al, 2005). O mesmo pode-se dizer do papel que nós, professores, precisamos exercer: sempre buscar obter melhorias na aprendizagem de nossos alunos. Docentes e pesquisadores que atuam no ensino de Ciências já identificaram, há vários 3 anos, os desafios encontrados para conseguir uma aprendizagem significativa nessa área. Muitas são as perguntas relacionadas ao tema. Como atingir a alfabetização científica dos alunos? Que objetivos a disciplina deve contemplar na sociedade atual? Como a área deve ser abordada com base em uma perspectiva construtivista? A questão se estende para as visões deformadas de ciência e tecnologia, que muitas vezes estão presentes no ensino de Ciências e a relação entre teoria/observação/teoria, destacando a importância das práticas experimentais numa abordagem de ensino pela pesquisa. A Alfabetização Científica está colocada como uma linha emergente na didática das ciências, que comporta um conhecimento dos fazeres cotidianos da Ciência, da linguagem científica e da decodificação das crenças aderidas a ela (CACHAPUZ et al, 2005). É um processo que tornará o indivíduo alfabetizado cientificamente nos assuntos que envolvem a Ciência e a Tecnologia, ultrapassando a mera reprodução de conceitos científicos, destituídos de significados, de sentidos e de aplicabilidade. Nesta perspectiva, a Alfabetização Científica se constitui num aliado para que o aluno possa ler e compreender o seu universo. Se a escola não pode proporcionar todas as informações científicas que os cidadãos necessitam, deverá, ao longo da escolarização, propiciar iniciativas para que os alunos saibam como e onde buscar os conhecimentos de que necessitam para a sua vida diária. Nessa perspectiva, as atividades pedagógicas desenvolvidas no projeto PIBID se apoiam em novos espaços, aulas práticas, saídas a campo, mostras científicas, trabalhos investigativos, propiciando uma aprendizagem mais significativa. Para uma renovação do ensino de Ciências, precisamos não só de uma renovação epistemológica dos professores, mas que essa venha acompanhada por uma renovação didático-metodológica de suas aulas. Não se trata apenas de uma questão de tomada de consciência e de discussões epistemológicas, é também necessário um novo posicionamento do professor em suas classes para que os alunos sintam uma sólida coerência entre o falar e o fazer. Para que isso efetivamente ocorra é necessário que a formação dos professores de Ciências os prepare para uma nova forma de atuar em sala de aula. É com o objetivo de que essa formação seja não apenas teórica e nem apenas prática, mas que concilie 4 essas duas dimensões do fazer docente, que se propõem as atividades do PIBID Licenciatura em Ciências Biológicas do IFSULDEMINAS - câmpus Inconfidentes. Este texto tem como objetivo apresentar a metodologia de trabalho adotada no projeto e alguns resultados preliminares. Metodologia A equipe do PIBID Licenciatura em Ciências Biológicas do IFSULDEMINAS Câmpus Inconfidentes conta com vinte e seis bolsistas de iniciação à docência e quatro professoras supervisoras que atuam em duas escolas de nível fundamental do município de Ouro Fino, MG e dois professores orientadores, que são responsáveis pelo programa. O processo formativo do projeto fundamenta-se no conceito de comunidade de aprendizagem da docência e adota como referência teórica o paradigma da racionalidade prática (MIZUKAMI et all, 2002). Uma das escolas participantes é a E.E. Horácio Narciso de Góes, localizada na zona rural do município de Ouro Fino, MG. A escola conta com Ensino Fundamental – anos iniciais e finais - e também com duas turmas do PROETI (Projeto Escola em Tempo Integral), uma com alunos dos anos iniciais, com 25 alunos e, outra, com alunos dos anos finais, com 30 alunos. A outra escola é a EE Bueno Brandão, também localizada no município de Ouro Fino, mas é uma escola de zona urbana, atendendo a um público bastante distinto da outra escola. Possui uma turma de PROETI- anos finais com 25 alunos e uma turma de aceleração (equivalente aos 8º e 9º anos) também com 25 alunos. Na primeira escola, atuamos apenas com a turma do PROETI - anos finais; na segunda escola, atuamos na turma do PROET- anos finais e também na turma de aceleração. O que nos levou a escolher essas escolas foram alguns relatos dos trabalhos desenvolvidos pelos alunos durante os estágios curriculares, o fato de apresentarem turmas de PROETI e o desafio em atuar ao mesmo tempo com alunos de realidades muito distintas. Acreditamos que o currículo do PROETI, por ainda não ter uma estrutura tão rígida e não ser alvo de avaliações externas, cria mais possibilidades para o trabalho de alfabetização científica. Busca uma ampliação qualificada do tempo, composto por atividades educativas diferenciadas no campo das ciências, da cultura, das artes, das tecnologias, entre outras, articuladas aos componentes curriculares e áreas do conhecimento, bem como às vivências e práticas socioculturais, numa concepção de educação integral que 5 proporcione ao educando seu desenvolvimento físico, cultural, afetivo, social, cognitivo e ético. No desenvolvimento de uma proposta de educação integral não existem modelos predefinidos, mas é fundamental organizar um currículo capaz de integrar os diferentes campos do conhecimento e as diversas dimensões formadoras das crianças e jovens na contemporaneidade. A escola deve voltar-se, também, para a formação do cidadão, priorizando práticas e construindo valores que possibilitem a convivência em uma sociedade democrática sem abrir mão de seus conteúdos, mas atribuindo sentido ao que é transmitido. (MINAS GERAIS, 2013, p.6). A princípio foram feitas várias reuniões entre os bolsistas de iniciação à docência, as supervisoras e coordenadores nas dependências do IFSULDEMINAS. Nessas reuniões foram realizados alguns estudos das referências teóricas sobre a alfabetização científica. Para cada tema fizemos uma leitura antecipada e, com a ajuda dos coordenadores, discutíamos os conteúdos dos textos. Os temas ligados ao conhecimento científico eram propostos via internet ou por apostilas. Os coordenadores ajudavam os bolsistas de iniciação à docência e as supervisoras a buscarem a melhor interpretação dos textos através de discussão e reflexão sobre a Ciência e seus desdobramentos sociais. Concomitantemente aos estudos, os bolsistas de iniciação à docência passaram a observar o ambiente escolar e as aulas, em ambas as escolas, atendo-se às singularidades de cada turma, nomes e costumes. Observaram o trabalho dos professores, suas metodologias e didática. Após os estudos e observações, deu-se início ao planejamento das intervenções pedagógicas que seriam feitas junto aos alunos de educação básica. As atividades desenvolvidas com os alunos são realizadas em módulos. Cada módulo é um conjunto de atividades a partir de um determinado tema. O planejamento das atividades é feito em reuniões. Há dois tipos de reuniões: entre os bolsistas de iniciação à docência e as supervisoras e entre os bolsistas de iniciação à docência, as supervisoras e a coordenadora de área do projeto. Todas as atividades são discutidas em grupo e aplicadas junto aos alunos da educação básica pelos bolsistas de iniciação à docência, que conduzem as atividades. Depois de aplicadas, as atividades são avaliadas por todo o 6 grupo (bolsistas de iniciação à docência, supervisoras e coordenadora de área do projeto) e são ressaltados seus aspectos positivos e negativos, se os objetivos foram atingidos ou não e por quê. Neste momento procura-se evidenciar a aprendizagem de todo o grupo, principalmente as dos bolsistas de iniciação à docência. O primeiro módulo foi direcionado à investigação sobre o que os alunos compreendiam sobre Ciências e o trabalho que os cientistas desenvolvem. Para essa intervenção foram criados momentos de discussão, debates, entrevistas, exibição de vídeos e sistematização de ideias por escrito e por meio de desenhos. Observou-se que alguns alunos tinham grande dificuldade na leitura e na escrita. Por isso, o segundo módulo foi proposto com um novo tema a ser trabalhado – “agrotóxicos” - dando ênfase no desenvolvimento da leitura e escrita dos alunos por meio de debates, leituras, entrevistas, elaboração de um jornal impresso sobre o assunto e gravação de um telejornal escrito e interpretado pelos alunos. Durante todas as atividades as supervisoras e os alunos bolsistas da iniciação à docência registram suas impressões semanalmente em portfólios. Esses registros são pessoais e significativos uma vez que levam a uma reflexão dos trabalhos desenvolvidos e seus resultados. Por meio dos portfólios os bolsistas tomam mais consciência das suas ideias e das suas aprendizagens no projeto. Conclusões Durante a realização dos trabalhos tem-se verificado, como já aponta a literatura, que a formação científica no Brasil é frágil e deficitária, mesmo entre os licenciandos e os professores já em atuação. Durante a primeira fase do projeto, em que foram discutidos textos sobre Ciência e sobre alfabetização científica, ficou evidente a frágil formação científica dos próprios integrantes, a qual se deve a toda uma trajetória escolar que nunca ou raramente oportunizou momentos de reflexão sobre o que é a Ciência, quais são as bases do trabalho científico, em que medida a Ciência se diferencia de outras atividades humanas, quais as relações entre a Ciência, a produção tecnológica, o meio ambiente e as sociedades humanas etc. Assim, o projeto tem contribuído para trazer à tona as concepções dos integrantes e também para discuti-las e ampliá-las em um processo de reflexão coletiva. Além disso, algumas dificuldades que têm sido encontradas no desenvolvimento das atividades junto aos alunos, como por exemplo, os problemas de leitura e escrita, e 7 ideias preconcebidas sobre a Ciência, que a relacionam ao uso de equipamentos laboratoriais. Em nossas reuniões coletivas, os bolsistas de iniciação à docência têm manifestado o desenvolvimento de uma série de conhecimentos e habilidades necessários ao ensino de Ciências na perspectiva da alfabetização científica, tais como: a) Não é possível mudar a concepção dos alunos sobre Ciências com atividades pontuais, é necessário um trabalho de médio em longo prazo e no qual os alunos possam vivenciar diferentes situações que os familiarizem, pouco a pouco, com os procedimentos científicos; b) os alunos têm muito interesse e curiosidade em conhecer e conversar com cientistas, considerados por eles como pessoas especiais, portadoras de um grande conhecimento, o que, embora seja favorável às atividades de alfabetização científica, precisa ser trabalhado para que eles também possam desenvolver uma criticidade com relação ao trabalho dos cientistas; c) os alunos têm interesses particulares e específicos por temas científicos e, portanto, trabalhar a partir do interesse dos alunos parece motivá-los mais; d) a literatura sobre alfabetização científica enfatiza muito a importância da leitura e da escrita neste processo; no projeto, como já mencionado, os alunos têm pouco interesse pela leitura e pela escrita, mas quando estas atividades são utilizadas como atividades-meios e não como atividades-fim, elas são mais bem recebidas por eles. Dessa forma, é possível concluir, apesar de resultados ainda preliminares, que a experiência tem contribuído com os licenciandos no sentido de despertá-los para a problemática que envolve o ensino de Ciências hoje, no Brasil, e também para desenvolver uma base de conhecimentos que lhes permita atuar como professores capazes de superar as deficiências de um ensino de Ciências acrítico e não problematizador das relações entre Ciência, Tecnologia, Ambiente e Sociedade. Esperamos que até o final do projeto, os bolsistas de iniciação à docência desenvolvam não apenas as suas próprias concepções sobre a Ciência, de forma a aproximá-las de ideias mais complexas e críticas, mas que também sejam capazes de propor e avaliar atividades de ensino que contribuam com o processo de alfabetização científica dos alunos da educação básica. 8 Referências: BRASIL. Portaria 096, 18/07/2013. Dispõe sobre as normas do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência. Disponível em http://www.capes.gov.br/images/stories/download/legislacao/Portaria_096_18jul13_ AprovaRegulamentoPIBID.pdf. Acesso: fevereiro de 2014. CACHAPUZ, GIL- PEREZ, PESSOA de CARVALHO, PRAIA e VILCHES. A necessária renovação do ensino das Ciências, São Paulo, Cortez Editora, 2005, 263p. MARANDINO, Martha; KRAASILCHIK, Myriam. Ensino de Ciências e Cidadania, São Paulo, Editora Moderna Ltda., 2005, 88p. MINAS GERAIS, Secretaria de Estado da Educação. Projeto Estratégico Educação em Tempo Integral. Belo Horizonte, 2013, 23 p. Disponível em http://crv.educacao.mg.gov.br/SISTEMA_CRV/banco_objetos_crv/%7B4D8AC33E -AEE5-495E-A75097F103880572%7D_2013%20Diretrizes%20para%20implanta%C3%A7%C3%A3o%2 0do%20projeto%20Educa%C3%A7%C3%A3o%20em%20Tempo%20Integral(1).pdf. Acesso em: fevereiro de 2014. MIZUKAMI et al. Escola e aprendizagem da docência: processos de investigação e formação. São Carlos: Edufscar, 2002, 203p.