HOMILIA DO 6º DOMINGO DO TEMPO COMUM “Ensinai-me a viver vossos preceitos, quero guardá-los fielmente até o fim!” Leituras: Eclesiástico 15, 16-21; Salmo 118; Primeira Carta de São Paulo aos Coríntios 2, 6-10; Mateus 5, 17-37. COR LITÚRGICA: VERDE Animador: A justiça do cristão não depende em primeiro lugar da sua observância da lei, mas de se terem realizado em Jesus os últimos tempos, porque Ele veio para ser o primeiro a obedecer à lei em comunhão com Deus 1. Situando-nos brevemente Neste domingo, o sexto do Tempo comum, na trilha do evangelista Mateus, permanecemos na montanha com Jesus, acolhendo como discípulos, a proposta singular e desafiadora de seu Reino. Ele nos propõe uma nova maneira de interpretar a lei, levando-a à plenitude e chamando-nos à exigência de sua radicalidade, na prática da justiça e da misericórdia. A Eucaristia, que hoje celebramos, abraça todas as pessoas que, com o coração sincero e reto, se comprometem com a justiça, socorrem os mais fracos, partilham com generosidade o pão, promovem o relacionamento fraterno entre as pessoas e acreditam na força do perdão e da reconciliação. Feliz quem anda na lei do Senhor, cantamos no salmo de hoje. Esta é assembléia onde Deus habita, rezamos na oração inicial, a quem Deus revela a sabedoria de sua lei, pelo seu Espírito. 2. Recordando a Palavra Hoje continuamos ouvindo o sermão da montanha, no qual Jesus ensina o que está na origem do Reino de Deus. Ele não veio abolir a lei e os profetas, mas veio dar-lhes pleno cumprimento. Para Jesus, as Sagradas Escrituras devem ser integralmente cumpridas. Quem compreender isto e assim ensinar será grande no Reino de Deus, mas quem fizer o contrário será o menor. O contexto em que o primeiro evangelho surgiu é aquele após a destruição de Jerusalém e do templo pelo império romano. Os grupos existentes no judaísmo (saduceus, zelotas e essênios) haviam sido dizimados. Das ruínas materiais e da crise espiritual emerge um grupo fariseu que unifica o judaísmo normativo, excluindo qualquer pluralismo. 1 A comunidade do evangelho de Mateus é constituída por judeus que reconheceram Jesus como o Messias. A rejeição aos cristãos vai se intensificando, até tornar-se oficial na assembléia de Jamnia, entre os anos 85 a 90 d.C. Os judeu-cristãos são expulsos formalmente das sinagogas. O trecho do evangelho que ouvimos hoje expressa bem a tensão existente entre os cristãos e os fariseus. Para quem segue Jesus ressuscitado, a prática da justiça é fundamental, Jesus fala com uma autoridade que está acima dos mestres do judaísmo. Jesus cumpre a lei e os profetas em seu sentido profundo. O reinado de Deus é a meta. Quem pertence a esse reinado do Senhor tem que superar a prática da justiça dos letrados e dos fariseus. Jesus expõe sua posição diante da lei tradicional, indo além, exigindo atitudes interiores, conversão profunda, na forma reiterada: “foi dito” – “eu vos digo”. A lei de Jesus supera a lei de Moisés que é, ao mesmo tempo, lei religiosa e civil. Nos versículos 21-26, sobre o homicídio (Ex 20,13; Dt 5,17; Lv 24,17), radicaliza-se a atitude interior (cf. Lv 19, 17-18) de onde brota a violência de matar e se estendem as ofensas menores – xingamentos, insultos, desprezo, rancor, inveja – que podem levar ao homicídio. Há uma hierarquia para o castigo: tribunal local, conselho nacional, o próprio Deus, com o castigo escatológico do fogo. Do preceito negativo de “não matar” estende-se a exigência positiva da reconciliação, antes da participação no culto. Os versículos 27-30 são sobre o adultério sua proibição (Ex 20, 10,14; Dt 5,18), sob pena de morte (Lv 20,10). A nova lei atinge a atitude interior de desejo consentido que entra pelos olhos e pelos outros sentidos e membros. Novamente é lembrando o fogo escatológico como castigo. Os versículos 31-32 falam do divórcio concedido ao homem. Jesus se opõe à lei e à sua legalidade. Os versículos 33-37 falam sobre o juramento (Lv 19,12; Nm 30,2). Entre os irmãos cristãos, a sinceridade deve ser tal que inutilize todo juramento: “Sobretudo, meus irmãos, não jureis, nem pelo céu, nem pela terra, nem com outro juramento qualquer. O vosso sim seja sim, e o vosso não, não. Então não estareis sujeitos a julgamento.” (Tg 5,12) O juramento era procedimento legal e prática religiosa admitidos e respeitados. No juramento, se oculta a desconfiança na palavra humana; o juramento busca o respaldo de uma instância superior. Não se deve colocar Deus em meio a nossas questões humanas. O livro do Eclesiástico afirma a liberdade humana diante da proposta de Deus: “se você quiser” observar os mandamentos, eles guardarão você; “se quiser” confiar em Deus, você vai ver. Deus deu-lhe a capacidade de escolher entre o fogo e a água, entre a vida e a morte, o bem e o mal. Você receberá o que preferir. A sabedoria de Deus é imensa. Ele é forte e bondoso e tudo vê. Deus tem cuidado de quem o teme e conhece nossas obras. Ele não nos mandou agir erradamente e não nos dá licença de pecar. O Salmo 119 (118) é uma longa meditação sobre a lei de Deus, sua Palavra, mencionada em cada verso por diversos sinônimos. É um salmo de instrução, proclamando que é feliz quem observa e vive os preceitos do Senhor. A carta aos Coríntios fala da misteriosa sabedoria de Deus, que os foi revelada através do Espírito. 3. Atualizando a Palavra Hoje a Palavra de Deus nos ilumina sobre a relação entre Jesus e a lei. Sua missão não é abolir nem facilitar, mas libertar do formalismo e do fundamentalismo. Para Jesus, não basta a observância externa apenas para “ir para o céu” após a morte. Jesus exige radicalidade. 2 A Palavra de Deus deve atingir até o mais profundo do ser humano. É uma procura amorosa da vontade original de Deus que ultrapassa a simples letra da lei. É necessário ver e ouvir por “trás das palavras”, encontrando-se pessoalmente com o Espírito da Lei. Para o cristão ser justo, conforme a exigência de Jesus, não basta observar preceitos ou cumprir mandamentos. É necessário viver e realizar o bem proposto por Deus em sua Palavra. A letra da lei mata, mas o Espírito vivifica. Conforme o Salmo 119 (118), a lei é uma luz, um caminho, razão de viver e se sentir interiormente como o povo escolhido de Deus. A lei foi dada para podermos viver e testemunhar o bem que Deus propõe. Jesus nos alerta que podemos observar a lei em outro espírito, que não seja o Espírito de Deus. O espírito que motivava os fariseus da época se afastava do projeto do Pai, porque não beneficiava os pobres e pequeninos. Não era espírito de Deus, mas um negócio com Deus, uma troca ou barganha. Os fariseus tornaram-se donos da lei e ela passou a ser instrumento de dominação econômica, política e religiosa sobre os demais: “Amarram pesados fardos e impõem-se aos ombros dos irmãos, ao passo que eles mesmos se negam a movê-los com o dedo”. (Cf Mt 23,4). Jesus, então, deseja tirar a lei das mãos de quem oprime em nome de sua observância e devolvê-la a Deus. O que Deus deseja é a justiça, seu plano amoroso. Procurar a justiça verdadeira é olhar a vida com amor radical. Então os mandamentos de Deus significarão muito mais do que a letra diz, e nos levarão à perfeição de filhas e filhos de Deus. Devemos cumprir toda justiça, pois a justiça inclui a lei e os profetas. O essencial da lei é a prática da justiça e da misericórdia que ultrapassam a observância legalista. Jesus toma alguns exemplos para deixar claro até onde vão a justiça e a misericórdia. Vai até a raiz e mostra que o objetivo da lei é a defesa da vida. Não basta “não matar”, é necessário construir uma sociedade humana, fraterna e solidária, na qual a vida plena seja para todos. A lei é “não cometer adultério”, mas não basta; é preciso eliminar o desejo de posse sobre a mulher, extinguir todo machismo e todos os privilégios do homem, raiz de toda opressão presente nas relações humanas. O bem-querer é a proposta de Deus. Nossa resposta é um amor verdadeiro, com raiz na totalidade da pessoa, o qual se insere na fonte do amor que é o próprio Deus. Não basta “não jurar falso”; temos que promover a convivência fundamentada na verdade, na integridade, na honestidade, na ética. O que a Palavra de Deus exige hoje de nós é cortar o mal pela raiz. Jesus não nos prescreve apenas normas, mas uma proposta evangélica nova que batize, lave até nosso inconsciente, nossa consciência profunda, e faça da vida um continuo ato de discernimento, de busca de sentido de nosso ser, de nosso viver, do nosso agir. A primeira leitura nos convida, a cada momento, a tomar uma posição diante da Lei, o projeto de Deus. 4. Ligando a Palavra com ação litúrgica Acolhemos, na mesa da Palavra, a novidade da lei do amor que não conhece limites. A Eucaristia é, para nós cristãos, a mais verdadeira e perfeita expressão simbólico-ritual desta nova lei. Ao prepararmos a mesa da ceia, neste domingo, somos impelidos a nos despojarmos do egoísmo, do individualismo, da autossuficiência e de qualquer sinal de rancor e mágoa que nosso coração esteja nutrindo contra alguém. Assim podemos, confiantes, rezar com as palavras da oração sobre as oferendas: 3 “Ó Deus, que este sacrifício nos purifique e renove, e seja fonte de eterna recompensa para os que fazem a vossa vontade”. Humildes e reconciliados, elevamos nossa ação de graças ao Pai, entregando nossa vida como oferenda agradável e levada a efeito na comunhão, como dádiva do amor de Deus para conosco e de nós para com Ele, em Cristo Jesus: “Deus amou tanto o mundo, que deu o seu Filho único, para que todo o que nele crer não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3,16), rezamos na antífona de comunhão. Oração dos fiéis: Presidente: Peçamos ao Pai para que nos dê a força de traduzir em obras a palavra que acolhemos no coração. 1. Senhor, para que a Igreja nunca deixe de anunciar a tua Palavra que sempre é de vida e salvação. Peçamos: Todos: Acolha, Senhor, nosso pedido. 2. Senhor, olhe para os cristãos do mundo inteiro, para que sejam imitadores de Cristo e atuem concretamente no projeto do evangelho. Peçamos: 3. Senhor, para que nossa vida cristã não seja apenas uma busca de milagres e de fatos extraordinários, mas uma autêntica imitação das atitudes de Jesus para com os mais pobres e necessitados. Peçamos: 4. Senhor, por nossas comunidades para que se dediquem a ajudar os mais pobres, acolhendo aqueles que precisam de ajuda e compaixão. Peçamos: (Outras intenções) Presidente: Acolha Senhor, nossas preces, fazendo de cada um de nós pessoas comprometidas com a justiça que promove a dignidade humana. Por Cristo, nosso Senhor. Todos: Amém. III. LITURGIA EUCARÍSTICA ORAÇÃO SOBRE AS OFERENDAS: Presidente: Ó Deus, que este sacrifício nos purifique e renove, e seja fonte de eterna recompensa para os que fazem a vossa vontade. Por Cristo, nosso Senhor. Todos: Amém. ORAÇÃO APÓS A COMUNHÃO: Presidente: Ó Deus, que nos fizestes provar as alegrias do céu, dai-nos desejar sempre o alimento que nos traz a verdadeira vida. Por Cristo, nosso Senhor. Todos: Amém. BÊNÇÃO E DESPEDIDA: Presidente: O Senhor esteja convosco. Todos: Ele está no meio de nós. Presidente: Que o Senhor os abençoe e façam promotores da nova lei. Por Cristo, nosso Senhor. T. Amém. Presidente: (dá a bênção e despede a todos). 4