PASSAGEM DE FRENTES FRIAS NA REGIÃO SUL DE MINAS GERAIS
Luciano José da Silva, Michelle Simões Reboita
Instituto de Recursos Naturais – Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI)
Itajubá, Minas Gerais - MG
[email protected], [email protected]
RESUMO: Este estudo quantificou a passagem de frentes frias pela Região Sul de Minas
Gerais (RSMG) no período de 2004 a 2010. Para tanto, utilizou-se dados de temperatura do ar
na superfície, de pressão ao nível do mar e da componente meridional do vento medida a 10
metros de altura. Uma frente foi identificada quando houve queda de temperatura em relação ao
dia anterior, aumento da pressão em relação ao dia anterior e no dia posterior a passagem da
frente e aumento da intensidade da componente meridional do vento, o que significa um
enfraquecimento do vento de direção norte. Em média anual, há passagem de 33 frentes pela
região, sendo a estação com maior número de passagem de frentes a primavera, seguia de
inverno, outono e verão.
ABSTRACT: This study quantified the passage of cold fronts through the Região Sul de Minas
Gerais (RSMG) between 2004 to 2010. The study used data on surface air temperature, pressure
at sea level and meridional wind component measured 10 meters high. A front was identified
when the temperature fell on the previous day, the pressure increased on the previous day and
increased after one day the passage of the front and the intensity of the meridional component of
the wind increased. On annual average, there are 39 fronts passing through the region, the
station with the largest number of fronts passing the spring followed winter, autumn and
summer.
INTRODUÇÃO
Os sistemas frontais, também denominados simplesmente de frentes, são sistemas
atmosféricos que causam mudanças bruscas nas condições do tempo nos locais por onde
passam. No caso das frentes frias, há mudança do giro do vento para quadrante sul (no
Hemisfério Sul), precipitação, decréscimo da pressão atmosférica e da temperatura do ar
(Petterssen 1956). Após a passagem frontal, normalmente, observa-se queda acentuada de
temperatura, aumento da pressão e rajadas de vento.
Alguns autores têm realizado estudos para quantificar a passagem de frentes frias em
determinados locais do país. Por exemplo, Kousky (1979) determinou a freqüência de sistemas
frontais na região nordeste do Brasil entre 1961 a 1970 e notou que os anos com maior
freqüência destes sistemas possuía maiores totais pluviométricos. Rodrigues et al. (2004)
também fizeram uma climatologia de frentes, mas para o litoral de Santa Catarina, e verificaram
que a freqüência média mensal de frentes frias não varia muito durante o ano nesta região. Para
a cidade de São Paulo, Dametto e Rocha (2005) e Morais et al. (2010) observaram que a maior
frequência de passagens frontais ocorre na primavera. Além disso, Dametto e Rocha (2005)
obtiveram que 68% da precipitação ocorrida no inverno em São Paulo é devido à passagem de
sistemas frontais.
As frentes frias atuam durante todo o ano na região sudeste do Brasil (Satyamurty e
Mattos, 1989; Reboita et al., 2009), podendo influenciar a Região Sul Minas Gerais (RSMG).
Entretanto, são escassos na literatura estudos que quantificam a passagem de frentes frias nessa
região. Portanto, o objetivo do presente trabalho é determinar a frequência da passagem frentes
frias na RSMG entre 2004 a 2010.
METODOLOGIA
a) Dados
Os dados utilizados neste estudo foram a temperatura do ar, pressão ao nível do mar e
vento meridional do período de 2004 a 2010. A temperatura média diária foi obtida através da
média entre temperatura máxima e mínima medidas na estação meteorológica da Empresa de
Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG) em Maria da Fé. A EPAMIG não faz
registro manual de dados de pressão, intensidade e direção do vento. Então, utilizou-se a pressão
ao nível do mar e a componente meridional do vento a 10 metros de altura obtida da reanálise
do ERA-Interim. Essa reanálise tem resolução espacial de 1,5° x 1,5° de latitude por longitude e
resolução temporal de 6 horas.
Antes de utilizar os dados de vento da Era-Interim na climatologia de frentes, os
mesmos foram validados com base em comparação com dados registrados no período de 1989 a
2005 na estação do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas (IAG) da
Universidade de São Paulo, localizada na latitude de 23,65° S e longitude de 46,62° W. Para
tanto se calculou a correlação dos dados medidos na estação do IAG com o ponto de grade da
ERA-Interim mais próximos a esta. A intensidade das componentes zonal e meridional
apresentaram correlação de 0,74 e 0,72, respectivamente. Também foi avaliado o sentido das
componentes do vento obtidas da reanálise com os dados observados, o vento zonal e o
meridional em 78,2% e 72,9% dos casos, respectivamente, concordaram com o sentido das
observações. Como os valores de comparação foram elevados, considerou-se que as
componentes do vento da Era-Interim são representativas dos dados observados. Assim, extraiuse da reanálise as componentes do vento para o período de 2004 a 2010 do ponto de grade mais
próximo a Maria da Fé (22,3° S, 45,38° W). Ressalta-se que essa validação foi feita com duas
regiões distintas e com diferentes condições de relevo, mas seu resultado mostra que mesmo o
vento sendo a 10 metros de altitude, ele pode ser bem representado pela reanálise ERA-Interim.
Também foi comparado a correlação e direção do vento a 10 metros de altura com 925 hPa e foi
verificado que os mesmos não apresentam diferença significativa para esse estudo, pois em
90,71% dos casos os ventos apresentam mesmo sentido.
b) Identificação das frentes
Considera-se que houve a passagem de uma frente fria pela RSMG quando os seguintes
critérios forem estabelecidos e nesta sequência:
 Queda de temperatura em relação ao dia anterior;
 Aumento da pressão em relação ao dia anterior da passagem da frente (-24h) e aumento da
pressão no dia posterior a passagem da frente (+24h);
 Aumento da intensidade da componente meridional do vento, o que significa um
enfraquecimento do vento de direção norte.
As frentes foram identificadas com um algoritmo desenvolvido no Matlab levando em
conta o critério descrito. O algoritmo foi validado para o ano de 2010. As datas identificadas
como de passagem de frente fria sobre a RSMG, através dos critérios acima, foram comparadas
com cartas sinóticas do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC) a fim de
estabelecer se o critério proposto é robusto na correta identificação dos sistemas frontais. Uma
síntese dos resultados é apresentada na Tabela 1. A tabela mostra que boa parte dos eventos
reportados pelo algoritmo também são identificados pelo CPTEC, tendo um erro de 9,38%.
Sendo que 3 frentes a mais são identificadas pelo algoritmo. Trata-se de um erro admissível,
haja vista que Reboita (2008) relata que em geral espera-se até 20% de erros nos códigos de
detecção de sistemas atmosféricos. Muitas das vezes que o algoritmo detecta uma frente, as
cartas do CPTEC mostram apenas um cavado estendido conectando uma frente no oceano até o
continente. A Figura 1 mostra a passagem de uma frente fria detectada pelo algoritmo no dia 26
de fevereiro de 2010 sobre a RSMG. A detecção dessa frente foi confirmada pela carta sinótica
do CPTEC.
RESULTADOS
Para o período de 2004 a 2010 o algoritmo detectou a passagem de 231 frentes frias
pela RSMG, o que corresponde a uma média anual de 33 frentes (Tabela 2). Também é notado
na Tabela 2 que o número de frentes possui uma variabilidade anual, o ano 2008 foi o que teve a
menor ocorrência desses sistemas (27), enquanto o ano 2009 a maior (41). Em termos sazonais
(Tabela 3), encontraram-se as maiores médias de frentes frias por ano para as estações
primavera (9), inverno (8,1), outono (8) e verão (7,9).
A menor ocorrência de frentes no verão pode ser devido ao enfraquecimento dos
gradientes de temperatura do Hemisfério Sul. Já no inverno, a atuação do Anticiclone
Subtropical do Atlântico Sul, Figura 2, que nessa época do ano está mais intenso e deslocado
para oeste, pode impedir a chegada das frentes até a RSMG.
Também é interessante ressaltar que da Silva e Reboita (2011) verificaram que 65% da
chuva no inverno na RSMG é devido à passagem de frentes frias.
CONCLUSÕES
Neste estudo de 2004 a 2010, encontrou-se para RSMG a passagem de 231 frentes frias
com média anual de 33 frentes. A menor ocorrência de frentes no verão pode ser devido ao
enfraquecimento dos gradientes de temperatura do Hemisfério Sul. Já no inverno, a atuação do
Anticiclone Subtropical do Atlântico Sul, que nessa época do ano está mais intenso e deslocado
para oeste, pode impedir a chegada das frentes até a RSMG.
AGRADECIMENTOS
À EPAMIG por disponibilizar os dados de temperatura do ar, ao ECMWF por
disponibilizar as reanálises, ao CNPq e a Pró-Reitoria de Graduação da Universidade Federal de
Itajubá por financiar essa pesquisa.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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de São Paulo. Relatório FAPESP, 2005.
KOUSKY, V. E. Frontal Influences on Northeast Brazil. Monthly Weather Review, n. 107, pp.
1140-1153, 1979.
MORAIS, M. A., CASTRO, W. A. C., TUNDISI, J. G. Climatologia de Frentes Frias sobre a
Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), e sua Influência na Limnologia dos 12
Reservatórios de Abastecimento de Água. Aceito para publicação na Revista Brasileira de
Meteorologia, 2010.
PETTERSSEN, S. Weather Analysis and Forecasting. New York: McGraw-Hill, v. 1, 1956,
498p.
REBOITA, M. S. Ciclones Extratropicais sobre o Atlântico Sul: Simulação Climática e
Experimentos de Sensibilidade. Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas –
IAG–USP, 2008, 359 p. Tese (Doutorado em Meteorologia).
REBOITA, M. S. Análise de Ciclone Semi-estacionário na Costa Sul do Brasil Associado a
Bloqueio atmosférico. Revista Brasileira de Meteorologia, v. 24, n. 4, pp. 407-422, 2009.
RODRIGUES, M. L. G., FRANCO, D., SUGAHARA, S. Climatologia de Frentes Frias no
Litoral de Santa Catarina. Revista Brasileira de Geofísica, v.22, n. 2, pp.135-151, 2004.
SATYAMURTY, P., MATTOS, L. F. Climatological Lower Tropospheric Frontogenesis in the
Midlatitudes due to Horizontal Deformation and Divergence. Monthly Weather Review, 117, n.
6, p. 1355-1364, 1989.
SILVA, L. J., REBOITA, M. S. Precipitação Associada com a Passagem de Frentes Frias no
Inverno na Região Sul de Minas Gerais. In: VI Seminário de Meio Ambiente e Energias
Renováveis, Itajubá, 2011.
Tabela 1 Comparação do número de passagem de frentes segundo as cartas sinóticas do CPTEC
e o algoritmo elaborado para o ano de 2010.
Algoritmo CPTEC
Janeiro
3
2
Fevereiro
2
2
Março
2
1
Abril
3
3
Maio
2
3
Junho
3
3
Julho
3
2
Agosto
2
2
Setembro
1
2
Outubro
5
5
Novembro
4
2
Dezembro
2
2
Total
32
29
Erro
9,38%
Tabela 2 Número total de passagem de frentes na cidade de Maria da Fé entre 2004-2010 por
ano.
Ano
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
Média
Total
Número de
32
31
37
31
27
41
32
33,0
231
Frentes
Tabela 3 Número total de passagem de frentes na cidade de Maria da Fé entre 2004-2010 por
estação do ano.
Estação do
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010
Média
Total
Ano
Verão
9
8
8
6
9
8
7
7,9
55
Outono
8
9
9
8
4
11
7
8,0
56
Inverno
6
6
13
8
5
11
8
8,1
57
Primavera
9
8
7
9
9
11
10
9,0
63
Figura 1 Carta sinótica do dia 26/02/2010 às
00Z (18 h local) confirmando a passagem de
frente fria pela RSMG identificada pelo
algoritmo.
Figura 2 Carta sinótica do dia 11/08/2010 às
12Z (09 h local) mostrando a atuação do
ASAS (linhas amarelas) sobre as regiões sul
e sudeste do Brasil.
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