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ESTUDO DA TRANSIÇÃO DE FASE LÍQUIDO-VAPOR DA ÁGUA UTILIZANDO A PORTA
PARALELA DO MICRO PC
Antonio César do Prado Rosa Jr., José Carlos Oliveira de Jesus e Álvaro Santos Alves
Universidade Estadual de Feira de Santana, Departamento de Física, Projeto Física no Campus, BR 116 – Norte, km 03,
Av. Universitária, s/n, CEP 44031 – 460, Feira de Santana – Bahia.
RESUMO
Neste trabalho, apresentamos um experimento didático simples que tem por objetivo o
estudo da transição de fase líquido vapor da água, através do espalhamento de um feixe
de laser. A este fenômeno dá-se o nome de opalescência. O experimento é de baixo
custo e está direcionado ao ciclo profissionalizante dos cursos de graduação em Física,
uma vez que, trata-se de um fenômeno de não-equilíbrio e o sinal obtido é uma série
estocástica. Entretanto, daremos maior ênfase à parte de instrumentação, uma vez que,
para realizar o experimento, construímos um fotômetro baseado na faixa de resposta
linear de um fototransistor, uma fonte de laser com polarização e intensidade estáveis e
utilizamos, para aquisição de dados, a porta paralela de um micro PC.
INTRODUÇÃO
O ensino de ciências, em particular da Física, deve possibilitar ao educando, estabelecer
relações entre elementos próprios do seu cotidiano e os modelos e métodos científicos, numa
tentativa de compreender qualitativamente o mundo que o cerca (de Jesus, 2003). Sob esta
perspectiva, encontra-se em rápida expansão no Brasil, a área de instrumentação para o ensino de
Física, onde a atividade experimental é encarada como um importante argumento didático para
estabelecer o elo entre realidade e ciência, tanto no âmbito do ensino médio quanto na formação de
professores.
Nas recentes publicações da área, experimentos clássicos são remodelados através da
aplicação de novas tecnologias, com destaque para o uso do microcomputador no processo de
aquisição de dados, através da porta de jogos, da porta paralela ou da placa de som (Montarroyos,
2001; Cavalcante, 2002; Haag, 2001). Além disso, surgem propostas de novos experimentos
voltados ao estudo de fenômenos mais complicados como, por exemplo, transições de fase e
flutuações de densidade, mas inseridos no contexto de elementos do cotidiano (de Jesus, 2003). É
neste segundo aspecto que se enquadra este trabalho. Apresentamos uma discussão sobre os
resultados obtidos de um experimento simples para o estudo da ebulição da água, um fenômeno
extremamente corriqueiro a qualquer estudante, cuja técnica de medida é, no entanto, baseada no
fenômeno não muito conhecido da opalescência. Utilizamos os recursos de um microcomputador
para a aquisição de dados.
TRANSIÇÃO DE FASE LÍQUIDO VAPOR DA ÁGUA
Quando um recipiente contendo uma certa quantidade de água é posto em aquecimento, é
notável o surgimento de bolhas no interior do líquido antes mesmo de se atingir a ebulição. Uma
bolha de vapor d’água consiste, em alguns moles de vapor, enclausurados em uma casca de água
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líquida, e sua formação está relacionada a deformações na superfície interna do recipiente,
existência de impurezas na água e a flutuações locais de densidade no líquido que estabelecem uma
probabilidade de encontrar moles de vapor, mesmo na faixa de temperatura onde a fase líquida é
predominante. Durante a transição de fase, marcada pelo processo de ebulição, há uma mudança
brusca no padrão das flutuações de densidade porque, na temperatura crítica, as fases são
eqüiprováveis. As bolhas estouram na superfície livre do líquido produzindo pulsos propagantes de
pressão. A captação do sinal acústico produzido neste processo permite avaliar a mudança no
padrão das flutuações de densidade, uma vez que, na transição de fase a água encontra-se
violentamente agitada. Esta técnica é apresentada por de Jesus (2003) e o sinal medido em função
do tempo foi submetido à análise usando DFA (Detrended Fluctuation Analysis). Resultados
preliminares indicam diferentes comportamentos para o expoente de correlações de longo alcance
antes e depois da transição (Zebende 2003).
As variações de densidade geram mudanças no índice de refração uma vez que, as bolhas
provocam o espalhamento da luz que atravessa o meio. Como o número de bolhas cresce com a
temperatura, à medida que a água é aquecida observa-se um aumento da intensidade da luz
espalhada de maneira que, próximo à temperatura crítica, o meio torna-se literalmente opaco. Este
fenômeno é conhecido por opalescência crítica. A descrição matemática do fenômeno de
espalhamento induzido pelas flutuações de densidade foge ao escopo deste trabalho, pois se trata de
um problema complexo e nosso objetivo é discutir apenas o processo de instrumentação.
INSTRUMENTAÇÃO E RESULTADOS
A técnica aplicada neste experimento consiste em medir as variações de intensidade de um
feixe de laser, transmitido por um recipiente de vidro contendo cerca de 1 litro de água que é
aquecida, da temperatura ambiente até atingir a fervura. O espalhamento do feixe, gerado durante
este processo, é detectado por um fotômetro e o sinal medido é enviado a um microcomputador
através da porta paralela. A Fig. 1 a seguir, apresenta um diagrama geral do experimento.
Fonte
térmica
Laser
Água
Fotômetro placa de som/
porta paralela
Filtro
Lente
Convergente
Fonte de
tensão DC
Fig.1- Diagrama ilustrando o experimento.
A fonte térmica é um ebulidor de imersão comercial 120 Volts/1200 Watts. A fonte de
tensão DC utilizada para a alimentação do laser e do fotômetro foi obtida de um microcomputador
em desuso isso porque, este tipo de fonte possui grande estabilidade quanto aos valores de tensão
fornecidos na saída. O feixe é produzido a partir de um diodo-laser extraído de um “apontador” de
baixo custo comercial e fácil de encontrar no mercado. O filtro para radiação infravermelha, é uma
pequena cuba de vidro contendo água. O fotômetro consiste num fototransistor inversamente
polarizado em série com um resistor e um amplificador de diferenças onde utilizamos o OP 741. O
fototransistor é posicionado na distância focal da lente convergente que é da ordem de 15 cm. Para
o uso da porta paralela foi montado um conversor analógico digital onde utilizamos o componente
ADC0408 de 8 bits. Elaboramos um programa em linguagem C++ que permite a leitura e gravação
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(extensão .dat) dos dados na porta paralela com a possibilidade de ajuste do intervalo de tempo
entre uma leitura e a próxima. Para avaliar a linearidade do fotômetro e calibrá-lo, uma vez que o
diodo laser produz um feixe de polarização estável, realizamos o experimento de verificação da Lei
de Malus muito conhecida da literatura, cujo resultado é mostrado na Fig. 2.
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Intesidade luminosa (unid. arb.)
Chi^2=0.00146
R^2=0.99915
A=-0.091 ±0.011
B=3.509±0.018
C=-0.053±0.003
3
2
1
0
-1,5
-1,0
-0,5
0,0
0,5
1,0
1,5
Ângulo relativo (rad)
Fig. 2- Curva de calibração do fotômetro.
As leituras de tensão foram realizadas utilizando-se a porta paralela e cada ponto
experimental presente na curva acima, correspondem a médias de 7000 dados. A curva contínua é o
ajuste não linear da função,
Vs (θ ) = A + B cos 2 (θ − C )
(1)
onde os parâmetros de ajuste A, B e C correspondem, respectivamente, a uma tensão de offset, a um
valor máximo V0 , e uma constante de fase que representa a uma incerteza sobre o valor de θ = 0°. A
curva de espalhamento do feixe de laser devido às flutuações de densidade induzidas no
experimento, é apresentada na Fig. 3, e é composta por 70000 dados experimentais medidos a uma
taxa de 0,1 ms.
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Opalescência
Nível de ruído
4
Tensão (volts)
3
2
1
0
0
100
200
300
400
Tempo (s)
500
600
700
Fig. 3 – Medida de espalhamento do feixe de laser durante o aquecimento e na transição de fase
(ebulição) da água.
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A linha corresponde à medida do nível de ruído elétrico e é obtida para o sistema a
temperatura ambiente e com o ebulidor desligado. Observe que, a amplitude das flutuações de
intensidade é muito maior que o nível de ruído o que torna o resultado do experimento satisfatório.
Além disso, o padrão das flutuações durante o aquecimento tem um aspecto diferente das flutuações
que ocorrem na ebulição o que, de certo modo, já era esperado. O efeito de opalescência crítica é
evidente devido à redução drástica do valor de tensão á temperaturas muito próximas da transição
de fase.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em seqüência a este trabalho, os resultados obtidos serão submetidos a técnica de DFA para
uma análise dos expoentes de correlação de longo alcance até mesmo para uma possível
comparação com a técnica descrita por Zebende (2003). Entretanto, acreditamos que o experimento
já representa uma contribuição significativa, pois lida com um problema real e comum ao nosso
cotidiano mas ao mesmo tempo, trata-se de um sistema de não equilíbrio e que portanto, não pode
ser descrito pela termodinâmica clássica aprendida no Ensino Médio e nos anos iniciais dos cursos
de graduação em Física. Sem dúvida, a possibilidade de lidar com problemas reais dentro de um
contexto científico, é um aspecto importante na formação tanto de estudantes quanto de
profissionais de ensino de ciências.
REFERÊNCIAS
HAAG, Rafael. Utilizando a Placa de Som do Micro PC no Laboratório Didático de Física Revista Brasileira de Ensino de Física, São Paulo, v. 23, n. 2, 176-183, 2001.
MONTARROYOS, Erivaldo; MAGNO, Wictor C. - Aquisição de Dados com a Placa de Som do
Computador - Revista Brasileira de Ensino de Física, São Paulo, v. 23, n. 1, 57-62, 2001.
CAVALCANTE, Marisa A.; SILVA, Elias da; PRADO, Reginaldo do; HAAG, Rafael. O Estudo
de Colisões através do Som. Revista Brasileira de Ensino de Física, v. 24, n. 2, p. 150157, jun. 2002.
KUBO, Ryogo. Statistical Mechanics: an advanced course with problems and solutions.
Amsterdam: North-Holland Publishing Company, 1978. 5. impressão.
OLIVEIRA DE JESUS, José Carlos; SILVA, Marcus Vinícius Santos da. Estudo de Transições de
Fase usando a Placa de Som do Micro PC. In: Atas do XV Simpósio Nacional de Ensino
de Física. Curitiba-PR, 2003 (im press)
CALLEN, Herbert B. Thermodynamics: an introduction to the physical theories of equilibrium
thermostatics and irreversible thermodynamics. New York: John Wiley & Sons, 1970. 7.
impr.
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