As mulheres na pesca e nas culturas maninhas na Europa UMA Visita de campo a Cambados em companhia das marisqueiras. Reafir mar-se Mais de 150 mulheres vinculadas a pesca participaram da conferência internacional AKTEA que teve lugar na Galicia entre os dias 10 e 13 de Novembro de 2004. Lá puderam experienciar que compartilham um mesmo destino e regressaram a seus lugares com o desejo de prolongar esta dinâmica. A conferência internacional AKTEA celebrada em Novembro de 2004, anunciada nos dois números anteriores, marcou uma pauta importante no reagrupamento das mulheres da pesca e dos cultivos marinhos. Nela reuniram-se mais de 170 participantes: pescadoras, marisqueiras, recoletoras, vendedoras de pescado, cônjuges de pescadores ou aqüicultores, mas também pessoas dedicadas a investigação, a função pública, assistentes sociais e membros de associações. As participantes proveniam de Europa ocidental, mas também de África Sub-saariana, América e Ásia. Alternando as comunicações nas sessões plenárias com os fóruns de discussão de grupos reduzidos, a conferência convidava tanto a reflexão pessoal como ao intercâmbio de experiências e idéias. Palavras que até então haviam sido abstratas, tomaram sentido: globalização, organização, trabalho em rede. Além disso, as européias surpreenderam-se do pro- N°5 Março 2005 AKTEA: Nereida da mitologia grega simbolizando a beira-mar A G E N DA VA L I O S A O terceiro encontro do programa FEMMES e a conferência internacional AKTEA, celebrados em Santiago de Compostela, Galicia, Espanha, em Novembro de 2004, permitiu às mulheres da pesca, do Norte e do Sul, debater numerosos temas: a segurança marítima, as mulheres na pesca e a aqüicultura, o status profissional feminino, a diversificação das atividades, a gestão dos recursos, a organização das mulheres. Estes encontros foram possíveis graças à financiação européia (DG Pesca, 5° Programa Marco de Investigação e Desenvolvimento) e a regional (Galicia e Bretanha). Uma agenda provisória, cujo conteúdo são as reivindicações das mulheres européias, foi apresentada e submetida à discussão. Esperamos receber críticas e sugestões que nos ajudem a melhorar este documento destinado a quem toma decisões políticas a nível nacional e da União Européia. Por outra parte, os investigadores e investigadoras concluirão em breve uma agenda que conterá as necessidades para desenvolver os estudos sobre as mulheres vinculadas a pesca na Europa. Ainda que estes intercâmbios ocupam grande parte deste número de AKTEA, em essência o tema principal é o trabalho de comercialização realizado pelas mulheres dos pescadores. Em Espanha, em Portugal, na Itália ou na França, a venda direta é o que assegura a persistência das pequenas empresas familiares. A questão do reconhecimento do trabalho feminino requer aqui plena importância. E D I T O R I A L Katia Frangoudes gresso das mulheres dos países em vias de desenvolvimento em matéria de trabalho associativo e de coletivização dos problemas. Puderam comparar suas situações e seus métodos de trabalho, avaliar em que aspectos são ocasionalmente privilegiadas com respeito a outras e em quais têm ainda caminho por percorrer. Por exemplo, o status de " cônjuge colaboradora " ao que se podem acolher as francesas não tem equivalente no resto da Europa. Em Portugal, onde são zzz 1 Rede Informe Duas cultivadoras de marisco da Lagoa de Thang (França), participantes do encontro de Santiago de Compostela na Galicia, compartilham suas impressões zzz muitas as mulheres que saem a pescar com seus maridos, as esposas declaram-se como membros da tripulação do barco. Isto lhes dá o direito a aposentadoria, mas não lhes é reconhecido seu trabalho de gestão e de co-direção da empresa familiar. Este status já é bastante surpreendente se considerarmos os Países Baixos ou a Itália, onde as mulheres simples e despretensiosamente não têm nenhum tipo de reconhecimento oficial. Em outros aspectos, a organização e o trabalho em grupo das marisqueiras galicianas ampliaram os horizontes a muitas outras mulheres. Das sombras a luz Annie Rouquette e Annie Castaldo em companhia de Nicki Holmyard, no centro, criadora de marisco escocês. Desde nossa primeira assistência como ouvintes na conferência relacionada com o tema das mulheres na pesca de Bruxelas organizada pela Direção Geral de Pesca, até a de Aktea em Santiago, não só aprendemos senão que nos sentimos valorizadas, mais respeitadas e mais fortes. Tomamos força para ser as intermediárias de todas as mulheres que trabalham em suas pequenas empresas familiares, defendendo a produção artesanal, o savoir-faire local e uma terra que lhes é querida. A visita de campo organizada na Galicia nos permitiu ter um encontro com as marisqueiras de amêijoa e as cultivadoras de mexilhões. Os mexilhões da Galicia invadem nosso mercado, nos causam problemas sanitários e de comercialização. Ter discutido com as criadoras de mexilhões nos permitiu pôr nossos medos e nossas crenças em perspectiva. Regressamos com duas propostas: 1. A federação francesa de mulheres do mar (2FM) deve reestruturar-se para nos representar na rede européia que está em construção e cujo objetivo será a conservação dos recursos. 2 2. Nossa associação local deve trabalhar à partir de uma agenda precisa: assegurar a comunicação interna e externa, estabelecer contatos dentro da própria região (Marennes e Arcachon), incorporar-se mais nas instâncias profissionais, estabelecer contatos com as mulheres galicianas, marisqueiras e produtoras de mexilhões. As duas "Annies" Contacto : [email protected] Mais além das diferenças, surgiu uma necessidade comum: reafirmar-se como mulher trabalhadora da pesca e não como "mulher de". Todas as participantes da conferência coincidiram em manifestar que seu trabalho deve ser considerado como tal, e não como um complemento das atividades dos hombres da família. Esta perspectiva comum acompanha, entretanto, posicionamentos diferentes. Enquanto as espanholas pretendem dirigir uma ação em nome próprio, as portuguesas não querem arriscar-se a ter um conflito com os homens; preferem enfrentar os problemas que afetam ao setor da pesca de maneira geral, que são os mesmos para os homens, e afrontá-los conjuntamente. As portuguesas não querem que seu processo de reconhecimento pessoal divida o setor da pesca e a aqüicultura. Em essência, a dificuldade consiste então em não debilitar o peso político do setor, que geralmente tem pouca representação nos PIB nacionais, ao mesmo tempo em que faz ouvir a voz específica das mulheres. Isto propõe uma série de questões práticas e estratégicas cujas respostas variarão segundo o grau das diversas situações de cada país: As mujeres deveriam participar das organizações dos homens ou atuar desde organizações próprias? Deveriam expôr as demandas femininas ou também as reivindicações do setor? O fato é que, de momento, às mulheres não lhes é dado o reconhecimento da legitimidade de falar em nome do setor. Inclusive ainda que exista uma verdadeira igualdade entre os cônjuges, o que é às vezes comum, esta mantêm-se no terreno do privado. A representação da igualdade no trabalho de um e de outro não chega a instâncias profissionais. Quase todas as mulheres co-proprietárias com seus esposos de barcos de pesca dizem estar excluídas das organizações profissionais, quando não em direito, mas sim na prática. Todavia falta muito pó por sacudir das instituições do setor. É importante que as mulheres façam parte do espaço público, já que elas percebem as coisas de maneira zzz mais global. Para elas, a pesca não limita-se ao ato da captura. A pesca começa com os recursos haliêuticos, prolonga-se a família e a comunidade, chegando até os pratos dos consumidores, e finalmente as estantes das grandes superfícies. Os intercâmbios da conferência permitiram concretizar uma base de ação comum: preservar o futuro das populações do litoral respeitando os recursos. Para as mulheres, isto significa defender uma pesca razoável, vinculada a atividade familiar zzz Encontro Passamos a ação O último encontro de trabalho do programa de investigação FEMMES permitiu redirigir uma agenda de reivindicações das mulheres da pesca na Europa. Dito documento anuncia a direção da ação política. O terceiro encontro do Programa FEMMES teve lugar entre o dia 8 e 9 de Novembro em Santiago de Compostela na Galicia. A cinqüentena de mulheres presentes teve a possibilidade de consolidar e/ou extender os laços privilegiados estabelecidos nos dois primeiros encontros. Esta vez, os investigadores e as investigadoras contribuíram fazendo comparações e analisando diferentes temas de interesse para as mulheres, tais como seu status, o rol das mulheres na produção haliêutica, a administração da empresa, a formação, a diversificação de atividades, as organizações de mulheres, etc. Uma apresentação da situação das agricultoras em Irlanda mostrou como organizam-se e lutam as mulheres de outros setores. A presença de investigadores e investigadoras provenientes de países do Sul permitiu ampliar a discussão na condição das mulheres em outros países. Não obstante, o que mais preocupou as participantes foi a preparação da agenda com as reivindicações das mulheres. Trás um debate muito rico em aportações onde a realidade de cada país ocupou um lugar importante, os intercâmbios resultaram na versão provisória de uma agenda mais representativa de toda Europa. Os debates prosseguiram mediante as organizações e as redes informais de mulheres. Já perfila-se alguns eixos gerais das reivindicações. Apresentamos aqui um resumo: 1. Reconhecer a contribuição das mulheres nas empresas da pesca e a aqüicultura (gestão, contabilidade, etc.) mediante um status oficial. 2. Permitir que as mulheres implicadas na produção acedam a um status profissional. 3. Favorecer as iniciativas de diversificação dos ingressos familiares mediante o acesso das mulheres a micro-créditos e a formação. 4. Reconhecer o valor dos ofícios vinculados a pesca freqüentemente assumidos pelas mulheres: o remendo de redes, a comercialização do pescado, etc. 5. Abolir todo tipo de discriminação entre homens e mulheres enquanto ao acesso aos ofícios e aos recursos. 6. Reconhecer e manter o acesso das mulheres às instâncias profissionais. 7. Melhorar o acesso das mulheres aos serviços de formação e aos dispositivos de valorização das conquistas profissionais. 8. Manter as organizações de mulheres e suas ações. 9. Melhorar as condições de trabalho e de segurança a bordo para todo o pessoal embarcado. 10. Acordar uma atenção específica para as necessidades das mulheres de marinheiros (dificuldades de formação, isolamento) e a suas ações (condições de trabalho, segurança a bordo). Uma vez concluída, a agenda deverá ser levada ante as autoridades políticas regionais, nacionais e européias. Toda boa vontade será necessária; mais que nunca, é momento de que as mulheres reforcem seu lugar no espaço público. O encontro do programa FEMMES de Santiago assim demonstrou, o primeiro passo é o que mais custa. Todas as mulheres do mar são capazes de representar e defender sua causa, quando assim lhes permite fazê-lo Solidariedade com Ásia A catástrofe de 26 de Dezembro de 2004 no Sudeste asiático comocionou ao mundo inteiro. Repercutiu fortemente no meio marítimo, já que o tsunami afetou particularmente as famílias dos pescadores. As mulheres da pesca da rede holandesa Vin Vis lançaram um chamamento para a arrecadação de fundos. Sentiram a necessidade de ajudar à suas irmãs e irmãos da pesca e cooperam com uma organização de pescadores. Essa inciativa pode ser compartilhada, com sua doação na seguinte conta: St. Vissersvrouwen voor Vissersvrouwen en Azie, número NL85 RABO 0321 4605 02 Contacto : [email protected] 3 Comércio Ve n d e d o r a s e n g e n h o s a s Emmanuelle vende dir etamente a pesca de seu marido no mer cado de Trévignon (ver página 8). "Sem o trabalho de sua esposa, o pescador não tem mais comida do que aquilo que pesca", ironiza Pencha Santasmarinas, de la Conselheria de Pesca e Assuntos Marítimos de Galicia. Isto ilustra a importância das mulheres na comercialização das capturas. A venda direta do pescado ou do marisco fresco permite melhorar os ingressos familiares, evitando os intermediários. Em Europa, isto é praticado sobretudo nos países do Sul. Nos países nórdicos, onde os consumidores mostram uma preferência para os pescados processados, é efetivamente mais interessante comercializar produtos elaborados à partir da pesca familiar. A venda direta é assunto das mulheres. Isto não é nada novo, já desde o século XIX as mulheres deslocavamse aos mercados dos povoados vizinhos para dar saída a produção familiar. Em seus povoados não encontravam-se muitos compradores já que todos eram pescadores… Hoje em dia, não se trata tanto de obter clientes senão que de obter um preço superior ao que oferece o leilão e que aproxime-se tanto quanto seja possível ao preço de venta dos vendedores fixos. Isto é válido sobretudo para os barcos de pesca artesanal ou para as pequenas unidades aqüícolas ou de cria que dispõe de quantidades relativamente pequenas e, portanto, fáceis de vender diretamente. Com cestos A venda itinerante à pé ou em caminhonete efetua-se paralelamente a venda em uma peixaria fixa ou em um posto do mercado. Em quase todas as partes, a caminhonete refrigerada suplanta a venda à pé, já que cumpre melhor com as normas sanitárias européias. Só em Portugal é possível encontrar ainda as vendedoras "com cestos". Sobretudo estas últimas, são mulheres desprovi- 4 das de recursos econômicos e que não têm outra opção para melhorar os ingressos familiares. Cada manhã vão ao mercado atacadista onde compram uma pequena quantidade de pescado que transportam, sem gelo e ao ar livre, em um cesto sobre suas cabeças. Às vezes vêemse obrigadas a comprar o pescado à crédito, devolvendo o dinheiro a seu credor quando realizada a venda. Na atualidade, esta atividade está proibida em muitas cidades portuguesas. As vendedoras não têm direito de usar o transporte público para deslocar-se de uma zona de comércio a outra.Os condutores dos ônibus mostram certa tolerância, aceitando que as mulheres circulem nos ônibus muito cedo pela manhã, antes dos horários de ponta. Elas sabem que correm o risco de ver sua mercadoria confiscada e destruída pela polícia, além de ter que pagar uma multa. De qualquer maneira, consideram-se profissionais e querem contribuir para a previdência social com intuito de poder beneficiar-se de uma aposentadoria. Em caminhonete A compra de uma caminhonete refrigerada é indispensável para praticar a venda ambulante. Esta compra representa uma inversão considerável e, em alguns casos, superior ao valor de um barco de pesca. Por outra parte, ocasionalmente é necessário obter uma licença de venda expedida pelas autoridades municipais, que nem sempre vêem com bons olhos o desenvolvimento deste tipo de comércio. O estacionamento de caminhonetes zzz ao longo das vias públicas está estritamente limitado: de um par de minutos em Portugal até uma hora em França. Em Portugal, as vendedoras são geralmente mulheres de pescadores, que preferem abastecer-se no mercado atacadista e não nos barcos de seus maridos. "Elas não querem que os homens da tripulação possam pensar que, durante a pesca e no cálculo das partes a dividir, o marido roube pescado para dá-lo a mais à sua mulher. Eventualmente, podem comprar em leilão as capturas do barco familiar, já que esta é uma prática à vista de todos", afirma um filho de pescador. Na França continental, a venda ambulante em caminhonete também pratica-se, mas a maior parte da venda direta é realizada desde postos fixos de venda em uma cidade. É necessário uma licença para ter direito a instalar o mostruário durante uma manhã completa. Em Córcega, a venda em caminhonete realiza-se em dias diferentes, dependendo da temporada. Em verão, quando o número de residentes da ilha aumenta consideravelmente, as mulheres vendem para a clientela da costa, mas também usam a caminhonete para ir aos povoados das montanhas buscar clientes, ilhéus ou turistas. Em inverno, interrompem com freqüência sua atividade de venda. zzz A domicílio A garagem de muitas das casas de pescadores corsos resguarda viveiros onde são armazenadas lagostas. Através do boca a boca, a população vizinha e os turistas mais "fiéis" sabem onde abastecer-se de crustáceos a bom preço. São as mulheres da casa quem ocupam-se da venda. Para elas isto é um complemento. Não têm os meios econômicos para adquirir um ponto de venda não vinculado ao domicílio, mas têm a sorte de ganhar mais que o que ganhariam passando pelos atacadistas. Em peixarias de grande superfície A abertura de uma peixaria de grande superfície permite valorizar os produtos das famílias pescadoras e também comercializar as produções exteriores. O investimento necessário para a criação de tal estrutura é muito importante já que as normas sanitárias são rígidas: o recinto deve estar pavimentado, equipado com refrigeradores, máquina de gelo, etc. É necessário conhecer toda a informação técnica e jurídica, obter as licenças administrativas e buscar créditos e ajudas financeiras. Uma das mulheres de pescadores corsa que se lançou a esta aventura empresarial confesa não haver medido em um princípio o tempo requerido para cumprir este trabalho prévio. "Se tivesse tido conhecimento, não teria feito…", conta C. Foram necessários dois anos para realizar o projeto e poder reunir os 150.000 euros de investimento. Em um primeiro momento, C. queria abrir uma peixaria, mas devido a lei da pesca de 1997, só poderia vender o pescado capturado por seu marido e não por outros barcos, e tampouco teria o direito de vendê-lo aos restaurantes. Atualmente, em sua peixaria vende atum e lagostas pescadas por seu marido, assim como espécies importadas do continente (sardinhas, anchovas, cavalas, etc.). Emprega duas pessoas a tempo parcial, uma na peixaria e a outra na venda em caminhonete. Ela mesma não recebe um salário e não trabalha mais de seis meses ao ano, durante a temporada turística. Em mercados de pescado Paralelamente a estas iniciativas pessoais, nos países do Sul de Europa existem iniciativas coletivas de venda impulsionadas ou bem por mulheres ou por organizações de pescadores em benefício das mulheres. Por exemplo, em Ajaccio, Córcega, o antigo mercado de pescado foi renovado e transformado em um estabelecimento comercial onde cada barco do porto pode vender diretamente sua produção. As mulheres dos pescadores asseguram a venda. A criação de tal estrutura exige uma estreita colaboração com as organizações de pescadores locais, com as autoridades territoriais, nacionais e européias. O compromisso coletivo é determinante. Com a abertura deste mercado, o intercâmbio cotidiano entre as mulheres que vendem o pescado de seus maridos é crucial. Estas relações sólidas contribuem a reforçar a posição das associações de mulheres ante as dos homens e as autoridades locais. O papel econômico que desempenham as mulheres no seio familiar e no setor da pesca é cada vez mais reconhecido Membros da Rede FEMMES França : CEDEM Univ. de Bretagne Occidentale - Associação Mulheres entre Terra e Mar, Bretanha Sul - Espanha : Universidad de La Laguna, Iles Canaries - Cofradia de Pescadores de Cambados, Galicia - Portugal : Universidade da Madeira- Mutua dos Pescadores, Lisboa - Finlândia : Osterbottens Fiskarförbund r.f., Vaasa - Reino Unido e Irlanda : membros não organizados Identificação do projecto Financiamentos: Contrato n° Q5TN-2002-01560 - CCE, DG Pesca - 5ème PCRD. Programa “Qualidade de Vida e gestão dos recursos marinhos”. Coordenação do projecto: Katia Frangoudes, CEDEM, França. Editado pelo Centre de Direito e de Economia do Mar (CEDEM) - Directora da publicação: Katia Frangoudes Coordenação: Sarah Mongruel- ISSN 1765-8551 - Impressão Bureau 2000, Plougastel - Tiragem em português 1000 exemplares -Participaram neste número: Sébastien Metz, Séverine Julien, Monique Philip, Michèle Pendelièvre. Contato: [email protected] Esta publicação não reflecte necessariamente a opinião da Comissão das Comunidades Europeias e em caso algum antecipa a sua atitude neste domínio. Reprodução dos artigos autorizada sob reserva da menção obrigatória dos autores e dos financiamentos. http://www.fishwomen.org 5 Ancona Leilão ao estilo italiano A equipe f eliz da associação Penélope. No porto de Ancona, a divisão do trabalho é clara: os homens ao mar, as mulheres em terra para vender e administrar. Resumo de uma semana normal de trabalho. Em Ancona, a semana de trabalho para as mulheres da pesca começa pela noite de segunda-feira até às duas da madrugada do dia seguinte, quando os pescadores regressam ao porto para descarregar o pescado capturado nas 24 horas anteriores. As mulheres carregam as caixas de pescado nas caminhonetes ou em carros adequados e os levam ao interior do estabelecimento comercial, onde serão vendidos. Colocam o pescado, cuidando com a apresentação do produto para os compradores, e logo retiram o código numérico designado a cada barco. A loteria destes números estabelece a ordem de venda. Quando a ordem não é a favorável, e se ocorre que o barco possui a classificação entre os últimos para vender, a proprietária do caminhão pode retirar a mercadoria em venda e dirigir-se ao mercado de outra cidade da região para ver se tem sorte. Este trajeto pode ser às vezes de até 100 kilômetros… As mulheres também recorrem à venda direta em outro mercado quando o preço estabelecido pelo leilão cai abaixo do umbral mínimo que elas estabelecem. O regresso a casa acontece na primeira hora da manhã, uma vez finalizado o trabalho do leilão, justo a tempo para ocupar-se das crianças e acompanhá-las ao colégio. Na ausência da mãe, os maiores podem ficar sós pela noite, mas os pequenos ficam com a avó ou outro membro feminino da família. Trás haver realizado algumas tarefas domésticas, as mulheres voltam a ocupar-se da parte administrativa do trabalho empresarial. São elas quem encarregam-se de solicitar ou pagar os serviços da cooperativa de pescadores, de levar a contabilidade e as relações com os ban- 6 cos, de apresentar os expedientes administrativos ante a Capitania do Porto, de controlar as contas e de responsabilizar-se pelos comprovantes de renda dos tripulantes no fim do mês. Repassemos as tarefas de uma ama de casa: preparar a comida, arrumar e limpar a casa, ajudar com os deveres escolares e levar as crianças em suas atividades. Uma jornada de trabalho ativa e bem completa, e entretanto nem sempre gratificada com um bom resultado nas vendas. É por isto que a venda é tão estressante. Este encadeamento de atividades ocorre quatro vezes por semana. Nunca com mais freqüência, já que os pescadores devem conservar os recursos e manter os preços, limitando a quatro os dias de pesca. As mulheres de Ancona têm a consciência de ser importantes na direção da empresa, mas ainda não conseguiram obter um reconhecimento jurídico e uma proteção social que dê suporte a sua atividade. Ao associar-se, saem de seu papel de presença silenciosa e dão-se a conhecer. Não obstante, consideram-se empresárias e já não duvidam em demandar formação complementária. A Associação "Penélope" é única na Itália, o que não lhes facilita o caminho até o reconhecimento jurídico e social. Por outro lado, estabelecer contatos e intercâmbios com outras organizações de mulheres da pesca em Europa lhes permitirá progredir com mais rapidez Adriana Celestini Contacto : [email protected] Instalação Minha pequena caminhonete. Estelle, de 26 anos, lançou-se na venda ambulante em um pequeno município próximo a Lorient (França). Entrevista. Aktea: De onde surgiu a idéia da venda em caminhonete? Estelle: Eu venho de um ambiente de marinheirospescadores e sempre quis ter um negócio de pescados. Tenho um Certificado de Aptitude Profissional de venda em peixaria. Entrei como aprendiz aos 17 anos e tenho um título de profissional de alimentação de nível secundário. Trabalhei em Rennes durante um ano e meio em uma grande peixaria. Após esta experiência, foi quando me lancei. Sabia o que queria, ¡o que não sabia era o que isso iria me custar! A Câmara de Ofícios de Lorient ajudou muito. Criar uma peixaria é um investimento grande por demais. A venda em caminhonete, entretanto, estava ao meu alcance. Além disso, não é necessário obter uma licença. Somos livres de ir onde queremos, com a condição de não estacionar mais de uma hora em um ponto fixo. Tardei mais de seis meses em resolver todos os assuntos jurídicos, econômicos, técnicos, calcular os balances, encontrar a caminhonete e fazer os consertos necessários, especialmente pôr uma caixa isotérmica e uma estrutura corrediça. Aktea: Quais são os problemas para o encaminhamento do negócio? Estelle: Eu havia preparado bem o terreno: publicidade nas caixas de correios e de porta em porta ao redor para saber se as pessoas estavam interessadas em que passasse tal dia por sua casa. O boca a boca funcionou e várias pessoas me chamaram para dizer que estavam interessadas. Trabalho sobretudo no município de Plomeur, onde todos se conhecem. É mais fácil. Assim pude organizar meu itinerário. Tardo 8 horas. Na terçafeira pela manhã estou na costa. Na quarta-feira, descanço. Na quinta-feira, vou para o campo. Na sextafeira, instalo-me no mercado de Lorient. No sábado, vou ao de Pont-Scorff. No domingo, estou em um posto fixo em Plomeur, em um terreno que me empresta a proprietária. Logo, às 12:30h, volto a Lorient para refrigerar a mercadoria e lavar a caminhonete. Aktea: Onde se abastece? Estelle: No estabelecimento comercial de Lorient, dos barcos de pesca artesanal. As pessoas daqui conhecem muito o pescado, ¡não é possível vender um pescado descolorido, conservado durante dez dias na câmara refrigerada de um barco de pesca! Vou ao mercado todos os dias às quatro da manhã. É um processo que leva seu tempo para quem quer observar tudo muito bem. Por aí passam mais de mil barcos ao dia. Demorei dois bons meses em estar satisfeita com minhas compras e em minimizar as perdas. Poderia haver elegido abastecer-me da pesca do meu pai, mas queriamos que as coisas estivessem claras. Além disso, haveriam penalizado a ele no mercado caso houvesse vendido para mim, o colocariam entre os últimos da fila. Aktea: E a concorrência? Estelle: Não somos muitas na venda ambulante de pescado. A concorrência vem sobretudo das peixarias. A longo prazo, eu também gostaria de abrir uma. Meus anos de aprendizagem e experiência na venda ambulante possibilitam conhecer as necessidades dos clientes. Hoje em dia já não se vende como há dez anos, sobretudo nas cidades. As pessoas querem comer pescado, mas não sabem como prepará-lo. Em Rennes, as pessoas de 30-40 anos pedem muitos conselhos e receitas simples. Isto amplia as perspectivas Países Baixos Mercados de pescado, essa é a tendência Os habitantes de um pequeno porto de pesca criaram um mercado de pescado gastronômico e pedagógico. Um belíssimo exemplo de diversificação a serviço da pesca. Vivo em um pequeno povoado pesqueiro no Norte dos Países Baixos. Meu marido, meu filho e meu sobrinho são os três pescadores. Sou co-proprietária de um barco e, além do trabalho doméstico, sou responsável pelas tarefas administrativas e pelas compras do barco. Às vezes saio a pescar com meu marido. Isto me fez ver que o pescado que se vende no mesmo dia em que se pega alcança o mesmo preço que o que leva vários dias capturado. Isto foi uma grande decepção. Agora bem, faz dois anos, o governo municipal do povoado propôs instalar um mercado local de pescado fresco. Sua proposta foi recebida com entusiasmo. Constituiu-se um grupo de voluntários para realizar um estudo das necessidades e das possibilidades. Confiando no êxito do projeto, o governo municipal acordou conosco uma ajuda econômica em forma de empréstimo, saída dos zzz 7 zzz orçamentos da província e dos fundos europeus. No verão, o povoado acolhe a muitos turistas atraídos pela beleza desta região bem conservada. Foi a princípios da temporada turística de 2004 quando abriu o primeiro mercado semanal de pescado fresco. Como cada semana, os pescadores passam primeiro suas capturas pelo leilão de sexta-feira, respeitando assim um período obrigatório nos Países Baixos. Aí, o grupo de voluntários compra o pescado, a um preço mais elevado que o do pescado menos fresco. Os pescadores ganham mais assim. Logo o pescado é colocado nos postos do mercado novo, sendo vendido a um preço que também é bom para o consumidor. Não é um mercado qualquer. As mulheres que trabalham aí comprometem-se a informar os clientes sobre os lugares e as técnicas de captura. Organizamos demonstrações de como é preparado o pescado e convidamos os visitantes a degustá-lo e a prepará-lo em suas casas. Do mesmo modo, o mercado tem uma página na Internet (www.vismarktwieringen.nl). A informação foi difundida e agora há mais turistas, habitantes da região e membros do setor da restauração que vem ao povoado aos sábados pela manhã. Este êxito também favoreceu aos otros comércios e aos restaurantes. Isto deve-se também em parte ao que sugerimos aos compradores, ou seja, que guardem o pescado em frigoríficos enquanto visitam o povoado ou vão de excursão a bordo de um barco de pesca. O mercado de pescado fresco deu fé de seu êxito e, além disso, alguns dos voluntários estão agora remunerados. Vamos ampliar o mercado com outros produtos locais. Isto supõe uma inversão econômica suplementar. Esta é a razão pela qual ainda não começamos a devolver o empréstimo. Estamos contentes e orgulhosos de nosso projeto. Para chegar até aqui houve um trabalho coletivo importante que reuniu os habitantes do lugar. Se as coisas seguem seu curso, nossos filhos estarão orgulhosos de ser os seguintes portadores da tocha Wilma Koster Contacto: [email protected] No posto de Wilma degusta-se paelha holandesa Finisterre Cotovelo com cotovelo Emmanuelle deixou um emprego assalariado para vender diretamente a pesca de seu marido. Toda a família ganhou qualidade de vida. Emmanuelle é de Trevignon (França). Desde muito jovem ficou encarregada de vender diretamente a pesca de seu pai. Continuou vendendo a de seu esposo, paralelamente ao seu trabalho assalariado como trabalhadora de uma fábrica têxtil. A venda ocupava suas férias e os domingos. Manteve ambas atividades até o nascimento de sua segunda filha de agora dez anos. A ampliação da família levou-a a tomar uma decisão. Não queria seguir vivendo a um ritmo tão acelerado. Desejava passar mais tempo com sua segunda filha do que havia passado com sua primogênita. A decisão se impôs: deixar o trabalho na fábrica e dedicar-se a venda direta. Até que sua filha cumpriu os três anos, Emmanuelle pôde beneficiar-se de uma licença por maternidade, o que facilitou a transição. Está presente no mercado de pescado de Trevignon todos os fins de semana e cada dia durante as férias. Não toda a pesca de seu marido vende-se diretamente. As capturas da semana vendem-se em leilão. Mas, em volume, a venda direta representa cinco vezes a venda em leilão. Se Emmanuelle não vendesse no mercado, o volume de negócio seria a metade. Emmanuelle elegeu manter preços fixos para garantir seus ingressos. No leilão, os preços variam de uma quantidade ao triplo, enquanto que fixar um preço medio ao ano reduz os riscos. Os clientes regulares apreciam esta estabilidade, sobretudo em épocas festivas… Inclusive havendo preços mais atrativos em alguns supermercados. Emmanuelle também assume o trabalho administrativo e de contabilidade. Desmonta as redes e às vezes é quem leva o pescado ao estabelecimento comercial. No total, trabalha o equivalente a três quartas partes de uma jornada de trabalho, com uma qualidade de vida bastante superior. Durante a semana está com as filhas. Aprecia a variedade de seu trabalho e a qualidade da relação com seus clientes. Emmanuelle não acolheu ao status de cônjuge colaboradora, que não considera interessante em termos econômicos. Mas vai preparando sua aposentadoria, poupando cada mês uma pequena quantidade. Ela se considera verdadeiramente a colaboradora de seu marido. Está claro que são dois capitaneando: um no mar, e uma em terra 8