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O TRIBUNAL DO JURI: BRASIL X ESTADOS UNIDOS
As grandes diferenças e poucas similaridades
Prof. Me. Marco Antônio de Oliveira1
Jéssica Aparecida Batelli Nogueira2
RESUMO
O Tribunal do Júri é um instituto que surgiu no século XIII na Inglaterra. A palavra “júri”
deriva do latim "jurare" que significa fazer juramento. Desde a sua criação, vigora o
entendimento de que os jurados decidem sobre a condenação ou absolvição do réu, e o juiz,
presidente do júri é que intermedeia essa decisão. Assim, o magistrado declara o réu
absolvido ou condenado sempre de acordo com a vontade dos jurados. Desta forma, cada país
adaptou o procedimento do júri conforme suas leis e costumes. O presente artigo tem como
escopo apresentar uma comparação a respeito do Tribunal do Júri brasileiro e americano
apresentando os seus poucos pontos de encontro e as suas grandes diferenças. A principal
semelhança é que em ambos os países o Tribunal do Júri é um direito fundamental: nos
Estados Unidos é estampado na Sexta Emenda à Constituição; no Brasil é previsto na
Constituição Federal de 1988. Já as diferenças se iniciam desde os sistemas adotados por cada
país até o momento de interposição dos recursos. É de suma importância este estudo a fim de
absorver o que há de mais valioso e defeituoso em cada instituição, respeitando o fato notório
de que os sistemas judiciários brasileiro e americano são bastante distintos por uma questão
histórico-cultural.
Palavras-chave: Tribunal do Júri, Direito fundamental, Sexta Emenda à Constituição,
Constituição Federal 1988.
ABSTRACT
The jury is an institute that emerged in the thirteenth century in England. The word "jury"
derives from the Latin "jurare" which means to make oath. Since its inception, force the
understanding that the jury decide on the conviction or acquittal of the defendant, and the
judge, jury president is that intermedia that decision. Thus, the judge declares the defendant
acquitted or convicted always according to the will of the jurors. Thus, each country adapted
the jury procedure as their laws and customs. This article has the objective to present a
comparison regarding the Brazilian and American jury presenting their few meeting places
and their major differences. The main similarity is that in both countries the jury is a
fundamental right: the United States is stamped on the Sixth Amendment to the Constitution;
in Brazil is provided in the Federal Constitution of 1988. Since the differences begin from the
systems adopted by each country to date of lodging of appeals. It is very important this study
in order to absorb what is most valuable and defective in each institution, respecting the
notorious fact that the Brazilian and American judicial systems are quite distinct by a
historical-cultural issue.
Keywords: Jury, Fundamental Right, Sixth Amendment to the Constitution, Federal
Constitution of 1988.
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Delegado de Polícia do Estado de São Paulo; Professor de Direito Penal e Processo Penal e Coordenador do
Curso de Direito da Faculdade Eduvale de Avaré. Contato: [email protected] .
2 Estagiaria na Procuradoria Geral do Município de Avaré. Discente do Curso de Direito da Faculdade Eduvale
de Avaré. Contato: [email protected].
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1 INTRODUÇÃO
O presente artigo tem a finalidade de trazer conhecimento acerca da importância do
Tribunal do Júri na sociedade, sendo que, tanto no Brasil como nos Estados Unidos trata-se de
uma garantia fundamental e representa o estado democrático, em razão da participação
popular. Desta maneira, torna-se necessária uma análise acerca do direito comparado, pois a
comparação com o Júri americano é importante para clarear a ideia de que aquilo que é visto
nos filmes de Hollywood não é a realidade brasileira, mas torna-se relevante salientar que as
diferenças existentes entre os dois países se iniciam desde os sistemas jurídicos que são
adotados até a interposição dos seus recursos. Portanto, é importante comparar todas as
diferentes e semelhanças entre o Tribunal de ambos os países, pois, vemos que, reformas
devem surgir com a finalidade de aperfeiçoar tal instituto, para que no futuro, passamos a
possuir um Tribunal com participação popular que alcance a mais civilizada forma de justiça.
2 SURGIMENTO DO TRIBUNAL DO JÚRI
Há uma grande imprecisão doutrinária sobre a origem do Tribunal do Júri. O grande
dissenso nos posicionamentos deve-se a uma conjuntura de fatores: 1º) falta de acervos
históricos seguros e específicos; 2º) o fato de o instituto estar ligado às raízes do direito e
quase sempre acompanhar quaisquer aglomerações humanas, desde as mais antigas, esparsas
e até as menos estudadas, dificultando o estudo e a pesquisa; 3º) o fato de não se conseguir
destacar um traço mínimo essencial para poder afirmar que a sua existência ocorreu em
determinado momento da história.
A controvérsia é tanta que, nos dizeres de CARLOS MAXIMILIANO:
(...) as origens do instituto, são tão vagas e indefinidas, que se perdem na noite dos tempos. (1948, p. 156 apud
TUCCI, 1999, p. 12).
Entretanto, por mais controvérsia que exista a maior parte da doutrina não hesita em
afirmar que origem do Tribunal do Júri se deu na Inglaterra, quando o Concílio de Latrão, em
1215, aboliu as ordálias ou Juízos de Deus, com julgamento nitidamente teocrático, instalando
um conselho de jurados. Portanto, na Inglaterra nasceu o Tribunal do Povo, que entre os
ingleses deixou grandes marcas, já em outros países do “Velho Mundo”, sobretudo a França, a
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Itália e a Alemanha, a Instituição do Júri não obteve o êxito esperado, sendo logo substituído
por outros órgãos.
Destes fatos é que teria nascido à instituição do Júri, consolidando-se, dentre todas as
instituições do nosso ordenamento legal, como a mais democrática instituição de aplicação
dogmática. Nesse sentido, é conhecimento como Júri em decorrência da palavra em latim
“jurare”, que significa “fazer juramento”, sendo este o ato praticado pelas pessoas que
formavam o conselho de sentença.
O júri é um tribunal especial sendo denominado tribunal do júri em razão da sua
composição que contém os juízes de fato ou jurados, o presidente que é o juiz togado, e seus
auxiliares de justiça. Daí pode-se afirmar que o tribunal do júri é órgão complexo da
jurisdição, um verdadeiro juízo.
É relevante tomar conhecimento a respeito do tribunal do júri, pois,
independentemente do país no qual está sendo exercido, sempre terá participação popular e
consequentemente acabará transmitindo a opinião da sociedade através daquela decisão que
está sendo aplicada, sem a limitação de questões técnicas advindas dos juízes.
O mecanismo do “povo julgando o povo” dá à sociedade a sensação de participar de
um país onde o povo tem o direito de exercer a função de Estado.
3 OS SISTEMAS JURÍDICOS
Há diversos sistemas jurídicos adotados mundo afora, desta forma, torna-se
necessário uma criteriosa avaliação referente a cada sistema para que se possa ter uma
compreensão didática acerca das suas características, semelhanças e diferenças. Precisamos,
entretanto, insistir nas diferenças entre os sistemas common law e civil law, para entendermos
porque o Tribunal do Júri brasileiro e americano possuem mais diferenças do que
semelhanças. Ambos sistemas que serão objeto de análise no presente capítulo são divididos
em duas famílias: as famílias do civil law (romano-germânica) e as famílias do common law.
Neste caso podemos afirmar que o Brasil é país que integra a família civil law,
enquanto que os Estados Unidos fazem parte da common law. Em que pesem as inúmeras
diferenças entre as duas famílias, realçadas mais adiante, ambas remontam, historicamente, a
uma base comum: a origem é europeia.
Iniciaremos pelo Common Law que é um sistema originário das leis não escritas
sendo derivado mais de princípios do que de regras (rules), e não se tratam de regras
absolutas, rígidas e inflexíveis, mas sim de amplos e abrangentes princípios baseados na
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justiça, na razão e no senso comum, que são determinados pelas necessidades sociais da
comunidade e que mudam conforme a sociedade evolui. A palavra Common Law vem do
inglês que significa “direito comum”, ocorre que, o juiz ao proferir uma decisão não fica
obrigado a limitar o seu fundamento em lei, podendo julgar de acordo com os costumes que a
sociedade está vivendo, isto é, a formação deste sistema deriva dos antigos costumes locais, e
nem as fases posteriores, que lhe moldaram o caráter que hoje possui, foram capazes de
modificar essa característica essencial.
É importante mencionar as palavras de ANTOINE GARAPON“:
O direito inglês foi profundamente marcado pela ausência, durante o seu período de
formação, de poder legislativo real no seio do Parlamento e pelo poder das Cortes
Reais de Justiça. A common law designa a totalidade dessas regras, suscetíveis de
serem subsumidas a partir de decisões particulares. No fundamento da common law
se encontra, portanto, a regra do precedente. (GARAPON, Antoine. Julgar nos
Estados Unidos e na França – cultura jurídica francesa e common law e uma
perspectiva comparada. Trad. De Regina Vasconcelos. Rio de Janeiro: Lumen Juris,
2008, p. 3).
Desta forma, no common law os statutory laws (leis estatutárias/escritas) têm papel
secundário, a principal fonte do direito é o direito como posto pelo juiz no caso concreto.
Portanto, o Common Law pode ser definido como o sistema jurídico que é baseado em
precedentes judiciais ao invés de se basear somente nas leis escritas (statutory laws/leis
estatutárias), pois as leis como as conhecemos, são diferentes na Inglaterra. Não se concebe
uma norma genérica e abstrata, pois no common law, a ideia que permeia o sistema é de que o
direito existe não para ser um edifício lógico e sistemático, mas para resolver questões
concretas, conclui-se, portanto, que os precedentes criados neste sistema são definidos através
de um conjunto de decisões já dadas pelos tribunais, ou com melhor denominação, através de
jurisprudências.
Já o Civil Law é o sistema no qual o juiz é apenas um porta-voz da vontade genérica
e abstrata da lei, ou seja, no Civil Law prepondera a lei, tida como centro do direito, também
sendo conhecimento como o sistema codificado, porque o juiz deve recorrer primeiramente à
lei e depois a outras fontes do direito. Este sistema foi criado com base os princípios da
legalidade e da igualdade, pois foi concebido justamente com o objetivo racional,
expressamente declarado, de gerar segurança jurídica para a sociedade. Neste caso, o
precedente do Civil Law é formado por expressar a opinião pessoal do julgador e não por
expressar qual foi a melhor solução para um caso concreto – diferente da formação do
precedente no sistema da common law.
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Desta forma, enquanto o sistema Civil Law adota a lei como fonte principal do
direito; o modelo do Common Law adota a jurisprudência como fonte primordial.
É relevante as descrições acima em razão de que a instituição do Júri norteamericano se desenvolveu, historicamente, de forma coerente com o espírito e os princípios
da common law, que é uma tradição jurídica que possibilitou as condições e o contexto
adequados para o aparente sucesso do júri. Rui Barbosa mencionou em seu livro “Júri sob
todos os aspectos” a importância de tal característica:
(...) Já as características da tradição do povo americano possibilitaram o surgimento
de um espírito cívico e de uma consciência jurídica comum que tornam
materialmente exequível o júri como regra e não a exceção. (BARBOSA, 1950,
p.28-35).
Já o Tribunal do Júri brasileiro tem suas características advindas do Civil Law,
restando comprovado que as grandes diferenças e poucas semelhanças que serão mostradas
nos próximos capítulos incide de uma questão histórico-cultural.
4 TRIBUNAL DO JÚRI NO DIREITO COMPARADO
Após uma breve análise da origem do Tribunal do Júri e dos sistemas adotados pelo
Brasil e Estados Unidos, será iniciada uma comparação entre o Tribunal do Júri brasileiro e
norte-americano, apresentando os seus pontos de encontro e as suas diferenças. Dentro deste
panorama, à luz do direito comparado, algumas considerações poderiam ser úteis para a
construção de um “novo” tribunal do júri (assim como um “novo” procedimento), pois, a
instituição do Júri de cada país tem o seu ponto mais valioso, como também aquele momento
vicioso, no qual, a junção daquilo que é bom, poderia ser uma forma de alcançar a tão
aclamada e verdadeira justiça.
4.1 Fatos que vão à Júri
No Brasil, não são todos os casos que vão ser julgados por um Tribunal do Júri, pois,
em razão de ser um direito fundamental está expresso no nosso Texto Maior, onde o
legislador fez tal distanciamento, expressando que somente será julgado pelo Júri Popular os
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crimes dolosos contra a vida, conforme previsão na Constituição Federal de 1988, em seu
artigo 5º, inciso XXXVIII:
(...) Artigo 5º. XXXVIII – e reconhecida a instituição do júri, com a organização
que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a
soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos
contra a vida; (...). (grifo nosso)
Os crimes dolosos contra a vida estão previstos no Código Penal na Parte Especial,
Título I dos Crimes Contra as Pessoas, Capítulo I dos Crimes contra a Vida. Portanto, os
crimes dolosos contra a vida que poderão ser julgados pelo Tribunal do Júri no Brasil são:
homicídio simples, privilegiado, qualificado (artigo 121 caput e parágrafos); induzimento,
instigação ou auxilio ao suicídio (artigo 122); infanticídio (artigo 123); aborto provocado
pela gestante ou com o seu consentimento (artigo 124); aborto provocado por terceiros sem o
consentimento da gestante (artigo 125); aborto provocado por terceiros com o consentimento
da gestante (artigo 126); aborto na forma qualificada (artigo 127) e, por último, adicionado
recentemente a este rol, o feminicídio previsto na Lei 8305/2014.
Já nos Estados Unidos é possível que se tenha um julgamento pelo Júri tanto em
causas cíveis quanto em causas penais. Isto ocorre em face do Tribunal do Júri americano
estar previsto na Constituição Americana afirmando que todos os acusados têm direito a um
julgamento público e rápido, conforme a Sexta Emenda, in verbis:
Nos processos de direito consuetudinário, quando o valor da causa exceder vinte
dólares, será garantido o direito de julgamento por júri, cuja decisão não poderá ser
revista por qualquer tribunal dos Estados Unidos senão de acordo com as regras do
direito costumeiro. (Emenda VI).
Tal julgamento deverá ser feito por jurado imparcial e selecionado pelo Estado, no
Distrito no qual foi cometido o delito, sendo previamente estabelecido por lei, conforme
previsão no artigo 3º, seção 2, parte final da Constituição Americana:
(...)O julgamento de todos os crimes, exceto em casos de impeachment, será feito
por júri, tendo lugar o julgamento no mesmo Estado em que houverem ocorrido os
crimes; e, se não houverem ocorrido em nenhum dos Estados, o julgamento terá
lugar na localidade que o Congresso designar por lei.
Assim, é possível perceber que nos Estados Unidos o Tribunal de Júri tem
fundamental importância, pois, o cidadão americano acredita que a participação do povo nos
julgamentos é uma forma de fazer valer o seu Estado Democrático de Direito.
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O povo norte-americano dá grande importância na sua função de jurado que tem
alma, voz, valoração e sentimento nos EUA já que para os americanos o exercício da
democracia pela participação do povo na vida pública ocorre não apenas pela prática do
direito ao voto, mas, também, pelo desempenho do direito de integrar o Tribunal do Júri.
Passamos as palavras de PAULO RANGEL:
A pedra angular da justiça nos EUA é o processo perante o Tribunal do Júri, pois o
cidadão americano tem plena consciência de que sua participação na vida pública
não apenas se efetua a partir do direito ao voto, mas, sim, em especial, de sua
integração ao corpo de jurados. A cidadania também é exercida no Tribunal do Júri,
pois o poder emana do povo e, por intermédio dele, se evitam decisões arbitrárias na
aplicação da lei. (RANGEL, Paulo. Op. Cit. 45 p).
Diante do exposto, chegamos à conclusão que a primeira diferença que envolve o
tribunal do júri brasileiro e americano é em relação aos casos concretos que serão julgados
pelo Júri Popular.
4.2 Direito fundamental e renúncia
No Brasil, o Tribunal do Júri é uma garantia fundamental expressamente prevista na
Constituição Federal em seu art. 5º, inciso XXXVIII. Enquanto nos Estados Unidos é direito
consagrado na Sexta Emenda da Constituição estadunidense e, a exemplo da nossa Carta
Magna, os americanos também o tratam como direito fundamental.
Embora nos Estados Unidos o direito ao julgamento pelo Júri tenha caráter de direito
fundamental, o acusado tem a faculdade de abrir mão deste julgamento, optando por ser
julgado por um juiz togado, desde que, receba a acusação por um crime mais brando, esse
fenômeno é denominado “guilty plea” que é a “possibilidade de o acusado se declarar
culpado”. Outro fenômeno realizado no júri norte-americano é a chamada “plea bargaining”,
ou “plea bargain”, que é a possibilidade de realização de acordo entre o réu e a acusação, que
viabiliza a utilização da guilty plea. Por exemplo: o investigado que cometeu um homicídio
qualificado pode negociar com a promotoria para fins de reconhecer sua culpa em troca de
uma acusação de homicídio simples. Nos Estados Unidos, cerca de noventa por cento das
causas criminais são resolvidas pela aplicação da plea bargain.
Na jurisdição federal isso é possível desde que o investigado tenha sido aconselhado
por um advogado, bem como haja concordância do promotor e do juiz. Na raia estadual, tendo
em vista a existência de diversos sistemas de acordo com cada unidade da federação, há
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diferentes limitações, sendo que em alguns Estados essa possibilidade de renúncia não existe
quando se tratar de crime apenado com pena de morte. Portanto, mesmo ambos sendo garantia
fundamental se afastam no que diz respeito à possibilidade de se abdicar do julgamento pelo
Júri, pois enquanto nos Estados Unidos a pessoa tem a prerrogativa de renunciar ao
julgamento, no Brasil esta possibilidade não existe, já que a competência constitucional da
instituição é indelegável e irrenunciável.
4.3 Escolha dos jurados
No Brasil as pessoas interessadas em fazer parte de uma Sessão Plenária deverão se
inscrever ou ser indicado para a função. Após a inscrição, o nome do cidadão passa a constar
numa lista elaborada pelo juiz-presidente da Comarca. A quantidade de jurados que cada
Comarca deve possuir varia de acordo com o tamanho e o número de habitantes das cidades.
Para ser jurado no Brasil é necessário a idade mínima de 18 anos, não havendo a necessidade
de ter conhecimento na área jurídica, devendo ser cidadão brasileiro com bons antecedentes.
Nenhum cidadão poderá ser excluído dos trabalhos do júri ou deixar de ser alistado em razão
de cor ou etnia, raça, credo, sexo, profissão, classe social ou econômica, origem ou grau de
instrução. A atividade não é remunerada, no entanto alguns benefícios são assegurados, por
exemplo, nenhum desconto será feito no salário ou vencimento do jurado no dia em que
comparecer à sessão do Júri; os jurados sorteados que comparecem às sessões do Júri, terão
direito a certidão que comprove seu comparecimento; o exercício efetivo da função de jurado
constituirá serviço público relevante e estabelecerá presunção de idoneidade moral e
assegurará prisão especial, em caso de crime comum, até o julgamento definitivo e constitui
também, preferência em igualdade de condições nas licitações públicas e nos provimentos,
mediante concurso de cargo ou função pública, bem como nos casos de promoção funcional
ou remoção voluntária. Para a escolha dos jurados na sessão plenária serão intimados a
comparecer em data, horário e local designados, 25 (vinte e cindo) dos jurados que estão
alistados na Comarca, sendo que, a sessão plenária se iniciará com o sorteio, dos quais, apenas
07 (sete) serão convocados para formar o Conselho de Sentença e julgar o acusado.
Nos Estados Unidos, a escolha dos jurados é feita aleatoriamente por escriturários
dos sistemas dos tribunais por meio da compilação de listas a partir do cadastro de eleitores,
cadastro de licenciamentos de veículos ou mesmo de carteiras de motoristas, sendo as
exigências básicas para ser jurado o gozo dos direitos de cidadania, idade entre 21 (vinte e
um) e 70 (setenta) anos, ser alfabetizado e não ter sido condenado por nenhum crime.
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Durante o procedimento de escolha dos jurados que irão efetivamente compor o
grupo que julgará a causa é possível a recusa de alguns indivíduos antes de chegar a sessão
plenária, isso é possível porque a seleção passará sempre pelo crivo do juiz presidente, que
inquirirá o candidato a respeito de sua disposição, capacidade para atuar no julgamento e se é
moralmente idôneo para decidir de modo justo. Dessa forma, pessoas tendenciosas e com
juízo pré-formado serão, de pronto, rejeitadas.
Nos Estados Unidos aqueles que são convocados para tal tarefa recebem uma
remuneração e a formação do corpo de jurados varia entre 6 (seis) e 12 (doze) membros,
porém, em se tratando do Júri federal, o corpo de jurados será composto por 12 (doze)
pessoas. Como a Constituição americana não prevê um número determinado de jurados, no
âmbito estadual, tal matéria foi disciplinada pelo Tribunal Supremo Federal, desta forma, foi
disciplinado que se tratando de delitos de natureza grave, em quase todos os Estados, será
exigido a composição de 12 (doze) jurados (com exceção dos Estados de Arizona e Utah, que
permitem um corpo de jurados formado por 8 (oito) membros, e os Estados de Connecticut,
Florida, Massachusetts e Nebraska, onde o corpo de jurados pode ser integrado por 6 (seis)
membros, desde que seja unânime a decisão). Cabe ressaltar que, mesmo que o tribunal tenha
dado a sua decisão sem unanimidade, o Tribunal Supremo Federal americano tem declarado a
inconstitucionalidade dos casos nos quais o corpo de jurados é composto por menos de 6
(seis) membros, isto é, quando se tratam de júris formados por apenas seis jurados, no juízo
estadual, o entendimento firmado é no sentido da imprescindibilidade de um veredicto
unânime.
4.4 A comunicação entre os jurados
No Brasil é adotado o princípio da incomunicabilidade dos jurados que significa a
proibição que os mesmos possuem de falar entre si durante o julgamento, tal princípio é
previsto no artigo 466, § 1º do Código de Processo Penal:
O Juiz Presidente também advertirá os jurados de que, uma vez sorteados, não poderão comunicar-se entre si e
com outrem, nem se manifestar sua opinião sobre o processo, sob pena de exclusão do conselho e multa.
Desta forma, a incomunicabilidade é considerada uma cautela para assegurar livre
manifestação de pensamentos e não deixar que um jurado seja influenciado pela opinião do
outro. Todavia, a falta de diálogo entre os jurados pode ser prejudicial levando em conta
democratização, pois não há oportunidade de cada jurado demonstrar o seu pensamento.
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É importante salientar que a quebra da incomunicabilidade está presente no projeto
do novo Código de Processo Penal, que já foi aprovado pelo Senado Federal, onde os jurados
terão depois de muitos anos a total liberdade de discutirem suas opiniões, como diz TUCCI,
Rogério Lauria:
Nada poderia ser mais salutar do que esse encontro privado entre os jurados. Para
troca de ideias e impressões sobre a causa, desde que, natural, tivessem que achar
um consenso para o julgamento [...]. As soluções de consenso evitam, normalmente,
os exageros acusatórios e as franquias irresponsáveis, gerando um forte sentimento
de responsabilidade à atividade do jurado como expressão não apenas de uma
convicção pessoal, mas comunitária que se guarda o veredicto.
Já nos Estados Unidos da América adota-se o princípio da comunicabilidade entre os
jurados, sendo, portanto, o oposto em relação ao adotado pelo Brasil.
A comunicabilidade no Júri americano significa que os jurados poderão discutir o
caso concreto entre si, discutir a respeito dos fatos e das provas apresentadas durante a sessão,
sob as orientações jurídicas dadas pelo juiz presidente, sendo que esses debates devem ser
mediados pelo jurado escolhido para ser o “foreperson”, líder entre os jurados, que tem a
incumbência de conduzir na sala secreta os passos a serem tomados para a decisão e poderem
dar o seu veredicto.
4.5 A sala secreta
No Brasil após a realização de todos os atos necessários para a realização da sessão
plenária, como por exemplo, oitiva de testemunhas, depoimento do réu, debates entre as
partes, os jurados são direcionados a sala secreta, sendo que, nesta sala entrarão o juizpresidente e seu assistente, o promotor de justiça, o advogado do réu, em determinados casos
é autorizado o ingresso de estágios e por fim, todos os jurados.
São tantas as diferenças entre um Júri Popular brasileiro e um americano que até no
momento de ingresso a sala secreta podemos notar grande diferença, pois, nos Estados Unidos
é terminantemente proibido o ingresso a sala secreta de qualquer pessoa que não seja jurada,
inclusive, do juiz-presidente, isto é, somente entrará na sala secreta o número de jurados que
formam o conselho de sentença.
Dentro da sala secreta outra diferença entre um país e outro se torna relevante, aliás a
forma pela qual as decisões são tomadas também é totalmente diversa. A Constituição da
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República Federativa do Brasil de 1988 assegura ao Júri o sigilo de suas votações. Por esta
razão, a votação que ocorre na sala secreta na presença de todos os integrantes já
mencionados se dá por quesitos (perguntas) e ocorre de modo que ninguém da sala saiba qual
foi o voto individual do jurado, neste caso, a votação será encerrada quando houver a maioria
simples, por exemplo, se na votação, a resposta de quatro jurados (dentre os sete) foi negativa
sobre os quesitos relacionados à materialidade do fato e à autoria resultará, portanto, na
absolvição do acusado.
Nos Estados Unidos, por outro lado, embora também se preze pelo sigilo, os jurados
devem debater a causa até que se chegue ao consenso de unanimidade, isto é, quando a
unanimidade não é alcançada, ocorre o chamado: o “hung jury”, que leva o juiz,
obrigatoriamente, a declarar um “mistrial” e determinar a convocação de novo julgamento.
Contudo, em alguns Estados a falta de concordância entre os Jurados determina a
possibilidade de o juiz, em acordo com o Promotor, absolver o réu.
4.6 A condenação e absolvição
A última diferença e não menos importante a respeito do assunto tratado é em
relação a condenação ou absolvição do réu, isto é, no Brasil quando o réu é condenado ou
absolvido é cabível para tal decisão o recurso de apelação, conforme artigo 593, III, alíneas,
do Código de Processo Penal, nas seguintes situações: Ocorrer nulidade posterior à
pronuncia; for a sentença do juiz presidente contrária à lei expressa ou a decisão dos
jurados; houver erro ou injustiça no tocante a aplicação da pena ou da medida de segurança
(ver inimputabilidade, com a extinção do sistema do duplo binário, a partir da Lei 7.209/84);
for a decisão dos jurados manifestadamente contrária aos autos.
Desta forma, o Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal não pode substituir
a vontade dos jurados, que é uma consagração da vontade popular, à luz do princípio da
soberania do Júri, uma garantia constitucional, somente podendo anular e mandar que haja
novo julgamento.
Quanto ao recurso cabível nos Estados Unidos estamos diante do “appel” que será
cabível quando houver uma sentença condenatória e, no caso de o tribunal acolhê-lo, pode
modificar a decisão recorrida e ordenar novo julgamento. Mas, nos casos de absolvição, em
razão da proibição constitucional da dupla incriminação, não é admitido nenhum recurso
quando há sentença de absolvição.
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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente trabalho não teve a finalidade de discutir a existência do Tribunal do Júri,
pois o mesmo trata-se de uma garantia fundamental expresso na Constituição Federal
Brasileira e na Constituição Americana. Portanto, pode-se discutir o seu procedimento, jamais
a sua existência. De qualquer maneira, é certo que o Tribunal do Júri brasileiro, merece
muitos ajustes. Alguns, inclusive, já estão contemplados no Projeto de Reforma do Código de
Processo Penal que está no Congresso Nacional. Entretanto, nenhum sistema é composto
apenas de perfeições e uma análise no direito comparado é fundamental para que em cada
alteração realizada pelo legislador a perfeição deste procedimento esteja o mais próximo de
ser realizada.
Os juris brasileiros e americanos possuem muito mais diferenças do que
semelhanças, em razão da origem de cada país e adoção de sistemas jurídicos diferentes.
Pode-se dizer que a única semelhança é que o Tribunal do Júri em ambos os países é uma
garantia fundamental, já as diferenças são notáveis pois, no Brasil a atuação do Júri se reserva
ao julgamento das causas criminais relativas aos crimes dolosos contra a vida, enquanto nos
Estados Unidos é possível que se tenha um julgamento pelo Júri tanto em causas cíveis
quanto em causas penais.
Os padrões se distanciam também no que diz respeito a votação. Enquanto nos
Estados Unidos a votação deve ser unânime, no Brasil elas se darão sempre por maioria, seja
para a absolvição seja para a condenação. Após a decisão dada pelos jurados estamos diante
do duplo grau de jurisdição que é a possibilidade de a parte insatisfeita buscar uma nova
decisão, desta forma, para os casos relacionados a condenação e absolvição no Brasil o
recurso de apelação será para anular algo ocorrido ou determinar a realização de nova Sessão
Plenária. Nos Estados Unidos, o duplo grau de jurisdição somente é possível quando há
condenação, cabendo o recurso denominado “appel”, mas nos casos de absolvição não há
possibilidade do ingresso de recursos.
Por fim, dentre as inúmeras diferenças apresentadas no presente estudo conclui-se
que este comparativo não deseja mencionar que um sistema é melhor que o outro, mas sim,
que tal comparação se torne um exemplo para aproveitar o que há de valoroso em cada
Tribunal e, inclusive, tomar conhecimento a respeito desse instituto que é definitivamente a
forma mais notável de democracia.
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REFERÊNCIAS
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Silva. Rio de Janeiro: Editora Nacional de Direito, 1950.
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Lumen Juris, 2008, p. 3.
NUCCI, Guilherme de Souza. Júri: princípios constitucionais. São Paulo: J. De Oliveira.
OLIVEIRA, César Antônio Silva. A influência da mídia no Tribunal do Júri à luz dos
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PARENTONE,
Roberto
Bartolomei.
Tribunal
do
Júri.
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em:
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