ARRUDA, Estevan Augusto de Barros; GONÇALVES JUNIOR, Luiz. A educação física
escolar na cidade de Araraquara - Brasil: possibilidades geradas com a lei de diretrizes e
bases. In: 8º CONGRESSO DE EDUCAÇÃO FÍSICA E DESPORTO DOS PAÍSES DE
LÍNGUA PORTUGUESA, 2000, Lisboa (Portugal). Anais... Lisboa (Portugal): 2000. (no
prelo)
A Educação Física Escolar na Cidade de Araraquara – Brasil:
Possibilidades Geradas com a Lei de Diretrizes e Bases
Estevan Augusto de Barros Arruda; Luiz Gonçalves Junior
Núcleo de Estudos de Fenomenologia em Educação Física / Departamento de Educação
Física e Motricidade Humana / Universidade Federal de São Carlos
Introdução
Com a promulgação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB),
em 1996, possibilitou-se uma série de dispositivos flexibilizadores, entre outros, das
instituições escolares poderem elaborar e executar sua proposta pedagógica. Com relação a
Educação Física Escolar, que até então era considerada “atividade” passou a denominação de
“componente curricular”, adquirindo respeito na forma da lei. Por outro lado, com a
fragilidade ainda presente da área de Educação Física e a possibilidade das escolas poderem
elaborar suas propostas pedagógicas, a Educação Física Escolar tem sido objeto de convênios
entre escolas particulares e academias poliesportivas.
Percebendo uma certa tendência de escolas particulares buscarem tais convênios com
as academias poliesportivas, julgamos necessário observar se, tratava-se de um inconseqüente
repasse de obrigações ou de uma alternativa refletida de trabalho prevista no projeto
pedagógico elaborado pela escola, já que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDB), promulgada em 20 de dezembro de 1996, permite e até incentiva a flexibilização do
projeto pedagógico de acordo com as premissas da região e da escola, conforme manifesta
seus parágrafos I e VI do artigo 12º: “I - elaborar e executar sua proposta pedagógica; (...) VI
- articular-se com as famílias e a comunidade, criando processos de integração da sociedade
com a escola (...)” (Brasil, 1996).
Nos relata Demo (1997) que devemos ter “a lei como dispositivo motivador, que há de
conter parâmetros estabelecidos, mas a serviço da criatividade”(p.14), portanto, uma lei em
educação deve “insistir em propostas flexíveis, para não atrapalhar a vontade de
aprender”(p.15).
Neste estudo o interesse é nas aulas de Educação Física Escolar de estabelecimentos
de ensino particular, situados na cidade de Araraquara, interior do estado de São Paulo, Brasil,
que realizam convênios com academias poliesportivas, ao que chamaremos de
“terceirização”. Consideramos Educação Física Escolar “tercerizada”, aquela na qual as aulas
ao invés de serem realizadas nas respectivas escolas com professores devidamente contratados
pelas mesmas, são transferidas para academias poliesportivas, onde os alunos passam a ter
opção de freqüentar uma modalidade esportiva a sua escolha, como: natação, musculação,
ginástica, dança, etc, com professores contratados pela academia.
Entende-se, “terceirização” como a transferência de serviços da escola particular
(instituição prestadora de serviços aos alunos e pais), para uma academia poliesportiva
(instituição estranha à relação escola/aluno ou ordenação jurídica - escola/pais de alunos), ou
seja, no caso presente, a academia poliesportiva torna-se parceira trabalhadora da escola,
intercedendo legitimamente na demanda das aulas de Educação Física Escolar, demonstrando
interesse próprio definido nos contratos de convênio. Assim a presente pesquisa tem como
objetivo identificar a forma como se estabelecem e se desenvolvem estes convênios e, ainda,
qual a visão de educação física escolar dos coordenadores pedagógicos das escolas
conveniadas.
2
A Educação Física na Educação Básica e a Nova LDB
A “terceirização” da Educação Física é algo novo, ou seja, a possibilidade de convênio
entre escolas e academias poliesportivas foi apresentada recentemente com a promulgação da
nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional -1996 (LDB), a qual possibilita às
instituições escolares elaborarem e executarem sua proposta pedagógica, além de uma série de
outros dispositivos flexibilizadores, que para Demo (1997) “atingem níveis (...)
surpreendentes, tornando-se quase uma obsessão”(p.20) conforme podemos perceber nos
artigos 23 e 25 da referida lei, a seguir:
“Art. 23. A educação básica poderá organizar-se em
séries anuais, períodos semestrais, ciclos, alternância
regular de períodos de estudo, grupos não seriados, com
base na idade, na competência e em outros critérios, ou
por forma diversa de organização, sempre que o interesse
do processo de aprendizagem assim o recomendar.(...)
Art. 25. Será objetivo permanente das autoridades
responsáveis alcançar relação adequada entre o número
de alunos e o professor, a carga horária e as condições
materiais do estabelecimento.
Parágrafo único: Cabe ao respectivo sistema de ensino, à
vista das condições disponíveis e das características
regionais e locais, estabelecer parâmetro para
atendimento no disposto neste artigo” (Brasil, 1996).
Para Demo (1997), o grande problema do parágrafo único citado acima é que:
"...representa menos uma flexibilização do que concessão
duvidosa a manobras locais, que tenderão a
sobrecarregar as turmas, sobretudo em entidades
privadas (...) toda proposta de flexibilização se presta a
mal entendidos, porque, cabendo o direito de interpretar,
está incluído no negócio o abuso do direito"(p.24).
A autonomia das instituições escolares também ocorre em função de que os órgãos
governamentais não baixarão normas com modelos de propostas pedagógicas, apresentando
apenas diretrizes ou parâmetros, com caráter de princípios norteadores; ou seja, os currículos
da educação básica (educação infantil, ensino fundamental e médio) terão uma base nacional
comum, que será complementada por uma parte diversificada, de responsabilidade de cada
estabelecimento escolar.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) estabelece que “A Educação
Física, integrada à proposta pedagógica da escola, é componente curricular da educação
básica, ajustando-se às faixas etárias e às condições da população escolar, sendo facultativa
nos cursos noturnos” (Brasil, 1996).
Lei que já se encontra integrada nas proposições da Secretaria de Estado da Educação
de São Paulo, da qual as escolas da cidade de Araraquara seguem orientação, observando que
“A Educação Física deixa de sofrer conseqüências da parafernália normativa constante nas
legislações anteriores; agora o que preside o funcionamento das atividades de Educação Física
é a Proposta Pedagógica da Escola”(São Paulo, 1998, p.3).
3
O Método
O ponto de partida para esta investigação foi percorrer as cidades de São Carlos e
Araraquara em busca de escolas que possuíssem algum tipo de convênio com academias
poliesportivas.
A partir daí foram detectados dois tipos distintos de convênio, o primeiro, apenas de
cunho financeiro, consiste na academia fornecer desconto para os alunos de determinada
escola no ato da matrícula; o segundo, consiste em, não apenas existir um desconto sobre a
mensalidade, mas também na academia fornecer seus serviços em substituição às aulas de
Educação Física da escola conveniada, inclusive controlando a freqüência dos alunos e a
remetendo à escola posteriormente.
O primeiro modo de convênio foi encontrado em ambas as cidades, porém, foi
descartado desta análise, por não se configurar objeto desta pesquisa. O segundo caso trata
exatamente da “terceirização” da Educação Física e foi encontrado apenas em Araraquara.
Deste modo, com a finalidade de identificar como se estabelecem e se desenvolvem os
convênios entre as escolas particulares de educação básica (na cidade de Araraquara, interior
de São Paulo, Brasil) e uma academia da cidade e, ainda, qual a concepção de Educação
Física Escolar dos dirigentes das instituições escolares conveniadas, efetuamos uma pesquisa
de campo nas referidas escolas e academia, onde pudemos ter acesso aos contratos que
estabelecem as regras do intercâmbio.
Após esta etapa, comprovada a existência dos convênios, solicitamos às coordenadoras
pedagógicas as propostas pedagógicas das respectivas escolas, porém não obtivemos êxito.
Como o assunto abordado surgiu recentemente, isto é, somente com a aprovação da
nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), não existem bibliografias que
tratam exclusivamente do assunto no âmbito da Educação Física. Consequentemente a
pesquisa bibliográfica foi feita com base, principalmente, em literatura da área de educação e
na legislação pertinente.
Utilizamos como metodologia a fenomenologia, entendendo-a conforme a proposição
de Martins (1992): “...a investigação direta e a descrição de fenômenos que são
experienciados pela consciência, sem teorias sobre sua explicação causal e tão livre quanto
possível de pressupostos e de preconceitos” (p.50).
Assim, a pesquisa, não enfatiza o esclarecimento dos fatos (relações causais,
mecânicas, externamente mensuráveis), e sim, busca compreender os fenômenos, cuja
peculiaridade é a imanência e a capacidade de conferir significado às coisas exteriores.
Portanto, fenomenologia pode ser entendida como uma descrição da estrutura específica do
fenômeno e da estrutura da consciência, enquanto compõe-se de vivências como condição
primeira de possibilidade de conhecimento.
Pode-se dizer “...que a trajetória fenomenológica, consiste em três momentos, os quais
não deverão ser vistos como passos ou seqüências: a descrição, a redução e a compreensão
fenomenológica, sendo que, necessariamente, esta ultima envolve uma interpretação”
(Martins, 1992, p.59).
Deste modo, procedendo com a trajetória fenomenológica, foram entrevistadas as
coordenadoras pedagógicas das duas escolas particulares da cidade de Araraquara que
possuem convênios de "terceirização" das aulas de Educação Física, no caso com uma mesma
academia poliesportiva, sendo que seus nomes serão mantidos em sigilo nos discursos por
motivos éticos.
Optamos por coletar o discurso das coordenadoras, pois estas estão envolvidas
diretamente com a elaboração e execução do projeto pedagógico de suas respectivas escolas, a
partir da seguinte interrogação: Qual sua compreensão de Educação Física escolar?
Optou-se apenas por uma questão para evitar respostas fechadas (sim/não) com no
máximo um breve comentário. Pretende-se com a interrogação obter um discurso sobre o
assunto, neste será analisado a experiência vivida no contexto da consciência da entrevistada,
pois na descrição revela-se o ser mais intimo, traduzindo a própria objetividade da
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comunicação humana. Segundo Moreira (1992): “é na descrição que encontramos o
pesquisador e sujeitos interagindo, comprometidos na ação da pesquisa”(p. 58).
Salientamos que os discursos (descrições) de cada coordenadora entrevistada foram
transcritos em sua integra e somente após os termos lido várias vezes é que iniciamos o
movimento da redução fenomenológica (levantamento das unidades de significado em relação
a interrogação empreendida buscando a essência do fenômeno interrogado) e da compreensão
fenomenológica (organização das convergências surgidas no discurso reduzido dos sujeitos
em categorias estruturais a partir das quais pode-se organizar a matriz nomotética refletindo
sobre a estrutura do fenômeno, possibilitando a interpretação – “conclusão” desta modalidade
de pesquisa).
Os Discursos
Discurso I: Coordenadora A - Escola A
Eu acredito que a Educação Física, não só ela, tem, como uma das finalidades,
trabalhar, né? O desenvolvimento motor, equilíbrio, enfim, toda parte psicomotora de um ser,
pensando num ser dentro do aspecto físico (1). Mas eu acho que ela tem uma... A Educação
Física, ela tem uma força muito grande na formação integral do ser, das pessoas, porque, ah...,
nesse momento, você pode trabalhar no momento de aula de Educação Física. A criança, pode
trabalhar...(pensa para reflexão)... a cooperação, a partilha, você trabalha o juízo de valores,
ahhh, você tem um, uma força, né? nas mãos, que nem todas as disciplinas tem (2). Eu acho
que a, a Educação Física, ela é muito ampla, é um contato (palavra incompreensível) né?
então o professor, ele é muito assim..., muito próximo ao aluno, ele..., pera aí um pouco, pára
aí. Que a Educação Física, ela é um momento de comunicação, comunicação entre pessoas, é
uma comunicação não só em nível social, é uma comunicação emocional, é uma comunicação
de idéias, ah..., porque através das atividades físicas, jogos, ah..., a ampliação, né? Dessa
ide..., a oportunidade, né?, que uma aula de Educação Física permite pra... para que... ah..., se
desenvolva o aspecto social, o aspecto emocional da pessoa é... é muito grande (3). Então, eu
acho, que, que num currículo escolar a Educação Física é indispensável e é imprescindível
(4), agora eu acho só que nem todas as escolas, nem todos os educadores, tem essa visão, e até
mesmo dentro da própria Educação Física, os próprios profissionais da Educação Física não
tem essa consciência, da importância do trabalho do professor de Educação Física, a
importância dessa disciplina, né? no currículo escolar (5); porque não é só você chegar e dar
um exercício físico, dou um jogo, os alunos tão lá..., eu acho que a força, a força educacional
que um professor de Educação Física consegue, talvez um professor de... de história não
consiga tanto, um professor de matemática não consiga tanto, né?(6) então ele pode estar
aproveitando o momento da própria aula, né? Os acontecimentos das relações humanas que
ocorrem no decorrer, né? de todo seu planejamento de aula, ahhh, fazer com que a pessoa, né?
que traga sua escala de valores, né? Repense sobre as relações humanas (7), eu tô repetitiva.
Eu acho que tá bom, não sei mais o que que eu... A Educação Física não é uma disciplina
fechada em si, né? a força que ela tem como... ah... uma das... dos caminhos da educação, se
vê a interação com outras disciplinas é muito importante, quantas vezes, por exemplo, um
professor de Educação Física pode estar resgatando conhecimentos matemáticos, né?
Prática... na sua própria prática, conhecimentos históricos na sua prática, então, quer dizer, é
um... uma disciplina que pode trabalhar a interdisciplinaridade com muita facilidade (8).
Então, quer dizer, eu acho que a Educação Física ela é muito global, muito ampla (9), na sua...
Acho que tá bom.
5
Redução Fenomenológica do Discurso I
1- A Educação Física trabalha o desenvolvimento motor, o equilíbrio e toda a parte
psicomotora a partir do aspecto físico.
2- A Educação Física tem uma força muito grande na formação integral do ser que outras
disciplinas não tem, pode trabalhar a cooperação, a partilha e o juízo de valores.
3- A Educação Física é muito ampla, é um momento de comunicação no nível social,
emocional, de idéias; desenvolve o aspecto social e emocional da pessoa, sendo que o
professor é muito próximo ao aluno.
4- Educação Física é indispensável e imprescindível no currículo escolar.
5- Nem as escolas, nem os educadores e nem mesmo os profissionais de Educação Física tem
consciência da importância do trabalho do professor de Educação Física e dessa disciplina no
currículo escolar.
6- A força educacional que um professor de Educação Física consegue, talvez professores de
outras disciplinas não consigam.
7- O professor de Educação Física pode aproveitar o momento das relações humanas da aula
para a pessoa trazer sua escala de valores e repensar as relações humanas.
8- A Educação Física não é disciplina fechada e em função de sua praticidade ela permite o
trabalho interdisciplinar com muita facilidade.
9- A Educação Física é muito ampla.
Análise Ideográfica do Discurso I
A coordenadora entrevistada atribui à Educação Física, o desenvolvimento motor, o
desenvolvimento do equilíbrio e da parte psicomotora, a partir do aspecto físico. Diz, também,
que a Educação Física tem grande força educacional na formação integral do ser, trabalhando
a cooperação, a partilha e o juízo de valores.
Segundo a coordenadora o professor é muito próximo ao aluno, traduzindo a Educação
Física como um momento de comunicação social e emocional das idéias, desenvolvendo esses
aspectos, e por isso esta disciplina é fundamental no currículo escolar.
Acrescenta que os profissionais de Educação Física não têm a consciência do que
podem fazer e conseguir em relação aos outros professores. Por fim cita a facilidade do
desenvolvimento de um trabalho interdisciplinar a partir da Educação Física em função da sua
praticidade.
Discurso II: Coordenadora B - Escola B
Bom dia, acredito que a Educação Física é tão necessária quanto o ar que nós
respiramos, porque se você também não tem condições físicas, um corpo sadio, dificilmente
você vai ter uma mente sadia, não é verdade? (1), e ao mesmo tempo que as pessoas
deficientes ou portadoras, um... por motivos alheios da vontade deles, encontram uma
dificuldade, em... no mercado de trabalho e consequentemente também na escola; uma
dificuldade e ah... não só em locomoção, mas de adaptação, porque você vai ter éhhh...
cadeiras especializadas, vai ter rampas e tal, não é isso que eu quero falar sobre o que é o
exercício; mas que a Educação Física é necessária para ajudar a ter esse corpo ativo, né?
Porque o aluno também se torna sedentário se ele não tiver Educação Física (2). Bem, outra
coisa que eu acredito que é a Educação Física; ela traz a integração do ser humano, porque
é...é nesse momento a Educação Física é a descontração, então se o... o jovem, a criança, ele
encontra esse espaço para... estar tão descontraído e dar vazão aos seus impulsos, a Educação
Física só vai proporcionar esse encontro de ser humanos, né? e é ai que acontecem realmente
a amizade, o coleguismo; porque dificilmente dentro da Educação Física nós temos
discórdias...(3) sabe, é um momento da aula onde eles gostam, eles se sentem bem, então a... a
não ser algum probleminha, assim, de disciplina ou alguém muito rebelde, mas dificilmente
6
chega aqui prá nós, problemas na aula de Educação Física. Tá? Outra coisa que eu gostaria de
falar... ahhh, que a Educação Física... favorece também... a possibilidade de encaminhamento
para novas descobertas, né? Nós temos aí a possibilidade de serem atletas dentro da Educação
Física, né? E o mundo precisa de atletas, né? Precisa de pessoas que trabalhem com o corpo,
então é na aula de Educação Física que você vai dar essa possibilidade de... de ginástica
olímpica, de jogos, e então...(4) e vai ensinar o homem a viver em comunidade... porque
sozinho ele não consegue sobreviver, e em todas as disciplinas você pode até estudar sozinho,
mas a Educação Física você não pode ficar sozinho (5), se tem que ficar em companhia, acho
que é isso a grande preocupação do ser humano, tá?
Redução Fenomenológica do Discurso II
1- A Educação Física é tão necessária quanto o ar que respiramos, se você não tem condições
físicas, um corpo sadio, dificilmente vai ter uma mente sadia.
2- A Educação Física é necessária para ajudar a ter o corpo ativo, porque o aluno também se
torna sedentário.
3- A Educação Física possibilita a integração do ser humano, a descontração, a vazão dos
impulsos, e assim proporciona a amizade e o coleguismo.
4- A Educação Física favorece a possibilidade de encaminhamento de novas descobertas, de
atletas, e a Educação Física vai dar a oportunidade de se trabalhar o corpo, a ginástica
olímpica, os jogos.
5- A Educação Física ensina o homem a viver em comunidade, pois em outras disciplinas o
aluno pode estudar sozinho e na Educação Física não.
Análise Ideográfica do Discurso II
A coordenadora entrevistada infere que a Educação Física é tão necessária quanto o ar
que nós respiramos, ajuda a ter um corpo ativo, necessário para que o aluno não se torne
sedentário; integra o ser humano, descontrai e proporciona o a amizade e o coleguismo.
Ela cita a Educação Física como encaminhamento para novas descobertas, como
atletas, e como oportunidade para trabalhar o corpo, a ginástica olímpica e os jogos. Ensina
também o homem a viver em comunidade.
A Compreensão dos Discursos
Na cidade de Araraquara, interior do estado de São Paulo, Brasil, onde foram
detectados convênios cujo teor se adequava ao tema da pesquisa, existiam apenas duas escolas
que desenvolviam tal convênio, assim, foram duas as coordenadoras pedagógicas
entrevistadas, “geralmente se considera que, quanto maior for o número de sujeitos, maior
poderá ser a variação e, consequentemente, melhor a possibilidade de ver aquilo que é
essencial, embora este não seja o principal critério a ser observado, pois o que se busca são
convergências e idiossincrasias nestas descrições” (Martins, 1992, p.61).
Como próximo passo para a construção dos resultados apresentamos, a seguir, a matriz
nomotética, tratando-se de uma análise qualitativa das asserções encontradas nos discursos.
Deste modo, na primeira coluna da matriz, encontram-se as categorias levantadas nos
discursos, dispostas pelas letras maiúsculas do alfabeto de “A” à “C”. Nas colunas seguintes,
em uma seqüência horizontal, estão representadas as descrições (discursos) numeradas por
algarismos romanos “I” e “II”, logo abaixo, foram assinaladas as "unidades de significado" de
acordo com as categorias correspondentes em algarismos arábicos e, quando seguidos da letra
“d” minúscula indica-se uma divergência. Por outro lado as categorias que possuem duas ou
mais unidades de significado em discursos diferentes, caracterizam uma convergência entre
7
eles. Já as categorias que possuem unidades em apenas um discurso, demonstram uma
idiossincrasia ou individualidade dos mesmos.
Quadro 1: Matriz Nomotética
Descrições
Categorias
A- A visão dicotômica do ser
B- A Educação Física é indispensável
no currículo escolar
C- Força educacional da Educação
Física e possibilidade do trabalho
interdisciplinar
I
II
1 e 2d
4; 5
1; 2; 3 e 4
3; 6; 7; 8 e 9
5
Interpretação
A primeira categoria encontrada durante a análise das descrições foi nomeada de “A
visão dicotômica do ser”, na qual, podemos observar que o discurso “I”, unidades de
significado reduzidas 1, e o discurso “II”, unidades de significado 1, 2, 3 e 4 apresentam uma
visão dicotômica de ser humano, ou seja ocorre a fragmentação do ser em corpo e mente,
atribuindo-se grande destaque ao aspecto físico nas unidades “I”-1 e “II”-1. Ocorre, no
entanto, uma divergência na descrição I, unidade 2d, quando o depoente afirma que a
Educação Física favorece a formação integral do ser.
Entendemos que deve-se evitar tais fragmentações e considerar-se sempre o ser
humano como ser integral ou, na fala de Merleau-Ponty (1969), o corpo encarnado, ou seja, o
corpo que olha todas as coisas e que também é capaz de olhar a si, que se vê vidente, toca-se
tateante... Corpo que se move não pela reunião de partes e na ignorância de si, mas irradiando
de um si. Corpo que não é objeto para um “eu penso”: ele é um conjunto de significações
vividas, pois: “não reuno as partes de meu corpo uma a uma; essa tradução e essa reunião
estão feitas de uma vez por todas em mim: elas são meu próprio corpo (...). Mas eu não estou
diante de meu corpo, estou em meu corpo, ou antes sou meu corpo”(Merleau-Ponty, 1996,
p.207-208).
Ou, ainda, conforme Gonçalves (1994), deve-se considerar que:
“A relação de unidade do homem com o mundo é uma
relação viva e funda-se na sensibilidade (...) Todo saber
se instala nos horizontes abertos pela percepção (...) O
movimento corporal nunca se repete, pois uma situação
nunca é a mesma como também não o é o homem. Ser
capaz de captar o novo em cada situação, isto é, de
atribuir novos significados e de agir criando o novo em si
próprio, parece ser a essência da criatividade”(p.152153).
Na categoria “B”, denominada “A Educação Física é indispensável no currículo
escolar”, encontramos uma idiossincrasia na descrição “I” em suas unidades de significado 4
e 5. Porém, se a Educação Física continuar sendo "terceirizada" seguindo o rumo atual, sem a
ocorrência de amplas discussões nas delegacias de ensino de cada região e particularmente em
cada escola para formulação do projeto pedagógico, pode-se configurar o mero rapasse das
responsabilidades da escola para outras instituições, e ainda, as academias poliesportivas
assumirem o ensino do esporte praticamente como única possibilidade, prejudicando muito a
8
Educação Física Escolar, especialmente ao privar os alunos do contato com uma variabilidade
de conteúdos necessários ao seu pleno desenvolvimento.
A categoria C – “Força educacional da Educação Física e possibilidade do trabalho
interdisciplinar” – realça a proximidade de contato do professor de Educação Física com os
alunos (“I” – 3 e 7) e que possui grande força educacional (“I” – 6 e “II” – 5) favorecendo
ação interdisciplinar em torno de sua amplitude e praticidade (“I” – 8 e 9).
Ao discutir as relações humanas e escala de valores conforme proposto na descrição
“I”, unidade 7, percebemos valorização da experiência vivida pelo aluno fora do contexto
escolar, trazendo para os colegas novas maneiras de ser e de conviver socialmente, pois, a
escola “mais do que nunca, é um espaço social privilegiado de construção de conhecimentos,
significados éticos necessários e constitutivos das ações de cidadania”(São Paulo, 1998),
reafirmando-se assim, como um espaço de informação e formação que deve: “...possibilitar o
desenvolvimento de capacidades que o permitam compreender e intervir nos fenômenos
sociais e culturais e garantir que os alunos possam ter acesso e compreender o produto das
culturas...”(p.2).
Em acordo Gonçalves (1994) afirma que a Educação Física deve visar “o
desenvolvimento da personalidade humana de forma total, abrangendo todas as possibilidades
de emancipação dos seus atributos humanos, e a sua integração na vida social, o que significa
compromisso e responsabilidade social” (p.158).
No entanto, será possível considerar tais aspectos nas aulas de Educação Física
“terceirizada” em academias poliesportivas, na qual os alunos optam por um dado esporte?
A flexibilização da Lei de Diretrizes e Bases da Educação abre opções das escolas
estarem adaptando sua proposta pedagógica e ampliando o conteúdo do seu currículo, através
dos convênios com as academias poliesportivas, por exemplo, pois, possibilitam o uso de um
espaço físico para a realização das aulas de Educação Física que algumas escolas não
possuem como: salão de danças e piscinas.
Deste modo, a terceirização, fazendo com que as aulas na academia tornem-se, uma
das atividades da Educação Física Escolar, ou seja, extensão das atividades escolares, os
alunos poderão ter mais opções de atividades e consequentemente uma variabilidade maior de
vivências de movimentos, possibilitando, assim, que o indivíduo tenha respostas
diversificadas, de acordo com as necessidades do ambiente externo.
Por outro lado corre-se o risco dos alunos freqüentarem as aulas de um único esporte
ao longo de sua “vida escolar”, o que, em certa medida, já vem infelizmente ocorrendo no
seio das escolas, conforme afirma Rangel-Betti (1995): “a escola assumiu o ensino do esporte,
praticamente como única estratégia. Esta é uma constatação fácil de ser percebida em toda
instituição escolar...” (p.26)
É sempre bom lembrar que a Educação Física lida não somente com o esporte mas
também com a relação do aluno com o mundo exterior a ele e “a função do professor é a de
promover o entendimento dos vários sentidos que os jogos esportivos possam ter, a resolução
de conflitos que possam surgir em sua realização e a compreensão, e até, alteração de suas
regras. É preciso aprender a discutir o que acontece no esporte, por exemplo a questão dos
boicotes olímpicos, os ídolos, e não simplesmente negá-los (...) Mas falta ainda outro tipo de
mudança, que é a introdução de novas modalidades esportivas, os diferentes tipos de dança e
as atividades expressivas” (Rangel-Betti, 1995, p.27).
Nos referindo aos convênios estudados especificamente, entendemos que é possível
que ele venha a ajudar a valorizar um pouco mais o professor de Educação Física, a partir do
momento em que as academias poliesportivas necessitem de mão-de-obra especializada, como
diferencial contra a concorrência, por outro lado o profissional que prioritariamente deveria
atuar em academia é o bacharel, o qual não possui o preparo específico para o trabalho
educacional, situação privilegiada dos egressos do curso de licenciatura.
Entendemos assim, que o processo de “terceirização”, no trabalho em academias,
deverá ser planejado e discutido entre todos os envolvidos (professores de Educação Física,
9
professores em geral, pais, alunos, coordenadores pedagógicos e coordenadores das
academias) e visto como ampliação e complementação, nunca como única atividade da
Educação Física Escolar.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Rangel-Betti, I. C (1995). Esporte na escola: mas é só isso professor? Motriz, 1: 1, 25-31.
Brasil (1996). Ministério da Educação e do Desporto. Lei de diretrizes e bases da educação
nacional.
Demo, P. (1997). A nova LDB: ranços e avanços. Campinas: Papirus.
Gonçalves, M. A. S. (1994). Sentir, pensar, agir: corporeidade e educação. Campinas:
Papirus.
Martins, J. (1992). Um enfoque fenomenológico do currículo: educação como poíesis. São
Paulo: Cortez.
Merleau-Ponty, M. (1969). O ôlho e o espírito. Rio de Janeiro: Grifo.
Merleau-Ponty, M. (1996). Fenomenologia da percepção. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes.
Moreira, W. W (1992). Educação física escolar: uma abordagem fenomenológica. Campinas:
UNICAMP.
São Paulo – Estado – (1998). Secretaria do Estado da Educação. Escola de cara nova:
planejamento 98, as mudanças na educação e a construção da proposta pedagógica da
escola.
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GONÇALVES JUNIOR, Luiz. A educação física escolar na cidade de